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Direito Constitucional Aplicado I - Aula 02 - Constitucionalismo Teoria da Constituição, Ideologias e Filosofia Constitucional

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Direito Constitucional Aplicado I
Aula 02: Constitucionalismo: Teoria da Constituição, Ideologias e Filosofia Constitucional.
Segundo Daniel Sarmento e Claudio Pereira (2012):
“Um dos critérios tradicionais para distinguir os campos da teoria e da filosofia constitucional é a pretensão de apenas descrever ou de também prescrever conteúdos constitucionais: a teoria da Constituição seria descritiva, enquanto a filosofia constitucional teria pretensões prescritivas, buscando justificar racionalmente o modelo mais adequado de Constituição. No entanto, é comum que as diversas propostas formuladas, no campo da teoria da Constituição, também possuam dimensões normativas (prescritivas), e que as filosofias constitucionais não sejam estranhas ao constitucionalismo efetivamente praticado em cada contexto sociopolítico.”
No ponto, adotaremos o critério classificatório dos autores mencionados, considerando apenas teorias e filosofias constitucionais formuladas a partir do advento do constitucionalismo moderno.
Os principais estudos de teoria e filosofia da Constituição têm sua origem em outros países, sobretudo na Alemanha e nos Estados Unidos, razão pela qual as seções seguintes estão centradas na análise de autores que formularam suas contribuições tendo em vista outras ordens constitucionais.
Ferdinand Lassale e a Constituição como fato social e os fatores reais de poder
A teoria sociológica ou idealista da Constituição, em que pese ser uma das mais conhecidas e antigas, sempre despertou análises bem críticas. Apontam Souza Neto e Sarmento (2012) que já no século XIX era patente a desconexão entre leis/Constituição e realidade. Para os autores, embora “as normas constitucionais positivassem a liberdade e a igualdade, a realidade social era marcada pelo arbítrio e pela desigualdade.
As proclamações constitucionais seriam, a rigor, desprovidas de maiores consequências práticas, sendo incapazes de incidir efetivamente sobre uma realidade social refratária”.
Assim, o conceito de Constituição deveria ser estabelecido em sentido sociológico: “a teoria da Constituição deveria refletir a ‘Constituição real’, espelhando os padrões sociopolíticos efetivamente em vigor em cada sociedade”.
Lassale, idealizador da crítica, era participante ativo nas lutas políticas e sociais da Alemanha do século XIX.
Nos seus termos, a Constituição nada mais é do que fatores reais de poder atuantes em determinada sociedade. O grande problema, por exemplo, com este modelo, é que na Prússia da época os fatores reais eram o rei, a burguesia, os banqueiros, a classe operária, dentre outros. A Constituição escrita que não correspondesse a esses fatores reais de poder seria uma mera folha de papel, desprovida de importância na realidade social do país.
Hans Kelsen e o positivismo constitucional 
No início do século XX, muitas das novas Constituições escritas se afastaram da matriz liberal, inspiradora do constitucionalismo clássico, passando a conter prescrições não relacionadas às tarefas de limitar e estruturar o poder político.
Os novos textos constitucionais positivavam normas de teor bastante variado, sobre temas como economia, família, cultura etc. No novo contexto, não havia como definir a Constituição apenas a partir de seu conteúdo material, como propugnava a teoria idealista.
Era especialmente significativa, naquele cenário, a Constituição alemã de 1919, chamada “Constituição de Weimar” — um dos documentos constitucionais mais influentes da história, apesar de sua curta vigência, que, de fato, passou a ser meramente formal com a ascensão do nazismo.
Elaborada em um contexto de intensa turbulência política, a Constituição de Weimar é o resultado de influências ideológicas diversas. Além de estruturar o Estado alemão e de positivar direitos individuais, a Constituição dispunha, por exemplo, sobre:
• A organização da economia (art. 151)
• A função social da propriedade (art. 153),
• Estabelecimento dos direitos trabalhistas (arts. 157-165) e previdenciários (art. 161) — matérias absolutamente estranhas ao constitucionalismo do Estado liberal.
Com a alteração do papel das constituições, torna-se impossível a definição da Constituição a partir do conteúdo das suas normas.
Para abranger uma multiplicidade razoável de textos constitucionais, o conceito de Constituição deveria se ater aos seus aspectos formais. Essa era a concepção de Hans Kelsen, principal expositor dessa vertente teórica.
Quer estabeleça uma ditadura, quer institua um governo democrático, a Constituição, para Kelsen, define-se por ocupar o ápice do ordenamento jurídico. Não é característica necessária das constituições a organização do exercício do poder em termos liberais.
As constituições possuem em comum a supremacia formal, ou seja, o fato de ocuparem o ápice da ordem jurídica, provendo fundamento de validade para o restante do ordenamento.
Kelsen propõe a imagem de uma pirâmide para representar a estrutura escalonada da ordem jurídica.
Remanesce, todavia, o problema do fundamento de validade da própria Constituição. Kelsen identifica-o na denominada “norma hipotética fundamental”. Trata-se de pressuposto lógico segundo o qual devem ser cumpridas as normas elaboradas de acordo com a Constituição.
A proposição fundamental da ordem jurídica estadual diz:
“Devem ser postos atos de coerção sob os pressupostos e pela forma que estatuem a primeira constituição histórica e as normas estabelecidas em conformidade com ela.”
Em forma abreviada:
“Devemos conduzir-nos como a constituição prescreve”.
A norma hipotética fundamental costuma ser apontada como “calcanhar de Aquiles” da teoria kelseniana. Tanto é assim que, diante da evidente insuficiência do argumento, Kelsen foi obrigado a fazer concessões de cunho sociológico para dar sustentação a seu modelo, como se verá a seguir.
A Teoria Pura do Direito, além de negar que a validade das normas decorra da correção, criticava a falta de correspondência entre o idealismo da Constituição concebida, de acordo com as ideias liberais predominantes, na Europa e nos Estados Unidos.
Atenção!
Quando o ordenamento jurídico é globalmente respeitado e aplicado, as normas produzidas conforme os procedimentos por ele prescritos são válidas. Mesmo o normativíssimo de Kelsen faz essa importante concessão sociológica.
No normativíssimo de Kelsen, a referência ao mundo dos fatos esgota-se, todavia, nessa inferência. Sendo o ordenamento globalmente eficaz, faz sentido pressupor a norma hipotética fundamental, e, a partir dela, estruturar uma cadeia hierarquizada de validação do Direito, pela qual o fundamento de validade da norma inferior é sempre encontrado na norma superior.
Por outro lado, na virada do século XIX para o século XX, amplia-se a influência do positivismo no campo do Direito.
Para o positivismo, a tarefa da teoria constitucional seria simplesmente descrever, com objetividade, a Constituição, e não prescrever para ela um conteúdo determinado, como pretendia a teoria idealista do constitucionalismo liberal.
Também não seria jurídica a definição do conteúdo ideal das normas jurídicas – o Direito deve se ocupar das normas como são, e não de como elas deveriam ser. Isso valeria também para a Constituição. É nesse sentido que Kelsen propõe que se exclua da investigação da Ciência do Direito “tudo quanto não pertença a seu objeto” — a política, a sociologia, a ética etc.
A constituição como “decisão politica fundamental” (Carl Schmitt)
As teorias, matérias da constituição, foram grandes opositoras do idealismo da corrente liberal quanto ao formalismo de Kelsen, privilegiando elementos materiais oriundos da realidade constitucional, e não por prescreverem determinado conteúdo particular.
A teoria mais influente nessa linha foi proposta por Carl Schmitt, para o qual a Constituição deveria ser definida como a “decisão política fundamental” do poder constituinte. Trata-se da decisão política que modela a substância do regime. Em relação à “decisão política fundamental, (...) todas as regulações normativas sãosecundárias.
A Constituição, para Schmitt, não se confunde com as “leis constitucionais”. Ela consiste na manifestação concreta do poder político, que toma a decisão fundamental, pondo fim ao conflito antes existente e definindo as bases do novo regime: uma democracia ou uma ditadura, um Estado capitalista ou socialista etc.
As “leis constitucionais” — leia-se, a Constituição escrita —, podem conter diversos elementos que não sejam propriamente constitucionais, porque são dissociados da decisão política fundamental do poder constituinte.
O conceito de Constituição, de Carl Schmitt, não se apoia em critérios de justiça ou racionalidade do conteúdo normativo adotado, como sustenta a teoria ideal. Para ele, o poder constituinte pode estabelecer qualquer conteúdo constitucional, inclusive um completamente divergente dos princípios do Estado Liberal.
Nisso repousa o aspecto central da sua concepção “decisionista”, que considerava a Constituição não como a positivação de um sistema racional de princípios, mas como um ato de “vontade” do poder constituinte.
Norma, realidade, concretização da Constituição: as teorias concretista (Konrad Hesse) e estruturante (Friedrich Müller) da Constituição
Com o fim da II Guerra, o constitucionalismo social, surgido ainda na primeira metade do século XX, se afirmar no cenário europeu. As novas constituições são democráticas, repletas de garantias de direitos individuais, mas muitas delas também contêm direitos sociais e normas de intervenção estatal na economia.
Inúmeras constituições aprovadas desde então, além de refratárias ao autoritarismo, são também comprometidas com a justiça social. Um dos principais problemas a que a teoria da Constituição passa a se dedicar é o de como converter as normas constitucionais em realidade concreta. A chamada “força normativa” da Constituição se torna uma questão central para o constitucionalismo do Estado Social.
Para realizar esse propósito, algumas teorias sustentam ser necessário que a Constituição também se deixe permear pela realidade. A mais importante dessas concepções foi formulada por Konrad Hesse, recebendo, posteriormente, complementações, sobretudo no campo metodológico, do seu discípulo Friedrich Müller.
Hesse desenvolveu a sua tese a partir de um diálogo com Ferdinand Lassalle, que, como antes esclarecido, definira a Constituição em termos sociológicos, com base no conceito de fatores reais do poder. Para Hesse, o elemento essencial de uma Constituição é a normatividade. Mas o conteúdo material da Constituição deve ser extraído das “exigências substantivas” que se situam na sociedade que a Constituição se propõe a regular. Ao invés de a Constituição dirigir verticalmente a vida social, interage com ela em uma relação de influências recíprocas, que leva à determinação do conteúdo constitucional.
Por um lado, a realidade influencia no significado das normas constitucionais, que não podem ser interpretadas com abstração do quadro empírico sobre o qual incidem. Mas, por outro, a norma constitucional não é apenas um reflexo da realidade, tendo algum poder de condicioná-la.
Segundo Konrad Hesse, a Constituição é a “ordem fundamental jurídica da coletividade”. Mas ela não deve tratar de todos os assuntos, nem descer a pormenores em cada tema a que se dedica. É importante que diversos âmbitos da vida estatal sejam ordenados somente por normas dotadas de grande “amplitude material e indeterminação”.
A teoria da Constituição dirigente
As constituições dirigentes contêm não apenas garantias da liberdade individual, mas também programas, metas e objetivos a serem executados pelo Estado e pela sociedade. São constituições típicas do Estado Social, que positivam direitos prestacionais e dispõem sobre a intervenção estatal no domínio econômico. Nos textos constitucionais dirigentes, está descrito um estado ideal de coisas que o constituinte quer ver realizado no futuro.
No Brasil, como na Europa, a teoria do constitucionalismo dirigente norteou parte do pensamento constitucional de esquerda. Percebe-se, aqui, a influência das propostas reformadoras do socialismo democrático e da socialdemocracia. Entende-se, por um lado, que a justiça social está vinculada aos aspectos centrais do modelo igualitário de organização da vida econômica. Por outro lado, parte-se da premissa de que a necessária transformação da sociedade deve ser alcançada por meio dos instrumentos do constitucionalismo democrático. Rejeita-se, com isso, tanto a via revolucionária de transformação da sociedade, quanto o arcabouço institucional que predominou nos países do socialismo real.
O exemplo mais expressivo de Constituição dirigente é a Constituição Portuguesa, de 1976, atualmente em vigor. Resultado da Revolução dos Cravos, que pôs fim a um governo autoritário, e elaborada com intensa participação de comunistas e socialistas, a Constituição previa, em seu texto originário, a própria “transição para o socialismo” (art. 1º) e a criação de uma “sociedade sem classes” (art. 2º).
Tais dispositivos, dentre outros, foram alterados pela primeira Revisão Constitucional, de 1982, com a substituição das expressões originais pelas fórmulas menos ideologicamente carregadas de “construção de uma sociedade livre, justa e solidária” (art. 1º) e “realização da democracia econômica, social e cultural” (art. 2º), as quais, contudo, ainda mantêm forte teor dirigente.
Muitas das constituições contemporâneas, embora não se identifiquem, com igual intensidade, com os compromissos ideológicos contidos no texto originário da Constituição Portuguesa, também são integradas por preceitos que proclamam, como objetivos a serem perseguidos, a igualdade e a justiça social, adotando fórmulas mais próximas da atual redação do texto constitucional lusitano.
O dirigismo constitucional elabora um conceito material de legitimidade:
As Constituições devem conter não só normas que determinam limites (Constituição garantia) e processos (Constituição como processo ou instrumento de governo) para a atividade política, mas também normas definidoras de finalidades políticas e econômicas.
A teoria da Constituição dirigente busca justamente investigar a vinculação do Estado e da sociedade a esse tipo de programa constitucional transformador:
“a Teoria da Constituição assume-se como teoria da constituição dirigente enquanto problematiza a tendência das leis fundamentais para:
1. se transformarem em estatutos jurídicos do Estado e da sociedade;
2. se assumirem como norma (garantia) e tarefa (direção) do processo político social”.
Com esse propósito, a teoria da Constituição dirigente elege temas prioritários, como:
► a legitimação substantiva da legislação;
► a estrutura das normas programáticas;
► o grau e a forma de vinculação do legislador ao programa constitucional.
A questão central é identificar em que medida o conteúdo material fixado no programa constitucional é determinante para a atividade legislativa, definindo o próprio teor das decisões políticas tomadas pelas gerações futuras.
A contribuição mais importante, no âmbito da teoria da Constituição dirigente, é a do constitucionalista português Gomes Canotilho. Sua tese de doutoramento, intitulada A Constituição dirigente e a vinculação do legislador, além de influenciar de maneira definitiva nossa teoria constitucional, foi referência também para a própria elaboração da Constituição de 1988.
Canotilho sustentava a tese de que o legislador estaria vinculado ao programa constitucional, devendo observar não apenas as normas que instituem direitos e procedimentos, mas também aquelas que estabelecem programas de ação. A legitimidade material dos atos legislativos dependeria de sua capacidade de concretizar as diretrizes instituídas no texto constitucional.
Ressalte-se, porém, que, para Canotilho, a “vinculação do legislador” ao programa estabelecido na Constituição não se alicerçava na atuação do Poder Judiciário. Para ele, “em sede de constituição dirigente, não tem grande sentido nem alcance prático falar-se dos tribunais oude um tribunal constitucional como ‘defensor da constituição’. (...) Quer pela especificidade das suas funções, quer pelos problemas de legitimação democrática, o alargamento das funções do juiz a tarefas de conformação social positiva é justamente questionável”.
Ele apostava muito mais na participação popular do que na atuação do Judiciário como mecanismo de concretização dos objetivos constitucionais traçados pelas normas programáticas.
A incorporação da teoria da Constituição dirigente no Brasil, porém, a conjugou com institutos dogmáticos e processuais tendentes à efetivação judicial da Constituição. Entre nós, predominou a compreensão de que, por ser “menor o nível de organização e atuação política da sociedade civil”, deveria ser aumentada “a responsabilidade dos integrantes do Poder Judiciário na concretização e no cumprimento das normas constitucionais, inclusive as que possuem uma alta carga valorativa e ideológica”.
Hoje, Canotilho não mais sustenta, nos mesmos termos, a tese da vinculação do legislador à Constituição dirigente. Para ele, “subjacente ao programa constitucional está toda uma filosofia do sujeito e uma teoria da sociedade cujo voluntarismo desmedido e o holismo planetário conduziram à arrogância de fixar a própria órbita das estrelas e dos planetas”.
Para o constitucionalista português, a globalização, o fortalecimento do Direito Comunitário (no âmbito europeu) e Internacional, e o advento de uma filosofia constitucional pós-moderna, descrente em relação a projetos muito grandiosos de transformação social pelo meio do Direito, teriam contribuído para desgastar as premissas do constitucionalismo dirigente.
Pós-positivismo neoconstitucionalismo
Século XIX - A Sistematização do Direito
A teoria jurídica, ao longo do século XIX, realizara movimentos em direção à secularização, à positivação e à sistematização do Direito. Ao final desse processo, a sua vertente hegemônica passou a conceber o Direito separadamente da moral. O positivismo de Kelsen é a expressão máxima dessa concepção.
Nessa perspectiva, não caberia à teoria do Direito avaliar o conteúdo particular de cada ordenamento, no sentido de verificar sua compatibilidade com as normas morais. A justiça ou injustiça das normas jurídicas ou do próprio ordenamento não seria tema afeto à Ciência do Direito. O mesmo ocorre com a teoria do Estado.
No final do século XIX e início do século XX, forma-se uma teoria do Estado com enfoque especificamente jurídico, buscando definir o fenômeno estatal de forma neutra, sem enveredar em juízos de valor.
O objeto da teoria do Estado era, naquele contexto de virada do século, classificar e catalogar as instituições políticas, sem ingressar na reflexão crítica sobre suas características e funcionamento. A expressão “Estado de Direito” perde seu conteúdo material — assentado na ideia de limitação jurídica do poder político — para significar apenas que o poder político estatal se organiza juridicamente.
Essas teorias, ao não se pronunciarem sobre o conteúdo particular de cada ordenamento, acabaram deixando de fornecer instrumentos para a crítica do Direito produzido pelos Estados autoritários e totalitários da primeira metade do século. A ascensão do partido nazista ao poder, por exemplo, ocorreu pelos meios previstos na Constituição de Weimar. Chegando ao poder, os nazistas utilizaram o Direito como instrumento para a imposição de políticas repressivas e discriminatórias.
A Ciência do Direito que simplesmente descrevesse esse ordenamento jurídico, deixando de se pronunciar sobre a extrema injustiça de seu conteúdo, podia ser condenada como omissa, quando a afirmação política do Estado de Direito era demandada em todos os níveis, mesmo no da teoria do Direito.
Diante do mal absoluto, a pretensa neutralidade científica era totalmente incapaz de se justificar. Perante a dramática irracionalidade do Direito e do Estado, se tornava completamente inadequada a concepção segundo a qual apenas a análise objetiva do fenômeno jurídico poderia ser validada como racional.
Surgem, então, a partir do segundo pós-guerra, teorias do Direito que procuram religar as esferas do Direito e da moral. Na constelação de ideias que procuram oferecer alternativas às abordagens positivistas, não há, obviamente, unidade ou consenso. Há, porém, convergência no tocante a dois objetivos centrais: procurar superar o afastamento entre Direito e moral preconizada pelo positivismo e reabilitar o uso prático da razão na metodologia jurídica.
Segunda metade do Século XX - A volta do Jusnaturalismo
Após o final da II Guerra Mundial, ocorreu, em um primeiro momento, um resgate do jusnaturalismo, que passou a ser defendido como um escudo contra a barbárie. É certo, porém, que a Filosofia do Direito que prevaleceu entre os nazistas rejeitava importantes dimensões do positivismo, como o compromisso com a legalidade, concebendo o direito em nome da preservação do “espírito do povo” e da realização dos “interesses do Reich”.
O renascimento do jusnaturalismo, na segunda metade do século XX, foi, todavia, bastante fugaz. Como o Direito natural só podia se basear em fundamentação metafísica, ele não mais se sustentava em sociedades plurais, nas quais vigoram múltiplas concepções acerca do bem, inúmeras identidades particulares, diversos projetos de vida. Por isso, a tentativa de resgate do jusnaturalismo acabou abandonada, mas as inquietações provocadas pela crise do positivismo jurídico se mantiveram acesas.
Muitas têm sido as propostas formuladas desde então para oferecer uma alternativa consistente para o Direito, sem retroceder, contudo, ao antigo dilema entre positivismo e jusnaturalismo. Nesse cenário, pode ser identificada a emergência de um novo paradigma jus filosófico, que tem sido chamado de pós-positivismo.
O pós-positivismo se caracteriza por buscar a ligação entre o Direito e a moral por meio da interpretação de princípio jurídicos muito abertos, aos quais é reconhecido pleno caráter normativo. Ele, porém, não recorre a valores metafísicos ou a doutrinas religiosas para busca da Justiça, mas sim a uma argumentação jurídica mais aberta, intersubjetiva, permeável à moral, que não se esgota na lógica formal.
É claro que, no âmbito do paradigma pós-positivista, existem diferenças internas bastante consistentes. Há, por exemplo, visões mais ou menos liberais nos campos político ou econômico; posições mais ou menos favoráveis ao protagonismo do Poder Judiciário na arena constitucional. No entanto, nossa percepção inicial é de que tais diferenças não são maiores do que as existentes no positivismo, entre, por exemplo, posições como a de Hans Kelsen e as da Escola da Exegese.
O campo do pós-positivismo jurídico não é apenas o Direito Constitucional. Não obstante, na seara constitucional, o pós-positivismo encontrou o solo mais fértil para florescimento, tendo em vista as características das constituições contemporâneas, pródigas na consagração de princípios abstratos dotados de forte conteúdo moral. Diante dessa característica da maior parte dos textos constitucionais contemporâneos — inclusive o brasileiro de 1988 — sequer é necessário que o jurista, para se engajar no pós-positivismo, recuse a premissa teórica básica do positivismo, de ausência de ligação necessária entre Direito e moral. Afinal, se o próprio ordenamento positivo princípios dotados de inequívoco conteúdo moral, situando-os no seu plano hierárquico mais elevado, mesmo um positivista poderá reconhecer a penetração da moral no processo de interpretação e aplicação das normas constitucionais.
O pós-positivismo se liga diretamente ao ambicioso modelo constitucional que tem se difundido nas últimas décadas e vem sendo designado por diversos autores como neoconstitucionalismo. Esse modelo:
►Envolve, simultaneamente, mudanças no tipo das constituições e dos correspondentes arranjos institucionais e alterações na teoria jurídica subjacente.
► Está associado a diversos fenômenos reciprocamente implicados, seja no campo empírico, seja no plano da dogmática jurídica,que podem ser assim sintetizados:
 
Neoconstitucionalismo:
• Mais princípios em vez de regras;
• Mais ponderação do que subsunção;
• Justiça particular ao invés de justiça geral;
• Mais Juiz do que Legislador;
• Mais Constituição do que lei.

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