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Prática Jurídica Constitucional e Tributária Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Me. Meire Cristina de Souza Revisão Textual: Prof.ª Dr.ª Selma Aparecida Cesarin Revisão Técnica: Prof. Dr. Reinaldo Zychan Apresentação e Noções Gerais Apresentação e Noções Gerais • Permitir visão geral dos principais institutos do direito material e processual em matéria constitucional e tributária; • Introdução ao processo constitucional e ao processo tributário administrativo e judicial. OBJETIVOS DE APRENDIZADO • Noções Direito Constitucional; • Noções Direito Tributário. UNIDADE Apresentação e Noções Gerais Noções Direito Constitucional Supremacia das Normas Constitucionais O Direito Constitucional é um ramo do Direito Público que tem por finalidade a constituição política e jurídica do Estado, ou seja, é o Direito que estrutura o Estado e é responsável pela organização, sistematização e integração de todo o ordenamento jurídico desse Estado. O Direito Constitucional, dessa forma, constitui-se pelas normas fundamen- tais relativas à estrutura do Estado, isto é, forma de governo, meio de aquisição e exercício do poder, repartição vertical e horizontal do poder, estabelecimento de seus órgãos administrativos, limites de sua atuação, direitos fundamentais das pessoas e suas respectivas garantias, além de regras básicas e gerais da ordem social e econômica. Os Princípios e as Normas Fundamentais do Estado compõem a Constituição que, no caso do nosso país, é a Constituição Federal de 1988. A Constituição Federal é o conjunto de normas que estabelecem a estrutura do Estado e a base de funcionamento de todos os órgãos que irão compor tal Estado, bem como o início de todo o ordenamento jurídico que disciplinará as relações entre Estado e cidadãos, e dos cidadãos entre si. A Constituição traz, ainda, expressas em seu texto, normas de direitos e garantias fundamentais desses cidadãos que fazem parte do elemento fundamental do Estado, qual seja, o povo, e que deverão ser observadas pelos órgãos e agentes do Estado em todas as suas esferas de poder. Sendo a Constituição o conjunto de normas que estruturam o Estado e iniciam o ordenamento jurídico de um país, é a partir de suas normas que o ordenamento ju- rídico irá se estabelecer, seja por meio da legislação nova, seja, ainda, pela recepção das normas anteriores ao texto constitucional vigente. Você Sabia? O Código Tributário Nacional foi recepcionado pela nossa Constituição Federal de 1988. O CTN foi estabelecido pela Lei nº. 5.172, de 25 de outubro de 1966, ainda sob a vigên- cia da Constituição de 1946, contudo, já no contexto do Regime Militar que foi insta- lado em 1964. A Constituição é a certidão de nascimento do Estado e traz a sua estrutura com- pleta, de forma que todas as Leis e Atos Normativos que compõem o ordenamento jurídico de uma Estado devem estar em conformidade com as Normas Constitucio- nais, assim como todos os entes federativos no exercício de suas funções também devem agir em conformidade com as normas estabelecidas na Constituição. 8 9 Figura 1 Fonte: Wikimedia Commons Assim, a supremacia das normas constitucionais corresponde à vinculação total de todos os Poderes do Estado ao que estabelece o texto da Constituição, de modo que as Leis Infraconstitucionais de todas as esferas de poder sejam compatíveis com a Constituição Federal. O Princípio da Supremacia, dessa forma, requer que todas as situações jurídicas se- jam compatíveis com os princípios e os preceitos estabelecidos na Constituição. Essa conformidade com os ditames constitucionais, contudo, não se preenche apenas com a atuação positiva de acordo com a Constituição, sendo necessário controle da cons- titucionalidade das normas infraconstitucionais, conforme veremos no próximo Item. A Constituição Federal, assim, é a Lei Maior, a Lei das Leis, a “mãe” do ordena- mento jurídico de um Estado e está acima de todas as Leis e atos normativos que regem um povo. É por meio da Teoria Pura do Direito, obra do jurista Hans Kel- sen, que se tratou da hierarquia das Leis em uma “estrutura escalonada do Direito”. Em sua obra, Hans Kelsen afirma que é a Constituição que dá validade a todas as ou- tras normas. É a Constituição que prevê o Processo Legislativo, ou seja, a forma como as Leis e Atos Normativos serão realizados para entrar no ordenamento jurídico de um Esta- do e, dessa forma, a supremacia da Constituição deve ser observada tanto pelas normas infraconstitucionais quanto pelos órgãos e poderes que compõem a estrutura do Estado. Direitos e garantias fundamentais – Distinção Como visto no item anterior, a Constituição Federal traz em seu texto normas que estruturam o Estado, que regulam as relações entre os cidadãos e entre o Estado e os cidadãos e, ainda, os direitos e garantias fundamentais. O s direitos fundamentais encontram-se em vários Artigos da Constituição, não apenas no Título II, que trata dos Direitos e Garantias Fundamentais. 9 UNIDADE Apresentação e Noções Gerais Mas direitos e garantias são a mesma coisa? Existe alguma diferença, uma vez que o Título II expressa, nos Artigos 5º ao 17, os direitos e deveres individuais e coletivos (Art. 5º), os di- reitos sociais (arts. 6º ao 11), os direitos de nacionalidade (arts. 12 e 13), os direitos políticos (arts. 14 a 16) e os direitos relacionados o pluralismo político (Art. 17)? O Título II da Constituição Federal de 1988 expressa, no Artigo 5º e seguintes, a declaração dos direitos individuais e coletivos e também as garantias constitucionais contra a violação de qualquer direito do cidadão. Importante! Os direitos fundamentais não constituem direitos absolutos, vez que a própria Constitui- ção pode trazer limitações ao exercício de alguns desses direitos, como, por exemplo, o direito de propriedade (Art. 5º, XXII) que é relativizado no Inciso seguinte com a previsão de que a propriedade deve atender à sua função social (Art. 5º, XXIII), sob pena de perda desse direito por desapropriação (Art. 182, §§ 2º e 4º) ou por usucapião (Art. 183). Figura 2 Fonte: Pixabay Assim, a diferença básica entre direitos e garantias consiste em que, nos primei- ros, a Constituição declara os direitos da pessoa humana e, no segundo, expressa de que forma tais direitos são assegurados pelas Normas Constitucionais. Dessa forma, o Título II ao expressar os direitos individuais e coletivos, no Ar- tigo 5º da Constituição, também expressa as garantias e os chamados “remédios constitucionais”, que se consistem nas ferramentas disponíveis para a proteção dos direitos declarados. Sampaio Dória (2016) adverte, entretanto, acerca da correspondência terminoló- gica que se forma em torno das expressões direitos e garantias, afirmando que “os direitos são garantias e as garantias são direitos”. A finalidade da expressão “direitos fundamentais” está em alcançar situações ju- rídicas, objetivas e subjetivas, expressas no ordenamento jurídico positivo, para a proteção da dignidade, da igualdade e da liberdade da pessoa humana. 10 11 Assim, a s garantias constitucionais, em conjunto, consistem em imposições, po- sitivas ou negativas, a todos os órgãos do Poder Público estatal, a fim de limitar sua conduta para assegurar a observância dos direitos fundamentais ou, em caso de violação, sua reintegração ao cidadão. De acordo com a Constituição, ao Poder Legislativo compete basicamente legislar e fiscalizar os atos do Poder Executivo. No âmbito federal, o Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional – composto pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. Na Câmara, ficam os deputados federais e no Senado, os senadores. No plano estadual, este poder é exercido pelas Assembleias Legislativas, por meio dos deputados estaduais, e na esfera municipal quem exerce essa função é a câmara legislativa do município, composta pelos vereadores eleitos. Em se tratando da fiscalização exercida pela Poder Legislativo local, ou seja, pela câmara legislativa,é possível que um vereador de determinado município exija de forma individual, como parlamentar, informações e documentos sobre assuntos referentes à administração municipal com vistas à fiscalização? O Supremo Tribunal Federal – STF no julgamento do Recurso Extraordinário 865.401/MG em 25/04/2018, apreciando o tema 832 da repercussão geral, na relatoria do Ministro Dias Toffoli, decidiu por unanimidade, dar provimento ao recurso fixando a seguinte tese: “O parlamentar, na condição de cidadão, pode exercer plenamente seu direito fundamental de acesso a informações de interesse pessoal ou coletivo, nos termos do Art. 5º, inciso XXXIII, da CF e das normas de regência desse direito”. RE 865401, disponível em: https://bit.ly/3altlPf Podemos observar que o Recurso Extraordinário 865.40, de Minas Gerais, teve como base uma ação mandamental, ou seja, um Mandado de Segurança, com a finalidade de proteger direito líquido e certo previsto na Constituição Federal em seu Artigo 5º, XXXIII, qual seja, o direito à informação. Por meio do Mandado de Segurança, foi garantido ao parlamentar, na condição de cidadão, o direito de acesso à informação. O direito à informação consiste em direito fundamental do cidadão e sua garantia também está prevista na Constituição expressamente em seu Artigo 5º, LXIX. Assim, temos, no caso apresentado, um direito fundamental declarado constitucionalmente e uma garantia de proteção desse direito, ambos expressos no Artigo 5º, que traz um amplo rol de direitos e deveres individuais e coletivos, assim como garantias para a efetivação desses direitos e deveres. Você Sabia? Os direitos e garantias individuais e coletivos previstos no Artigo 5º da Constituição não se exaurem nos 78 Incisos ali expressos, ou seja, não se trata de rol taxativo, vez que o parágrafo 2º do Artigo 5º estabelece a proteção de outros direitos e garantias decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos Tratados internacionais em que Estado brasileiro seja parte. 11 UNIDADE Apresentação e Noções Gerais Remédios Constitucionais No item anterior, vimos que a Constituição expressa, em seu texto, os direitos e as garantias individuais e coletivos. Vários são os direitos, que não se esgotam no Artigo 5º, assim como várias são as garantias, que também podem ser expressas em Tratados internacionais, por exemplo. Nesse contexto, remédios constitucionais são espécies de garantias previstas constitucionalmente como instrumentos à disposição do cidadão para provocar a intervenção das autoridades competentes a fim de sanar, corrigir, proteger ou resta- belecer um direito constitucional violado. O termo “remédios constitucionais” é utilizado na doutrina e na jurisprudência pátria para se referir às garantias constitucionais específicas para exigir a proteção a direitos individuais ou coletivos. Remédios constitucionais, são, portanto, espécies de garantias que, por seu ca- ráter específico e por sua função saneadora e de restauração, recebem o nome de “remédios”, e remédios constitucionais, porque consignados na Constituição (SILVA, 2019, p. 445). Na Constituição Federal estão expressas as seguintes espécies de remédios cons- titucionais: a) Direito de petição e obtenção de certidão previsto no Art. 5º, Inc. XXXIV, alíneas “a” e “b” respectivamente; b) Habeas corpus, previsto no Art. 5º, Inc. LXVIII; c) Mandado de Segurança, previsto no Art. 5º, Inc. LXIX; d) Mandado de Segurança Coletivo, previsto no Art. 5º, Inc. LXX; e) Mandado de Injunção, previsto no Art. 5º, Inc. LXXI; f) Habeas data previsto no Art. 5º, Inc. LXXII; g) Ação Popular previsto no Art. 5º, Inc. LXXIII. O direito de petição tem sua origem nas revoluções inglesas de 1628 e sua con- solidação na Revolução Gloriosa, (Bill of Rights), em 1689, e consiste em direito que pertence a uma pessoa de peticionar aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder. O direito a certidões garante a todos, independentemente do pagamento de taxas, a obtenção de certidões em repartições públicas com a finalidade de defesa de direi- tos e esclarecimentos de situações de interesse pessoal. O habeas corpus é a garantia mais antiga conquistada pelo cidadão na Magna Carta de 1215 na Inglaterra, e consiste em um remédio destinado a tutelar o direito de liberdade. 12 13 O Mandado de Segurança Individual consiste em remédio que visa a amparar direito pessoal líquido e certo, cuja legitimidade para impetração pertence apenas ao titular do direito violado. O Mandado de Segurança Coletivo, por sua vez, consiste em remédio com a fi- nalidade de amparar direitos da coletividade de pessoas, cuja legitimidade pertence aos partidos políticos com representação no Congresso Nacional e organização sin- dical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelos menos um ano, para defesa dos interesses de seus membros ou associados. O Mandado de Injunção traduz-se em garantia de Ação Constitucional que permi- te ao cidadão titular de um direito cujo exercício seja obstado em razão da inexistên- cia de norma regulamentadora, exigir do Poder Público a injunção para determinar prazo razoável para que o impetrado promova a edição da norma regulamentadora ou estabelecer as condições em que se dará o exercício dos direitos, das liberdades ou das prerrogativas reclamados ou, ainda, se for o caso, as condições em que poderá o impetrante promover ação própria visando a exercê-los, caso não seja suprida a mora legislativa no prazo determinado. O habeas data é o remédio para assegurar ao cidadão o conhecimento de infor- mações importantes relativas à pessoa do impetrante, que constem de registro ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público, ou ainda, para assegurar a retificação de dados quando não houver preferência de fazê-lo por meio de processo sigiloso, judicial ou administrativo. A Ação Popular, por outro lado, consiste em remédio de caráter impessoal, vez que qualquer cidadão tem legitimidade para propô-la em defesa do patrimônio públi- co, histórico e cultural, da moralidade administrativa, do meio ambiente. Na próxima unidade, veremos o processamento das ações dos principais remé- dios constitucionais. Revista de Filosofia do Direito, do Estado e da Sociedade. Os remédios constitucionais e sua importância no ordenamento jurídico brasileiro. Disponível em: https://bit.ly/2DF6N07 Controle de constitucionalidade Conforme estudado no Item 1, vimos que a Constituição prevalece sobre todo o ordenamento jurídico em razão do princípio da supremacia das normas constitucio- nais. A Constituição, assim, prevê mecanismos a serem utilizados para exame da inconstitucionalidade das Leis e atos normativos infraconstitucionais. O Controle de Constitucionalidade, dessa forma, é previsto com a finalidade de adequação das normas infraconstitucionais ao texto da Constituição Federal, de 13 UNIDADE Apresentação e Noções Gerais forma a garantir a supremacia das normas constitucionais, em decorrência da rigidez formal da nossa Lei Maior. São Princípios que regem o controle de constitucionalidade das normas: • Supremacia da Constituição; • Hierarquia das normas ou hierarquia das fontes normativas; • Rigidez Constitucional. Para se declarar uma norma contrária à Constituição Federal, é necessário que se configure em seu texto uma inconstitucionalidade, total ou parcial. A Constituição, de fato, estabelece duas formas de inconstitucionalidades: a inconstitucionalidade por ação e a inconstitucionalidade por omissão (Art. 102, Inciso I, alínea “a”, e inciso III, alíneas “a”, “b” e “c”, e Art. 103, §§ 1º a 3º). A inconstitucionalidade por ação ocorre quando a produção de atos legislativos ou administrativos contrariam as regras ou princípios da Constituição. Essa contrariedade será verificada quando a norma padecer de um vício que pode se dar na forma como a Constituição estabelece o processo e procedimentosdas Leis e atos normativos ou, na matéria disciplinada, quando seu conteúdo é incompa- tível com o conteúdo da Constituição. A inconstitucionalidade formal se verifica quando o processo legislativo ou ato administrativo de produção da norma são realizados em desconformidade com o que estabelece a Constituição, ou seja, o vício formal é aquele que atinge o ato em seu processo de elaboração. Um exemplo é Lei complementar aprovada por votação com quórum de maioria relativa, padeceria tal norma de vício formal, uma vez que a Constituição determina que as Leis complementares serão aprovadas por maioria absoluta (Art. 69). Na inconstitucionalidade material, o vício encontra-se no conteúdo da Lei ou ato normativo que está em desacordo com o conteúdo de norma constitucional, ou seja, o texto da Lei ou ato normativo contraria princípios e regras constitucionais. Exem- plo: Lei que estabeleça a perda de um direito previsto na Constituição. O controle de constitucionalidade, dessa forma, tem por objetivo garantir a or- dem e a coerência do sistema normativo, e pode se realizar em dois momentos, ou seja, de forma preventiva ou repressiva. O controle preventivo de constitucionalidade pode ser político e judicial. O controle repressivo, somente ocorre de forma judicial. O controle político preventivo é realizado durante o processo legislativo da nor- ma por meio das comissões de constituição e justiça das duas casas do Congresso Nacional, responsáveis por analisar preventivamente a constitucionalidade do texto em tramitação. Pode ainda, ser realizado por meio do veto presidencial, ou seja, a Constituição prevê a possibilidade de o Presidente da República vetar totalmente ou parcialmente determinados projetos de Leis, e esse veto se justificará por duas razões: contrarie- dade ao interesse público e inconstitucionalidade (Art. 66, § 1º). 14 15 Um projeto de Lei vetado parcial ou totalmente por ser considerado inconstitucio- nal, só adentra ao ordenamento jurídico como Lei, quando esse veto presidencial é derrubado pelo Congresso Nacional (Art. 66, §4º). De toda forma, uma vez vetado, o controle exercido é o político preventivo, pois o projeto, ao seguir para sanção presidencial, ainda não se consubstancia efetivamente em Lei. O controle político repressivo pode ocorrer por meio de Ação Mandamental (Man- dado de Segurança) quando houver flagrante inobservância do Processo Legislativo estabelecido na Constituição ou, ainda, inobservância à legitimidade ou competência para iniciativa de propositura de determinada Lei ou ato normativo. O controle repressivo possui duas vias: a difusa e a concentrada, ambas com a finalidade de verificar a adequação das Leis e atos normativos que compõem o ordenamento jurídico infraconstitucional, e ambas realizadas pelo poder judiciário. Entretanto, o controle exercido pela via concentrada ou controle abstrato é de com- petência exclusiva do Supremo Tribunal Federal – STF, já o controle pela via difusa ou controle concreto, pode ser realizado por qualquer juiz, ou tribunal, respeitando- -se as diretrizes da legislação processual em vigor. Dessa forma, o controle difuso, ou seja, controle judicial com base em caso con- creto, pode ser exercido por qualquer juiz ou tribunal, desde que provocado por meio de incidente de inconstitucionalidade. Importante! A declaração de inconstitucionalidade, proferida por juiz ou tribunal no caso concreto, somente produzirá efeitos entre as partes que compõem o processo, ou seja, entre autor e réu, o que se denomina efeito inter partes. O controle concentrado de constitucionalidade, ou controle abstrato, é exercido apenas pelo STF em ações específicas cujos legitimados para propositura estão re- lacionados no rol taxativo do Artigo 103 da CF/88. Diz-se controle concentrado, porque somente um órgão do poder judiciário tem competência para exercer tal controle, e, diz-se abstrato, porque não tem como objeto um caso concreto entre autor e réu, o seu objeto será a Lei ou ato normativo em si para aferir a constitucionalidade ou não da norma. As Leis e atos normativos são gerais e abstratos, uma vez que seu regramento deve ser observado por todas as pessoas, daí ser denominado também controle abs- trato de constitucionalidade. Importante! A declaração de inconstitucionalidade proferida pela STF no exercício do controle abstra- to produzirá efeitos para toda a Sociedade, ou seja, efeito erga omnes. 15 UNIDADE Apresentação e Noções Gerais As ações que fazem parte do controle abstrato de constitucionalidade, e que serão estudadas pormenorizadamente na próxima unidade são: • ADI – Ação direta de inconstitucionalidade (Art. 102, I, a); • ADC – Ação declaratória de constitucionalidade (Art. 102, I, a); • ADO – Ação direta de inconstitucionalidade por omissão (Art. 103, § 2º); • ADPF – Arguição de descumprimento de preceito fundamental (Art. 102, § 1º). A Ação Direta de Inconstitucionalidade consiste na medida judicial cabível para declarar a inconstitucionalidade de Lei ou ato normativo federal ou estadual. A de- claração de inconstitucionalidade tem por objetivo a defesa da Constituição, cujas normas devem prevalecer sobre as normas infraconstitucionais. A Ação Declaratória de Constitucionalidade é a medida prevista para declarar a constitucionalidade de Lei ou ato normativo apenas da esfera federal, cabível nos casos de controvérsia judicial relevante sobre a aplicação da Lei ou ato normativo federal, isto é, os estados da federação ou o Distrito Federal, atribuem interpretação diversa sobre a mesma Lei ou ato normativo. A interpretação deverá ser conforme a vontade do legislador constitucional, con- tudo, essa interpretação pode variar de tribunal para tribunal, gerando a necessidade de conformidade, ou seja, de se declarar tal norma constitucional ou não. Você Sabia? As ações diretas de inconstitucionalidade e as ações declaratórias de constitucionalida- de, são ações ambivalentes, ou seja, possuem natureza dúplice. Assim, a improcedência de uma ADI equivale à procedência de uma ADC, e vice e versa, ou seja, a improcedência de uma ADC, equivale à procedência de uma ADI. Essa ambivalência está prevista no Artigo 24 da Lei nº. 9868/99, que disciplina o processo das ADI, ADC e ADO. Estabelece o referido Artigo, que proclamada a constitucionalidade, julgar-se-á improcedente a ação direta ou procedente eventual ação declaratória; e, proclamada a inconstitucionalidade, julgar-se-á procedente a ação direta ou improcedente eventual ação declaratória. A ação de inconstitucionalidade por omissão prevê a proteção da eficácia das normas constitucionais, vez que, determinando a Constituição que um direito ali declarado seja regulamentado por meio de Lei, a inércia ou omissão do legislador responsável pela regulamentação, configura a inconstitucionalidade. A arguição de descumprimento de preceito fundamental, regulamentada pela Lei nº. 9.882/99, possui caráter subsidiário, uma vez que a Lei expressamente veda a possibilidade de arguição de descumprimento de preceito fundamental, quando houver qualquer outro meio eficaz para sanar a lesividade. Um exemplo é a Lei municipal, cujo objeto não conste da respectiva constituição estadual, e que esteja em desconformidade com a Constituição Federal, poderá ser objeto do controle concreto, por meio de ADPF. 16 17 Importante! As Leis municipais em regra, serão objeto de controle de constitucionalidade perante o Tribu- nal de Justiça estadual, considerando que as constituições estaduais em sua maioria, repetem o texto do Constituição Federal. Entretanto, algumas Constituições não preveem na íntegra, as disposições da CF/88, atendo-se aos temas mais importantes e especificando as peculiarida- des regionais, dentro do parâmetro da Constituição Federal e, dessa forma, pode acontecer de um Município editar norma que esteja em desacordo com a Constituição Federal, sem, contu- do, violar a Constituição estadual. A não violação da ConstituiçãoEstadual obsta o controle de constitucionalidade pelo respectivo Tribunal de Justiça, e no âmbito do STF, seria incabível ADI, uma vez que são objetos de ADI as Leis e os atos normativos apenas estaduais e federais. Nesse caso, é possível o controle abstrato ou concentrado, por meio da ADPF. Acórdão ADPF nº 467/MG – Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 29/05/2020. Disponível em: https://bit.ly/31LdMN2 Para a propositura das ações do controle abstrato, a Constituição prevê um rol taxa- tivo de legitimados relacionados no Artigo 103. Assim, são legitimados para propositura das respectivas ações apenas: o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados, a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legis- lativa do Distrito Federal, o Governador de Estado ou do Distrito Federal, o Procurador Geral da República, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, qualquer Partido Político que tenha representação no Congresso Nacional e qualquer Confedera- ção Sindical ou Entidade de Classe, desde que possuam âmbito nacional. Importante! A doutrina e a jurisprudência do STF classificam os legitimados relacionados no Artigo 103 da CF/88, em legitimados universais e legitimados especiais. Entende o STF que o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara do Deputado, o Procurador Geral da República e o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil são legitimados universais, ou seja, podem propor as ações do controle concentrado em face de qualquer Lei ou ato normativo estadual e federal. Os legitimados especiais são a Mesa das Assembleia Legislativas dos Estados e a Mesa da Câmara Legislativa do Distrito Federal, o Governador de Estado ou do Distrito Federal, o partido político com representação no Congresso Nacional e a Confederação Sindical ou Entidade de Classe de âmbito nacional. Os legitimados especiais somente podem propor as ações do controle concentrado se comprovarem o requisito da pertinência temática, estabelecido por meio de interpreta- ção do STF, ou seja, só podem impugnar uma determinada norma se esta tiver relação com as suas finalidades institucionais. O requisito da pertinência temática, será demonstrado por parte dos governadores e Mesas do Poder Legislativo estadual e do DF, se a Lei impugnada disser respeito, de algum modo, às respectivas unidades federadas. Já, por parte das confederações e entidades de classe, somente se a norma em causa ferir os interesses dos respectivos filiados ou associados. 17 UNIDADE Apresentação e Noções Gerais O fenômeno e as formas de controle de constitucionalidade das Leis. Disponível em: https://bit.ly/33UpnvE Trocando Ideias... No Artigo 103 da Constituição Federal de 1988, está expresso o rol taxativo de legitimados para propor as ações do controle concentrado de constitucionalidade. Todavia, a Consti- tuição em momento algum no seu texto limita essa legitimidade com base em interesses regionais ou de associados e categorias, ou seja, com base em uma pertinência temática que, para alguns juristas, caracteriza-se com interesse de agir, de forma que a legitimidade constitucional prevista no Artigo 103 sofreu uma interpretação restritiva quanto aos gover- nadores, às Mesas da Assembleia e Câmara legislativas e, ainda, os partidos políticos com representação no Congresso, as Confederações sindicais e entidades de classe de âmbito nacional. Será que essa interpretação da Constituição reflete a vontade do legislador? A posição do STF, contudo, está se tornando menos rígida quanto à exigência da perti- nência temática. Não há um entendimento consolidado ainda, mas, no julgamento da ADI 3961, a corte conheceu da ação e flexibilizou a necessidade de pertinência temática para proposição de ações de controle de constitucionalidade. Venceu o voto da ministra Rosa Weber, para quem “a ausência de disciplina constitucional ou legal a respeito do tema acaba fazendo com que haja grande variação jurisprudencial a respeito do tema, ora mais restritiva, ora mais flexível quanto à pertinência”. Revista Consultor Jurídico. A gradual supressão da exigência da pertinência temática em controle abstrato. Disponível em: https://bit.ly/2PM4QRX Jurisdição constitucional Para que possamos entrar na prática por meio das ações constitucionais, faz-se necessário que tenhamos uma mínima compreensão do âmbito de atuação das nor- mas constitucionais, de sua força normativa e, principalmente, da interpretação, al- cance e eficácia de seu texto. Até onde vai a força normativa da Constituição? Quem dá a palavra final na interpretação das regras e princípios constitucionais? O termo jurisdição, conforme aprendemos no início da vida acadêmica como estudantes de Direito, significa o limite de atuação do poder judiciário para “dizer o direito”, seja no âmbito material, isto é, sobre qual tema o representante desse Poder pode atuar, seja no âmbito espacial, melhor dizendo, o limite territorial, no qual o poder de “dizer o direito” será exercido. A jurisdição constitucional, dessa forma, caracteriza-se pela constante aplicação da Constituição como parâmetro nas decisões judiciais e, nesse sentido, torna-se indispensável a verificação de alguns limites de atuação. 18 19 O exercício dessa jurisdição é de competência do Poder Judiciário, e a última palavra em interpretação do sentido das normas constitucionais, essencial para a efetivação do controle de constitucionalidade, é de competência do Supremo Tribunal Federal – STF. A jurisdição constitucional, nesse contexto, apresenta-se como uma forma de controle de constitucionalidade, que pode evidenciar um sentido formal ou material. Assim, o que aprendemos sobre controle de constitucionalidade, no Item 4, trata-se, também, de jurisdição constitucional, por meio da qual todas as Leis e os atos nor- mativos devem ser interpretados no limite das normas constitucionais. A Filosofia Hermenêutica para uma jurisdição constitucional democrática: fundamentação/ aplicação da norma jurídica na contemporaneidade. Revista de Direito da Fundação Getúlio Vargas, v. 5, n., p. 147. Disponível em: https://bit.ly/30QHWPu Processo e Legislação Processual Constitucional O Processo Constitucional consiste na forma de concretização e exercício de di- reitos fundamentais, e só foi possível a partir da Constituição Brasileira de 1988, ele- geu o Estado Democrático de Direito como matriz principiológica competente para orientar e reger todo o ordenamento jurídico nacional, uma vez que a Constituição é fundamento de validade de toda e qualquer norma brasileira. O exercício de defesa contra qualquer tipo de violação dos direitos fundamentais expressos na Constituição somente é possível por meio do Processo. A jurisdição constitucional, nesse sentido, também necessita do Processo para prevalecer. A ssim, o Processo Constitucional constitui-se como um conjunto de princípios e regras que norteiam e regem a atuação da jurisdição, assegurando a supremacia das normas constitucionais para assegurar a proteção de direitos e garantias fundamen- tais, bases de sustentação do Estado Democrático de Direito. A Constituição, nessa linha, estabelece diversas normas processuais de proteção aos direitos e garantias fundamentais do cidadão. A legitimidade para propositura dos remédios constitucionais, o devido processo legal e a ampla defesa, o duplo grau de jurisdição, o controle de constitucionalidade das Leis e atos normativos, são exem- plos de ferramentas que fazem parte do processo constitucional. Na próxima Unidade, veremos as Leis específicas que regem as ações do controle de constitucionalidade (Leis 9.868/1999 e 9.882/1999), que disciplinam o mandado de segurança individual e coletivo, o habeas data e a ação popular (Lei 12016/2009, Lei 9507/1997 e Lei 4717/1965). O que é processo constitucional?, Revista Eletrônica do Curso de Direito – PUC Minas Serro, n. 13, jan./jul. 2016. ISSN 2176-977X. Disponível em:https://bit.ly/2DS2Fts 19 UNIDADE Apresentação e Noções Gerais Legislação • ADI, ADC e ADO, disponível em: https://bit.ly/2PNntVk • ADPF, disponível em: https://bit.ly/3iDwXPo • Mandado de Segurança, disponível em: https://bit.ly/30QLaT2 • Habeas data, disponível em: https://bit.ly/3fVfekI • Ação Popular, disponível em: https://bit.ly/2XS2wx9 Em Síntese Até aqui, trabalhamos a importância da Constituição como norma que dá origem e validade a todo ordenamento jurídico de um Estado. A supremacia das normas cons- titucionais assegura que a Legislação infraconstitucional não viole direitos e garantias fundamentais, vez que o texto da Constituição traz a proteção dos direitos fundamentais por meio dos remédios constitucionais, de garantias ao cidadão e por meio do controle de constitucionalidade das Leis e atos normativos tanto de forma concentrada quanto ao caso concreto. Essas ações constitucionais serão trabalhadas de modo aprofundado no que tange às suas peculiaridades processuais, legitimidade e petição inicial com análise de casos concretos e ações do controle concentrado julgadas pelo STF. Noções Direito Tributário Sistema Tributário Nacional O Sistema Tributário Nacional consiste na disposição constitucional de competên- cias atribuídas à União, Estados, Distrito Federal e Municípios, bem como as limita- ções constitucionais ao poder de tributar (Arts. 145 a 162), compreendendo, ainda, toda a Legislação tributária disposta em Leis complementares, resoluções do Senado Federal, Leis federais, Constituições e Leis estaduais e as Leis municipais, que enu- meram e regulamentam a instituição e a arrecadação de tributos, conforme as com- petências estabelecidas na Constituição Federal para cada ente federativo tributante. Em seu Artigo 145, a Constituição disciplina os tributos de competência comum entre os entes federativos e estabelece critérios objetivos a serem observados no exercício dessa competência, como, por exemplo, o caráter pessoal dos impostos, a vinculação gradativa desses segundo a capacidade econômica de cada contribuinte, e a determinação expressa de que as taxas não podem ter base de cálculo própria de impostos. Impostos e taxas são espécies que pertencem ao gênero tributo. O significado de tributo está no Artigo 3º da Lei n.º 5.172/1966 que dispõe sobre o sistema tributário nacional (Código Tributário Nacional – CTN), e o conceitua como toda prestação 20 21 pecuniária compulsória, ou seja, que deve em regra, ser paga em dinheiro, e obriga- tória a todo aquele que pratica o fato gerador da obrigação tributária. O Artigo 3º do CTN estabelece, ainda, que tributo e multa não se confundem, isto é, tributo é obrigação que surge para o contribuinte que pratica o fato gerador da obrigação tributária expressa na Lei, a multa ou sanção, é a consequência que sofre o contribuinte por não recolher o tributo no prazo estabelecido em seu lançamento. O lançamento do tributo, ainda conforme determina o Artigo 3º do CTN, consiste em atividade administrativa plenamente vinculada ao que determina a Lei. Os tributos no sistema tributário nacional são os impostos, as taxas, as contri- buições de melhoria, as contribuições em geral e os empréstimos compulsórios. Os impostos, as taxas e as contribuições de melhoria, podem ser instituídos e ar- recadados tanto pela União quanto pelos Estados e Distrito Federal quanto pelos Municípios. Quanto aos empréstimos compulsórios, somente a União tem compe- tência para os instituir. As contribuições, em sua maioria, são de competência da União, como as contri- buições sociais, contribuições de intervenção no domínio econômico, etc. As contribuições para custeio de regime próprio de previdência social, contudo, podem ser instituídas por todos os entes, conforme dispõe o parágrafo 1º do Artigo 149 que, após a edição da Emenda Constitucional nº 103/2019, serão cobradas dos servidores ativos, dos aposentados e dos pensionistas, podendo ter alíquotas progressivas de acordo com o valor da base de contribuição ou dos proventos de aposentadoria e de pensões. Por fim, a contribuição para o custeio de iluminação pública, disposta no Artigo 149-A da Constituição Federal, é de competência privativa dos Municípios e do Dis- trito Federal. Figura 3 Fonte: Pixabay 21 UNIDADE Apresentação e Noções Gerais Principais limitações ao poder de tributar: Princípios Constitucionais Tributários A Constituição Federal, além de trazer a estrutura da distribuição das competên- cias tributárias de cada ente federativo, estabelece, ainda, limitações a esse poder por meio dos Princípios Constitucionais Tributários, que consistem em mandamentos com força normativa que norteiam a Legislação tributária em todas as esferas de poder, de modo que o contribuinte pode se valer de alguns remédios constitucionais para se proteger da violação de qualquer desses princípios. A partir do Artigo 150, a Constituição enumera as garantias asseguradas ao contribuinte, determinando expressamente aos entes tributantes que a exigência ou aumento de tributos se dê apenas por meio de Lei, garantindo tratamento isonômi- co aos contribuintes, proibindo que a Lei tributária gravosa ao contribuinte retroaja no tempo e proibindo e estabelecendo a anterioridade da Lei para determinados tributos, a fim de garantir ao contribuinte a possibilidade de se programar para o pagamento da respectiva obrigação. O Princípio da Anterioridade previsto na Constituição pode ser pelo prazo de no- venta dias ou um ano, ao que a doutrina denomina Princípio da Anterioridade Anual e Princípio da Anterioridade Nonagesimal, ou seja, a Lei que instituir ou majorar tributo só terá eficácia no próximo exercício financeiro ou após noventa dias de sua edição quanto a tributos específicos, como o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e as Contribuições Sociais. A exceção para essa regra da anterioridade anual e nonagesimal encontra-se em tributos como o Imposto de Importação (II), Imposto de Exportação (IE) e Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Assim, a Legislação que majorar ou alterar o Imposto de Importação, de Exportação e o IOF terá eficácia imediata, devendo o contribuinte que praticar o respectivo fato gerador desses tributos se adequar imediatamente às novas regras estabelecidas. Você Sabia? A Constituição Federal previa originalmente no Artigo 150 apenas a anterioridade anual, ou seja, fixava o intervalo entre a publicação da Lei e o primeiro dia do exercício finan- ceiro seguinte, de forma a permitir a adequação do contribuinte às novas regras estabe- lecidas, mas vigentes apenas no ano seguinte. Entretanto, ao se perceber a violação da garantia de anterioridade com a edição de Leis nos últimos dias do ano anterior, o legis- lador constituinte derivado, por meio da Emenda Constitucional 42/2003, acrescentou ao Inciso III do Artigo 150, a alínea “c” fixando um prazo mínimo de noventa dias entre a publicação da Lei e a possibilidade de exigência do tributo majorado. 22 23 Importante! Conforme a Súmula Vinculante nº 50 do STF, a norma legal que altera o prazo de reco- lhimento de obrigação tributária, não se sujeita ao Princípio da anterioridade, vez que a proteção garantida pelo respectivo princípio possui o objetivo de evitar que o contri- buinte seja surpreendido com alteração onerosa nos tributos, a fim de que a Sociedade não viva aos sobressaltos, sendo surpreendida com aumento dos tributos de uma hora para outra. Outra limitação ao poder de tributar, ainda no Artigo 150 da CF/88, é a proibição de que o tributo possua efeito de confisco, ou seja, que onere de tal forma o sujeito passivo a ponto de o valor da obrigação tributária se tornar igual ou superior ao valor da base de cálculo do fato gerador. A Constituição garante ao cidadão o direito de ir e vir e, nesse sentido, também limita a administração tributária, de forma que não se permita aos entes federativos estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens por meiode tributos interesta- duais ou intermunicipais. Importante! Inobstante à garantia constitucional de não limitação ao tráfego de pessoas e bens, a Constituição Federal permite à União, Estados, Distrito Federal e Municípios, a cobrança de pedágio pela utilização das vias conservadas pelo Poder Público. Todos os tributos de competência da União, ou seja, os tributos federais, por força do princípio da uniformidade geográfica (Art. 151, I), deverão ter aplicação idêntica em todo território nacional, de forma que, não exista diferença quanto ao fato gera- dor, base de cálculo ou definição dos contribuintes, para os Estados, Distrito Federal e Municípios. Nesse sentido, a Constituição, em respeito ao pacto federativo, não permite qualquer discriminação em relação aos demais entes federativos, exceto, quanto à concessão de incentivos fiscais com vistas a atender peculiaridades especí- ficas regionais ou locais dos Estados e Municípios brasileiros. Estabelece, ainda, o texto constitucional, imunidades que impedem a instituição de tributos sobre o patrimônio, renda ou serviços, entre os entes federativos, isto é, a instituição de imposto de renda sobre os bens e arrecadação de Estados e Municí- pios, por exemplo. Assim, o Município que possui a competência tributária para instituição do IPTU, irá exercer tal competência por meio de Lei municipal que não será aplicada aos imóveis pertencentes aos Estados, Distrito Federal, assim como aos imóveis que pertencem à União. 23 UNIDADE Apresentação e Noções Gerais Estão imunes, também, à obrigação tributária instituída por Lei os Partidos Políticos, os Sindicatos, as Instituições de Educação e de Assistência Social sem Finalidade Lucra- tiva, observados os requisitos previstos em Lei, por exemplo, a comprovação de atua- ção sem fins lucrativos, a comprovação de cumprimento das obrigações acessórias etc. Importante! A imunidade entre os entes federativos denomina-se IMUNIDADE RECÍPROCA e refere-se SOMENTE aos IMPOSTOS. A Imunidade sobre o patrimônio, renda ou serviços das enti- dades religiosas, Partidos Políticos, Sindicatos de Trabalhadores, Organizações Sociais, Institutos, Escolas e Universidades sem fins lucrativos, significa que: a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não podem cobrar IMPOSTOS sobre a renda, sobre o patrimônio e sobre os serviços (IPTU, ISS, ITBI, IPVA, ITCMD, ICMS, IPI, ITR, II, IE, IOF, IR) das Igrejas, Organizações Sociais ou Civis sem fins lucrativos, Escolas e universidades sem fins lucrativos e institutos. Tais vedações, contudo, compreendem somente o patri- mônio, a renda e os serviços relacionados às finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas e não se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços relacionados à ex- ploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usu- ário, bem como não exonera o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel adquirido por meio de venda realizada pelo Poder Público. A Constituição também estabelece imunidade de impostos sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão, fonogramas e videofonogramas mu- sicais produzidos no Brasil, desde que contenham obras musicais ou literomusicais de autores brasileiros, ou obras em geral interpretadas por artistas brasileiros, bem como, os suportes materiais ou arquivos digitais que os contenham, exceto quando da etapa de replicação industrial de mídias ópticas de Leitura a laser. Essa limitação é denominada pela doutrina de imunidade cultural. Importante! A IMUNIDADE sobre livros, jornais e periódicos só se estende à matéria-prima e NÃO SE ESTENDE AO VALOR DE VENDA DO PRODUTO FINAL, ou seja, a editora tem imunidade nos impostos sobre as matérias primas que adquire para a produção do livro (ICMS e IPI), no entanto, quando o produto for vendido, incidirão os impostos pertinentes à venda dele e ao lucro obtido. Da mesma forma, a imunidade não se estende à etapa de replicação industrial de mídias. Relação Jurídico Tributária: a obrigação tributária A relação jurídico tributária se estabelece quando a pessoa pratica o fato gerador da obrigação tributária prevista na respectiva Legislação. Da prática do fato gerador surge para o sujeito passivo ou para o contribuinte a obrigação de pagar o respectivo tributo ou cumprir determinadas exigências estabelecidas na Legislação tributária. 24 25 Figura 4 Fonte: Pixabay A obrigação tributária é relação obrigacional entre o fisco e o contribuinte que nasce quando o contribuinte pratica o fato gerador previsto na Lei tributária. A obri- gação tributária pode ser principal ou acessória. Será principal a obrigação tributária quando o contribuinte tiver de pagar o tributo em dinheiro, isto é, obrigação de dar/pagar. Por outro lado, obrigação tributária será acessória quando o contribuinte estiver obrigado a fazer ou deixar de fazer (não fazer) uma ação determinada na Lei tributária. Obrigação de fazer ou não fazer que, caso seja descumprida pelo contribuinte, pode gerar, em consequência, a incidência de multa entre outras sanções. P ara que se configure uma obrigação tributária, é necessário que se verifique a pre- sença dos seguintes elementos: sujeito ativo, sujeito passivo, Lei tributária descrevendo o fato gerador da obrigação e prestação, que poderá ser de pagar, fazer ou não fazer. O fato gerador da obrigação tributária, enquanto mera expressão da Lei, não obriga o cidadão a recolher qualquer tributo, pois consiste, nesse primeiro momento, em hipótese de incidência de determinado tributo. Uma vez praticada a hipótese expressa na Lei, nasce para o contribuinte a obrigação tributária. Essa obrigação, contudo, há de ser efetivamente lançada pela Administração tributária de forma a se converter em crédito tributário para o fisco, que poderá ser devidamente exigido do contribuinte inadimplente. Processo Tributário: Princípios No ordenamento jurídico brasileiro, a Constituição Federal nos traz de forma muito clara a garantia da segurança jurídica ao expressar, no Artigo 5º, Inciso XXXVI, que a Lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Essa garantia constitucional consubstancia-se no sobreprincípio da segurança jurídica. Na primeira parte desse estudo, aprendemos que a Constituição se compõe de normas jurídicas que se caracterizam em regras e princípios, sendo os princípios os vetores da vontade do legislador constituinte, ou seja, tais normas são carregadas de valores que norteiam a atuação de Estado e da sociedade no sentido de proteção do 25 UNIDADE Apresentação e Noções Gerais cidadão por meio do Estado Democrático de Direito, ou seja, o Estado instituído e regulado pelo Direito. Para que o Estado possa efetivar os direitos expressos na Constituição, necessário se faz que tenha recursos financeiros suficientes para custear a implementação dos direitos garantidos, e é por meio dos tributos que tais recursos alimentam a máquina administrativa estatal, tributos esses devidos por toda a Sociedade. Inobstante a necessidade de financiamento do Estado para efetivação dos direi- tos, em um Estado Democrático de Direito, as normas de proteção ao contribuinte devem ser rígidas a fim de garantir que os tributos, compulsórios como o são, sejam também justos e adequados à situação de cada contribuinte. Essa rigidez para a pro- teção dos direitos é que garante a segurança jurídica aos cidadãos e contribuintes. O princípio da segurança jurídica, assim, reveste-se de extrema importância para o processo tributário, seja no âmbito administrativo, seja no processo tributário ju- dicial, uma vez que, se não houver a garantia de segurança jurídica, o Estado perde arrecadação e, consequentemente, perde a capacidade de efetivação e garantia dos direitos sociais, assim como de sustento de toda a máquina administrativaestatal, necessária ao bom funcionamento de todos os órgãos que a compõem. O processo é o caminho utilizado para a restauração ou restabelecimento de um direito violado, seja a violação por parte de um indivíduo, por parte de uma pessoa jurídica de direito privado ou de direito público, seja por parte do próprio Estado. Além de todos os princípios constitucionais que norteiam as normas tributárias, como o princípio da legalidade, da irretroatividade, anterioridade, isonomia etc., tam- bém os princípios constitucionais norteadores das normas processuais civis, penais e administrativas irão nortear o processo tributário tanto no âmbito judicial quanto no seu procedimento administrativo. Assim, temos como princípios norteadores do processo tributário, o Princípio da Ampla Defesa e do Devido Processo Legal e o Princípio da Tipicidade, ou seja, só haverá obrigação tributária se houver a tipificação do fato gerador na legislação. Outros princípios que irão nortear o processo tributário e o procedimento ad- ministrativo tributário, são: o Princípio da Moralidade Administrativa, Princípio da Publicidade, da Proporcionalidade, da Eficiência, Princípio da Oficialidade, da Cele- ridade, da Hierarquia, da Motivação e da Finalidade. Dessa forma, por meio do processo, o cidadão contribuinte pode garantir os princípios que o protegem da atuação compulsória estatal, assim como também o processo que o contribuinte utilizará possui princípios que garantem a segurança jurídica do procedimento até a resolução de eventual conflito que se evidencie entre contribuinte e fisco, em qualquer das esferas de governo. Procedimentos administrativos em matéria tributária A obrigação tributária como vimos, nasce da prática do fato gerador expresso na Legislação tributária. Entretanto, tal obrigação só se converte em exigência se 26 27 houver o competente lançamento de seu objeto e o não cumprimento por parte do sujeito passivo. O tributo devidamente lançado e dentro do prazo de cumprimento da obrigação, contudo, não é passível d e aplicação de multa e juros de mora, enquanto estiver pendente consulta tributária formulada pelo contribuinte, desde que dentro do prazo legal para o pagamento do tributo. A consulta tributária, assim, consiste no instrumento que permite ao contribuinte expor suas dúvidas à autoridade administrativa fiscal, a fim de obter dela esclareci- mento quanto a qualquer dúvida ou equívoco que possa existir no lançamento do crédito tributário (Art. 161, § 1º do CTN). Outro procedimento previsto no CTN, é a denúncia espontânea (Art. 138), que estimula o arrependimento do contribuinte ao excluir a responsabilidade por infrações que sejam objeto de d enúncia espontânea q ue pode, inclusive, ser acompanhada do pagamento do tributo acrescido dos juros de mora, desde que não tenha sido iniciado qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização antes dessa. Importante! A denúncia espontânea, segundo entendimento do STJ por meio da edição da Súmula 360, não se aplica aos tributos sujeitos a lançamento por homologação regularmente declarados, mas pagos após o prazo de vencimento. Podem ser realizados, ainda, pelo contribuinte, os procedimentos de restituição, compensação e ressarcimento de tributos. A restituição de valor pago de forma espontânea referente a tributo indevido, ou que possua erro na identificação do contribuinte, ou ainda após reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória (CTN Art. 165, I, II e III). A compensação é o procedimento que permite ao contribuinte a extinção do crédito tributário (CTN Art. 156, II), quando houver tributo a ser restituído cujo valor poderá ser compensado com o tributo a pagar. Por fim, o ressarcimento de crédito tributário pode ser realizado tanto por meio da restituição do pagamento indevido, quanto por meio da compensação desse valor com tributo a vencer. Ações de iniciativa do fisco O fisco pode se valer da exigência do crédito tributário cujo pagamento não foi realizado pelo contribuinte, por meio da execução fiscal. O processo de execução, como sabemos, consiste em meio mais rápido de expropriação de bens do devedor para satisfação do débito, desde que exista um título executivo certo, líquido e exigível. Na execução fiscal, a necessidade de um título executivo certo e líquido também se faz necessária, e a exigibilidade se consubstancia com a inscrição do débito na dívida ativa do ente federativo tributante. Assim, a CDA (Certidão de Dívida Ativa) é o título que embasa a execução fiscal para expropriação de bens do contribuinte inadimplente. 27 UNIDADE Apresentação e Noções Gerais A defesa do contribuinte será estudada pormenorizadamente posteriormente, em que trataremos das peças e procedimentos específicos de cada ação tributária, como a impugnação administrativa, os recursos administrativos, os embargos à execução e a exceção de pré-executividade. Figura 5 Fonte: Pixabay Ações de iniciativa do contribuinte As ações de iniciativa do contribuinte se desdobram entre os remédios constitucio- nais e ações processuais específicas. Assim, temos como meio de iniciativa do con- tribuinte em defesa dos seus direitos na seara tributária o Mandado de Segurança, a Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídico-Tributária, a Ação Anulatória de Débito Fiscal e a Ação de Repetição do Indébito. As peculiaridades de cada ação, assim como a peça de cada uma, serão estudadas posteriormente, momento em que o estudante aprenderá com base em situações concretas a peticionar tanto no âmbito administrativo, quanto no processo judicial para defesa dos interesses de seu cliente. Figura 6 Fonte: Getty Images 28 29 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Livros Jurisdição Constitucional e Tribunais Constitucionais MORAES, A. de. Jurisdição Constitucional e Tribunais Constitucionais. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2013. Curso de Direito Constitucional Positivo SILVA, J. A. da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 42.ed. – São Paulo: Malheiros, 2019. Curso de Direito Constitucional TAVARES, A. R. Curso de Direito Constitucional. 14.ed. São Paulo: Saraiva, 2016. Vídeos Saber Direito – Direito Constitucional – Aula 1 https://youtu.be/K2DWqdXWXfk Saber Direito/TV Justiça – Princípios Constitucionais Tributários – Aula 1 https://youtu.be/M7LkxQxDBVI Saber Direito – Princípios Constitucionais Tributários – Aula 1 https://youtu.be/M7LkxQxDBVI Saber Direito – O Processo Tributário – Aula 1 https://youtu.be/LD5kim6evvU Saber Direito – O Processo Tributário – Aula 2 https://youtu.be/LD5kim6evvU Leitura Processo Constitucional: O Processo como locus devido para o exercício da democracia SILVA, F. L. A. da. Processo Constitucional: O Processo como locus devido para o exercício da democracia. Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP, v. 16, jul.-dez. 2015, p. 157. https://bit.ly/31S2SoN A Relação Direito e Política: uma Análise da Atuação do Judiciário na História Brasileira STRECK, L.; TASSINARI, C.; LIMA, D. P. A relação direito e política: uma análise da atuação do judiciário na história brasileira, Pensar Revista de Ciências Jurídicas, Fortaleza, v. 18, n. 3, 2013. https://bit.ly/3izqxkv Habeas Data – RE 673707/MG STF – Jurisprudência. Habeas Data – RE 673707/MG. https://bit.ly/3iBpKPP O Efeito Vinculante dos Precedentes Judiciais no Processo Tributário Administrativo 29 UNIDADE Apresentação e Noções Gerais BERNARDES, F. C.; PIRES, R. H. O efeito vinculante dos precedentes judiciais no Processo Tributário Administrativo. Revista de Direito Tributário e Financeiro Belém, v. 5, n. 2, p. 37-58, jul./dez, 2019. https://bit.ly/3ixF8wA Lei Nº 5.172, de 25 de Outubro de 1966 Legislação: Código Tributário Nacional. https://bit.ly/2XWNeY0 30 31 Referências BRASIL. STF. Recurso Extraordinário Nº. 865.401/MG. Relator: Ministro Dias Toffoli, data de Julgamento: 25/04/2018, Plenário. Disponívelem: <http://portal. stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4709214>. Acesso em: 22/07/2020. CAPARROZ, R. Direito Tributário Esquematizado. 3.ed. São Paulo: Saraiva Edu- cação, 2019. CLÈVE, C. M. Direito Constitucional: controle de constitucionalidade. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. v.2. DORIA, S. Direito Constitucional. 3.ed. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1953, t. 2, p. 257 apud TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2016. KELSEN, H. Teoria Pura do Direito. 7.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2006. p. 246-58. MORAES, A. de. Curso de Direito Constitucional. 32.ed. São Paulo: Atlas, 2016. ________. Jurisdição Constitucional e Tribunais Constitucionais. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2013. S ILVA, J. A. da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 42.ed. São Paulo: Malheiros, 2019. TAVARES, A. R. Curso de direito constitucional. 14.ed. São Paulo: Saraiva, 2016. TEIXEIRA, J. H. M. Curso de Direito Constitucional. Florianópolis: Conceito Editorial, 2011. TORRES, H. T. Direito Processual Tributário 1. 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