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AULA 1 - CURSO A FICÇÃO CIENTÍFICA NO CINEMA (1)

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A FICÇÃO CIENTÍFICA NO CINEMA
AULA 1: PRIMÓRDIOS DA SCI-FI: DA ERA SILENCIOSA À SEGUNDA GUERRA
por Fernando Brito
APRESENTAÇÃO DO CURSO
Neste curso, temos como objetivo apresentar um panorama rico e abrangente do gênero e de suas diferentes vertentes em países como Estados Unidos, Alemanha, França, Japão e União Soviética, refletindo acerca das questões socioculturais e históricas destas produções em seus respectivos contextos e como podem contribuir para um cânone cinematográfico da sci-fi.
AULA 1 – Primórdios da sci-fi no cinema: da era silenciosa à Segunda Guerra
AULA 2 – A Era de Ouro da sci-fi: os anos 50
AULA 3 – Mutações da sci-fi nas décadas de 1960 e 1970
AULA 4 – Sci-fi no Japão, União Soviética, Tchecoslováquia, França e outros países
AULA 5 – Cyberpunk e filmes associados à estética cyberpunk
FICÇÃO CIENTÍFICA – CONCEITOS 
“A FC é um gênero literário subversivo por excelência, inclusive por abrigar visões conflitantes e ser palco de debates essenciais do nosso tempo – debates esses que há meio século questionavam: Podemos, e devemos, viajar para outros planetas? E nos dias de hoje nos perguntamos: Podemos, e devemos, fazer upload de nossa mente para um ambiente/realidade virtual?” 
Bráulio Tavares
“O que continua a tornar a FC relevante, assim como grande, é sua abertura ao outro, à mudança, à alteridade”
Adam Roberts, A Verdadeira História da Ficção Científica
“Essas três formas, concebidas de maneira ampla, definem minha primeira ideia do que é FC: histórias de viagem pelo espaço (para outros mundos, planetas, estrelas), histórias de viagem pelo tempo (para o passado ou para o futuro) e histórias de tecnologias imaginárias (maquinários estranhos, robôs, computadores, ciborgues e cibercultura). Há uma quarta forma, a ficção utópica, que os críticos de ficção científica com frequência incluem em qualquer definição razoável da forma. Minha premissa neste estudo é que a ficção utópica seja na verdade ficção científica, embora tome como ponto de partida a filosofia e a teoria social em vez de itens de uma hipotética tecnologia ou destinos inteiramente novos.” 
Adam Roberts, A Verdadeira História da Ficção Científica
“[A ficção científica é] (...) um gênero literário ou construto verbal cujas condições necessárias e suficientes são a presença e interação de distanciamento e cognição, e cujo dispositivo central é uma moldura imaginativa alternativa ao ambiente empírico do autor.”
Darko Suvin
“[O novum de Darko Suvin] o dispositivo, artefato ou premissa ficcionais que põem em foco a diferença entre o mundo que o leitor habita e o mundo ficcional do texto de FC. Esse novum pode ser algo material, como uma espaçonave, uma máquina do tempo ou um dispositivo de comunicação mais-rápido-que-a-luz; ou pode ser algo conceitual, como uma nova versão de gênero ou consciência. O distanciamento cognitivo de Suvin equilibra alteridade radical e certo grau de semelhança familiar, de modo que (nas palavras de Patrick Parrinder), ‘ao imaginar mundos estranhos, acabamos vendo nossas próprias condições de vida em uma perspectiva nova e potencialmente revolucionária.”
Adam Roberts, A Verdadeira História da Ficção Científica
“Não há entre esses diversos pensadores [Brian Stableford, John Clute, Peter Nicholls] um consenso simples sobre o que é FC, além do acordo de que é uma forma de discurso cultural (em essência literário, mas nos últimos tempos cada vez mais cinematográfico, televisual, de quadrinhos e relacionado a jogos, eletrônicos ou não) que envolve a concepção de um mundo, de um modo ou de outro, diferenciado do mundo real em que os leitores vivem. O grau de diferenciação – a estranheza do novum, para usar a terminologia de Suvin – varia de um texto para o outro, mas na maioria das vezes envolve exemplos de hardware tecnológico que se tornaram, até certo ponto, reificados pelo uso: a espaçonave, o alienígena, o robô, a máquina do tempo e assim por diante. A natureza da diferenciação, contudo, continua em debate. Alguns críticos definem ficção científica como o ramo da ficção fantástica ou não realista em que a diferença se encontra em um discurso materialista, científico, quer a ciência evocada esteja ou não em acordo estrito com a ciência que compreendemos hoje.”
Adam Roberts, A Verdadeira História da Ficção Científica
“Para ele [Heidegger], a tecnologia não é um instrumento, mas ‘um modo de conhecer, ‘um modo de revelar’ (...) em que a alétheia, a verdade, acontece’. Longe de ver a tecnologia como mera ‘prática da ciência’, Heidegger argumenta que a ciência é, de fato, uma função da tecnologia (...) Em outro ensaio (...) é famosa, mesmo notória, a declaração feita por Heidegger de que ‘a ciência não pensa’. O que ele quis dizer com isto (...) foi que a ciência não enquadra do modo como faz a tecnologia. A ficção científica, por outro lado, realmente pensa: não apenas no sentido de exercitar numerosos conceitos, possibilidades, dramas intelectuais e coisas semelhantes, mas no sentido mais profundo de enquadrar o mundo em termos textuais, apresentando as alternativas dele (...) [Portanto] a FC é mais bem definida como ficção tecnológica, desde que não encaremos tecnologia como sinônimo de engenhocas, mas, em sentido heideggeriano, como um modo de enquadrar o mundo, manifestação de uma perspectiva fundamentalmente filosófica.”
Adam Roberts, A Verdadeira História da Ficção Científica
CONTEXTO
“[A ficção científica] é um subgênero da FANTASIA no qual mundos ou acontecimentos improváveis recebem explicações científicas em vez de mágicas. A popularidade da ficção científica deve muito ao ritmo da mudança tecnológica no século XX e as emoções conflitantes decorrentes dela: de um lado, deslumbramento pelas possibilidades oferecidas, por outro, ansiedade acerca de um futuro incerto (...) Em si um produto do boom tecnológico do fim do século XIX, o cinema demonstrou desde cedo uma fascinação com o efeito provocado pela tecnologia no cotidiano. Não demorou também para que a habilidade do meio de criar novos mundos por meio de trucagens visuais fosse explorada em uma série de fantasias que conferiram à ciência e aos cientistas um papel central. No entanto, a ficção científica não tem uma história contínua de produção no cinema. Na verdade, o gênero teve uma série de picos, seja como resposta a algum novo fenômeno científico e social, ou estimulado pela evolução dos efeitos especiais cinematográficos. O primeiro pico de ficção científica aconteceu na virada do século, com a obra pioneira de George Méliès. Inspirado pelo trabalho de Verne e Wells, ele produziu inúmeros curtas-metragens sci-fi, incluindo as notáveis fantasias de viagem espacial Viagem à Lua (1902) e Viagem Através do Impossível (1904). O tema da viagem espacial é periodicamente recorrente nas décadas seguintes, sendo tratado com certo realismo no filme dinamarquês Himmelskibet (1918), no britânico The First Men in the Moon (1919) e em A Mulher na Lua (1929), de Fritz Lang. Este último filme era suficientemente próximo dos fatos científicos para que os nazistas o retirassem de circulação durante o programa V2.” 
Cassell Companion to Cinema
“Olhando em retrospecto, parece claro que a manifestação mais importante da FC visual é a do cinema; mas isso não era evidente à luz dos primeiros desdobramentos do gênero. Os primeiros filmes de FC foram excentricidades, curtas representações de bizarrices pantomímicas concebidas como diversão. Um dos primeiros é Viagem à Lua (1902), dirigido pelo pioneiro francês Georges Méliès. Exploradores lunares alcançam a Lua em uma espaçonave verneana lançada por um canhão e descobrem alienígenas insectoides wellsianos antes de voltar à Terra (Méliès reconheceu a influência tanto de Da Terra à Lua, de Verne, quanto de Os Primeiros Homens na Lua, de Wells). Há uma excentricidade um tanto forçada no filme, efeito colateral do passado de Méliès como ilusionista e prestidigitador: coristas com bermudas de babados carregam a espaçonave para o canhão; guarda-chuvas, plantados na superfície lunar, crescem e dão flores.Mas há traços compensatórios na imaginação visual. Em particular, a aterrissagem na Lua é mostrada a princípio – em uma imagem brilhantemente icônica – como um projétil que acerta o olho da face humana rechonchuda, repleta de crateras, da Lua. 
Essa imagem, ainda recorrente (isto é, passível de ser reconhecida por muitos até hoje) é para lá de eloquente: parece condensar uma série de pressupostos sobre a exploração da natureza do homem, e sobre a alteridade como uma compreensível singularidade, de maneira espirituosa e compacta. Há outro significado na imagem de Méliès. Ela simboliza de que modo o cinema de FC iria provocar seu maior impacto estético – como linguagem de impressionantes e belas imagens, antes que como um instrumento de (digamos) caráter narrativo, ou mesmo, em particular, de espetáculo. Os momentos fundamentais da FC do último meio século são, em essência, momentos poéticos: a ressonância e o mistério, assim como a beleza de uma imagem poética, é o que tornam brilhante (como era de esperar) o hominídeo atirando ao céu o osso que vai se transformar em espaçonave em 2001: uma Odisseia no Espaço, o céu repleto de estrelas do parágrafo final de O Cair da Noite, de Isaac Asimov; as desconcertantes crianças ‘alienígenas’ no filme A Aldeia dos Amaldiçoados, baseado no livro de John Wyndham, ou Carrie-Anne Moss congelada em um golpe de kung-fu em pleno ar, enquanto a câmera passeia com velocidade ao seu redor em Matrix, ou ainda os sinistros silêncios dos primeiros dois livros de The Years of Rice and Salt, de Kim Stanley Robinson. Há centenas de exemplos de FC da melhor qualidade, e todos funcionam com exatidão como o fazem as imagens poéticas. Algumas das imagens mais ressonantes e belas, no entanto, vêm do cinema de FC.”
Adam Roberts, A verdadeira história da ficção científica
 “É verdade, por certo, que as narrativas nos primórdios do cinema eram rudimentares; a ênfase estava antes no espetáculo, em proporcionar ao público impressionantes novidades visuais (...) Na segunda década do século XX, porém, as plateias tornaram-se mais exigentes. Na busca por histórias envolventes, os cineastas de FC voltaram-se para os clássicos em prosa do gênero como fonte para narrativas cinematográficas mais ambiciosas (...) Depois da Primeira Guerra Mundial, a narrativa cinematográfica tendeu a se encaixar em estruturas mais convencionais, mas os efeitos especiais e a estética visual de novidade e espetáculo que criou desenvolveram-se com rapidez.”
Adam Roberts, A verdadeira história da ficção científica
“O filme seguinte de Lang, A Mulher na Lua (1929), tem seus defensores, em particular para as primeiras seções, em que um foguete é montado e lançado para a Lua (parece que os nazistas mais tarde suprimiram o filme e destruíram os modelos de seus efeitos especiais, com medo de que isso revelasse os segredos do programa V2). A tripulação com destino à Lua espera encontrar outro lunar; há um passageiro clandestino e várias aventuras. Mas não há nada no filme que rivalize com o impacto icônico dos panoramas da cidade em Metropolis ou com a originalidade do robô Maria. Foi com esses momentos visuais, embora fossem não raro apenas minúsculas porções de narrativas visuais muito mais longas, que o cinema deu sua maior contribuição para a arte em desenvolvimento da FC.”
Adam Roberts, A verdadeira história da ficção científica
“O som alterou o modo como o cinema funcionava em mais do que apenas o sentido óbvio do caráter auditivo sendo acrescentado ao visual. Filmes mudos poderiam ser feitos e exibidos em qualquer país, com as legendas passando de uma língua para outra conforme necessário. O cinema sonoro, embora possa ser dublado ou provido de legendas, é muito menos portátil. Traz, em grau muito maior, a marca do país e da cultura que o produziu. Uma consequência para o cinema de FC foi que, dos anos 1930 em diante, os filmes mais importantes de ficção científica foram produzidos em países de língua inglesa. O bom cinema de FC também era feito, é claro, em outras línguas, mas em um século XX dominado pelo inglês, com frequência não conseguia atingir a penetração cultural do cinema anglófono.”
Adam Roberts, A verdadeira história da ficção científica
VIAGEM À LUA, METROPOLIS & KING KONG: OBRAS-PRIMAS DOS PRIMÓRDIOS 
“‘A pequena loja do imaginário... Jules Marey e os irmãos Lumière haviam sucessivamente criado o movimento. Méliès foi o primeiro a libertar as fadas’ (Paul Gilson). Viagem à Lua é, sem dúvida, a obra mais célebre de Georges Méliès (1861-1938), um modelo do gênero ‘féerico’ e o primeiro filme de ficção científica. Quando o realizou em seu ateliê de Montreuil-sous-Bois, Méliès estava no apogeu de sua carreira. Contemporâneo dos Irmãos Lumière e um de seus primeiros e entusiastas espectadores, esse homem de múltiplos talentos, herdeiro de Robert Houdin, cujo teatro comprara, especialista em ilusionismo, pirotecnia e mágicas de todo tipo, logo entreviu as possibilidades fantásticas (no pleno sentido da palavra) da nova invenção. Desprezando as vistas documentárias, opta pela gag burlesca, a narrativa fantasmagórica, a alucinação controlada. Seu tema favorito, que desenvolveu com paixão, é a viagem imaginária: na terra, nos mares, no ar, e para completar, ‘através do impossível’. Ele recheia essas viagens de todas as trucagens e efeitos possíveis, alguns já rodados no cenário, outros concebidos especialmente para a tela: superposições, fusões, parada da imagem, etc. Seu gênio está numa mistura rigorosa de precisão mecânica com invenção. Se Lumière é o Gutenberg do cinema, Méliès é o Fausto ou Cagliostro. Viagem à Lua inspira-se em Júlio Verne e H.G. Wells, talvez também numa opereta de Offenbach do mesmo título.”
Claude Beylie, As Obras-Primas do Cinema
“Metropolis é com certeza o filme mais icônico de FC do período anterior à guerra. É ambientado na cidade futurista do título, dividida na vertical entre os trabalhadores (que labutam em fábricas subterrâneas) e a classe dominante (que vive no topo dos gigantescos arranha-céus e se exercita em ensolarados campos olímpicos) (...) Não é a história rudimentar e ideologicamente ingênua que faz dele um grande filme. É verdade que Metropolis foi editado com severidade para distribuição nos Estados Unidos, e a versão mutilada sem dúvida faz menos sentido narrativo que a versão mais longa, que havia estreado em Berlim. Ainda assim, a versão mais longa – e transformada em novela pela esposa de Lang, Thea von Harbou – é mal articulada e fatalmente esquemática. Os governantes representam ‘a cabeça’ e os trabalhadores, ‘a mão’, e com uma banalidade de tirar o fôlego as cenas finais tentam nos convencer de que a moral do filme é que ‘cabeça e mão têm de trabalhar juntas, e não lutar uma contra a outra’. Se Lang tivesse de fato conseguido dramatizar um clichê tão tolo, sem dúvida o filme teria sido merecidamente esquecido. Mas algo interessante entra em cena. Metropolis em si é um espaço urbano futurista, embora Rotwang more em uma antiga mansão gótica e lute com Fredersen no telhado de uma catedral medieval. O filme não apresenta justificativa para esses estilos visuais conflitantes; na verdade, é possível argumentar que a justaposição perturbadora seja parte da proposta do filme. A justaposição fundamental do filme é o humano e a máquina.”
Adam Roberts, A verdadeira história da ficção científica
“Babel ópera... criação de um espírito visionário, alimentado por obras de ficção científica e uma generosa utopia, Metropolis anuncia e, ao mesmo tempo, denuncia as estruturas e as contradições da sociedade-campo de concentração (...) 1925 marca o apogeu do cinema expressionista alemão. Num país às voltas com crises políticas, com a inflação e o desemprego, a criação artística é rainha. Caligari, O Golem, Nosferatu e o ciclo dos Nibelungos esgotaram o veio dos monstros do pesadelo e dos heróis de lenda. É na vida contemporânea, no próprio âmago do sistema social, que cumpre buscar agora o eco dos fantasmas de um povo desnorteado. A audácia – e o gênio – de FritzLang (1890-1976) está em ter sido capaz de oferecer, de Metropolis a M, o Vampiro de Düsseldorf, o espetáculo alucinante deste mal moderno e de seu antídoto, contrabalanceando a vertigem de Babel com a inspeção das camadas inferiores da sociedade. Sua formação de arquiteto o predispunha a essa visão futurista e apocalíptica. A descoberta dos arranha-céus e o do taylorismo americanos, combinada com o gosto por um estética ‘construtivista’ e com a consciência de que o clima social tornava-se cada vez mais pesado, proporcionar-lhe-ão o impulso decisivo. Sua companheira, Thea von Harbou, escreverá o roteiro de Metropolis inspirando-se em narrativas de ficção científica de H.G. Wells, Júlio Verne e Villiers e l’Isle-Adam. Lang lançará mão de tudo (construção de cenários imensos, hábil utilização de maquetes, enorme quantidade de figurantes, quase um ano de filmagem) para dar corpo a essa utopia grandiosa, a esse ‘sonho de pedra’ que podemos considerar tanto um hino como um desafio à ideologia totalitária. Há nele, sem dúvida, um duplo movimento de fascínio e repulsão, que a ambiguidade da mensagem final, ao tentar reconciliar a arbitrariedade do poder com as exigências da justiça social, não consegue dirimir. Lang estava plenamente consciente disso: ‘A conclusão é falsa, já não a aceitava quando realizei o filme’, declara em 1959 aos Cahiers du Cinéma. Ele modera essa opinião em 1971: ‘Thea von Harbou imaginara que o mediador entre o cérebro dirigente e a mão executora podia ser o coração. Isso me parecia, então, pueril, utópico. Percebo, porém, que a juventude das universidades tende para essa solução.’ Metropolis, filme nazista ou progressista? Ainda não se chegou a uma conclusão. Em todo caso, Hitler e Goebbels fizeram dele seu filme de cabeceira e talvez tenham encontrado nele a ideia da edificação de campos de concentração e da ‘solução final’ (note-se a estrela amarela pintada na porta de Rotwang). Georges Sadoul relata que um prisioneiro de Mauthausen perguntou, em 1943, a um de seus companheiros de cativeiro que trabalhava na construção de uma imensa escadaria que não levava a parte alguma: ‘Você se lembra de Metropolis?’. Resta o admirável êxito plástico do filme. O passo lento dos homens na cidade subterrânea, a geometria impecável dos movimentos da multidão, contrastando com a confusão final, também perfeitamente organizada, toda essa profusão e esse domínio das formas, tendo no topo do edifício o rosto de Brigitte Helm, fazem de Metropolis um dos pontos culminantes da arte muda, que devemos colocar ao lado de Intolerância, de Griffith, e, sem dúvida, acima de Eisenstein.”
Claude Beylie, As Obras-Primas do Cinema
“A besta humana... obra-prima de efeitos especiais, digna de Méliès, King Kong assusta – e fascina – como o ogro da fábula, ao mesmo tempo que mergulha profundamente suas raízes no inconsciente coletivo americano (...) King Kong é uma metamorfose, amplificada, de Tarzan, o homem-macaco, cruzado com o mito da Bela e a Fera. Também pode-se ver no filme o eco, em forma de exorcismo, dos pesadelos que atormentam uma sociedade em pleno crescimento: a ilha dos monstros corresponde à selva das cidades; os picos rochosos aos arranha-céus. Aliás, o pobre animal se engana com eles. Acrescentemos as referências explícitas ao show business, notadamente ao cinema. Há como que uma ‘estrutura especular’, a história da carochinha torna-se reflexão sobre o espetáculo. King Kong também é uma proeza técnica, que necessitou de mais de um ano de filmagem, um orçamento tão colossal quanto seu herói (750 mil dólares) e um complexo sistema de marionetes articuladas – pois, evidentemente, não há nenhum ator ou animal sob a pele do macaco. Tudo é feito com maquetes, executadas por um mestre modelista: Willis O’Brien. O sucesso foi tamanho, que engendrou toda uma série de subprodutos, quase todos medíocres, até uma refilmagem em 1976 por Dino de Laurentiis. Quanto a um dos artífices do empreendimento, o industrioso Ernest Beaumont Schoedsack (nascido em 1893), ele fez uma bela dobradinha filmando no mesmo ano outro clássico do fantástico, Zaroff, o caçador de vidas.”
Claude Beylie, As Obras-Primas do Cinema
FILMOGRAFIA BÁSICA SUGERIDA
1902 – Viagem à Lua (Le voyage dans la Lune), de Georges Méliès
1903 – A Message from Mars, de Franklyn Barrett
1904 – Viagem Através do Impossível (Le voyage à travers l’impossible), de Georges Méliès
1910 – Frankenstein, de J. Searle Dawley
1912 – A Conquista do Polo (À la conquête du pôle), de Georges Méliès 
1913 – A Message from Mars, de Wallett Waller
1916 – Homunculus, de Otto Rippert
1918 – Himmelskibet, de Holger-Madsen
1920 – Algol – Tragödie der Macht, de Hank Werckmeister
1920 – The Invisible Ray, de Harry A. Pollard
1920 – O Médico e o Monstro (Dr. Jekyll and Mr. Hyde), de John S. Robertson
1921 – O Homem Mecânico (L’uomo meccanico), de André Deed
1921 – A Message from Mars, de Maxwell Karger
1922 – Radio-Mania, de Roy William Neill
1924 – The Last Man on Earth, de John G. Blystone
1924 – Aelita – A Rainha de Marte (Aelita), de Yakov Protazanov
1924 – Paris Adormecida (Paris qui dort), de René Clair
1925 – O Mundo Perdido (The Lost World), de Harry O. Hoyt
1927 – Metropolis (Idem), de Fritz Lang
1928 – Alraune, de Henrik Galeen
1929 – High Treason, de Maurice Elvey
1929 – A Mulher na Lua (Frau im Mond), de Fritz Lang
1930 – Fantasias de 1980 (Just Imagine)
1931 – O Fim do Mundo (La fin du monde), de Abel Gance
1931 – Frankenstein (Idem), de James Whale
1932 – A Ilha das Almas Selvagens (Island of Lost Souls), de Erle C. Kenton
1932 – O Vampiro (The Vampire Bat), de Frank R. Strayer
1932 – O Monstro (Doctor X), de Michael Curtiz
1933 – Os Crimes do Museu (The Mystery of the Wax Museum), de Michael Curtiz
1934 – O Gato Preto (The Black Cat), de Edgar G Ulmer
1933 – King Kong (Idem), de Merian C. Cooper, Ernest B. Schoedsack
1933 – O Homem Invisível (The Invisible Man), de James Whale
1933 – Lição ao Mundo (Men Must Fight), de Edgar Selwyn
1933 – O Homem que Ficou para Semente (It’s Great to Be Alive), de Alfred L. Werker
1934 – Ouro (Gold), de Karl Hartl
1935 – A Noiva de Frankenstein (Bride of Frankenstein), de James Whale
1935 – Dr. Gogol – O Médico Louco (Mad Love), de Karl Freund
1935 – O Império dos Fantasmas (The Phantom Empire), de Otto Brower, B. Reeves Eason
1935 – Túnel Transatlântico (Transatlantic Tunnel), de Maurice Elvey
1936 – Daqui a Cem Anos (Things to Come), de William Cameron Menzies
1936 – O Poder Invisível (The Invisible Ray), de Lambert Hillyer
1936 – A Boneca do Diabo (The Devil Doll), de Tod Browning
1936 – Flash Gordon: Space Soldiers (Flash Gordon), de Frederick Stephani, Ray Taylor
1938 – Flash Gordon no Planeta Marte (Flash Gordon’s Trip to Mars), de Ford Beebe e outros
1938 – Mars Attacks the World, de Ford Beebe, Robert F. Hill
1939 – Buck Rogers (Idem), de Ford Beebe, Saul A. Goodkind
1939 – Sombra Destemida (The Phantom Creeps), de Ford Beebe, Saul A. Goodkind
1939 – O Homem Imortal (The Man They Could Not Hang), de Nick Grinde
1940 – O Delírio de um Sábio (Doctor Cyclops), de Ernest B. Schoedsack
1940 – Flash Gordon Conquista o Universo (Flash Gordon Conquers the Universe, seriado)
1941 – A Bela e o Monstro (The Monster and the Girl), de Stuart Heisler
1944 – A Dama e o Monstro (The Lady and the Monster), de George Sherman

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