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Etica nas Organizações - IPEMIG

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ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
BELO HORIZONTE / MG 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
2 
 
SUMÁRIO 
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS E CONCEITOS ........................................................ 4 
2. TEORIAS DA OBRIGAÇÃO MORAL .................................................................... 11 
2.1. Moral como busca do supremo bem ................................................................. 11 
2.2. Teorias da Obrigação Moral .............................................................................. 12 
2.3. Realização da Moral ......................................................................................... 13 
2.4. Forma Lógica dos Juízos Morais ....................................................................... 13 
2.5. Obrigatoriedade do Comportamento Moral ....................................................... 14 
2.6. Justificação Moral ............................................................................................. 14 
3. VALORES ............................................................................................................ 17 
3.1. Valores: o que são? .......................................................................................... 17 
3.2. Ética e Religião ................................................................................................. 24 
4. RELAÇÃO DA ÉTICA COM OUTRAS CIÊNCIAS ................................................ 27 
4.1. Filosofia............................................................................................................. 27 
4.2. Psicologia .......................................................................................................... 27 
4.3. Sociologia ......................................................................................................... 28 
4.4. Antropologia ...................................................................................................... 28 
4.5. História .............................................................................................................. 29 
4. 6. Economia ......................................................................................................... 29 
4.7. Direito ............................................................................................................... 30 
4.8. Outras ciências ................................................................................................. 33 
5. VIDA EM SOCIEDADE ......................................................................................... 34 
5.1. Deveres Éticos na Família ................................................................................ 34 
5.2. Ética e Comunidade .......................................................................................... 35 
5.3. Ética e Sociedade ............................................................................................. 36 
5.4. O Estado ........................................................................................................... 37 
6. A ÉTICA E A COMUNICAÇÃO DE MASSA.......................................................... 43 
6.1. Os Meios de Comunicação de Massa ............................................................... 43 
6.2. Marketing .......................................................................................................... 44 
6.3. Publicidade ....................................................................................................... 44 
6.4. Propaganda ...................................................................................................... 45 
6.5. Imprensa ........................................................................................................... 47 
6.6. Ética e Comunicação de Massa ........................................................................ 49 
7. A ÉTICA E A EMPRESA ...................................................................................... 53 
7.1. A ética e a organização ..................................................................................... 53 
7.2. Responsabilidade social corporativa ................................................................. 58 
7.3. Educação corporativa........................................................................................ 60 
7.4. Temas emergentes: responsabilidade global .................................................... 61 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
3 
 
8. ASSÉDIO MORAL ................................................................................................ 63 
8.1. O Assédio ......................................................................................................... 63 
8.2. Manobras do Assédio........................................................................................ 65 
8.3. Assédio Organizacional ..................................................................................... 68 
9. CÓDIGOS DE ÉTICA ........................................................................................... 72 
9.1. Instituições e Códigos de Ética ......................................................................... 72 
9.2. Construção de Código de Ética ......................................................................... 74 
10. PALAVRAS FINAIS ............................................................................................ 76 
11. REFERÊNCIAS.................................................................................................. 77 
 
 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
4 
 
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS E CONCEITOS 
 
Caro aluno, 
Cá estamos em nosso primeiro encontro sobre um tema sempre palpitante, 
muito falado, pouco compreendido e duvidosamente aplicado; ainda mais hoje em 
dia, quando a fartura e velocidade de veículos de informação nos bombardeiam com 
notícias sobre esta e aquela ação praticada por alguém, muitas vezes já emitindo 
um julgamento, ou direcionando o julgamento do receptor pelas expressões usadas, 
para condenar, absolver ou enaltecer. As interpretações e julgamentos que você faz 
sobre (ou talvez fosse mais apropriado dizer sob) essa maré de informações 
acontece em conformidade com uma tábua de valores que você adota: quando 
coincidentes, são considerados positivamente; quando divergentes, são 
considerados negativamente. E fala-se em ética para cá, ética para lá, em 
imoralidade, em valores (financeiros, morais, afetivos?), mas os conceitos ficam em 
terreno movediço e coberto por névoa, de modo a ser quase um vale-tudo na hora 
de empregar tal ou qual expressão. 
Neste primeiro encontro, pretendemos ajudá-lo a: conceituar ética e moral; 
identificar o campo de atuação de cada uma; e identificar as condições de existência 
do ato moral. Vamos, então, aventurar-nos primeiro no campo dos conceitos. 
 A ética está presente em todos os discursos. Em toda invocação referente à 
busca da conduta correta, ela é citada, mesmo que por pessoas cujo 
comportamento não seja lá muito correspondente aos seus ditames. 
 Certas expressões tornaram-se tão presentes nos pronunciamentos que se 
pode considerar quase terem virado clichês: CIDADANIA, ÉTICA, LIBERDADE, 
IGUALDADE, DIGNIDADE, JUSTIÇA, PAZ SOCIAL, DIREITOS HUMANOS, 
DEMOCRACIA, CULTURA, INCLUSÃO, IDENTIDADE, SOLIDARIEDADE e outras. 
O apelo frequente a tais expressões, nos mais variados contextos, buscando 
valer-se da carga emocional que encerram, banaliza-as e subverte o seu sentido, 
tornando-as “coringas” com o intuito de aumentar a capacidade de convencimento 
pela retórica. 
 Como bem diz José Renato Nalini (2008, p.25-26), são expressões que se 
impregnam de sentimento, distanciam-se do sentido racional. Seu enunciado tem a 
complexidade própria das questões filosóficas. Quanto mais numerosos sejam os 
sentidos conceituais para definir uma noção que simbolize um valor, mais confusa 
essa noção parece. A banalização de seu uso acaba por fazer delas conceitos ocos, 
esua repetição pode produzir efeito contrário ao desejado – em lugar de inflamar o 
público, causam-lhe aversão. 
A hipersimplificação vocabular e a atribuição de significados totalmente 
distintos dos usuais para palavras e expressões (por exemplo, o termo irado, de 
equivalente a enfurecido passa a ser entendido como na moda, bacana) 
assemelham-se à novilíngua (ORWELL, 1984); a verborragia ou a hipersimplificação 
polissêmica permitem à linguagem ser vaga e dar margem às interpretações mais 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
5 
 
convenientes para o momento, no melhor estilo do duplipensar descrito por Orwell 
em seu 1984. 
Duplipensar quer dizer a capacidade de guardar simultaneamente na 
cabeça duas crenças contraditórias, e aceitá-las ambas. (...) até os 
nomes dos quatro Ministérios por que somos governados ostentam 
uma espécie de imprudência na sua deliberada subversão dos fatos. 
O Ministério da Paz ocupa-se da guerra, o da Verdade, com as 
mentiras, o do Amor com a tortura e o da Fartura com a fome. Essas 
contradições não são acidentais, nem resultam de hipocrisia 
ordinária: são exercícios conscientes de duplipensar. Pois é só 
reconciliando contradições que se pode reter indefinidamente o poder 
(ORWELL, 1984, p.200-202). 
 
Nessa profusão de discursos em que se empregam expressões fortes num 
vazio de sentido, o conceito que essas expressões representam esvazia-se. A 
verborragia do politicamente correto mostra-se discurso vazio na medida em que se 
mostra tão grande preocupação em esmiuçar o que se diz para supostamente não 
ferir suscetibilidades e, ao fim e ao cabo, alimentar a discriminação em detrimento 
da consideração de todos como pertencentes à mesma humanidade. 
 
Exemplos históricos existem à farta, de se proclamar a paz 
promovendo ações belicosas, ou de atribuir ao agredido a agressão 
que lhe era feita. “É paradoxal assistir à proclamação enfática dos 
direitos humanos, simultânea à intensificação do desrespeito por 
todos eles (NALINI, 2008, p.26)”. 
 
O que é cidadania? É só saber cantar o Hino Nacional, é só comparecer aos 
locais de votação nos dias determinados, é lembrar-se somente de direitos reais ou 
supostos, e dos deveres e proibições quando conveniente? 
 O que é igualdade de oportunidade? É priorizar um grupo para determinados 
benefícios em detrimento de outro, em nome de alguma espécie de “retratação 
histórica” quando as circunstâncias que produziram a anterior segregação não mais 
existem? É atribuir alguma espécie de benefício diferenciado mercê de fatores não-
controláveis pelo indivíduo, tais como aqueles do fenótipo? Ou é possibilitar às 
pessoas um mesmo ponto de partida, em paridade de condições de progressão? 
 O que é identidade? É a afirmação de determinados elementos socialmente 
construídos com a exclusão do que lhes seja diferente, ou é aquilo que permite 
reconhecer a peculiaridade de um indivíduo ou grupo que se integra a um grupo 
social maior? 
 O que é ética, o que é moral, o que é ser ético? Se os conceitos devem 
evoluir, até que ponto essa evolução arrisca-se a caminhar para uma polissemia 
manejável de modo a ser conveniente para os objetivos de cada emissor? 
 Todas essas perguntas, como você notou, estão interligadas. Cidadania é a 
participação ativa na vida da polis, zelando pelos seus direitos, sim, mas cumprindo 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
6 
 
os deveres, que visam ao bem da coletividade. Igualdade de oportunidade é 
assegurar o máximo de objetividade ao verificar o que a pessoa sabe e é capaz de 
fazer, independentemente de ser homem, mulher, ser narigudo, ter orelhas de abano 
ou crer no poder redentor da bolinha de gude amarela. Identidade é reconhecer-se 
único, rodeado por outros com seus próprios gostos, desejos e saberes e igualmente 
dignos de buscar a felicidade. E a ética envolve essa igualdade de oportunidade e 
de observância de direitos e deveres por um indivíduo identificável como único 
naquele grupo social. 
Vejamos, inicialmente, como se pode conceituar ética e moral. São dois 
conceitos que têm forte semelhança em sua etimologia, pois ethos, em grego, e 
mores, em latim, significam “costumes”. Referem-se, portanto, a comportamentos 
dos seres humanos em sociedade. E você já notou, em seu tempo de vida, que no 
seu grupo social existem vários tipos de regras: leis, que preveem punições para os 
casos de descumprimento; regras do trato social, que geralmente permitirão sua 
convivência sem grandes choques com os outros; e as regras morais, 
recomendando condutas que se enquadram no modelo “bom” daquela sociedade. 
Uma análise bem abrangente dos conceitos de ética e moral é de Luciano 
Zajdsznajder: 
 
 As duas expressões buscam captar algo que é complexo e multifacetado: um 
todo que contém pelo menos as seguintes partes: 
 Um conjunto de normas codificadas ou não sobre como devem se 
conduzir as pessoas e as instituições nas diversas situações que se 
apresentam na vida, servindo para distinguir o que é um bom ou um 
mau comportamento e estabelecendo de algum modo o que seria um 
comportamento correto ou ideal; 
 Um conjunto de ideias acerca de como deve ser conduzida a vida 
humana para que seja considerada boa ou feliz; 
 A maneira como as pessoas e instituições comportam-se realmente na 
prática; 
 A reflexão e o raciocínio que ocorrem quando se tomam decisões ou 
se resolve agir, segundo o que é correto ou incorreto, no sentido de 
bom ou mau; 
 Os sentimentos das pessoas diante de seus próprios comportamentos 
ou de outros, como vergonha, remorso, piedade, orgulho; 
 As reflexões sobre a origem das normas, o seu fundamento, a sua 
justificativa (ZAJDSZNAJDER, apud AMOÊDO, 2007, p.18). 
 
Como diz Yves de la Taille (2006, p.26), a preocupação em distinguir moral e 
ética explica-se pelo fato de muitas pessoas verem na palavra “ética” um conceito 
cheio de promessas filosóficas, um rico campo de reflexões e atitudes nobres, sendo 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
7 
 
a moral um pobre conjunto de ditames, nem sempre compatível com os interesses 
dos membros do grupo social. Segundo esse autor, o sucesso do vocábulo “ética” 
pode ser relacionado ao fracasso de seu irmão etimológico, “moral”. Moral é 
associada a “moralismo”, “moralista”, lembrando “normatização incessante, 
dogmática, de abrangência excessiva, de legitimidade suspeita e seu militante, esse 
normatizador e vigia contumaz da vida alheia (LA TAILLE, 2006, p.27) ”. 
 Moralista, em sentido clássico, é o estudioso da moral. Modernamente, é 
esse vigilante da conduta alheia. Naturalmente, você já teve contato com algum (ou 
mesmo vestiu a máscara de) “moralista”, pregando para outros uma pureza que nem 
sempre encontra eco no pregador. Será coerente, será moralmente válido pautar-se 
por “faça o que eu digo, não o que eu faço”? 
Principalmente graças aos “moralistas”, a palavra moral é suspeita porque 
fala em normas; mas, se prestarmos atenção às atuais referências à “ética”, 
veremos que são tão normativas quanto aquelas associadas à moral. As frequentes 
referências atuais à ética parecem mais relacionadas a uma demanda por normas, 
por limites, por controle. Ao se falar em ética na profissão, ao se construírem 
códigos de ética ou comitês de ética para diversas atividades humanas, trata-se na 
verdade de regras de conduta, ou seja, fala-se muito em ética pensando em moral, 
devido a uma percepção de deterioração nas relações sociais, de banalização da 
desonestidade, das incivilidades e da violência, enfim, de uma falta de parâmetros 
nos costumes (desregramento). 
Mas será que a multiplicação das normas resolve o problema? Salta aos 
olhos que, mais do que a quantidade de normas, o que realmente conta para a vida 
em sociedade é a sua observância – que só é viável sem coerção se as normas 
forem entendidas como legítimas. Uma quantidade muito grande de normas, muitas 
vezes referindo-se a minúcias, pode, por um lado,engessar o seu cumpridor e, por 
outro, tornar viável a transgressão a partir de suas contradições e brechas (o que 
não é proibido é tacitamente permitido; ou, quando duas normas entram em conflito, 
tende-se a ir para a que dá menos restrições). 
 Segundo Yves de la Taille, a convenção mais adotada para diferenciar o 
sentido de moral do de ética é reservar o primeiro conceito para o fenômeno social, 
e o segundo para a reflexão filosófica ou científica sobre ele. Todas as comunidades 
humanas são regidas por um conjunto de regras de conduta, por proibições de 
vários tipos cuja transgressão acarreta sanções socialmente organizadas. Portanto, 
toda organização social humana tem uma moral. Mas, como todo fenômeno social, 
indaga-se sobre ela para melhor compreendê-la. 
Como a moral trata de normas de conduta, há que se indagar para conhecer 
suas origens, seus fundamentos, sua legitimidade: é trabalho da filosofia. No 
entanto, sendo a moral objeto de um estudo científico, pode-se procurar traçar a 
história dos diversos sistemas morais (trabalho da história), pode-se procurar 
compreender as condições sociais que os tornam possíveis ou até necessários 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
8 
 
(trabalho da sociologia), pode-se procurar desvendar os processos mentais que 
fazem com que os homens os legitimem (trabalho da psicologia), entre outras 
possibilidades de análise. A esse trabalho de reflexão filosófica e científica é que se 
costuma dar o nome de ética. 
 Essa diferença de sentido entre moral e ética é interessante. Por um lado, 
permite nomear diferentemente o objeto e a reflexão que incide sobre ele; por outro, 
permite notar que se pode viver uma moral tem nunca ter se dado ao trabalho da 
reflexão ética (LA TAILLE, 2006, p.26). Mas é bom lembrar que esta diferenciação é 
apenas uma convenção. Há autores que consideram as duas expressões sinônimas. 
 Um autor que segue a ideia de diferentes sentidos para moral e ética é 
Adolfo Sánchez Vázquez: “Ética é a ciência do comportamento moral dos homens 
em sociedade (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, p.23, grifo do autor) ”. O objeto da ética 
é a moral, conjunto de normas adquiridas pelo hábito reiterado de sua prática. A 
ética procura extrair dos fatos morais os princípios gerais a eles aplicáveis. A ética é 
mais direcionada a uma reflexão sobre os fundamentos do que a moral, que tem 
sentido mais pragmático. A moral é, por assim dizer, a matéria-prima da ética. 
O objeto de estudo da ética é constituído pelos atos conscientes e voluntários 
dos indivíduos e que afetam outros indivíduos, determinados grupos sociais ou a 
sociedade em seu conjunto (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, p.24). Os agentes morais 
são indivíduos reais que fazem parte de uma comunidade, e seus atos são morais 
somente se considerados nas suas relações com os outros. 
O homem diversifica seu comportamento de acordo com o objeto com o qual 
entra em contato e também com o tipo de necessidade que procura satisfazer, 
dependendo das condições históricas concretas. A moral é um fato histórico e a 
ética, como ciência da moral, tem de considerá-la como um aspecto da realidade 
humana mutável com o tempo. A moral é histórica porque é um modo de comportar-
se de um ser histórico por natureza, o qual constantemente se recria tanto no plano 
de sua existência material, prática, como no de sua vida espiritual – que inclui a 
moral (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, p.37). 
 A ética estuda a variedade e evolução das morais no tempo e no espaço, 
com seus respectivos valores, princípios e normas. Por buscar construir teorias que 
compreendam princípios gerais, não se identifica com os princípios e normas de 
nenhuma moral em particular e também não pode adotar uma atitude indiferente 
diante das morais que estuda. Além de explicar suas diferenças, deve investigar o 
princípio que permita compreendê-las no seu movimento e no seu desenvolvimento 
(SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, p.22). 
 A ética [como ciência que é] nos diz o que é a norma moral, mas não postula 
ou não estabelece normas; estuda um tipo de conduta normativa, mas não é o 
teórico da moral, e sim o homem real, que estabelece determinadas regras de 
comportamento. (...) A moral, pois, tem por base determinadas condições históricas 
e sociais, assim como determinada constituição psíquica e social do homem. Cabe à 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
9 
 
ética examinar as condições de possibilidade da moral (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, 
p.103-104). 
 Não se pode conceber moral sem que haja vida em sociedade; portanto, todo 
ato moral só pode ser assim considerado inserido na relação entre seres, praticado 
por um (uns) e refletindo-se sobre outro (s). Todo sistema moral contém deveres 
para com outrem, e esse costuma ser o foco principal na busca de um projeto de 
felicidade. A moral “não diz o que é ser feliz nem como sê-lo, mas sim quais são os 
deveres a serem necessariamente obedecidos para que a felicidade individual tenha 
legitimidade social (LA TAILLE, 2006, p.60) ”. 
A necessidade de ajustar o comportamento de cada membro aos interesses 
da coletividade leva a que se considere como bom ou proveitoso tudo aquilo que 
contribui para reforçar a união ou a atividade comum e, ao contrário, que se veja 
como mau ou perigoso o oposto; ou seja, o que contribui para debilitar ou minar a 
união; o isolamento, a dispersão dos esforços, etc. (...) O que mais tarde se 
qualificará como virtudes ou vícios acha-se determinado pelo caráter coletivo da vida 
social (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, p.40). 
A ética é uma disciplina descritiva, ao buscar descrever a forma como as 
pessoas agem e explicam sua ação, em termos de julgamentos de valor e 
pressuposições; e é uma disciplina normativa, no sentido de descobrir e elucidar 
normas, estudando as formas como as pessoas devem agir e analisando os 
julgamentos de valor e pressuposições que justificam tais ações. “Seu conteúdo 
mostra às pessoas os valores e princípios que devem nortear sua existência. A ética 
aprimora e desenvolve o sentido moral do comportamento e influencia a conduta 
humana (NALINI, 2008, p.30) ”. A ética é uma ciência voltada para a atualização ou 
experiência de valores, e as normas, que ela procura descobrir e elucidar, 
pressupõem valoração. 
 
“Norma é regra de conduta que postula dever. Todo juízo 
normativo é regra de conduta, mas nem toda regra de conduta é uma 
norma, pois algumas das regras de conduta têm caráter obrigatório, 
enquanto outras são facultativas (NALINI, 2008, p.30-31) ”. 
 
Regras de ordem prática, que exprimem uma necessidade condicionada, se 
incluem no conceito de regras técnicas, ou seja, preceitos que assinalam meios para 
a consecução de finalidades. As normas, diferentemente das regras técnicas, são 
preceitos cuja observância implica um dever para o destinatário, independentemente 
das especificidades. 
 A noção de norma pode ser mais bem compreendida ao ser comparada com 
a de lei natural. As leis naturais ou físicas têm fim explicativo e são suscetíveis de 
serem provadas por fatos. As normas têm fim prático, pretendem provocar um 
comportamento, valem independentemente de sua observância ou violação. A 
norma exprime um dever, dirigindo-se a seres capazes de cumpri-la ou de violá-la. 
Funda-se no pressuposto filosófico da liberdade, pelo que não há relação necessária 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
10 
 
entre validez (a norma vale para todos) e eficácia (capacidade de fazer cumprir, ou 
materializar a validez) da norma. 
 Vários autores, como Max Weber e Jean Piaget, apontam para diferentes 
formas de o ser humano relacionar-se com as normas: a anomia, ou ausência de 
norma, pode-se dizer que corresponde a um estágio caótico de inconsciência, ou, 
numa expressão freudiana, ao império do id; a heteronomia pode-se dizer 
corresponder a um estágio no qual se tem consciência da necessidade de normas, 
mas as normas são dadas por outrem, ou, na trilha de Freud, uma autoridade 
externafazendo as vezes do superego impõe as normas; e a autonomia 
corresponde a uma situação na qual o ser lida com as normas vigentes e constrói 
também aquelas que percebe como capazes de propiciar-lhe satisfatória convivência 
na sociedade; ou, o ego e o superego balanceiam-se para operar a conduta. 
 Algumas interpretações da ética como ciência normativa partem da ideia de 
que sua missão é dizer ao ser humano o que deve fazer, ditando-lhe as normas ou 
princípios pelos quais pautar seu comportamento. Mas a função fundamental da 
ética é a de toda teoria: explicar, esclarecer ou investigar uma determinada 
realidade. 
 Ao longo destas páginas, pudemos ter contato com alguns conceitos sobre 
ética e moral, que ajudaram você a entender as semelhanças e diferenças entre 
uma e outra; a perceber que a moral, sendo socialmente construída, insere a ciência 
que a estuda (ética) no rol das ciências sociais; e a notar que o ato moral, 
essencialmente humano, tem determinadas condições a serem atendidas para ser 
identificado como tal. Após este contato com os conceitos, veremos algumas teorias 
referentes à obrigatoriedade moral. 
 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
11 
 
2. TEORIAS DA OBRIGAÇÃO MORAL 
 
 Após passearmos pelos conceitos de moral e de ética, vamos fazer uma 
visita às teorias da obrigação moral. Como pudemos ver, a ética é uma ciência de 
caráter normativo, tendo por objeto de estudo a moral, ou seja, as normas que 
regem os costumes de determinado grupo social, os imperativos a cujo cumprimento 
o indivíduo percebe-se obrigado. E essa obrigatoriedade será definida por diferentes 
intérpretes, em diferentes momentos históricos, sendo cada concepção 
complementar às demais. 
Neste encontro, pretendemos ajudá-lo a identificar as principais teorias da 
obrigação moral e a caracterizar as concepções éticas fundamentadas no dever e na 
responsabilidade. 
 
2.1. Moral como busca do supremo bem 
O ser moral busca a plena realização moral, ou seja, aquilo que tenha o maior 
valor moral, o summum bonum. A ética intenta orientar a busca da conduta virtuosa, 
ou aquela que é orientada para o bem comum. Vejamos, então, algumas 
concepções que se refletem na forma como interpretaremos e aplicaremos a moral. 
 Aristóteles foi o primeiro a sustentar que a felicidade é o mais alto dos bens e 
que a ela todos os homens aspiram. 
 Para os estoicos, o supremo bem é a virtude. 
 Para os epicuristas, o bem supremo é o prazer, natural e necessário, 
consentâneo com o que Freud perceberia como o princípio do prazer: tendemos a 
buscar o que nos traz sensações e sentimentos agradáveis e a evitar o que nos dá 
sensações e sentimentos desagradáveis. 
 
 Moral absoluta: seus defensores creem na validez atemporal e 
absoluta dos princípios. A partir dela, constrói-se a ética dos valores ou 
deontológica. Segundo ela, todo dever baseia-se em um valor. Um dos 
seus grandes nomes é Kant. 
 
Segundo Kant, o bom é a boa vontade (concepção formalista e apriorística do 
bom); o bem atuar é mais importante do que a razão. Kant apresenta um imperativo 
categórico: “age só segundo uma máxima tal que possas querer ao mesmo tempo 
que se torne lei universal (apud NALINI, 2008, p.71) ”. 
 
 Moral relativa: validez empírica, acorde com a subjetividade. A partir 
dela, constrói-se a ética dos fins ou teleológica. O valor é dado pelas 
consequências do ato. Uma de suas vertentes é o utilitarismo. 
 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
12 
 
Para Bentham, o grande nome do utilitarismo, ou da ética do interesse, o bom 
é o útil (Útil para quem? E em que consiste o útil?). O bom pode ser encontrado na 
relação entre os interesses pessoais e coletivos. 
 As obrigações morais são os diques ou freios socialmente construídos de 
modo a impedir o autoesmerilhamento social que decorreria da assunção de uma 
percepção pura e simples das pessoas como presas (ou predadoras) umas das 
outras. E para tornar viável o cumprimento das normas, empregam-se mecanismos 
de caráter político (mais usualmente, refletindo-se em marginalização na polis) e 
simbólico (como, por exemplo, a não-concessão de um documento que credenciaria 
seu possuidor a determinadas benesses – diploma, certificado de quitação com o 
serviço militar etc.). Eis aí o ponto de partida para as teorias da obrigação moral. 
 
2.2. Teorias da Obrigação Moral 
 Basicamente, consideramos dois grandes campos teóricos para a ética: o 
das concepções deontológicas e o das concepções teleológicas. 
 
2.2.1. Deontológicas (do dever) 
As teorias desta linha relacionam a obrigação moral com normas previamente 
estabelecidas. 
 Do ato. O caráter específico de cada situação ou ato impede de apelar 
para uma norma geral; daí o guia tem de ser a própria consciência 
(“intuir” o correto). 
 Da norma. Há normas gerais que indicam o dever. Assim, a ação deve 
dar-se de acordo com uma máxima universalizável 
 
2.2.2. Teleológicas (dos objetivos) 
As teorias teleológicas relacionam a obrigação moral com as suas 
consequências – a vantagem ou benefício (individual ou coletivo). 
 
 Egoísmo ético: “Deves fazer o que te traz o maior bem, 
independentemente das consequências que derivem para os outros”. 
 Utilitarismo: “Deves fazer aquilo que beneficia, fundamentalmente, os 
outros, ou o maior número de pessoas”. 
 
 Do ato: o melhor ato é o que beneficia o maior número de pessoas. 
 Da norma: o melhor ato é o praticado de acordo com a norma cuja 
aplicação garanta o maior bem para o maior número. 
 
Como você notou, corroborando o caráter histórico da moral, nenhuma das 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
13 
 
doutrinas da obrigação moral é capaz de indicar o que o homem deve fazer em 
todos os tempos e em todas as sociedades (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, p.179-
202). Mas é a sua complementaridade que reflete a busca de uma orientação que se 
reflita no bem comum com a maior frequência possível. 
 A linha teórica deontológica é também conhecida como “ética da convicção”, 
que parte de valores e imperativos previamente estabelecidos e considerados 
atemporais ou de ideais a atingir, e o ato é avaliado segundo a sua coerência com 
tais princípios; e a teleológica, como “ética da responsabilidade”, que se baseia na 
análise das circunstâncias e dos fatores condicionantes com vistas aos resultados 
dos atos morais; neste caso, portanto, as consequências é que são objeto da 
avaliação. 
 
2.3. Realização da Moral 
Adolfo Sánchez Vázquez (2002, p.217-233) apresenta três tipos de instâncias 
ou fatores sociais que contribuem de maneira diversa para a realização da moral: 
 Relações econômicas, ou vida econômica da sociedade: 
compreendendo tanto a própria produção material quanto as relações 
sociais que os homens nela contraem. 
 Estrutura ou organização social e política da sociedade: inserção numa 
família, numa classe social e como cidadão de um Estado ou 
organização política e jurídica à qual está sujeita a população de um 
território. 
 Estrutura ideológica, ou vida espiritual da sociedade. 
 
2.4. Forma Lógica dos Juízos Morais 
 x é y. Forma enunciativa, na qual x (substantivo: pessoa ou ação) é 
caracterizado por y (adjetivo), que exprime uma propriedade, possuída 
em relação com uma finalidade ou necessidade. Exprime um juízo 
factual, ou juízo de valor. 
Exemplo: Roubar é errado. Flávio é uma pessoa honrada. 
 
 x é preferível a y. Forma preferencial. Comparação entre atos 
valorados em relação a certa necessidade ou finalidade humana e 
tomando em consideração determinadas condições ou circunstâncias 
concretas, considerando um ato mais valioso que o outro. 
Exemplo: Redigir seu trabalho é preferível a (melhor que) fazer uma 
colagem da internet. 
 
 Você deve fazer x (faça x). Forma imperativa. A norma não é uma 
expressão ou registro de um fato, ela exige a realização daqueles que 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
14 
 
devem cumpri-la. Sua validade independedo seu cumprimento ou do 
grau em que ele ocorra. Aquilo que se julga dever ser realizado é 
sempre considerado valioso. Os juízos expressos na forma imperativa 
têm por objetivo regulamentar as relações entre os homens numa 
sociedade. 
Exemplo: Ajude o colega em dificuldades (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 
2001, p.237-243). 
 
2.5. Obrigatoriedade do Comportamento Moral 
O comportamento moral é obrigatório e devido; o agente é obrigado a 
comportar-se de acordo com uma regra ou norma de ação e a excluir ou evitar os 
atos proibidos por ela. Por conseguinte, a obrigatoriedade moral impõe deveres ao 
sujeito. Conforme visto anteriormente, toda norma funda um dever. 
Diferentemente doutras formas de comportamento humano (como a jurídica 
ou a do trato social), a vontade do agente moral é livre. Por outro lado, mercê dessa 
liberdade de escolha, tais normas devem ser respeitadas por causa de uma 
convicção interior, e não por uma conformidade exterior. 
 Os traços essenciais da obrigatoriedade moral que permitem distingui-la 
de outras formas de obrigação ou de imposição são: 
 A liberdade na prática do ato: a causa do ato está no próprio agente 
(ou causa interior), e não em uma causa exterior que o force a agir de 
certa maneira, contrariando a sua vontade; 
 A consciência (do agente) quanto ao seu comportamento: o sujeito não 
ignora nem as circunstâncias nem as consequências da sua ação; e 
 O caráter social, ou seja, o reflexo sobre o grupo. 
 
Esses traços devem ser considerados ao analisar o ato em sua natureza, e 
permitem atribuir responsabilidade ao agente pelo ato. 
 
2.6. Justificação Moral 
O verdadeiro comportamento moral não se exaure no reconhecimento de 
determinado código por parte dos indivíduos; ele demanda – e a isto tende o 
progresso moral – a justificação racional das normas que se aceitam e se aplicam. A 
ética procura saber se é possível uma justificação racional da moral e, 
particularmente, dos seus juízos de valor e das suas normas, e quais seriam – se 
esta justificação é possível – as razões ou os critérios justificativos que se poderiam 
aduzir (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, p.249). 
Critérios de justificação moral, segundo Sánchez Vázquez (2002, p.253-259): 
I – Justificação social: toda norma corresponde a interesses e necessidades 
sociais, o que condicionará sua validade para a sociedade em questão. 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
15 
 
II – Justificação prática: toda norma implica uma exigência de realização; 
assim, devem existir na sociedade as condições necessárias para o cumprimento da 
norma. 
III – Justificação lógica: as normas não existem isoladas; fazem parte de um 
conjunto articulado que é o código moral da sociedade, que deve caracterizar-se 
pela não contraditoriedade de suas normas e pela sua coerência interna. 
IV – Justificação científica: uma norma se justifica cientificamente quando 
não só se adapta à lógica, mas também aos conhecimentos científicos já 
estabelecidos. 
V – Justificação dialética: uma norma moral se justifica dialeticamente 
quando contém aspectos ou elementos que, no processo ascensional moral, se 
integram em um novo nível numa moral superior. 
 
É possível superar o relativismo ético quando se consegue justificar os juízos 
morais? O relativismo ético parte do princípio de que diferentes comunidades julgam 
o mesmo tipo de atos de maneiras diferentes, ou postulam normas morais diferentes 
perante situações semelhantes, e a causa dessas diferenças deve ser buscada na 
diversidade de interesses e necessidades das várias comunidades. 
 O relativismo ético proclama, portanto, que os juízos morais, relativos a 
diferentes grupos sociais ou comunidades, e que, por conseguinte, são diferentes 
entre si e, inclusive, contraditórios, justificam-se pelo contexto social correspondente. 
Mas este relativismo não se limita a justificar um juízo moral pela relação com a 
comunidade na qual se formula, mas considera que um juízo diferente, ou até 
oposto, será igualmente correto, porque também corresponde a necessidades e 
interesses. Cada juízo moral ficaria justificado por esta referência e, portanto, todos 
seriam igualmente válidos. Tal é o núcleo do relativismo no terreno moral 
(SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, p.259). 
 Mas o fato de duas normas sobre o mesmo fator referirem-se a diferentes 
necessidades sociais não significa que sejam igualmente válidas. A validade será 
dada pela capacidade de a norma transcender os limites daquela comunidade 
específica, pois afeta as interações com outras comunidades. Assim, a justificação 
social não basta para evitar o relativismo. Da mesma forma ocorre com a justificação 
prática, já que as condições de cumprimento da norma também variarão. A 
exigência de coerência e não contraditoriedade também é insuficiente, pois, “se se 
considerasse suficiente este critério, resultaria que duas normas opostas entre si, 
mas igualmente coerentes e não contraditórias com os seus respectivos códigos, 
teriam a mesma validade (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, p.259-261) ”. 
Quando aplicamos o critério da justificação científica, começamos a ter 
elementos para superar o relativismo, pois não se pode justificar uma norma que 
derive de uma premissa cuja falsidade a ciência tenha demonstrado. Ainda assim, 
por não se tratar de um critério especificamente ético, a concordância do juízo moral 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
16 
 
com o conhecimento científico não basta para justificar o grau de validade de uma 
norma ou de um código além das necessidades ou das condições sociais a que 
correspondem. 
É o critério de justificação dialética, que, situando uma norma em um código 
num processo histórico ascensional, permite, de um lado, reconhecer a relatividade 
da moral, e, do outro, admitir a existência de elementos positivos que extrapolam as 
limitações e particularidades das necessidades sociais da comunidade e das 
condições reais que explicam a aparição e a aplicação das normas morais 
(SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, p.262-263). 
 Após termos passeado por definições de ética e moral e pelas teorias que 
buscam explicá-las, voltamos a invocar Yves de la Taille, que define como moral os 
sistemas de regras e princípios que respondem à pergunta “como devo agir? ”, e 
como ética as respostas à pergunta “que vida eu quero viver? ” (LA TAILLE, 2006, 
p.49-58). Essa definição nos traz ao tema dos valores, de que trataremos no 
próximo encontro. 
 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
17 
 
3. VALORES 
 
Após passearmos pelos conceitos de moral e de ética, vamos incursionar pelo 
terreno do seu fundamento: os valores. Veremos que valorizar é atribuir significado. 
Atribuir significado é função eminentemente humana, variável historicamente, 
geograficamente e mesmo individualmente. Para Humberto, chegar lá é o mais 
importante; para Artur, como chegar lá, em termos materiais, tem mais importância; 
para Emílio, como chegar lá, em termos morais, é mais relevante; para Ernesto, o 
que “chegar lá” vai provocar tem maior peso; para João, por que chegar lá é o maior 
destaque; para José, quem chega lá é mais importante. Priorizar objetivos, 
processos, recursos materiais, pessoas, princípios, resultados depende de cada 
agente. 
Conforme você se paute pela moral do sucesso, da convicção, da parceria, do 
oportunismo, da utilidade, da parcialidade ou da responsabilidade (e isso decorre da 
sua própria história de vida), por essa moral tendem a ser orientadas as suas 
decisões e modos de agir. Vejamos. 
 
3.1. Valores: o que são? 
Como já vimos, Yves de la Taille define como moral os sistemas de regras e 
princípios que respondem à pergunta “como devo agir?”, e como ética as respostas 
à pergunta “que vida eu quero viver?”. “Como agir” remete-nos às normas, aos 
preceitos da vida em sociedade. E “que vida viver” remete-nos à busca da vida boa. 
Os qualificativos bom ou mau exprimem valoração, ou seja, significados que o ser 
humano atribui aosatos e às suas consequências. O estudo e interpretação dos 
valores é chamado AXIOLOGIA, e tem como veículo a ética. 
 A humanidade tem um desejo perenemente insatisfeito por significado, 
gerando aquilo que se conhece por vazio existencial. O psiquiatra Viktor Frankl 
(1985) aponta a busca do significado como fator de preservação da integridade 
psíquica tanto do indivíduo como do grupo social. E ele pôde experimentar isso de 
forma bastante contundente: foi um sobrevivente dos campos de extermínio nazistas 
da década de 1940. Seu trabalho sobre o papel da atribuição de significado na 
sobrevivência psíquica é aplicado na linha terapêutica por ele desenvolvida, a 
logoterapia, ou a terapia pela construção de significado. 
 Atribuir significado é atribuir valor e, quando entramos no campo dos valores, 
entramos no campo da moral, objeto de estudo da ética. Quando se tem a 
percepção de significado e de objetivo conexo a esse significado, pode-se proceder 
eticamente. 
 Diferentemente dos animais, o ser humano é capaz de atribuir aos seres, às 
coisas e aos atos significados que vão além dos de nutrição, sexo, dominância, 
rivalidade ou perigo. A valoração humana compreende aquilo que é visto como 
benéfico ou maléfico para o grupo, e a partir daí estabelecem-se linhas gerais para 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
18 
 
interpretar os atos. Como diz Adolfo Sánchez Vázquez: 
 
Todo ato moral inclui a necessidade de escolher entre vários atos possíveis. 
Esta escolha deve basear-se, por sua vez, numa preferência. Escolhemos a porque 
o preferimos pelas suas consequências a b ou c. Poderíamos dizer que a é 
preferível porque se nos apresenta como um comportamento mais digno, mais 
elevado moralmente ou, em poucas palavras, mais valioso. E, por conseguinte, 
deixamos de lado b e c, porque se nos apresentam como atos menos valiosos ou 
com um valor moral negativo. (...) ter um conteúdo axiológico (de axios, em grego, 
valor) não significa somente que consideramos a conduta boa ou positiva, digna de 
apreço ou de louvor, do ponto de vista moral; significa também que pode ser má, 
digna de condenação ou censura, ou negativa do ponto de vista moral. Em ambos 
os casos, nós a avaliamos ou julgamos como tal em termos axiológicos (SÁNCHEZ 
VÁZQUEZ, 2002, p.135). 
Valor é significado simbólico, utilidade (propriedades materiais do 
objeto/relação com o sujeito que o usa), possibilidade de satisfação de uma 
necessidade humana. Os valores existem para um sujeito, não apenas 
isoladamente, mas como ser social. O homem, social e historicamente, cria os 
valores e os bens nos quais se encarnam, independentemente dos quais só existem 
como projetos ou objetos ideais. “Os valores são, pois, criações humanas, e só 
existem e se realizam no homem e pelo homem (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, 
p.146) ”. 
 A opção por praticar determinado ato é feita mediante uma escolha em que 
se prefere a alternativa considerada mais valiosa e adequada ao que se pretende. 
Os valores “existem em função da atribuição humana que lhes é imposta, a priori ou 
não, emergindo ao sabor da complexidade dos inter-relacionamentos sociais”. Ou 
seja, atribui-se sempre um valor às coisas, às ações ou aos objetos, naturais ou 
produzidos pelo homem, distinguindo-os por seus conteúdos estético, político, 
jurídico ou moral. E esse valor é culturalmente construído e disseminado de acordo 
com os veículos de comunicação disponíveis (AMOÊDO, 2007, p.17-20). 
 Como já vimos, o ato moral tem caráter social, e a escolha pela linha de ação 
a adotar ou por qual partido tomar envolve conflito de interesses: o nosso ou o 
coletivo, o do chefe ou o do cliente, o do chefe imediato ou o da organização 
(SROUR, 2000). E a escolha será feita de acordo com o valor que atribuirmos ao 
ato, quer à luz de princípios preestabelecidos, quer à luz de uma análise de suas 
consequências. De todo modo, só se pode falar em valores morais referindo-se a 
atos ou produtos humanos e, entre estes, naqueles realizados livremente, ou seja, 
de modo consciente e voluntário. 
 Por avaliação, pode-se entender a atribuição do valor respectivo a atos ou 
produtos humanos. A avaliação moral compreende os três elementos seguintes: a) o 
valor atribuível; b) o objeto avaliado (atos ou normas morais); e c) o sujeito que 
avalia (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, p.153). 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
19 
 
Nem todos os atos humanos estão sujeitos a uma avaliação moral, mas 
somente aqueles que, por seus resultados e consequências, afetam a outros. O 
objeto da avaliação insere-se necessariamente num contexto histórico-social. E a 
avaliação é sempre atribuição de valor por parte de um sujeito, julgando o ato não 
como o afeta pessoalmente, mas como afeta o grupo social. Portanto, a avaliação é 
a atribuição de um valor concreto numa situação determinada (SÁNCHEZ 
VÁZQUEZ, 2002, p.153-155). 
 A moralidade entra em jogo quando os atos de uma pessoa afetam outras, 
seguindo ou infringindo normas socialmente estabelecidas. A conduta é amoral 
quando não há prescrições que a contemplem e quando não afeta os outros; é 
moral quando se realiza de acordo com as normas; e é imoral quando fere as 
normas. Por exemplo, fazer o registro contábil da empresa é amoral; fazê-lo 
retratando fielmente a realidade é moral; e maquiá-lo para fraudar os acionistas ou o 
fisco é imoral (no caso, imoral e ilegal). 
 O ato moral pretende ser uma realização do “bom”. O bom e o mau 
relacionam-se reciprocamente como conceitos axiológicos inseparáveis e opostos. 
Definir o bom implica, pois, em definir o mau, o que nos remete a Lao-Tzu: 
 
Se todos na Terra reconhecerem a beleza como bela, desta forma já 
se pressupõe a feiúra. Se todos na Terra reconhecerem o bem como 
bem, deste modo já se pressupõe o mal. Porque o Ser e Não-ser 
geram-se mutuamente [...] (LAO-TZU, 1987, p.38). 
 
 Tal concepção é histórica e real, baseando-se em aspirações e interesses 
humanos concretos. Ninguém aceita como bom o que entra em contradição com os 
seus interesses sociais. As ideias de bom e de mau “mudam historicamente de 
acordo com as diferentes funções da moral efetiva de cada época, e essas 
mudanças se refletem sob a forma de novos conceitos nas doutrinas éticas 
(SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, p.157) ”. E a transmissão dos valores ocorre por 
diversas formas no grupo social, entre as quais destacam-se as lendas e histórias 
populares (CASCUDO, 2001; MELLO, s/d), que apresentam situações/personagens 
com as quais a pessoa se identifica e que processa psiquicamente, reforçando ou 
redirecionando a conduta. 
 Quanto às virtudes, atributos que manifestam o que é bom, podemos 
aproveitar como exemplo três virtudes que Yves de La Taille selecionou como 
capitais: a justiça, a generosidade e a honra. 
 A justiça pode ser definida principalmente a partir de dois princípios: 
igualdade (todos os seres humanos têm o mesmo valor intrínseco, 
independentemente do gênero, nacionalidade, etnia...) e equidade (tornar iguais os 
diferentes ao proporcionar condições de paridade para que ocupem de forma 
competente seu papel no grupo social). 
 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
20 
 
A generosidade é a virtude altruísta por excelência. Consiste em dar a outrem 
o que lhe falta, sendo que essa falta não corresponde a um direito. 
 A honra é o autorrespeito: mais do que a reputação perante os outros, é o 
valor moral que a pessoa tem aos próprios olhos e a exigência que faz a outrem 
para que esse valor seja reconhecido e respeitado. A honra de uma pessoa depende 
da qualidade de suas ações, do seu mérito moral. A pessoa honrada, se faltasse 
com seu dever, se tornaria indigna aos seus próprios olhos (LA TAILLE, 2006, p.61-
64). 
 Aproveitando que mencionamos uma palavra meio fora de moda, a saber, a 
virtude denominada honra, uma boa ilustração de como se pode interpretar 
diferentemente conceitos referentes ao campo da moral já nos era dada por 
Shakespeare, notávelem sua percepção humana, no monólogo de Sir John Falstaff, 
na 1ª parte de Henrique IV, ato V, cena I: 
 (...) Pode a honra repor uma perna? Não; um braço? Não; ou tirar a dor de 
um ferimento? Não. A honra não sabe nada de cirurgia? Não. Que é honra? Uma 
palavra. Que conteúdo tem essa palavra, “honra”? Que é essa palavra? Ar. Bela 
coisa! Quem a tem? O que morreu na quarta-feira. Sentiu-a? Não. Ouviu-a? Não. 
Então, ela é insensível! É, aos mortos. Mas não viverá com os vivos? Não. Por quê? 
A infâmia não o consente. Então, não quero nada com ela. A honra é um mero 
escudo pintado; e assim acaba meu catecismo (SHAKESPEARE, 1989, p.499, 
tradução livre). 
Como vemos, Falstaff atribui valor apenas àquilo que satisfaz à natureza 
animal, o gozo dos sentidos “aqui e agora”. Sua moral é a do máximo proveito 
pessoal, moral oportunista e egoísta, com as considerações de “bom” e “mau” 
variando conforme seus interesses na ocasião. Seu extremo oposto pode ser visto 
no cervantino Quixote, que relega ao segundo plano as necessidades da vida 
material e social em prol de uma “honra” da imortalidade. 
Marshall, em seu clássico Homens ou fogo?, destaca que, em situação de 
combate, mais do que quaisquer conceitos abstratos, a moral ligada à sobrevivência 
do grupo primário é que baliza o comportamento do indivíduo e do grupo. “Não 
falhar com os companheiros” e depois, num nível mais alto, “não enfear o nome da 
coletividade (Companhia/Batalhão)” tem um apelo psicológico muito forte, por 
remeter à necessidade de pertencimento (MARSHALL, 2003, 141-159). De forma 
direta, é o que se refere ao sentido de “honra”. É desonroso não contribuir para que 
o companheiro (e, por extensão, o grupo), com quem há uma história em comum 
(vínculo) sobreviva e, se possível, alcance os objetivos indicados. Não 
necessariamente por “fazer-se de herói”, mas simplesmente por não expor os 
demais à morte ou sofrimento evitáveis. 
 
Com o desenvolvimento tecnológico e a agilidade das comunicações, com 
alta disponibilidade de produtos de consumo ao alcance do bolso, acentuou-se a 
tendência para ser mais igual que os outros, exacerbando-se a busca do interesse 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
21 
 
próprio. “[Na] medida em que inúmeras situações do cotidiano levam os agentes a 
fazer escolhas egoístas, destituídas de desprendimento e de compromissos 
coletivos, coloca-se incessantemente em xeque o arcabouço ético (SROUR, 2000, 
p.111)”. 
 Essa busca da satisfação imediata, do atendimento aos desejos e 
conveniências pessoais é o que embasa o que Srour (2000) denomina moral do 
oportunismo, que, com outro foco ou outra abrangência, alimentará a moral do 
sucesso e a moral da parcialidade. 
 A concepção de moral do sucesso pode ser associada às relações sociais e 
econômicas do mundo capitalista, tendo por modelo básico o norte-americano, que 
pode ser entendido como uma deturpação do princípio da ética protestante orientada 
para o trabalho; propor-se-ia originalmente ser correto, portanto bom aos olhos de 
Deus, que o homem, pelo trabalho se faça capaz de estabelecer e consolidar suas 
próprias bases (seu sustento e de sua família), de modo a não ser um peso para a 
sociedade e produzir em proveito dela. 
A derivação para a moral do sucesso passa a discriminar as pessoas em 
winners (vencedores) e losers (derrotados) conforme suas conquistas materiais, 
traduzidas no consumismo, no hedonismo materialista, na ambição, no jogo de 
soma zero (um só ganha com a perda do outro), num verdadeiro darwinismo social. 
O indivíduo torna-se indiferente a tudo que não diga respeito ao interesse próprio e 
narcisista e exclui tudo aquilo que não seja vencedor ou útil para os seus propósitos 
pessoais. 
 A moral do oportunismo tem fonte ligeiramente diferente: parte da busca do 
indivíduo pela obtenção de benesses dando um jeitinho numa engessadora ética da 
convicção de base católica com caráter paternalista, salvacionista e assistencial. 
Essa base ética rigidamente deontológica propicia a que os indivíduos manifestem 
uma dupla moral: a proclamada e pública, ferrenhamente acorde com as mais 
estritas regras de boa conduta; e a vivenciada e privada, na qual o principal valor é 
sair ganhando, como já analisaram em profundidade Roberto DaMatta (1997a; 
1997b; 2000) e Lívia Barbosa (1992). “A moral do oportunismo repousa no mais 
estreito interesse pessoal, num egoísmo mesquinho que, na ânsia de obter 
vantagens e saciar caprichos, despe-se de quaisquer escrúpulos (SROUR, 2000, 
p.152) ”. Expressa a famosa “Lei de Gérson”, segundo a qual o objetivo fundamental 
é “levar vantagem em tudo”. 
 A título de curiosidade, a famosa “Lei de Gérson” não é lei, nem foi feita pelo 
ex-jogador da Seleção Brasileira tricampeã de futebol em 1970. Acontece que o dito 
jogador foi garoto-propaganda para uma marca de cigarros (anos 1976-78), e nas 
peças publicitárias o slogan era “eu gosto de levar vantagem em tudo”, e fumar 
aquele cigarro deveria ser considerado vantajoso pela relação preço/qualidade. 
 Mas voltando ao nosso assunto, convém citar Robert Srour: 
 Os brasileiros não se dividem discretamente em agentes oportunistas e em 
agentes íntegros. Mesmo que existam alguns visceralmente oportunistas, estranhos 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
22 
 
a qualquer gesto decente, e outros essencialmente íntegros, que quase nunca 
prevaricam. A maior parte dos brasileiros vive oscilando entre as duas morais, ora 
inescrupulosos, ora idôneos. Agentes híbridos. Ambíguos quanto às suas culpas e 
inseguros quanto às suas razões. Moldados por uma moralidade casuística – tão 
louvada quanto o são a mistura das comidas, a miscigenação das raças, o 
sincretismo das religiões, ou o jogo das inversões nos carnavais, em que se 
confundem hierarquias, gêneros ou papéis (SROUR, 2000, p.158). 
Conhecemos oportunistas contumazes, sujeitos intrinsecamente de “mau 
caráter”, mas podemos considerar que na maior parte dos casos temos os 
oportunistas de ocasião, pessoas em geral “honradas” e que, premidas pelas 
circunstâncias, eventualmente dão o seu jeitinho. Dependendo do pecado cometido, 
esses pecadores são vistos com alguma indulgência, como humanamente falíveis, e 
passam a gozar de uma condição atenuante, já que, na maioria das vezes, podem 
ser confiáveis (SROUR, 2000, p.159-160). 
 Tal duplicidade moral não é privilégio dos brasileiros, pois, como pudemos 
notar na descrição da moral do sucesso, ali há também uma moral da conquista dos 
bens pelo trabalho e uma da superação de todos os “concorrentes”, custe o que 
custar. Basta que os interesses próprios sejam seriamente ameaçados para que não 
se cumpram mais promessas, não se respeitem mais acordos, não se sigam mais 
regras. 
Na feliz imagem de Srour, é como se fosse uma peça de teatro na qual em 
vários momentos os atores se tornassem diferentes personagens: íntegros quando 
não se percebem pressões ou ameaças; anti-heróis se as circunstâncias exigirem; 
vilões às vezes; quase sempre espertos e criativos para solucionar os desafios. Isso 
provoca profunda ansiedade e exige precauções e salvaguardas quase tão 
numerosas quanto as possíveis formas de burlá-las (SROUR, 2000, p.159). 
 A moral do oportunismo encontrará ambiente para vicejar onde houver fortes 
relações de dominação e dependência, alto índice de personalismo nas concessões 
de benesses e onde o atendimento às necessidades de sobrevivência é incerto. 
Para a barriga vazia (ou em risco de o ficar), ética é uma palavra bonita, mas que 
não é mais que uma emissão de ar (como diria Falstaff). Contrapõe-se à moral da 
integridade, fortemente apregoada, mas dificilmente implementada por fundar-se 
numa rígida ética da convicção de raízes jesuítas. Pedro Malasartes e Macunaíma 
representam a moral do jeitinho, a necessária esperteza para sobreviver no mundo 
cão. 
 A moral da parcialidade adota seletivamente normas de conduta, exigindo 
lealdade para com“os nossos” e justificando as conveniências oportunistas no trato 
com “os outros”. Ideias-força típicas da moral da parcialidade: “Todo mundo faz 
assim”. “Se não o fizermos, outros o farão”. “Primeiro o nosso, o resto a gente vê 
depois”. “Farinha pouca, meu pirão primeiro”. 
 A moral da parceria é expressão da ética da responsabilidade, considerando 
os negócios como acordos que beneficiam as partes envolvidas (SROUR, 2000, 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
23 
 
p.179). Sua visão e padrões de conduta focam-se em objetivos de médio e longo 
prazo. Busca-se compromissos mutuamente vantajosos para perenizar o negócio. 
Caracteriza-se pela idoneidade nas transações, transparência, apoio mútuo e 
compartilhamento de informações. 
 Como dito mais acima, a exacerbação da busca do interesse próprio 
encaminha as relações para algo muito próximo de um vale-tudo. Mais ainda quando 
as ações boas e más (especialmente as moralmente condenáveis) são facilmente 
dadas a público – mas, muitas vezes, a mensagem que supostamente se transmite 
como “não se deve proceder assim”, acaba sendo interpretada como “tenho de fazer 
diferente para não ser pego e me dar bem”. A moral da culpa, que incide sobre o ato 
(o ato é imoral; sente-se culpa pelo que se fez) vai cedendo lugar à moral da 
vergonha, que incide sobre a pessoa (sente-se vergonha do que se é: o sujeito 
procede mal; o sujeito é imoral; ou, noutra vertente, o sujeito é otário o suficiente 
para ser pego cometendo o ato). 
 Como diz Lis Soboll: 
 O sentimento de culpa requer um interesse pelos vínculos que nos ligam a 
nós mesmos, aos outros, e ao infinito, estabelecendo uma luta entre desejo e 
proibição. A civilização da vergonha pressupõe que “todo ato repreensível, seja ele 
qual for, pode ser perpetrado. Basta que não seja descoberto. Se ele for conhecido, 
a vergonha se abate sobre o autor da ação. Tudo está no ato e na sua visibilidade”. 
A relevância não está no que deve ou não ser feito, mas na visibilidade da ação (...) 
A regra dominante é de que tudo é permitido, desde que ninguém tome 
conhecimento de como foi executado. (...) No trabalho onde predomina a violência, 
os processos ficam na obscuridade, num submundo organizacional permissivo e 
com um padrão ético “econômico” que exige apenas os resultados. A ameaça está 
em ser descoberto (SOBOLL, 2008, p.116-117). 
O ambiente social acaba caracterizando-se por: declínio da credibilidade 
pública de instituições consagradas e corrosão da autoridade; desemprego e 
exclusão social; acelerada obsolescência dos saberes e competências pela 
evolução tecnológica (percepção de inutilidade e impotência); alta rotatividade nas 
empresas, enfraquecendo os laços de lealdade empresa-funcionários, funcionários-
empresa e entre funcionários. 
 Enfraquece-se o controle social exercido pelas agências ideológicas 
tradicionais – família, escola, comunidade, igreja – especialmente nas metrópoles. 
Ainda que precariamente, entram em cena outros controles sociais: 
 Coibição promovida internamente pelas empresas; 
 “Poder do mercado” com a seleção de fornecedores por parte dos 
clientes; 
 Mídia enquanto expressão da vigilância da sociedade civil; 
 Aparelho judiciário do Estado quando as transgressões morais 
coincidem com as legais. 
 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
24 
 
Assim, não é muito de estranhar que os valores, fundamento da moral e da 
ética, sejam relativizados ao ponto de uma total descrença, pela perda de 
referenciais em qualquer dos ambientes de convivência, pela exacerbação do 
individualismo e do hedonismo. 
 
Quando o prazer é a regra e o próprio interesse a exclusiva 
preocupação, obedecer a regras morais pode parecer insano. Mas as 
regras morais são o que ajuda a impedir um curto-circuito ou 
autoesmerilhamento na máquina humana (NALINI, 2008, p.94). 
 
E como estamos a tratar de valores, que tal darmos uma olhada num campo 
em que eles estão fortemente presentes? 
 
3.2. Ética e Religião 
 
 A ética está inseparavelmente ligada à religião, pois não há religião que não 
apresente preceitos éticos. Budista, cristã, taoísta, hinduísta, muçulmana, animista, 
toda linha de crença tem seus mandamentos de boa conduta, em alguns casos 
especificando formas de proceder em relação aos fiéis e em relação aos “ímpios”. 
 
As religiões com frequência não fazem distinção entre o plano ético e 
o plano religioso. Os costumes da tribo, as regras ou os princípios 
morais da casta são tão religiosos quanto os sacrifícios e as orações. 
(...) A noção do ser humano como uma criação divina implica que ele 
é responsável perante Deus por tudo o que faz, ritual, moral, social e 
politicamente (GAARDER, 2000, p.31). 
 
A moral de inspiração religiosa impõe observância aos mandamentos, pois é 
imoral desatendê-los. Provido de livre arbítrio, o ser humano pode escolher entre o 
bem e o mal. A consciência dessa condição de escolha legitima não apenas a 
crença na transcendência (Deus), mas também o prestígio do direito natural. O ser 
humano é capaz de perceber que há condutas que deve observar e outras que não 
(em decorrência do instinto gregário, aliado ao delineamento das convenções 
sociais). 
 Nenhuma religião deixa de impor sua ética aos seus crentes. E esses 
preceitos éticos de base religiosa serão ecoados no Direito Natural, geralmente 
ordenado a partir do princípio de amor a Deus e ao próximo. Para atender a esse 
princípio, uma ética religiosa tem de ser tolerante em relação aos demais credos. 
Isso é especialmente importante quando pessoas das mais variadas crenças se 
instalam numa mesma região geográfica, sendo igualmente responsáveis pelo 
provimento da sobrevivência e aprimoramento da coletividade. 
A laicização do Estado é uma consequência do pluralismo religioso, de modo 
a propiciar a imparcialidade legal e administrativa no trato dos cidadãos de diversas 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
25 
 
fés. 
As sociedades onde coexistem várias religiões e vários pontos de 
vista consideram mais difícil vincular a ética exclusivamente à 
religião. A sociedade precisa ter suas linhas mestras éticas, e 
algumas delas são preservadas nas leis. (...) hoje muitos países 
aceitam a Declaração dos Direitos Humanos, proclamada pelas 
Nações Unidas, como uma afirmação ética comum, seja qual for a 
religião ou a perspectiva geral do país (GAARDER, 2000, p.31). 
 
A secularização do Estado “propõe como finalidade do direito o 
estabelecimento de uma ordem social que assegura aos membros da comunidade 
política uma coexistência pacífica, sejam quais forem suas concepções religiosas 
(PERELMAN, apud NALINI, 2008, p.249) ”. A tolerância recíproca é basilar numa 
sociedade propiciadora do pluralismo religioso, tendo como principal valor a 
liberdade de consciência, sendo seu consectário a liberdade de religião (NALINI, 
2008, p.249). 
 A ética predominante na civilização ocidental é a cristã, cujos valores são 
fornecidos pelo cristianismo, baseado solidamente na tradição judaica. A primeira 
fonte da moral cristã é a Bíblia. Enfatizam-se dois mandamentos: 
 Amar a Deus (Mt 22,37); e 
 Amar ao próximo como a si mesmo (Lv 19,18 e Mt 22,39). 
 
Conforme diz a Bíblia, Jesus é muito enfático com a chamada regra de ouro: 
“Tudo aquilo que quereis que os homens vos façam, fazei-o também por eles (Mt 7, 
12) ”. É a mesma regra que Confúcio apresenta na negativa. Se cumprida, seria a 
regra pela qual se instauraria a paz mundial. 
 O apóstolo Paulo faz com que o cristianismo, de religião baseada nas obras, 
passe a fundar-se na fé. A moral calca-se sobre as virtudes da fé, esperança e 
caridade (amor). “Ao contemplar o amor como a mais importante das virtudes, o 
Cristianismo reconhece que somente precisa de moral quem não tem amor (NALINI, 
2008, p.87) ”. 
 As virtudes cardeais são o eixo central da moralidade cristã: prudência, 
temperança (in medio virtus), justiça (jogo limpo) e fortaleza (fibramoral, superação 
da adversidade). 
 Como mostra Max Weber, entre os cristãos a ênfase no que é valorizado 
varia: os protestantes emprestaram maior valor ao trabalho, tendo a riqueza como 
seu corolário (o trabalho agrada a Deus, que abençoa o diligente com riquezas), 
enquanto os católicos consideraram mais valiosos a abnegação, o espírito de 
pobreza (humildade) e o sacrifício (AMOÊDO, 2007, p.12). 
 Cada Estado pode estabelecer limites à liberdade religiosa, definindo a 
licitude ou não da recusa ao serviço militar, à transfusão de sangue ou à vacinação, 
do canibalismo ou assassínio ritual, ou da poligamia/poliandria, ou do uso de drogas. 
Não obstante o pluralismo religioso implicar certa tolerância (aos chamados 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
26 
 
imperativos de consciência), há as exigências da vida em sociedade a imporem 
limites – sociedade não apenas dentro de um Estado, mas nas interações com 
outros Estados ou envolvendo os naturais doutros Estados. Assim, por exemplo, se 
o islamismo autoriza o fiel a ter até quatro esposas desde que consiga dar a todas o 
mesmo padrão de vida, o indivíduo não pode invocar essa liberdade num país em 
que a legislação estabelece a monogamia. 
 O estabelecimento destes limites, como temos visto, ocorre, primeiramente, 
no campo da moral, irradiando-se para outras situações do trato social e tomando 
uma forma mais consolidada no arcabouço legal. Esta formalização na lei pode 
fazer-se necessária especialmente quando algum grupo, por critérios totalmente 
subjetivos (formato das orelhas, religião, atributos físicos etc.), discrimine outro 
quanto a direitos fundamentais. 
 Vimos, portanto, que o ser humano é capaz de atribuir significado a coisas, 
ideias e ações; esse significado se traduz em valores. Esses valores foram 
construídos historicamente, em sua forma mais rudimentar como uma proposta de 
reciprocidade de tratamento (“não bata em mim e eu não baterei em você”), 
evoluindo para a percepção de uma inspiração divina (“se os frutos da mesma 
árvore envenenarem uns aos outros, como fica a árvore? ”) e adquirindo contornos 
mais sofisticados ao traduzir-se no corpo normativo que rege uma sociedade, nos 
mais diversos setores de atividade. E em nossa próxima aula veremos a relação da 
ética com outras ciências. 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
27 
 
4. RELAÇÃO DA ÉTICA COM OUTRAS CIÊNCIAS 
 
Caro aluno, 
Como você já percebeu, a ética nos permite compreender e acompanhar a 
construção e evolução dos valores e das normas que buscam fazer com que as 
pessoas vivam de acordo com esses valores. E sendo a ética ciência, será 
conveniente vermos o seu relacionamento com outras ciências. Veremos que 
nenhum conhecimento se constrói isoladamente, mas sim em constante interação 
com outros. 
Neste encontro, esperamos que você identifique os pontos de contato da ética 
com outros campos do conhecimento e a influência mútua que exercem. 
 
4.1. Filosofia 
Para que nos lembremos, quando o ser humano começou a investigar de 
maneira mais sistemática o mundo ao seu redor, todas as especulações de busca 
do conhecimento das leis que regem os fenômenos ficavam sob o guarda-chuva da 
filosofia, e foram recebendo nomes específicos à medida que o conhecimento sobre 
seu objeto de estudo e seus métodos se tornavam mais específicos. 
 
A ética é uma disciplina filosófica: é uma investigação racional e 
sistemática sobre um objeto de estudo que lhe é próprio (a vida 
moral), sob uma perspectiva de totalidade e com o intuito de trazer à 
luz seus aspectos mais profundos e universais (NALINI, 2008, p.112). 
 
4.2. Psicologia 
Freud sublinhou o caráter conflitivo da relação do indivíduo com a moral. Por 
um lado, quer submeter-se a ela para poder viver em sociedade e civilizar-se. Por 
outro, reluta fortemente em fazê-lo, pois tal submissão implica perda da liberdade de 
buscar a saciação dos desejos (LA TAILLE, 2006, p.13). Submeter seus atos a um 
crivo moral é como colocar em ação o superego de modo a orientar a conduta para, 
mais do que a gratificação da satisfação imediata, buscar outro nível de gratificação 
pela satisfatória convivência com o outro. 
 Os atos morais são também psíquicos, derivados de motivação, impulso e 
consciência. Antes de produzir efeito em relação às outras pessoas, o ato moral é 
produzido na psique de seu agente, que pode escolher entre agir e deixar de agir. 
 A explicação psicológica do comportamento humano possibilita compreender 
as condições subjetivas dos atos dos indivíduos e, assim, contribui para a 
compreensão da sua dimensão moral (NALINI, 2008, p.113). Responsabilidade e 
culpabilidade não podem ser examinadas sem a consideração dos fatores psíquicos 
ensejadores do ato. 
 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
28 
 
Ainda que o comportamento moral responda (...) à necessidade social 
de regular as relações dos indivíduos numa certa direção, a atividade 
moral é sempre vivida interna ou intimamente pelo sujeito em um 
processo subjetivo para cuja elucidação contribui muitíssimo a 
psicologia (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2002, p.29). 
 
A psicologia auxilia a ética ao pôr em evidência as leis que regem as 
motivações internas do comportamento do indivíduo e ao mostrar a estrutura do 
caráter e da personalidade. Os traumas, os bloqueios, os comportamentos que 
foram reprimidos ou gratificados, o desenvolvimento afetivo refletir-se-ão na 
interpretação e valoração do ato moral pelo agente. 
 
4.3. Sociologia 
As relações no grupo social e com outros grupos fornecem os elementos para 
a construção das regras de convivência, para a definição do que é certo ou aceitável 
e do que é errado, por conseguinte censurável ou inaceitável. 
 A moral que condiciona a conduta do indivíduo resulta de uma criação 
coletiva, das exigências da vida social. As expectativas de comportamento forçam o 
ser humano a posturas que isoladamente ele não adotaria. Por exemplo, ao trazer 
caça, o homem tinha de pensar não apenas em seu consumo imediato – 
relativamente fácil, bastava fazer uma fogueirinha em local abrigado e assar o 
bocado escolhido –, mas no da coletividade – levar maior quantidade do que a 
bastante para si e sua prole, repartir os bocados, empregar processos de 
conservação... 
 Não obstante, a opção moral é uma opção de consciência individual. 
 
Se o homem fosse exclusivamente um ser coletivo não poderia vir a 
ser moralmente responsabilizado por qualquer ato. Somente o grupo 
social responderia pela atitude de seu componente. (...) A criatura 
sempre tem uma faixa individual de discernimento para fazer suas 
escolhas morais (NALINI, 2008, p.118, grifo do autor). 
 
4.4. Antropologia 
 Todo sistema normativo é parte da cultura do grupo social. Ele é construído 
na vivência grupal e, pela transmissão continuada, firma-se na tradição. As normas 
para vestir-se, para tratar os estranhos ao clã, para casar-se, para construir e usar 
moradia, para dispor do alimento traduzem as necessidades do grupo em certo 
momento histórico (fatos geradores) e se mantêm enquanto o grupo considerar que 
satisfazem as suas necessidades. 
Não é considerado adequado, por exemplo, andar pela rua em trajes menores 
ou adâmicos, mesmo que o calor esteja perto dos 40°C. Matar o idoso ou o enfermo 
hoje é inadequado, mas isolar aquele que está sem trabalho formal é tido por 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
29 
 
normal. 
 
Conhecer a antropologia social facilita a distinção entre as normas 
morais permanentes ou absolutas, detectáveis em qualquer tipo de 
sociedade e em todos os contextos históricos, daquelas vinculadas a 
um modelo concreto e tendentes a desaparecer com ele (NALINI, 
2008, p.120). 
 
Em nome do pragmatismo e do repúdio à dor e ao sofrimento, vários temas 
são recorrentes na história humana a orientar as normas morais. O altruísmo 
recíproco – trate os outros como quer que eles tratem você – é o mais presente. 
Entretanto, a solidariedadeestá entre os proclamados importantes e relativizados na 
vivência, num ambiente de competição desenfreada. 
 
4.5. História 
A ética é intrinsecamente histórica. Como pudemos notar, ela é socialmente 
construída no tempo e no espaço. Faz parte do conteúdo cultural transmitido por 
sucessivas gerações, refletindo as peculiaridades do momento vivido, das condições 
ambientais e da evolução do grupo social. 
Sobre a relação da ética com a história, podemos acompanhar o que diz José 
Renato Nalini: 
 
A história propicia o debate sobre a possibilidade de um progresso 
moral (...), assim entendido: 1. a ampliação da esfera moral na vida 
social; 2. a elevação do caráter consciente e livre do comportamento 
dos indivíduos ou dos grupos sociais e, por consequência, pelo 
crescimento da responsabilidade desses indivíduos e grupos no seu 
comportamento moral; e 3. o grau de articulação e de coordenação 
dos interesses coletivos e pessoais (NALINI, 2008, p.120, grifo do 
autor). 
 
Por progresso moral pode-se entender a evolução das práticas sociais ao 
longo do tempo em direção a percepções mais apuradas quanto à abrangência do 
bem comum, compreendendo as necessidades individuais e grupais em níveis mais 
elevados que as meramente destinadas à sobrevivência física. Tal evolução ocorre 
numa marcha desigual e contraditória – o que é proibido hoje pode ser permitido no 
futuro e voltar a ser tido por ilícito mais adiante –, mas ascensional, ou seja, 
traduzindo um maior refinamento na percepção do ser humano e das necessidades 
que norteiam suas condutas. 
 
4. 6. Economia 
Numa era em que o mercado é o regente, a economia dita as regras e, assim, 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
30 
 
impõe o ritmo e as escolhas para a humanidade. O acúmulo de bens materiais é 
visto como indicação de prestígio, como medida para valorização do indivíduo 
perante o grupo. Como o ser tem uma alta subjetividade, a objetividade quantificável 
do ter empresta um certo conforto simplista a quem quer, por algum parâmetro, dizer 
se é valioso ou desvalioso relacionar-se com determinada pessoa. 
 
Num regime em que o trabalho se vende como mercadoria, 
desvinculado de sua dignidade ínsita, em que o lucro é o maior 
objetivo, em que amealhar bens materiais a suprema finalidade, a 
moral é egoísta e individualista. (...) por outro lado, os atos 
econômicos – assim compreendidos a produção de bens através do 
trabalho e a apropriação e distribuição dos mesmos – não podem 
deixar de apresentar conotação moral. A atividade do trabalhador, a 
divisão social do trabalho, as formas de propriedade dos meios de 
produção e a distribuição social dos produtos do trabalho humano são 
questões morais (NALINI, 2008, p.122). 
 
Se a economia é a ciência cujo escopo é prover a humanidade em suas 
necessidades materiais, não pode distanciar-se do mundo moral. Se o homem é 
força produtiva, é também sujeito das relações de produção. Ou seja, a atividade 
econômica não é fim em si mesma tendo o homem por recurso, mas sim, atividade 
provedora de recursos para o homem. Assim, a atividade econômica auxilia no 
estudo da ética quando se compreende os processos usados na geração de riqueza 
em sua dimensão humana – ou seja, no papel desempenhado pelo homem como 
sujeito das relações de produção. 
 
4.7. Direito 
Não é preciso um esforço muito grande para perceber que os códigos 
legislativos, de uma forma geral, têm um forte enraizamento moral. Todo sistema 
jurídico é baseado no respeito entre as pessoas e na ideia de limitar a atividade 
própria para tornar possível o exercício da atividade alheia (o direito de um acaba 
onde começa o direito do outro). Este soberano imperativo ético é pressuposto da 
reciprocidade e da equidade que fundamentam qualquer ordem jurídica. 
Nalini apresenta alguns elementos característicos que aproximam o direito da 
moral: 
 Ambos disciplinam a relação entre os homens por meio de normas. 
Impõem conduta obrigatória a seus destinatários. 
 Tanto as normas jurídicas como as morais são imperativas, não 
constituindo meras recomendações. 
 Direito e moral têm por escopo a garantia da coesão social, portanto, 
atendem à mesma necessidade social. 
 Moral e direito refletem formas históricas de comportamento humano, 
modificando-se conforme se altere historicamente o conteúdo de sua 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
31 
 
função social. (NALINI, 2008, p.124). 
 
Esse autor apresenta, também, aspectos nos quais direito e moral se 
distinguem: 
 A vida moral é interior, a vida jurídica é exterior. A consciência 
individual orienta a observância da norma moral. Já a obediência à 
norma jurídica independe da consciência; concorde ou não, o agente 
deve cumpri-la. 
 A coação é interna em relação à moral (reação da consciência – 
remorso – ou reprovação social, com variados graus de 
constrangimento) e externa no que tange ao direito (meios coercitivos 
concretos, aparato repressor oficial). 
 A moral é mais abrangente que o direito. Voltada a permitir a 
coexistência entre as pessoas, existe mesmo nas manifestações 
gregárias incipientes, enquanto o direito instaura-se na estruturação 
formal de uma sociedade. 
 A moral precedeu o direito. 
 O direito positivo é necessariamente estatal. A moral pode ser ou não. 
 A relação mútua entre moral e direito, assim como suas esferas de 
incidência, revestem caráter histórico (NALINI, 2008, p.124-126). 
 
A justiça tem caráter ético, mas há três diferenças entre moralidade e justiça 
(NALINI, 2008, p.126-127): 
 A justiça não só impõe deveres, mas estabelece um direito 
correspectivo. A lei moral é unilateral, proibindo ou determinando sem 
propor uma contrapartida. 
 O direito, como norma de pacífica cooperação externa, não entra em 
função senão depois que a atividade cooperante seja exteriorizada (ou 
seja, a partir de ações objetivas e de seus resultados). A lei moral 
governa também as determinações interiores (a moralidade está na 
intencionalidade do agente, antes de estar no efeito ou no resultado). 
 Os preceitos morais não podem ser coercitivos. Os jurídicos são 
coercíveis. Atuar juridicamente é exigível, enquanto atuar moralmente 
reside na espontaneidade. Uma sanção moral manifesta-se na 
reprovação social. Uma sanção jurídica manifesta-se na retribuição 
material (multas, confiscos) e/ou restrição de liberdade, para atender 
ao bem-estar da coletividade. 
 
Quase todo crime é também falta moral. Ao violar as regras vigentes na 
comunidade, subvertendo o pacto de convívio, o infrator percorrerá, 
necessariamente, a área reservada à moral. Raro é o delito que escape à aferição 
de compatibilidade com parâmetros morais. Não há como desvincular o aspecto 
ÉTICA NAS ORGANIZAÇÕES 
32 
 
moral presente na fraude, na simulação, nos vícios dos atos jurídicos, nos vícios 
intrínsecos e ocultos, na violência e em tantas outras noções do Direito Privado 
(NALINI, 2008, p.137). Boa-fé, má-fé, indignidade, solidariedade, improbidade, 
maus-tratos, obrigações... São termos que, condicionando atos, emprestam-lhes um 
cunho moral. 
 Entretanto, como já foi mencionado anteriormente, as nuanças da reprovação 
do ato, conquanto violação da lei, estão sujeitas ao status de legitimidade que 
aquela lei tenha, à luz dos parâmetros morais vivenciados (lembre-se da diferença 
entre valores proclamados e vivenciados) na sociedade. Como diz Nalini: 
 
Quando a infração penal é moralmente irrelevante, ela não logra 
obter o repúdio social. A linguagem brejeira do brasileiro chega a 
mencionar leis que não pegam, para identificar as tipificadoras dos 
delitos tolerados pela comunidade (NALINI, 2008, p.134). 
 
 Delitos como o homicídio e os crimes contra os costumes ofendem qualquer 
noção de moral geralmente aceita. A condução de veículos de maneira perigosa 
atenta contra os preceitos de preservação da vida própria e alheia. A perturbação do 
sossego

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