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tado 4 (sudo Basuco do d i c e ) PASTA 12-À 24 cÓPIPS S O C I A L Teoria, m é t o d o e criatividade M A R I A CECÍLIA DE S O U Z A M I N A Y O (org.) SUELY F E R R E I R A D E S L A N D E S R O M E U G O M E S 4 EDITORA VOZES Petrópolis Capítulo 1 O desafio da pesquisa social Maria Cecilia de Souza Minayo 1. Ciência e cientificidade Do ponto de vista antropológico, podemos dizer que sempre existiu preocupação do homo sapiens com o conhecimento da realidade — As tribos primitivas, através dos mitos, explicaram e continuam a ex- licar os fenômenos que cercam a vida e a morte, O lugar dos in na organização social, seus mecanismos dé poder, controle e reprodução. Dentro de dimensões históricas imemoriais até nossos dias, as religiões e filosofias têm sido poderosos instrumentos explicativos dos significados da existência individual e coletiva. À poesia e a arte continuam a desven- dar lógicas profundas e insuspeitadas do inconsciente coletivo, da- vida cotidiana e do destino h u m a n o . Nesse universo de vários tipos de saberes, a ciência é apenas u m a forma de expressão dessa busca, não exclusiva, não c o n c l u s i v a e n ã o efinitiva e c o n h e c i m e n t o s . dade.ocidental, no entanto, a ciência é a forma hegemônica de construção da realidade. Sabemos que, na atualidade, quase fudo o que possuímos, consumimos e até pensamos - o telefone celular, a te- levisão, o carro, o GPS, os m e d i c a m e n t o s , os cosméticos, as diversas expressões culturais, à linguagem, e assim por diante - está impregnado por algum tipo de conhecimento científico que qualifica "65 Objetos, O — uso que fazemos deles e as concepções moralidade. Portanto, nossa sociedade, na prática, consagrou a ciência como o carro-chefe de seu próprio desenvolvimento. No entanto, para muitos críticos, a própria ciência é um mito mo- derno por sua pretensão de único promotor e critério de verdade, pois ela, ao m e s m o t e m p o em que se desenvolve, cria novos riscos sociais. E para problemas essenciais com os quais convivemos, c o m o a pobreza, a miséria, a fome e a violência, a ciência continua sem respostas e sem pro- postas, pois elas podem depender de decisó eligência e de técnica, mas dependem, principalmente, da política e do domínio do poder. m o T E S E . E T T o T E R e São muitas as explicações históricas para a hegemonia da ciência sobre outras formas de conhecimento. Mencionaremos duas razões: a primeira, de ordem externa a ela mesma própria, diz respeito a sua capacidade de capacidade d respo estões técnicas e práticas postas pelo desenvolvimento in- dustrial e pós-industrial. O mais relevante dessa situação é que a ciência e a tecnologia, ao final do século XX, t o r n a r a m - s e as grandes pr istas as i n o v a ç õ e s que, n u m m o v i m e n t o recursivo, r e t o r n a m c o m o desafios para seus campos específicos. É o caso do incomparável desenvolvimento a microeletrônica, das áreas de informação e comunicação e da biologia. A interação entre o conhecimento gerado e os artefatos construídos é um capítulo fundamental nas profundas transformações contemporâneas que trazem novas indagações, p a r t i c u l a r m e n t e , para as ciências sociais. A s e g u n d a razão, de ordem interna, consiste no fato de os cientistas te- o a e m e rem conseguido estabelecer uma linguagem fundamentada em conceitos, ara compreensão do mundo, das coisas, dos Fenó- métodos e téc menos, dos processos e das relações. Essa linguagem é utilizada de forma coerente, controlada e instituída por uma comunidade que a controla e administra sua reprodução. O campo científico, apesar de sua normatividade, é permeado por conflitos e contradições. Ele é representado por disciplinas que são cons- , truções intelectuais que c h a m a m para si uma região particular do conhe- cimento e apresentam teoria, métodos e fronteiras próprias, portanto, sua constituição define o que se pensa, como se pensa, o que se ensina e o que não é de sua competência. Afirmar o qué uma disciplira é significa dizer que ela não é igual a outra qualquer. E para nomear apenas uma das controvérsias que aqui nos interes- sa, citamos o grande embate sobre cientificidade das ciências sociais, em comparação com as ciências da natureza: s que buscam a unifor- midade dos procedimentos para c: natural e o social c o m o d e r > condição para atribuir o estatuto de “ciência” ao campo social. Há os que ivindi Il diferença e especificidade do c a m p o h u m a n o . Paul de Bruyne et al. (1995) advogam que a ideia da cientificidade comporta, ao mesmo tempo, um polo de unidade e um polo de diversi- dade, Ou seja, existe possibilidade de encontrarmos semelhanças relati- vamente profundas em todos os empreendimentos que se instituíram a partir da ideia geral de um conhecimento construído por meio de concei- tos, seja de caráter sistemático, seja de caráter exploratório e dinâmico. Essa ideia representa uma tradição geral de autorregulação do processo de cons- trução de conhecimento. Mas, por outro lado, a cientificidade não pode ser reduzida a uma forma determinada de conhecer: ela pré-contém, por assim dizer, diversas maneiras concretas e potenciais de realização. Tal reflexão se torna particularmente fundamental para nosso objeto de estudo neste pequeno livro, a pesquisa social. A interrogação e em torno daientificidade i jais se desdobra em vári questões. A primeira diz respeito à possibilidade concreta de tratarmos de uma realidade da qual nós próprios, enquanto seres humanos, somos agentes: Essa ordem de conhecimento não escaparia radicalmente a toda possibilidade de objetivação? Em segundo lugar, está a identidade do campo: Será que, buscando R S p p eq e e a s r a s e a objetivação que é própria das ciências naturais, não estaríamos desca- racterizando o que há de essencial nos fenômenos e processos sociais, ou . seja, o profundo sentido da subjetividade na construção da cultura? -Por fim, e em terceiro lugar, que método ger ríamos propor para explorar uma realidade tão marcada pela especificidade e pela dife- renciação? C a m o garantir a possibilidade de um acordo fundado numa partilha de princípios e não de procedimentos? o RL aa S u pio o Resumimos as várias respostas, dizendo que as ciências sociais hoje, como no passado, continuam gerando conhecimento. E que seu dilema não é o de copiar os caminhos das ciências naturais e sim o de e n c o n t r a r seu | núcleo mais profundo de contribuição na construçãodo campo científico. | MPEs ai sans k 2 ” E E Mas sua situação não é fácil e não é simples. Primeiro porque; se às Ciên” cias da natureza são pioneiras e as estrelas da ideia de cientificidade, embora % u PRE er a vivenciam a mesma época histórica têm alguns traços comuns, dado o fato de que vivemos num m u n d o marcado pelo influxo das comunica- ções. Igualmente, as sociedades vivem O presente m a r c a d o por seu passa- cionando em seu próprio campo as ideias de espaço, de tempo e de relações do e é com tais determinações que constroem seu . — — q — — sujeito-objeto. constante e ue-está-d uto de seu protagonismo. Portanto, a provisoriedade, o dinamismo e à especificidade são caracteris- or Isso; lambém, as crises têm reflexo não esteja definido que elas já atingiram sua expressão adequada. À física quântica'com suas descobertas e as teorias sistêmicas com o aprofundamen- to das abordagens complexas, dentre outros temas científicos, vêm revolu- A cientificidade, portanto, tem que ser pensada como uma ideia regu- ladora de alta abstração e não como sinônimo de modelos e normas a se- rem seguidos. A história da ciência revela não um “a priori” mas o que foi produzido em determinado m o m e n t o histórico com toda a relatividade ticas ucr questão social. tanto no seu desenvolvimento como na decadência das teorias sociais que as explicam (pois essas t a m b é m são históricas). L C o m o consequência da primeira característica, é importante dizer que o objeto de estudo das Ciências Sociais possui £onsciência histórica. Noutras palavras, não é apenas o investigador que temcapacidade de dar sentido ao seu trabalho intelectual. Todos os seres humanos, em geral, do processo de conhecimento. Poderíamos dizer, nesse sentido, que o labor científico caminha sem- pre em duas direções: numa, elabora suas teorias, seus métodos, seus princípios e estabelece seus resultados; noutra, inventa, ratifica seu ca- ; minho, a b a n d o n a certas vias e encaminha-se para certas direções privi- legiadas. E, ao fazer tal percurso, os investigadores aceitam os critérios E a suas construções, são capazes de explicitar as inten a da historicidade, da colaboração e, sobretudo, revestem -se da humildade e projetam e planejam seu futuro, dentro de um nível de racionalidade . . , a O O “- r A " . L s de quem sabe que qualquer conhecimento é aproximado e construído sempre presente nas ações humanas. O nível de consciência histórica das : a: Ciências Sociais está referido ao nivef de consciência a socie- | portanto passível de mudanças... pô, embora esses dois níveis não se confundam. Em terceiro lugar, é preciso ressaltar que nas Ciências Sociais existe umafidentidade entre sujeito e objeto4 A pesquisa nessa área lida com se- res humanos que, por razões culturais de classe, de faixa etária, ou por qualquer outro motivo, tém um substrato c o m u m de identidade com o investigador, tornando-os solidariamente imbricados e c o m p r o m e t i d o s , 5 c o m o lembra Lévy-Strauss (1975): “ N u m a ciência, onde o observador é da mesma natureza que o objeto, e o observador é, ele próprio, uma parte de sua observação” (p.215). Outro aspecto distintivo das Ciências Sociais é o fato de que ela é in- trínseca e extrinsecamente ideológica. ão existe uma c i ê n c i a . peutra, T da ciência - embora mais intensamente as Ciências Sociais — passa por interesses e visões de m u n d o historicamente criadas, embora suas contribuições € seus eleitos teóricos e técnicos ultrapassem as inten- O objeto das Ciências Sociais é histórico Asto significa que cada so- « d a tciedade humana existe e se constrói num determinado espaço e se orga- Cbr ções de seus próprios autores. No entanto, as ciências físicas e biológicas m a diferente da ideologia social (p. ex., na escolha de niza de forma particular e diferente de outras. Por sua vez, todas as que e íficas dão significado a suas ações assim como gru a d e a, ———+9rã, se existe u m a ideia de devir no conceito d : se p o d e trabalhar, nas ciências sociais, apenas com a n o r m a da cientifi- cidade já construída. A pesquisa Social se aproximação-mas, ao progredir, elabora ritéri 1 mais precisos. C o n f o r m e l e m b r a m Bruyne et al. ( na realidade histórica de seu devir, o procedimento científico é, ao m e s m o tempo, aquisição de um | saber, aperfeiçoamento de uma metodologia, elaboração de uma norma” (p.16). Obviamente isto se faz dentro da especificidade que as Ciências Sociais representam no campo do conhecimento.'Por isso, para falarmos das Ciências Sociais, dentro de sua peculiaridade, retomaremos critérios gerais que a distinguem e que se e n c o n t r a m em autores c o m o D e m o |. | (1995) e M i n a y o (2012, 2014) sem, contudo, desvinculá-la dos princípios da cientificidade. RR temp To Es 12 13 temas considerados relevantes e noutros que são descartados, na escolha de métodos e técnicas há influências econômicas, culturais e outras), pela ema do e u a gua elas colocam ao investigador. Ka, inves- tas A natureza 1 a pD Eq) y al an al EH aj o! ff a al E á q Us & O a “ a dé E É nã o BE o: &: a a o [oo] & estabelece e A visão de mundo de ambos'está ilicada =. em todo o processo de conhecimento, desde a concepção do objeto aos resultados do trabalho e à sua aplicação. Ou seja, a relação, neste caso, entre conhecimento e interesse deve ser capunrestadida como critério de realidade e busca de objetivação. R A ae “Por fim, é preciso afirmar que o objeto das Ciências Sociais é essencial. - mente qualitativo. A'realidade social é a cena e o seio do dinamismo da vida individual e coletiva com toda a riqueza de significados dela trans- bordante. Essa mesma realidade é mais rica que qualquer t ual- uer pensamento e qualquer discurso que possamos elaborar sabre ela — Portanto, os có às ciências que por sua natureza são sempre referi- dos e recortados são incapazes de conter a totalidade da vi jaliAs | NAN, —(Giências-Sariáis, no entanto, possuem instrumentos e teorias capazes de > fazer uma aproximação da suntuosidade tiados seres humanos em sociedade, ainda que de forma incompleta, im atisfató- “ria. Para isso, elas abordam o conjunto de expressões humanas constantes mas nas estruturas, nos processos, nas representações sociais, nas e x p r e s s õ e s da «subjetividade, nos simbolos-e-significados.. | Este pequeno livro trata do caráter especificamente qualitativo das CiênciasSociais e da metodologia apropriada para reconstruir teoricamen- . te os processos, as relações, os simbolos e os significados da realidade social. . 2. Conceito de metodologia de pesquisa Entendemos por metodo multaneamente a teoria da aborda, nd os instrumentos de operacionalização do conhecimento (as técnicas) e a criatividade do pes- quisador (sua experiência, sua capacidade crítica e sua sensibilidade). A metodologia ocupa um lugar central no interior das teorias e está referi- da a elas. Dizia Lenin (1965) que “o m é t o d o é a alma da teoria” (p.148), E 14 distinguindo a forma externalizada com que muitas vezes é é abordado o processo de trabalho científico. Esta externalidade se manifesta quando apenas usamos técnicas e instrumentos para chegar ao conhecimento sem entrar nc mérito do sentido das indagações ou sem levar em conta os conceitos e E que as fundamentar fa verdade, a metodologia é | art mentos sobre a realidade. La ões teóricas da abordage Enquanto Sacangencis de pon cene Gis teóricas de g e ate didi jea “metodologi Tr junto de técnicas, a metodologia deve dispor | coerente, elaborado, capaz de encaminhar os impasses teóricos n a o 1 : desafio da prática, | pai a pu qem E O endeusamento das técnicas produz um formalismo árido ou tas estereotipadas. q; ão contrário, leva ao empirismo sempre ilusório em suas canclusões, ou a especulações abstratas e estéreis. Nada sub: i, no entanto, a n u m trabalho d e n o m i n a d o Contra o Tudtocio (1989) observa que o pro- j i das regras do que à sua por mais fundamental e neces- O s - resso da ciência está ass observância. “Dada uma regra qualquer, e e e N a verdade, a m e t o d o l o g i a e de do pesquisador. Feyerabend, * ta s á r i a q u e se a f i g u r e p a r a a c i ê n c i a , s e m p r e h a v e r á c i r c u n s t â n c i a s e m q u e R se torna conveniente não apenas ignorá-la como adotar a regra oposta” (p.51). Em Estrutura das revoluções científicas (1978), Thomas Kuhn re-| conhece que nos diversos momentos históricos e nos diferentes ramos da ciência há um conjunto de crenças, visões de m u n d o e de processos de trabalho em pesquisa consagrados, reconhecidos e legitimados pela comunidade científica, configurando o que ele chama de paradigma. Para Kuhn (1978), no entanto, o progresso da ciência se faz pela que- bra dos paradigmas, pela colocação em discussão das teorias e dos méto- dos, acontecendo assim uma verdadeira revolução. O método, dizia o historicista Dilthey (1956), é necessário por causa de nossa “mediocridade” Dilthey quis dizer que, como não somos gênios, precisamos de pa ros para caminhar na produção de um conheci- ça cs entanto e apesar de tudo, a marca da criatividade é nossa “grife” (ou seja, nossa experiência, intuição, capacidade crítica de comunicação e de inda- gação) em qualquer trabalho de investigação. ue f a g a s t a ro O R S ad A : | Entendemos por pesquisa a atividade básica da c i ê n c i a na sua indaga- ão e construção da realidade.JÉ a pesquisa que alimenta a atividade de ensino e a atualiza frente à realidade do mundo. Portanto, e m b o r a seja ática teóricaa pesquisa vincula pensamento e ação; Ou seja, nada ? Pesquisa podeseri nte um problema se não tiver sido, em primeiro lugar, | um problema da vida prática. As questões da investigação estão, portanto, relacionadas a interesses e circunstâncias socialmente condicionadas. São “frutos de determinada inserção na vida real, nela-encontrarido suas razões' > = papa rem nir er e seus objetivos. | " T E M síntese, toda investigação se inicia por uma questão, por u m pro- resposta a esse m o v i m e n t o blema, por uma pergunta, por : do pe n s a m e n t o geralmente se vincula a conhecimentos anteriores ou de- Kd; m a n d a a criação de novos referenciais. Q u a i s S D S GO Teorias Os conhecimentos que foram construídos cientificamente sobre deter- rpinado assunto, por outros estudiosos que o abordaram antes de nós e lançam luz sobre nossa pesquisa, são chamados teorias. A palavra teoria tem origem no verbo grego fheorein, cujo significado € “Ver”. À associação ci das bases de qualquer ciência. »aA entre “ver” e “saber” é uma A teoria é construída para explicar ou para compreender um fenôme- no, u m processo ou um conjunto de f e n ô m e n o s e processos. Este conjun- to constitui o domínio empírico da teoria (ou seja, a dinâmica da prática que ela explica ou interpreta). A teoria propriamente dita sempre será u m conjunto de proposições, um discurso abstrato sobre a realidade. Há grandes teorias, conhecidas por macroteorias, que são verdadeiras narra- tivas ou discursos escritos por cientistas sociais muito importantes, au- tores de referência, para interpretar a realidade. C o m certeza todos já a i i a 16 Ê | ouviram falar em positivismo, marxismo, teoria da ação, compreensivismo. Essas são as principais grandes teorias das Ciências Sociais. Mas há tam- bém teorias menores que, geralmente sob o guarda-chuva das grandes narrativas, explicam ou interpretam fenômenos especificos e particulares. Em geral, várias teori si para explicar ou para aju- dar o pesquisador a compreender determinada questão. Muitas vezes também existem problemas novos para os quais não foram desenvolvi- das teorias específicas. Nesse último caso, costumamos trabalhar com o conceito de pesquisa exploratória, na qual o investigador vai propondo um novo discurso interpretativo para O fenômeno que descreve. 4 N e n h u m a teoria, por mais bem-elaborada car ou interpretar todos os fenômenos e pro ofitro campo científico por vários motivos. não é transparente e é sempre mais rica e ma itas re nosso restrito saber. Segundo, porque Teficácia da prática científica se estabelece, não por perguntar sobre tudo, recorta determinado aspecto significativo | compreênde e, a partir dele, busca suas interconexões sistemáticas com A seotEstiio rm ssa a Ea E s são explicações da realidade. Elas c u m p r e m funções «o observa e O Teorias, portanto; muito importantes: (a) Colaboram para esclarecer melhor o objeto de investigação. I E a (b) Ajudam a levantar questões, a focalizar O problema ou as perguntas e a estabelecer hipóteses com mais propriedade. (c) Permitem maior clareza na organização dos dados, (d) E iluminam a análise dos dados, embora elas não possam direcionar totalmente essa atividade, Uma conclusãocientífica deve se beneficiar Es dos achados empíricos e trazer uma novidade como fruto do estudo. De outra forma não haverá originalidade e contribuição específica para a construção do conhecimento do objeto. Em resumo, uma teoria é uma espécie de grade, a partir da qual olha- mos e “enquadramos" a interpretação da realidade: EldE fo mas não deve ser uma camisa de força. Ela é feita de um conjunto de é o G e c u r i d g G r A proposições. Quer dizer, ela é u m discurso sistemático que orienta o olhar sobre o problema em pauta, a obtenção de dados e a análise dos mesmos. Proposições Proposições são o i a g s afirmativas, | são E oie comprovadas sobre f e n ô m e n o s çõés que c o m p õ e m uma teoria devem ter caracteristi fcas: (a) Serem capazes de lançar luz sobre questões reais. (b) Serem claras e inteligíveis. (c) Apresentarem com precisão as relações abstratas entre elementos, fatos e processos que buscam explicar ou interpretar. Ao estabelecer um conjunto de proposições logicamente relacionadas, a teoria constrói u m discurso que deve apresentar as seguintes carac- terísticas: ordenação do que é principal e do que é derivado ou secundá- rio, apresentação sistemática do pensamento e sua articulação com o real concreto. A proposta de uma teoria é ser compreendida pelos membros de uma comunidade acadêmica que têm formação em determinado cam- -—po-cientifico para entender e seguir o raciocínio da reflexão e sua vincu- lação com o m u n d o da vida, - Se quisermos, portanto, trilhar a carreira de pesquisador, temos que nos aprofundar nas obras dos diferentes autores que trabalham com os temas que nos p r e o c u p a m , i inclusive, com os que desenvolvem ou abra- çam teorias com as quais ideologicamente não concordamos. O b o m . o pesquisador é é o que indaga muito, lê com p r o f u n d i d a d e para entender o pensamento dos autores, que é crítico frente ao que lê, e que elabora sua / proposta de pesquisa, informade, pelas teorias (não escravo delas, mas de forma pessoal e criativa. “ Q u a n d o investimos na compreensão do campo científico das Ciências Sociais em temas específicos já tratados e questionados por antecessores e contemporâneos, nós nos elevamos à categoria de membros dessa co- munidade. Assim, teoricamente informados, locamo-nos lado a lado com os que estudam questões fundamentais da sociedade humana de nosso tempo. Desta forma, o domínio de teorias fundamenta nosso ca- rt t a a m a m i n e sproposi- minho do pensamento e da prática teórica, além de constituir o plano interpretativo para nossas indagações “de pesquisa, seja para desenvol- vê-las, respondê-las, ou para, a partir delas, propor um novo discurso. U m a pesquisa sem teoria corre o risco de ser uma N o opinião pes- soal sobre a realidade observada. n g t a e p o c a Conceitos Os termos mais importantes de um discurso científico são os conceitos. Conceitos são vocábulos ou expressões carregados de sentido, em torno dos quais existe muita história e muita ação social Por exemplo, o con- ceito de mudança: ele não é apenas uma palavra, Nele se concentra muita teoria, muitas representações da realidade, muita posição política e muita história. A teoria positivista define mudança de um jeito totalmente di- ferente da teoria da ação sócial, da compreensiva ou da teoria marxista. Em seu aspecto cognitivo, o conceito é delimitador e focalizador do e nncraea c r i m e P S e e Seria rei ( e e rr r m s a o tema ém estuda f C ó s t u m a m o s aconselhar aos que se aventuram a fazer jum projeto de pesquisa que, quando formulam seu objeto de estudo, logo f seguir, conceitue, detalhadamente, cada um dos termos que colocou na a a 4 a e e e ne ren ii em e SA St e a tamento dos adolescentes masculinos, futuros pais, quando descobrem que sua namorada ficou grávida”, Este é o objeto. E s t e é o problema de pesquisa. Conceituã- J o é sexual de adolescentes masculinos; paternidade na adolescência; relações sexuais entre adolescentes; gravidez na adolescência; O pesquisador qué S e n n a assumir tal objeto de pesquisa deve partir para uma busca bibliográfica - sobre cada uma das expressões citadas e trabalhá-las historicamente, com - as divergências e convergências teóricas sobre o assunto, para só depois (colocar sua posição e suas hipóteses. Q u a n d o delimitado, todo conceito deve ser valorativo, pragmático e comunicativo. Valorativos] no sentido de que o pesquisador precisa ex- Plicitar a que corrente teórica os conceitos que adotou estao filiados. Pragiáficos) no que se refere a suà capacidade de serem operativos para m a descrever e interpretar a realidade. omunicativos) ou seja, claros, preci- Pao ct ee 1 / definição de sua proposta/Vamos a um exemplo. Vou estudar o “compor- “ discutir os seguintes termos: c o m p o r t a m e n t o ! *- o sos, abrangentes e ao m e s m o tempo específicos para serem entendidos pelos interlocutores da pesquisa. Há vários tipos de conceitos que podem classificar-se em teóricos, de observação direta ou indireta. (a) C o n c e i t o s t e ó r i c o s — são os q u e c o m p õ e m e e s t r u t u r a m o d i s c u r s o da pesquisa: eles permanecem no nível da abstração. (b) Conceitos de observação direta — são os que definem os termos com os quais o pesquisador trabalha em campo ou nas análises docu- mentais. (c) Conceitos de observação indireta - são os que fazem a relação do contexto da pesquisa com os conceitos de observação direta ( K A P L A N , 1972). | ““Émuito importante ter em mente que o discurso teórico e conceitual | n ã o é um jogo de palavrasiÃo contrário, lernbrám-nos grandes pesquisa- “dores, como Malinowski (1984), que todo bom pesquisador prepara antes e muito bem seus instrumentos teóricos para compreender e interpretar a realidade. Essa preparação é imprescindível a qualquer trabalho científico de qualquer campo. Embora o mesmo autor advirta, o investigador deve sempre relativizar seus cuidadosos marcos teóricos a favor dos achados que a realidade empírica lhe trouxer.jÀ capacidade de realizar esse ba- lançó flexível entre a teoria e a realidade é a medida do êxito dos cientistas * sociais. Ou seja, teorias e conceitos não são camisa de força, são camisa sim, produzida de um tecido que adequa ocorpo ao ambiente e protege o | pesquisador das intempéries de seus julgamentos solitários, valorizando isua contribuição. " b a o À a je ' ' = , aii y Vlitivdo É Q i ge e m m a - é . “a 3. Pesquisa q u a l i t a t i v a no c a m p o das Ciências Sociais2, C s A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se ocupa, dentro das Ciências Sociais, com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes. Esse con- junto de fenômenos h u m a n o s é entendido aqui como parte da reali- dade social, pois o ser humano se distingue não só por agir, mas também por pensar sobre o que faz e por interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e compartilhada com seus semelhantes. O universo 20 y da produção humana que pode ser resumido no m u n d o das relações, das representações e da intencionalidade e é objeto da pesquisa qualitativa dificilmente pode ser traduzido em números € indicadores quantitativos. Por isso não existe um continuum entre abordagens quantitativas e quali- tativas, como muita gente propõe, criando uma hierarquia ideológica no campo científico: em primeiro lugar estariam as pesquisas quantitativas por serem consideradas “objetivas”. E as qualitativas ficariam no final da escala, ocupando um lugar auxiliar e exploratório, porque reconhecidas “subjetivas e impressionistas”, A pesquisa social empírica € compreensiva é realizada por pesquisa- dores de diferentes campos (história, sociologia, antropologia, saúde pú- blica, psicologia, até administração). Geralmente, as estratégias utilizadas para coleta ou geração de material são várias: observação, entrevista, gru- pos focais, uso de material secundário, entre outros. Os estudiosos cos- tumam valer-se de diferentes instrumentos de registro: anotações, grava- ções, fotografias, por exemplo. Existe ainda uma diversidade de maneiras de tratar o material como é o caso das análises de conteúdo, de enuncia- ção, de discurso, fenomenológicas, hermenêutico-dialéticas, sendo que - cada uma das modalidades se filia a teorias específicas.;À variedade de “técnicas e de referenciais evidencia que cada tipo de estudo, teoria ou “método deve adequar-se à compreensão do objeto - que é sempre sujeito, - por trabalharmos com seres h u m a n o s ( M I N A T O e G U E R R I E R O , 2014). t É preciso dizer que dentro do campo das Ciências Sociais, há pesqui- sadores que só trabalham com à abordagem quantitativa e outros que utilizam a qualitativa. É importante ressaltar t a m b é m que o foco nos es- tudos qualitativos traz uma diferença em relação aos trabalhos quantita- tivos que não é de hierarquia e sim de natureza. Enquanto os cientistas sociais que trabalham com estatística visam a criar modelos abstratos ou a descrever e explicar fenômenos que produzem regularidades, são re- correntes e exteriores aos sujeitos, a abordagem qualitativa se aprofunda no mundo dos significados. Esse nível de realidade não é visível, precisa ser exposto e interpretado, em primeira instância, pelos próprios pesqui- sados ( M I N A Y O , 2012, 2014) e, em segunda instância, por um processo compreensivo e interpretativo contextualizado. 21 Os dois tipos de abordagem e os dados delas advindos, porém, não são incompatíveis. Entre eles existe uma oposição complementar que, quando bem trabalhada teórica e praticamente, produz riqueza de infor- mações, aprofundamento e maior fidedignidade interpretativa. Mas essa é uma opinião nossa, e tal afirmação tem muitas controvérsias entre teó- ricos e pesquisadores. As divergências quase sempre ocorrem no debate entre correntes de pensamento e as principais serão citadas a seguir. Positivismo A principal influência do positivismo que domina a visão de vários campos científicos e está presente também nas Ciências Sociais consiste na utilização da filosofia e dos conceitos matemáticos para a explicação da realidade. Sua consequência é a apropriação da linguagem de variáveis para especificar atributos e qualidades do objeto de investigação. Os fun- damentos da pesquisa quantitativa nas Ciências Sociais são os próprios princípios clássicos utilizados nas ciências da natureza: (a) O m u n d o social opera de acordo com leis causais. (b) O alicerce da ciência é a observação sensorial. (c) A realidade consiste em estruturas € instituições identificáveis “a olho nu” de um lado e crença e valores de outro. Essas duas o r d e n s de coisas se relacionam para fornecer generalizações e regularidades. (d) São réais para as Ciências Sociais positivistas os “dados visíveis e identificáveis” Valores e crenças só podem ser compreendidos através dos primeiros, por isso devem ser desprezados como objetos específi- cos de pesquisa. (e) Os dados recolhidos da realidade empírica das estruturas e institui- ções são suficientes para explicar a realidade social. Objetividade No cerne da defesa do método quantitativo como sendo suficiente para explicar a realidade social está a discussão da objetividade. Para os positivistas, a análise social é objetiva q u a n d o é realizada sobre u m a rea- lidade concreta ou pela utilização de métodos ou modelos matemáticos 22 ger EDER seua OT dr 7 mera (altamente abstratos) e instrumentos padronizados e pretensamente re- conhecidos como “neutros” Existe uma crença entre os positivistas de que é pelas técnicas estatísticas cada vez mais sofisticadas que consegui- mos atingir a objetividade. Não faz parte da teoria a consideração de que a construção de técnicas passa pela subjetividade dos pesquisadores e que as proposições e construções que as constituem introjetam interesses hu- manos e sociais dos mais diferentes matizes. Compreensivismo - Em oposição ao positivismo, a chamada Sociologia Compreensiva res- ponde diferentemerte à questão qualitativa. Essa corrente teórica, como o próprio nome indica, coloca como tarefa mais importante das Ciências Sociais a compreensão da realidade humana vivida socialmente. Em suas diferentes manifestações - fenomenologia, etnometodologia, interacionis- mo simbólico - significado é o conceito central da investigação e com- preensão da realidade o foco central. N u m e m b a t e direto c o m o positivismo, a S o c i o l o g i a C o m p r e e n s i v a propõe a subjetividade como o fundamento do sentido da vida social e “defendeca como corstitutiva da vida h u m a n a e inerente à construção da objetividade nas Ciências Sociais. Os autores compreensivistas não se p r e o c u p a m em quantificar e em explicar, e sim em compreender: este é o verbo da pesquisa qualitativa, Compreender relações, valores, atitudes, crenças, hábitos e representações e, a partir desse conjunto de fenômenos humanos gerados socialmente, interpretar a realidade ( M I N A Y O , 2012). O pesquisador que trabalha com estratégias qualitativas atua com amatéria-prima das vivências, das expe- riências, da cotidianidade e t a m b é m analisa as estruturas e as instituições, mas entendem-nas como ação humana objetivada. Para esses pensadores e pesquisadores, a linguagem, os símbolos, as práticas, as relações e as coisas são inseparáveis. Se partirmos de um desses elementos, temos que chegar aos outros, mas todos passam pela subjetividade humana. Marxismo O marxismo enquanto abordagem que considera a historicidade dos processos sociais e dos conceitos, as condições socioeconômicas de pro- 23 | | dução dos fenômenos e as contradições sociais é outra teoria sociológica importante. Enquanto método, ele propõe a abordagem dialética que teo- ricamente faria um desempate entre o positivismo e o compreensivismo, pois juntaria a proposta de analisar os contextos históricos, as determi- nações socioeconômicas das situações de vida, as relações sociais de pro- dução e de d o m i n a ç ã o com a c o m p r e e n s ã o das representações sociais. A dialética trabalha com a valorização das quantidades e da qualida- de, com as contradições intrínsecas às ações e realizações humanas, e com o movimento perene entre parte e todo e interioridade e exterioridade dos fenômenos. Porém, nas análises marxistas, a consideração sobre valores, crenças, significados e subjetividade são quase inexistentes porque à prá- tica marxista hegemônica de análise da realidade tem sido macrossocial ou m e s m o positivista. Por exemplo, um expoente da teoria, Althusser (1965), dizia que a questão do sujeito era uma ilusão da antropologia. Várias críticas têm sido feitas às teorias acima descritas e, como já dis- semos, essas críticas têm como base o fato de que n e n h u m a delas conse- gue explicar inteiramente a realidade que é mais rica do que qualquer “discurso construído sobre ela. Por exemplo, criticamos a pretensa obje- tividade (sem sujeito) do positivismo e a sua crença de que devemos restringir o conhecimento da realidade ao que pode ser observado, quan- tificado ou modelado de forma externa aos sujeitos. Ao compreensivismo, as criticas enfatizam sua tendência ao empiris- mo (ou seja, a crença de que o que as pessoas dizem sobre o real é à própria realidade) e ao subjetivismo (que confunde as percepções do pes- quisador c o m a verdade científica) ( M I N A Y O , 2012, 2014). Sobre o marxismo, as críticas enfatizam sua dificuldade para criar ins- trumentos compreensivos, pois a tendência dos seus autores e seguidores é importar respostas prontas baseadas na exegese da teoria, perdendo a riqueza da realidade empírica. C o m o falava Sartre (1980), os marxistas costumam ver o quadro (a teoria) como se ele constituísse a totalidade da pintura (a dinâmica da realidade social) ( M I N A Y O , 2014). dade, a especificidade e as diferenciações internas dos nossos objetos de pesquisa que precisam ser, ao m e s m o tempo, contextualizados e trata- dos em sua singularidade. Acreditamos na relação fértil e frutuosa entre 24 Pessoalmente, advogamos a importância de trabalhar com a complexi- Fe psrans STATE POR S TT Dr abordagens quantitativas e qualitativas que devem ser vistas em oposi- ção complementar. No entanto, neste p e q u e n o livro trataremos apenas dos instrumentos de pesquisa qualitativa. Sobre o c a m p o de investigação quantitativa será necessário outro investimento de igual dedicação. 4. Ciclo da pesquisa qualitativa Diferentemente da arte e da poesia que se baseiam na inspiração, a pesquisa é um trabalho artesanal que não prescinde da criatividade, mas se realiza fundamentalmente por um labor intelectual baseado em con- ceitos, proposições, hipóteses, métodos e técnicas, que se constrói com um ritmo próprio e particular. A esse ritmo d e n o m i n a m o s Ciclo de pes- quisa, ou seja, um peculiar processo de trabalho em espiral que começa cófiiima pergunta e termina com uma resposta ou produto que, por sua -Yéz, dá origem à nóvas interrogações. Para efeitos bem práticos, dividimos o processo de trabalho científico em pesquisa qualitativa em três etapas: (1) fase exploratória; (2) trabalho de campo; (3) análise e tratamento do material empírico e documental. . A fase exploratória consiste na produção do projeto de pesquisa e de todos os procedimentos necessários para preparar a entrada em campo. É o tempo dedicado — e que merece empenho e investimento — a defi- nir e a delimitar o objeto, a desenvolvê-lo teórica e metodologicamente, ia colocar hipóteses ou alguns pressupostos para seú e n c a m i n h a m e n t o , ka escolher e a descrever os instrumentos de operacionalização empírica trabalho de trabalho), a pensar o cronograma de ação e a fazer os proce- putentos exploratórios para escolha do espaço e da amostra qualitativa. A fase de campo consiste em dialogar com a realidade concreta a cons- trução téórica elaborada na primeira etapa. Essa fase combina observa- ção, entrevistas ou outras modalidades de comunicação e interlocução com os pesquisados. Ou o diálogo como o material documental, no caso das análises documentais ou de discurso. Esse m o m e n t o depende, de um lado, da boa preparação realizada na fase exploratória; de outro, da ca- pacidade do pesquisador estabelecer relações e observações que possam confirmar ou refutar suas hipóteses e suas propostas teóricas. O trabalho 25 A de campo é uma fase tão central para o conhecimento da realidade que Lévy-Strauss (1975) o d e n o m i n a “ama de leite” de toda a pesquisa social. A terceira etapa, resumida no título Tratamento e análise do material, diz respeito ao conjunto de p r o c e d i m e n t o s pára valorizar, compreender, interpretar os dados empíricos, articulá-los com a teoria que fundamen- tou o projeto ou com outras leituras teóricas e interpretativas cuja neces- sidade foi dada pelo trabalho de campo. Podemos subdividir esse mo- mento em três tipos de procedimento: (a) ordenação dos dados; (b) classificação dos dados; (c) análise propriamente dita. O tratamento do material nos conduz a uma busca da lógica peculiar e interna do grupo que estamos estudando, sendo esta a RR fun- damental do pesquisador. Ou seja, análise qualitativa rão é uma mera classificação de opínião dos informantes, é muito mais. É a descoberta de seus códigos sociais a partir das falas, símbolos e observações. A busca da compreensão e da interpretação à luz da teoria aporta uma contribuição singular e contextualizada do pesquisador. O ciclo de pesquisa não se fecha, pois toda pesquisa produz R E ú mento e gera indagações novas. Mas a ideia do ciclo se solidifica não emetapas estanques, mas em planos que se complementam. Essa ideia tam- bém produz delimitação do processo de trabalho científico no tempo, por meio de u m cronograma. Desta forma, valorizamos cada parte e sua inte- gração no todo. E pensamos sempre num produto que tem começo, meio e fim e ao m e s m o tempo é provisório. Falamos de uma provisoriedade que é inerente aos processos sociais e que se refletem nas construções teóricas, Referências A L T H U S S E R , L. Pour Marx. Paris: François Maspero, 1965. B R U Y N E , P; HERMAN,)J.; S C H O U T H E E T E , M. Dinâmica da pesquisa em Ciências Sociais. 6º ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1995. D E M O , P. Metodologia científica em Ciências Sociais. 3º ed. São Paulo: Atlas, 1985, 26 apos D I L T H E Y , W. Introducción a las Ciências del Espiritu. Madri: Revista de Occidente, 1956. F E Y E R A B E N D , P Contra o método. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1989. K A P L A N , A. A conduta na pesquisa. São Paulo: Herder/Edusp, 1972. K U N H , T. Estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 1978. LENIN, W. Cahiers philosophiques. Paris: Sciences Sociales, 1965. L É V Y - S T R A U S S , C. Aula inaugural. In: Z A L U A R , A. (org.). D e s v e n d a n d o máscaras sociais. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1975, p.211-244, M A L I N O W S K I , B. Argonautas do Pacífico Ocidental. São Paulo: Abril, 1984. M I N A Y O , M.C.S. Análise qualitativa: teoria, passos e fidedignidade. Ciência & Saúde Coletiva, 2012, 17 (3): pp. 621-626. . O desafio do conhecimento. 14º ed. ampliada e aprimorada. São Paulo: Hucitec, 2006. “ M I N A Y O , M.€.S.; G U E R R I E R O , I.C.Z. Reflexividade c o m o éthos da “pesquisa qualitativa. C i ê n c i a & Saúde Coletiva, 2014, 19 (4): 1103-1112. S A R T R E , J.-P Questão de método. Coleção Os Pensadores. São Paulo: Abril, 1980. Referências c o m e n t a d a s B R U Y N E , P; H E R M A N , ) J . ; S C H O U T H E R T E , M, D i n â m i c a da Pesquisa em Ciências Sociais. 6º ed. Rio de Janeiro: Prancisco Alves, 1995. Os autores propõem uma reflexão sobre a cientificidade das Ciências Sociais, sobre as condições de produção do conhecimento, e apresentam uma visão global do processo de pesquisa. Evidenciam que toda a cons- trução científica se movimenta em quatro polos: epistemológico, teórico, morfológico e técnico, polos não estanques e, sim, articulados. DEMO, P Metodologia cientifica em Ciências Sociais. 15º ed. São Paulo: Atlas, 1985. O 2 7 . Introdução à metodologia científica. 3º ed. São Paulo: Atlas, 1995. O autor destes dois livros de referência discute questões fundamentais da ciência enquanto um produto da sociedade e enquanto produção de conhecimento, na área de Ciências Sociais. Ele reflete sobre as principais correntes de pensamento dominantes e as implicações das abordagens de cada uma, O texto abrange temas de relevante interesse como critérios de cientificidade, campo científico, condições de produção do conhecimen- to e parâmetros para verificação, validade e confiabilidade. M I N A Y O , M.C.S. O desafio do conhecimento. 14º ed. ampliada e apri- morada. São Paulo: Hucitec, 2006. A autora faz uma reflexão abrangente sobre a filosofia, a sociologia e a prática da pesquisa social em saúde e acompanha toda a orientação meto- dológica com propostas teóricas e operacionais. O livro abrange todas as fases de uma pesquisa social qualitativa e, além de uma vasta bibliografia, que pode ser consultada, apresenta uma forma de abordagem própria, em diálogo com autores de referência no campo da pesquisa sociológica, an- tropológica e da saúde coletiva. A partir da 9º edição a autora introduz a abordagem articulada por triangulação de métodos e inicia uma reflexão sobre a teoria sistêmica e o conceito de complexidade em pesquisa. M I N A Y O , M.C.S.; ASSIS, S.G.; S O U Z A , ER. (orgs.). Avaliação por trian- gulação de métodos: abordagem de programas sociais. 2º ed. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2005. Apesar de ser um livro pensado para avaliação, esta obra traz orientação sobre métodos quantitativos e qualitativos e sua articulação na pesqui- - sa social. Os autores trabalham cada passo (definição de objeto, constitui- ção de marco teórico, definição de indicadores, técnicas de investigação, técnicas para trabalho de campo e diversas formas de análise) das duas abordagens, sempre combinando a sua triangulação para análise da rea- lidade social, 28 H as prerma inter deco Ee asa paca VESES E CS TITS E Era e vm e Capítulo 2 O projeto de pesquisa c o m o exercício científico e artesanato intelectual Suely Ferreira Deslandes! 1. Introdução U m projeto de pesquisa constitui a síntese de múltiplos esforços in- telectuais que se contrapõem e se complementam: de abstração teóri- co-conceitual e de conexão com a realidade empírica, dê exaustividade e síntese, de inclusões e recortes, e, sobretudo, de rigor € criatividade. Um projeto é fruto do trabalho vivo do pesquisador. Para isso, ele vai . . . . - . , T e r a . precisar articular informações € conhecimentos disponíveis (um amplo conjunto de saberes e técnicas), usar certas tecnologias (o uso de internet corpo ao esforço de realizar a tarefa. Q u e m duvida que as vistas cansam, as costas ardem e a coluna dói depois de longos dias em frente a um com- putador ou a uma pilha de livros? O projeto é construído artesanalmente por um artífice através do tra- balho intelectual. É, portanto, um artefato. O que queremos dizer com isso? Primeiro que o proj não surge espontaneamente, uni- camente pela vasta experiência ou pelo grande compromisso social de um pesquisador em relação a certa temática. Embora esses quesitos também sejam muito importantes e presentes, pois, como dizia o so- ciólogo americano Wright Mills (1972), os pensadores mais admiráveis não separam seu trabalho de suas vidas, “encaram a ambos demasiado a sério para permitir tal dissociação, e desejam usar cada uma dessas coisas para o e n r i q u e c i m e n t o de outra” (p.211-212). Entretanto, tor- 1. Socióloga, doutora em Ciências e pesquisadora titular do IFF/Fiocruz. A na-se necessário o trabalho sistemático para o domínio de teorias e mé- Odos justamente para que O Tcnador, evitando o “fetichismo do método e da técnica MILLS, 1972), para que possa usá-los artesanalmente, adequando-os, reinventando os caminhos próprios para sua investigação. Segundo é que, ao construir um projeto, fabricamos também uma ferramenta, um artefato, cuja materialidade não se apresenta somente no número de páginasescritas ou num arquivo de um editor de textos, mas que se concretizará na realização do trabalho investigativo. Artefato porque tanto é fruto da mão de obra humana, intencionalmente criado, quanto no sentido de ser resultado do uso de métodos particulares em pesquisa (FGV, 1987). É um i n s t r u m e n t o que servirá como guia para as ações do estudo proposto. Podemos ponderar que esta ferramenta-guia não se limitaria à metáfora do prumo de um pedreiro, que se destina a corrigir a retidão do ângulo de uma parede, evitando rigorosamente os desvios. Melhor talvez fosse pensar através da metáfora de outras ferra- mentas-guia, tais como o astrolábio e o sextante, instrumentos utilizados pelos antigos navegadores para se lançarem em mares desconhecidos, de- safiadores e fascinantes. 2. D i m e n s õ e s de um projeto de pesquisa e o Quando escrevemos um projeto, estamos definindo uma cartografia de escolhas para abordar a realidade (o que pesquisar, como, por que, po o tempo etc.). Isso porque o projeto científico trabalha com um objeto construído e não com o objeto percebido, nem com o objeto real ( B R U Y N E ; H E R M A N ; S C H O U T H E E T E , 1977). O objeto percebido é aquele que se apresenta aos nossos sentidos pela forma de imagens, é o que vemos e sentimos e que, na maioria das vezes, se apresenta como “real”, natural e transparente. Em pesquisa social sa- bemos o quanto estas percepções sofrem influências das nossas visões de mundo, possuidoras de uma historicidade, portanto, em nada “naturais”. O objeto real diz respeito à totalidade das relações da existência so- cial. Suas fronteiras e complexidade, porque dinâmicas e constantemen- te reinventadas, excedem a apreensão do conhecimento científico. 30 CAPES Cera MORTES ITA SEND Rods EUR ia O objeto construído, por sua vez, constitui u m a tradução, u m a ver- são do real a partir de uma leitura orientada por conceitos operadores. É resultado de um processo de objetivação teórico-conceitual de certos aspectos ou relações existentes no real. Este é um ponto muito caro às ciências sociais. Marx (1978) já afirmava que a ciência se apropria da totalidade do social pelo pensamento, por abstrações conceituais que se debruçam sobre o concreto, Weber (1986) postulava que a ciência so- cial não trabalha com as conexões reais entre coisas, mas com conexões conceituais entre problemas, e Durkheim (1978), que, assim como Marx, lembrava a importência de realizar uma ruptura com o senso c o m u m , com as percepções imediatas. Esta etapa de reconstrução da realidade, entendida aí enquanto a de- finição de um objeto de conhecimento científico e as maneiras propostas para investigá-lo, traz e m si muitas d i m e n s õ e s . Ao elaborarmos um projeto científico estaremos lidando, ao m e s m o tempo, com pelo menos três dimensões importantes que estão interligadas. A dimensão téinica, que trata das regras reconhecidas como cientifi- cas para a construção de u m projeto, isto é, c o m o definir u m objeto, como abordá-lo e como escolher os instrumentos mais adequados para a investigação. Sendo que técnica sempre diz respeito à m o n t a g e m de instrumentos ( D E M O , 1991), o projeto de pesquisa é visto neste senti- do c o m o um instrumento da investigação. A dimensão ideológica se relaciona às escolhas do pesquisador. Q u a n d o definimos o que pesquisar, a partir de que base teórica e como pesquisar, estamos fazendo escolhas que são, m e s m o em última instância, idevlógi- cas. Hoje, m e s m o cs cientistas naturais reconhecem que a neutralidade da investigação científica é um mito. É Não estamos, é zerto, nos referindo a uma visão maniqueista, onde o pesquisador reconstrói a realidade com “segundas intenções políticas”, Estamos, sim, falando de uma caracteristica intrínseca ao conhecimento científico: e l e é sempre histórico e soci jonado. O pesquisa- dor opera escolhas (mesmo sem ter a consciência disto), tendo como hori- zontes de influência os valores e conhecimentos produzidos e adquiridos a partir de sua própria posição social e da mentalidade de um momento histórico concreto. Se 31 V D A dimensão científica de um projeto de pesquisa articula estas duas d i m e n s õ e s anteriores. A pesquisa científica busca ultrapassar o senso c o m u m (que por si é | uma reconstrução da realidade) atraves do método cientifico. Como já dito, o método científico permite que a realidade social seja reconstruída enquanto objeto do conhecimento, através de um processo de categoriza- ção (possuidor de características específicas) que une dialeticamente O teórico e o empírico. Neste capítulo estaremos dando ênfase à dimensão técnica na questão da construção de um projeto. Estamos propondo uma introdução a este tema, e n t e n d e n d o que d o m i n a r a técnica é t a m b é m viabilizar a produção do conhecimento. 3. Os propósitos e a trajetória de elaboração de um projeto de pesquisa F a z e m o s um projeto de pesquisa, sobretudo, para esclarecer a nós mes- mos qual a questão que estamos propondo investigar, às definições teóri- cas de suporte e as estratégias do estudo que utilizaremos (o que pesqui- “ S a r , C O M O , por q u a n t o t e m p o etc.). A redação do projeto cria u m a série de d e m a n d a s ao pesquisador para tornar clara, coerente e consistente sua proposta. Redigir seu protocolo de investigação sob a forma de um proje- to ajuda o autor a perceber o que ainda precisa estudar, definir e mesmo refletir para concluí-lo. O projeto ajuda t a m b é m a mapear um caminho a ser seguido duran- te a Investigação. srassim antecipar cenários é criar um plano de trabalho. Isso permite ao pesquisador planejar e administrar cada etapa da investigação e os esforços, recursos e e m p r e e n d i m e n t o s que serão necessários. Além disso, um pesquisador necessita comunicar seus propósitos de pesquisa para que esta seja aceita na comunidade científica. O “meio de comunicação” reconhecido no m u n d o científico é o projeto de pesquisa. Através deste, outros especialistas poderão tecer comentários e críticas, contribuindo para um melhor encaminhamento da investigação. É im- portante lembrarmos que a pesquisa científica pressupõe sempre uma instância coletiva de reflexão. O projeto permite ainda que várias equipes 32 NE MEISTER ET de pesquisa, m e s m o situadas em instituições e regiões diferentes, traba- lhem integradamente, seguindo um m e s m o protocolo. O projeto é também um pré-requisito para obter financiamento.As instituições de fomento à ciência regularmente abrem editais convocan- do os pesquisadores a concorrerem entre si por fundos. U m projeto bem- elaborado é condição essencial a participar destas concorrências. Finalmente, ao apresentar um projeto, o pesquisador assume uma res- ponsabilidade pública com a realização do que foi prometido. Mudanças p o d e m ser necessárias e imprevistos c o s t u m a m acontecer. Essa contin- gência revela que a pesquisa é uma prática dinâmica, contudo, o pesqui- sador precisará esclarecer e justificar as modificações daquilo que foi pre- conizado inicialmente. Os órgãos de fomento e instituições apoiadoras cada vez mais frequentemente exigem relatórios de a c o m p a n h a m e n t o da execução de projetos. O projeto de pesquisa é o desfecho de várias ações e esforços do pes- visador Éle culmina uma trajetória anterior marcada por atividades e R E atitudes ( R U D I O , 2000; M I N A T Y O , 2006): 1) De pesquisa bibliográfica disciplinada, critica e ampla: a) Disciplinada porque devemos ter uma prática sistemática — um crité- “ rio claro de escolha dos textos e autores. Quais serão as chaves temáticas de busca? Serão incluídos somente os textos mais recentes? Serão tex- tos oriundos somente de uma área de conhecimento? Haverá alguma forma de escolha dos autores? Aqueles, por exemplo, que defendem determinada linha de pensamento? Responder a estas perguntas ajuda a definir certo escopo de pesquisa bibliográfica. b) Crítica porque precisamos estabelecer um diálogo reflexivo entre as teorias e outros estudos com o objeto de investigação por nós es- colhido - uma revisão não pode ser diletante, mas precisa estar atenta à correlação entre os métodos propostos e os resultados encontrados por outros pesquisadores. Desenvolver esta capacidade comparativa e analítica em relação aos outros estudos nos ajuda a melhor delimitar nossa proposta. c) Ampla porque deve dar conta do “estado” atual do conhecimento sobre o problema — espera-se que o pesquisador saiba dizer o que é o 33 9» consenso sobre o assunto em debate e o que é polêmico; o que já é tido c o m o conhecido e o que ainda pouco se sabe. E c o m o se apropriar seletivamente de tantos conhecimentos? Os fichamentos são um bom procedimento, mas, como já dito, devem ter um foco e sempre estabe- lecer um diálogo com o tema e objeto de estudo desejado. 2) De articulação criativa, seja na delimitação do objeto de pesquisa, seja na aplicação de conceitos — trabalhos originais e inovadores se ini- ciam com perguntas que ainda não foram formuladas para a investigação científica e com maneiras diferentes de abordar o objeto. 3) De humildade, ou seja, r e c o n h e c e n d o que todo c o n h e c i m e n t o cien-. T - ; tífico tem sempre um caráter: " = a 4 - sobre os quais se questiona, se aprofunda ou se crítica. b) Provisório — tanto a realidade social se modifica quanto as inter- pretações sobre ela podem ser superadas por outras que incluem mais elementos e complexidade. c) Inacessível em relação à totalidade do objeto, isto é, as ideias ou ex- plicações que fazerros da realidade estudada são sempre mais Empreci- sas do que a própria realidade. d) V i n c u l a d o à vida real — a rigor, um n a f r a g u r a d E e e e partir de sua existência na vida real e não “espontaneamente”. e) C o n d i c i o n a d o historicamente. £) Condicionado T i . Considerando-se os vários ciclos de uma pesquisa, esta etapa é reco- “nhecida como a fase exploratória e é, sem dúvida, um de seus momentos “mais importantes (MINAYO, 2006). Compreende várias fases da constru- ção de u m a trajetória de investigação, tais c o m o : a) escolha do tópico de investigação; b) delimitação do objeto; c) definição dos objetivos; d) construção do marco teórico conceitual; e) seleção dos instrumentos de construção/ coleta de dados; f) exploração de campo. 34 * Importante lembrar que a fase exploratória conduzida de m a n e i r a pre- cária trará grandes dificuldades à investigação como um todo. U m pes- a quisador mais inexperiente pode pensar que a elaboração de um projeto é uma tarefa incômoda e o que mais importa é logo fazer o trabalho de campo e realizar a análise. Contudo, se o objeto e objetivos de pesquisa qu se os métodos não forem bem demarcados, futuramente os obstáculos aparecerão exigindo revisões e ajustes. Formalmente, a fase E a g e d termina quando o E s p e t o de- finiu seu objeto de pes , construiu o marco teórico co empregado, d e m a r c o u objetivos clar - selecionou os ins R e s trumentes de coleta de dados, escolheu o espaço e o grupo de pesquisa = a u c r i o u c r i t é r i o s p a r á a i n c l u s ã o dos s u j e i t o s e s t u d o s t a b e i e c e u é tratégias para entrada no campo. Em outras palavras, a elaboração do projeto de investigação demarca a conclusão desta fase, 4. Os elementos constitutivos de um projeto de pesquisa O projeto de-pesquisa deve, fundamentalmente, responder as seguintes pergurtas (BARROS; LEHFELD, 1986; GIL, 1991; RUDIO, 2000): - O que pesquisar? (Definição do problema, hipóteses, base teórica e conceitual.) Re p e i d o * Para que pesquisar? (Propósitos do estudo, seus objetivos.) « Por que pesquisar? (Justificativa da escolha do problema.) * C o m o pesquisar? (Metodologia.) R o n a n * Por quanto tempo pesquisar? (Cronograma de execução.) * C o m que recursos? (Orçamento,) * À partir de quais fontes? (Referências.) d a o c o TO Oque pesquisar? A construção do objeto de pesquisa Definição do tema e escolha do problema O tema de uma pesquisa indica a área de interesse ou assunto a ser in- a D O , E E E d o o ia vestigado. Trata-se de uma delimitação ainda bastante ampla. Por exem- plo, quando alguém diz que deseja estudar a questão “exploração sexual 35 NA de crianças e adolescentes”, está se referindo ao assunto de seu interesse. Contudo, é necessário para a realização de uma pesquisa um recorte mais preciso deste assunto. Este encontro com o tema é o primeiro passo para o trabalho cientifi- co. Sugere-se que o pesquisador faça três indagações sobre o tema eleito ( S A N T O S , 2004): se lhe agrada e motiva; se possui relevância social e acadêmica; e se há fontes de pesquisa sobre ele. R A N A == ES e d e e Mas O tema é um caminho ainda em aberto. O pesquisador de nosso exemplo então se pergunta: O que pesquisar sobre exploração sexual de crianças e adolescentes? Várias questões podem ser deseu interesse. Quais Crianças, adolescentes e suas amilias? C o m o são as características des operam as redes e agentes responsáveis por esta exploração? Quais ações têm sido realizadas nos últimos anos para o enfrentamento dessa prática? Ao formularmos perguntas ao tema estaremos construindo sua proble- matização. U m problema decorre, portanto, de um aprofundamento do í terna. Ele é Sempre i izado e especifico. A definição do Pr a ou objeto de pesquisa às vezes é tarefa di- fícil, mas t a m b é m é a razão da existência de um projeto. À construção de um objeto de estudo científico constitui um verdadeiro exercício con- tra a ideia de que as coisas estão dadas na realidade e que basta apenas estar atento ao que acontece no cotidiano. Esta postura é criticada por Bourdieu, C h a m b o r e d o n e Passeron (1999), que a nomeiam como “so- ciologia espontânea”, É importante lembrar que um problema social não é a mesma coi- sa que um problema científico ( V I C T O R A ; K N A U T H ; H A S S E N , 2000; B O U R D I E U , 1989). Em nosso exemplo falávamos do tema exploração sexual de crianças e adolescentes e este é um problema social importan- te, seja porque traz sérias consequências à saúde física e mental dessas crianças, seja porque fere todos os seus direitos, seja porque é moralmente intolerável, ou mesmo porque denota falhas nos mecanismos de proteção daquela sociedade à infância e adolescência. Contudo, a exploração se- xual de crianças e adolescentes só se tornará um roblema científico se o pesquisador operar propositalmente uma série de rupturas sistemá- ticas: a) romper com as ideias e concepções circulantes sobre a questão j o s e P a a e p j p i a j u t e m e 36 es ore (sejam religiosas ou morais); b) desconstruir ideias preconcebidas (que as famílias são as principais responsáveis pelo problema, p. ex.J; CJ evitar-as— explicações simplistas ("E a pobreza que explica a existência deste tipo de comércio”). construindo um objeto científico sobre esta questão, u m a das posturas iniciais seria a de se perguntar q u a n d o e em que c o n t e x t o de nossa-história-a prática de exploração sexual de crian- ças e adolescentes (perpetrada por centenas de anos em nossa sociedade) passou a ser vista c o m o um problema social? Quais atores ( m o v i m e n t o s sociais, mídia, representantes do Estado etc.) e circunstâncias foram res- ponsáveis por atribuir à questão O status de problema social? C o m o esse “problema social” tem sid ública? Esse caminho, que a j u d a a r o m p e r o senso c o m u m sobre o problema e suas explicações circulantes, é c h a m a d o pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu (1989) de prática da “dúvida radical”, O apoio de revisões bibliográficas sobre os estudos já feitos ajuda a mapear as perguntas já elaboradas naquela área de conhecimento, per- mitindo identificar o que mais tem se enfatizado e o que tem sido pouco trabalhado. Construir um diário pessoal de perguntas e questionamentos “4... s o b r e O tema também é útil. Confrontar estas perguntas com o que já foi investigado e a forma como foram tratadas por outros estudiosos é a pró- xima etapa para selecionar o problema de estudo. Este exercício permite ao pesquisador não só delimitar o seu problema, mas constituir a sua proble- mática de estudo, isto é, contextualizar o seu problema em relação àquele campo temático de c o n h e c i m e n t o (LAVILLE; D I O N N E , 1999). A escolha de certas variáveis também auxilia a delimitação do proble- ma. Retomamos o exemplo colocando-o inicialmente como problema de estudo: “Quais foram as iniciativas para o enfrentamento da exploração sexual de crianças e adolescentes?” C o m o se vê, uma série de imprecisões É dificulta o entendimento dessa proposta: A que tipo de iniciativa nos refe- rimos? Relativas a que período de tempo? Em todo o pais? Trata-se, então, somente de listar o que foi feito? Novas reflexões a partir de maior conhe- cimento sobre o tema ajudariam a reelaborar a proposta e teriamos então: “ C o m o se c a r a c t e r i z a m as iniciativas g o v e r n a m e n t a i s , em t e r m o s de estra- tégias, efetividade e continuidade, para combater a exploração sexual de crianças e adolescentes no Estado do Rio de Janeiro desde a implantação 37 j j Ç : | I do Estatuto da Criança e do Adolescente?” Poderíamos seguir recortando a abordagem para as iniciativas de certa área específica de atuação das políticas públicas (Segurança Pública ou da Assistência Social). Alguns autores sugerem que 0 problema deva ter algumas característi- cas, como, por exemplo (GIL, 1991): a) Deve ser formulado como pergunta. Esta maneira parece ser à mais fácil para se formular um problema, além do que facilita sua identifica- ção por q u e m consulta o projeto de pesquisa. b) O problema deve ser claro e preciso. c) Deve ser delimitado a uma dimensão viável. O problema formulado de maneira muito ampla torna-se impossível de ser investigado. As vezes, problemas propostos não se encaixam a estas regras. U m caso típico é o dos temas pouco estudados ou muito recentes que carecem de pesquisas exploratórias. Finalmente, a escolha de um problema merece que o pesquisador faça sérias indagações ( R U D I O , 2000): | a) Trata-se de um problema original? b) O problema é relevante? “c) Ainda que seja “interessante, é adequado para mimf d) Tenho hoje possibilidades reais para executar tal estudo? e) Existem recursos financeiros para a investigação deste tema? f) Terei tempo suficiente para investigar tal questão? Formulação de hipóteses As hipóteses são afirmações provisórias ou uma solução possível a res- peito do problema colocado em estudo ( S A N T O S , 2004). Entretanto, as hipóteses não constituem os pressupostos de estudo, porque estes já es- tão confirmados pela literatura, constituindo o acervo de evidências pré- vias sobre a questão (SEVERINO, 2002). Um estudo pode articular uma ou mais hipóteses. Às hipóteses são elaboradas a partir de fontes diversas, tais como a observação, resultados de outras pesquisas, teorias ou mesmo intuição (GIL, 1991). A analogia com 38 ED err as saluções dadas a outros casos comparáveis também constitui um me- canismo de elaboração de hipóteses ( B O U R D I E U ; C H A M B O R E D O N ; P A S S E R O N , 2999). Possui t a m b é m algumas características para ser considerada uma “hi- pótese aplicável” (GIL, 1991): a) Deve ter conceitos claros. Por exemplo, a hipótese de que “as inicia- tivas de E n
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