Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
UNIVERSIDADE FEDERAL DOS VALES DO JEQUITINHONHA E MUCURI FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS E EXATAS CURSO DE GRADUAÇÃO EM MATEMÁTICA EDUCAÇÃO DE SURDOS: Uso de recursos didáticos alternativos para o ensino de conceitos matemáticos. Diego Gomes Monteiro Teófilo Otoni 2013 UNIVERSIDADE FEDERAL DOS VALES DO JEQUITINHONHA E MUCURI FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS E EXATAS EDUCAÇÃO DE SURDOS: Uso de recursos didáticos alternativos para o ensino de conceitos matemáticos. Diego Gomes Monteiro Orientador: Clodoaldo Teodosio Santana da Silva Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Matemática, como parte dos requisitos exigidos para a conclusão do curso. Teófilo Otoni 2013 EDUCAÇÃO DE SURDOS: Uso de recursos didáticos alternativos para o ensino de conceitos matemáticos. Diego Gomes Monteiro Orientador: Clodoaldo Teodosio Santana da Silva Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Matemática, como parte dos requisitos exigidos para a conclusão do curso. APROVADO em 17/09/2013 __________________________________________________ Prof. Dr. Wederson Marcos Alves - UFVJM __________________________________________________ Prof. Esp. Greyd Cardoso Mattos - UFVJM __________________________________________________ Prof. MSc. Clodoaldo Teodosio Santana da Silva – UFVJM RESUMO O sistema educacional brasileiro está em constante evolução no processo de inclusão dos alunos surdos nas escolas regulares de ensino. Diante dessa realidade, há necessidade de preparação do corpo docente das instituições de ensino para atendimento destes, devido às diversidades da cultura surda, dentre estas pode-se destacar a aquisição de uma linguagem materna visual-motora, a Língua Brasileira de Sinais, que se difere da língua dos ouvintes. Então, as metodologias de ensino, devem ser adequadas para atendimento a todos os alunos sem nenhuma distinção, ou seja, de forma inclusiva. As pesquisas sobre surdez e educação de surdos ainda são recentes, alguns deles voltados para a temática da cultura surda, porém pouca bibliografia descreve sobre o repensar da prática docente propondo sequências didáticas indicadas para o ensino de conceitos matemáticos a alunos surdos, na qual foi o objetivo deste trabalho. Após estudos bibliográficos na área da surdez e sua cultura, educação e tendências para o ensino de Matemática, foi proposto três sequências didáticas em que a primeira objetiva-se o ensino de representação em plano cartesiano através do jogo Batalha Naval; a segunda e terceira atividades utiliza-se o software GeoGebra para o ensino do conceito de Função Afim e demonstração do coeficiente angular, respectivamente. As propostas de ensino visam proporcionar, aos alunos surdos usuários da língua de sinais, estudantes do primeiro ano do ensino médio, a aprendizagem dos conceitos abordados numa perspectiva lúdica e interativa, reduzindo a oralidade do professor na sala de aula e em contrapartida aumentando a participação dos alunos que, envolvidos nas atividades orientadas pelo professor, tornam-se protagonistas em seu processo de aprendizagem. Palavras-chave: Inclusão, Surdos, Propostas de Ensino, Matemática. ABSTRACT The Brazilian educational system is constantly improving the process of inclusion of deaf students in regular schools. In this scenery is necessary to prepare the masters of educational institutions to face this perspective, for the diversity that deaf culture has, among these may be noted the acquisition of a visual-motor native language, the Brazilian Signs Language, which differs from the language of listeners. So, the teaching methodologies should be appropriate to serve all students without discrimination, in other words, including. The researches on deafness and deaf education are still recent, some of them bringing the issue of deaf culture, but little literature describes about the rethinking of teaching practice proposing didactic sequences indicated for teaching mathematical concepts to deaf students, which was the objective of this work. After bibliographical studies in the field of deafness and its culture, education and trends in the mathematics teaching, was proposed three didactic sequences and the first objective is the teaching of representation on Cartesian plane through the game Battleship; the second and third activities use the software GeoGebra to teach the concept of function in order and demonstration of the angle coefficient, respectively. The proposals aim to provide education for the deaf students users of signs language, in the first year of high school, learning the pointed concepts in a fun and interactive perspective, reducing the teacher orality in the classroom and increasing the participation of students, involved in activities directed by the teacher, becoming protagonists in their learning process. Keywords: Inclusion, Deaf, Education Proposals, Math. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1: TABULEIRO BATALHA NAVAL ............................................................... 27 Figura 2: PEÇAS ............................................................................................................ 27 Figura 3: TELA INICIAL DO GEOGEBRA ................................................................. 29 Figura 4: CORRIDA DE TÁXI ...................................................................................... 30 Figura 5: AJUSTES DA TELA GEOMÉTRICA ........................................................... 31 Figura 6: GRÁFICO DA FUNÇÃO y = x + 3 ............................................................... 32 Figura 7: CONTROLES DESLIZANTES E FUNÇÃO y = a*x + b ............................. 34 Figura 8: CONSTRUÇÃO DAS RETAS PARALELAS ............................................... 35 Figura 9: CONSTRUÇÃO DO TRIÂNGULO RETÂNGULO ..................................... 35 Figura 10: DETERMINAÇÃO DO COMPRIMENTO DOS CATETOS ..................... 36 Figura 11: MOVIMENTAÇÃO DOS CONTROLES DESLIZANTES ........................ 37 Figura 12: ZOOM DA CONSTRUÇÃO ........................................................................ 37 file:///C:/Users/DIEGO/Desktop/TCC%20Diego-27.08.13.docx%23_Toc365717566 file:///C:/Users/DIEGO/Desktop/TCC%20Diego-27.08.13.docx%23_Toc365717567 file:///C:/Users/DIEGO/Desktop/TCC%20Diego-27.08.13.docx%23_Toc365717570 file:///C:/Users/DIEGO/Desktop/TCC%20Diego-27.08.13.docx%23_Toc365717571 file:///C:/Users/DIEGO/Desktop/TCC%20Diego-27.08.13.docx%23_Toc365717572 file:///C:/Users/DIEGO/Desktop/TCC%20Diego-27.08.13.docx%23_Toc365717573 file:///C:/Users/DIEGO/Desktop/TCC%20Diego-27.08.13.docx%23_Toc365717574 file:///C:/Users/DIEGO/Desktop/TCC%20Diego-27.08.13.docx%23_Toc365717575 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 7 2. A MATEMÁTICA PARA SURDOS ........................................................................ 9 2.1 A IDENTIDADE SURDA E SEU CONTEXTO HISTÓRICO-SOCIAL ............. 9 2.1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS ...................... 9 2.1.2 LIBRAS NO ENSINO BILÍNGUE ............................................................... 11 2.1.3 IDENTIDADES SURDAS: ASPECTOS GERAIS ....................................... 13 2.1.4 A SURDEZ NA POLÍTICA EDUCACIONAL ............................................ 16 2.2 EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PARA ENSINO MÉDIO ................................... 18 2.2.1 ABORDAGENS DA MATEMÁTICA NO PCN PARA ENSINO MÉDIO . 18 2.2.2 ANÁLISE DO LIVRO DIDÁTICO .............................................................. 21 2.2.3 TENDÊNCIA PARA O ENSINO DE MATEMÁTICA ............................... 233. IDÉIAS DE ATIVIDADES PARA ENSINO DE FUNÇÃO AFIM A ALUNOS SURDOS ........................................................................................................................ 26 3.1 ATIVIDADES A SEREM DESENVOLVIDAS .................................................. 26 3.2 ANÁLISE TEÓRICA SOBRE AS ATIVIDADES PROPOSTAS ...................... 38 4. CONCLUSÃO ........................................................................................................... 40 REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 42 7 1. INTRODUÇÃO O processo de inclusão social dos surdos decorre da sua inserção no ambiente escolar, que tem sido alvo de discussão em todo o país, após a iniciativa de ofertar o ensino básico a estes alunos nas escolas regulares de ensino. Esta premissa, vem acabando com os paradigmas de séculos atrás em que os surdos eram marginalizados e classificados como castigados pelos Deuses. Skliar (2013) relata o registro desse sofrimento na história. O mito de que a norma para os seres humanos consiste em falar e ouvir leva a olhar para o surdo e dizer que ele é um selvagem. O pressuposto normalmente aceito é a normalização do corpo. E esta normalização do corpo evoca o sofrimento do surdo e está registrada na história. (SKLIAR, 2013, p. 68) Esse pensamento excludente está sendo cessado e os surdos brasileiros começaram a conquistar os seus direitos através da oficialização da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS fazendo com que as propostas de ensino sejam repensadas a fim de atender satisfatoriamente tanto a alunos ouvintes, quanto aos surdos. Contudo, para a adequação das aulas, o docente deve estar preparado para reduzir a sua oralidade em sala de aula, promovendo uma maior participação e discussão dos alunos sobre o conceito estudado, apresentado de forma articulada, com o intuito de que a aprendizagem aconteça através das inferências da turma sobre o conteúdo matemático abordado. O professor ainda precisa ter conhecimento da cultura surda e pensar no surdo, para que as diferenças culturais e de comunicação existentes entre surdos e ouvintes sejam levadas em consideração no planejamento das suas aulas, atendendo de forma satisfatória a toda classe. A temática deste trabalho foi induzida considerando a afirmação de Junior e Ramos (2008) que diz: “Muitas Pesquisas no ensino de alunos surdos concentram-se na identidade e cultura surda. Pouco se enfatiza sobre modos recomendáveis para o professor interagir com esse tipo de aluno, principalmente no ensino da Matemática”. 8 Partindo desse pressuposto é que se instigou a realização dessa pesquisa e a propor sequências didáticas no ensino de conceitos matemáticos para alunos surdos. A pesquisa desenvolvida é direcionada a professores, discentes de cursos de licenciatura e demais estudiosos do tema. As propostas de ensino que serão apresentadas têm a sua aplicação destinada a alunos surdos usuários da língua de sinais e/ou ouvintes do 1º ano do Ensino Médio das escolas de ensino regular, por se tratar de conceitos relacionados à representação em plano cartesiano e Função Afim, que geralmente são ensinados nesta série. Através das pesquisas bibliográficas, verifica-se que o ensino através de situações-problemas, jogos e a utilização de softwares matemáticos, torna favorável a aprendizagem de todos os alunos, independente das suas particularidades, sendo assim, justifica-se a utilização desses recursos nas sequências didáticas elaboradas. Como aporte teórico para estruturar a proposta de ensino, foram realizados estudos relacionados à identidade e contexto histórico-cultural dos surdos, Parâmetros Curriculares Nacionais e tendências para o ensino de matemática, distribuídos na seção 2 conforme a seguir. 9 2. A MATEMÁTICA PARA SURDOS 2.1 A IDENTIDADE SURDA E SEU CONTEXTO HISTÓRICO-SOCIAL 2.1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA EDUCAÇÃO DOS SURDOS Para tratar da evolução histórica da educação dos surdos, antes deve ser analisada a forma como a surdez era caracterizada na antiguidade, momento histórico em que a anormalidade no ser humano era muitas vezes evidenciada como “castigo dos Deuses”, como apresenta Goldfeld (2001): A ideia que a sociedade fazia sobre os surdos, no decorrer da história, geralmente apresentava aspectos negativos. Na antiguidade os surdos foram percebidos de formas variadas: com piedade e compaixão, como pessoas castigadas pelos deuses ou como pessoas enfeitiçadas, e por isso eram abandonados ou sacrificados. (GOLDFELD, 2001, p.27) Percebe-se então, que o preconceito com o surdo já existia desde a antiguidade, o tratamento da falta total ou parcial do sentido da audição há muito tempo foi encarada como uma deficiência, ocasionando em desprezo para com esse grupo de pessoas pelo simples fato de necessitarem de uma forma de linguagem diferenciada para se comunicarem com a sociedade ouvinte, ou seja, via língua de sinais. Segundo Skliar (2013), os surdos não querem ser chamados de “deficientes” não por negarem delirantemente a surdez, mas por resolverem sua impossibilidade de aprender auditivamente o mundo por meio de uma leitura visual do mesmo. Nesta perspectiva, a surdez não deve ser avaliada como uma deficiência, pois essas pessoas não possuem impedimentos ou limitações para viver no mundo como qualquer outro cidadão. A ausência parcial ou total do sentido da audição pode ser um dificultador para a comunicação oral, porém não o impede de se comunicar de forma 10 natural com outras pessoas utilizando-se da língua de sinais, suprindo assim as dificuldades de comunicação. Através da conceituação da surdez com uma perspectiva mais inclusiva, possibilitou a saída dos surdos das suas casas indo de encontro ao mundo. A sua inserção nas escolas regulares de ensino, lugar este que era pouco frequentado por essa parcela da população, possibilitou a aprendizagem do conhecimento científico promovendo a descoberta de novos horizontes, acrescentando em seu desenvolvimento sociocultural, na sua capacidade crítica, tornando-o um cidadão capaz de lutar por seus direitos e pelo seu espaço na sociedade. Nas mesmas escolas que os ouvintes, o surdo se educa, consequentemente se torna apto para se lançar ao mercado de trabalho de forma produtiva e igualitária. A inclusão dos surdos nas escolas de ensino regular se consagrou após a oficialização da Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS através da Lei Nº 10.436, de abril de 2002, que tem em seu artigo primeiro, a seguinte redação: Art. 1 o: É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua Brasileira de Sinais - Libras e outros recursos de expressão a ela associados. Parágrafo único: Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil. (BRASIL, 2002.) A LIBRAS é reconhecida como uma língua com todas as suas especificidades, ou seja, estrutura gramatical e sistema linguístico de natureza visual-motora, onde a comunicação se dá via sinalização, expressões faciais e manuais, não dependendo da oralidade. Regulamentada essa forma de comunicação nos diversos âmbitos sociais, tanto nas escolas quanto no mercado de trabalho, a premissa da dificuldade na comunicação será superada quando a LIBRAS for adotada como disciplina obrigatória em todas as escolas, desde as séries iniciais de ensino. 11 Deve-se observar ainda que o processo de inclusão dos surdos na escola de ensino regular é relativamente recente, pois a LIBRAS foi reconhecida como língua oficial em 2002.Ainda há muitas pendências nas escolas como a qualificação de professores, bem como formação e contratação de profissionais intérpretes para atender os surdos com a total eficácia, porém pode ser considerado que o processo de inclusão está em evolução para esse objetivo. Os surdos estão em busca da conquista dos seus direitos como cidadãos, processo que já começou a partir do acesso à educação e consequentemente, o mercado de trabalho vem abrindo as portas para a aquisição desse público como colaboradores nas empresas de diversos segmentos. Assim, o sistema educacional brasileiro tem se mobilizado para possibilitar a proteção dos direitos humanos fundamentais. 2.1.2 LIBRAS NO ENSINO BILÍNGUE O ensino Bilíngue, utilizado na educação de alunos surdos nas escolas de ensino regular, compreende uma filosofia de aquisição de conhecimento fundamentada na comunicação com a utilização de duas línguas, como apresenta Goldfeld (2001): “o bilinguismo tem como pressuposto básico que o surdo deve ser bilíngue, ou seja, deva adquirir como língua materna a língua de sinais, que é considerada a língua natural dos surdos e, como segunda língua, a língua oficial de seu país”. No Brasil, portanto, o processo de educação dos surdos se dá via a Língua Brasileira de Sinais (língua materna) e a Língua Portuguesa (oficial do país). O ensino bilíngue de alfabetização de crianças surdas, nesta perspectiva, deveria ocorrer desde os anos iniciais, com a conscientização de que a primeira língua, ou seja, a língua materna deverá ser a LIBRAS, e a partir disso, o ensino de língua portuguesa como a segunda língua. Contudo, quando a família da criança surda é ouvinte, geralmente a LIBRAS é pouco utilizada na comunicação, ou até mesmo não é de conhecimento da família esta língua, sendo o surdo submetido a uma comunicação via 12 mímica em que não se tem uma estrutura gramatical e lógica (definição de um único sinal para cada ação/objeto) podendo atrapalhar o crescimento cognitivo da criança. O uso cotidiano da Língua Portuguesa pela sociedade, seja ela na modalidade escrita ou falada, faz-se necessário que o surdo tenha o domínio desta sua segunda língua, haja vista que há supremacia desta língua nos meios de comunicação e ela está presente no país em todos os âmbitos: em correspondências, placas nas ruas e rodovias, nos aparelhos televisores. Isso faz o ensino bilíngue essencial desde a alfabetização dos surdos para toda sua vida. A recomendação do MEC/SEESP é de que, em função da língua portuguesa ser, pela constituição federal, a língua oficial do Brasil, portanto língua cartorial em que se registram os compromissos, os bens, a identificação das pessoas e o próprio ensino, determina-se o uso dessa língua obrigatório nas relações sociais, culturais, econômicas (mercado nacional), jurídicas e nas instituições de ensino. Nessa perspectiva, o ensino da língua portuguesa, como segunda língua para surdos, baseia-se no fato de que esses cidadãos brasileiros, têm o direito de utilizar e aprender esta língua oficial que é tão importante para o exercício de sua cidadania. (QUADROS e SCHMIEDT, 2006, p. 17) Essa concepção abrange uma discussão que talvez possa confrontar com o atual sistema de ensino regular existente hoje no país, ou seja, a necessidade de tornar a LIBRAS uma disciplina que compõe a grade curricular nas escolas. Nesta perspectiva, Quadros e Schmiedt (2006, p. 22) defendem que: “A escola torna-se, portanto, um espaço linguístico fundamental, pois normalmente é o primeiro espaço em que a criança surda entra em contato com a língua brasileira de sinais.”. E ainda, Quadros e Schmiedt (2006, p. 20) dizem que “o processo das crianças surdas adquirindo língua de sinais ocorre em período análogo à aquisição da linguagem em crianças adquirindo uma língua oral-auditiva”. Reitera-se então a necessidade inclusão dessa língua desde os anos iniciais do ensino regular para que não somente os alunos surdos, mas sim todas as crianças, possam ter o contato e a alfabetização dessa língua analogamente ao processo de alfabetização da Língua Portuguesa. A partir desta conscientização de que a LIBRAS deva ser implementada na grade curricular das escolas, há necessidade de professores bilíngues nas salas de aula. 13 Esta preocupação já foi observada pelo governo federal, uma vez que o Decreto 5.626 de 22 de dezembro de 2005, estabelece a inclusão da LIBRAS como disciplina curricular obrigatória nos cursos de licenciatura. Se a carga horária disponibilizada nos cursos de licenciatura para tal disciplina é adequada para a efetiva preparação do docente para lidar com o ensino de surdos, esta discussão talvez possa ser alvo de estudo para futuros trabalhos, mas por ser um decreto consideravelmente novo, ainda está em fase de implantação e adequação. Esta evolução não deveria ocorrer somente no campo escolar, mas também nos veículos de comunicação como a imprensa através da presença de intérpretes nos jornais televisivos, novelas, entre outros; e ainda em instituições públicas, prestadoras de serviços. Pois Goldfeld (2001) observa que: “São raros os programas televisivos em língua de sinais, não temos intérpretes em locais necessários como hospitais, repartições públicas, etc”. O processo de inclusão está sendo realizado, mesmo sendo um processo moroso, pois abrange muitas questões e até mesmo uma mudança de cultura. Os surdos vêm conquistando a cada dia um espaço maior diante da sociedade, porém percebe-se que há muita coisa a se fazer para que essa inclusão chegue à sua excelência. 2.1.3 IDENTIDADES SURDAS: ASPECTOS GERAIS A escola recebe a cada ano um público de alunos em que tem como a principal característica a heterogeneidade do conhecimento, comportamento, cultural e atitudinal. Estes aspectos são formados diferentemente em cada indivíduo, pois são estruturados ao longo da vida considerando o contexto histórico-social, bem como suas características inatas e subjetivas. Segundo Miranda C. e Miranda T. (2011): “O ambiente escolar é composto por diversidades, logo o educador tem como função administrar a heterogeneidade e valores pessoais para promover a aprendizagem dos alunos.” Diante das diferenças, a inclusão dos surdos nas escolas de ensino regular proporciona ainda mais a heterogeneidade já existente e o educador, portanto, tem o ofício de lidar com as 14 individualidades com o propósito de conseguir aproximar ao máximo o conhecimento científico aos seus alunos. Obviamente, a diferença que se destaca com a inclusão dos alunos surdos é a própria surdez, que desafia o professor a se superar através da utilização de uma nova forma de comunicação e a percepção de algumas características similares entre os surdos. Estas características peculiares é o que define a identidade surda do indivíduo com surdez. Mas antes de falar sobre as “Identidades Surdas” é importante saber a definição e classificação da surdez. Segundo o Projeto Incluir (2006) do Governo de Minas Gerais, a surdez é a perda total ou parcial do sentido da audição, sendo classificada como surdez leve ou moderada (surdos que com o auxílio de próteses auditivas conseguem ouvir e decifrar os fonemas das palavras). Outra classificação é a surdez severa ou profunda (surdos que mesmo com o aparelho auditivo não conseguem decifrar os fonemas das palavras, ou seja, ouve somente os zumbidos). A surdez pode ser congênita ou adquirida. Observa-se que a adquirida pode ocorrer antes da aquisição da linguagem pelo indivíduo, ou pode ser pós-linguística, interferindo assim na sua identidade surda. A conceituação da Identidade Surda parte da extensão da definição da palavra Identidade aplicada às características comuns à comunidade surda. Segundo Silva (1998), “a identidade cultural ou social é o conjunto dessas características pelas quais os grupossociais se definem como grupos”. Skliar (2013) explora a temática da identidade surda dentro de quatro subgrupos, sendo elas: híbridas, de transição, incompleta e flutuante. Identidades surdas híbridas: são os surdos que tiveram a surdez adquirida pós- linguística, ou seja, tiveram a língua portuguesa como língua materna e a utilizam no processo de comunicação da seguinte forma: a captação da informação se dá através da modalidade visual via sinais devido a ausência do sentido da audição, no processo cognitivo essa informação é passada para a língua materna, interpretada e então é remodelada para a língua de sinais novamente para que o surdo se expresse. 15 Identidades surdas de transição: são os surdos que estão no momento de transição da vivência com a cultura ouvinte, ou seja, do contato hegemônico com a comunicação oralizada e passa a se reconhecer na comunidade surda através da experiência de vida com comunicação viso-manual. Essa situação ocorre nos casos em que os surdos são filhos de pais ouvintes. Identidade surda incompleta: são os surdos que não se aceitam dentro da comunidade surda, por sofrerem a hegemonia ouvintista, têm a concepção de que a cultura ouvinte é o único padrão “normal” de comunicação, assim, procuram se socializar nesta perspectiva ouvinte. Identidades surdas flutuantes: são os surdos que se definem realmente como surdos, mas não se conformam com a sua surdez, pois se acham impotentes e menosprezadas, devido ao padrão ouvinte imposto pela sociedade. Há o desejo latente de se tornar ouvinte. Não se estabilizam na comunidade ouvinte devido ao fator comunicação (ausência da audição) e nem na comunidade surda também devido à comunicação (não domina a língua de sinais). Assim, os surdos se classificam entre uma ou outra identidade e vivem conforme seus desejos e aceitações. Essa classificação é flexível, pois Skliar (2013) trata a Identidade do indivíduo como: “algo em questão, em construção, uma construção móvel que pode frequentemente ser transformada ou estar em movimento, e que empurra o sujeito em diferentes posições”. A identidade se transforma com o decorrer da vida, na qual certos valores e conceitos podem ser repensados e mudados. O professor tem que se preparar para estes novos desafios, pois a partir do conhecimento mais aprofundado sobre a cultura do surdo, suas identidades e como se dá o processo ensino-aprendizagem para esta clientela, leva ao professor a repensar a sua prática pedagógica, adequando-a para ser eficaz no processo da inclusão social dos surdos. 16 2.1.4 A SURDEZ NA POLÍTICA EDUCACIONAL A surdez é interpretada ainda por muitos grupos de pessoas: médicos, fonoaudiólogos, entre outros, como deficiência no sentido de patologia e, portanto, caracterizam os surdos como anormais ou fora dos padrões de normalidade do ser humano. Mas quem disse que existe um padrão de normalidade para o ser humano? Cada indivíduo, seja ele surdo ou ouvinte, possui as suas diferenças em relação aos outros, suas características físicas e subjetivas tornam cada ser humano único. A surdez é somente mais uma diferença existente em um grupo reduzido na sociedade civil. A surdez no âmbito educacional segundo FATEC (2013) é interpretada como: “à incapacidade da criança aprender a falar naturalmente, por via auditiva”. Porém, a comunicação da criança pode se dar através de outras formas como já foi dito. A política educacional não deve encarar a surdez como deficiência e sim como uma diferença no processo de comunicação, numa perspectiva de inclusão e aceitação dos surdos na sociedade, para que seja garantido os seus direitos como qualquer outro cidadão, pois a surdez pode ser superada através dos outros sentidos e membros do corpo. A população em massa deve refletir sobre essa temática e a escola é o ambiente propício para essa discussão, já que as concepções sobre o surdo estão sendo repensadas como cita Skliar (2013): O que estão mudando são as concepções sobre o sujeito surdo, as descrições em torno da sua língua, as definições sobre as políticas educacionais, a análise das relações de saberes e poderes entre adultos surdos e adultos ouvintes, etc. (SKLIAR, 2013, p. 7) A reforma educacional para atendimento dos surdos nas escolas de ensino regular acontece e é necessária devido às novas reflexões sobre essas concepções, mas para isso, outro aspecto também deve ser discutido, a Educação Especial. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei Nº 9.394/96, ou simplesmente LDB, explicita sobre a educação especial em seu artigo 58: “Entende-se 17 por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais”. Ou seja, a educação especial é uma modalidade de educação e que tem como público alvo portadores de necessidades especiais. Sobre a conceituação de modalidade de educação, o Grupo Positivo (2013), define como: “um conjunto de recursos educacionais e de estratégias de apoio que deve estar à disposição de todos os alunos, oferecendo diferentes alternativas de atendimento”. Os recursos educacionais e estratégias de apoio vão variar de acordo com as necessidades de cada indivíduo, seja ele: surdo, cego, deficiente físico, mental, etc. Toda essa variedade está reunida em um grupo específico chamado “portadores de necessidades especiais”. Skliar (2013), debate sobre o suposto movimento de tensão e ruptura entre a educação especial e a educação de surdo, propondo um discurso de um novo campo conceitual, os Estudos Surdos, a fim de desagrupar os “portadores de necessidades especiais” por se tratar de várias classes (cegos, surdos, etc.), cada uma com características distintas, dentro de um único grupo, que é formado por indivíduos que estão “fora dos padrões de normalidade”, são “especiais”, numa perspectiva excludente devido à questão patológica. Tal ruptura promoveria a discussão teórica específica aos Surdos, contribuindo para o ajustamento da conduta política, educacional e social no contexto da inclusão em todos os âmbitos. A designação: Portadores de Necessidades Especiais, não é tão específica a fim de identificar pela expressão o público que constitui esse grupo, mas nem deveria, devido à diversidade entre seus membros: surdos, cegos... Atualmente, a designação desse grupo foi alterada no campo educacional a partir da Lei Nº 12.796, de 4 de abril de 2013, em que altera a Lei Nº 9.394 conforme a seguinte redação: Art.58: Entende-se por educação especial, para os efeitos da Lei, a modalidade de educação escolar oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação. (BRASIL, 2013, p.2, grifo nosso) 18 Refletindo sobre a alteração da designação do público alvo da educação especial de educandos portadores de necessidades especiais para educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, observa-se que o grupo se tornou mais específico sem a retirada de nenhum componente, ou seja, houve o reenquadramento dos indivíduos que recebem a educação especial em classes patológicas. Assim, ao invés de ocorrer a divisão dos indivíduos em subprodutos da educação especial acontece o inverso, a heterogeneidade está sendo homogeneizada dentro da classe de: deficiência, transtorno global ou superdotação. Diante dessa concepção, infelizmente a surdez acaba de ser classificada como uma deficiência pelo poder público. Percebe-se, portanto, a necessidade de ruptura da educação especial em: educação de surdo e demais subprodutos, para que a partir da criação de um novo campo conceitual, Estudos Surdos, apresentado por Skliar (2013),proporcione uma consolidação de uma conceituação inclusiva da surdez. 2.2 EDUCAÇÃO MATEMÁTICA PARA ENSINO MÉDIO Nesta seção serão abordados os estudos sobre os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN, no que tangem sobre a disciplina Matemática ministrada para o Ensino Médio. Como este trabalho propõe uma sequência didática para Ensino de Função Afim a alunos surdos utilizando jogos, situação problema e informática, far-se-á necessário o estudo do PCN e também das Tendências para o ensino de Matemática na qual será abordado detalhadamente, a fim de nortear a proposta didática em sala de aula. 2.2.1 ABORDAGENS DA MATEMÁTICA NO PCN PARA ENSINO MÉDIO O PCN, documento utilizado para nortear as ações pedagógicas nas escolas de educação básica no Brasil, apresenta as habilidades e competências desejáveis para o desenvolvimento dos alunos de forma que possam estar preparados a viver em cidadania 19 possibilitando a análise crítica de informações, a discussão de ideias e estando preparado para sua inserção no mercado de trabalho. Os objetivos do Ensino Médio em cada área do conhecimento devem envolver, de forma combinada, o desenvolvimento de conhecimentos práticos, contextualizados, que respondam às necessidades da vida contemporânea, e o desenvolvimento de conhecimentos mais amplos e abstratos, que correspondam a uma cultura geral e a uma visão de mundo. (BRASIL, 2002, p. 6) Através da globalização e consequentemente da acessibilidade à informação, no cotidiano a gama de informações que direta ou indiretamente envolvem conceitos matemáticos, físicos, químicos, entre outros que o ser humano tem acesso; direciona o PCN a uma abordagem dos conceitos do currículo básico comum de forma interdisciplinar e contextualizada, ou seja, bem como os conhecimentos científicos se apresentam no dia-a-dia via meios de comunicação. A Matemática, constantemente tem a sua metodologia de ensino discutida para a sua adequação ao PCN, essa evolução no contexto didático é perceptível ao comparar os livros didáticos utilizados há alguns anos com os utilizados hoje nas escolas. Percebe-se que os exercícios do tipo calculem e resolvam estão sendo eliminados ou ajustados para uma característica mais contextualizada. Isso significa que os exercícios do tipo “calcule...”, “resolva...” devam ser eliminados, pois eles cumprem a função do aprendizado de técnicas e propriedades, mas de forma alguma são suficientes para preparar os alunos tanto para que possam continuar aprendendo, como para que construam visões de mundo abrangentes ou, ainda, para que se realizem no mundo social ou do trabalho. (BRASIL, 2002, p. 113) Isso é reflexo da visão da Matemática de forma interdisciplinar e contextualizada que dá oportunidade do aluno aprender os conceitos novos através dos conhecimentos já adquiridos no decorrer da sua vida. Possibilitando também conhecer a aplicabilidade do conceito estudado a partir da utilização de métodos de ensino pelo professor como as 20 situações problemas. Mídia informática, dentre outros recursos didáticos agregam dinâmica, interatividade e participação de todos os envolvidos, proporcionando o ensino de forma lúdica. Assim, evitam-se as aulas expositivas, intituladas como tradicional, em que se utiliza o quadro e giz para ensino de meros algoritmos e fórmulas, na qual os alunos são obrigados a decorar sem conhecerem a verdadeira essência que constitui o conteúdo. Nesta perspectiva em que o aluno é um sujeito ativo no processo de ensino- aprendizagem, ou seja, o professor dá condições para o envolvimento e participação efetiva na construção do conhecimento, o PCN (2002) aborda: “Não somente em Matemática, mas até particularmente nessa disciplina, a resolução de problemas é uma importante estratégia de ensino”. Através dessa estratégia de ensino, o aluno é levado a raciocinar, articular o seu conhecimento matemático a fim de criar hipóteses e testá-las com o objetivo de chegar à resolução, desencadeando todo um esquema de planejamento, verificação de resultados e toda uma estruturação lógica sobre a resposta apresentada. Intuitivamente na resolução do problema, o aluno passa por todas essas etapas que agregam valores para a sua vida social, pois todo dia o ser humano passa por inúmeras situações em que há necessidade de avaliações de resultados, planejamento de ações, entre outras experiências. Nesse sentido, é preciso que o aluno perceba a Matemática como um sistema de códigos e regras que a tornam uma linguagem de comunicação de ideias e permite modelar a realidade e interpretá-la. Assim, os números e a álgebra como sistemas de códigos, a geometria na leitura e interpretação do espaço, a estatística e a probabilidade na compreensão de fenômenos em universos finitos são subáreas da Matemática especialmente ligadas às aplicações. (BRASIL, 2002, p. 40) Dessa forma o aluno passa a enxergar a Matemática inserida na sua vida. Tem consciência da importância dessa disciplina para o seu desenvolvimento educacional e sócio-cultural. 21 2.2.2 ANÁLISE DO LIVRO DIDÁTICO Os livros didáticos no decorrer dos anos e através das discussões sobre a educação vêm sofrendo adaptações a fim de atenderem às orientações do PCN que trata da contextualização, interdisciplinaridade, entre outros critérios. Não menos importante, com a inclusão dos surdos no ensino regular, essas alterações se tornaram ainda mais necessárias para que a compreensão dos conceitos não seja prejudicada devido à especificidade na comunicação destas pessoas. Em análise da abordagem do conceito de Função no livro didático do ensino médio do ano 2010: Matemática Ciência e Aplicações (Iezzi, et al.), utilizado em escolas da rede pública de ensino; percebe-se que há uma introdução do conceito de função de forma intuitiva, com situações problemas do cotidiano dos alunos como: pista de ciclismo (relacionando tempo e espaço), barraca de praia (relacionando mercadoria e preço), viagem de ônibus (relacionando passageiros e preços de passagem) dentre outras situações. Há em alguns exercícios imagens ilustrativas relacionadas aos problemas, porém não são em todos. São abordadas diversas representações dos objetos matemáticos como diagramas, tabelas, gráficos. A utilização de ilustração nos exercícios favorece a interpretação dos problemas nos livros didáticos. O texto escrito pode não ser tão inteligível devido à utilização da língua portuguesa em sua modalidade escrita, ou seja, utilização da segunda língua (não materna) pelos surdos, esse fator já pode ser um dificultador para o aluno. As imagens possuem a função de auxiliar no processo cognitivo com a sua associação juntamente com o texto lido, tornando possível a interpretação do exercício. Segundo Nery e Batista (2004), “[...] é importante o uso de representações visuais como estratégia de ensino numa proposta pedagógica inclusiva, pois ela favorecerá a apropriação de significados pela criança, bem como possibilita a representação mental de experiências.”. Assim, através das imagens o aluno estabelece através da sua experiência de vida uma conexão das palavras lidas com o contexto em que elas estão inseridas no texto. 22 Ainda sobre o uso das imagens, Nery e Batista (2004) citam que: “Na linguagem verbal, a palavra possibilita a generalização e o raciocínio classificatório, e, no caso dos surdos, a representação visual poderá auxiliar nesses processos de pensamento.”. Neste contexto, a utilização de imagens nos livros didáticos, possibilita ao aluno surdo uma filtragem no significado das palavras, relacionando-as com a figura, evitando que uma palavra ou expressão seja interpretada com outro sentido que não é a intenção do autor do livro. Isso ocorre devido à Língua Portuguesa apresentar vários homônimos como, por exemplo: sede (vontade de beber)e sede (residência), podendo levar o aluno surdo a uma dificuldade de interpretação do texto. Os símbolos existentes nas notações matemáticas relacionadas ao conceito de função é um obstáculo que pode ser superado no processo de aprendizagem de alunos surdos, segundo Neves (2011): Sendo conhecedor profundo da Língua deste sujeito este profissional tem perfeitas condições de fazer a interpretação/tradução do conhecimento matemático para a Língua materna dos surdos levando em consideração um fator importantíssimo do processo, que é o fato de que esta Língua ainda está em construção, então nas situações em que um sinal precisa ser “instituído” provisoriamente só um conhecimento profundo da Língua pode auxiliar o professor a lidar com a situação sem com isso obstaculizar a aprendizagem do aluno. (NEVES, 2011, p. 9) O professor ou o intérprete deve estar preparado para interpretar símbolos matemáticos que não possuem representações visuais-gestuais específicos, portanto o domínio desta língua é importante para que a comunicação seja estabelecida de forma satisfatória e consequentemente tenha como resultado a aprendizagem do aluno surdo. Tanto os alunos ouvintes quanto os surdos convivem com a linguagem matemática e seus inúmeros símbolos, portanto não pode haver distinção no tratamento da dificuldade de aprendizagem decorrente da utilização dessa linguagem, pois os signos utilizados possuem significados que podem ser interpretados tanto para a língua portuguesa quanto para a LIBRAS. 23 Outra evolução dos livros didáticos foi a criação de livros didáticos digitais em LIBRAS que segundo o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação foram distribuídos no ano de 2007 16,5 mil exemplares para as escolas públicas que tinham alunos surdos matriculados. O material distribuído era composto de um livro impresso e um CD-ROM com o mesmo conteúdo e que a cada título possuía um ícone de uma TV, ao qual ao ser clicado, aparecia um tradutor-intérprete apresentando o assunto abordado, em LIBRAS. Essa é mais uma proposta que visa a integração do aluno surdo nas escolas regulares de ensino, garantindo assim o seu direito à educação conforme assegura a LDB. 2.2.3 TENDÊNCIA PARA O ENSINO DE MATEMÁTICA Pesquisas têm sido desenvolvidas no âmbito da Educação Matemática e recentemente literaturas foram criadas considerando não somente o conteúdo matemático, mas também as fases de desenvolvimento do ser humano e seus processos cognitivos destacados na psicologia. Aliado a isso, o próprio desenvolvimento da tecnologia e a sua adaptação nas escolas tem sido alvo de muitos pesquisadores a fim de apresentar propostas de ensino que auxiliam o processo ensino-aprendizagem entre professores e alunos. Os estudos sobre Educação Matemática têm destacado em sua vertente as Tendências para o Ensino de Matemática atualmente utilizadas no Brasil conforme David (1995) aborda: “Estamos nos referindo às seguintes tendências, que nos parecem as mais expressivas neste momento, no Brasil, e cuja aplicação em salas de aula já resultou em elaboração de diferentes relatos”. Conforme a autora são as tendências: Etnomatemática, Construtivismo, Modelagem e Resolução de Problemas. As perspectivas com o uso das tendências em sala de aula atende claramente ao instruído pelo PCN, pois segundo David (1995) são elas: 24 Supõem a participação ativa do aluno no processo de aprendizagem (a ênfase passa do ensinar para o aprender); Sugerem uma relação professor-aluno de mão dupla (em que ambos ora ensinam, ora aprendem); Buscam um sentido para o ensinar Matemática em algo que não é o conteúdo matemático em si mesmo, mas vai além dele. (DAVID, 1995, pg. 58) O sentido do ensino da Matemática através da contextualização e a concepção de que o aluno tem que ser também o protagonista do processo de ensino-aprendizagem abordado no PCN é uma reação direta do uso das tendências de ensino. Como este trabalho tem como proposta a apresentação de uma sequência didática elaborada com o conceito de Função Afim, optou-se por utilizar as Tendências para o Ensino de Matemática a alunos surdos devido aos fatores que podem auxiliar a aprendizagem desses alunos como a variação das representações de objetos matemáticos, atividades lúdicas a partir de jogos e o trabalho com situações-problemas contextualizadas. Sendo assim, serão abordados os conceitos de Modelagem Matemática, Resolução de Problemas e Jogos (também considerada uma tendência de ensino por autores). Gazzetta (1989) apresenta o sentido dos termos Modelagem Matemática como: “processo de construção de um modelo abstrato descritivo de algum sistema concreto”. Em outras palavras, consiste na determinação de uma função, equação diferencial... (modelo matemático); capaz de representar um fenômeno qualquer objeto de estudo com o objetivo de analisar suas variações em um período de tempo e/ou de se fazer previsões. A exemplo da modelagem, na proposta da sequência didática será abordado um modelo matemático que determina o valor a ser pago em uma corrida de táxi a partir da quilometragem percorrida, que se resume em uma simples função afim. A Resolução de Problemas é facilmente percebida nas salas de aula. É uma das tendências mais utilizadas no ensino de Matemática. Vários livros didáticos atuais contemplam a introdução de um tema através de uma situação problema contextualizada em que através da sua resolução desencadeia o ensino do novo conceito a ser estudado. O processo didático dessa tendência não pode ser confundido com as questões do tipo calcule e resolva tradicionalmente utilizadas nas escolas em que se tem como objetivo a 25 prática tecnicista de aprendizagem. A proposta em questão vai além, parte de uma situação problema do cotidiano do aluno que é levado a pensar, elaborar hipóteses de resolução, testar e validá-las através da matemática formal. Por fim, o uso de jogos matemáticos, bem como a utilização da tecnologia informática tem como objetivo tornar a matemática lúdica e atraente, podendo priorizar as diferentes representações de um mesmo objeto matemático que de forma interativa e participativa o aluno tem um contato com o conteúdo abordado. Diferentes softwares educativos podem ser incorporados às aulas, desde que se planeje uma sequência didática bem elaborada para o uso desses recursos. O GeoGebra será utilizado como proposta de recurso didático neste trabalho para valorizar as representações geométricas e algébricas de pontos e retas, mas para isso, propõe-se também um jogo de batalha naval a fim de reforçar as representações de pontos no plano cartesiano. 26 3. IDÉIAS DE ATIVIDADES PARA ENSINO DE FUNÇÃO AFIM A ALUNOS SURDOS Neste capítulo será abordada uma proposta de sequência didática a ser aplicada a alunos surdos cujo conteúdo matemático abordado será o conceito de Função Afim. Para isso, será utilizado o jogo batalha naval e também a mídia informática com o software GeoGebra para os estudos. 3.1 ATIVIDADES A SEREM DESENVOLVIDAS Atividade 1: Jogo Batalha Naval Objetivos da atividade: Estabelecer a noção de par ordenado; Diferenciar a localização dos pontos (a,b) e (b,a) em que a é diferente de b. Desenvolver a capacidade de representação de pontos no plano cartesiano. Material: Tabuleiro conforme FIGURA 1 para cada jogador, e peças (quantidade de cada unidade de peça a ser definida pelo professor) conforme FIGURA 2 para cada jogador. 27 Figura 1: TABULEIRO BATALHA NAVAL Figura 2: PEÇAS O jogo de tabuleiro Batalha Naval proposto neste trabalho, consiste em efetuar disparos contra o seu oponente com o objetivo de exterminar o seu potencial bélico. Cada jogador organiza as peças indicadas na FIGURA 2 no tabuleiro de nome MEU JOGO indicadona FIGURA 1. Os jogadores não podem ter acesso ao jogo do seu adversário. Após as peças estarem dispostas nos tabuleiros inicia-se efetivamente o combate. Cada jogador dita os três primeiros alvos (pares ordenados) na qual seus disparos são direcionados marcando no plano cartesiano JOGO DO ADVERSÁRIO os pontos em que atirou contra seu adversário (essa marcação da localização é importante 28 para que o jogador não efetue disparos em uma mesma direção). Após cada disparo, o adversário revela se atingiu alguma das suas peças, caso tenha sido atingido deve-se informar qual unidade do seu exército foi atingida. Terminada a jogada, o outro jogador realiza a sua jogada e assim sucessivamente. Por fim, o jogador que destruir todas as peças do seu adversário será o vencedor da batalha. Concluído o jogo, o professor deverá discutir com os alunos sobre os pontos marcados nos planos cartesianos formados por um par de retas perpendiculares em que são chamadas de abcissas e ordenadas. Devendo enfatizar que os pontos são formados por pares ordenados em que suas coordenadas servem para a localização do objeto matemático no plano cartesiano assim como acontece similarmente no sistema de localização de aeronaves e embarcações. Atividade 2: Situação Problema da Corrida de Táxi Objetivos da atividade: Aprender o conceito de Função Afim e sua utilidade no cotidiano; Estabelecer a correlação entre um fenômeno de corrida de táxi e a Função Afim em que o domínio da função é x > 0. Relacionar a representação geométrica de uma reta com a sua respectiva função algébrica. Material: Um computador com o software GeoGebra para cada aluno; Projetor Multimídia e computador (para o professor). Estando cada aluno disposto com o seu computador, inicialmente deve-se apresentar brevemente o software GeoGebra, ferramenta de ensino que será utilizada para introduzir o conceito de função afim. 29 O GeoGebra é um software gratuito de matemática dinâmica que possibilita através da sua operação o desenvolvimento da álgebra, cálculo, geometria euclidiana, entre outros. Apresenta uma interface de fácil utilização e nele podem-se obter as representações geométricas e algébricas dos objetos matemáticos e de forma dinâmica. Dessa forma, diante das diferentes representações visuais que o software proporciona, numa sequência didática elaborada, esse diferencial pode auxiliar o professor a obter o êxito no processo de ensino-aprendizagem a alunos surdos, em que através dos movimentos os próprios alunos podem criar hipóteses e testá-las sobre os conceitos abordados em sala de aula. Após apresentação do GeoGebra e de suas principais ferramentas, propõe-se o início do trabalho do conceito da Função Afim através da seguinte situação problema: “Um motorista de táxi cobra uma taxa fixa de R$ 3,00 pela bandeirada mais R$ 1,00 por quilômetro rodado. Calcule o valor da corrida para 1 KM, 2 KM e 3 KM.. Por fim calcule o valor da corrida para os x quilômetros rodados”. Figura 3: TELA INICIAL DO GEOGEBRA 30 Esta é uma tradicional situação problema para a introdução do conceito de função, porém o mais importante é a adaptação do desenvolvimento deste problema com o auxílio do GeoGebra, para que os surdos percebam cada passo da construção da reta bem como da generalização algébrica da função afim, ou seja, a evolução do conceito tanto no campo geométrico como no algébrico. É importante que o professor dialogue com os seus alunos perguntando se já andaram de táxi, assim como verificar o conhecimento sobre o processo de cobrança pela corrida, o significado da “bandeirada”. Isto já possibilita uma sondagem dos alunos para verificar se a situação problema é do contexto deles, se está presente em seu convívio social. Dessa forma o entendimento do conceito poderá ser mais satisfatório. O professor deverá perguntar aos alunos qual o valor a ser pago para a corrida de 1 km e pedir que marquem no GeoGebra o ponto que representa (Km,VC), ou seja (Quilômetro, Valor da Corrida). É importante que o professor nomeie o eixo da abcissa com a sigla Km e da ordenada com VC, deslocando os eixos para que na representação gráfica só se tenha valores positivos e exiba a malha como na figura abaixo: Figura 4: CORRIDA DE TÁXI 31 Figura 5: AJUSTES DA TELA GEOMÉTRICA Após os alunos marcarem o ponto (1 , 4) no gráfico do software, o professor deverá registrar no quadro o cálculo feito pelos alunos priorizando a representação: 4 = 1.1 + 3. Similarmente os alunos deverão calcular o valor da corrida para os quilômetros 2 e 3, marcando os pontos (2 , 5) e (3 , 6) no gráfico e priorizando as representações no quadro: 5 = 1.2 + 3 e 6 = 1.3 + 3. Deverá ser questionado aos alunos quanto a organização estética dos pontos no gráfico, chegando à conclusão de que estão alinhados, ou seja, estão em uma mesma reta. Para confirmar, deve ser traçado a reta que passa por estes pontos utilizando a ferramenta Reta Definida por Dois Pontos, utilizando-se quaisquer dos três pontos plotados no gráfico. Na janela algébrica aparecerá a função que deu origem a reta x – y = -3. Clicando com o botão direito do mouse sobre a função, altere para a forma y = x + 3. 32 Figura 6: GRÁFICO DA FUNÇÃO y = x + 3 No quadro, organize os registros da seguinte forma: 4 = 1.1 + 3 5 = 1.2 + 3 6 = 1.3 + 3 Destaque os valores variáveis das equações e questione aos alunos: Para X quilômetros qual o valor Y da minha corrida? Ouça as respostas e escreva a função da situação problema: Y = 1.X + 3 no quadro abaixo dos registros anteriores. Compare o resultado do quadro com a função da reta encontrada no GeoGebra e então faça a correlação entre o fenômeno da corrida de táxi com o conceito de função afim. É importante ressaltar que a função modela o fenômeno a partir de x > 0. Aprofundando, faça a discussão da forma genérica da função afim destacando o valor da bandeirada como b e o valor de cada quilômetro como a encontrando então a Função Afim y = a.x + b. Deve-se nesse momento formalizar o conceito com as suas 33 definições, enfatizando a correlação que esse conceito matemático tem no nosso dia-a- dia. Através da dinâmica dos objetos matemáticos, pode-se verificar a variação dos coeficientes angular e linear deixando que os próprios alunos discutam sobre o que observam e formalizando as hipóteses testadas visualmente. Segundo o PCN (2002): A riqueza de situações envolvendo funções permite que o ensino se estruture permeado de exemplos do cotidiano, das formas gráficas que a mídia e outras áreas do conhecimento utilizam para descrever fenômenos de dependências entre grandezas. (BRASIL, 2002, p.121) A visualização das representações algébricas e geométricas permite que o aluno surdo identifique as variações dos objetos matemáticos e aprenda a partir da informação visual que recebe do próprio computador. O professor continua a exercer seu papel através da orientação dos procedimentos, acompanhamento e formalização do conceito abordado, retratando por fim a didática que o PCN propõe aos docentes, valorizando a contextualização e utilização de diferentes tecnologias, além de tornar o aluno o protagonista do processo de ensino-aprendizagem. Atividade 3: Demonstração do coeficiente angular da Função Afim Objetivos da atividade: Promover o contato dos alunos surdos com demonstrações matemáticas; Desenvolver geometricamente a demonstração do coeficiente angular da Função Afim. Material: Um computador com o software GeoGebra para cada aluno; Projetor Multimídia e computador (para o professor). 34 Nesta atividade propõe-se desenvolver com os alunos surdos um processo de demonstração geométrica da fórmula de coeficienteangular utilizando para isso o software GeoGebra. Inicialmente pede-se para que os alunos construam dois seletores distintos com a ferramenta Controle Deslizante , nomeando-os de a e b respectivamente. Geralmente os controles já são criados com esta identificação. Após isso, deslize o seletor b até a posição b = 3. Com os controles construídos, deve-se entrar com a Função Afim genérica “y = a*x+b”. Desta forma, os valores a e b estarão assumindo os valores designados no controle deslizante. Construa uma reta paralela ao eixo x passando pelo ponto (0 , 4) e uma reta paralela ao eixo y passando pelo ponto (3 , 0). Estas retas paralelas darão as interseções para a construção do triângulo retângulo que tem como hipotenusa um segmento da reta criada. Figura 7: CONTROLES DESLIZANTES E FUNÇÃO y = a*x + b 35 Crie os pontos interceptos e construa o triângulo retângulo formado por eles, determinando seus ângulos. A primeira verificação é que o triângulo realmente possui um ângulo de 90º. Figura 8: CONSTRUÇÃO DAS RETAS PARALELAS Figura 9: CONSTRUÇÃO DO TRIÂNGULO RETÂNGULO 36 O comprimento dos catetos do triângulo retângulo já é exibido na janela algébrica na seção Segmento, para exibir o nome do segmento designado automaticamente pelo software a cada cateto, basta clicar com o botão direito do mouse no cateto e selecionar com o botão esquerdo o ícone Exibir Rótulo. Calcule a tangente do ângulo formado entre a hipotenusa e o cateto paralelo ao eixo x e compare com o valor de a (controle deslizante). Deverá ser verificado que os valores são iguais. No exemplo ilustrado, a tangente de 45º é determinado pela divisão do segmento c1 = (y2 – y1) = 2 e d1 = (x2 – x1) = 2. Assim, temos que: Tg (45º) = 2/2 = 1 = a Ou seja, o coeficiente angular da função y = a*x+b é determinado pela divisão do cateto oposto sobre o cateto adjacente do triângulo retângulo, cálculo realizado e chamado de função tangente. O cateto oposto pode ser calculado genericamente como y2-y1 e o cateto adjacente como x2-x1 para quaisquer pontos da reta y = ax+b. Assim, determina-se o Figura 10: DETERMINAÇÃO DO COMPRIMENTO DOS CATETOS 37 cálculo do coeficiente angular de uma Função Afim podendo ser visualmente comprovada a sua generalidade a partir da movimentação dos controles deslizantes conforme modelo abaixo em que toda a construção do triângulo retângulo se modifica dinamicamente com a escolha dos valores a = 2 e b = 1 ilustrado abaixo. Figura 11: MOVIMENTAÇÃO DOS CONTROLES DESLIZANTES Figura 12: ZOOM DA CONSTRUÇÃO 38 3.2 ANÁLISE TEÓRICA SOBRE AS ATIVIDADES PROPOSTAS De acordo com Miranda C. e Miranda T. (2011) “os surdos são capazes de aprender matemática, contudo de maneira diferente da dos ouvintes, já que eles são de uma cultura diferente, possuem uma identidade diferente e, portanto, aprendem de modo diferente.” Assim, propõe-se a partir deste trabalho, apresentar uma metodologia alternativa de ensino em que a oralização possa ser parcialmente substituída pelas representações gráficas e/ou algébricas, que por si só mostram os resultados e a matemática existente no conceito abordado. Através dessa prática, os alunos tendem a criar hipóteses e testá-las, o professor torna-se um orientador que direciona as discussões dos alunos. Desta forma, o oralismo tradicional das aulas de matemática, em que somente o professor fala, está neste contexto sendo reduzido, pois as imagens da tela do computador e também dos tabuleiros do jogo, possibilita a reflexão do aluno a respeito do conceito matemático existente, sendo dessa forma o protagonista do seu processo de aprendizagem. ANDRADE (2005) concluiu em sua pesquisa que os surdos do seu grupo estudado dentre os testes de raciocínio abstrato, numérico e espacial; obtiveram maior êxito no espacial e, portanto, indica que “os surdos têm a capacidade de visualização, isto é, de formar representações mentais visuais e manipulá-las transformando-as em novas representações, mais desenvolvida do que as outras habilidades avaliadas”. Devido a este fator relevante, optou-se em propor o ensino do conceito de função afim através da utilização do software GeoGebra, por proporcionar representações visuais do objeto matemático e através da dinâmica pode ser percebida as suas propriedades. Observa-se que a aprendizagem dos alunos surdos se torna mais satisfatória com o desenvolvimento do ensino do conceito através de diferentes representações, enfaticamente a forma geométrica. Como diz o ditado popular: “uma imagem vale mais que mil palavras”, também é válido no processo educacional, pois segundo Durval (2003), “a mobilização entre os diferentes registros de representações na matemática pode contribuir para uma aprendizagem significativa dos conceitos, pois permite um desenvolvimento maior das capacidades cognitivas dos alunos”. 39 Com a utilização do software isso é possível, pois podem ser valorizadas duas representações distintas de um mesmo objeto, mostrando a correlação existente entre ambas, já que muitas vezes os alunos não veem que uma representação geométrica de uma reta está inteiramente relacionada à sua expressão algébrica. A dinâmica disponibilizada na interface do GeoGebra torna possível observar que qualquer movimento efetivado nos gráficos do software, repercute diretamente na sua representação algébrica e vice-versa. Com isso, o aluno surdo é capaz de deduzir as propriedades do objeto matemático estudado em questão. Assim, com a discussão das representações, o professor pode explorar demonstrações, interpretar e deduzir teoremas e/ou afirmações, auxiliando na aprendizagem e participação dos alunos. Através das representações visuais, meio de comunicação dos surdos, propõe-se reduzir o oralismo nas aulas de matemática para esta clientela a partir da proposta de ensino apresentada nesta pesquisa, Miranda C. e Miranda T. (2011) ainda apresenta que “Impor o oralismo característico da nossa língua significa interferir na prática social e enfraquecer as associações dos surdos além de dificultar o acesso às atividades intelectuais e ao mercado de trabalho.” A partir do momento que os educadores respeitam a cultura do surdo, passam a contribuir para a sobrevivência das particularidades dessa identidade surda, trabalhando para que se torne comum no meio escolar e consequentemente em toda sociedade. Como afirma Vilela (2012): O surdo, como todos os demais educandos “especiais”, terá garantido assim, os seus direitos à educação, assegurando uma formação que lhe dê condições de autonomia no mercado de trabalho, etc., ou seja, realmente partindo da educação para a inclusão social em todos os seus aspectos. (VILELA, 2012) As escolas têm grande responsabilidade no processo de inclusão social dos surdos, portanto investimentos na educação tanto na graduação bem como na formação continuada da carreira docente é de grande importância para que o Brasil assegure uma educação com qualidade que é um direito constitucional de todo cidadão brasileiro, independente das suas diferenças. 40 4. CONCLUSÃO Os surdos felizmente estão conquistando o seu direito à educação e para tanto o sistema escolar está em processo de adaptação para atendimento a esta clientela, consequentemente a discussão entre o ensinar perpassa pela compreensão e aceitação da identidade surda com todas as suas especificidades. O docente tem que se preparar a cada dia, planejando a sua aula pensando como surdo. A preparação do corpo de professores já é obrigatória desde a sua preparação nos cursos de licenciatura, mas essa formação vai além, ela deve ser continuada durante toda a sua carreira profissional. Opreconceito que existiu contra os surdos vem sendo abolida, a inserção dos surdos no mercado de trabalho já acontece, diante disso é possível entender que a surdez é uma diferença e não uma deficiência. O surdo só precisa de uma forma alternativa para se comunicar, utilizando a sua língua materna de caráter visual-motora. Isso define a sua cultura e identidade que por fim deve ser respeitada principalmente no ambiente escolar. As adaptações nas aulas, principalmente de Matemática, a fim de reduzir a oralidade, valorizando o aspecto visual no ensino dos alunos surdos pode facilitar o entendimento do conceito abordado, pois é nesse ambiente que a aprendizagem dos surdos é mais eficaz. Diversas tendências para o ensino de Matemática, como jogos, situações problemas, modelagem...; podem contribuir nesse processo. As representações geométricas dos objetos matemáticos são visualizadas em diversos softwares matemáticos, que de forma lúdica e interativa, o aluno passa a ser o construtor do seu próprio conhecimento. A tarefa de educar permite o refletir sobre as suas metodologias de ensino buscando sempre a adequação para que o conhecimento seja repassado de forma objetiva para o aluno seja ele surdo ou não, as tecnologias que a mídia informática oferta, pode contribuir nesse processo educacional. Um método de ensino perfeito nunca vai existir devido às particularidades de cada aluno que é influenciado pelo seu contexto histórico-social, pelas suas subjetividades, princípios e diferenças. Cabe ao 41 professor diante da diversidade, criar meios para que o aluno possa trilhar o seu próprio caminho na conquista do saber. Propostas de ensino, como as apresentadas neste trabalho, não precisam ser seguidas criteriosamente, mas o objetivo maior é nortear as ações dos educadores para que eles possam através da criatividade mudar o ensino tradicional em que somente o professor fala e o aluno ouve. Com a presença de alunos surdos o professor deve repensar a sua prática pedagógica com mais atenção, porém como apresentado nas atividades lúdicas e interativas, bem conduzidas, pode então despertar a atenção do aluno tornando-o protagonista no processo educacional. É importante ressaltar que mesmo se tratando de uma classe heterogênea na escola, surdos e ouvintes em uma mesma sala de aula, a condução das atividades pelo professor conforme foi abordado neste trabalho, não trará prejuízos aos alunos ouvintes, pelo contrário, a intenção é facilitar a sua aprendizagem através dos recursos didáticos alternativos. Por fim, este trabalho teve como ênfase a apresentação de propostas de sequências didáticas para o ensino de conceitos matemáticos a alunos surdos, pois muitas bibliografias são voltadas para o estudo dos surdos e sua identidade. Pretende-se então contribuir para que propostas de ensino como estas sejam colocadas em prática em sala de aula, avaliando-as e remodelando-as conforme as necessidades, com o objetivo final de proporcionar aos alunos, principalmente os surdos, uma educação de qualidade, promovendo de forma satisfatória a inclusão dessa clientela nas escolas regulares de ensino e consequentemente em toda a sociedade. 42 REFERÊNCIAS ANDRADE, Clarissa Galecki e MONTEIRO, Janine Kieling. Avaliação do raciocínio abstrato, numérico e espacial em adolescentes surdos. Aletheia, nº 21, enero-junio, 2005, pp.93-99. Universidade Luterana do Brasil. BRASIL. Decreto nº 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei no 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras, e o art. 18 da Lei no 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Brasília/DF, 2005. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/decreto/d5626.htm>. Acessado em: 07 de junho de 2013. BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília/DF, 1996. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm>. Acessado em: 10 de maio de 2013. BRASIL. Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras e dá outras providências. Brasília/DF, 2002. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10436.htm>. Acessado em: 10 de abril de 2013. BRASIL. Lei nº 12.796, de 04 de abril de 2013. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para dispor sobre a formação dos profissionais da educação e dar outras providências. Brasília/DF. 2013. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011- 2014/2013/Lei/L12796.htm>. Acessado em: 22 de julho de 2013. BRASIL. Ministério da Educação. PCN - Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais: Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Disponível em: <www.mec.gov.br>. Acessado em: 12 de abril de 13. DAVID, Maria Manuela S. As possibilidades de inovação no ensino-aprendizagem da matemática elementar. Revista Presença Pedagógica, Jan./Fev. Belo Horizonte: Dimensão, 1995. DURVAL, Raymond, Registros de representações semióticas e funcionamento cognitivo da compreensão em matemática. In: Aprendizagem em matemática: Registros de representação semiótica, MACHADO, Silvia D. A. (org.), 2003. FATEC. Educando para transformar vidas. Disponível em: <http://www.fatecc.com.br/alunos/apostilas/libras/poslibras/oralismo/apostilaoralismo.p df>. Acessado em: 11 de julho de 2013. 43 FNDE. Livro digital em libras contribui para alfabetização de alunos com surdez. Brasília/DF, 2007. Disponível em: <http://www.fnde.gov.br/fnde/sala-de-imprensa/noticias/item/1064-livro-digital-em- libras-contribui-para-alfabetiza%C3%A7%C3%A3o-de-alunos-com-surdez>. Acessado em: 11 de julho de 2013. GAZZETTA, M. (1989). A modelagem como estratégia de aprendizagem da Matemática em cursos de aperfeiçoamento de professores. Rio Claro, SP, UNESP. Dissertação de Mestrado. GOLDFELD, Márcia. A Criança Surda. Linguagem e Cognição Numa Perspectiva Sócio-Interacionista. São Paulo: Plexus Editora, 2001. GRUPO POSITIVO. Modalidades de ensino. Disponível em: < http://www.educacional.com.br/legislacao/leg_iv.asp>. Acessado em: 11 de julho de 2013. JUNIOR, Henrique Arnoldo; RAMOS, Maurivan Guntzel. Matemática para pessoas surdas: proposições para o ensino médio. 2º SIPEMAT, Recife/PE, 2008. MIRANDA, Crispim Joaquim de Almeida; MIRANDA, Tatiana Lopes. O Ensino de Matemática para Alunos Surdos: Quais os desafios que o professor enfrenta? Revemat, Florianópolis/SC, v. 06, n.1, p.31-46, 2011. NERY, Clarisse Alabarce; BATISTA, Cecília Guarnieri. Imagens visuais como recursos pedagógicos na educação de uma adolescente surda: um estudo de caso. Revista Paidéia, Ribeirão Preto, v. 14, n. 29, set./dez. 2004. NEVES, Maria Janete Bastos; SILVA, Francisco Hermes Santos. Comunicação em Matemática e surdez: os obstáculos do processo educativo. XIII CIAEM, Recife/PE, 2011. QUADROS, Ronice Muller; SCHMIEDT, Magali L. P. Ideias para ensinar português para alunos surdos. Brasília: MEC; SEESP, 2006. SECRETARIA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO - MG. Projeto Incluir. Disponível em: <https://www.educacao.mg.gov.br/projetos/projetos-complementares/1207-projeto- incluir>. Acessado em: 06 de abril de 2013. SILVA, T.T. Contrabando, incidentes de fronteira: ensaios de estudos culturais em educação. Porto Alegre, 1998. SKLIAR, de Carlos de. (Org.). A surdez. Um olhar sobre a diferença. 6ª ed. Porto Alegre: Mediação, 2013. VILELA, Genivalda Barbosa. Histórico Da Educação Do Surdo No Brasil. Disponível em: 44 <http://www.feneis.com.br/page/noticias_detalhe.asp?categ=1&cod=623>. Acessado em: 04 de outubro de 2012. 45 AUTORIZAÇÃO Autorizo a reprodução e/ou divulgação totalou parcial do presente trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico, desde que citada a fonte. _______________________________________ Diego Gomes Monteiro diegogomes4@gmail.com Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri Rua do Cruzeiro, nº1, Bairro Jardim São Paulo – Teófilo Otoni/MG
Compartilhar