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ISBN (versão impressa) 978-85-69215-02-8 1a edição, 2017 Proibida a reprodução, gravação ou armazenamento total ou parcial desta obra, em sistemas eletrônicos, fotocopiada, reproduzida por meios mecânicos e/ou outros quaisquer, sem autorização prévia, por escrito do autor. (Lei 9.610 de 19/02/1998). Editor: Rodrigo Bibo de Aquino Transcrição: Joaquim Avelino Revisão: Adalberto Nunes João Guilherme S. dos Anjos (Box95) Adaptação para e-book: Josué de Oliveira Capa: Guilherme Gontijo (Box95) Esta edição foi feita pela Box95, em parceria com a BTBooks, especialmente para você, associado da Box95, com muito carinho. SUMÁRIO Apresentação Introdução 1. O que Jesus exige de seus seguidores 2. Religiosidade e cristianismo 3. A impureza e o chamado para a santidade 4. Nossas palavras revelam quem nós somos 5. Um irmão em Cristo me deu prejuízo: e agora? Epílogo APRESENTAÇÃO Uma das mensagens da Reforma Protestante é o retorno às Escrituras Sagradas. Representada pelo sola scriptura, a mensagem é que somente a Bíblia é nosso guia de fé e prática, infalível e inerrante. Neste ano em que se comemora os 500 anos desde que Lutero pregou suas teses na porta da igreja do castelo de Wittenberg e iniciou uma revolução, essas informações já não são tão novas para muitas pessoas. Porém, não basta aprender que não aceitamos qualquer outro texto como sendo inspirado, não basta vociferar que nada que o homem diz, ontem ou hoje, tem mais peso que a Palavra de Deus. É preciso mais. Deus nos chama a vivermos o que está registrado no seu livro sagrado. Nosso padrão de comportamento ético não pode estar além nem aquém do que Deus nos revela em sua Palavra. Qualquer rigidez moral que sobrepuja a Bíblia redunda em legalismo, qualquer frouxidão redunda em liberalismo, senão libertinagem. Dizer sim ao chamado de Deus de sermos santos porque ele é santo é desafiador e, para buscar a santidade de forma genuína, é imprescindível viver o sola scriptura, ou seja, não basta negar outra autoridade que não a bíblica, é preciso olhar para ela e perceber que não dá para ser como antes, não dá para viver segundo os padrões da nossa era. Essencialmente, pregar o sola scriptura implica em nadar contra a corrente, remar contra a maré, ir contra o fluxo. Neste livro, Augustus Nicodemus expõe com maestria cinco temas para quem quer ser, digamos, crente de verdade. E ser crente de verdade, hoje, na época de Jesus ou nos dias da reforma, é caminhar no sentido contrário, é ir contra o fluxo. Afinal, amar Cristo sobre todas as coisas importará em negação das próprias paixões, perda de amigos ou família, poderá trazer sofrimento. Mas ser cristão sem amar Cristo não é ser cristão. E amar Cristo sem ir contra o fluxo do mundo é impossível. Seja crente de verdade, entenda o que Jesus exige de seus seguidores. Cuidado! Entender errado o que é ser crente de verdade poderá te levar a um comportamento farisaico, o qual é mais religiosidade do que cristianismo de verdade, por isso, observe bem o segundo capítulo deste livro para não incorrer no mesmo erro dos fariseus e dos clérigos católicos do século 16, que, apesar de bonitos por fora, tendo todas as regras decoradas de trás para frente, eram, na verdade, podres por dentro. Isso não é seguir Jesus. O verdadeiro seguidor de Cristo que anda contra o fluxo vê a si próprio como o pior dos pecadores e clama incessantemente pela graça, para ter diariamente o coração moldado ao caráter de Cristo. Corações quebrantados buscam santidade invariavelmente. Não existe meio termo, não existe desculpa, nem contexto. E santidade não caminha com imoralidade. E imoralidade é mais ampla do que nossos corações pecaminosos querem interpretar. Como Nicodemus expõe no capítulo três, Deus exige de nós um padrão de comportamento sexual. Conforme nos ensina 1Ts 4.1-8, o viver que agrada a Deus envolve abstenção da imoralidade sexual, o que significa qualquer comportamento que atenda “a paixão de desejos desenfreados, como os pagãos que desconhecem a Deus” (v. 5). Seja crente de verdade. Em meio a tantas notícias de corrupção, de mentiras e dissimulações, ande contra o fluxo e deixe o Espírito Santo limpar seu coração para que suas palavras não denunciem seu interior corrompido, mas exibam um coração transformado pela graça de Deus. Sabe o que é mais bonito neste livro? O autor não tirou nada da sua própria cabeça. Ele simplesmente expôs a Palavra de Deus, nosso guia de fé e prática, pois uma importante herança da Reforma Protestante é esta: não pregaremos nada que não seja a Palavra de Deus, não pregaremos nada que não esteja na Palavra de Deus, não deixaremos nunca de pregar a Palavra de Deus. Que esta obra te inspire a buscar Jesus de todo o coração, a desenvolver seu caráter, a ir contra o fluxo. JOÃO GUILHERME E OLAVO BANDEIRA Brasília, outubro de 2017 INTRODUÇÃO Quando assumi o pastorado da Primeira Igreja Presbiteriana de Goiânia em agosto de 2014, decidi iniciar meu ministério ali pregando sermões que fossem úteis e relevantes para o maior número possível de pessoas que viessem a participar dos cultos da manhã e da noite. Como eu ainda não estava familiarizado com a igreja e sua membresia, escolhi temas que julguei que teriam uma aplicação prática para todos. Assim, preguei sobre as demandas de Jesus aos seus seguidores, os perigos da religiosidade, a necessidade de uma vida livre da imoralidade, o poder e o efeito das nossas palavras, quer para o bem, quer para o mal, e obviamente, sobre irmãos que causam prejuízo financeiro a outros. Essas mensagens foram muito abençoadas por Deus na vida da igreja. Depois, elas foram disponibilizadas na Internet e tiveram um alcance ainda maior. Agora, elas viraram o livro que o leitor tem em mãos. Acredito que a utilidade dessas mensagens é que elas tratam de assuntos que representam áreas constantes de conflito e luta na vida dos crentes em Jesus Cristo. Disciplina pessoal, piedade e vida devocional, santidade e pureza na área sexual, o emprego certo das palavras e os problemas na área financeira são temas recorrentes na vida da maioria dos cristãos. O objetivo deste livro é ajudá-los a encarar esses problemas e lidar com eles de maneira cristã. Acredito que a pregação expositiva é a melhor e mais eficaz maneira de pregar a Palavra de Deus. O que você tem em mãos, portanto, são exposições bíblicas de textos que considerei apropriados para tratar desses assuntos. Assim, leia este livro com sua Bíblia na mão. Minha oração é que Deus o use para abençoar sua vida como usou para abençoar aqueles que primeiro ouviram essas mensagens no templo da Primeira Igreja Presbiteriana de Goiânia. 1 O QUE JESUS EXIGE DE SEUS SEGUIDORES Texto-base: Mateus 10.34-391 Introdução Meu querido leitor, minha intenção neste capítulo, em primeiro lugar, é expor as demandas que o Senhor Jesus Cristo faz nessa passagem com relação aos seus seguidores. Em segundo, chamá-los à submissão plena e completa à pessoa de Jesus Cristo, o Filho de Deus. Acredito que nem sempre entendemos o que significa ser cristão. O pecado afetou toda a raça humana e o indivíduo como um todo de tal maneira que não existe uma solução parcial ou indolor, por assim dizer, para o problema causado por ele. A solução de Deus é extremamente radical, e Cristo, aqui, apresenta-a de maneira clara. As demandas que ele faz para as pessoas que se dizem cristãs ou que querem segui-lo são demandas extremamente radicais. Creio que, às vezes, não estamos entendendo isso. Pensamos, ocasionalmente, que ser um cristão evangélico é uma opção que fazemos entre tantas tradições religiosas. E é bem verdade que essa escolha é feita sem que nós tenhamos ideia do que representa, de fato, ser um seguidor de Jesus Cristo. Penso que, se entendêssemos o que Jesus requer de nós, o número de seus seguidores seria bem menor. E é exatamente por existirem tantos conceitos errados a respeito do que é ser cristão ou de quem é Jesus Cristo que precisamos sempre nos voltar a esses ensinos básicos do Senhor, a fim de que nullnós estejamos seguros de que, de fato, queremos ser cristãos e o que está envolvido nisso. Jesus disse essas palavras aos seus discípulos quando os mandou em missão. Elas se iniciam no capítulo 10, verso 1. Jesus chama seus doze discípulos, dá a eles autoridade para expelir demônios e curar toda sorte de doenças e enfermidades. No verso 5, ele os envia com uma série de instruções, dadas à medida que eles iam de cidade em cidade, de vila em vila, pregando e anunciando o Evangelho. Ele ainda dá algumas admoestações sobre como deveriam se comportar nas casas que os recebessem e os encoraja diante das dificuldades. No texto que encabeça esse primeiro capítulo, Jesus apresenta com clareza as demandas que serão exigidas não só dos doze, os quais por ele estão sendo enviados, mas também daqueles que quiserem ouvir a mensagem dos doze e se tornarem cristãos. Jesus faz três demandas, que serão apresentadas a seguir. Primeira demanda: sofrer por Cristo Se quisermos nos tornar cristãos, temos que estar dispostos a sofrer por causa de Jesus. Se nós estamos pensando que o cristianismo é uma religião que veio para nos livrar dos nossos problemas, trazer-nos paz e tranquilidade, além de uma vida relativamente tranquila, estamos muito enganados, porque a primeira demanda apresentada por Jesus nos diz que nós temos que estar dispostos a sofrer por causa dele. Ele apresenta a razão no verso 34: “Não penseis que vim trazer paz à terra; não vim trazer paz, mas espada”. Para entendermos o que Cristo quis dizer com “Não penseis que vim trazer paz à terra”, é necessário entender o seu alvo nesse trecho. É bem verdade que ele trouxe, sim, paz entre nós. Por meio de seu sacrifício na cruz, tendo pagado a nossa culpa e sofrido o castigo que nos era merecido e justo, reconciliou-nos com Deus para que pudéssemos ter paz com ele. Por causa disto, podemos também ter paz com outras pessoas. Porém ele quis dizer que seu alvo, na sua primeira vinda, não era estabelecer aquele reino messiânico de paz que os judeus tanto ansiavam e que os profetas prometeram no Antigo Testamento. Não era seu propósito resolver todos os problemas do mundo. Quando ele veio a essa terra, há mais de 2.000 anos, seu objetivo não era pregar paz e amor como pregavam os falsos profetas naquela época e nos dias de hoje, os quais querem transformar Jesus em um arauto da paz – tanto é que nas figuras que fazem de Jesus sempre o colocam com a pombinha branca e com aquele rosto emaciado, olhos azuis e um aspecto sereno. No entanto, ele não veio trazer paz. Esse Jesus que pintam não é o Jesus viril que o Novo Testamento apresenta. Cristo diz: “Não pensem que eu vim trazer paz, eu não vim resolver os problemas do mundo agora, eu não vim instalar um reino onde todos viverão em harmonia, eu não vim acabar com as guerras e as polêmicas, não foi isso o que eu vim fazer”. Então, este é o primeiro esclarecimento a respeito de Cristo que precisa ser feito: ele traz paz no sentido de que, pelo seu sacrifício, nós temos paz com Deus e, assim, podemos ter paz com outras pessoas. Todavia, isso está longe de tornar Jesus uma espécie de pacificador ou uma pessoa que veio ao mundo para resolver todos os seus problemas e estabelecer um reino de paz. Pelo menos, não foi isso que ele veio fazer agora. Pelo contrário! Ele diz que veio trazer espada. Mas o que ele não quis dizer com isso? Quando Jesus disse que veio trazer espada, ele não disse que veio fundar uma religião ancorada na violência, como existem algumas neste mundo. Quando ele declarou que veio trazer espada, ele não quis dizer que nós deveríamos nos armar e lutar contra o resto do mundo, muito menos que nós viríamos a usar espadas ou armarmo-nos para converter os infiéis pela força. Jesus Cristo não está dizendo isso. O que ele quis dizer com essa expressão é que, por causa dele, haveria muitos conflitos entre pessoas, cidades e até países e que a sua pessoa seria motivo de discórdia, de polêmicas e de inimizade. E a razão para isso é a apresentação radical que ele faz de si mesmo. Jesus se apresenta como sendo o Filho de Deus, aliás, o próprio Deus. Ele diz que é o único caminho para Deus e que, sem ele, todos estão perdidos; expõe a perdição da humanidade por causa dos seus pecados e diz que o ser humano sozinho não pode alcançar a felicidade eterna; ele afirma ser o caminho, a verdade e a vida. Isso é colocar uma espada na mão de quem não acredita. Por afirmar essas coisas, os seguidores de Jesus despertam inimizade, hostilidade, ódio e perseguição por parte de quem não acredita em Cristo. A espada que Cristo trouxe não é para que seus seguidores firam o mundo. Por incrível que pareça, a espada que ele trouxe é a mesma pela qual os seus seguidores são feridos. A pessoa de Jesus provoca esse comportamento por causa das suas demandas radicais e pela forma como ele se apresenta: o Filho de Deus, o único em quem existe salvação, sendo que fora dele não há possibilidade de redenção ou felicidade eterna. Essa espada, portanto, que é resultado de quem é Jesus, é tão profunda que corta, inclusive, laços familiares, como ele diz no verso 35: “Pois vim causar divisão entre o homem e seu pai; entre a filha e sua mãe e entre a nora e sua sogra”. Existe uma relação mais querida do que a de pai e filho? Eu amo meu pai e eu amo meus filhos. E eu sei que vocês sabem o que é isso. Mas Jesus está dizendo que essa espada que foi trazida por ele corta, inclusive, esse tipo de laço. Do mesmo modo, a relação de mãe e filha, que também é um laço terno, querido, profundo, é cortada por essa espada. O terceiro laço pode parecer mais fácil, pois é entre a nora e sua sogra. Mas, brincadeira à parte, sabemos que há sogras que são maravilhosas, como a minha. Eu compreendo a dificuldade. O que o Senhor está dizendo é que a sua pessoa, quem ele é, as suas demandas, o que ele representa, causam atrito e polêmica entre as pessoas a ponto de separar, inclusive, familiares. Veja como ele diz que haveria inimigos do homem até mesmo em sua família: “Assim, os inimigos do homem serão os da sua própria casa”. Em outras palavras, algumas pessoas odiarão Jesus e seus seguidores com tamanha ira que, se um filho se tornar discípulo de Cristo, o amor do pai por esse filho será menor que o ódio sentido por Cristo. Igualmente na relação entre irmãos ou de um filho para com seu pai. E isso tem acontecido ao longo da história, especialmente em períodos de perseguição aberta e oficial ao cristianismo. Durante o Império Romano, há muitas dessas histórias. John Foxe, em O Livro dos Mártires, página 353, relata um caso de uma mulher que entregou o marido às autoridades para ser morto, porque ele se tornou cristão; ou ainda casos de pais que renegaram filhos, entregando-os para serem mortos, porque se tornaram cristãos. Nos países comunistas, onde há perseguição até hoje, há casos e casos de famílias que entregaram seus membros que se tornaram cristãos para não serem mortas ou presas; em países islâmicos, isso também ocorre ainda hoje. Enfim, famílias se fragmentam, dividem-se, acabam-se, porque um membro entrega o outro que se tornou cristão. Em resumo, Jesus é claro: quem quiser ser discípulo dele tem de estar disposto a enfrentar a ira e a hostilidade do mundo e até mesmo a da esposa, do marido, dos pais ou dos irmãos. Veja como é esse cristianismo que nos é apresentado aqui. Essa demanda de Jesus torna o cristianismo bíblico bem diferente daquele tipo que apresenta Cristo como uma espécie de guru que prega paz e amor a todos. Esse não é o Jesus da Bíblia. Este é muito claro com seus seguidores. Ele está dizendo que, na hora em que nos tornarmos seguidores dele, devemos nos preparar, porque a espada poderá ir até a nossa casa, até o nosso casamento, até o nosso relacionamento com nossos filhos, porque ele não veio trazer paz no presente momento, mas a espada, e os inimigos do homem serão os da sua própria casa. Esta é a primeira demanda de Jesus: vocês têm de estar dispostos a sofrer por ele, inclusive dentro das suas próprias famílias.Segunda demanda: amar Cristo acima de tudo e de todos A segunda demanda é ainda mais radical. Jesus diz que ele é a pessoa que você deve dar amor supremo. Ele exige isto, conforme os versos 37 e 38: “Quem ama seu pai ou sua mãe mais do que a mim não é digno de mim; quem ama seu filho ou sua filha mais do que a mim não é digno de mim; e quem não toma a sua cruz e vem após mim não é digno de mim”. Mas o que significa ser digno de Jesus? É ser, e eu uso essa palavra com cuidado, merecedor. Mas do quê? Do amor, da graça, da misericórdia de Cristo. É poder ter o direito de dizer que é, de fato, cristão. É ser digno de tal modo que Jesus não se envergonhará de nós. Isso é ser digno dele. Mas, para isso, ele diz que temos que o amar acima daquilo que nós temos de mais precioso, que é a família e a nossa própria vida. Você tem que amá-lo acima de tudo. Mas o que significa isso? Preste atenção. Ele não está dizendo que temos de deixar nossa família, nossos lares e irmos morar com nossos irmãos em Cristo, como se eles fossem uma nova família. Algumas seitas fazem isso, como, por exemplo, os Meninos de Deus. Essa seita é muito antiga e perigosa e tem seu foco de atuação principalmente entre os jovens, nas universidades e escolas. Eles se apresentam como irmãos em Cristo Jesus e tiram os jovens de seus lares para morar em comunidades, em acampamentos. O moço e a moça largam suas famílias e seus estudos e vão morar com outros jovens em retiros. Não é isso que Jesus está dizendo. Ele não está nos incentivando a abandonarmos nossa família, muito menos que negligenciemos nossas obrigações com os familiares. Ele não está nos encorajando, por exemplo, a nos envolvermos nas atividades da igreja de tal forma que nos esqueçamos de nossas obrigações como membros de uma família (esposo, esposa, filho (a)). Não é isso que ele está dizendo. O que ele quer dizer é que o nosso amor a ele deve superar o amor que nós temos por qualquer outra pessoa, inclusive familiares e parentes. Isso porque o nosso relacionamento com Cristo é superior aos laços familiares e terrenos. Isso é algo que nós precisamos entender claramente. Os laços terrenos um dia acabarão. A relação entre pai e filho, mãe e filha, irmão, irmã são pertencentes a essa vida. Um dia, isso tudo se acabará e no novo estado, no novo mundo, na nova era que Deus está trazendo e que já foi inaugurada, essas relações familiares desaparecerão. O que ficará é a nossa relação com Deus e com os seus demais filhos. Então, aqueles que você hoje ama como familiares poderão não ser os mesmos que estarão nesse reino celestial. Se forem, aleluia. Mas o que prevalecerá na eternidade é a irmandade. É a família da fé. Veja como Jesus, nesse mesmo Evangelho, explicou isso, no capítulo 12, versos 46 ao 50: “Falava ainda Jesus ao povo, e eis que sua mãe e seus irmãos estavam do lado de fora, procurando falar-lhe. E alguém lhe disse: Tua mãe e teus irmãos estão lá fora e querem falar-te. Porém ele respondeu ao que lhe trouxera o aviso: Quem é minha mãe e quem são meus irmãos? E, estendendo a mão para os discípulos, disse: Eis minha mãe e meus irmãos. Porque qualquer que fizer a vontade de meu Pai celeste, esse é meu irmão, irmã e mãe”. O Senhor Jesus disse que quem fizer a vontade do Pai é, de fato, seu irmão, sua mãe e sua irmã, colocando em segundo lugar o relacionamento familiar que ele tinha com a sua mãe e os seus irmãos terrenos. Isso quer dizer que é esse o relacionamento que prevalecerá na eternidade e é por isso que o Senhor Jesus Cristo disse que temos que amá-lo mais do que amamos nosso pai, nossa mãe, nossos filhos e filhas, uma vez que essas relações haverão de passar e a que permanecerá por toda a eternidade é a relação que temos com ele. Em outras palavras, o Senhor Jesus está dizendo que, se chegar uma ocasião em que tivermos de escolher entre a nossa família e Jesus Cristo, a decisão deve ser a favor de Jesus. Só assim nos tornaremos dignos dele. Dou aqui alguns exemplos práticos: o marido de alguém cometeu um erro que está sendo confrontado por algumas pessoas. A esposa dele é cristã, crente, discípula de Jesus. Ela sabe que seu marido está errado, contra a verdade de Cristo, e que está sendo confrontado. Porém, mesmo assim, ela toma partido dele. Quem ela está amando mais? O marido ou Jesus Cristo? É claro que ela pode ficar ao lado do seu marido, mas com sabedoria. Ela pode dizer: “Querido, você sabe que eu te amo de todo coração, mas nesse ponto você está errado. Eu vou estar ao seu lado. Se você tiver que ir preso, eu vou para a cadeia com você, mas eu vou dizendo que você está errado. A verdade é essa. Vamos admitir, corrigir e resolver isso”. Há pessoas que, nesse particular, preferem ofender Cristo e a verdade, ficando ao lado do familiar. Algo bem comum que poderia ser citado como exemplo são casais que se dizem crentes, mas - quando o filho faz algo errado na escola - defendem-no. Isso mostra que eles não estão amando Jesus mais do que o seu filho, uma vez que a atitude correta é deixar este ser corrigido. É preciso dizer: “Filho, você sabe que nós te amamos. Nós vamos estar ao seu lado sempre, mas você está errado e precisa ser corrigido. Você vai aceitar essa disciplina e essa correção”. Às vezes, nós defendemos os nossos por causa desses laços. Outra situação: alguém tem parentes que se envolvem em uma briga com os sócios da empresa. Porém, mesmo sabendo que os parentes estão errados, a pessoa toma partido deles. Posso citar mais uma situação entre tantas possíveis: imaginemos os familiares de uma pessoa lhe pedindo para fazer algo que, ao final, representa um ato errado ou até ilegal. Por exemplo, o diretor de uma empresa está fazendo um exame de seleção, e o seu sobrinho é um dos candidatos. De repente, a irmã desse diretor pede que ele dê um jeitinho para que seu filho obtenha aquele emprego, dizendo a ele: “É o seu sobrinho, dê uma forcinha”. É exatamente isso que as pessoas fazem. Às vezes, elas querem usar os laços familiares para propor ações que vão contra Jesus. Em resumo, o que ele está dizendo é que quem quiser segui-lo precisa estar disposto a tomar a sua cruz, conforme o verso 38, que diz que quem não tomar a sua cruz e seguir após ele não é digno dele. A cruz era um instrumento de morte. Os condenados à morte de cruz, naquela época, carregavam-na nas costas até o local de execução. Foi isso que obrigaram o Senhor Jesus a fazer. Ele foi até uma parte do caminho, quando, então, Simão, o Cirineu, tomou a cruz de Cristo e a levou. A figura presente aqui é que, diariamente, temos que morrer para nós mesmos e para nossa vontade e submetermo-nos a Jesus. Isso significa tomar a cruz. Às vezes, as pessoas dizem: “Essa doença é minha cruz!”. Não, esse não é o sentido de tomar a cruz. Ela, aqui, é instrumento de morte, representando que nós temos que mortificar nós mesmos e a nossa vontade e morrermos para o nosso eu, para que então possamos seguir a Cristo. Nada menos do que isso é exigido por ele. Jesus quer amor supremo, dedicação suprema maior do que o amor que temos pela nossa família, maior do que o amor que temos por nós mesmos. Terceira demanda: perder a vida pelo Senhor Esta, sem dúvida, é a demanda mais radical de todas. Jesus diz, no verso 39: “Quem acha a sua vida perdê-la-á; quem, todavia, perde a vida por minha causa achá-la-á”. Esse é um dos ensinamentos que Jesus mais repetiu. Ele aparece cerca de seis vezes nos quatro Evangelhos. Ele significa que quem acha a sua vida a perderá. Achar a vida significa alguém ser bem-sucedido, de acordo com os padrões desse mundo, ser realizado profissionalmente, poder realizar todos os desejos, ter independência financeira. E o pior: tudo isso alheio a Deus, sem lugar para Jesus Cristo. No fim de toda essa dedicação aos próprios desejos, pensando que ganhou a vida, verá que, na verdade, perdeu-a. Então, achar a vida é entendido como lutar, procurar, esforçar-se, buscar as coisas que as pessoas consideram como sendo as mais importantes em suas vidas. Mas o que significa perdera vida? A melhor resposta para isso é a parábola do Rico Insensato, contada por Jesus e registrada em Lucas, capítulo 12, versos 16 a 21: “E lhes proferiu ainda uma parábola, dizendo: O campo de um homem rico produziu com abundância. E arrazoava consigo mesmo, dizendo: Que farei, pois não tenho onde recolher os meus frutos? E disse: Farei isto: destruirei os meus celeiros, reconstrui-los-ei maiores e aí recolherei todo o meu produto e todos os meus bens. Então, direi à minha alma: tens em depósito muitos bens para muitos anos; descansa, come, bebe e regala-te [...]”. Vale comentar que aqui está um homem que achou sua vida: bem- sucedido, com boa provisão, aposentadoria tranquila, possuidor de bens, sem medo do futuro, tinha de sobra, possuía propriedades, enfim, alguém que achou sua vida. Mas ele a perdeu, como veremos a seguir: “[...] Mas Deus lhe disse: Louco, esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado, para quem será? Assim é o que entesoura para si mesmo e não é rico para com Deus”. É isso que significa “Quem acha a sua vida perdê-la-á [...]”. Muitas coisas dessa vida são lícitas, legais, boas, necessárias, mas o problema é o primeiro lugar dado a elas. Sendo assim, se você se dedicar, nesse mundo, no tempo presente, a buscar incessantemente apenas essas coisas, aplicando nelas o coração e fazendo de Cristo apenas uma nota de rodapé em sua vida ou, às vezes, nem dando importância nenhuma a ele, você chegará ao fim de sua vida e verá que desperdiçou seu tempo, sua juventude e suas forças correndo atrás daquilo que não lhe trará felicidade eterna, que não resolverá seu problema de relacionamento com Deus. Por isso, quem acha sua vida nesse mundo vai perdê-la, mas quem perde a sua vida nesse mundo por causa de Jesus vai achá-la. Você pode, sim, trabalhar, ganhar dinheiro, ter família, mas tudo isso precisa ser secundário e por amor a Jesus, para de alguma forma promover o nome de Cristo e trazer glória a ele, afinal, o Senhor é a razão de tudo que você faz. Outrora você era o centro de tudo, mas agora você vive para ele. A diferença entre nós e os outros é que os outros querem ganhar dinheiro para gastar consigo mesmos, mas nós, da mesma forma, queremos ganhar dinheiro a fim de podermos abençoar os outros, para poder ajudar outras pessoas. A diferença é a motivação. Então, para os que perdem a vida aqui neste mundo, ou seja, para os que renunciam a busca da sua própria glória, do seu próprio conforto; para os que abrem mão das coisas do seu eu e vivem, de fato, para Cristo, ele promete, por meio de sua Palavra, que estes acharão a vida. Em resumo, quem quiser ser discípulo de Cristo deve estar disposto a renunciar a si mesmo e a tudo quanto tem por amor a ele. Conclusão Mas com que direito Jesus Cristo exige isso? Quem é ele para prometer essas coisas? Amado leitor, pensemos direito. Nós temos aqui um judeu, filho de Maria, chamado Jesus, que viveu aqui há mais de 2.000 anos. De repente, ele se dirige para um grupo de seguidores e diz: “Vocês têm que me amar mais do que vocês amam as suas famílias; vocês têm que estar dispostos a morrer por minha causa; e digo mais, se vocês não passarem a vida toda tendo a mim como a razão suprema de vocês serem, vocês estão condenados”. Notemos que estamos diante de um homem que só pode ser duas coisas: um louco ou Deus! Não há opção. Ele ou é louco, megalomaníaco, esperto, porque enganou quase três bilhões de pessoas, que é a quantidade de cristãos que existe hoje, ou ele é o que diz realmente ser. Sendo assim, você, leitor, precisa decidir: quem é Jesus para você? Pense no que ele está reivindicando. Nenhum outro fundador de religião, se é que eu posso chamar Jesus de um fundador de religião, fez demandas ao menos parecidas com essas. Ninguém. Nesse sentido, de fato, ele é único. Não há opção para nós. Jesus demanda isso porque ele é Deus. Ele é o Filho de Deus. Ele é o Criador de todas as coisas e o Senhor de tudo e de todos, que morreu pelos nossos pecados, ressuscitou dos mortos, subiu aos céus e tem todo poder no céu e na terra e em todo o universo. Sendo assim, ele tem o direito de exigir de nós amor supremo, lealdade absoluta e obediência total. Ninguém mais pode demandar isso se não for o próprio Deus. Ninguém tem o direito de pedir essas coisas a não ser que ele seja Deus. Nenhum ser humano tem o direito de pedir essas coisas a outro ser humano. Todavia, se Deus, o Criador de todas as coisas, na Pessoa do seu Filho, veio até nós e nos fez tais demandas, é nosso dever curvarmo-nos diante dele e obedecer-lhe. O que isso representa para nós hoje (nós que nos dizemos crentes, cristãos, evangélicos)? As perguntas são: nós somos dignos dele? Nós amamos o Senhor Jesus mais do que nosso cônjuge, filhos, irmãos, pais? Estamos dispostos a renunciar a tudo que temos e ao que somos por amor a Jesus? Valorizamos a vida eterna que ele nos promete mais do que a vida nesse mundo? Ele tem o primeiro lugar na nossa vida? Qual é a razão pela qual, às vezes, muitos cristãos são apáticos e descomprometidos? Das duas uma: ou porque nunca entenderam de fato quem é Jesus Cristo ou porque entenderam, mas, por alguma razão que vai desde a incredulidade até a covardia, eles não têm a disposição de assumir o que significa de fato ser cristão. Espero que você não se enquadre nesse caso. Quero, então, convidá-lo a repensar sua vida e sua declaração de fé de que você é cristão. É mesmo? Olhe o que ele exige de nós. Olhe para os seus atos, olhe para as suas atitudes, para as suas escolhas, para os planos que você tem feito. Qual o lugar de Cristo neles? Para que você quer ir para a universidade? Para que você quer um emprego? Para que você quer constituir uma família? Por que você está correndo atrás dessas coisas? Qual a razão? Qual o lugar de Cristo em sua vida? Se ele tem o primeiro lugar nela, quanto tempo você dispõe para se dedicar a ele? Você lê a sua Palavra? Gasta tempo em oração e em comunhão com ele? Porque se nós amamos uma pessoa, é claro que nós queremos estar com ela. Eu quero que você examine sua vida e tome uma decisão: ou você é, de fato, discípulo de Cristo nos moldes ditados por ele ou então é melhor fazer como muitos: virar as costas e ir embora. E eu espero que isso não seja necessário como aconteceu quando Jesus ensinava na sinagoga de Cafarnaum. Quando disse quem ele era e o que queria, muitos, entendendo a mensagem, viraram as costas e foram embora2. Por isso, eu coloquei que, se nós entendêssemos quem é Jesus, o número de seus seguidores seria bem menor, porque ele nunca esteve interessado em números. Somos nós que ficamos interessados em encher a igreja. Jesus nunca esteve preocupado com isso, pelo contrário, ele estava expulsando pessoas, pois só queria que ficasse quem realmente era dele, quem de fato o amava, quem o entendia. Ele queria o verdadeiro adorador, não um consumidor do evangelicalismo brasileiro (trazendo para nossos dias), mas um discípulo de verdade. Se você ainda não se dobrou diante de Jesus Cristo como Senhor e Salvador, eu te convido para tal. Não deixe passar essa oportunidade que Deus te dá. Você acabou de ler essa exposição da Palavra de Deus que apresenta as demandas de Cristo, as promessas que ele fez. Não há salvação, de fato, em nenhum outro. Ele é o Filho de Deus e o salvador do mundo. Ele te chama a se curvar diante dele. Certamente, eu não estou pedindo para você dar uma chance a Jesus Cristo, como, às vezes, as pessoas fazem: “Dê uma chance a Jesus”. Não, de jeito nenhum. É ele que está dando a você a chance. Ele te chama pela leitura da sua Palavra, do Evangelho, e você deveria dar atenção a ele porque nem sempre a porta estará aberta. Que você possa tomar a decisão de se curvar diante dele e confessá-lo como Senhor. Que possa se entregar a ele e que Cristo seja o amor maior em sua vida. Amém! Oração Jesus, quem é digno do Senhor? Cristo, Filho de Deus, ressurreto dos mortos, entronizado à direita do Pai nas alturas, o Senhor tem todo o poder no céu e na terra e pode fazeressas reivindicações sobre nossa vida, nossos bens, nossos laços familiares, porque o Senhor é digno, nosso salvador e nosso Redentor. Senhor, ensina a nós esse cristianismo radical que é ensinado na Bíblia. Que nós te amemos de coração mais do que amamos qualquer outra coisa. Ajuda-nos a sermos fiéis ao Senhor mesmo que isso nos custe amizades preciosas, laços preciosos e coisas preciosas neste mundo. Ajuda-nos a amá-lo acima de tudo, com os olhos na glória, com os olhos na eternidade, quando então o reino de paz será estabelecido, quando finalmente a paz reinará neste mundo, quando o Senhor vier pela segunda vez para reinar com os seus. Jesus, se o leitor ainda não havia compreendido o que é o Evangelho e quem é o Senhor, faça brilhar a sua luz no seu coração para que discípulos verdadeiros sejam chamados para viver para sua glória. Perdoa-nos, Deus, e recebe-nos por amor de Jesus. Amém! 1 Sermão pregado em 26 de outubro de 2014. 2 Cf. João 6.60-69. 2 RELIGIOSIDADE E CRISTIANISMO Texto-base: Mateus 23.1-383 Introdução Caro leitor, o meu alvo neste capítulo é refletir a respeito da diferença que existe entre religião e cristianismo; entre religiosidade e a verdadeira prática espiritual. Para isso, usarei esse sermão de Jesus contra os religiosos da sua época: os fariseus e os escribas. Esse sermão aparece também em Lucas 11, um pouco resumido, o que mostra que Jesus, em outro contexto, disse essas coisas várias vezes. Ao falar sobre religiosidade e verdadeiro cristianismo, fazendo uso dessa passagem na qual Jesus fala contra os fariseus, eu estou consciente de que eu não posso comparar os cristãos verdadeiros com os fariseus e, de certo, essa não é a minha intenção, visto que seria desonesto com você. O que ocorre, porém, é que existem elementos da religiosidade dos fariseus que percebo estarem presentes também no meio dos evangélicos. Por isso, mesmo que a comparação esteja muito distante, ainda há pontos mencionados por Jesus, nos quais ele critica os escribas e fariseus, que bem podem ser aplicados à nossa vida, pelo menos à guisa de exame e de referência. Eu creio que toda Escritura é proveitosa e se aplica a nós. Ela foi escrita para o nosso benefício. Portanto, o capítulo 23 de Mateus não é uma exceção. E, com certeza, se essa mensagem de Jesus contra os escribas e fariseus foi preservada no Evangelho, é porque Deus, sem dúvida, deseja que ela seja lida, refletida e aplicada pela sua igreja durante todas as suas épocas. Meu alvo é que, ao examinarmos aquilo que Jesus criticou na religiosidade dos escribas e fariseus, nós nos examinemos também, a fim de que possamos aprender e desejar o cristianismo puro e simples que a Bíblia nos ensina. É isto que nós queremos ser: cristãos, de acordo com o que o Evangelho nos ensina. Mas deixe-me fazer outras observações à guisa de introdução. O ser humano é religioso por natureza. Mesmo as pessoas que não nasceram de novo, que não foram regeneradas e que não estão salvas, são capazes de orar, cantar, dar ofertas, fazer sacrifícios. A prova disso é a quantidade de religiões falsas que existem no mundo, nas quais as pessoas fazem praticamente tudo o que os cristãos fazem. Elas vão aos seus cultos, têm corais, pregadores e pastores, dão ofertas, fazem sacrifícios, vão de porta em porta distribuindo folhetos e espalhando aquilo em que elas creem, ou seja, a religião é algo que pertence ao ser humano, mesmo que ele não seja salvo. Desse modo, um descrente pode ser religioso. Por isso, nós não podemos medir a salvação de alguém simplesmente pelos atos religiosos que ele pratica, porque um descrente também pode ser religioso. Então, é preciso notar quais são esses elementos da religiosidade que, por vezes, manifestam-se em nossa vida, para que nós os rejeitemos e vivamos um cristianismo autêntico, puro e simples. Quando Jesus disse essas palavras, ele estava na última semana da sua vida terrena, em Jerusalém. Ele já tinha tido vários conflitos com os escribas e fariseus. Se você, depois, quiser ler o capítulo 22, poderá notar que houve uma discussão entre Jesus, os escribas e os fariseus com relação ao tributo – eles discutiam se era necessário pagar imposto a Cesar ou não; depois, houve uma discussão a respeito da ressurreição; logo em seguida, um debate sobre qual era o grande mandamento; e ainda sobre quem era aquele senhor sobre o qual o rei Davi havia dito no Salmo 110, verso 1: “Disse o SENHOR ao meu senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos debaixo dos teus pés”. Aquela tinha sido uma semana extremamente conturbada, e Jesus estava envolvido em polêmicas e discussões diretas com os escribas e fariseus, que eram os líderes religiosos daquela época. E agora, no fim, como que já cansado de ver tanta cegueira, tanta religiosidade, tantos conceitos errados, Jesus, então, pronuncia, no capítulo 23, esse sermão, que é considerado um dos mais duros pronunciados por ele. Contudo, é preciso lembrar que nem todos os fariseus eram como Jesus está dizendo aqui. Havia fariseus como, por exemplo, Nicodemos e José de Arimateia, os quais esperavam o Reino de Deus, eram sinceros, verdadeiros, tementes a Deus e portadores da verdadeira fé. Porém a grande liderança do farisaísmo daquela época era composta de pessoas extremamente religiosas, mas que não conheciam a Deus. De qualquer forma, eles praticavam a sua religião pensando que estavam fazendo o que era correto diante de Deus. O que, então, Jesus censurou neles? Ao respondermos essa pergunta, nós estaremos dando alguns dos elementos da religiosidade que nós queremos evitar. Hipocrisia A primeira censura de Jesus aos fariseus e escribas foi quanto à hipocrisia, como consta no capítulo 23, versículos de 1 a 3: “Então, falou Jesus às multidões e aos seus discípulos: Na cadeira de Moisés, se assentaram os escribas e os fariseus. Fazei e guardai, pois, tudo quanto eles vos disserem, porém não os imiteis nas suas obras; porque dizem e não fazem”. Havia, literalmente, uma cadeira na sinagoga chamada “cadeira de Moisés”, na qual os fariseus e os escribas se assentavam para ensinar todos os ditames da Lei ao povo. Eles sabiam de cor o discurso ortodoxo a ponto de Jesus dizer que o problema com eles não era seu ensino, pois eles eram ortodoxos e doutrinariamente corretos. O problema estava no fato de eles não praticarem o que ensinavam. Nesse ponto, você tem o primeiro elemento da religiosidade: um religioso é alguém que se preocupa com a exatidão, a precisão doutrinária, o andamento das coisas de acordo com as normas, todavia, ele não vive aquilo que prega e ensina. Normas e regras A segunda crítica de Jesus aos fariseus é que eles haviam criado normas e regras que Deus nunca mandara, como consta no versículo 4: Atam fardos pesados [e difíceis de carregar] e os põem sobre os ombros dos homens; entretanto, eles mesmos nem com o dedo querem movê-los. Não satisfeitos com a Lei de Moisés, que já continha muitas normas e regras, os fariseus do período anterior a Cristo, por volta de 200 a 150 a.C., começaram a elaborar novas regras por meio dos rabinos. Como exemplo, podemos citar a questão do sábado. Na Lei de Moisés, era dito que não se podia trabalhar nesse dia. Mas o que era trabalho? A partir dessa pergunta, podemos imaginar a seguinte discussão entre os rabinos: trabalho é andar um quilômetro, logo, andar um quilômetro é pecado; trabalho é levantar três quilos, ou seja, se levantar até dois quilos não é pecado, mas se levantar três quilos ou mais, sim. Claramente, aquilo que já era pesado, os rabinos tornaram mais pesado ainda, criando normas que Deus nunca havia criado, impondo um fardo difícil sobre o povo de Deus. Contudo, eles não queriam mover o fardo nem com um dedo. Então, esse é o segundo aspecto da religiosidade: ela cria normas e regras que Deus nunca mandou. Um exemplo óbvio são aquelas regras que proíbem as pessoas de ir ao cinema, de cortar os cabelos, de usar calça comprida, de usar barba, entre outras. Há um legalismo no meio evangélico peloqual as pessoas criam normas, colocando-as sobre as pessoas, que, por sua vez, vivem carregadas debaixo dessas regras e preceitos humanos nunca ordenados por Deus. A religiosidade faz isso em nome de Deus. Aprovação humana A terceira crítica de Jesus aos fariseus é que eles buscavam a aprovação dos homens. O versículo 5 diz: “Praticam, porém, todas as suas obras com o fim de serem vistos dos homens; pois alargam os seus filactérios e alongam as suas franjas”. Filactérios são caixinhas de couro, com trechos da Torá, que os judeus amarravam nas mãos e na testa. Isso porque, em Deuteronômio 6.6-8, Moisés tinha dito ao povo para guardar a Palavra de Deus no coração e atá-la à mão e à cabeça. É claro que Moisés estava falando figuradamente, porque mão e cabeça significam, respectivamente, o que alguém faz e pensa. Porém eles interpretaram aquilo literalmente. Outro ponto é que o fariseu mandava fazer essas caixinhas, de certo modo, grandes para que, quando ele as colocasse na testa e nas mãos e saísse andando pelas ruas, os homens olhassem e comentassem o quanto ele era religioso e piedoso, até mesmo um santo, tal era o tamanho dos filactérios do fariseu. Já as franjas eram as borlas da veste. Elas funcionavam como o atual rosário católico, que são aqueles nós (contas) usados para contar as orações e os pais-nossos. Os judeus tinham, então, franjas, que eram penduradas na sua roupa a fim de contar as orações. O problema é que os fariseus mandavam encher suas roupas de franjas. Desse modo, quando eles andavam na rua com aqueles filactérios e com as franjas, as pessoas que os viam poderiam, por certo, dizer o quanto aqueles homens eram santos, não querendo, assim, nem chegar perto deles, para não serem fulminadas, tal era a santidade. É isso o que a religião faz. Ela busca agradar e impressionar as pessoas. Um religioso dos dias de hoje é alguém que pratica o cristianismo, faz as atividades relacionadas à vida cristã, mas apenas por estar preocupado em se aparecer aos homens, em agradar-lhes, em ostentar a sua religiosidade. Não é difícil dar exemplos disso. Autoexaltação O quarto item que Jesus condena nos fariseus é a autoexaltação. Os versículos 6 a 12 nos dizem: “Amam o primeiro lugar nos banquetes e as primeiras cadeiras nas sinagogas, as saudações nas praças e o serem chamados mestres pelos homens. Vós, porém, não sereis chamados mestres, porque um só é vosso Mestre, e vós todos sois irmãos. A ninguém sobre a terra chameis vosso pai; porque só um é vosso Pai, aquele que está nos céus. Nem sereis chamados guias, porque um só é vosso Guia, o Cristo. Mas o maior dentre vós será vosso servo. Quem a si mesmo se exaltar será humilhado; e quem a si mesmo se humilhar será exaltado”. Os fariseus usavam a religião que eles praticavam para se promover diante dos homens. Diz Jesus no versículo 6 que eles amavam o primeiro lugar nos banquetes. Quando os judeus faziam os seus banquetes, eles reservavam lugares para as autoridades. Assim, quando o judeu e o fariseu chegavam, gostavam de ser distinguidos e se sentarem na frente, para que todos vissem que eles eram pessoas especiais. Nas sinagogas, isso não era diferente. Quando não era na cadeira de Moisés, era nos primeiros lugares das sinagogas – bancos reservados para as pessoas especiais. Logo, o fariseu fazia questão de sentar-se ali para que todos pensassem que ele era uma pessoa especial. Do mesmo modo, quando ele andava nas praças, gostava que as pessoas o chamassem pelos títulos que tinha, como mestre e rabi. Isso era extremamente apreciado por ele. Jesus disse: “Vós, porém, não sereis chamados mestres [...]”. Ele não está proibindo esse título, mas está proibindo que usemos esse título para bajular alguém, ou que uma pessoa o use para se autoglorificar. Quando Jesus diz: “[...] porque um só é vosso Mestre, e vós todos sois irmãos. A ninguém sobre a terra chameis vosso pai [...]”, é claro que não está proibindo que eu me refira ao meu genitor como pai; o que ele está dizendo nesse ponto é que não façamos de alguém nosso pai, que não usemos esse título para bajular alguém, ou que ninguém diga sobre si mesmo: “Eu sou o pai dessa ideia, eu sou o pai dessa igreja, eu sou o mestre dessa igreja”. Jesus completa dizendo que ninguém deveria usar esses títulos com esse objetivo porque um só é o Pai, aquele que está nos céus; da mesma forma, ele proíbe o chamar-se de guias, porque um só é o nosso guia: o Cristo. E afirma: “Mas o maior dentre vós será vosso servo”. Quer ser grande? Sirva. Você quer realmente ser grande? Então, o caminho do cristianismo é o serviço. Na religião, para alguém ser grande, ele precisa buscar títulos, posições nos primeiros lugares e ostentação, mas no cristianismo quem quiser ser grande tem de começar sendo pequeno, servindo aos irmãos e não sendo servido por eles. Ainda sobre isso, no versículo 12, Jesus diz: “Quem a si mesmo se exaltar será humilhado; e quem a si mesmo se humilhar será exaltado”. Ou seja, quem hoje se exalta em nome de Deus, no Dia do Juízo será humilhado diante dos homens e de Deus. A religião busca exaltação humana, mas o cristianismo faz com que nós sejamos servos e vivamos para servir a ele. Mas por que Jesus condenou essas atitudes? Do versículo 13 em diante, ele muda a direção do discurso. Até aqui Cristo vinha falando aos discípulos e alertando-os sobre ter cuidado com os fariseus. Agora, no versículo 13, ele se volta diretamente aos fariseus, que estavam naquela audiência. Imagine- nos ouvindo o que Jesus falava; pense em um sermão duro. É fácil falar dos fariseus pelas costas, mas, no caso, eles estavam presentes naquela audiência. Os ais A partir deste ponto, Jesus, voltando-se a eles, pronuncia oito ais. Esses ais são como condenações por determinadas coisas. Mas que coisas são estas? Por que Jesus condenou essa religiosidade farisaica? Nós as veremos em seguida. Primeiro ai Condena-se a religiosidade farisaica primeiramente porque esse tipo de atitude que Jesus acabou de descrever acima impede não apenas que o próprio religioso seja salvo, mas que outras pessoas sejam salvas. Como ele disse no verso 13: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque fechais o reino dos céus diante dos homens; pois vós não entrais, nem deixais entrar os que estão entrando!”. Os escribas e fariseus deveriam estar abrindo o Reino de Deus para as pessoas, porque eles conheciam a Lei; eles conheciam a Palavra de Deus e seus ensinamentos dados por meio dos profetas, de Moisés, de Davi. Eles eram os conhecedores daquilo que Deus havia dito no Antigo Testamento. Mas, por causa da sua religiosidade, eles não entraram no Reino de Deus. Além disso, pelos seus ensinos e exemplos, eles também não deixavam as outras pessoas entrarem. Quando nós fazemos essa aplicação em nossa vida, percebemos como a religiosidade tem consequências terríveis. Pessoas que são religiosas – mas que não são salvas – terminam por dar um péssimo exemplo, pois elas não entram no Reino de Deus e acabam sendo um tropeço para aqueles que querem entrar. Segundo ai A segunda razão pela qual Jesus condenou a religiosidade dos fariseus é que, por vezes, ela é somente uma capa para esconder pecados. O versículo 14 diz: “[Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque devorais as casas das viúvas e, para o justificar, fazeis longas orações; por isso, sofrereis juízo muito mais severo!]”. O fariseu chegava à casa de alguma pobre viúva que estava sofrendo e dizia: “Irmã, eu vou orar pela senhora, mas você sabe, minha oração é paga por tempo, se eu orar um minuto é uma dracma, se eu orar dois minutos serão cobradas duas dracmas; a senhora sabe como é, tenho que ganhar a vida”. Então, era como se ele ligasse seu taxímetro, vamos chamar de oraçãozímetro, e começasse a fazer longas orações, porque na verdade ele queria se valer da inocência e da ingenuidade da coitada da viúva, usando a religião como meio de esconder e camuflar a sua ganância, o seu amor ao dinheiro. Da mesma forma, a religiosidade é uma capa para pecados maissérios. Eu já acompanhei e conheço casos de gente que estava na igreja, era superzelosa, frequentava todas as reuniões de oração, não perdia um culto, exercia várias atividades e ministérios, era oficial da igreja, mas, de repente, descobre-se que tudo aquilo era uma capa e que, na verdade, aquele homem era desonesto, ladrão, imoral, agredia a esposa, mas na igreja ninguém suspeitava. Às vezes, a religiosidade é uma capa apenas para esconder pecados graves e terríveis, por isso, Jesus a condena, porque o religioso se justifica por meio dessas práticas listadas acima. Terceiro ai O terceiro ai se encontra no versículo 15. Jesus condena a religiosidade porque ela leva as pessoas ao inferno. “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque rodeais o mar e a terra para fazer um prosélito; e, uma vez feito, o tornais filho do inferno duas vezes mais do que vós!”. Os fariseus eram extremamente ativistas. Eram evangelistas, saíam de porta em porta evangelizando, pois queriam que os que não eram judeus se tornassem judeus, especialmente o prosélito, que era um gentil, um não judeu, que havia se convertido ao judaísmo e se circuncidado, sendo agora um judeu. Então, os fariseus percorriam vários lugares e faziam qualquer esforço para este fim. Jesus diz, neste ponto, que eles rodeavam mar e terra a fim de conseguir seus adeptos. Todavia, no fim, esses coitados eram duas vezes filhos do inferno. Por isso, Jesus condenou os fariseus, porque a religiosidade leva as pessoas ao inferno, visto que elas praticam aquilo que Deus não mandou ou praticam aquilo que Deus mandou pelos motivos errados. Elas podem parecer religiosas, podem enganar os seus corações com atos religiosos, mas, na verdade, nunca nasceram de novo, nunca foram regeneradas, não conhecem a graça de Deus, nunca tiveram um encontro verdadeiro com ele. É justamente por esses fatores que a religiosidade é tão perigosa e perniciosa e conduz para o inferno, porque a pessoa considera que ser religiosa, ir à igreja, dar o dízimo, estar no ministério, ser pastor e pregador, são evidências de que ela está salva. Porém ela pode não ser. Por isso, Jesus adverte os escribas e fariseus, porque eles conduziam outras pessoas à condenação. Quarto e quinto ais A quarta razão pela qual Jesus condenou a religiosidade dos fariseus é porque ela foca no que é secundário e acaba se esquecendo do que é mais importante na vida cristã. Há dois ais que tratam disso. Eles estão na sequência dos versículos 16 ao 24: “Ai de vós, guias cegos, que dizeis: Quem jurar pelo santuário, isso é nada; mas, se alguém jurar pelo ouro do santuário, fica obrigado pelo que jurou! Insensatos e cegos! Pois qual é maior: o ouro ou o santuário que santifica o ouro? E dizeis: Quem jurar pelo altar, isso é nada; quem, porém, jurar pela oferta que está sobre o altar fica obrigado pelo que jurou. Cegos! Pois qual é maior: a oferta ou o altar que santifica a oferta? Portanto, quem jurar pelo altar jura por ele e por tudo o que sobre ele está. Quem jurar pelo santuário jura por ele e por aquele que nele habita; e quem jurar pelo céu jura pelo trono de Deus e por aquele que no trono está sentado. Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque dais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho e tendes negligenciado os preceitos mais importantes da Lei: a justiça, a misericórdia e a fé; devíeis, porém, fazer estas coisas, sem omitir aquelas! Guias cegos, que coais o mosquito e engolis o camelo!”. O que esses dois ais têm em comum? É que em ambos os casos o que Jesus está condenando é o foco dado pelos fariseus às coisas secundárias e miúdas, esquecendo-se do quadro maior, do mais importante. É exatamente isso o que o religioso faz. Ele está preocupado com as coisinhas pequenas, os detalhes, os arranjos aqui e acolá, e se esquece das grandes coisas, das grandes virtudes, dos pontos centrais do cristianismo. No caso dos fariseus, temos primeiro a questão do juramento. Era comum jurar entre os judeus. Na verdade, a Bíblia não proíbe esse ato. Ela proíbe o juramento falso. Em algumas ocasiões, como diz nossa confissão de fé4, o juramento é lícito. Mas os fariseus faziam disso algo banal. Vejam como é que se manifestava a religiosidade. Eles diziam que a ação de jurar pelo templo de Jerusalém e pelo santuário não significava nada, mas se alguém fizesse um juramento pelo ouro trazido, ficaria devendo. Por que o judeu queria pegar a consciência de quem jurava pelo ouro? Porque eles ficavam com o ouro. Eles também diziam que jurar pelo altar não significava nada, mas se alguém jurasse pela oferta trazida sobre o altar ficaria devendo. Por que eles faziam isso? Porque eles não estavam preocupados com a oferta da pessoa, no sentido de que a pessoa fosse aceita por Deus e perdoada, mas estavam de olho na própria oferta. Logo, eles inventaram todas essas regras. Então, Jesus os repreende dizendo: “Cegos, quem é maior? O que santifica o ouro? É o templo. O que santifica a oferta? É o altar. Se você jura pelo céu, está jurando por Deus. Tudo leva a Deus. Será que vocês não percebem?”. E acrescenta: “Vocês estão cegos, estão torcendo a Palavra de Deus e focando nas coisas secundárias, por causa do interesse mesquinho de vocês”. Jesus, então, após repreendê-los chamando-os de cegos, questiona-os sobre quem era o maior: o ouro ou o santuário que o santifica? A oferta ou o altar que a santifica? Acrescenta dizendo que, se alguém jurar pelo céu, está jurando por Deus, porque tudo leva a Deus. Diante disto, os escribas e fariseus, por causa de seus interesses mesquinhos, estavam torcendo a Palavra de Deus e focando nas coisas secundárias. O mesmo acontece no versículo 23, no qual ele diz: “[...] porque dais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho [...]”. Os fariseus tinham roça em suas propriedades. Eles davam 10% da alface, do tomate, do legume, do endro, do cominho etc. Eles mediam com exatidão. Toda décima parte tinha de ser levada à igreja. Essa questão de líquido ou bruto não interessava a eles. Tudo era calculado sempre pelo bruto. Eles eram meticulosos para dar aquilo. Mas se esqueciam das coisas mais importantes da Lei: a justiça, a misericórdia e a fé. Alguém pode estar tão preocupado com as coisas da igreja, como a organização do templo e o andamento dos serviços; pode estar tão mergulhado em atividades, cuidando de um detalhe aqui, outro ali, que acaba se esquecendo de que o cristianismo não é isso. É muito mais que isso. Religião é tornar esses equipamentos, recursos, lugar e atividades em fins em si mesmos. Estas coisas existem para nos levar a Deus, a seu filho Jesus Cristo; elas existem para nos levar a viver vidas santas, retas e justas. Ou como disse Jesus: “[...] a justiça, a misericórdia e a fé [...]”. Às vezes, as pessoas se dedicam aos acessórios da igreja, como se fossem a própria religião verdadeira em si, e perdem de vista o mais importante, como Jesus disse: “[...] coais o mosquito e engolis o camelo!”. Mosquito era um inseto considerado impuro, então, o judeu, para não correr o risco de engolir um mosquito, colocava um coador por cima de tudo o que ele fosse beber. Ele era muito cuidadoso nisso. Mas, ao mesmo tempo, ele engolia um camelo, que também era um animal imundo, sendo o maior animal conhecido pelo judeu. Então é óbvio o que Jesus está dizendo aqui. Ele está condenando aquela atitude do religioso, porque ele é meticuloso com coisas secundárias e se esquece de ser santo, de orar, de amar, de exercer misericórdia e de exercer e praticar a justiça. Sexto e sétimo ais A quinta razão pela qual Jesus condena aquela religiosidade é porque ela leva as pessoas a se preocuparem com o que é externo, esquecendo-se, então, do que é interno. Mais uma vez, temos dois ais sobre esse tema. Os versículos 25 a 28 dizem: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque limpais o exterior do copo e do prato, mas estes, por dentro, estão cheios de rapina e intemperança! Fariseu cego, limpa primeiro o interior do copo, para que também o seu exterior fique limpo! Ai de vós,escribas e fariseus, hipócritas, porque sois semelhantes aos sepulcros caiados, que, por fora, se mostram belos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda imundícia! Assim também vós exteriormente pareceis justos aos homens, mas, por dentro, estais cheios de hipocrisia e de iniquidade”. Jesus usa duas figuras para ilustrar esse ponto da religiosidade. Primeiro, a lei cerimonial, que mandava que o judeu fizesse determinadas lavagens. O que acontecia era o seguinte: o judeu, quando ia ao mercado comprar alimentos ou utensílios, poderia se deparar com gentios, não judeus, ou com judeus não conservadores, que estivessem manipulando estes itens; então, para evitar se contaminar, ele levava todos os itens adquiridos para casa e os lavava, fossem copos, pratos ou alimentos, tudo era lavado, mas não era por uma questão de higiene, era por uma questão de religião. Jesus condena o fato de eles se preocuparem com o exterior e, por dentro, estarem cheios de rapina, iniquidade, pecado e corrupção. A religião se preocupa com o exterior da pessoa, com normas, com regras, mas acaba se esquecendo da necessidade de intimamente esta pessoa ser convertida, da necessidade de quebrantamento do coração, de fé verdadeira, de um amor que parte do coração. Não é só não adulterar, mas também não pensar em adultério; não é só não matar, mas também não querer que o seu irmão morra. Jesus explicou isso no Sermão do Monte (Mateus 5:27-28), dizendo: “Ouvistes que foi dito: Não adulterarás. Eu, porém, vos digo: qualquer que olhar para uma mulher com intenção impura, no coração, já adulterou com ela”. A religião se preocupa com o aspecto interno, mas o cristianismo diz que o Deus que fez o exterior é o Deus que vê o interior também. Então, essa preocupação com a vida interior é necessária. A segunda ilustração que Jesus diz é a das sepulturas. No versículo 27, ele chama os escribas e fariseus de sepulcros caiados. Eles gostavam de embelezar a sepultura dos antigos, só que a sepultura pode ser bonita por fora, mas por dentro está cheia de podridão e de ossos decompostos, de carne pútrida. E assim Jesus diz: “Vocês são sepulcros caiados. Vocês estão preocupados em adornar o exterior para parecerem justos aos homens, mas por dentro vocês estão completamente corrompidos”. Oitavo ai A última razão pela qual Jesus condena a religiosidade dos fariseus é porque ela impede que os religiosos ouçam a Palavra de Deus. Do versículo 29 ao 32, Jesus diz: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque edificais os sepulcros dos profetas, adornais os túmulos dos justos e dizeis: Se tivéssemos vivido nos dias de nossos pais, não teríamos sido seus cúmplices no sangue dos profetas! Assim, contra vós mesmos, testificais que sois filhos dos que mataram os profetas. Enchei vós, pois, a medida de vossos pais”. O que Jesus está dizendo aqui? Na época do Antigo Testamento, Deus mandou profetas como Isaías, Jeremias, Ezequiel, Oseias, Joel, Amós para falar àquele povo religioso. Foram homens a quem Deus revelou sua Palavra. Homens que ele levantou para dizer ao povo, como consta no primeiro capítulo de Isaías, no verso 12: “Quando vindes para comparecer perante mim, quem vos requereu o só pisardes os meus átrios?”. E continua nos versos 16 a 18: “Lavai-vos, purificai-vos, tirai a maldade de vossos atos de diante dos meus olhos; cessai de fazer o mal. Aprendei a fazer o bem; atendei à justiça, repreendei ao opressor; defendei o direito do órfão, pleiteai a causa das viúvas. Vinde, pois, e arrazoemos, diz o SENHOR; ainda que os vossos pecados sejam como a escarlata, eles se tornarão brancos como a neve; ainda que sejam vermelhos como o carmesim, se tornarão como a lã”. Todos conhecem essa passagem. Era isso que o profeta fazia no Antigo Testamento. Deus levantava um profeta para trazer o povo religioso de volta à verdade. Mas o que o povo de Israel fazia com os profetas? Ele os rejeitava, apedrejava-os, matava-os. Não os queria ouvir. A história da Bíblia do Antigo Testamento é a história de Deus tentando convencer aquele povo a voltar à verdade, mas este permanecia rejeitando, matando, prendendo e apedrejando os enviados de Deus. Agora, na época de Jesus, os escribas e os fariseus disseram: “Se tivéssemos vivido naquela época, não teríamos feito o mesmo. Nós somos melhores que os nossos pais, porque se tivéssemos vivido na época de Isaías, Jeremias, nós teríamos aceitado a Palavra de Deus”. Jesus disse: “seus hipócritas, vocês estão prestes a me matar, estão tramando planos, urdindo como vocês me pegarão e matarão; vocês estão enchendo a medida dos seus pais. Vocês são iguais a eles, zelosos pela tradição e pela antiguidade, mas não querem a Palavra de Deus”. A religião é assim, ela é muito tradicionalista, sempre apelando para o passado, mas na verdade não quer ouvir a Palavra de Deus. Jesus, então, termina condenando os escribas e fariseus do versículo 33 ao 36. Ele diz, no versículo 33: “Serpentes, raça de víboras! Como escapareis da condenação do inferno?”. No versículo 34, Jesus diz que eles vão continuar fazendo o que sempre fizeram: “Por isso, eis que eu vos envio profetas, sábios e escribas. A uns matareis e crucificareis; a outros açoitareis nas vossas sinagogas e perseguireis de cidade em cidade”. E foi exatamente o que fizeram com Jesus e com os seus discípulos. Depois, no versículo 35, continua: “para que sobre vós recaia todo o sangue justo derramado sobre a terra, desde o sangue do justo Abel até ao sangue de Zacarias, filho de Baraquias, a quem matastes entre o santuário e o altar”. Jesus está dizendo que isto iria acontecer para que a medida do pecado deles se enchesse e Deus derramasse o juízo dele contra aqueles homens. No verso 36, Jesus afirma: “Em verdade vos digo que todas estas coisas hão de vir sobre a presente geração”. E foi exatamente o que ocorreu. Trinta e cinco anos após Jesus ter dito estas palavras, os romanos cercaram Jerusalém e, após um cerco de três anos, entraram na cidade, matando mais de 500 mil judeus, que foram espalhados por toda a parte; destruíram a cidade e o templo, arrasando-o no seu fundamento. Tudo isso para cumprimento da Palavra de Jesus acerca dos juízos de Deus contra aquela geração. Aplicação e conclusão Leitor, como afirmei no início, eu seria desonesto em compará-lo aos escribas e fariseus, mas preste atenção ao seguinte: você sabe que está se tornando religioso quando está mais preocupado com o arranjo de flores, com o lugar do coral, com a roupa do pastor, do que com a pregação; quando leva mais tempo se preparando diante do espelho antes do culto do que se preparando espiritualmente para participar do culto; quando não consegue aturar os erros dos outros, contudo, é muito tolerante com os seus e de seus familiares; quando participa de todas as atividades da igreja, mas não tem mais tempo para sua família e para estar a sós com Deus; quando é zeloso para dar dízimo e ofertas, mas trata mal seus empregados, não perdoando quem te ofende e não pratica misericórdia para com os pobres; quando sua vida cristã gira em torno de elementos da igreja que, embora legítimos, não são essenciais. Eu também corro esse risco, por exemplo, quando penso no ministério que tenho no púlpito, na pregação, no ministério pastoral, no título de reverendo, doutor. Eu peço a Deus que me livre dessas coisas, porque eu não posso girar a minha vida cristã e o meu ministério em torno disto. Eu quero concluir com o fim do capítulo. Veja como termina: Jesus lamentando. Os versículos 37 a 39 são o lamento de Jesus: “Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os que te foram enviados! Quantas vezes quis eu reunir os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintinhos debaixo das asas, e vós não o quisestes! Eis que a vossa casa vos ficará deserta. Declaro-vos, pois, que, desde agora, já não me vereis, até que venhais a dizer: Bendito o que vem em nome do Senhor!”. Notem que Jesus diz no versículo 37: “[...] Quantas vezes quis eu reunir os teus filhos, como a galinha ajuntaos seus pintinhos debaixo das asas, e vós não o quisestes!”. Jesus está se referindo a todas as tentativas de Deus durante a história de reunir o povo dele, o povo da antiga aliança debaixo de si, a fim de ter um relacionamento verdadeiro, pessoal, íntimo. Porém ele diz nesse trecho que o povo não queria. A grande pergunta que nós queremos fazer é esta: nós somos o povo de Deus hoje, ele continua nos chamando para debaixo das suas asas, ele quer ter um relacionamento verdadeiro e íntimo conosco, pois é isso que é o verdadeiro cristianismo, mas nós queremos isso? Porque Israel não queria. Queremos viver para Deus? Queremos deixar a religiosidade? Queremos buscar a verdade? Queremos ser mudados? Queremos ser usados? Essas são as perguntas que Deus nos faz. Queremos? Desejamos? Ansiamos por isto? Se nós não estivermos dispostos, se não quisermos, se não nos prontificarmos, as coisas continuarão como sempre foram. Mas se nós queremos crescer, se queremos progredir, se queremos servir a Deus mais e melhor, é preciso que nós queiramos nos deixar reunir debaixo dele, das suas asas, em uma relação verdadeira, deixando de lado tudo que ele nunca ordenou, para que nós vivamos sempre para sua glória. Amém! Oração Ó Deus, livra-nos da justiça própria, da religião carnal, dessa religiosidade que nos atrapalha de ver o que é essencial. Ajuda-nos a viver um cristianismo puro e simples, focado naquilo que sua Palavra nos diz. Ajuda-nos em todas as coisas, pois o Senhor é o nosso Deus, queremos viver para sua glória, em nome de Jesus. Amém! 3 Sermão pregado em 31 de agosto de 2014. 4 Confissão de Fé de Westminster, capítulo 22 (Dos juramentos legais e dos votos). 3 A IMPUREZA E O CHAMADO PARA A SANTIDADE Texto-base: I Tessalonicenses 4.1-85 Introdução Boa parte dos problemas que nós enfrentamos como cristãos no relacionamento uns com os outros e com Deus é na área da impureza sexual. Nós não podemos e não precisamos ir muito longe para vermos que essa é uma área que foi tremendamente afetada pelo pecado. No Novo Testamento, há várias listas de pecados, e quase todas começam com pecados relacionados à área da sexualidade: a imoralidade, o adultério, a fornicação, a prostituição etc. Creio que todos nós, de uma forma ou de outra, lutamos para viver uma vida pura diante de Deus no que diz respeito à sexualidade. Paulo escreveu essa carta, e mais precisamente essa parte dela, com o objetivo de ajudar os crentes em Tessalônica a viver uma vida pura diante de Deus nessa área da nossa vida que é tão importante. Ele tinha fundado a igreja e passado pouco tempo com ela. De acordo com o livro de Atos, capítulo 17, ele passou três semanas pregando nas sinagogas e, por meio da sua pregação, Deus levantou uma igreja naquela cidade. Não demorou muito para que Paulo fosse obrigado a fugir daquela localidade por conta da perseguição levantada pelos judeus incrédulos. Ele saiu de lá deixando uma igreja jovem, talvez com um ou dois meses de fundação; novos convertidos com um ou dois meses de conversão. Ele até tentou voltar para continuar a discipular a igreja, mas não pôde. Então, mandou Timóteo, que conseguiu chegar à igreja, reunir-se com os irmãos e retornar trazendo notícias a respeito daquela comunidade. Essas notícias eram boas e más. As notícias boas eram que a igreja estava firme, aqueles novos convertidos permaneceram, apesar da perseguição que estavam passando, mas havia surgido questionamentos a respeito da saída de Paulo da cidade, como por exemplo, por que ele não ficou com o rebanho, mas saiu no meio da perseguição. Alguns estavam dizendo que Paulo era um mercenário interessado apenas no dinheiro que receberia da igreja. Também havia necessidade de Paulo completar o que havia começado a ensinar. Talvez Timóteo tenha trazido alguns dos temas que a igreja gostaria que Paulo concluísse, visto que não pôde por ter sido interrompido pelas perseguições. Paulo, então, escreveu essa carta com o objetivo de explicar porque ele saiu, explicar que suas motivações eram corretas e ainda responder a alguns questionamentos doutrinários que tinham sido feitos, além de completar aquilo que ele não tinha podido terminar quando estava com aqueles irmãos. E um dos assuntos que ele tratou foi a questão da pureza sexual. E, por meio da leitura do texto que sustenta esse capítulo, fica muito claro que ele já tinha falado a respeito disso. Estava, pois, completando o que havia começado. Aqui, ele trata do assunto de maneira direta. Com base nisso, eu quero destacar aqui os pontos do ensinamento de Paulo com o objetivo de aplicá-los ao nosso coração, até porque nossa situação é bastante parecida com a situação dos tessalonicenses. A impureza na época de Paulo e hoje O mundo greco-romano, no qual eles viviam, era um mundo erotizado, onde a imoralidade sexual era vista como algo normal. Os homens casados tinham as suas amantes, e isso era aceitável na sociedade. As escravas serviam como objeto sexual. Também as próprias patroas e as senhoras tinham seus casos amorosos com jovens de aluguel. Não é muito diferente dos escorts6 que existem hoje. A prática da homossexualidade era bastante difundida e aceita no mundo greco-romano, embora houvesse resistência por parte de alguns filósofos como, por exemplo, os estoicos, que achavam que aquele comportamento era inadequado. Todavia, no geral, a sociedade daquela época era bastante permissiva na área sexual. Quando uma pessoa em Tessalônica aceitava o Evangelho e ingressava na igreja, ela era desafiada a mudar completamente esses padrões. Ela era confrontada com um estilo de vida completamente oposto a tudo o que ela, até então, experimentara durante sua vida. Tudo isso não é muito diferente dos nossos dias. Vivemos uma época em que a imoralidade ou a permissividade, a libertinagem na área sexual são largamente espalhadas no mundo ocidental; em que relacionamentos sexuais casuais, traição, ter vários parceiros, enfim, todo tipo de perversão sexual são comportamentos aceitos como se fossem normais dentro da nossa sociedade. E a igreja, quando confrontada, parece que está na contramão da cultura, porque ela é, por assim dizer, o último bastião de resistência. Porém isso não se aplica a todas as igrejas, uma vez que muitas delas já adotaram comportamentos estranhos às Sagradas Escrituras. Num português claro: liberaram geral para a juventude e para os casais. Essas igrejas não abordam esses assuntos sexuais. Preferem dizer que é uma questão pessoal e que solteiros e casados precisam resolver entre si e Deus. Simplesmente essas lideranças não querem se envolver nesse assunto. Mas o cristianismo bíblico rompe com o mundo, com a cultura, caminhando na contramão, não porque ele é chato, mas porque a cultura se desviou dos caminhos de Deus. A cultura foi contaminada, impregnada de valores contrários à Palavra de Deus, e o cristão tem que fazer uma escolha: se ele vai seguir o que a Palavra de Deus diz ou se vai seguir o caminho da cultura, da sociedade, da mídia, dos artistas, do que se propaga por todos os meios. O que vemos aqui é um confronto. Paulo escreve à igreja de Tessalônica e a chama (chamado este que se estende a nós) a tomar uma posição naquela sociedade completamente permissiva, estabelecendo uma separação muito clara entre a igreja e o mundo nessa área da sexualidade. Chamado à santidade Ele começa dizendo que a santificação é a vontade de Deus para nós, como vemos nos versos de um a três. Notemos que ele já havia ensinado isso quando estava com aquele povo. No primeiro verso, Paulo diz: “Finalmente, irmãos, nós vos rogamos e exortamos no Senhor Jesus que, como de nós recebestes, quanto à maneira por que deveis viver e agradar a Deus, e efetivamente estais fazendo, continueis progredindo cada vez mais”. Quando Paulo estava em Tessalônica, ele ensinava àquele povo a maneira pela qual deveria viver e agradar a Deus, porque essa é a função do pastor. Nós não temos outra função. É esse o nosso objetivo. É isso que significa a função pastoral e presbiteral. Pastorese presbíteros são aqueles homens que Deus levantou na igreja para, por meio deles, dizer a ela de que maneira deve viver e agradar a Deus, porque esse é o alvo da nossa existência. Esse é o objetivo da minha vida: agradar a Deus e não a mim mesmo nem às outras pessoas. É claro que se eu puder agradar a Deus e às outras pessoas será ótimo, mas nem sempre isso é possível. Às vezes, temos que escolher a quem vamos agradar. Isso Paulo havia ensinado. Ele diz: “Vocês continuem fazendo isso, eu sei o que vocês estão fazendo, progridam, vão em frente, vocês começaram, mas têm a vida toda pela frente para aprender a viver e agradar a Deus”. No verso dois, Paulo diz: “porque estais inteirados de quantas instruções vos demos da parte do Senhor Jesus”. Mais uma vez ele está se referindo ao templo. Paulo diz que, quando estava com eles, havia dado muitas instruções. O apóstolo não era só um teórico, não era alguém que falava de filosofia ou de aspectos teológicos profundos e misteriosos, embora ele fale disso também, mas a função dele como pastor era ensinar, instruir, dar orientações práticas à igreja sobre como ela deveria viver e agradar a Deus, e isso ele tinha feito. Ele tinha dado essas instruções. Quando ingressamos em uma igreja, tomando parte nela, estamos, claramente, dizendo: “Estamos aqui com o objetivo de servir a Deus com essa comunidade! Queremos nos tornar parte dela. Para tanto, ouviremos o que nos é instruído, o que nos é dito a respeito de como viver e agradar a Deus”. Logo, se é parte do trabalho pastoral instruir a igreja como ela deve viver e agradar a Deus, então faz parte da igreja escutar os seus pastores enquanto eles estão dentro da Palavra de Deus. Enquanto assim eles fizerem, cumpre ouvir, colocar no coração e pôr em prática. Essa é a razão pela qual nós vamos à igreja. Não há outra razão. Nós temos tantas coisas boas quando estamos congregados. Revemos os amigos, os familiares, enfim, é muito agradável. Todavia, se fosse só para isso, poderíamos fazê-lo no clube, não é verdade? Seria até mais agradável. Porém, ao nos reunirmos, somos instruídos pela Palavra de Deus e prestamos culto a ele; ouvimos sua voz e, ao fim do culto, saímos para servi- lo. O mais importante da nossa vida não acontece na igreja, aos domingos, mas na segunda-feira pela manhã até o sábado à noite. O momento que passamos no domingo na igreja é para aprendermos o que devemos fazer de segunda até sábado à noite, quer seja no nosso trabalho, na nossa família, na nossa escola, na nossa vizinhança, no nosso prédio, no nosso negócio, enfim, em todas as áreas da vida. O ensino que temos no domingo, na igreja, é o ponto de partida, entretanto, é na nossa vida de segunda até sábado à noite que viveremos como cristãos. É nela que desenvolveremos e aplicaremos o que aprendemos. Essa digressão que fizemos aqui também é feita pelo apóstolo Paulo e é, por meio dela, que ele prepara o que dirá em seguida, no verso três, que tem relação com a vontade de Deus: “Pois esta é a vontade de Deus: a vossa santificação, que vos abstenhais da prostituição”. Por que ele tinha feito tudo isso? Por que ele tinha ensinado a igreja dessa forma? Porque a vontade de Deus para a igreja é a santificação. Santificação é uma palavra difícil de traduzir, pois ela abarca muitas ideias. Uma delas é a ideia de separação do mundo ou de consagração a Deus. Também tem a ver com os rituais de purificação no Antigo Testamento, em que objetos e pessoas eram consagrados a Deus para o uso dele. É uma palavra prenhe de significados, ou seja, não tem como traduzir por outra que a expresse completamente ou esgote seu significado. Então, poderíamos dizer que santificação significa nos separarmos das práticas contrárias a Deus, ou seja, da maneira de viver contrária a Deus. Significa nos consagrarmos, entregarmo-nos inteiramente a Deus para vivermos de acordo com a vontade dele, voluntariamente, sem reservas. Entregarmo-nos completamente! É isso que a palavra santificação significa. É isso que Paulo diz ser a vontade de Deus. Porém, às vezes, a vontade de Deus nos parece misteriosa. Não sabemos por que determinadas coisas acontecem. Às vezes, morre uma pessoa; um acidente acontece; uma coisa trágica ocorre em uma família, e nós ficamos nos perguntando: “Por quê? Por que isso aconteceu?”. Provavelmente, não teremos resposta neste mundo. A providência de Deus é frequentemente misteriosa, e ele não revela a razão pela qual faz determinadas coisas. O que ele exige de nós é que confiemos que ele é justo, sábio, bom e verdadeiro e que ele nunca fará o que é errado, o que é injusto. Ele nunca agirá de maneira injusta conosco. Ele pede que nós confiemos nele, mesmo que nós não compreendamos. Mas o meu ponto é que há uma vontade de Deus que nos é oculta. Nós não sabemos, mas há uma vontade de Deus declarada, pública e conhecida de todos. Encontraremos no Antigo e no Novo Testamentos vários pontos expressando o desejo, o querer, a vontade e o propósito de Deus. Ele revelou na Bíblia sua vontade para conosco. É claro que se você, leitor, perguntar a mim: “Augustus, qual a vontade dele para minha vida? Deus quer que eu me case ou quer que eu fique solteiro?”, eu, certamente, não terei resposta. É claro que torcerei para você se casar. Ou, se você perguntar: “Deus quer que eu more em Goiânia ou em Brasília, pastor?”. Ora, se dependesse de mim, você moraria na minha cidade, Goiânia, para que fique aqui com a nossa igreja. Você ainda poderia questionar: “Deus quer que eu seja médico ou que eu seja jogador de futebol?”. Sinceramente, eu direi que não sei se Deus quer que você seja médico ou jogador de futebol – desde que você não jogue pelo Corinthians, para mim estará ótimo! Brincadeiras à parte, há muita coisa relacionada com a vida, com as decisões para as quais nós não temos uma resposta direta de Deus. Todavia, uma coisa eu sei: quer você seja jogador de futebol ou médico, quer você vá para Brasília ou Goiânia, quer você case ou fique solteiro, a vontade de Deus sempre vai ser que você seja santo, sempre, seja em Brasília ou em Goiânia, em um consultório ou em um campo de futebol, solteiro ou casado. A vontade de Deus para você será sempre a santificação. Para isso não há questionamento. Não precisamos gastar nosso tempo perguntando: “Será que posso fazer determinada coisa pecaminosa?”. A resposta é NÃO! Ou ainda: “Será que Deus não abriria uma exceção por conhecer a minha situação? É só um errinho!”. Novamente a resposta é NÃO! Ou então: “Deus não sabe meu estado? Eu sou um pecador miserável, eu também tenho as minhas necessidades!”. De novo, a resposta é NÃO! A vontade de Deus é sempre a santificação. Sempre. Sempre. Em todas as circunstâncias. Paulo detalha isso, porque a santificação abrange todas as áreas da nossa vida. Agora, o apóstolo trata de um assunto que ele não deixou terminado, mas em aberto com aquela igreja, que era a questão da vida sexual. Como é possível notar, na segunda parte do verso três, ele diz: “[...] que vos abstenhais da prostituição”. Então, a partir desse ponto, ele se dedica à questão da santificação na área sexual. Não é muito perceptível na tradução portuguesa, mas na língua original é possível notar três pontos que Paulo pode ter colocado. Primeiro (verso 3b): “[...] que vos abstenhais da prostituição”. Segundo (versos 4 e 5): “que cada um de vós saiba possuir o próprio corpo em santificação e honra, não com o desejo de lascívia, como os gentios que não conhecem a Deus”. Terceiro (verso 6): “e que, nesta matéria, ninguém ofenda nem defraude a seu irmão; porque o Senhor, contra todas estas coisas, como antes vos avisamos e testificamos claramente, é o vingador”. Sendo assim, dentro da área de santificação, entrando na área sexual, Deus tem três orientações: a primeira é abster-se da prostituição; a segunda é possuir o corpo da maneira certa; e a terceira é não ofender ninguém nessa área. Veremos cada uma dessas áreas abordadas por Paulo e, ao fim, receberemos quatro encorajamentos e aplicações apresentados por
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