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BIOÉTICA
BIOÉTICA
Copyright © UVA 2020
Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer 
meio sem a prévia autorização desta instituição.
Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico 
da Língua Portuguesa.
AUTORIA DO CONTEÚDO
Josemar Figueiredo Araújo 
REVISÃO
Janaina Vieira
PROJETO GRÁFICO
UVA
DIAGRAMAÇÃO
UVA
SUMÁRIO
Apresentação
Autor
06
07
Vida, identidade e morte em seus aspectos 
controversos
35
• Diferenças entre vida e direito à vida: o início da vida e o começo do 
direito à vida. O embrião in vitro. Biossegurança, investigação e terapia 
com células-mãe embrionárias.
• Identidade de gênero: aspectos sociológicos e antropológicos do 
conceito de identidade. A identidade como direito. Intersexualidade/
Transexualidade, a redesignação sexual e direito ao nome
• Direito à morte: eutanásia, mistanásia, ortotanásia; suicídio assistido. 
Testamento vital: diretivas antecipadas da vontade e consentimento 
informado
UNIDADE 2
08
• Ética, Bioética e Biodireito: conceitos, históricos, objeto e caráter 
interdisciplinar
• Limitações constitucionais e éticas à pesquisa com seres vivos
• Direitos da personalidade, bioética e biodireito 
Bioética e interdisciplinaridade 
UNIDADE 1
SUMÁRIO
Macrobiodireito 88
• Conceito, histórico e atuação 
• Experimentação animal
• Biodiversidade e ecossistema 
UNIDADE 4
60
• Reprodução assistida homóloga e heteróloga. Gestação em 
substituição. Gravidez post mortem. Presunções parentais
• Transplante de órgãos e tecidos intervivos e mortis causa: a lei de 
biossegurança. A questão da transfusão de sangue
• Aborto legal. Dilemas éticos e religiosos dos profissionais da saúde. 
A liberdade de escolha do médico nas hipóteses de aborto permitido 
por lei
Formas de intervenção 
UNIDADE 3
6
A humanidade vive um período de descobertas que frequentemente alteram nossas vidas, 
assim como irão alterar a vida das futuras gerações de forma definitiva. As descobertas 
científicas, a globalização e a velocidade da informação têm produzido inúmeros debates 
sobre as nossas formas de viver. Além desses fatores, a biotecnologia tem provocado 
muitos debates morais e éticos relativos à colocação de limites no que se refere ao tra-
tamento da vida humana e da vida animal, em decorrência dessas novas descobertas.
Esta disciplina se propõe abordar novos debates surgidos em razão desses avanços 
científicos, isto é, em função do próprio desenvolvimento tecnológico. Estamos, portan-
to, diante de uma série de debates bioéticos que dependem de regulamentação pelo 
biodireito. Face à necessidade de valorização da pessoa humana, prevista nos próprios 
princípios bioéticos, pelos direitos da personalidade e pelos Direitos Humanos em geral, 
é preciso refletir sobre vários temas, tais como: início da vida, esterilização de seres hu-
manos, pesquisas com células-tronco, natureza jurídica do embrião, aborto, desenvolvi-
mento da clonagem, transplante de órgãos e tecidos, autonomia do paciente diante do 
tratamento médico e da própria terminalidade da vida, responsabilidade civil do médico e 
dos profissionais de saúde, entre tantos outros.
Todo profissional que lida com a vida humana ou com a vida animal, direta ou indireta-
mente, precisa conhecer e compreender os temas problematizados em bioética e regula-
mentados pelo biodireito. Essa necessidade torna-se evidente à medida que o profissio-
nal precisa fazer escolhas difíceis a respeito de temas cujo consenso moral não existe ou 
sobre os quais ainda se conhece pouco. A bioética é a disciplina que lança um olhar críti-
co e problematizador sobre os avanços científicos, assim como sobre a aplicabilidade de 
suas descobertas. Essas reflexões, portanto, acompanham o profissional de saúde em 
particular e qualquer outro profissional que, de certa forma, lida com a vida no planeta. 
APRESENTAÇÃO
7
JOSEMAR FIGUEIREDO ARAÚJO 
Doutor e mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal Fluminense 
– UFF. Possui graduação em Direito e graduação em Ciências Sociais (bacharelado e 
licenciatura plena). É professor universitário e advogado com atuação destacada para a 
Efetividade dos Direitos Humanos. 
AUTOR
Bioética e interdisciplinaridade 
UNIDADE 1
9
Como a ciência está em constante evolução, assim como a tecnologia e os costumes — 
que se alteram regularmente —, muitos acontecimentos que outrora eram vistos apenas 
em filmes de ficção científica hoje fazem parte da realidade social. Ainda que as mu-
danças trazidas por essas constantes descobertas ofereçam vários benefícios, também 
oferecem riscos, receio, incertezas e questionamentos éticos. Assim, podemos dizer que 
essa nova realidade social, de riscos, de receios e de questionamentos éticos tornou 
indispensável o estudo da bioética e do biodireito. Ao estudar esta unidade você com-
preenderá que a bioética envolve temas com os quais deparamo-nos cotidianamente, os 
quais são regulados juridicamente pelo biodireito. 
INTRODUÇÃO
Nesta unidade você será capaz de:
• Identificar o conceito, as origens e o objeto de estudo da bioética, seu caráter in-
terdisciplinar, assim como os limites éticos e jurídicos relativos a pesquisas com 
seres humanos. 
OBJETIVO
10
Ética, Bioética e Biodireito: conceitos, 
históricos, objeto e caráter interdisciplinar
Para que possamos compreender bem os nossos objetos de estudo, é importante dis-
tinguirmos bioética, biodireito e biotecnologia. Os temas decorrentes das descobertas e 
mudanças científicas de ordem ética e moral, sobre os quais não existe consenso, são 
objeto da bioética. Já quando se fala dos temas essencialmente relacionados à vida e às 
relações sociais, estes são objeto do biodireito. Por fim, quando tratamos do emprego de 
processos tecnológicos com o objetivo de produzir materiais e novas substâncias para 
uso farmacêutico, medicinal, industrial, entre outros, estamos diante do objeto de estudo 
da biotecnologia.
Ética e moral
Antes de falarmos de bioética, vamos falar de ética? Normalmente empregamos as pala-
vras “moral” e “ética” como sinônimas, mas elas têm diferenças importantes. Ainda que 
seus significados etimológicos revelem alguma semelhança, não é difícil fixar algumas 
distinções: 
Na origem etimológica, a palavra “moral” deriva do latim mos, moris, significando “ma-
neira de se comportar regulada pelo uso”, o que também pode se entender por costume. 
Ainda do latim, moralis é adjetivo e significa “relativo aos costumes”. Então, podemos 
entender a moral como um conjunto de regras de conduta admitidas em uma época 
específica ou por um grupo de seres humanos.
A palavra “ética” deriva do grego ethos, significando “costume”. Também compreendida 
como filosofia moral, a ética é a parte da filosofia que realiza as reflexões sobre as no-
ções e princípios da moral. Essa reflexão segue os mais diferentes caminhos, de acordo 
com o ser humano que a realiza.
Enquanto a moral é eminentemente prática, a ética é teórica e reflexiva, por exemplo dian-
te de uma norma moral, como fidelidade. A reflexão sobre como vamos nos comportar 
é objeto da ética. É também por isso que as empresas têm um código de ética para es-
tabelecer padrões diante de regras morais que estão no cotidiano da vida em sociedade 
e na realidade das próprias corporações. 
11
Bioética
Segundo Maluf (2020, p. 19): “Bioética é o estudo transdisciplinar entre biologia, medi-
cina, filosofia e direito que investiga as condições necessárias para uma administração 
responsável da vida humana, animal e responsabilidade ambiental”. A bioética considera 
as questões sobre as quais não se verifica consenso moral, tais como fertilização in vitro, 
eutanásia, pesquisas com células-tronco, aborto, assim como os limites e cuidados éti-
cos da pesquisa científica, além dos aspectos morais de sua aplicação. 
Portanto, podemos dizer que a bioética estuda não só a eticidade como a moralidade 
da conduta humana no âmbito das ciências da vida, procurando estabelecercertos 
padrões de conduta que traduzam algum consenso social. Essa falta de consenso é 
facilmente perceptível de acordo com a variação cultural, já que, internacionalmente, em 
razão de aspectos políticos, econômicos, religiosos ou ideológicos, essa ética se dá de 
forma diferente.
Em síntese, a ética explica e questiona as normas morais, é, portanto, reflexiva, 
enquanto a moral é prática, representando uma gama de normas reguladoras 
do comportamento humano em sociedade, normas essas que se aprendem 
tanto pelo cotidiano quanto pela tradição. 
Importante
Na América Latina, um tema de grande relevância é saúde pública, sobretudo 
quanto ao acesso à atendimento médico, custos e qualidade de vida. Na com-
paração entre Ocidente e Oriente, também é possível constatar que o Ocidente 
demonstra preocupações de cunho mais individual, enquanto o Oriente revela 
questões mais ligadas à coletividade
Exemplo
12
Microbioética e macrobioética
Conforme pudemos observar, no campo da bioética é possível identificar dois tipos de 
temas: de um lado as questões envolvendo dadas liberdades individuais e de outro as 
questões que traduzem eficácia para a coletividade. Com base neste critério, é possível 
distinguir microbioética e Macrobioética. 
Microbioética
Constitui-se no ramo da bioética, cujo objetivo consiste em estudar 
as relações entre médicos e pacientes, assim como as relações 
entre instituições e profissionais da saúde. Ocupa-se, portanto, das 
questões oriundas dos conflitos entre a evolução das pesquisas 
científicas e os limites éticos impostos pela dignidade humana. 
Macrobioética
É a outra parte da bioética e visa estudar a biodiversidade, almejan-
do preservar a vida em geral e a vida humana em particular. Ocupa-
-se, portanto, de questões reiteradas socialmente, razão pela qual 
se encontra regulamentada. São exemplos a proteção florestal ou 
de certa espécie da fauna.
Histórico
Resultado da junção das palavras gregas bios e étus, o termo “bioética” foi empregado 
primeiramente nos anos 1970, tendo por objetivo superar a dicotomia entre os fatos ex-
plicáveis por meio da ciência e os valores estudados pela filosofia. Em sua essência, con-
tém um diálogo interdisciplinar que visa compreender a realidade posta a partir de uma 
conjugação de fatores físicos, biológicos, políticos e sociais. Seu fim último é assegurar 
o valor da pessoa humana nos aspectos vida, dignidade, liberdade e autonomia, diante 
dos dilemas morais oriundos de descobertas científicas. 
Costuma-se dividir a história da bioética em três fases. Ainda que essa divisão seja 
questionável e não traduza consenso, ela pode nos ajudar a compreender esse 
percurso. Vejamos:
13
Princípios
Para o presente estudo podemos considerar que princípios são, em linhas gerais, normas 
abertas que devem ser ponderadas em cada caso, permitindo ao intérprete maior reflexi-
vidade e certa liberdade de ação no caso concreto. Atualmente existem quatro princípios 
amplamente reconhecidos. São eles: 
Princípio da autonomia: confere maior prevalência à vontade do paciente ou de seus 
familiares e responsáveis, procurando, nos limites éticos e legais, considerar seus valores 
religiosos e convicções morais. Trata-se de reconhecer o controle do paciente sobre sua 
vida, isto é, restringir a interferência alheia em suas opções terapêuticas. Quando se fala 
de autonomia, portanto, faz-se referência à aptidão para atuar, conhecendo as caracte-
rísticas do tratamento, riscos e benefícios, sem qualquer coação ou influência externa 
Surgem os primeiros médicos e cientistas demonstrando 
preocupação com as consequências do avanço científico 
e tecnológicos para a vida no planeta. Neste período 
formaram-se os primeiros comitês de bioética em vários 
países, nos quais se discutiam temas como viabilidade 
econômica de certos procedimentos e direitos dos 
pacientes. Também são desta fase os primeiros 
transplantes cardíacos e renais e os diagnósticos pré-
natal e de morte cerebral, entre outros. 
Primeira fase:
de 1960 a 1977. 
Foi neste período que ocorreu a publicação do Relatório 
de Belmont, apresentando os princípios éticos básicos 
que deveriam nortear as pesquisas biomédicas com 
seres humanos. Dá-se a primeira fertilização in vitro e 
verificam-se inúmeros avanços em engenharia genética. 
Também são dessa fase as criações do Convênio 
Europeu de Biomedicina e Direitos Humanos, do Grupo 
Internacional de Estudos em Bioética, da Associação 
Europeia de Centros de Ética Médica e vários outros. 
Segunda fase:
de 1978 a 1997. 
É marcada pela descoberta do genoma humano, por 
experiências de clonagem e por debates sobre as 
fragilidades dos sistemas de saúde pública dos países 
em desenvolvimento. 
Terceira fase:
iniciada em 1998 
e ainda em curso. 
14
indesejada. Não é por outra razão que, para a segurança jurídica tanto do médico quanto 
da instituição médica, se deve lavrar para o paciente o Termo de Consentimento Livre 
e Informado.
Princípio da beneficência: é informativo de que o atendimento ao paciente, tanto por 
parte do médico quanto dos demais profissionais da saúde, deve destinar-se ao atendi-
mento de seus mais elevados interesses, buscando sempre seu mais completo bem-es-
tar, evitando danos. Teria raízes no pensamento do médico grego Hipócrates, no sentido 
de que ao médico, em particular, e aos profissionais da saúde em geral, só se admite o 
emprego de tratamento para fazer bem ao paciente, de acordo com sua respectiva ca-
pacidade, jamais para causar mal. Na rotina médica deve ser desenvolvido o hábito de 
auxiliar, prestando socorro sem prejudicar e sem causar mal ou dano ao enfermo. O prin-
cípio pode ser assim resumido: Não causar dano. Maximizar os benefícios. Minimizar 
eventuais riscos.
Princípio da não maleficência: é decorrente da máxima da ética médica primum non 
nocere, que significa “primeiro não prejudicar”. Reflete a ideia de que, para fazer o bem, 
é fundamental não causar dano, não fazer mal. A distinção entre os princípios da bene-
ficência e da não maleficência pode ser assim pensada: toda beneficência que advém 
do tratamento tem um pressuposto: não causar prejuízo. Dito de outra forma, a não 
maleficência é condição da beneficência. 
Princípio da justiça: a justiça, em tese, é o fim último do Direito. Enquanto princípio bioé-
tico, pressupõe igualdade na distribuição de riscos e benefícios da prática médica por 
parte dos profissionais de saúde, de maneira que não se pratique discriminação. 
Em bioética, observada a ideia de microbioética, o bem é sempre pensado com base em 
um sujeito particular, jamais de maneira abstrata ou coletivizada. A bioética é, portanto, a 
disciplina que estuda os aspectos éticos das práticas médicas e biológicas, analisa suas 
implicações sociais, assim como suas implicações entre os seres humanos e entre estes 
e outros seres vivos, indicando as condutas que melhor observarão a dignidade humana. 
Biodireito
Inicialmente, é preciso destacar que, para fins didáticos, o Direito se divide em dois gran-
des ramos: o direito privado e o direito público. No âmbito do direito privado estão aque-
las disciplinas cujas relações jurídicas reguladas pressupõem certo equilíbrio entre as 
partes, voltando-se mais para os interesses predominantemente particulares. Nas rela-
ções jurídicas de direito público, o Estado tem supremacia sobre o particular, prevalecen-
do o interesse coletivo. 
15
O biodireito revela a presença do Estado, impondo limites normativos às relações cien-
tíficas, às relações ambientais, às relações entre médico e paciente, entre outras. Visa o 
interesse coletivo, predominantemente. 
Assim, podemos dizer que Biodireito é a disciplina jurídica que, sendo parte do direito 
público, liga-se umbilicalmente à Bioética, com o fito de estudar as normas e relações ju-
rídicas provenientes dos avanços tecnológicos associados à medicina, tendo a proteção 
da vida como pressuposto e fim principal. 
Nessa linha de pensamento, a norma jurídicanão pode sobrepor-se incondicionalmente 
a avanços científicos e tecnológicos, todavia esses não podem existir de maneira ilimi-
tada. Uma verdade científica, seja ela qual for, não pode sobrepor-se ao direito e à ética. 
De igual modo, os avanços científicos não podem representar justificativas para o come-
timento de crimes contra a dignidade da pessoa humana, muito menos estabelecer os 
destinos da vida humana sem observância dos limites éticos e jurídicos. 
Assim como em bioética, verifica-se que o biodireito revela forte interdisciplinaridade 
com a própria bioética, com biotecnologia, além de outras disciplinas jurídicas, tais como: 
• Direito Constitucional. 
• Direito Ambiental. 
• Direito Penal. 
• Direito Civil.
O biodireito constitui-se em instrumento de limitação e regulagem do poder científico 
sobre a pessoa humana. Assim, fala-se em microbiodireito e macrobiodireito. Quando 
fazemos referência a microbiodireito estamos tratando da regulação de temas como 
a vida em seus aspectos individuais: embrião in vitro, atos de disposição do próprio cor-
po e experimentos científicos com seres humanos, por exemplo. Já o macrobiodireito 
A principal finalidade prática do biodireito é regulamentar juridicamente os te-
mas problematizados pela bioética, disciplinando aqueles aspectos sensíveis 
que envolvem a incidência da valoração ética e jurídica sobre temas médicos, 
biotecnológicos, ambientais, científicos, entre outros, em relação aos quais não 
se verifica consenso moral. 
Importante
16
ocupa-se de disciplinar o uso, a modificação e as experiências com patrimônio natural 
(inclusive o genético), cultural e artificial. 
Princípios
Além dos princípios da autonomia, da justiça e da beneficência, comentados anterior-
mente, podemos destacar os seguintes: 
Sacralidade da vida: a vida é direito que encontra previsão em inúmeros tratados interna-
cionais, assim como na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (art. 5º). 
Logo, deve ser protegido e priorizado no exercício das atividades médicas e científicas. 
Dignidade da pessoa humana: é princípio que vai além do Direito e da filosofia, mos-
trando-se um vetor indispensável à conduta dos profissionais de saúde. Dada sua gran-
de abrangência, pode ser conceituado de inúmeras maneiras. No âmbito das condutas 
médicas e científicas, a dignidade humana indica que a pessoa humana não deve ser 
coisificada, não pode ser reduzida à condição de objeto. 
Cooperação entre os povos: assegura a liberdade de troca de experiências científicas 
entre os Estados, independentemente da existência de tratados formais, de maneira que 
os povos compartilhem experiências científicas, bem como se apoiem financeira e tec-
nologicamente, com vistas à preservação da vida enquanto valor e direito. 
Precaução: é um dos pilares do Direito Ambiental. Dada a interdisciplinaridade do Bio-
direito, tem plena aplicabilidade nessa área. Significa que é preciso adotar medidas pre-
ventivas de danos causáveis em função de práticas científicas, médicas e tecnológicas. 
Assim, por exemplo, se certa prática científica for passível de causar dano à vida, esses 
riscos devem ser analisados preventivamente e, se necessário, deve a prática científica 
ser impedida por normas de biodireito, até que ofereça maior segurança. 
Ubiquidade: é informativo de que tanto o meio ambiente quanto a integridade do patri-
mônio genético estão por toda parte, sendo, portanto, onipresentes. Esse princípio deve 
ser observado com atenção em temas como experimentos com células de germe huma-
no, pois a alteração de ditas células pode modificar perigosamente o patrimônio genético 
da humanidade. 
17
Biodireito e biotecnologia
Cabe ressaltar que biodireito e biotecnologia não se confundem. A distinção fica clara 
quando entendemos que o primeiro impõe normas à segunda. A biotecnologia é ciên-
cia instrumental, empregada com frequência no campo da biologia para criar ou alterar 
organismos vivos ou derivados com uma série de objetivos, entre os quais podem ser 
destacados: 
• Transferência de genes entre organismos. 
• Criação de produtos por meio biotecnológico para fins medicinais, fármacos, 
industriais, entre outros. 
• Cura de doenças.
Os limites a essas atividades são impostos pelo biodireito. Este regula as múltiplas for-
mas pelas quais a ciência interfere sobre a vida. São os casos, por exemplo, do uso de 
plantas e animais transgênicos, das terapias gênicas e do sequenciamento de DNA.
Interdisciplinaridade
Por fim, devemos observar que a bioética está estreitamente ligada ao biodireito, ca-
racterizando uma inevitável relação de interdependência. De igual modo, o biodireito, ao 
regular questões envolvendo temas sensíveis ligados à interferência da ciência sobre a 
vida, não fica alheio ao que é problematizado pela bioética, valendo-se de conhecimentos 
ofertados por outras disciplinas jurídicas, tais como Direito Constitucional, Direito Am-
biental, Direito Penal e Direito Civil.
18
Limitações constitucionais e éticas à 
pesquisa com seres vivos 
É inegável que não se pode fazer ciência sem liberdade. Por outro lado, se a liberdade da 
ciência não conhecer limites, será o fim do próprio Direito. Sendo a liberdade científica 
juridicamente garantida, ela também é ética e juridicamente limitada. Em um momento 
histórico em que a biotecnologia oferece uma gama de novas possibilidades nas mais 
variadas esferas da vida humana, é preciso entender que a ética do saber nos confere o 
dever de vigilância e atenção com o que as pesquisas científicas fazem com o outro. Daí 
se dizer que a bioética é a ciência da alteridade. 
A biotecnologia inclui três importantes escopos: um escopo de cunho filosófico, ligado à 
própria necessidade do conhecimento; outro de cunho político, assinalando o poder que 
o conhecimento agrega; e um último de cunho jurídico, que impõe limites legais, morais 
e éticos à liberdade científica. Certo é, portanto, que o poder sobre a vida implica proble-
mas bioéticos, não restando outra solução que não o equilíbrio entre o desenvolvimento 
científico com os valores morais dos povos. Ainda que não haja consenso sobre esses 
limites, é possível afirmar que eles estão na preservação da dignidade humana e na ma-
nutenção da vida enquanto valores superiores.
Limites à pesquisa em seres humanos
A busca pela imposição de limites à pesquisa científica em seres humanos não é algo 
novo, porque a própria pesquisa em seres humanos é milenar e diversos autores afir-
mam que tais estudos eram feitos por Hipócrates, na Grécia antiga. Com consequências 
diretas para o nosso tempo, entretanto, estão marcados na História da Ciência vários ca-
sos de pesquisas que chocaram não só o meio científico, mas igualmente a coletividade 
em geral.
O mais conhecido caso de experimento em desacordo com padrões éticos mínimos foi 
o uso de seres humanos vivos para experimentos científicos sem seu consentimento, 
ou contra sua vontade, pelo nazismo, ao longo da Segunda Guerra Mundial. Entre outras 
práticas, os nazistas estudaram um método de esterilização por meio de drogas, cirur-
gias e, principalmente, raio X, que tornaria inférteis milhões de pessoas em um curto es-
paço de tempo. A radiação, ministrada sem o conhecimento dos prisioneiros, provocou 
esterilidade, graves queimaduras e a morte de inúmeras pessoas. Também sem anuên-
cia das vítimas, os nazistas introduziram em humanos vírus como o tifo para o desenvol-
19
vimento de vacinas. Os próprios estudos sobre as reações do corpo humano ao ponto de 
congelação tiveram avanços significativos nos experimentos nazistas, que utilizaram o 
sofrimento humano não consentido. 
Além da barbárie nazista, as pesquisas científicas em medicina escandalizaram o mun-
do em outras oportunidades. Dados os limites deste estudo, comentaremos dois casos 
conexos: o caso Tuskegee e o caso Guatemala. 
No Caso Tuskegee, por meio de um ensaio clínico realizado em Tuskegee, no estado do 
Alabama (EUA) pelo serviçode saúde pública daquele país, entre os anos de 1932 e 1972, 
aproximadamente 400 homens com sífilis tiveram tratamento negado apenas para que o 
desenvolvimento da doença fosse estudado em seus corpos. 
No Condado de Macon, um dos mais pobres do estado do Alabama, em 1932, foram 
recrutados 600 homens negros e miseráveis, que receberam a promessa de alimenta-
ção, transporte, acompanhamento médico e assistência funeral. Desse total, 399 tinham 
sífilis e os demais (201) integravam o grupo de controle. Os homens negros com sífilis 
sequer sabiam que estavam doentes e eram comunicados de que tinham “sangue ruim”. 
Nenhum deles foi informado de que estava participando daquele experimento médico, 
muito menos conheciam as consequências da doença. Acreditavam que seu “sangue 
ruim” estava sendo tratado, pois recebiam regularmente pílulas e xaropes, que, na verda-
de, eram placebos. A penicilina se tornaria padrão de tratamento para a sífilis nos anos 
1940, sem que nenhum daqueles homens fosse tratado com o novo antibiótico. Em 1972 
a verdade foi revelada por uma matéria jornalística feita com base no relato de um dos 
membros da equipe de pesquisadores, mas os efeitos eram irreversíveis. Ao final do es-
tudo, somente 74 dos participantes estavam vivos. O caso gerou um processo de 9 mi-
lhões de dólares americanos, porém, somente em 1997 o governo dos Estados Unidos 
da América pediu desculpas oficialmente. 
Chama especial atenção o fato de que o estudo foi conduzido por cientistas preparados e 
respeitados, sob supervisão do governo estadunidense. Também conhecido como “Estu-
do de Sífilis de Tuskegee”, esse caso é um dos exemplos mais comuns do que não deve 
ser feito em pesquisas com seres humanos. 
O Caso Guatemala poderia ser considerado uma continuação das barbáries de Tuske-
gee, se ambos não fossem contemporâneos. Aliás, vários dos participantes eram os 
mesmos na Guatemala e em Tuskegee. O Dr. John Charles Cutler, que presidiu os estu-
dos na Guatemala entre 1946 e 1948, também atuou em Tuskegee.
20
Nesse experimento, prostitutas contaminadas por gonorreia ou sífilis foram utilizadas 
para o contágio de homens privados de liberdade, tais como institucionalizados em ma-
nicômios. Verificando que o percentual de contágio era pequeno, os estudiosos decidi-
ram promover a inoculação direta, injetando nos internos a bactéria Treponema pallidum, 
causadora da sífilis. Assim como em Tuskegee, os participantes não foram informados 
sobre os experimentos, pois a crença dos membros da equipe de pesquisa era de que as-
sim os estudos teriam melhores índices de resultados. Investigando entre outros temas 
as consequências das enfermidades venéreas durante longos períodos, sem que aos 
doentes participantes do estudo fosse oferecido tratamento adequado, os experimentos 
levaram à morte, em dois anos de pesquisas, de aproximadamente 1.500 latinos, todos 
vitimados pela sífilis induzida. 
O programa foi patrocinado pelos governos guatemalteco e estadunidense, com o obje-
tivo de estudar as respostas do organismo humano à infecção pela respectiva bactéria, 
entender os processos de cura, realizar testes com doses de penicilina mais adequa-
das a cada caso, assim como encontrar as possíveis causas da falsa positividade de 
provas sorológicas.
Abusos como esses foram vários e, mesmo diante das regulamentações, continuam a 
existir, o que nos faz compreender que a imposição legal de limites é fundamentalmente 
necessária para a preservação da dignidade da pessoa humana e para a proteção da 
vida como fim último da medicina. 
O Código de Nuremberg
Após o término dos julgamentos dos oficiais nazistas por um tribunal militar internacio-
nal (Tribunal de Nuremberg), foi elaborado o Código de Nuremberg, em 1947, tendo por 
escopo estabelecer regramentos éticos para pesquisas envolvendo seres humanos, a 
fim de que a medicina não continuasse a ser praticada de modo autoritário. 
Tendo a ética como vetor indispensável dos rumos das pesquisas científicas com seres 
humanos, o Código de Nuremberg introduziu o princípio da autonomia pessoal, estabe-
leceu a necessidade do consentimento informado e o direito à sua revogação, além de 
condenar métodos coativos de submissão de pacientes a experimentos científicos. Além 
dessas, podemos mencionar as seguintes contribuições do Código de Nuremberg: 
a) Prescreveu que os experimentos com seres humanos fossem feitos com base 
em experimentação prévia com animais. 
b) Estabeleceu regras internacionais para experimentos científicos. 
21
c) Assinalou que a medição dos riscos deve ter por base a importância humanitária 
dos resultados, assim como devem ser avaliados por estudiosos capacitados para 
analisá-los. 
d) Afirmou que, além de conduzir os experimentos de maneira a evitar sofrimento 
ou danos desnecessários, o pesquisador precisa se preparar para a interrupção dos 
estudos experimentais a qualquer momento da pesquisa, sempre que perceber o 
potencial danoso do experimento. 
e) Reconheceu na beneficência o mais importante fator justificador de experimen-
tos científicos. 
A Declaração de Helsinque
Trata-se de uma série de princípios éticos, Fruto da 18ª Assembleia Médica Mundial, 
realizada em Helsinque (Finlândia) em junho de 1964, que desenvolveu os primeiros 10 
princípios do Código de Nuremberg, incorporando-os às relações entre médico e pa-
ciente, assim como os associou aos deveres éticos do médico, previstos na Declaração 
de Genebra.
Se até o Código de Nuremberg não existiam regras internacionais reguladoras das pes-
quisas com seres humanos vivos, a Declaração de Helsinque representou um importante 
marco na evolução dos regramentos éticos em pesquisa, sendo um dos mais relevantes 
documentos nessa matéria. Pela primeira vez buscou-se alguma padronização regulató-
ria da pesquisa biomédica e aquele conjunto normativo se tornou a base primordial para 
a redação de documentos posteriores, deixando como relevante contribuição a ideia de 
que, acima de interesses científicos e de interesses da própria sociedade, deve estar o 
bem-estar da pessoa humana. Considerando a atual Declaração, após seis revisões e 
dois esclarecimentos, entre outros aspectos importantes, destacamos: 
a) A distinção da pesquisa clínica terapêutica, cujo objetivo é o tratamento do enfer-
mo e a pesquisa não terapêutica, cujo fim é puramente investigativo. 
b) A missão essencial do médico é o cuidado com a saúde das pessoas; logo, deve 
empregar seus conhecimentos para a realização deste fim. 
c) Os resultados obtidos em laboratório devem destinar-se à sociedade. 
d) A importância de trazer benefícios às populações mais pobres onde a pesquisa 
se desenvolve, devendo o tratamento ser feito em comparação com os tratamentos 
existentes, e não com mera ministração de placebo. 
e) Em sua segunda revisão, revela a importância da questão ambiental e dos expe-
rimentos com animais, reconhecendo a necessidade de protocolos experimentais. 
f) É direito de toda e qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo, a proteção por 
princípios éticos contra abusos de experimentações científicas.
22
Regulamentação no Brasil
A dignidade da pessoa humana, prevista no art. 1º da Constituição da República Fede-
rativa do Brasil, consiste no princípio geral de todo o Direito, assim como no objetivo das 
ciências médicas. Deve ser observado integralmente nas ciências da saúde, sobretudo 
envolvendo seres humanos vivos, tanto em estudos biomédicos quanto em pesquisas 
em ciências sociais.
Pesquisas com animais
Experimentação animal significa a utilização de animais com a finalidade de desenvolver 
estudos científicos ou como material didático. Se por um lado é necessário alcançar o 
bem-estar do homem, por outro esses objetivos levam ao sacrifício de animais. Aliás, 
diversos documentos internacionais, como a própria Declaração de Helsinque, recomen-
dam que, antes de desenvolver pesquisas em seres humanos, estas já devem ter sido 
desenvolvidas anteriormente em animais ou em laboratórios.Assim como as pesquisas com seres humanos — que trouxeram inúmeros benefícios 
para a vida no planeta —, as pesquisas com animais foram decisivas para várias desco-
bertas, entre as quais as vacinas contra difteria, tétano e raiva.
Entre vários dispositivos normativos destacamos a vigente Resolução nº 466, 
de 12 de dezembro de 2012, que, entre outras providências, incorpora referen-
ciais da bioética, tais como autonomia, não maleficência, beneficência, justiça e 
equidade, objetivando garantir os direitos e deveres que dizem respeito aos par-
ticipantes da pesquisa, à comunidade científica e ao Estado. Institui regras para 
as pesquisas com seres humanos no Brasil, determinando formalmente a apli-
cação dos princípios e regras da Declaração de Helsinque em território nacional.
Importante
23
Significativa em tema de limites aos experimentos com animais é a contribuição de Wil-
liam Russell e do microbiologista Rex Burch. Ambos, na obra intitulada The principles of 
humane experimental technique, de 1959, estabeleceram o que ficou conhecido como 
os três R das pesquisas envolvendo animais. São eles: 
Replace
Equivale a substituir os animais sencientes, assim entendidos 
como aqueles capazes de sentir dor, felicidade, medo e outros 
sentimentos correlatos.
Reduction
Trata-se da redução da quantidade de animais empregados 
em pesquisa, sem prejuízo para o estudo.
Refinement
É a idéia de refinamento, orientando no sentido de diminuir a se-
veridade dos procedimentos científicos aplicados em animais.
O que também ficou conhecido como O Princípio dos 3 Rs, não impede a pesquisa com 
animais, entretanto, de certa forma, busca tratá-los de maneira a reduzir os efeitos de sua 
objetificação.
Para refletir
A milenar consideração de que os animais são seres inferiores, em certa medi-
da explica práticas em relação às quais hoje realizamos questionamentos éti-
cos. A questão que se colocou em debate ao longo dos séculos em matéria de 
proteção aos animais é se são eles capazes de sentir e de sofrer. Se compara-
das todas as espécies de animais, não há como afirmar o mesmo em relação 
a todas elas.
Assim, existe dúvida razoável, por exemplo, em relação aos ácaros, insetos e 
outros invertebrados, sendo esse um tema muito próprio das ciências biológi-
cas, cuja análise nos afastaria muito do nosso objeto de estudo. Fato é que o 
sofrimento animal, que se discute há alguns séculos, hoje é um problema bioé-
tico, merecedor de regulamentação. 
24
A proteção dos animais em experimentos no Brasil
O Brasil é administrativamente dividido em três níveis de poder político, existindo legisla-
ção ambiental em todas essas esferas. Logo, a análise das legislações presentes nas 27 
unidades federativas seria inviável nos limites do nosso estudo, razão pela qual tratare-
mos aqui das mais importantes normas vigentes no âmbito federal. 
Para análise deste tema, vamos começar pela Constituição da República Federativa do 
Brasil, de 1988. Esta, no art. 225, estabelece que: 
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de 
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se 
ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo 
para as presentes e futuras gerações.
Estabelece ainda que são deveres do Poder Público — assim consideradas todas as es-
feras de poder — “preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País 
e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético”; “pro-
teger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua 
função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a cruel-
dade”, ressaltando que não se consideram cruéis as práticas desportivas que utilizem 
animais, desde que sejam manifestações culturais.
As preocupações com os abusos contra animais na indústria de cosméticos, 
nos transportes, nos abatedouros, entre outros, foram expressas fortemente 
por Peter Singer, em sua obra Animal Liberation, de 1975. Em 1978, a Orga-
nização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura — Unesco 
publicou a Declaração Universal dos Direitos dos Animais. 
Ampliando o foco
25
Em 1979 foi editada a Lei nº 6.638, estabelecendo uma série de normas para a prática 
didático-científica da vivissecção de animais, porém esta lei jamais foi regulamentada, 
até ser revogada pela Lei nº 11.794, de 2008. 
Por sua vez, a Lei nº 11.794, de 2008, “Regulamenta o inciso VII do § 1o do art. 225 da 
Constituição Federal, estabelecendo procedimentos para o uso científico de animais; re-
voga a Lei nº 6.638, de 8 de maio de 1979; e dá outras providências”. Entre as providên-
cias adotadas foram criadas as Comissões de ética para Uso de Animais (CEUAs) nas 
instituições de pesquisa e o Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal 
(CONCEA). Esta é a lei que regulamenta e define juridicamente certos termos biológicos 
no Brasil. Dada sua grande relevância, transcrevemos a seguir os arts. 2º e 3º:
Art. 2o - O disposto nesta Lei aplica-se aos animais das espécies clas-
sificadas como filo Chordata, subfilo Vertebrata, observada a legislação 
ambiental.
Art. 3o - Para as finalidades desta Lei entende-se por: 
I – filo Chordata: animais que possuem, como características exclusivas, 
ao menos na fase embrionária, a presença de notocorda, fendas bran-
quiais na faringe e tubo nervoso dorsal único; 
II – subfilo Vertebrata: animais cordados que têm, como características 
exclusivas, um encéfalo grande encerrado numa caixa craniana e uma 
coluna vertebral; 
III – experimentos: procedimentos efetuados em animais vivos, visando 
à elucidação de fenômenos fisiológicos ou patológicos, mediante técni-
cas específicas e preestabelecidas; 
IV – morte por meios humanitários: a morte de um animal em condições 
Ainda que se possa legitimamente questionar sua aplicação, o Brasil, em tema 
de legislação ambiental, costuma acompanhar as tendências mundiais de pro-
teção. Assim, antes mesmo da Declaração Universal dos Direitos dos Animais, 
de 1978, editou a Lei nº 5.517, de 1978, pela qual foram instituídos os Conse-
lhos Federal e Regionais de Medicina Veterinária. Também são desta época as 
exigências para que apenas médicos veterinários atuassem no trato com os 
animais de laboratório. Em outras palavras, em cada biotério deve existir um 
médico veterinário responsável.
Importante
26
que envolvam, segundo as espécies, um mínimo de sofrimento físico 
ou mental.
Parágrafo único. Não se considera experimento: 
I – a profilaxia e o tratamento veterinário do animal que deles necessite; 
II – o anilhamento, a tatuagem, a marcação ou a aplicação de outro mé-
todo com finalidade de identificação do animal, desde que cause apenas 
dor ou aflição momentânea ou dano passageiro; 
III – as intervenções não experimentais relacionadas às práticas 
agropecuárias.
Também podemos destacar a Lei nº 11.105, de 2005 (Lei de Biossegurança), que esta-
belece regras para o uso de Organismos Geneticamente Modificados, o que inclui os 
animais geneticamente modificados (AnGM). 
A Lei nº 9.605, de 1998 (Lei de Crimes Ambientais), em seu art. 32, prevê pena de deten-
ção para quem pratica ato de abuso, maus-tratos, fere ou mutila animais silvestres, do-
mésticos ou domesticados, nativos ou exóticos. Também nesse artigo está determinado 
que: “Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal 
vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.” 
Finalizando, é possível afirmar que a legislação brasileira estabeleceu especial proteção 
aos animais das espécies classificadas como filo Chordata, subfilo Vertebrata, mas não 
a todas as espécies. Tem se fortalecido no Brasil a tendência de inserir os animais em 
uma comunidade moral, já que eles são capazes de sofrer, de sentir dor, angústia, alegria, 
prazer e medo. Atualmente existem projetos legislativos que pretendem inclusive alterar 
o status jurídicodos animais, passando-o de semoventes (coisa que se move de maneira 
autônoma) para a de sujeitos de direitos despersonalizados. Somente décadas depois as 
pesquisas com animais tendem a caminhar para a observância dos três Rs das pesqui-
sas envolvendo animais, propostos por Russell e Burch. 
27
Direitos da personalidade, bioética e 
biodireito 
A todo ser humano é conferido um conjunto de poderes e prerrogativas para integrar 
relações jurídicas. A esses poderes e prerrogativas dá-se o nome de personalidade. É 
frequente ouvirmos as expressões pessoa física e pessoa jurídica. Aqui, empregaremos 
a expressão pessoa natural — prevista no Código Civil —, que equivale à terminologia 
pessoa física, utilizada no Código Tributário Nacional. Não é nosso foco de estudo a 
pessoa jurídica.
Os direitos da personalidade estão relacionados com a aptidão própria de cada ser hu-
mano para a aquisição de deveres, assim como para o exercício de direitos em nome pró-
prio ou em favor de outros. A ordem jurídica outorga essas prerrogativas a uma espécie 
de indivíduo — o ser humano —, que é, portanto, a pessoa natural. Os direitos da persona-
lidade estão previstos expressamente nos arts. 11 a 21 do Código Civil (Lei nº 10.406, de 
2002) e têm natureza de direitos subjetivos oponíveis contra todos. 
Os Direitos da Personalidade são direitos subjetivos oponíveis contra todos e aplicáveis 
afeitos às relações privados ou públicas, não se confundindo com os Direitos Humanos. 
Esses últimos predominam nas relações de poder desigual e institucionalizadas. Nessas 
relações de poder desigual e institucionalizadas podem figurar questões de direitos da 
personalidade, razão pela qual podemos afirmar que os Direitos Humanos são gênero do 
qual os Direitos da Personalidade são espécie. 
Pessoa natural é todo ser humano. Independentemente de qualquer outra ca-
racterística, todo ser humano é pessoa, isto é, possui aptidão para ser titular de 
direitos e contrair obrigações na ordem jurídica, sem discriminação de qualquer 
natureza, seja ela física, racial, étnica, sexual, filosófica, religiosa ou de qualquer 
outra espécie. 
Importante
28
Sabendo que os direitos da personalidade têm natureza de direitos subjetivos oponíveis 
contra todos, podemos ainda atribuir-lhes as seguintes características, sem exclusão 
de outras: 
a) Indisponíveis: não podem ser transferidos a outrem, quer a título oneroso ou a 
título gratuito.
b) Imprescritíveis: não se perdem por decurso de prazo.
c) Inatos: no momento da concepção são adquiridos e só se extinguem no momen-
to da morte.
d) Absolutos: podem ser opostos contra todos.
e) Irrenunciáveis: já que não é possível deixar de tê-los nem mesmo por vontade 
própria.
f) Inestimáveis: uma vez que a eles não é possível atribuir qualquer valor econômico.
g) Intransmissíveis: não podem ser repassados a outrem, nem mesmo mediante 
manifestação de vontade de seu titular.
Entre os direitos da personalidade podemos citar os direitos à vida, à liberdade, ao corpo, 
à integridade física, à integridade moral, à integridade intelectual, à honra, à imagem, ao 
nome, à intimidade, à privacidade, entre outros. Esses direitos estão protegidos não só na 
esfera cível, mas igualmente nas esferas penal e administrativa. 
No exercício dos direitos da personalidade surgem vários problemas bioéticos que preci-
sam ser ou estão regulados pelo biodireito. Vejamos alguns exemplos: 
Direito à vida: envolve diversos fenômenos biológicos eticamente controvertidos, tais 
como o momento da concepção, direitos do embrião, direitos do nascituro e do concep-
turo, aborto (da perspectiva do feto), prolongamento da vida e direito à morte. 
Direito ao corpo: direito a identidade genética, a direitos reprodutivos, a aborto (da pers-
pectiva da mulher), a células germinativas, a identidade de gênero e a cirurgia de trans-
Quando afirmamos que os direitos da personalidade são oponíveis contra to-
dos, referimo-nos às relações jurídicas absolutas. Cada um de nós pode exigir, 
de toda a humanidade, a observância dos nossos direitos subjetivos à imagem, 
à honra, ao nome, entre outros. 
Ampliando o foco
29
genitalização, a atendimento médico e acesso a técnicas de saúde, reprodução assistida, 
cessão temporária de útero, transfusão de sangue e a transplante, a sepulcro, entre outros.
Em tema de direito ao corpo, o Código Civil (Lei nº 10.406, de 2002) estabelece algumas 
proibições, tais como: 
a) Vedação ao ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição per-
manente da integridade física ou contrariar os bons costumes, exceto para fins de 
transplante (art. 13). 
b) Admite, entretanto, a disposição do próprio corpo para depois da morte, desde 
que os fins sejam altruístas (art. 14). 
c) Veda, expressamente, a imposição de tratamento obrigatório com risco de vida, 
de tratamento médico ou intervenção cirúrgica a toda e qualquer pessoa (art. 15).
Dadas as rápidas e constantes mudanças na sociedade, as questões bioéticas depen-
dentes de estudo e regulamentação pelo biodireito, aumentam constante e rapidamente, 
tornando necessárias respostas jurídicas capazes de preservar os primados constitucio-
nais que venham a salvaguardar a dignidade humana. Nesse contexto, por exemplo, não 
se admitem certas práticas, tais como experimentos científicos não consentidos, venda 
de órgãos humanos e transfusão de sangue mediante pagamento. 
Há outras questões ainda não suficientemente claras, que causam dúvidas sobre as 
formas mais adequadas de agir. Assim, por exemplo, para que se saiba o verdadeiro 
momento em que se inicia a vida precisamos responder se o embrião pode ser equipa-
rado ao nascituro, a fim de que tenha seus direitos postos a salvo, conforme previsão 
do Código Civil:
Art. 2º - A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com 
vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.
Ainda sobre os aspectos biológicos do embrião, para o biodireito é relevante saber se a 
condição de embrião se atribui pura e simplesmente por potencial carga genética ou se, 
para que obtenha o status de embrião, é indispensável que seja implantado no útero. 
Percebe-se que o biodireito atua para assimilação jurídica dos fenômenos biológi-
cos e para normatizar, com estudos e opções legislativas, o que é problematizado 
na bioética.
30
Assim, apenas para que fique clara a relação entre os direitos da personalidade, a bioética 
e o biodireito, vamos tomar como exemplo o direito à identidade genética: cada pessoa 
possui um patrimônio genético único e este faz parte do direito ao corpo, frequentemente 
chamado de direito à identidade genética. Diante de riscos acarretados por manipulação 
genética — entre os quais a possibilidade de criação de seres humanos idênticos ou a 
obtenção de seres híbridos após a mistura de material genético —, é eticamente neces-
sário conter o poder das técnicas de manipulação genética sobre a vida humana. Em 
outras palavras, em biodireito, o biopoder encontra seus limites jurídicos anteriormente 
problematizados pela bioética. 
31
Para ampliar seu conhecimento veja o material complementar da Unidade 1, 
disponível na midiateca.
MIDIATECA
A paciente Maria foi levada ao hospital ABC após ser atingida na cabeça por 
uma bala proveniente de arma de fogo, enquanto trafegava de carro por deter-
minada via pública. Verificado traumatismo cranioencefálico (TCE), a cirurgia 
é o procedimento médico necessário e urgente para a preservação da vida da 
paciente. A equipe médica não consegue contato com a família de Maria. 
Diante da situação, sabendo da necessidade de observar o princípio da autono-
mia da paciente, qual deve ser o procedimento da equipe? 
Observe que os princípios são normas jurídicas abertas que admitem ponde-
ração em casos concretos. Nesta hipótese, é possível mitigar a aplicação do 
princípio da autonomia de maneira a conferir prevalência aos princípios da sa-
cralidade da vida e da beneficência. Aqui, a simples aplicaçãodo princípio da 
autonomia levaria a paciente a óbito, dada a falta de contato com a família e ao 
seu estado de inconsciência. 
NA PRÁTICA
32
Resumo da Unidade 1
Iniciando o estudo da Bioética foi possível perceber suas relações e diferenças com o 
Biodireito e a Biotecnologia, bem como a importância da ética e da moral no desenvolvi-
mento desses estudos. Identificamos, assim, que a bioética atua sobre as questões em 
relação às quais não existe consenso moral, no âmbito das ciências da vida e da saúde. 
Essa falta de consenso se reflete, por exemplo, em experimentos científicos com seres 
vivos e na história da regulamentação dessas experiências, desde as barbáries cometi-
das em nome do conhecimento científico, até a consciência da necessidade de imposi-
ção de limites. Esses limites são postos pelo biodireito, que, após a problematização da 
bioética, traça as linhas demarcatórias entre o lícito e o ilícito a partir da norma jurídica. 
33
Referências 
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9788502208292. Minha biblioteca. 
BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 
Brasília, DF: Presidência da República [2016]. Disponível em: Constituição (planalto.gov.br). 
Acesso em: 10 maio 2021. 
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 
5.517, de 23 de outubro de 1968. Dispõe sobre o exercício da profissão de médico-ve-
terinário e cria os Conselhos Federal e Regionais de Medicina Veterinária. Brasília, DF: 
Presidência da República, 23 out. 1968. Disponível em: L5517 (planalto.gov.br). Acesso 
em: 15 maio 2021. 
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 
6.638, de 8 de maio de 1979. Brasília, DF: Presidência da República, 8 maio 1979. Estabe-
lece normas para a prática científica da vivissecção de animais e determina outras provi-
dências. REVOGADA PELA LEI Nº 11.794, de 8/10/2008. Disponível em: L6638 (planalto.
gov.br). Acesso em: 15 maio 2021. 
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 
9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e administrativas de-
rivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências. Bra-
sília, DF: Presidência da República, 12 fev. 1998. Disponível em: L9605 (planalto.gov.br). 
Acesso em: 18 maio 2021. 
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei 
nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF: Presidência da 
República, 10 jan. 2002. Disponível em: L10406compilada (planalto.gov.br). Acesso em: 
18 maio 2021. 
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 
11.105, de 24 de março de 2005. Regulamenta os incisos II, IV e V do § 1º do art. 225 
da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscaliza-
ção de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus 
derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5517.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/l6638.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/l6638.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9605.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm
34
Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de Bios-
segurança – PNB, revoga a Lei nº 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória nº 
2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10 e 16 da Lei nº 10.814, de 
15 de dezembro de 2003, e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, 
24 mar. 2005. Disponível em: Lei nº 11.105 (planalto.gov.br). Acesso em: 18 maio 2021. 
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 
11.794, de 8 de outubro de 2008. Regulamenta o inciso VII do § 1o do art. 225 da Cons-
tituição Federal, estabelecendo procedimentos para o uso científico de animais; revoga a 
Lei no 6.638, de 8 de maio de 1979; e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da 
República, 8 out. 2008. Disponível em: L11794 (planalto.gov.br). Acesso em: 15 maio 2021.
CAMILLO, C. E. N.; SILVA, P. F. D.; ROCHA, R. D.; CAMPATO, R. F. Biodireito, Bioética e 
Filosofia em Debate. São Paulo: Almedina, 2020. ISBN: 9786556271118. Minha Biblioteca.
MALUF, A. C. R.F. D. Curso de bioética e biodireito. 4. ed. São Paulo: Almedina, 2020. 
ISBN: 9786556270302. Minha Biblioteca. 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11105.htm
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11794.htm
Vida, identidade e morte em seus 
aspectos controversos
UNIDADE 2
36
Compreender a vida, seu início, seu curso e seu fim é muito mais do que entender aspec-
tos puramente biológicos. Entender as divergências sobre o começo da vida e a natureza 
jurídica do embrião in vitro, por exemplo, significa dispensar atenção a uma problemática 
presente na realidade de cada pessoa. Em outra linha de reflexão, quando o perfil psíqui-
co de um indivíduo rejeita suas características físicas, esse antagonismo pode levar à 
inaceitabilidade da própria existência humana. Portanto, os estudos sobre homossexua-
lidade, transexualidade e intersexualidade ligam-se ao próprio exercício do direito de viver 
com dignidade. No entanto, é possível ir além, questionando-se sobre a finitude da vida, 
visto que a morte, em muitos casos, significa uma existência com menos sofrimento, 
razão pela qual analisamos os dilemas bioéticos que envolvem temas como suicídio as-
sistido, eutanásia e ortotanásia, além de outros conceitos correlatos. 
INTRODUÇÃO
Nesta unidade você será capaz de:
• Detectar as diferenças entre vida e direito à vida, compreendendo ainda a iden-
tidade enquanto direito, bem como analisar as controvérsias sobre o direito 
à morte. 
OBJETIVO
37
Diferenças entre vida e Direito à vida: 
o início da vida e o começo do direito à 
vida. O embrião in vitro. Biossegurança, 
investigação e terapia com células-mãe 
embrionárias
Sem adentrarmos em aspectos muito específicos das ciências biológicas, podemos 
considerar que a vida é a qualidade que distingue um indivíduo por sua capacidade de 
realizar determinadas funcionalidades, entre as quais metabolismo, crescimento e repro-
dução. Também é possível dizer que é algo próprio de certos organismos, cuja existência 
começa a evoluir a partir do nascimento e termina com a morte. Claro que essas noções 
são superficiais e a conceituação da vida é muito mais complexa, todavia ela vale como 
auxílio para o nosso estudo.
A vida, valor supremo da humanidade, é a condição necessária para a existência dos 
demais direitos. Equivale a dizer que de nada serviriam, por exemplo, os direitos de liber-
dade, igualdade e solidariedade se o direito à vida não precedesse todos eles. Dito de 
outra forma, é da proteção da vida que decorrem os demais direitos. Seriam vida e direito 
à vida expressões sinônimas? São noções interdependentes e indissociáveis, porém para 
entendermos a distinção precisamos compreender que vida é conceito estudado pelas 
ciências da vida, tais como biomedicina e biologia. O direito à vida é objeto de estudo das 
ciências jurídicas. Vamos explorar suas interseções? 
O início da vida
O início da vida, isto é, quando ela começa de fato, é certamente o tema mais controverso 
no estudo de bioética. Entretanto, é fundamental sabermos quando se inicia, para que se 
estabeleça sobre ela a proteção do direito. Mesmo que certos direitos patrimoniais pos-
sam ser assegurados ao ser humano ainda não concebido (CÓDIGO CIVIL, art. 1.799), a 
regra é que a proteção do Direito se dá após o começo da vida. Como estamos diante 
de tema deveras complexo, a seguir sintetizamosas principais posições em resposta a 
essa pergunta:
Quando começa a vida?
38
Neurologicamente: a vida tem seu término quando a atividade elétrica deixa de existir no 
cérebro. Por simetria, ela se inicia quando há atividade cerebral equivalente à de um ser 
humano. Apesar de ser este o entendimento predominante no Supremo Tribunal Federal 
– STF para demarcar a posição daquela corte em relação ao aborto do feto anencefáli-
co, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 54), a data em que 
começa a atividade cerebral não traduz consenso. Há cientistas que afirmam já existirem 
esses sinais a partir da oitava semana de gestação, enquanto outros só os reconhecem 
a partir da 20ª semana de gravidez.
Na visão embriológica: é na terceira semana de gestação que a vida tem início, visto que 
só nesse período se estabelece a individualidade do novo ser. A explicação está no fato 
de que nos primeiros 12 dias após a fertilização o embrião ainda pode se dividir, originan-
do dois ou mais seres humanos. Esta é a razão pela qual em ciências médicas é admitido 
o uso da pílula do dia seguinte. 
Geneticamente: a vida começa quando óvulo e espermatozoide se unem, combinando 
seus genes, formando um novo indivíduo com um único conjunto genético. Assim, quan-
do o gameta masculino (espermatozoide) e o gameta feminino (óvulo) se unem, formam 
um zigoto, que, após algumas fases, se fixará no útero, ocorrendo a nidação, o que torna 
a vida viável.
Em uma percepção ecológica: o que determina a vida é a capacidade de sobreviver fora 
do útero. Nessa visão, um bebê prematuro, por exemplo, só é capaz de sobreviver fora 
do útero se tiver pulmões formados, sem que se possa afirmar com certeza o exato mo-
mento em que isso ocorre, estimando-se entre a 20ª e a 24ª semana de gestação. 
Metabolicamente: espermatozoides e óvulos têm vida, razão pela qual é irrelevante a 
discussão sobre o momento em que a vida começa. Sendo o desenvolvimento humano 
um processo em constante evolução, não faz sentido estabelecer um momento exato 
para seu início.
Se o tema é controverso em ciência, em religiões não é diferente. A Igreja Católica assim 
como parte dos cristãos protestantes, por exemplo, prega o entendimento de que a vida 
humana começa no momento da fertilização, isto é, quando óvulo e espermatozoide se 
encontram, originando um novo indivíduo. Diferentemente, para os judeus a vida começa 
no 40º dia, quando se crê que o feto passa a ter formas humanas definidas. Já na per-
cepção espírita, a vida se produz por meio da ação de um ser divino, portanto imaterial, 
sobre a matéria, estabelecendo-se laços entre corpo e alma já na fecundação, entretanto 
essa união somente se conclui quando do nascimento. Se pensarmos no budismo, no 
39
hinduísmo, no islamismo, entre outras doutrinas, perceberemos diversas outras crenças, 
que variam de acordo com cada visão de mundo.
Esses debates sobre o começo da vida têm um ponto de convergência: não há como 
negar que óvulo e espermatozoide são células vivas, porém até aqui existe vida, mas 
não existe vida humana. Então, a discussão não é propriamente sobre quando a vida 
se inicia, mas até que momento é moralmente legítimo interromper a existência iniciada 
com a fecundação. Em outras palavras, o que importa é saber quando a vida humana 
passa a ter significado moral.
Direito à vida
A vida é direito previsto em inúmeros documentos jurídicos, tais como A declaração Uni-
versal dos Direitos Humanos de 1948, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e 
Políticos de 1966 e a Constituição Federal de 1988. Integra o rol dos Direitos Humanos 
de primeira dimensão e o elenco dos direitos fundamentais. É o direito que se constitui 
em condição de existência de todos os outros direitos da personalidade.
De acordo com a legislação em vigor no Brasil, podemos afirmar que, em regra, o Direito 
Brasileiro considera que, para fins de proteção legal, o direito à vida começa na concep-
ção, nos exatos termos do art. 2º do Código Civil: 
Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe 
a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.
Juridicamente, nascituro é o feto que está em formação no útero materno. É o ser hu-
mano que ainda nascerá. Então, é possível dizer que, em regra, no Brasil, a vida humana 
começa na concepção, assim entendida como a fecundação do óvulo pelo espermato-
zoide, sendo irrelevante se de forma artificial ou natural. Para que se obtenha persona-
lidade jurídica, portanto, basta o nascimento. Ainda que o bebê sobreviva somente por 
minutos ou segundos, o nascimento com vida lhe terá assegurado todos os direitos de 
personalidade, assim como seus direitos patrimoniais.
Entre a concepção e o nascimento, o nascituro tem direito à vida, assim como a uma for-
mação protegida e saudável. Entretanto, os direitos relativos ao patrimônio somente se 
concretizam após o nascimento com vida. Essa é a interpretação mais comum do art. 2º 
do Código Civil, todavia existem três teorias sobre a personalidade jurídica do nascituro:
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Teoria natalista: afirma que a personalidade somente se verifica quando o ser humano 
nasce com vida, independentemente do tempo que permaneça vivo. Enquanto não nas-
ce, existe mera expectativa de direito em relação ao nascituro. 
Teoria concepcionista: considera que a personalidade jurídica existe desde o momento 
em que se verifica a concepção. O nascimento desempenha o papel de assegurar apti-
dão para que o novo ser humano seja titular de direitos e deveres na ordem jurídica. 
Teoria da personalidade condicional: defende que, desde a concepção, são reconhe-
cidos os seres que podem ser titulares de direitos como se já existissem. O exemplo de 
como isso ocorre na prática são os alimentos gravídicos, fixados judicialmente em fun-
ção da existência do nascituro. Dito de outra forma, uma mulher grávida pode solicitar 
pensão alimentícia em favor do nascituro a quem dará à luz, conforme previsão da Lei nº 
11.804, de 2008.
Sendo a vida um direito da personalidade, ostenta todas as características daqueles direi-
tos. Isto é, entre outras, o direito à vida apresenta:
Primariedade
Precede a todos os demais direitos, o que significa dizer que 
não há outros direitos anteriores ou superiores à vida.
Inviolabilidade
Significa que a ninguém é dado o direito de atentar contra a 
vida de outrem.
Indisponibilidade
Não é possível dispor da vida, nem da própria, nem da vida 
alheia, razão pela qual em nosso direito não há lugar para a 
prática de eutanásia, por exemplo. 
Imprescritibilidade
A vida humana não está sujeita a término por decurso de prazo 
e a ela não se pode preestabelecer um tempo de duração. 
Personalíssimo
Só pode ser exercido por seu titular, assim como outros di-
reitos da personalidade, tais como honra, imagem, liberdade, 
entre outros.
Essencial
Sem o direito à vida não é viável o exercício de nenhum outro 
direito, conforme especificado acima.
Observando essas características, verificamos que a legislação protege igualmen-
te o direito à vida, inclusive do embrião, nos termos da Lei nº 11.105, de 2005 (Lei de 
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Biossegurança), assim como do nascituro, independentemente de anomalias genéticas 
ou deficiência congênita ou adquirida (Código Civil e Lei nº 13.146, de 2015; do idoso, Lei 
nº 10.741, de 2003; da Criança e do Adolescente Lei nº 8069 de 1990, entre outras).
A vida, portanto, é, em regra, um bem juridicamente protegido desde a concepção. 
Não obstante existirem diversas teorias sobre o começo da vida, o Direito Brasileiro aco-
lheu o entendimento de que a proteção jurídica à vida começa a partir da concepção. 
Esta opção traz certos questionamentos bioéticos, tais como as situações de embrião 
pré-implantatório e de feto anencefálico.
Para finalizar, é importante destacarmos que o direito à vida não consiste apenas na 
garantia de existência das funções vitais ou apenas o bom funcionamento do corpo hu-
mano, formado ou em gestação. O direito àvida consiste em diversos outros direitos, 
que garantem a vida em sua plenitude. Entre esses direitos estão o próprio direito de 
permanecer vivo, o direito à dignidade, à alimentação, ao mínimo existencial, à saúde, ao 
desenvolvimento físico, psíquico e intelectual, ao lazer, à felicidade, entre outros. 
Embrião in vitro
O embrião in vitro é uma realidade muito comum na rotina médica. O problema bioético 
que se coloca é: esse embrião deve ser considerado coisa, ente despersonalizado ou 
pessoa? Para responder a essa pergunta, muitos argumentos são apontados pelos de-
fensores de cada uma dessas ideias. 
Quem sustenta que o embrião in vitro pode ser considerado pessoa, assinala que ele já 
foi concebido, possuindo carga genética única, o que lhe assegura dignidade, como se 
nascituro fosse. 
Dada a ampla proteção jurídica da vida, não têm lugar pena de morte (exceto 
em casos de guerra declarada, conforme art. 5º, XLVII da Constituição Federal); 
eutanásia, aborto (exceto nas hipóteses legais), infanticídio, homicídio, suicídio 
e induzimento ao suicídio, conforme se constata pela leitura dos arts. 121 a 128 
do Código Penal. A proteção da vida, portanto, é regra que admite pouquíssi-
mas exceções, entre elas a situação em que alguém mata em legítima defesa 
ou em estado de necessidade e o aborto legal.
Importante
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Aqueles que defendem que o embrião in vitro é coisa, argumentam que se ele pode ser 
objeto de estoque, de congelamento e de utilização para fins de pesquisa, não pode ser 
considerado pessoa. Ademais, o embrião in vitro não apresenta funções cerebrais. Se a 
vida se encerra com o fim da atividade cerebral, esta também só deve ser considerada 
iniciada com a verificação das primeiras funções do cérebro. 
Os defensores da ideia de que o embrião é ente despersonalizado argumentam que, se 
implantado, dará origem a um ser humano, sendo, portanto, uma virtual pessoa. Logo, 
uma virtual pessoa não pode ser coisa. Essa ideia é reforçada pelo pensamento desen-
volvimentista, que assinala que, apesar de a fertilização firmar as bases genéticas de um 
novo ser humano, é necessária certa interação do genótipo com o ambiente. Entendendo 
pela necessidade de certo desenvolvimento do embrião, os teóricos desenvolvimentistas 
identificam o início da vida na nidação. Significa dizer que, para que o potencial genético 
de um novo indivíduo esteja atualizado, é necessária a interação com o útero.
Biossegurança, investigação e terapia com células-mãe 
embrionárias
Assim como o nascituro, o embrião pré-implantatório possui proteção legal. Aliás, não é 
unânime a existência de distinção entre o embrião pré-implantatório e o nascituro. Pré-
-implantatório seria o zigoto fora do útero, ao passo que o nascituro seria o embrião 
fixado no interior do útero. Ambos têm a possibilidade de nascer, daí porque para certos 
autores a distinção não faz sentido.
A proteção geral da Lei Civil (CÓDIGO CIVIL, art. 2º) se aplica ao embrião pré-implanta-
tório, pois este é tecido humano vivo, apresentando carga genética única, portanto, con-
cebido. Ocorre que, com o manejo das modernas técnicas de reprodução assistida, são 
produzidos embriões em excesso, resultando daí que esse excedente pode ser objeto de 
criopreservação, de destinação à pesquisa científica ou até mesmo de descarte.
Para refletir
Os debates bioéticos são muitos, notadamente quanto ao destino dos em-
briões excedentários no caso de morte dos genitores, ou quanto ao destino 
dos embriões excedentários, se houver desistência do tratamento. No entanto, 
as questões não ficam restritas a esses aspectos: ao se congelar embriões, o 
tempo máximo de congelamento é tema importante, dada a necessidade de 
manter a qualidade deles. De igual modo, a destinação dos embriões não utili-
zados também causa controvérsia. 
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Parte da disciplina desses complexos problemas está na Resolução 2.168, de 2017, do 
Conselho Federal de Medicina e na Lei de Biossegurança — Lei nº 11.105, de 2005. 
O primeiro desses dispositivos prevê a proibição do comércio de embriões e gametas, 
sendo admitida a doação; os embriões criopreservados há mais de três anos podem ser 
descartados, garantindo-se aos pacientes o direito de manifestação de vontade prévia à 
criopreservação quanto ao destino dos embriões quando houver falecimento, separação 
ou divórcio dos genitores.
O art. 5º da Lei de Biossegurança foi objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 
3.510), proposta pelo então Procurador-Geral da República, sob o argumento de que o 
dispositivo violava a garantia constitucional consistente na inviolabilidade da vida. O STF 
o entendeu constitucional, formando maioria no sentido de que as pesquisas com cé-
lulas-tronco, ao contrário de violar a garantia do direito à vida, vêm para ampliá-la, pois 
somente as células-tronco embrionárias podem se transformar em mais de 200 tipos de 
tecidos humanos, inclusive neurônios, representando possibilidade de cura para várias 
doenças. Enfrentando o problema do início da vida, afirmou que o embrião, por ainda 
não ter cérebro formado, não se equipara à pessoa natural. Segundo a maioria do STF, 
a pessoa natural e o embrião são realidades distintas, uma vez que antes da nidação 
o embrião não é pessoa e não é nascituro.
Dada sua singular importância, transcrevemos o art. 5º da Lei de Biossegurança: 
Art. 5º É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-
-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por ferti-
lização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, atendidas as 
seguintes condições:
I – Sejam embriões inviáveis; ou 
II – Sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da 
publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta 
Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de 
congelamento. 
§ 1º Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores. 
§ 2º Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa 
ou terapia com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter 
seus projetos à apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética 
em pesquisa. 
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§ 3º É vedada a comercialização do material biológico a que se refere 
este artigo e sua prática implica crime tipificado no art. 15 da Lei nº 9.434, 
de 4 de fevereiro de 1997.
A posição do STF, até hoje muito criticada, não impede que se continuem buscando 
formas de proteção ao embrião pré-implantatório. Uma dessas buscas é pela existência 
de normas que clarifiquem e regulem a adoção do embrião pré-implantatório criopre-
servado há mais de três anos e que possa vir a ser descartado, assim como a de outros 
embriões que possam vir a ter o mesmo destino. 
De tudo o que até aqui foi analisado podemos concluir que o direito à vida é tão garantido 
quanto controverso em temas como o embrião pré-implantatório. Porém, o mais contro-
vertido é o próprio início da vida. A bioética fornece os problemas, mas as soluções são 
construídas no plano do biodireito. Entretanto, nem sempre elas existem e, quando exis-
tem, nem sempre são as mais adequadas às nossas expectativas e visões de mundo. 
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Identidade de gênero: aspectos sociológicos 
e antropológicos do conceito de identidade. 
A identidade como direito. Intersexualidade/
Transexualidade, a redesignação sexual e 
direito ao nome
O tema da identidade de gênero, assim como as noções de transexualidade, interse-
xualidade e homossexualidade são fortemente marcadas por preconceitos, estereótipos, 
tabus religiosos e muitas outras formas de resistência. Em uma abordagem bioética, 
tratamos dessa realidade sob o enfoque dos dilemas, incertezas e consequências que 
acarretam para a vida humana. Com essa finalidade, cabe analisá-las de maneira a en-
tender os questionamentos bioéticos que surgem.
Identidade
Em Sociologia e em Antropologia, apesar das divergências entre os teóricos dessas ciên-
cias, identidade significa o conjunto de características de determinadogrupo social. 
Ao se perceber parte daquele grupo por compartilhar daquelas características, diz-se 
que o indivíduo com ele se identifica, resultando daí sua identidade. Aspectos culturais, 
históricos e idiomáticos, por exemplo, podem ser determinantes para a identificação 
de alguém como pertencente a certo grupo. Daí porque se fala em identidade cultural, 
identidade política e identidade de gênero, sendo esta última a noção que nos interessa 
neste estudo.
A despeito de sua constituição biológica, um ser humano pode se identificar socialmente 
com certo gênero que não corresponde ao seu sexo biológico. Assim, não se discute, por 
exemplo, que o gênero mulher guarda correspondência com o sexo feminino. Entretanto, 
quando uma pessoa do sexo masculino, a partir de suas peculiaridades — características 
psíquicas, comportamento, visão de mundo, entre outras — se percebe parte do gênero 
mulher, temos aí um exemplo de identidade de gênero. 
O padrão de normalidade é a correspondência do sexo masculino com o homem e a 
correspondência do sexo feminino com a mulher, porém esses padrões foram estabe-
lecidos sem combinar com a diversidade humana, que a todo tempo desafia fórmulas 
rígidas e previamente estabelecidas. 
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Ao conjunto de características de natureza biológica presentes nos aparelhos reprodu-
tores feminino e masculino chama-se sexo, entretanto tal condição não é capaz de de-
terminar a identidade sexual nem a orientação sexual dos seres humanos. A identidade 
sexual se dá pelo enquadramento psíquico do indivíduo às suas características físicas, 
enquanto a orientação sexual se refere à maneira pela qual cada ser humano vive sua 
sexualidade: heterossexual, homossexual, bissexual ou assexual. 
Existem vários estudos nas áreas da genética e da embriologia procurando entender os 
aspectos biológicos da homossexualidade e até da transexualidade. A descrição desses 
estudos nos afastaria muito dos temas bioéticos, razão pela qual vamos nos ater, predo-
minantemente, aos aspectos sociais de cada uma dessas realidades. 
Homossexualidade
Costuma-se atribuir ao homossexual certa variação da afetividade e do impulso sexual. 
Socialmente, deve ser entendida como um comportamento sexual, tal qual a heterosse-
xualidade. Afirmar que se trata de uma escolha mostra-se controverso, pois, assim como 
ocorre com os heterossexuais, o indivíduo homossexual descobre sua sexualidade ao 
longo de seu desenvolvimento. Evidentemente que, assim como a heterossexualidade 
tem causas, a homossexualidade também as possui, sendo comum associá-la a ques-
tões hormonais, genéticas, psicológicas e ambientais, entre outras. 
Sua proteção jurídica está presente em diversos dispositivos legais, notadamente no art. 
3º da Constituição da República Federativa do Brasil. São titulares de todos os direitos 
da personalidade e de todos os direitos inerentes à pessoa humana, entretanto certos 
direitos ainda precisam ser declarados. Foi o que aconteceu no julgamento da Ação Di-
reta de Inconstitucionalidade (ADI 4.277) e da Arguição de Descumprimento de Preceito 
Fundamental (ADPF 132) pelo STF em maio de 2011. 
Aquela corte, por unanimidade, reconheceu como entidade familiar a união estável entre 
pessoas do mesmo sexo. O entendimento foi no sentido de que qualquer interpretação 
dada ao art. 1.723 do Código Civil, que impeça o reconhecimento da união entre pes-
soas do mesmo sexo como entidade familiar, afigura-se inconstitucional, contrária ao 
art. 3º IV, da Constituição, que proíbe expressamente qualquer discriminação por motivo 
de sexo. O Superior Tribunal de Justiça – STJ foi além e autorizou, posteriormente, o ca-
samento de duas mulheres. 
Tais decisões marcaram importante e decisiva mudança no direito à constituição de fa-
mília por pessoas homossexuais. Conferindo eficácia documental ao que fora decidido 
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pelas cortes superiores, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ publicou a Resolução 
nº 175, de 2013, que determina a todos os cartórios o registro do casamento civil entre 
pessoas do mesmo sexo, garantindo também a conversão das uniões estáveis em casa-
mento, sempre que requerida pelos interessados. 
Problemas que se colocam frequentemente são a possibilidade de adoção de menores 
por casais homossexuais e seu acesso às técnicas de reprodução assistida. O primei-
ro parece muito mais uma solução do ponto de vista da criança, visto que não faltam 
menores aguardando adoção. No segundo caso, o Conselho Federal de Medicina — 
CFM publicou a Resolução nº 2.168, permitindo acesso dessas famílias a técnicas de 
reprodução assistida.
Transexualidade
Dá-se a transexualidade quando certo ser humano apresenta perfil psíquico que o torna 
convicto de que pertence ao sexo biologicamente oposto ao seu sexo de origem. Portan-
to, o que primeiramente sobressai é o aspecto psíquico. Dadas as convenções sociais, as 
resistências alheias e os padrões preestabelecidos, a transexualidade costuma demandar 
um processo de autocompreensão e aceitação. Entretanto, nesse processo, o tratamento 
psicológico, isoladamente, com frequência se mostra ineficaz, podendo ser necessárias 
outras terapias, tais como tratamentos com hormônios e cirurgia de transgenitalização.
A cirurgia de transgenitalização foi amparada pela primeira vez no Brasil por meio da 
Resolução nº 1.492, de 1997, do Conselho Federal de Medicina. Até então, a cirurgia e 
outros procedimentos correlatos eram tidos como contrários à ética médica, sujeitando 
o profissional a sanções administrativas e até criminais, visto que a operação chegou a 
ser vista como forma de mutilação humana, o que caracterizaria delito de lesão corporal, 
previsto no art. 129 do Código Penal. Em substituição à Resolução 1.492, de 1997, em 
2002 foi publicada a Resolução nº 1.652 e, em 2010, a matéria passou a ser regulamen-
tada pela Resolução nº 1.955, de 2010, do Conselho Federal de Medicina, atualmente em 
vigor. Ao longo do tempo ocorreram ampliações nos direitos previstos e mudanças nas 
orientações terapêuticas. 
Nos termos da referida Resolução nº 1.955, de 2010 do Conselho Federal de Medicina, 
podem se submeter à cirurgia pessoas maiores e capazes, desde que não se adequem 
a seu sexo biológico e tenham sido submetidas a terapia por pelo menos dois anos, es-
tejam recebendo acompanhamento por equipe multidisciplinar, quando então, antes da 
intervenção cirúrgica, convivem como se do sexo oposto fossem, apresentando desejo 
de eliminar a genitália externa, bem como a vontade de perder os caracteres do sexo 
originário para obter aqueles do outro sexo. 
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Exige-se ainda a verificação de permanente distúrbio de identidade sexual por pelo me-
nos dois anos. O paciente não deve contar com outros distúrbios mentais, já que também 
se exige um termo de consentimento livre e esclarecido para que a cirurgia ocorra. Sua 
realização se dá em hospitais universitários ou hospitais públicos que estejam aptos para 
a realização de pesquisas científicas. É altamente recomendável que o acompanhamen-
to psicológico prossiga após a cirurgia, uma vez que a adaptação ao novo sexo, assim 
como a própria aceitação social, não se dá automaticamente com a redesignação sexual.
Não há uma regra que estabeleça qual é o melhor momento para a realização da cirurgia 
de redesignação sexual. Antes da cirurgia de mudança de sexo é necessário tratamento 
psicológico, depois tratamento clínico com hormônios, de maneira que o paciente adqui-
ra, gradativamente, as características do sexo pretendido. Plásticas são feitas nas faces, 
no nariz e nas mamas. Quanto à cirurgia de transgenitalização propriamente dita, com 
vistas à alteração do sexo masculino para o feminino, removem-se os testículos e o teci-
do peniano interno, realizando-se uma abertura no interior do períneo, que passa a fun-
cionar como vagina, revestida com o tecido que restou da remoção do pênis. O escroto 
vazio é empregado para a remodelação dos lábios vaginais. Já a cirurgia de mulher para 
homem se faz removendo-se

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