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REALIDADE SOCIOECONÔMICA E POLÍTICA BRASILEIRA Rosângela Aparecida da Silva Microeconomia e macroeconomia: diferenças Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Definir a divisão dos dois grandes campos de pesquisa econômica. Identificar as diferenças entre microeconomia e macroeconomia. Relacionar as atividades econômicas que pertencem ao campo mi- croeconômico e ao campo macroeconômico. Introdução Neste capítulo, você vai compreender como a economia funciona, seus respectivos campos de atuação, com foco nas atividades desenvolvidas na microeconomia e na macroeconomia, e seus principais fundamentos. Princípios de economia Economia é a parte da ciência social que estuda como empregar recursos produtivos escassos frente a uma sociedade que tem necessidades ilimitadas por bens e serviços. Isso quer dizer que o sistema econômico de um país, seja ele capitalista, socialista ou outro, tem que tomar decisões de como produzir, para quem produzir, quanto produzir e o que produzir diante de recursos escassos. Veja que a palavra escassez é o cerne da economia, mas isso não quer dizer que tudo é escasso, e sim que a maioria dos fatores de produção e bens e serviços que consumimos não existem em fartura para todos. Se não houvesse escassez e todo mundo tivesse o que quisesse, a economia não precisaria existir. Esta suposição poderia ser considerada uma utopia em uma economia capitalista, de mercado, e você verá a razão disso. Em um mundo com necessidades ilimitadas, as pessoas, ao alcançarem determinado objetivo de vida (como comprar um carro usado), logo querem Realidade_Socioeconomico_Book.indb 27 13/06/2018 13:28:55 alcançar outro objetivo (como comprar um carro novo) e assim sucessivamente. As necessidades de ontem não serão iguais às necessidades de hoje e nem às de amanhã. Sendo assim, a economia sempre vai existir para ajustar essas necessidades aos recursos existentes. Mas então, com a economia, as pessoas terão tudo que querem? Não, ela existe, teoricamente, mais para beneficiar do que prejudicar, mas os custos existem em qualquer esfera desse campo de estudo da ciência social. Nesse ponto, entra um conceito bem importante em economia, que é muito utilizado tanto na esfera micro quanto na macroeconômica, que é o custo de oportunidade do capital, que representa uma escolha do consumidor, do produtor ou até mesmo do governo. Para entender esse conceito, suponha que um produtor decide utilizar um galpão que tem para produzir; em vez de alugar esse galpão, ele fez uma escolha que vai lhe trazer custo implícito (a renda do aluguel), que se trata do custo de oportunidade, mas talvez o seu novo negócio dê tão certo que cubra este custo e os outros próprios da produção – são escolhas baseadas, teoricamente, em racionalidade. Essas escolhas estão no nosso dia a dia, sendo, ou não, da área econômica: Será que compro café ou chá? Vou fazer um curso de enfermagem ou viajar? Combato o tráfico de drogas (segurança) ou trato quem sofre do vício (saúde) ou ambos? Com que recursos? A economia ajuda, com seus fundamentos, a fazer essas escolhas, que têm como meta trazer uma melhor qualidade de vida para a sociedade em curto e longo prazo. Sendo assim, os campos de atuação da economia são bastante amplos e os principais são: microeconomia, macroeconomia, economia in- ternacional e desenvolvimento econômico. Como as áreas da microeconomia e macroeconomia já conseguem englobar as outras por serem os grandes campos de conhecimento da economia, daremos mais enfoque a ambas agora. A microeconomia, chamada também de teoria dos preços, tem como objetivo estudar o comportamento dos produtores e dos consumidores em mercados específicos. Estuda os agentes econômicos individuais, ou seja, como os consumidores tomam decisões de consumo, como os produtores tomam decisões de produção e, assim, de que jeito os mercados formarão os preços, entre outras variáveis. Microeconomia e macroeconomia: diferenças28 Realidade_Socioeconomico_Book.indb 28 13/06/2018 13:28:55 Como estudamos aqui a teoria microeconômica tradicional, pressupõe- -se, sempre, que os produtores desejam maximizar o seu lucro e que os consumidores desejam maximizar sua satisfação frente a recursos escassos. Enquanto isso, a macroeconomia estuda os fenômenos da economia de forma conjunta, como inflação, desemprego, crescimento econômico e renda na- cional. Logo, as políticas macroeconômicas e seus estudos interessam muito mais ao setor público. De acordo com Dornbusch, Fischer, Startz (2009), a macroeconomia se relaciona ao comportamento da economia como um todo, desde suas expansões e recessões, o crescimento do PIB (Produto Interno Bruto), as taxas de Inflação e desemprego, as contas públicas do país até a taxa de câmbio. Refere-se aos ciclos econômicos de curto e longo prazo. Conceitos muito utilizados na economia Em economia, utilizamos vários conceitos tanto no campo da microeconomia como no da macroeconomia: Oferta: é tudo que é colocado à disposição do consumidor para venda. Pode ser individual, bem específica quando utilizada na microeconomia (como oferta de feijão) e coletiva, agregada quando usada na macroeconomia (como oferta de todos os bens e serviços de um país). Demanda: é a procura por bens e serviços. Assim como no caso da oferta, ela pode ser individual (microeconomia) ou agregada (macroeconomia). Mercado: é o local no qual a oferta e a demanda se encontram. Pode ser físico, como supermercados locais, ou não físico, como o mercado de trabalho (nós sabemos que ele existe, mas não vemos). Novamente, esse conceito pode ser usado tanto na microeconomia quanto na macroeconomia. Déficit: é o saldo negativo, quando se gasta mais do que se arrecada. É muito utili- zado em macroeconomia para denotar as contas do governo e o saldo da balança comercial (que registra as exportações e importações de um país). Superávit: é o saldo positivo, quando se arrecada mais do que se gasta. É utilizado da mesma forma que o déficit, só que ao contrário. Economia nominal: é a parte da economia que trata de valores monetários, como moeda e inflação. É uma parte que não se vê, é intangível, mas se sente em termos de poder aquisitivo. Economia real: é a parte da economia que estuda toda parte produtiva da socie- dade, desde bens e serviços até mão de obra. Inflação: é o aumento no nível geral de preços de uma economia. No Brasil, pode ser medido por vários institutos e metodologias diferenciadas, mas os mais utilizados 29Microeconomia e macroeconomia: diferenças Realidade_Socioeconomico_Book.indb 29 13/06/2018 13:28:55 Diferenças entre microeconomia e macroeconomia As grandes diferenças do estudo da microeconomia e da macroeconomia estão realmente no enfoque: enquanto a primeira trata das unidades econômicas individuais, a segunda agrega essas unidades econômicas, dando prioridade para o seu estudo em conjunto. As unidades individuais da microeconomia incluem [...] consumidores, trabalhadores, investidores, proprietários de terras, em- presas e, na realidade, quaisquer indivíduos ou entidades que desempenhem um papel no funcionamento de nossa economia. A microeconomia explica como e por que essas unidades tomam decisões econômicas. Por exemplo, ela esclarece como os consumidores tomam decisões de compra e de que forma suas escolhas são influenciadas pelas variações de preços e rendas; explica também de que maneira as empresas determinam o número de trabalhadores que contratarão e como os trabalhadores decidem onde e quanto trabalhar (PINDYCK; RUBINFELD, 1999, p. 3). Ainda, de acordo com os mesmos autores, a microeconomia nos ajuda a entender como as empresas individuais se juntam para formar unidades maiores (como monopólios) e o que isso acarreta para os consumidores individuais. são INPC - IBGE (Índice Nacional de Preços ao Consumidor - Instituto Brasileirode Geografia e Estatística), muito usado em negociações salariais, IPCA - IBGE (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), usado pelo Banco Central do Brasil como principal indicador de inflação, IGPM - FGV (Índice Geral de Preços do Mercado - Fundação Getúlio Vargas), que é muito utilizado para correção de aluguéis de imóveis. Bens de capital: são utilizados para a fabricação de outros bens. Podem ser apre- sentados sob a forma de máquinas e equipamentos, por exemplo. Bens intermediários: são aqueles bens transformados ou agregados no processo produtivo para a criação do bem de consumo final. Um exemplo seria a laranja usada para a fabricação do suco de laranja. Bens de consumo final: são os bens que vão chegar ao consumidor final. No caso do exemplo anterior, o suco de laranja. Agregar valor: significa diferenciar o bem ou serviço de alguma forma para que ele tenha um valor maior. Como exemplos: diferenciar a forma de entrega, a embalagem, o atendimento, a funcionalidade, o aspecto tecnológico e muitas outras formas. Microeconomia e macroeconomia: diferenças30 Realidade_Socioeconomico_Book.indb 30 13/06/2018 13:28:55 Já a macroeconomia trata de estudar o comportamento econômico e as políticas econômicas que irão afetar o investimento, o consumo, as exportações e importações (balança comercial), as mudanças nos níveis gerais de preços e salários, a quantidade de moeda na economia, o orçamento público, as taxas de juros e a dívida pública (interna e externa) (DORNBUSCH; FISCHER; STARTZ, 2009). Os instrumentos de políticas macroeconômicas utilizados pelos governos atuarão sobre a capacidade produtiva e de consumo do país e, dessa maneira, tentam equilibrar os objetivos macroeconômicos. Em vez de estudar o mercado têxtil ou o mercado metal mecânico, a ma- croeconomia estuda todos os mercados como uma unidade, desconsiderando, em primeira instância, suas características individuais. Essa abstração talvez venha a deixar de lado considerações importantes para a formulação de políticas macroeconômicas, mas traz como benefício a visão de indicadores econômicos como um todo. Nisso, um campo não deve rejeitar o outro, porque, no fim, estão entrelaçados: o conjunto da microeconomia gera a macroeconomia e ambas são interdependentes, embora tenham assuntos distintos. Na verdade, a fronteira dessa relação está ficando cada vez mais difícil de ser enxergada. Considerando que as mudanças na economia como um todo surgem de vários indivíduos em conjunto, é impossível entender o que acontece na ma- croeconomia sem considerar as decisões individuais a que são submetidos estes mesmos indivíduos (microeconomia). Como exemplo, um gestor público pode querer fazer uma política fiscal que aumente o imposto de renda das pessoas que ganham de 4 a 6 salários mínimos. Para fazer uma política correta, que aumenta a arrecadação, ele vai ter que considerar de que maneira esse aumento do imposto afeta as decisões das famílias dessa classe de renda em consumir bens e serviços específicos (microeconomia), pois ele pode perder em termos de volume de impostos arrecadados dependendo da grandeza dos setores afetados (se as famílias começarem a reduzir muito seu consumo, por exemplo). Do contrário, ao analisar a possibilidade de produção maior para exportação, um produtor de carne bovina vai ter que observar como está a taxa de câmbio no presente e quais são as expectativas futuras, as políticas comerciais para o setor e, assim, também vai depender da macroeconomia para a formação de preços e produção, embora seja apenas um agente econômico. 31Microeconomia e macroeconomia: diferenças Realidade_Socioeconomico_Book.indb 31 13/06/2018 13:28:55 Micro e macroeconomia: suas principais abordagens Esses campos de atuação têm abordagens distintas, como vimos. Assim, agora, de modo resumido, daremos ênfase às principais atividades desenvolvidas tanto em micro quanto em macroeconomia. É importante destacar que não existe uma ordem para o estudo dessas áreas (ou qual área estudar primeiro), a lógica depende muito da facilidade de absorção por parte do leitor. Microeconomia A microeconomia estuda os agentes individuais, como eles tomam decisões de consumo, de produção e, nessa interação, como os preços se formam. Um dos assuntos mais destacados na microeconomia é a demanda, ou como as pessoas tomam decisões de consumo. De uma forma simplista e introdutória e em mercados com pouca agregação de valor, a lei geral da demanda tende a ser dominante: quanto menor o preço, há a tendência de maior consumo, e o contrário também é verdadeiro. É importante notar que essa lei diz “em geral”, o que quer dizer que não ocorre para todos os bens e serviços. Para fazer a análise de como os fatores influenciam a demanda de um bem, consideramos isoladamente o movimento de cada fator para perceber seu impacto. É a condição que chamamos de ceteris paribus, tudo o mais constante (VASCONCELLOS, 2014). O que leva o consumidor a adquirir um bem? Segundo a teoria microe- conômica estudada, os principais fatores que levam as pessoas a consumir são os seguintes: Preços (P): explicado por meio da lei geral da demanda. Preços dos bens substitutos (Pbs): bens substitutos são aqueles que o consumidor considera similares ao bem analisado. Quanto menor o preço do bem substituto deste bem analisado, menor tende a ser o consumo do último, e viceversa. Exemplo: para uma classe de renda especifica, chá e café são substitutos; assim, se o preço de um subir, o outro será mais consumido. Preços dos bens complementares (Pbc): bens complementares são aqueles que são consumidos em conjunto pelo consumidor (não se consome isoladamente) e em quantidades fixas. Quanto maior o preço do bem complementar deste bem analisado, menor deve ser o consumo do último, e vice-versa. Exemplo: lapiseira e grafite são consumidos Microeconomia e macroeconomia: diferenças32 Realidade_Socioeconomico_Book.indb 32 13/06/2018 13:28:55 em conjunto, de modo que se subir o preço da lapiseira, menor será o consumo dela e do grafite. Renda (R): para saber o que a renda acarreta para o consumo de algum bem, devemos classificar este bem: ■ Bem normal e supérfluo: aumenta a renda, aumenta o consumo, e vice-versa (exemplo: bolsa da marca Chanel para a classe C é algo supérfluo); ■ Bem inferior: aumenta a renda, diminui o consumo, e vice-versa (exemplo: carne moída de 2ª para a classe B é inferior); ■ Bem de consumo saciado: alterações na renda não interferem no consumo (exemplo: sal para a maioria das classes de renda). Essa classificação depende de cada consumidor ou de cada grupo de con- sumidores analisados (classes sociais). O que é normal para a classe A pode ser supérfluo para a classe C, por isso a importância do público-alvo. Todos esses fatores, em conjunto, influenciam na demanda de um bem. A soma de todo consumo individual de determinado bem ou serviço vai resultar na demanda de mercado daquele bem ou serviço. No que se refere à oferta, como os produtores definem o quanto irão ofe- recer de algum bem? Os principais fatores que levam os produtores a ofertar um bem são os seguintes: Preço: quanto maior o preço do bem, maior tende a ser a oferta do mesmo (lei geral da oferta), pois quanto maiores os preços, mais os produtores querem vender. É relevante notar que isso não ocorre para todos os casos. Preço dos fatores de produção: quanto maiores os preços dos fatores de produção (mão de obra, matéria-prima, maquinário), menor tende a ser a oferta do bem analisado (a tendência é passar a produzir um bem que dê maior lucro ou aumente o preço se a demanda comportar isso). Preço dos bens substitutos na produção: bens substitutos na produção são aqueles que, com os mesmos fatores de produção, podem ser produ- zidos como substitutos do bem analisado. Isso ocorre, sobretudo, quando o preço do bem substituto está alto e/ou o preço do bem analisado está baixo. Quanto maioro preço do bem substituto na produção, menor a produção do bem analisado, e vice-versa. Exemplo: escolher entre a produção de feijão ou a produção de milho? Escolhe-se o de preço maior e o outro tende a diminuir a oferta. 33Microeconomia e macroeconomia: diferenças Realidade_Socioeconomico_Book.indb 33 13/06/2018 13:28:55 Preço dos bens complementares na produção: bens complementares na produção são aqueles que são produzidos em conjunto com o bem analisado (não se pode produzir um sem produzir outro). Logo, quanto maior o preço de um bem, a tendência é que seja maior a produção dos dois (do complementar e do bem analisado), e vice-versa. Exemplo: carne de boi e couro de boi. Condições climáticas: dependendo das condições climáticas favoráveis, ou não, à produção, maior ou menor será a oferta do bem no mercado. Exemplo: a maçã Fuji necessita de frio para ter maior produção; então, se neste ano não fizer muito frio, a tendência é que a oferta de maçã diminua e o seu preço suba, se a demanda se mantiver constante. Todos esses fatores, em conjunto com a demanda, tendem a determinar a oferta do bem no mercado. A soma de toda oferta individual de determinado bem ou serviço vai resultar na oferta de mercado daquele bem ou serviço. Interação entre oferta e demanda O preço e a quantidade vendida e consumida do bem serão determinados pela interação de oferta e demanda no mercado. A tendência é que quanto maior for a oferta com relação à demanda, menor será o preço, e vice-versa (Figura 1). Figura 1. Gráfico do equilíbrio de mercado de um bem específico. Microeconomia e macroeconomia: diferenças34 Realidade_Socioeconomico_Book.indb 34 13/06/2018 13:28:56 Perceba que, na Figura 1, a curva de oferta (que é uma reta, mas é chamada de curva) é positivamente inclinada, obedecendo à lei geral da oferta, e a curva de demanda (que também é reta) é negativamente inclinada, obedecendo à lei geral da demanda. Essas curvas representam a preferência de consumo e produção, mas o ponto em que vai se produzir ou consumir depende do cru- zamento das duas curvas (ponto de equilíbrio). Esse ponto existe no mercado real? Em geral, não! O que existe são forças de mercado que pressionam os preços para baixo ou para cima, próximo ao equilíbrio. Se, por exemplo, a demanda estiver maior que a oferta, o preço tende a subir. Do contrário, se a oferta estiver maior que a demanda, os preços tendem a cair. As mudanças no equilíbrio de mercado podem ocorrer devido a mudanças nos fatores que determinam a oferta e/ou a demanda do bem. No caso do gráfico da Figura 2, por exemplo, somente a curva de oferta se deslocou; logo, houve mudança de um dos fatores que afetam a oferta e as preferências dos consumidores continuam as mesmas. Usando o exemplo da maçã Fuji, suponha que a safra foi muito boa devido ao frio intenso, que fez com que a oferta de mercado aumentasse; como a a curva de demanda não mudou, os preços tendem a cair. Figura 2. Gráfico do deslocamento do equilíbrio de mercado da maçã fuji. 35Microeconomia e macroeconomia: diferenças Realidade_Socioeconomico_Book.indb 35 13/06/2018 13:28:56 Interferência do governo no mercado Frequentemente, o governo pode interferir no equilíbrio de mercado com o objetivo de ajudar os produtores ou os consumidores e, assim, tentar equilibrar o mercado. Para ajudar os produtores (a terem preços melhores para seus produtos e cobrirem pelo menos seus custos de produção), o governo pode: comprar produção, fazer financiamentos a juros baixos, receber pagamento de dívidas em bens e outros. Para ajudar os consumidores (no sentido de diminuição dos preços de mercado), o governo pode: vender produção, oferecer incentivos (como taxa de juros baixa) para consumo de alguns bens específicos e outros. A interferência do governo no mercado é questionada por muitos economis- tas, mas, no mercado agrícola, no qual dificilmente se tem controle de oferta de mercado, é frequente sua intervenção, muito mais no sentido de ajuda aos produtores do que aos consumidores. Também é comum a participação do governo no caso em que há falhas de mercado, como nos casos de monopólio (um só produtor) ou oligopólios (poucas empresas dominam o setor), com produtos parecidos que propiciam a formações de cartéis (que são proibidos no Brasil). Convém destacar que, nos casos em que se percebe essas falhas, existem órgãos governamentais especí- ficos responsáveis por coibir práticas abusivas de mercado, regulando-o. No Brasil, existe, por exemplo, a ANEEL (Agência Nacional de Energia elétrica), que regula o setor elétrico, que, em geral, é monopólista, a ANATEL (Agência Nacional de Telefonia), que regula o setor de telefonia, que é oligopolista, e para outros setores que não contam com agências específicas, existe o CADE (Conselho Administrativo de Direito Econômico). Elasticidade – preço da demanda Nos casos em que os bens e serviços são diferenciados, entra em cena o exame da elasticidade da demanda, que é a sensibilidade do consumidor em relação a alterações de preços do bem. Nesse caso, é importantíssimo para quem produz descobrir até quanto seu consumidor está disposto a pagar pelo seu bem, para que consiga ajustar sua oferta e também seu preço. Fórmula: Epd = −(∆% Qd÷∆% P) Microeconomia e macroeconomia: diferenças36 Realidade_Socioeconomico_Book.indb 36 13/06/2018 13:28:56 (Ou seja, se variar percentualmente o preço, quanto vai variar percentual- mente a quantidade demandada/consumida do bem analisado?) Quando a demanda é elástica (muda se o preço mudar), alterações nos preços interferem muito no consumo do bem (Epd > 1). Quando a demanda é inelástica (muda pouco se o preço mudar), alterações nos preços não interferem muito no consumo (0 ≤ Epd < 1). Quando a elasticidade é unitária, alterações no preço alterararão o consumo na mesma proporção (Epd = 1). Os fatores que interferem na elasticidade – preço da demanda de um bem são: Existência de bens substitutos: quanto maior a existência de bens substitutos, maior a elasticidade da demanda (elástica). Peso do bem no orçamento (renda) do consumidor: se o bem não comprometer muito a renda do consumidor, sua demanda deve ser mais fiel (inelástica). Necessidade do bem: quanto mais essencial for o bem para o con- sumidor, mais fiel este vai ser ao bem (exemplo: medicamento para o coração). Estes fatores, em conjunto, irão determinar a elasticidade do consumidor para o bem. Contudo, é importante salientar que o produtor tem que fazer pesquisas de mercado constantemente, pois a elasticidade – preço da demanda se altera devido a mudanças de hábitos, de renda ou mesmo de necessidade de troca de bens duráveis de consumo (geladeiras, por exemplo) e, com isso, o que era considerado inelástico pode se tornar elástico. Quanto menor a elasticidade – preço da demanda ou quanto maior a fide- lidade do consumidor, maior tende a ser o preço que o produtor pode cobrar por seu produto. O quanto pode cobrar a mais depende do valor numérico da elasticidade. Logo, ele pode obter uma melhor receita (por meio do preço) se sua demanda for inelástica (relativamente fiel). Bens viciantes ou dos quais, de alguma forma, os consumidores dependem tendem a ter uma elasticidade baixa como: cigarros, bebidas alcoólicas e outros. Com isso, os impostos sobre esses bens tendem a ser maiores, até como forma de inibir o consumo ou mesmo fazer o governo arrecadar mais. 37Microeconomia e macroeconomia: diferenças Realidade_Socioeconomico_Book.indb 37 13/06/2018 13:28:56 Classes sociais no Brasil No link a seguir, você pode ver quais são as metodologias de classificação social no Brasil e fazer um quiz, descobrindo a classe à qual pertence segundo a análise referida. https://goo.gl/PbNe0s É importante deixar claro que a microeconomia ainda trata de outros assuntos, como teoria da produção, dos custos, estruturas de mercado, discriminação de preços e outras abordagens diferentesda teoria tradicional aqui pontuada. Macroeconomia Como a macroeconomia estuda a economia no todo, o setor público, em geral, é o grande idealizador de políticas macroeconômicas. Essas políticas servem para alcançar os objetivos macroeconômicos, quais sejam: estabilidade de preços, alto nível de emprego, crescimento econômico e distribuição de renda socialmente justa. Em curto prazo, é muito difícil que uma economia consiga alcançar todos os objetivos macroeconômicos, então o governo tende a escolher um ou dois objetivos para alcançar e faz políticas macroeconômicas para tal. Quais seriam essas políticas? A política monetária mexe com a quantidade de moeda em circulação, de modo que se o objetivo do governo é reduzir a inflação em curto prazo, a tendência é que ele controle ou diminua a quantidade de moeda em poder do público. O governo poderia fazer isso aumentando a taxa de juros básica da economia, aumentando a taxa de reserva compulsória (percentual dos depósitos a vista que ficam retidos no Banco Central do Brasil), aumentando a taxa de redesconto (taxa que o Banco Central cobra para emprestar dinheiro Microeconomia e macroeconomia: diferenças38 Realidade_Socioeconomico_Book.indb 38 13/06/2018 13:28:56 aos bancos comerciais), entre outros. Se a meta é crescimento econômico em curto prazo, as políticas monetárias anteriores seriam invertidas. Outra política muito utilizada pelo governo é a política fiscal, que se refere aos gastos (política de gastos) e às receitas governamentais (política tributária). Essa é uma política um pouco mais difícil de ser implementada (por ter que passar pelo congresso nacional), mas muitos economistas a consideram mais efetiva. Se o governo quiser que a economia tenha cresça em termos de produção em curto prazo, ele pode usar uma política de aumento de seus gastos mediante subsídios para alguns setores-chave da economia, por exemplo, de modo a estimular o crescimento econômico. Por outro lado, se quiser reduzir a inflação, pode diminuir esses subsídios de forma que tenha menos moeda em circulação. A política de renda também é utilizada quando o governo quer interferir diretamente na renda das pessoas. Um exemplo seria a diminuição do Imposto de Renda se o objetivo do governo for aumentar o consumo nacional para conseguir aumentar a produção no país. As políticas comercial e cambial são utilizadas quando o governo mexe com as políticas de comércio exterior (como acordos de exportação e im- portação) e com o valor da moeda estrangeira em relação à moeda nacional (por exemplo, o dólar). Para estimular a produção nacional, o governo pode, por exemplo, aumentar as barreiras não tarifárias (como a barreira sanitária em alguns setores) para não criar concorrência para os produtores internos do país. Enfim, existem muitas políticas, mas como vamos saber se elas estão dando certo, ou não, para o alcance dos objetivos? Por meio dos indicadores macroeconômicos, como o PIB (Produto Interno Bruto), que calcula a receita dos bens e serviços produzidos no território nacional, e os IPCs (Índices de Preços ao Consumidor), que verifica as variações nos níveis gerais de preços do país. Mas a macroeconomia trata apenas dos assuntos abordados aqui? Não, ela ainda se aprofunda mais em assuntos como desenvolvimento econômico, distribuição de renda, modelos de crescimento econômico diferenciados e outros relativos à economia de longo prazo. 39Microeconomia e macroeconomia: diferenças Realidade_Socioeconomico_Book.indb 39 13/06/2018 13:28:56 DORNBUSCH, R.; FISCHER, S.; STARTZ, R. Macroeconomia. 10. ed. São Paulo: McGraw- -Hill, 2009. PINDYCK, R. S.; RUBINFELD, D. L. Microeconomia. 4. ed. São Paulo: Makron Books, 1999. VASCONCELLOS, M. A. S.; GARCIA, M. Fundamentos de economia. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. Leituras recomendadas CARNEIRO, T. R. A. Faixas salariais x classe social: qual a sua classe social? São Paulo: Thiago Rodrigo Alves Carneiro, 2018. Disponível em: <https://thiagorodrigo.com.br/ artigo/faixas-salariais-classe-social-abep-ibge/>. Acesso em: 02 fev. 2018. MANKIW, N. G. Introdução à economia. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005. SAMUELSON, P. A.; NORDHAUS, W. D. Economia. 19. ed. Porto Alegre: AMGH, 2012. STIGLITZ, J. Introdução a macroeconomia. Rio de Janeiro: Campus, 2003. VARIAN, H. R. Microeconomia: princípios básicos. 5. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2000. VASCONCELLOS, M. A. S. Economia: micro e macro. São Paulo: Atlas, 2002. Microeconomia e macroeconomia: diferenças40 Realidade_Socioeconomico_Book.indb 40 13/06/2018 13:28:56 ECONOMIA POLÍTICA Filipe Prado Macedo da Silva Noções de microeconomia Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Definir o objeto de estudo da microeconomia. Analisar o comportamento da demanda: a teoria do consumidor. Analisar o comportamento da oferta: a teoria da firma e as estruturas de mercado. Introdução A microeconomia é o ramo da economia que se concentra no compor- tamento das unidades individuais, como os consumidores, as empresas, os proprietários de fatores de produção e os governos. Basicamente, a teoria microeconômica tem dois lados analíticos: o da demanda e o da oferta. Enquanto o comportamento microeconômico da demanda é analisado a partir da teoria do consumidor, o comportamento da oferta é estudado a partir da teoria da firma e da teoria dos mercados. Em todos os casos, a microeconomia apresenta uma perspectiva microscópica dos fenômenos econômicos, ou seja, uma análise parcial deles. Neste capítulo, você vai conhecer o objeto de estudo da microe- conomia. Além disso, vai compreender o que é o comportamento da demanda e o que é o comportamento da oferta. Objeto de estudo da microeconomia A microeconomia é o ramo da economia que estuda o comportamento das unidades individuais, como os consumidores, as empresas, os proprietários de fatores de produção e os governos. Em outras palavras, a microeconomia se ocupa da forma como as unidades individuais que compõem a economia — consumidores privados, empresas, trabalhadores, produtores de bens e serviços, etc. — agem e reagem umas sobre as outras (SANDRONI, 2005). C06_Nocoes_microeconomia.indd 1 13/03/2018 15:10:42 Assim, a microeconomia se preocupa em estudar como e por que os agentes econômicos capitalistas agem de determinadas formas. Entre inúmeras per- guntas, a microeconomia procura respostas para as seguintes questões: o que determina o preço dos bens e serviços em uma economia? O que determina o quanto de cada mercadoria será produzido? O que determina a maneira pela qual uma família gasta a sua renda? Para Vasconcellos (2009), deve ser observado que a microeconomia não tem seu foco na empresa, portanto não deve ser confundida com a administração. O foco da microeconomia está no mercado no qual as em- presas e os consumidores interagem, analisando os fatores econômicos que determinam tanto o comportamento da demanda quanto o da oferta. Logo, a microeconomia apresenta uma perspectiva “microscópica” dos fenômenos econômicos, ou seja, uma análise parcial desses fenômenos. Enquanto a microeconomia se preocupa mais com uma análise parcial, a macroeconomia foca nos grandes agregados econômicos dentro de uma análise global. É importante você notar que, antes do início do século XX, a economia era uma ciência exclusivamente microeconômica (SANDRONI, 2005). A divisão da economia em dois grandes ramos — microeconomia e macroeconomia — apareceu no início da década de 1930. Apesar de es- ses dois grandes ramos da economia caminharem por canais distintos, a separação é muito frágil. Afinal, os fenômenos econômicos requerem o inter-relacionamento das teorias que se inserem em ambos os ramos. Fundamentalmente, a análise microeconômica pode ser dividida em cinco grandes categorias: 1. a teoria da demanda/procura; 2. a teoria da oferta; 3. a análise das estruturas de mercado; 4.a teoria do equilíbrio geral e do bem-estar; 5. as imperfeições de mercado (as externalidades, os bens públicos e as informações assimétricas). Dentro da teoria da demanda/procura aparecem: a) a teoria do consumidor (que é a demanda individual); b) a demanda de mercado. Noções de microeconomia2 C06_Nocoes_microeconomia.indd 2 13/03/2018 15:10:42 Já na teoria da oferta surgem: a) a oferta individual — com a teoria da produção e a teoria dos custos da produção; b) a oferta de mercado. E, por fim, na análise das estruturas de mercado há: a) a análise do mercado de bens e serviços; b) a análise do mercado de insumos e de fatores de produção (dê uma olhada na Figura 1, a seguir). Figura 1. Grandes categorias da teoria microeconômica. Fonte: Vasconcellos (2009, p. 30). Teoria da demanda/ procura Teoria do consumidor (demanda individual) Demanda de mercado Teoria da oferta Análise das estruturas de mercado Teoria do equilíbrio geral e do bem-estar Imperfeições de mercado: externalidades, bens públicos, informação assimétricaOferta individual Oferta de mercado Teoria da produção Teoria dos custos da produção Mercado de bens e serviços Mercado de insumos e fatores de produção Teoria microeconômica Demanda Oferta Mercado Em resumo, a teoria microeconômica se assenta em três pilares: a demanda, a oferta e o mercado. Nesse contexto, a análise microeconômica acontece em dois mercados: o mercado de bens e serviços, e o mercado dos serviços dos fatores de produção (terra, trabalho e capital). 3Noções de microeconomia C06_Nocoes_microeconomia.indd 3 13/03/2018 15:10:42 Na prática, é da relação entre a demanda e a oferta nos dois mercados que surge a preocupação fundamental da microeconomia: a formação dos preços. É por isso que a microeconomia pode ser chamada também de teoria de preços. Já para Pindyck e Rubinfeld (1999), a microeconomia se assenta em dois grandes grupos: compradores (demandantes) e vendedores (ofertantes). É a partir da interação entre esses dois grupos que surgem os mercados. Nesse sentido, o mercado é um grupo de compradores e vendedores que, por meio das suas reais ou potenciais interações, determina o preço de um produto ou conjunto de produtos. É importante você notar que o mercado não é a mesma coisa que a indústria: a indústria é um conjunto de empresas que vendem o mesmo produto ou produtos correlatos. Assim, uma indústria corresponde apenas a um dos grupos (o lado dos vendedores) que compõem um mercado. Características da microeconomia O estudo da microeconomia caracteriza-se por, pelo menos, quatro axiomas ou princípios teóricos que servem de base para todas as cinco grandes categorias apresentadas anteriormente. Em outras palavras, trata-se de características que permeiam todas as análises microeconômicas. Análise dedutiva ou teórica: a microeconomia se caracteriza como um ramo da economia de natureza dedutiva ou teórica. Esse caráter dedutivo decorre da complexidade e entrelaçamento de infl uências que subjazem às situações reais que são objeto de estudo. Ou seja, a análise microeconômica trabalha com muitas variáveis que não podem ser observadas ou mensuradas. Noções de microeconomia4 C06_Nocoes_microeconomia.indd 4 13/03/2018 15:10:43 É o caso, por exemplo, do grau de utilidade que os consumidores desfrutam ao dispor de certos bens ou serviços. Logo, a microeconomia lança mão de modelos teóricos, ou seja, de construções teóricas compostas por uma série de hipóteses, a partir das quais as conclusões são elaboradas. Assim, a partir da situação do mundo real, são selecionadas as variáveis mais signifi cativas do fenômeno que se estuda, permitindo que a complexidade do mundo seja teoricamente manipulável (SANDRONI, 2005). Condição coeteris paribus: o estudo da microeconomia se baseia muito na condição coeteris paribus. Coeteris paribus é uma expressão em latim que signifi ca “tudo o mais permanecendo constante”. Assim, a análise micro- econômica, para poder analisar um mercado isoladamente, supõe todos os demais mercados constantes. Ou seja, supõe que o mercado em estudo não afeta nem é afetado pelos demais. Por exemplo, ao se adotar essa condição, verifi ca-se como a demanda — ou até mesmo a oferta — é infl uenciada pelo preço, permanecendo os demais fatores (hábitos, renda, entre outros) constantes (VASCONCELLOS, 2009). A condição coeteris paribus pode ser chamada também de análise de equilíbrio parcial. Análise estático-comparativa: a microeconomia tende a confrontar duas ou mais situações de equilíbrio, sem se preocupar com o período intermediário entre essas situações inicial e fi nal. De acordo com Carrera-Fernandez (2009), a análise estático-comparativa é a técnica que analisa as consequências de variações nos parâmetros econômicos da demanda e da oferta sobre o equilíbrio de mercado. Visão positiva/científi ca: a microeconomia se enquadra dentro do ramo da ciência positiva. Isso implica a ausência de juízo de valor ou conotação ética nas teorias microeconômicas, que se mantêm exclusivamente descritivas (CARRERA-FERNANDEZ, 2009; SANDRONI, 2005). Comportamento da demanda: a teoria do consumidor A teoria do consumidor é uma peça fundamental da chamada teoria econô- mica neoclássica. Para Carrera-Fernandez (2009), a teoria do consumidor talvez seja a mais importante das teorias econômicas da microeconomia. Consequentemente, é uma teoria muito criticada devido aos seus postulados teóricos de comportamento. 5Noções de microeconomia C06_Nocoes_microeconomia.indd 5 13/03/2018 15:10:43 Assim, a teoria neoclássica do consumidor está fundamentada no prin- cípio da racionalidade e postula um comportamento otimizador por parte dos consumidores. Em outras palavras, todos os consumidores estão sempre buscando o máximo com o mínimo de esforço”. Logo, a teoria do consumidor desconsidera consumidores irracionais, até porque seria impossível montar uma teoria dos consumidores irracionais, já que não há padrão de comportamento para realizar uma modelagem teórica. É daí que a teoria do consumidor fundamenta dois postulados de comportamento: maximização da utilidade; minimização do gasto ou custo. O primeiro — maximização da utilidade — refere-se ao fato de que o consumidor escolhe o consumo de cada mercadoria de modo a maximizar a sua satisfação ou utilidade, estando condicionado ao seu conjunto de possibi- lidade de consumo, limitado pela sua capacidade orçamentária (CARRERA- -FERNANDEZ, 2009). Já o segundo postulado refere-se ao fato de que o consumidor escolhe as quantidades das mercadorias a serem consumidas de modo a minimizar o seu gasto ou custo, estando limitado a atingir certo nível de utilidade(CARRERA-FERNANDEZ, 2009). É importante você saber que, na teoria do consumidor, o conceito de mercadoria é amplo. Ele envolve qualquer bem ou serviço que de alguma forma pode ser consumido ou gerar um fluxo de serviços de consumo. Nesse grupo de mercadorias, podem ser incluídas também aquelas que desagradam os consumidores e, logo, são fonte de insatisfação e “desutilidade”. Por exemplo, a poluição e o tempo dedicado ao trabalho são bons exemplos de mercadorias que desagradam grande parte dos consumidores. Ao lado dos dois postulados de comportamento, a teoria do consumidor apresenta ainda dois pressupostos básicos: informação completa; existência de uma função de utilidade. Noções de microeconomia6 C06_Nocoes_microeconomia.indd 6 13/03/2018 15:10:43 A informação completa é o pressuposto de que o consumidor possui perfeito conhecimento de todas as mercadorias, bem como da forma pela qual esses bens e serviços atendem às suas necessidades. Nessa situação, o consumidor conhece também todos os preços das mercadorias, bem como sua renda. Esse pressuposto é utilizado no sentido de garantir que todos os consumidores tomarão as melhores decisões, ou seja, não faltam informações sobre o mercado (CARRERA-FERNANDEZ, 2009; SAN-DRONI, 2005). Já o pressuposto da existência de uma função de utilidade revela que os consumidores derivam satisfação dos bens e serviços consumidos de acordo com uma função de preferência ou uma função de utilidade — que, na análise microeconômica, é representada graficamente e matematicamente. Assim, a existência de uma função de utilidade é um pressuposto mais amplo que a existência de preferências. Isso significa dizer que o pressuposto de que os consumidores têm preferências não é suficiente para garantir a existência de uma função de utilidade. Mas, ao se pressupor que os consumidores têm uma função de utilidade, pode-se afirmar que eles têm, de fato, preferências. Essa questão é fundamental para compreender a teoria do consumidor. A ideia de que os consumidores estão sempre buscando o máximo com o mínimo de esforço é a lei do interesse pessoal ou princípio hedonístico. O hedonismo deriva do grego hedone, que significa prazer. Na economia, foi um princípio introduzido por John Stuart Mill, em que cada um dos indivíduos procura o bem e a riqueza e evita o mal e a miséria. Logo, o bem e a riqueza são tratados como valores superiores, alinhados ao critério quantitativo da aritmética dos prazeres. Em suma, é a doutrina que considera o prazer como a essência da felicidade e como suprema norma moral. Preferências Em termos gerais, a utilidade é um conceito subjetivo que se modifi ca de consumidor para consumidor e, por conseguinte, não pode ser quantifi cada. Vários economistas marginalistas, no princípio das bases da teoria do consu- midor, imaginaram que a utilidade pudesse ser mensurada do mesmo modo que qualquer conceito objetivo, como a temperatura, o peso, o volume e a altura. 7Noções de microeconomia C06_Nocoes_microeconomia.indd 7 13/03/2018 15:10:43 Atualmente, para a moderna teoria do consumidor, a utilidade é um con- ceito estritamente ordinal, ou seja, necessita apenas ser ordenado. Em outras palavras, tudo que é requerido na moderna teoria do consumidor é que o consumidor seja capaz de ordenar as várias cestas de bens. Dessa maneira, quando confrontados com duas ou mais cestas de bens, os consumidores podem ordená-las de acordo com as suas preferências. Por exemplo, com apenas duas cestas de bens, é possível encontrar três situações mutuamente excludentes que podem ocorrer: a cesta A é preferida à cesta B; a cesta A não é preferida à cesta B; a cesta A é indiferente à cesta B. Nesse contexto, apenas uma situação pode ser escolhida de cada vez, de modo que qualquer mudança na escolha é um indicativo de que houve altera- ção nas preferências dos consumidores. Logo, as três situações mutuamente excludentes podem ser visualizadas também a partir da função utilidade, em que (CARRERA-FERNANDEZ, 2009): 1. utilidade de A > utilidade de B; 2. utilidade de A < utilidade de B; 3. utilidade de A = utilidade de B. Nessa análise, as preferências são consideradas completas, de modo que o consumidor é capaz de mostrar as suas preferências entre quaisquer das duas cestas de bens. Na prática, isso implica que a função de utilidade é contínua. Assim, não existem vazios no ordenamento das preferências dos consumi- dores. Além do mais, leva-se em conta que as preferências são transitivas. Ou seja, com uma terceira cesta de bens, pode-se estabelecer a propriedade da transitividade das preferências da seguinte forma: se a cesta A é preferida à cesta B, e se a cesta B é preferida à cesta C, então a cesta A é preferida à cesta C. Conforme Carrera-Fernandez (2009), a propriedade da transitividade é importante porque possibilita que o consumidor revele as suas preferências entre múltiplas cestas de mercadorias de forma consistente. É a partir daí que se define a função de utilidade como a relação do espaço de quantidades de bens e serviços para o conjunto real que preserva o ordena- mento das preferências do consumidor” (CARRERA-FERNANDEZ, 2009). Assim, para simplificar a compreensão das preferências, a teoria do consumidor faz uso da análise gráfica, de modo a decompor a função de utilidade. Noções de microeconomia8 C06_Nocoes_microeconomia.indd 8 13/03/2018 15:10:43 Na teoria do consumidor, a curva de indiferença é o instrumento gráfico que serve para ilustrar como são as preferências do consumidor. Ou seja, a curva de indiferença é o lugar geométrico de pontos que mostram diferentes combinações de bens que dão ao consumidor o mesmo nível de utilidade (CARRERA-FERNANDEZ, 2009). Na Figura 2a, você pode ver, na curva de indiferença, U0, várias combinações entre batatas e carne. Por exemplo, as cestas de bens A, B e C (na curva U0) possuem diferentes combinações entre batatas e carne, mas o mesmo nível de utilidade ou bem-estar para o consumidor (VASCONCELLOS, 2009). Em outras palavras, é indiferente para ele consumir 2 kg de carne e 8 kg de batatas (cesta de bens A), ou 3 kg de carne e 5 kg de batatas (cesta de bens B), ou então 5 kg de carne e 3 kg de batatas (cesta de bens C). Figura 2. Curva de indiferença e mapa de indiferença. Fonte: Vasconcellos (2009, p. 34–35). Nesse contexto, a curva de indiferença apresenta duas características básicas: inclinação negativa, em que, para manter o mesmo nível de bem-estar, ao aumentar o consumo de um bem determinado, é necessário reduzir o consumo de outro bem, substituindo-o; convexidade em relação à origem, em que a taxa marginal de subs- tituição — que é a taxa de intercâmbio de um bem por outro — vai diminuindo à medida que aumenta o consumo de um bem e diminui o do outro bem. Isso é devido à lei da utilidade marginal decrescente, em que, à medida que o consumo de um bem aumenta, o consumidor vai saturando-se dele e logo reduz o seu interesse (ou a sua preferência) em consumir mais desse bem. 9Noções de microeconomia C06_Nocoes_microeconomia.indd 9 13/03/2018 15:10:44 Assim, cada curva de indiferença representa determinado nível de utili- dade. Por isso, quanto mais alta a curva de indiferença, maior a satisfação que o consumidor pode obter no consumo dos dois bens (como, no exemplo, batatas e carne). Na Figura 2b, você pode ver um mapa de indiferença com três curvas de indiferença: U0, U1 e U2. Logo, a curva de indiferença mais desejada/satisfatória é a curva mais alta (U2), que é a com maior consumo dos dois bens (VASCONCELLOS, 2009). Os limites da escolha: o conjunto de oportunidades Para defi nir o conjunto de possibilidade de escolha do consumidor, supõe-se que ele não possa consumir quantidades negativas de qualquer bem ou serviço. Também se presume que possui uma renda nominal, bem como que enfrenta preços constantes para todos os bens e serviços. Desse modo, existem limites da escolha do consumidor, ou seja, existe uma restrição orçamentária. Os limites da escolha do consumidor estão restritos à sua possibilidade de consumo, o que significa dizer que o seu gasto total não pode exceder a sua renda nominal (CARRERA-FERNANDEZ, 2009). Assim, o conjunto de oportunidades de escolha é o conjunto de todas as cestas de bens e serviços que podem ser compradas com a renda do consumidor. Nesse sentido, define-se a reta orçamentária como as combinações máximas possíveis de bens e serviços, dados a renda do consumidor e os preços dos bens. Em outras palavras, essa reta representa um menu — conjunto de oportunidades de escolha — de opções que o consumidor poderá comprar. Na Figura 3a, esse menu se refere a todos os pontos abaixo da reta orçamentária (RO). Figura 3. Reta orçamentária e alternativas de equilíbrio do consumidor. Fonte: Vasconcellos (2009, p. 35–36). Noções de microeconomia10 C06_Nocoes_microeconomia.indd 10 13/03/2018 15:10:44 Como explica Vasconcellos (2009), a RO representa pontos em que o consumidor gasta toda a sua renda na compra dos dois bens — no exemplo, batatas e carne. Abaixo da RO, o consumidor está gastando menos do que poderia. Já acima da RO, o consumidor não tem condições de adquirir os bensou serviços com a renda de que dispõe e dados os preços de mercado. Por conseguinte, se o consumidor deseja maximizar seu nível de utilidade, deverá buscar alcançar — dada sua restrição orçamentária — a curva de indiferença mais alta. Em termos práticos, o consumidor maximizará sua utilidade quando sua reta orçamentária tangenciar sua curva de indiferença, como você pode ver na Figura 3b. Por exemplo, na Figura 3b o consumidor que tem a RO0 maximizará a sua utilidade na curva de indiferença U0 (PINDYCK; RUBINFELD, 1999). Esse ponto de tangenciamento — como, no exemplo, RO0 e U0 — representa o equilíbrio do consumidor, no sentido de que, uma vez alcançado esse ponto, não haverá incentivos para que o consumidor execute uma realocação de sua renda gasta no consumo dos dois bens (VASCONCELLOS, 2009). Ainda na Figura 3b, se a renda do consumidor aumenta, ou, alternativamente, se os preços dos bens e serviços reduzem, a RO se eleva — por exemplo, de RO0 para RO1 —, permitindo que o consumidor atinja níveis maiores de satisfação. Em síntese, na Figura 3b, você pode observar as várias alternativas de equilíbrio do consumidor. Nesse sentido, há um mapa de possibilidades de tangenciamento entre a reta orçamentária e a curva de indiferença, dados as rendas do consumidor e os preços dos bens e serviços. Assim, você pode perceber que o mapa de equilíbrio do consumidor é dinâmico, não estático. Comportamento da oferta: a teoria da firma e as estruturas de mercado Uma parte da teoria microeconômica se dedica a explicar e prever os com- portamentos da oferta a partir da compreensão do funcionamento da fi rma, em especial no que se refere à produção, aos custos e ao lucro. De acordo com Vasconcellos (2009), a teoria da fi rma trata justamente do problema da produção, dos custos de produção e dos rendimentos (lucros) da fi rma. Logo, a teoria da fi rma pode ser dividida em teoria da produção, teoria dos custos e teoria do lucro. Além disso, a microeconomia se dedica ao estudo dos tipos de estruturas de mercado, ou seja, se dedica à forma como os mercados se estruturam do ponto de vista econômico. É importante você se lembrar de que as firmas e 11Noções de microeconomia C06_Nocoes_microeconomia.indd 11 13/03/2018 15:10:44 a competição entre elas acontecem nos mercados. Pelo menos seis tipos de mercados são relevantes (SANDRONI, 2005; VASCONCELLOS, 2009): concorrência perfeita; concorrência monopolista; monopólio; oligopólio; monopsônio; oligopsônio. Teoria da firma: produção, custos e lucro A teoria da fi rma se assenta no intuito de entender a racionalidade do com- portamento da oferta de um bem ou serviço. Lembre-se de que o grande objetivo da fi rma que opera na economia capitalista é a maximização dos lucros. Daí que o primeiro dilema das fi rmas é a escolha do processo de produção — e as escolhas das relações tecnológicas, das quantidades a serem produzidas e das quantidades de insumos a serem usados na produção (VASCONCELLOS, 2009). Teoria da produção: a produção é o processo pelo qual uma fi rma transforma os fatores de produção adquiridos em bens ou serviços para a comercialização no mercado. Assim, a teoria da produção refere-se aos conceitos e princípios que norteiam a análise de preços e o emprego dos fatores de produção. Ela é a base para a análise dos custos e da oferta dos bens produzidos. É fundamental você compreender que a firma — da teoria microeconômica — é a unidade técnica que produz bens e serviços. Já os fatores de produção — mão de obra, capital físico, área ou terra e matérias-primas — são os bens e serviços intermediários que, combinados, suscitam outros bens e serviços finais. Em outras palavras, a firma é uma intermediária: compra insumos (inputs), combina-os segundo um processo de produção escolhido e vende os bens e serviços (outputs) nos mercados. Noções de microeconomia12 C06_Nocoes_microeconomia.indd 12 13/03/2018 15:10:44 O processo de produção pode ser intensivo em um dos fatores de pro- dução. Ou seja, pode depender quase exclusivamente de um dos fatores de produção, que também passa a ter relevância na estrutura total de custos. Fundamentalmente, existem três possibilidades em um processo de produção (VASCONCELLOS, 2009): 1. mão de obra intensivo, em que a mão de obra é indispensável para a produção; 2. capital intensivo, em que máquinas, equipamentos e instalações são altamente relevantes; 3. terra intensivo, em que a área ou a terra é o insumo primordial para que a produção aconteça. Em suma, a produção pode depender em maior quantidade de algum dos fatores de produção. Além disso, a escolha do processo de produção depende da sua eficiência. A eficiência pode, por um lado, ser avaliada do ponto de vista tecnológico — processo que permite produzir uma mesma quantidade de produto usando menor quantidade física de fatores de produção. De outro lado, ela pode ser avaliada do ponto de vista econômico — processo que permite produzir uma mesma quantidade de produto com menor custo de produção. Na teoria da produção, um dos conceitos mais relevantes é o da função de produção. Logo, a função de produção é a relação técnica entre a quantidade física de fatores de produção e a quantidade física de produto em determi- nado período de tempo. Em outras palavras, a quantidade de produto está em função ( f ) da quantidade de fatores de produção (mão de obra, capital físico e matérias-primas utilizadas). É importante você observar que o conceito de função de produção não deve ser confundido com o conceito de função de oferta. Este é um conceito econômico que relaciona a produção com os preços dos fatores de produção. 13Noções de microeconomia C06_Nocoes_microeconomia.indd 13 13/03/2018 15:10:44 Soma-se a tudo isso a questão do prazo e a distinção entre fatores de produção fixos e variáveis. Segundo Vasconcellos (2009), os fatores de produção fixos são aqueles que permanecem inalterados quando a firma aumenta ou diminui a produção. Enquanto isso, os fatores de produção variáveis se alteram com a mudança da quantidade produzida pela firma. Por exemplo, são fatores de produção fixos o capital físico e as instalações da empresa. E são fatores de produção variáveis a mão de obra e as matérias- -primas usadas. Com relação ao prazo, define-se curto prazo o período no qual existe pelo menos um fator de produção fixo. Já no longo prazo todos os fatores de produção variam. Teoria dos custos: todas as fi rmas na teoria microeconômica têm como objetivo maximizar os lucros por meio de sua atividade produtiva, ou seja, combinar de maneira efi ciente os fatores de produção. É nesse caso que os estudos dos custos das fi rmas tornam-se de fundamental importância para a economia. Assim, a quantidade empregada de cada fator de produção, multiplicada pelo seu preço de mercado, constituirá os custos da empresa, originando o custo total de produção (PINDYCK; RUBINFELD, 1999). Em outras palavras, o custo total de produção é o total das despesas realizadas pela firma com a utilização da combinação mais econômica dos fatores por meio da qual é obtida uma determinada quantidade de bens ou serviços (VASCONCELLOS, 2009). Dessa forma, os custos totais de produ- ção podem ser divididos em custos fixos e custos variáveis. Os custos fixos são aqueles que não dependem da quantidade produzida. Eles são decorrentes dos fatores de produção fixos. Já os custos variáveis de produção são aqueles que dependem da quantidade produzida, logo serão maiores quanto maior a produção e vice-versa. Na microeconomia, os custos também são analisados a partir do prazo — curto e longo prazo. Nesse caso, os custos de produção no curto prazo são afetados apenas pelos fatores de produção variáveis. Logo, você pode notar que os custos no curto prazo dependem diretamente do nível de produção estabelecido pela firma. Já os custos de produção no longo prazo são afetados por todos os fatores de produção,já que, nesse caso, não há fatores de produção fixos e logo não existem custos fixos de produção. Em outras palavras, no longo prazo todos os custos são variáveis (CARRERA- -FERNANDEZ, 2009). Noções de microeconomia14 C06_Nocoes_microeconomia.indd 14 13/03/2018 15:10:44 Além dos custos totais, fixos e variáveis, a teoria microeconômica se interessa também por outras análises de custos. Nesse contexto, a microeconomia analisa ainda os custos médios e os custos marginais. Os custos médios se referem aos custos totais divididos pelas quantidades produzidas. Ou seja, constituem o custo unitário da produção (ou o custo por unidade). Existe também o custo variável médio, que é o custo variável dividido pela quantidade, e o custo fixo médio, que é o custo fixo dividido pela quantidade. Já os custos marginais referem-se às variações dos custos em resposta às variações na quantidade produzida. Lucro: a teoria da fi rma postula um comportamento otimizador por parte dessa unidade produtiva. Em outras palavras, o propósito maior da fi rma é a maximização do lucro. A maximização do lucro ocorre quando a fi rma escolhe o nível de utilização de insumos e, portanto, o nível de produção, de modo a maximizar o seu lucro, condicionado à tecnologia disponível e dados os preços dos insumos e do produto (CARRERA-FERNANDEZ, 2009). De acordo com Carrera-Fernandez (2009), o postulado de maximização do lucro é mais amplo que o de minimização do custo. Em termos práticos, o autor defende que, ao se postular que a firma maximiza lucros, isso implica que ela estará minimizando o seu custo de produção. Porém, o inverso não é verdadeiro: se a firma minimiza os custos, isso não quer necessariamente dizer que ela esteja maximizando o lucro (CARRERA-FERNANDEZ, 2009). Quando analisado sob o ponto de vista econômico, o lucro da firma pode ser definido pela diferença entre a receita total (RT) e o custo total (CT). Vale lembrar que a receita total é o resultado da multiplicação do preço do produto pelo nível de produção. Já o custo total é a soma do gasto com todos os fatores de produção. Estruturas de mercado Como você sabe, na economia os mercados podem ser estruturados de manei- ras diferentes. Dois fatores básicos diferenciam a competição dos mercados (VASCONCELLOS, 2009): o número de firmas produtoras operando no mercado; a homogeneidade ou a diferenciação existente entre os produtos das firmas. 15Noções de microeconomia C06_Nocoes_microeconomia.indd 15 13/03/2018 15:10:44 É a partir desses dois fatores básicos que podem ser classificados, pelo menos, quatro tipos de mercados de bens e serviços: 1. concorrência perfeita; 2. concorrência monopolista; 3. monopólio; 4. oligopólio. Além disso, são classificados mais dois mercados de insumos e fatores de produção: 1. monopsônio; 2. oligopsônio. A seguir, você pode ver mais detalhadamente as características gerais de cada uma dessas estruturas de mercado e compreender como funciona o processo de determinação de preço e quantidade produzida. Concorrência perfeita: é uma estrutura de mercado que visa a revelar qual deveria ser o funcionamento ideal de uma economia, servindo de base comparativa para as demais estruturas de mercado. Apesar de ser uma cons- trução teórica, existem algumas situações que se aproximam da concorrência perfeita, como o mercado das commodities agrícolas ou de uma feira livre. Nesse sentido, a concorrência perfeita é uma situação de mercado assinalada pela existência de um grande número de compradores e vendedores que são tão pequenos que nenhum deles, de maneira isolada, é capaz de determinar o preço de mercado. Em outras palavras, tanto os produtores como os con- sumidores são tomadores de preços. Além disso, na concorrência perfeita, os produtos são homogêneos, não existindo diferenças entre eles. Logo, todos os produtos nesse mercado são perfeitos substitutos entre si. Ou seja, o consumidor comprará de qualquer firma, sendo indiferente a qualquer tipo de vendedor. Soma-se a isso, na concorrência perfeita, a inexistência de barreiras legais e econômicas tanto para a entrada como para a saída de firmas do mercado. Também há, tanto para compradores como para vendedores, informações perfeitas acerca do funcionamento do mercado. Ou seja, é um mercado com grande transparência nos preços, custos e lucros (PINDYCK; RUBINFELD, 1999). Noções de microeconomia16 C06_Nocoes_microeconomia.indd 16 13/03/2018 15:10:45 Concorrência monopolista: é a estrutura de mercado que contém ele- mentos da concorrência perfeita e do monopólio. Fica em uma posição intermediária entre as duas estruturas citadas. Da mesma maneira que na concorrência perfeita, existe na concorrência monopolista um grande número de fi rmas vendedoras que respondem por uma pequena fração do mercado total e possuem ainda a possibilidade de entrar e de sair do mercado com relativa facilidade. Logo, o que distingue a concorrência monopolista da concorrência perfeita é o afrouxamento da hipótese dos produtos homogêneos. Ou seja, as firmas na concorrência monopolista produzem produtos diferenciados — entretanto, substitutos próximos. Em termos práticos, cada firma procura diferenciar seu produto a fim de torná-lo único no mercado. É essa diferenciação no produto que dá à firma o poder de monopólio, uma vez que apenas ela produz aquele tipo de bem ou serviço. Isso permite que as empresas tenham alguma liberdade para fixar os seus preços (VASCONCELLOS, 2009). Monopólio: é a estrutura de mercado mais concentrada. É justamente o oposto da concorrência perfeita. Em outras palavras, é a situação de mercado em que há um só produtor de um bem ou serviço, que não tem substituto próximo, ou o produto não é homogêneo. Nesse mercado, o grau de diferen- ciação (exclusividade) do produto é pleno. Nesse contexto, a fi rma monopo- lista exerce grande infl uência na determinação do preço e das respectivas quantidades que serão vendidas ao mercado (SANDRONI, 2005). Em síntese, as características básicas do monopólio são: determinado bem ou serviço é fornecido por uma única empresa; não há substitutos próximos para esse bem ou serviço; existem obstáculos à entrada e à saída de novas firmas desse mercado. É importante você compreender que essa última característica revela que, para que o monopólio exista, é fundamental manter os concorrentes em poten- cial completamente afastados do mercado, mediante barreiras que impeçam ou desestimulem o surgimento de novas firmas. Basicamente, esses obstáculos podem ser oriundos de: monopólio natural (ou puro), que é aquele inerente ao próprio negócio, por exigir grandes investimentos financeiros; controle sobre o fornecimento de matérias-primas; 17Noções de microeconomia C06_Nocoes_microeconomia.indd 17 13/03/2018 15:10:45 proteção mediante patentes; processos burocráticos do sistema; monopólio legal, que é aquele em que o governo tem direito exclusivo de ser o produtor. Oligopólio: é o tipo de estrutura de mercado em que poucas empresas detêm o controle da maior parcela do mercado. O oligopólio é uma tendência das economias capitalistas modernas, em que a concentração da propriedade em poucas fi rmas de grande porte acontece a partir de fusão, incorporação ou mesmo compra e eliminação das pequenas fi rmas. Nesse mercado, as fi rmas dominam as áreas de atuação, limitando assim os custos de concorrência e fi xando os preços que ampliam as margens de lucro (SANDRONI, 2005). Na prática, o oligopólio pode ser classificado como puro — com produtos homogêneos — e diferenciado — com produtos heterogêneos. Assim, o oligo- pólio puro é aquele em que as firmas oferecem exatamente o mesmo produto. Já no oligopólio diferenciado as firmas oferecem produtos diversificados, em geral com uma competição focada na qualidade e no marketing. É importante você notar que há uma tendência ao oligopólio em setores da economia que exigem grandes volumes de investimentos.Monopsônio: é a estrutura de mercado em que existe apenas um comprador de uma mercadoria, em geral matéria-prima ou produto primário. No mo- nopsônio, mesmo quando diversos produtores fortes oferecem o produto, os preços não são determinados pelos vendedores, mas pelo único comprador. Nesse sentido, por exemplo, o monopsônio puro é muito raro. Ele costuma acontecer principalmente com empresas estatais que garantem a compra de determinados produtos estratégicos para o país (SANDRONI, 2005). Oligopsônio: é a estrutura de mercado em que poucas fi rmas — de grande porte — são as compradoras de determinada matéria-prima ou produto pri- mário. Nesse contexto, o oligopsônio pode ter duas formas: um mercado comprador muito concentrado, com poucas firmas grandes que negociam com muitos pequenos produtores; um mercado consumidor concentrado e um mercado vendedor também concentrado, com poucos e grandes produtores. Esse último caso é chamado também de oligopsônio bilateral. Noções de microeconomia18 C06_Nocoes_microeconomia.indd 18 13/03/2018 15:10:45 Na economia real, existem inúmeros exemplos das estruturas de mercado. Algumas estruturas de mercado são mais predominantes do que outras e, logo, são mais fá- ceis de serem visualizadas. O exemplo mais clássico de concorrência perfeita é a feira livre, em que inúmeros vendedores (inúmeras “barraquinhas”) comercializam o mesmo produto, em geral produtos agrícolas in natura. Em outras palavras, são muitos vendedores que comercializam produtos homogêneos. Já o caso da concorrência monopolista apresenta vários exemplos na realidade concreta. Talvez essa seja a estrutura de mercado em que é possível encontrar o maior número de exemplos reais. Dois casos ilustram muito bem essa estrutura de mercado. Primeiro, você pode considerar o exemplo dos salões de beleza. Existem inúmeros salões de beleza em qualquer cidade, mas cada salão de beleza faz uso de serviços cuja execução é praticamente exclusiva. Para entender melhor: imagine que existem muitos salões de beleza para cortar o cabelo, mas cada um corta de uma maneira diferente, sendo quase um monopólio no que realiza. Um segundo exemplo são as padarias. Como você sabe, todas produzem pães e produtos de panificação, mas cada uma tem o seu sabor específico e a sua qualidade peculiar. No monopólio, são comuns os casos relativos ao fornecimento de serviços con- siderados de natureza pública. Por exemplo, o fornecimento de água e esgoto, de energia elétrica, de telecomunicações, de estradas ou vias públicas, entre outros. Já os exemplos de oligopólio são comuns em grande parte dos setores contemporâneos, especialmente nos setores industriais mais complexos. Isso inclui, por exemplo, a indús- tria automobilística, a indústria farmacêutica, a indústria de tecnologia da informação, a indústria aeronáutica, entre outras. Ou seja, são exemplos em que existem apenas poucas firmas ou poucos big players (grandes participantes) no mercado produtor. Por fim, tanto o monopsônio como o oligopsônio apresentam exemplos nos setores de matérias-primas estratégicas, como o petróleo, os minérios, a energia, etc. No Brasil, um exemplo de monopsônio são as usinas de energia solar, que são obrigadas a vender a energia para um único distribuidor elétrico. Já um exemplo de oligopsônio são os pequenos/médios exploradores de petróleo que, em alguns países, são obrigados a vender os barris de óleo para poucas refinarias de petróleo. 19Noções de microeconomia C06_Nocoes_microeconomia.indd 19 13/03/2018 15:10:45 CARRERA-FERNANDEZ, J. Curso básico de microeconomia. Salvador: EDUFBA, 2009. PINDYCK, R. S.; RUBINFELD, D. L. Microeconomia. 4. ed. São Paulo: Makron Books do Brasil, 1999. SANDRONI, P. Dicionário de economia do século XXI. 2. ed. Rio de Janeiro: Record, 2005. VASCONCELLOS, M. A. S. Economia: micro e macro. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009. Leituras recomendadas FRANK, R. H. Microeconomia e comportamento. 8. ed. Porto Alegre: AMGH, 2013. KISHTAINY, N. et al. O livro da economia. São Paulo: Globo, 2013. Noções de microeconomia20 C06_Nocoes_microeconomia.indd 20 13/03/2018 15:10:45 02a 02b
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