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Auditoria e Investigação de Fraudes Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof. Me. Rodrigo de Souza Marin Revisão Textual: Prof. Me. Luciano Vieira Francisco Prevenção de Fraude Financeira • Introdução; • Origem e Fases da Lavagem; • Tipo Subjetivo do Delito de Lavagem de Capitais; • Setores Econômicos Utilizados pelos Lavadores – Tendências Atuais; • Excurso: a Autoria e a Participação no Delito de Lavagem de Dinheiro no Brasil; • Formas de Participação – Instigação e Cumplicidade. · Manipulação dos dados utilizado mongoDB. OBJETIVO DE APRENDIZADO Prevenção de Fraude Financeira Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como seu “momento do estudo”; Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo; No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você também encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados; Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus- são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e de se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE Introdução Vivemos uma intensa realidade de atos aéticos e desonestos e, graças à agilidade da comunicação, essas ações se tornaram de conhecimento público. Costumes e bons princípios têm sido atacados por todos os lados e a tecnologia contábil não foge desta realidade. Seu uso inadequado e criminoso ilude a opinião de terceiros e recruta cada vez mais adeptos. Tanto na esfera política quanto na empresarial, realizam-se operações devassas em que a soma de dinheiro envolvido atinge proporções incalculáveis. Por exemplo, segundo matéria veiculada no caderno de economia do jornal O Estado de São Paulo, em 2003, calcula-se que cerca de 5% do produto interno bruto mundial, a cada ano, refere-se ao valor de dinheiro circulante nas esferas da corrupção. Para o grupo que possui poder de decisão e comando, a fraude tem sido um negócio lucrativo e até as camadas inferiores das administrações têm se contaminado com essa prática. Assim, cientistas e tecnólogos da Contabilidade têm demonstrado interesse pelo estudo da fraude como veículo de corrupção, a fim de combatê-la de forma veemente e completa. Importante! Tudo o que envolve a desonestidade e a falta de caráter é intitulado de corrupção, ou o ato ou efeito de corromper. Importante! Origem e Fases da Lavagem A lavagem de dinheiro não apresenta um conceito único. Para que haja a definição de crime, utilizam-se as caracterizações do processo. A delimitação do delito, bem como a sua análise serve para que os desdobramentos do crime de lavagem de dinheiro sejam contidos, tratados e punidos adequadamente. Origem da Lavagem de Dinheiro Com o crescimento da atividade mercantil, o sistema de trocas apresentava certa incompatibilidade com relação às necessidades de consumo pessoais e, com isso, surgiu o dinheiro. 8 9 Existem momentos específicos em que o sistema de troca de mercadorias é utilizado; isso se dá quando ocorre uma interrupção do sistema financeiro. Na Segunda Guerra Mundial, por exemplo, cigarros, chocolates e chicletes passaram a ser moedas valiosas entre os soldados. Atualmente, com o cyberspace, um mercado totalmente novo está em formação, no qual todas as moedas operam simultaneamente, o que dificulta a fiscalização dos governos nacionais. Com isso, os lavadores de dinheiro trabalham com facilidade e, graças à Revo- lução Monetária introduzida pela internet, o delito se torna mundial, pois perde as fronteiras como limite. Embora a expressão “lavagem de dinheiro” tenha uma origem recente, a sua prá- tica parece ser antiga, remontando às ações dos piratas na Idade Média, os quais procuravam desvincular os recursos provenientes do crime das atividades delinquentes responsáveis por esses recursos. A teoria predominante acerca da origem da expressão nos leva à década de 1920, nos Estados Unidos, época em que os gângsteres norte-americanos se utilizavam de lavanderias para ocultar o dinheiro provindo da atividade ilícita, como a venda de bebidas alcoólicas ilegais. Em meados da década de 1970, passou-se a investigar o tráfico de drogas e como a lavagem de dinheiro acontecia. Conforme Tondini (2009), a expressão “lavagem de dinheiro” foi judicializada em 1982, quando os Estados Unidos apreenderam dinheiro advindo do contrabando de cocaína colombiana. (TONDINI, 2008) Por se tratar de um delito interfronteiriço, os narcotraficantes são obrigados a utili- zar-se de um mecanismo que dê aparência de licitude aos seus ganhos. A inserção desse dinheiro no mercado financeiro é dificultada devido ao volume financeiro, já que as operações geralmente acontecem nas ruas, em papel-moeda e em notas de valor reduzido. Atualmente, com o desenvolvimento acelerado da economia e a dinamização dos investimentos, o controle sobre as operações financeiras é mais difícil, de modo que uma reciclagem constante nos métodos de fiscalização se torna imprescindível. Conceito de “Lavagem de Dinheiro” No Brasil, a expressão utilizada para definir o delito é “lavagem de dinheiro”. A palavra lavar vem do latim lavare e significa expurgar, purificar, reabilitar, daí a ideia de tornar lícito o dinheiro advindo de atividades ilegais. 9 UNIDADE Eis uma lista de países e expressões equivalentes à lavagem de dinheiro, informações estas compiladas por (Silva, 2001): • Portugal – branqueamento de capitais; • Espanha – blanqueo de capitales; • França – blanchiment d’argent; • Estados Unidos – money laundering; • Argentina – lavado de dinero; • Colômbia – lavado de ativos; • Alemanha – Geldwache; • Suíça – blanchiment d’argent; • Itália – riciclaggio di denaro; • México – encubrimiento y operaciones com recursos de procedencia ilícita. Ex pl or Vejamos também a definição de lavagem de dinheiro para os seguintes teóricos: O delito de lavagem envolve atos que almejam a reintrodu- ção de benefícios obtidos por meio de atividades ilícitas ao sistema financeiro, de forma que seja impossível questionar juridicamente sua origem (DÉZ RIPOLLÉS, [2012]). A lavagem de capitais pode ser definida como o processo em que virtude do qual os bens de origem ilícita são integrados ao sistema eco- nômico legal com aparência de haverem sido obtidos de forma lícita (BLANCO CORDERO, [2013]). O conceito básico de lavagem de dinheiro caracteriza-se pelo ato ou a sequência de atos praticados para mascarar a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, valo- res e direitos de origem delitiva ou contravencional, ou seja, significa dissimular sua origem a fim de lhes atribuirimagem lícita diante da sociedade e economia (BADARÓ; BOTTINI, 2016). Pode ser considerado o processo de introdução ao sistema financeiro do produto resultante dos delitos antecedentes (RIOS, 2010). Cuida-se de ocultar (esconder) ou dissimular (encobrir) a natureza (a essência, a substância, as características estruturais ou a matéria), ori- gem (procedência, lugar de onde veio ou processo através do qual foi obtido), localização (a situação atual, o local de onde se encontra), dis- posição (qualquer forma de utilização onerosa ou gratuita), movimen- tação (no sentido de aplicação; da circulação, especialmente financeira ou bancária, ou, também, de deslocamento físico de bens móveis) ou propriedade (domínio, poder sobre a coisa, titularidade, qualidade le- gal ou fática de dono) de bens, direitos e valores (objetos materiais do crime) (MAIA, 2004, grifos do autor). 10 11 A lavagem de dinheiro pode ser definida por uma pluralidade de com- portamentos geralmente intrincados e fracionados, direcionados à conversão de valores e bens ilícitos em capitais lícitos e plenamente disponíveis por seus titulares (OLIVEIRA, [1998]). O conjunto de operações comerciais e financeiras que buscam a in- corporação, na economia de cada país, de modo transitório ou per- manente, de recursos, bens e valores de origem ilícita para dar-lhe aparência legal (BARROS, [2007]). A “limpeza” de importâncias ilegais para disfarçar a origem criminosa delas, permitindo seu trânsito pelo sistema financeiro com a aparência de serem legítimas (OLIVER, [2006]). A lavagem de dinheiro consiste na inserção de recurso de procedên- cia ilícita na economia formal mediada pelo Estado, com aparência de licitude (mediante condutas de “ocultação” ou de “dissimulação”) (SCHMIDT, [2015]). A lavagem caracteriza-se por todos os atos que tenham como objetivo encobrir a origem ilícita dos bens, ou seja, um método destinado a escamotear os valores adquiridos pelo empreendimento de determina- das atividades criminosas, com o escopo de viabilizar a real utilização destes proventos (LIMA, [2014]). Assim como todo crime econômico, a lavagem deve ser vista como um negócio que visa gerar lucro, mas que também tem custos devido à sua natureza. Nesse sentido, conceitua o delito como o processo que legitima o capital espúrio a ser utilizado licitamente, não sem perdas inevitáveis em razão do custo de produção das operações desse negó- cio (DE CARLI, [2008]). A lavagem de dinheiro é caracterizada pela desvinculação ou afasta- mento do dinheiro da sua origem ilícita para que possa ser aproveitado. O que fundamentou a criação desse tipo penal é que o sujeito que co- mete esse tipo de crime, que se traduz num proveito econômico, tem que disfarçar a origem desse dinheiro, ou seja, desvincular o dinheiro da sua origem criminosa e conferir-lhe uma aparência lícita a fim de poder aproveitar os ganhos ilícitos, considerado que o móvel de tais crimes é justamente a acumulação material (BALTAZAR JÚNIOR, [2006]). Por sua vez, os organismos internacionais têm definições próprias do crime: Qualquer ato ou tentativa de ocultar ou mascarar a obtenção ilícita, de forma que aparente ter sido originado de fontes legítimas (INTERNATIONAL POLICE ORGANIZATION, [2011]). Entre os doutrinadores brasileiros não há grandes discussões acerca de conceituação do delito de lavagem, dado que a definição do tema está vinculada à tipicidade penal inscrita no Artigo 1º, caput, da Lei n.º 9.613/98. A conduta referida no mencionado 11 UNIDADE Artigo consiste na ocultação ou dissimulação da natureza, origem, localização, dispo- sição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores oriundos, direta ou indiretamente, da infração penal. Tipo Subjetivo do Delito de Lavagem de Capitais “O delito de lavagem de dinheiro é de tipo subjetivo exclusivamente doloso, restando afastada qualquer hipótese de punição por culpa” (BADARÓ; BOTTINI, 2016). Importa dizer que o ordenamento jurídico brasileiro não admite responsabilidade penal objetiva em matéria de lavagem, configurando relevante garantia de imputação subjetiva que somente permitirá a responsabilização de agente que possua “relação psíquica” com os eventos do caso concreto (BADARÓ; BOTTINI, 2016). Características da Lavagem Atualmente, os criminosos buscam regiões mais improváveis para realizar a lava- gem, onde o controle é escasso e a possibilidade de firmar novas alianças ilegais é maior. Por exemplo, em fevereiro de 2012 o Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI) – Financial Action Task Force (FATF) – pesquisou e relacionou os países com maior índice de problemas quanto à facilidade de lavagem de dinheiro: Cuba, Etiópia, Bolívia e Indonésia. Assim, percebe-se que a globalização desempenha importante papel na transnacionalização do delito de lavagem. Importante! Que o GAFI/FATF desenvolve ações entre os governos para implementar políticas de prevenção da lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo? Você Sabia? 12 13 Ademais, as características do processo de lavagem de dinheiro são as seguintes: • Internacionalização das atividades de lavagem; • Profissionalização do trabalho; • Vocação de permanência; • Complexidade ou variedade dos métodos empregados; • Volume do fenômeno; • Conexão entre redes criminais. Fases da Lavagem de Dinheiro Ocultação ou Colocação: Esta é a fase inicial da lavagem, momento em que os criminosos pretendem fazer desaparecer as grandes somas que suas atividades ilegais geraram, separando os ativos da ilegalidade. Durante a colocação, os delinquentes estão mais vulneráveis; eis que as autoridades estão focadas nesse movimento financeiro inicial, quando muito dinheiro é convertido, facilitando a descoberta (TONDINI, 2009). Os principais canais de vazão aos capitais são: • Instituições financeiras tradicionais: » Fracionamento; » Cumplicidade da instituição financeira. • Instituições financeiras não tradicionais: » Cassinos ou estabelecimentos de jogos; » Falsas faturas de importação/exportação; » Comércio cruzado; » Sistemas bancários subterrâneos ou irregulares; » Compra ou estabelecimento de companhias privadas; » “Atividades de caixa”; » Evasão de fronteiras/contrabando de dinheiro; » Empresas lícitas com fundos ilícitos. Estratificação ou Escurecimento: Já inserido no mercado, o capital deve perder qualquer marca de ilicitude – daí o nome da fase, chamada também de doutrina de mascaramento (CALLEGARI, 2008). É importante dar agora a aparência de licitude – eis que esta fase é denominada dissimulação: “Disfarçar a origem ilícita e dificultar a reconstrução pelas agências estatais de controle e repressão da trilha de papel (paper trail)” (MAIA, 2004). 13 UNIDADE A fase de ocultação é a que apresenta maior facilidade de ser descoberta pelas autoridades. Depois dessa, os criminosos, por meio de complexas operações, tentam afastar de forma definitiva o dinheiro das atividades ilícitas que o originaram. Integração ou Reinversão: É a última etapa do processo de lavagem de dinheiro, onde o dinheiro proveniente de atividades ilícitas é utilizado em operações financeiras, dan- do a aparência de operações legítimas. Durante esta etapa são realizadas inversões de negócios, empréstimos a indivíduos, compram-se bens e todo o tipo de transação através de registros contábeis e tributários, os quais jus- tificam o capital de forma legal, dificultando o controle contábil e financeiro. Aqui, o dinheiro é colocado novamente na economia, com aparência de legalidade (TONDINI, 2009). Setores Econômicos Utilizados pelos Lavadores – Tendências Atuais A lavagem de dinheiro utiliza-se de métodos legais, a saber: • Transferências bancárias; • Compra e venda de objetos de luxo; • Depósitos fracionados etc. O que torna a operação ilegal é o intuito de ocultar e dissimular os frutos diretos ou indiretos de um crime. Assim, as operações passam a ser condenáveis e objetosde persecução penal. Há diversos métodos de lavagem considerados “tradicionais”. A lista a seguir é de se- tores ainda frágeis, de acordo com o GAFI/FATF, porém, já utilizados pelos criminosos. Lavagem de dinheiro no setor imobiliário: As variações de preços são frequentes neste setor e podem ser utilizadas para reinjetar os capitais lavados na economia. Assim, um belo imóvel pode ser adquirido por uma sociedade de fachada e os fundos produtos desta venda são considerados como fundos legais obtidos da venda de um imóvel (PASTOR; PALACIOS, 1998). 14 15 Lavagem no setor futebolístico: De acordo com o relatório publicado pela consultoria Binder Dijker Otte International (BDO): Os negócios do setor lidam com fluxos de caixa considerável e grandes interesses financeiros. Muitas das transações no setor envolvem grandes quantias de dinheiro, como por exemplo, no mercado de transferências. A concorrência é dura, tanto nacional como internacionalmente, e o desem- penho de um clube no campo também determina a sua posição financeira. Circuitos financeiros são múltiplos e globais, e os fluxos internacionais de dinheiro envolvidos podem fugir ao controle das federações e dos gover- nos. Muitas vezes, estes fluxos de dinheiro entram e saem dos paraísos fiscais ou envolvem vários países. Para o GAFI/FATF os esportes são vulneráveis por quatro razões principais: 1. Falta de regulamentação do setor; 2. Internacionalização do fenômeno futebolístico e intercâmbio de atletas; 3. Subjetividade dos preços e altas somas envolvidas; 4. Problemas financeiros dos clubes e necessidade de grandes investimentos. Lavagem pelos novos meios de pagamento: O comércio e as instituições bancárias têm demonstrado interesse na migra- ção do papel aos processos financeiros eletrônicos. Um dos principais benefí- cios dessa quebra de paradigma certamente é a inclusão financeira, que permi- tirá a expansão desse mercado e a criação de novos mecanismos de pagamento (THE WOLFSBERG GROUP, [2012]). Devido à sua contemporaneidade, esses novos métodos de pagamento exigem maior complexidade dos regulamentos atuais. Assim, é difícil precisar os riscos relacionados aos quais, fazendo com que a missão de criação de normas antilavagem seja árdua. Entre os novos métodos, dois apresentam ampla utilização em escala nacional: 1. Cartões pré-pagos; 2. Pagamentos via internet. 15 UNIDADE Sujeito Ativo O sujeito ativo do delito de lavagem de capitais pode ser, em princípio, qual- quer pessoa. É preciso, então, que se faça uma análise dos responsáveis pelo delito prévio para que se verifique se serão, ou não, sancionados como autores do posterior delito de lavagem de capitais. A Lei brasileira nada diz a respeito desse assunto. O preceito contido no Artigo 1º da Lei n.º 9.613/98, relativo à lavagem de dinheiro, é um delito comum, pois a modalidade contida no preceito pode ser realizada por qualquer pessoa, já que o preceito inicia com uma expressão anônima – “Ocultar ou dis- simular a natureza [...]” –, sem que o legislador tenha feito qualquer exigência expressa relativa ao sujeito ativo do delito (JESCHECK, [2002]; TERRA DE OLIVEIRA, [2002]). Excurso: a Autoria e a Participação no Delito de Lavagem de Dinheiro no Brasil Autoria O Artigo 29 do Código Penal não delimita o conceito de autoria, que pode abranger tanto a autoria como a participação, limitando-se a estabelecer uma forma de amplia- ção da figura típica. É necessário analisar os preceitos estabelecidos no Código Penal e na Lei de lavagem para se estabelecer a autoria no delito de lavagem de dinheiro previsto na Lei brasileira. O autor direto do delito de lavagem, em princípio, é quem realiza as atividades descritas no Artigo 1º da Lei n.º 9.613/98. Artigo 1º da Lei n.º 9.613/98 – aquele que oculta ou dissimula a natureza, origem, localização, disposição, movimento ou propriedade de bens, direitos ou valores, provenientes de infração penal; Art. 1º, § 1º da Lei nº 9.613/98 – quem, para ocultar ou dissimular a utilização de bens, direitos ou valores provenientes de infração penal, converte-os em ativos lícitos; adquire-os, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia, guarda, tem em depósito, movimenta ou transfere; importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos verdadeiros; Artigo 1º, Parágrafo 2º, I da Lei de lavagem – quem utiliza, na atividade econômica ou finan- ceira, bens, direitos ou valores provenientes de infração penal; Artigo 1º, Parágrafo 2º, II da Lei de lavagem – faz referência ao sujeito que participa de grupo, associação ou escritório, tendo conhecimento de que sua atividade principal ou secundária é di- rigida à prática de crimes previstos na Lei de lavagem. Ex pl or 16 17 Autoria Mediata No delito de lavagem de dinheiro previsto na Lei n.º 9.613/98, pode-se verificar a ocorrência da autoria mediata em várias hipóteses. Existem quatro casos de autoria mediata: 1. O erro determinado por terceiro; 2. A coação moral irresistível; 3. A obediência hierárquica; e 4. O caso do instrumento impune em virtude de condição ou qualidade pessoal. Coautoria O Código Penal brasileiro não estabelece expressamente o conceito de coautoria. Assim, utilizando-se dos conceitos doutrinários, leva-se em consideração quem são os autores e os partícipes na realização de um delito. Então, para se determinar a coautoria nos casos de lavagem de dinheiro, utiliza-se o conceito do domínio do fato. [...] a aplicação dos critérios do domínio do fato e a inclusão do organi- zador ou chefe como coautor nos casos de lavagem de dinheiro é impor- tante, pois uma das características do delito de lavagem é a sua realização por meio de grandes organizações internacionais. Também no Brasil essa característica de organização do delito de lavagem coloca a questão da responsabilidade que corresponde àquele que, pertencendo a um grupo hierarquicamente organizado, procede à realização do delito de lavagem no marco de um plano delitivo (BLANCO CORDERO, [2012]). A autoria do chefe ou organizador está fundada no domínio funcional do fato e subsiste sempre que também tiver esse domínio. Conclui-se, portanto, que, nos casos de lavagem de dinheiro, o chefe da organização será coautor, ainda que se encontre ausente no momento da execução, desde que também tenha o domínio do fato. Participação: consiste na livre e dolosa colaboração no delito de outro. Essa forma de colabo- ração no delito alheio pressupõe que o partícipe não tenha, de nenhuma forma, o domínio do fato, ou que não tenha realizado a ação típica (BATISTA, [2012]). Ex pl or 17 UNIDADE Formas de Participação – Instigação e Cumplicidade A Doutrina recolhe do Artigo 31 do Código Penal – ajuste, determinação ou instigação e o auxílio – os tipos de participação, ainda que majoritariamente se faça menção apenas à instigação e cumplicidade. Instigação: Este tema tem relevância nos casos de lavagem de dinheiro, pois tal delito está co- mumente relacionado a organizações criminosas que se utilizam de meios fraudulen- tos para que seus ganhos provindos de comportamentos delitivos tenham aparência de legalidade. Importante! A instigação é a dolosa colaboração de ordem espiritual, objetivando a comissão do crime doloso. Abarca também a determinação, que significa a conduta daquele que faz surgir na mente do autor direto a resolução de cometer o crime. Assim, o instigador é quem faz surgir na outra pessoa a resolução de executar dolosamente uma conduta típica e antijurídica (BATISTA, [2012]). Trocando ideias... Cumplicidade: É a dolosa colaboração de ordem material que objetiva a comissão de um crime doloso. Nos casos em que a participação é de natureza psíquica – sem a entrega de ne- nhum material – ocorre a instigação. A cumplicidade material ocorre quando a ajuda é realizada antes ou durante a execução do delito, sem que o partícipe tenha domínio da situação. Se a ajuda ocorrer após a execução, o delito tipificado é outro. Ademais,a participação de menor importância é aquela cuja contribuição moral ou material foi pequena. Em tais situações, cabe ao juiz verificar a gravidade da parti- cipação. Em muitos casos, esse tipo de participação é a cumplicidade que ocorre de forma secundária, dispensável, insignificante ou mínima. 18 19 Quanto à amplitude do conceito de participação da Lei de lavagem, o Parágrafo 2º do Artigo 1º da Lei n.º 9.613/98 estabelece que incorre na mesma pena do delito previsto no Caput do Artigo 1º quem: “II – participa de grupo, associação ou escri- tório tendo conhecimento de que sua atividade principal ou secundária é dirigida à prática de crimes previstos nesta Lei”. O dispositivo próprio criado pelo legislador brasileiro para incriminar as pessoas que se vinculam, de alguma forma, ao delito de lavagem de dinheiro apresenta, de forma extremamente ampla e genérica, os tipos de condutas impróprias previstas que se definem como desrespeitosas em relação aos princípios de ética e honestidade. A interpretação desse dispositivo deve ser realizada seguindo os mesmos requisi- tos tradicionais do concurso de pessoas. Assim, para que alguém seja considerado partícipe, é necessário que, além de conhecimento de que participa do grupo, asso- ciação ou escritório destinado à lavagem, possua vínculo com os demais lavadores e tenha contribuído para o resultado de forma efetiva. É imprescindível a análise específica da participação delitiva e a punição dos sujeitos que concorrem para o delito de lavagem de dinheiro. Tal análise deve ocorrer como consequência da verificação das formas de intervenção delitiva e dos preceitos que as regulam no Código Penal. Conclui-se, portanto, que, diante da amplitude do tipo penal, a interpretação deve ocorrer de forma restrita, para que se evite o cometimento de injustiças. 19 UNIDADE Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Sites A Lavagem de Dinheiro e o Profissional da Contabilidade https://goo.gl/oSTqnf Lavagem de Dinheiro e a Responsabilidade do Contador https://goo.gl/bjXif4 Vídeos Aula 09 - Leis Penais Especiais - Lei de Lavagem de Dinheiro - Lei 9.613/98 - Parte 01/02 https://youtu.be/of-ABr6MA3M Você sabe o que é “Lavagem de Dinheiro”? https://youtu.be/fDLYbqiLl0A 20 21 Referências BADARÓ, G. H.; BOTTINI, P. C. Lavagem de dinheiro. Aspectos penais e processuais penais. Comentários à Lei n.º 9.613/98, com alterações da Lei n.º 12.683/2012. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Crimes Federais: contra a administração pública, a previdência social, a ordem tributária, o sistema financeiro nacional, as telecomu- nicações e as licitações, estelionato, moeda falsa, abuso de autoridade, trafico inter- nacional de drogas, lavagem de dinheiro. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2006. BARROS, Marcos Antonio. Lavagem de capitais e obrigações civis correlatas com comentários, artigo por artigo, à lei 9.614/98. 2. Ed. Ver. E ampl. São Pau- lo: Revista dos Tribunais, 2007. BDO BRASIL. Indústria do esporte: finanças dos clubes de futebol do Brasil em 2010. São Paulo, 2010. Disponível em: http://www.bdobrazil.com.br/pt/analises/ esporte/Finanças%20dos%20Clubes%20Brasileiros.pdf. Acesso em: 22 ago. 2012. BLANCO CORDERO, I1,sidoro. El delito de blanqueo de capitales. Pamplona: Thomson Reuters, 2012, p. 517.), BOTTINI, Pierpaolo Cruz. A. cegueira deliberada no julgamento da ação Penal 470. Consultor Jurídico, 30 jul. 2013 BOTTINI, Pierpaolo Cruz. 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