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MOTTA (2009) - Agonia ou Robustez-

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MOTTA (2009) - Agonia ou Robustez?
Reflexões acerca da historiografia econômica brasileira – José Flávio Motta
Professor Antonio Cândido afirma: Casa Grande e Senzala (Gilberto Freyre), Raízes do Brasil (Sérgio Buarque de Holanda) e Formação do Brasil Contemporâneo (Prado Jr) são livros chave que parecem exprimir a mentalidade ligada ao sopro de radicalismo intelectual e análise social que eclodiu depois da Revolução de 30.
Para Motta, dos 3 destaca-se o livro de Prado Jr, da perspectiva da história econômica. Sobre ele, Cândido ainda escreve: “trazendo para a linha de frente os informantes coloniais de mentalidade econômica mais sólida e prática, dava o primeiro grande exemplo de interpretação do passado em função das realidades básicas da produção, da distribuição e do consumo”.
Na década de 40, a educação pradiana constituiu uma possibilidade de aproximação à história do Brasil alternativa à análise de ciclos, quase justapostos em ordem cronológica (sai pau-brasil, entra açúcar). Esse erro é cometido por Simonsen, que utiliza os termos ciclo, fase ou época como sinônimos. Tentando organizar a história cronologicamente, Simonsen favorece uma visão compartimentada e estanque da história.
Prado Junior viu o processo econômico brasileiro globalmente: interpretou vários setores da atividade econômica colonial, sendo o primeiro a apontar a unidade do sistema, marco muito importante na reflexão histórica sobre o passado brasileiro. Descobriu nos ciclos manifestações de algo mais profundo, a “estrutura exportadora da economia colonial”.
Sentido da colonização Brasileira: portugueses não utilizavam feitoria, mas tinham o mesmo objetivo que ela, explorar recursos naturais de um território virgem em proveito do comércio europeu.
Novais e Furtado estavam presos à interpretação anterior.
Auge da interpretação de Caio Prado: entre décadas de 60 e 70. Crítica de Iglésias: falta amplitude de informações, dados, números e quantidades. Crítica reveladora: são reparos nada viscerais. Para Iglésias, era a oposição entre a história econômica dos historiadores e dos economistas, ilustrada pela contraposição entre Prado jr e Furtado. Tomou o partido de Caio Prado por parecer-lhe que o trabalho de economistas era às vezes abstrato, quase construção mental.
Iglésias não questiona Caio Prado, mas chama a atenção para que seus sucessores busquem informações ausentes em sua obra (dados, quantidades e números). Fazer ciência normal.
Kuhn: Ciência Normal: Tentativa de forçar a natureza a encaixar-se dentro dos limites preestabelecidos e relativamente inflexíveis fornecidos pelo paradigma. Não tem como objetivo trazer a tona novas espécies de fenômenos (os que não se encaixam ao paradigma não são vistos). Cientistas não procuram criar novas teorias. Está dirigida para a articulação daqueles fenômenos e teorias já fornecidos pelo paradigma. Restringe a visão do cientista.
Ciro Cardoso, Gorender e Barros de Castro: se aproximaram nas críticas a Caio Prado. Para eles, a essência das críticas está na necessidade de centrar a atenção no espaço colonial, ou seja, o enfoque às relações de produção da economia colonial precisam ser estudadas de dentro para fora.
Castro: A forma pela qual os interesses externos atuam sobre a colônia passa a depender primeiramente da sua solidez e estrutura interna. O projeto colonial e/ou mercantilista subsiste, sem dúvida, seu raio de incidência fica limitado pelo surgimento na colônia de uma estrutura socioeconômica, com seus elementos de rigidez, suas regularidades, seus interesses e seus conflitos que lhe são próprios.
Cardoso: Sociedades da América Latina e Antilhas só revelam seu sentido se consideradas em um sistema vasto, na medida em que surgiram como anexos complementares da economia européia, dependentes de áreas metropolitanas. Porém, nelas também surgiram sociedades cujas estruturas internas possuem lógicas não necessariamente conectadas com o mercado externo. Logo, a análise de anexos complementares é insuficiente. Deve-se analisar as estruturas das colônias em si mesmas.
Insuficiência do Paradigma.
No bojo da ciência normal, muitos estudos procuraram trilhar o caminho de Iglésias. Produção historiográfica: fontes de caráter seriado, com análise quantitativa, demandam um diálogo com a Economia e a Estatística, não conseguiu evitar a desvantagem do paradigma. 
“Cultura da monografia”: melhor maneira de “fazer ciência normal”.
Porém, há um impacto positivo desses estudos no sentido de procurarem suprir insuficiências pradianas. Trouxeram à luz uma economia e uma sociedade pretéritas diferente daquelas construídas pelo paradigma.
Iraci da Costa: Grave limitação do modelo pradiano deve-se ao fato de ele haver transposto para o plano fenomênico, sem mediações, elementos que considerou a essência de nossa formação. Resta-nos uma caricatura da vida social e econômica, desfigurada, apartada das experiências do dia-a-dia, perdem-se as especificidades e as peculiaridades do escravismo moderno. Se fica com um “sentido” abstrato, imaterial, que faz com que nos sintamos incomodados e “desconfortáveis” quando confrontamos nossa visão daquela sociedade que derivamos da leitura dos escritos de Caio Prado Júnior.
Para Além do Paradigma Pradiano
Produção historiográfica trouxe certo desalento com as grandes explicações socioeconômicas. 
Contudo, também há ganhos: estudos se aproximaram da realidade analisada. Ex: caracterização dos escravos, que aprofundou-se, e resultou em um entendimento que atribui a eles um papel de destaque, cuja atuação, juntamente à dos livres e libertos, foi fundamental na construção quotidiana do escravismo brasileiro. Afasta-se dos estereótipos: escravo submisso (dócil e feliz) ou escravo reificado (equiparado a um bem) Volta-se os olhos para o escravo que lutava (não necessariamente um Zumbi): luta renhida, dia após dia, marcada por reveses e conquistas, na qual procurava sua humanidade, emancipar-se, moldando os parâmetros de ser escravo (Motta).
Ganhos no que tange à estrutura da posse de escravos e no segmento formado pelos não-proprietários de cativos. Resultado essencial para repensarmos o processo de nossa formação socioeconômica, além dos limites da plantation (que não é suficiente para explicar a reprodução no tempo da sociedade brasileira).
Panos de fundo socioeconômicos distintos podem dar origem a populações com estruturas geográficas de perfis estatísticos semelhantes, é o caso do Brasil nos séculos XVIII e XIX.
Relações familiares existentes entre os cativos: Até 1970 não se via relevância nelas. Contexto: se multiplicavam as escravarias compostas por reduzidos números de cativos. As relações familiares entre eles era o único modo de constituir acréscimos ao seu patrimônio. Isso porque os escravos eram sujeitos ativos de sua história, logo o escravismo era uma arena de negociação permanente.
O trabalho do escravo executado em um domicílio de um pequeno agricultor, onde ele vivesse com sua esposa, filhos e poucos escravos, decerto envolvia relações muito diferentes daquelas presentes em um engenho, onde turmas de escravos trabalhavam sob a supervisão de feitores. No primeiro caso, família e escravos poderiam labutar lado a lado.
Documentação sobre a escravidão: relata um universo complexo e de grandes possibilidades analíticas. Exacerba a sensação de desconforto de I da Costa, pelo distanciamento percebido entre o que é relatado e a caricatura fornecida pelo paradigma. Por outro lado, patenteia a robustez da historiografia responsável por esse repensar de nossa formação econômica e social.
Robustez evidenciada nos estudos acerca da escravidão encontrou sua natural inclinação na historiografia no sentido de avançar os primeiros passos para que a partir do complexo universo, se extraia dele uma discussão mais abrangente. Fundamento teórico: capital escravista-mercantil. Pires e Costa (exemplo dos esforços): propunham a vigência, no âmbito do escravismo moderno, de uma específica forma do capital: “enfim, mais-valia, valor que se valoriza, portanto capital; porém,uma forma específica de existência de capital, pois calcada na produção de mercadorias com base no escravismo”.
Incapaz de conceber sua reprodução no tempo de maneira autônoma, mas exercia ampla dominância no espaço colonial. (Nota: “...mais-valia recorria da ação do capital escravista-mercantil, embora isolado dos mercados externos e da órbita da circulação. (...) Esfera da produção interna em sua órbita: dominância em produção de mercadorias (exportáveis ou não), valores de uso e de serviços e a alocação de recursos e fatores e disseminando-se pela circulação interna. Afetava: geração e distribuição de renda, escala da produção, vida social e política. Logo, segmentos sociais e econômicos não diretamente vinculados ao escravismo se viam influenciados e determinados (no que tange ao seu limite no espaço colonial) pelo capital escravista-mercantil”. Pires e Costa).
O processo de acumulação do capital escravista-mercantil o tornava mais dependente dos pressupostos externos (se aumentava a produção, com ela a dependência para o suprimento de cativos e escoamento da produção). No Brasil, a constituição de uma economia reflexa e dependente não decorreu meramente da exploração metropolitana ou de o fato de a colônia ter sido voltada para o suprimento de produtos para o comércio europeu, mas derivou da forma de capital cujo predomínio continuou até 1888. (Pires e Costa)
O surgimento e desenvolvimento de uma economia relativamente autônoma, voltada para dentro se mostrava compatível com a forma de capital escravista-mercantil e dela decorreu. (Pires e Costa)
Considerações finais: Certeza no que respeita à relevância que teve nas últimas décadas a pesquisa assentada em variado elenco de fontes primárias para o avanço do conhecimento do passado brasileiro. Esses resultados não implicam negação de uma pesquisa teórica mais ampla: um não faz sentido sem o outro; Carlos Ginziburg: Micro-história deveria levar a repensar as generalizações históricas, mas não deve ser vista como alternativa à história geral. Ambas devem ser aprendidas para que sejamos capazes de entender os impactos de processos globais num microssomo; 
Relevância de esforços de Pires e Costa: primeiros passos à proposição de elementos teóricos capazes de dar conta das evidências empíricas que têm sido levantadas. São essas evidências causadoras do “desconforto” por se separarem das inferências realizadas a partir da interpretação pradiana. E não somente da formulação de Caio Prado, mas também de outras que como ela mais parecem esforçar-se por “encaixar” evidências dentro de seus “limites preestabelecidos e relativamente inflexíveis”. Logo, dificuldades são grandes, mas a robustez de nossa historiografia faz nos acreditar que os primeiros passos serão seguidos. E serão novas gerações de estudiosos de nossa história econômica que concretizarão essa expectativa favorável.

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