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FORMAS DE SE PENSAR O TEMPO NO ENSINO DE HISTÓRIA Autor: Emerson Marcelino Alves Silva Coautor: Maykon Douglas Souza Gouveia Graduandos do curso de Licenciatura Plena em História, da Universidade Estadual da Paraíba. emersonmas@outlook.com maikonsousa012543@gmail.com Simpósio Temático 03: CAMINHOS PARA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO: FORMAÇÃO DOCENTE E METODOLOGIAS DO ENSINO DE HISTÓRIA RESUMO O Presente artigo que será apresentado na I SEMANA NACIONAL DE HISTÓRIA DA UEPB: História, Interdisciplinaridades e Cultura, tem como pretensão refletir maneiras possíveis de aprimorar o uso da temporalidade no ensino de história, visto que a metodologia positivista de linha do tempo é cronológica e aos moldes eurocêntricos, que permeia a didática dos professores e está longe da realidade do aluno. Conectando o aluno e sua realidade a grade curricular é compreender que das poucas informações que tem, situa-lo em um tempo distante da sua noção ao invés de ensina-lo, promoveremos uma confusão e com ela muito preconceito para com a disciplina de História. Aproximar o aluno passo a passo, ano letivo a ano letivo, para que entenda fatos do seu cotidiano, e depois, afastá-lo repentinamente a uma temporalidade distante na tentativa de entender os porquês do seu presente é um movimento difícil e gera resultados que podem na verdade instigar o desinteresse pelo próprio futuro. Assimilar o passado é também interpretar o presente e conceber o futuro, esse é o movimento natural da vida. Porque não inverter essa lógica de linha temporal cronológica e linear. Se nossa compreensão de tempo é geralmente crescente, nascemos, passamos pela infância, adolescência, juventude fase adulta, envelhecemos e ao fim falecemos, mas antes do nosso igualitário destino, destinamos muito do nosso tempo revisitando o passado a partir da memória para que essa influa no presente ou até no futuro. Afinal o mundo moderno trouxe o anseio pela preservação das memórias, a necessidade de narrar o passado está presente ao redor dos alunos em filmes, séries e novelas com teor histórico, sendo importante expor aos alunos como a história os cercam e está sempre sendo reapresentada no presente, não somente no passado “obsoleto” e fatigante dos livros didáticos como também sua própria história. É com ela que damos continuidade ao oficio do professor, que para além de uma mera reprodução de conteúdo é lecionar em prol de uma nova história, que não seja meramente decorativa no que diz respeito a ornamentação, mas também no sentido de fixar na memória e que seja proveitoso e usual na rotina do aluno. É a partir dessa visão que pretendemos discutir como essa inversão da linha temporal comumente usada nos livros didáticos pode ser mais inteligível ao aluno, tornando-o crítico e também construtivo, mantando os valores que são aprendidos, mas, na medida do possível, levantando questionamentos e o próprio aluno buscando a solução. Palavras-chave: Ensino. Metodologia. Tempo. Linhas Temporais. Lecionar. mailto:emersonmas@outlook.com mailto:maikonsousa012543@gmail.com 1 INTRODUÇÃO Lecionar é uma atividade que, desde os tempos mais remotos, vem possibilitando e desenvolvendo a evolução humana, notabilizando conhecimentos, até então, não descobertos ou produzidos. A curiosidade pelo desconhecido, o fato de querer explorar o inexplorado, é um movimento que está intrínseco ao ser humano no que implica, na maioria dos casos, uma reflexão sobre si, do tempo vivido e aonde está inserido, gerando uma busca por melhorar sua vida cotidiana. No filme “Os Croods” (2013), numa representação da vida pré-histórica, onde uma família “menos evoluída” interage com outro indivíduo mais versado no conhecimento e experiências, na trama esse sujeito começa a ensinar como poderiam melhorar suas vidas a partir de outras perspectivas práticas do cotidiano. A essa família é proporcionado um descortinar dos seus olhos, introduzindo o “novo” em suas rotinas que lhes renderiam uma melhor compreensão do que antes não conseguiam enxergar. Não seria exagero reproduzir este cenário na educação básica, o professor como o sujeito que instrui a família pré-histórica representada na animação e a família os alunos. Principalmente, quando se trata do ensino de história o aluno ainda não percebe que a história tem implicação direta em sua vida. E como trazer à tona um fato que parece tão distante da sua realidade? Como atrai-lo para perto dessa compreensão fazendo-o participante? Esses são questionamentos vitais onde o discente tem por obrigação refletir sobre as formas de pedagogizar o conteúdo de história. A proposta do artigo é a de esclarecer sobre a temporalidade como instrumento viável ao ensino de História dentro do âmbito escolar, utilizando recursos e métodos para não só cativar o aluno, mas também envolvendo-o e fazendo-o interagir, tornando-o parte da história afastando os preconceitos e o anacronismo. O TEMPO E SUAS INTERAÇÕES NO ENSINO DE HISTÓRIA. Empreender nas futuras gerações a noção do quão necessário é refletir sobre seu tempo, é uma responsabilidade incumbida ao historiador. Perante esse ofício, em específico, estar intrínseco a tarefa do educador. E a está função, respeito e admiração sempre fora atribuída. Exemplo do próprio D. Pedro II que em José Murilo de Carvalho manifesta seu desejo pela profissão, “Alegou que se os brasileiros não o quisessem como imperador iria ser professor” 1 reforçando o quão notável é o valor dado ao profissional do ensino. Os Griots mesmo na figura 1 CARVALHO. 2012, p. 110. 2 de um ancião que estava responsável por manter viva a história da tribo nas sociedades africanas, também exerciam o papel de educadores, levando em consideração que as experiências vividas por eles eram de grande valia, tanto para os jovens, como para a comunidade. Contudo, as dificuldades encontradas no passado, até mesmo hoje no nosso tempo presente, são questões para além do plano físico das quatro paredes da sala de aula, na verdade perpassa, alcançando o lado emocional desses profissionais que por muitas vezes adentram madrugada horas a fio na tentativa de conciliar sua vida individual e os desafios no decorrer do ano letivo escolar. Importante salientar que essas dificuldades possuem braços, e se estendem até o aluno, esse que é receptor tanto do conhecimento passado pelo professor quanto é filtro das adversidades passadas por eles, observam a realidade enfrentada pelos profissionais em momentos tendem a ajudar, outros não demonstram interesse algum. Quanto a rede pública, a má infraestrutura oferecida é um dos fatores que os profissionais sondam meios para contornar, pois é um limitador cruel no emprego de novas perspectivas e métodos para o ensino. O aluno inicia o processo de aprendizagem na infância e se estende até a vida adulta (em menor proporção), e a percepção do tempo e do espaço advém das experiências vividas durante este período, sejam elas experiências de outros sujeitos ou convividas dentro do próprio âmbito familiar. A memória passa a ser construída por intermédio da oralidade ou da observação visual. E essas memórias exercem um papel fundamental de inclusão social, a partir dela revisitamos fatos passados rememorando e perspectivando-o de modo a estabelecer interação com o tempo vivido, que o tempo presente. Afinal, ao lecionar história o professor precisa sondar entraves que estão além das dificuldades físicas do seu ofício, prevendo o comportamento do aluno ao se deparar com o conteúdo abordado, questionando a si mesmo se será de fácil absorção o conteúdo? O aluno tem algum conhecimento prévio? Se sim, como foi construído esse assunto? Se não, como é possível abordá-lo de maneira prática? É com o emprego da memória que aproximamos o aluno da sua própria realidade e existência, respondendomuito dos questionamentos que são construídos pela observação cotidiana do seu próprio meio social. O ensino de História é norteado pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que durante o período da redemocratização é discutido a participação do aluno no processo educacional, como também a necessidade de objetivar alunos que possuam senso críticos, construindo um cidadão ativo e consciente sobre sua realidade, como também a do outro. Todavia, conectar o passado ao presente é uma missão árdua e tempestuosa, tendo em vista a pré-conceituação da disciplina de História como sendo uma disciplina essencialmente 3 informativa, levando uma leitura meramente decorativa, que “só fala de pessoas mortas”, sobre “o que já passou” e isso nada tem a ver com o presente ou a realidade. Levando em consideração, a variedade cultural existente em uma sala de aula onde cada indivíduo presente pensa de um modo e convive em múltiplos meios sociais, o ensino de história tem um grande desafio que é a de estabelecer conexão entre a história e as realidades que cada indivíduo vivencia dentro e fora da sala de aula, principalmente fora, prospectando um ensino que amarre e cative o aluno a compreender questões que tenham aplicabilidade direta ao seu cotidiano, construindo uma noção do tempo dos fatos. Nesta dualidade temporal o aluno apega-se ao tempo cronológico, onde em alguns casos, acabam projetando uma barreira mental que dificulta a interação com o tempo histórico em sua noção de tempo. Imagine uma aula onde o professor aborda temas sobre cultura (material ou imaterial), seria mais interessante ensinar ao aluno que, a cultura é tudo aquilo que o ser humano cria, enfatizando festividades locais, como por exemplo, e após abrir o discernimento do aluno sobre o tema, analisar as grandes festas que estão longe da sua perspectiva habitual, mas que podem ter traços que coincidem com ela. Nesse sentindo, ao aproximar o aluno da noção de um tempo fatídico, propiciara sua inclusão na história narrada, tornando-se participante em sua construção e compreensão. Contudo, é importante ter ciência dos perigos anacrônicos que podem surgir, pois o passado tem suas particularidades que só pertencem a ele e projetar o fato e suas consequências no presente pode se causar uma confluência temporal não existente. O tempo cronológico é demarcado pela contagem linear e progressiva do tempo, cada sociedade lança seu olhar sobre o tempo de forma distinta sendo vital destacar que, por mais que o tempo seja contado ele não é contado da mesma maneira como hoje usamos, dentro de um sistema métrico universal de unidade de medida que por décadas foram sendo aprimoradas. Um exemplo dessa noção temporal é o caso das tribos indígenas que demarcavam sua temporalidade com eventos naturais, cheias e secas do rio, migração das aves, fases da lua, etc. Por mais que o tempo cronológico seja o mais habitual entre o aluno (o tempo do relógio), ele não é o único a ser abordado, assim, no ensino de história as noções de tempo devem unir a cronologia com o tempo histórico que é o marcador das atividades do homem no tempo e espaço. O meio social como bem discute os sociólogos é primordial para a construção do homem, a exemplo dos moldes do Jean-Jacques Rousseau onde afirma que “o homem é bom por natureza. É a sociedade que o corrompe” (ROUSSEAU. 1762.), já que o meio social 4 influencia diretamente na construção da noção de certo e errado, condicionando a tomar decisões com base em valores e crenças construídas pelo seu próprio meio social. A base educacional aplicada no meio escolar, hoje, tem por ênfase no ensino de história a construção de um aluno cidadão, construtor do seu próprio tempo diferenciando-se das diretrizes educacionais pregadas até meados do século XX. Essa realidade distancia-se do ideal de que o ensino de história é a porta de entrada para o questionamento do presente vivido, projetando uma reflexão sobre os erros e acertos do passado. Sob essa análise, o tempo cronológico e o tempo histórico andariam de mãos dadas, levando em consideração que o ensino de história não pode ser meramente factual, e sim explicativa, sintetizando um senso crítico. QUEM SÃO OS OUVINTES? APLICAÇÕES DIDÁTICAS A VIDA COTIDIANA [...] Permita ao indivíduo a indagação sobre o passado de forma que a resposta lhe faça algum sentido no presente e que de alguma maneira esse sujeito encontre uma orientação histórica para a sua vida cotidiana 2. O ambiente escolar inclui livros, sala de aula, diretores, coordenadores, pedagogos, educadores, e o aluno claro, afinal qual seria a função do professor sem o seu educando para fazer sentido ao esforço diário da produção do conhecimento. Mas para além da escola existe todo um universo paralelo ao aluno que o faz pensar e construir sua visão de mundo associada principalmente às noções familiares, ela é essencial para as primeiras impressões de mundo que estão se organizando na mente da criança. Contudo, algumas situações no cotidiano do próprio aluno dificultam sua motivação pela aprendizagem. Quantas vezes a célebre frase: “Estude para ser alguém na vida” já foi dita por um adulto a uma criança na tentativa de incentivá-las a compreender a necessidade de se ter conhecimento para posteriormente alcançar os seus objetivos. Uma frase que por tantas vezes ser dita, em alguns casos, começa a perder seu efeito. Neste contexto a escola tem a função de submergir o aluno no mundo que nos rodea e retirá-lo da inércia e introduzindo-o no caminho do conhecimento. Outro fator que é motivo de reclamação pelos alunos são as aulas desmotivantes principalmente da área de humanas. No caso da disciplina de história, parece irrelevante a um aluno da periferia estudar o período das expedições marítimas sendo que esse nada a ver com a sua realidade, então como é possível alinhar o ensino de história conciliar passado, presente e 2 RÜSEN, 2007. p.133. 5 realidade social? Essa tarefa torna-se complicada, afinal nem tudo na história pode ser relacionado com o presente, daí surge a necessidade de não somente aglutinar passado e presente, como também problematizar questões do passado projetando no aluno um senso crítico e investigativo na busca de solucionar os porquês presentes na história. A história problema tão enfatizada na metodologia de ensino, ao mesmo tempo em que serve de questionamentos a termo ou situações do passado, também pode ser uma reflexão do presente. Um exemplo sobre a história problema pode ser tratado em relação às diferenças raciais vivenciadas em nossa sociedade. Ao salientar essas desigualdades, buscamos entender esse pensamento ao revisitando recortes de tempo, como o tráfico negreiro, atividade essa assegurada pelo pensamento dominado pelo eurocentrismo onde colocava o branco, hétero, cristão e europeu como uma referência e pondo em um local de marginalidade o negro. Visto como um produto que poderia ser trocado ou vendido afinal não se dava nenhum tipo de valor. Essa reflexão faz-se necessária para compreender que muito dos estigmas do passado perpassaram o tempo, sendo presentes até os dias de hoje ao se julgar um livro pela capa, ou seja, ao julgar um ser humano pela sua tonalidade/pigmentação de pele. RELAÇÃO PASSADO-PRESENTE COMO RECURSO DIDÁTICO De acordo com Thompson (1998), as organizações sociais têm diferentes tipos de percepções do passado. Sob essa ótica, as sociedades tradicionais (ou sociedades camponesas) percebem o passado e, também o tempo, de maneira cíclica. Portanto o passado se reconfigura, e “reacontece” em ciclos. Já as sociedades modernas (ou sociedades urbano-industriais) adquiriram uma compreensão linear do tempo. Nesse sentido, nas sociedades modernas, o passado é percebido como algo imutável, perdido no tempo. 3 A visão de que o tempo passado é retrógrado se configuranuma tentativa de desvínculo de noções conservadoras e um convite ao “novo”, mas se analisarmos, para que se haja um “novo”, isto é, uma mudança da mentalidade, é estritamente necessário um intercâmbio de experiências, aprimoramentos feitos com base no passado do outro, contribuindo para um melhor modelo de saber que conflua na interação entre indivíduos e sociedades que pensem de diferente forma, tornando útil e aplicável o conhecimento já aprimorado, e esse movimento é de singular importância para a evolução da sobrevivência humana. Essa percepção de que o 3 FORNECK, Mara Betina. ENSINO DE HISTÓRIA, TEMPO E TEMPORALIDADES: UMA EXPERIÊNCIA DE FORMAÇÃO CONTINUADA COM PROFESSORES DE HISTÓRIA DE ARROIO DO MEIO/RS. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ensino de História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 2017. 6 tempo é cíclico já vem sendo posta à prova, pelo fato de não comtemplar as singularidades da temporalidade, os estratos como Reinhart Koselleck afirma; "Tais estratos permitem, condicionam e limitam as possibilidades das ações humanas e, ao mesmo tempo, as geram." 4. O estudo sobre as singularidades do tempo, esses mesmos estratos auxiliam na análise sobre os fatos, evitando equívocos que podem vir a surgir, atuando como um agente limitante lançando os olhares para os contextos e consequências, aprimorando a visão crítica do aluno. Até meados do século XX, a História tinha o papel de reafirmar a ideia do passado imutável, como se o tempo fosse progressivo e homogêneo, pois essa era as noções habituais sobre o tempo e as utilizavam como ferramenta de ensino, perpetuando durante muito tempo no imaginário social. A afirmação de um tempo imutável, homogêneo e cíclico, nos remete a antigas civilizações, como a egípcia onde o tempo era marcado por um retorno aos mesmos eventos antepassados, e esses eventos eram descritos como se ocorressem pela intervenção dos deuses. Mas de onde será que veio essa compreensão cíclica? A resposta não seria tão simples se não nos remetêssemos a nossa própria experiência de vida, muitos dos nossos familiares ainda preservam noções de tempo que são reações de suas rotinas diárias. Se adentrarmos a cultura tradicional camponesa, nos depararíamos com certo lado místico de antecipar eventos naturais, e que tinha ligação direta quanto ao tratamento com o campo. Para o camponês, o tempo é ressignificado pelos eventos naturais e esses são cíclicos, mesmo no advento do relógio, essa cultura permanece forte até nossos dias e este também faz parte do tempo dos fatos, isto é o tempo histórico, mas não possuem a mesma compreensão. Como nos referenciais teóricos usados por Koselleck, ele afirma: [...] os tempos históricos podem ser distinguidos claramente dos tempos naturais, embora ambos se influenciem reciprocamente. O percurso regular e repetitivo do Sol, dos planetas, da Lua e das estrelas, assim como a rotação da Terra, remetem a medidas temporais constantes - anos, meses, dias e “constelações” -, bem com o à sucessão das estações do ano. Todos esses decursos de tempo foram impostos ao ser humano, mesmo que ele tenha aprendido a interpretá-los e, sobretudo, a calculá-los graças a realizações culturais e intelectuais. 5 Consequentemente, o ato de lecionar, seja ele pelo professor ou até mesmo pela família, está intimamente ligado às experiências vividas, notavelmente a noção de tempo será cíclica, e a partir dessa ideia que pode vir a surgir o anacronismo. O ser humano tende a dar ênfase aquilo 4 KOSELLECK, 2014, p.13. 5 KOSELLECK, 2014, p. 9. 7 que é de prioridade, naturalmente quando ocorrem mudanças climáticas, como na passagem das estações do ano e nos preparamos para aquele evento, nos preparamos porque temos um conhecimento prévio do que a de acontecer, mesmo assim cada inverno, por exemplo, tem suas particularidades e nem sempre são notadas. O historiador precisa recorrer ao uso da metáfora, sendo ela uma ferramenta interessante que proporciona um passeio temporal sem desconstruir a representação por meio do movimento em unidades espaciais 6 que já vivemos. O historiador precisa servir-se dessas metáforas retiradas da noção espacial se quiser tratar adequadamente as perguntas sobre diferentes tempos. A história sempre tem a ver com o tempo, com tempos que permanecem vinculados a uma condição espacial, não só metafórica, mas também empiricamente. 7 Nesse sentido, Immanuel Kant em 1755, ano de publicação da sua obra “Allgemeine Naturgeschichte und Theorie des Himmels” (História Natural Genérica e Teoria dos Céus), fez uma analogia interessante sobre a exuberância das montanhas na transcrição de um fato temporal. Para que se alcance a perfeição, decorrerão milhões e montanhas de milhões de séculos, durante os quais sempre surgirão novos mundos e novas ordens cósmicas nos âmbitos naturais mais distantes. 8 Perceba que ele utiliza um misto de cronologia (séculos), unidades (milhões), metáfora (montanhas de milhões), para intensificar e cativar o leitor a observação dessa perfeição quase “inalcançável” tanto quanto o pico de uma montanha que, às vezes, nem é possível alcançá-lo fitando o horizonte de tão alta que é. Com todo esse esboço teórico, é importante aproximar a leitura temporal do aluno, na perspectiva que ele tem de tempo. Pode não ser uma “montanha”, mas pode ser algo ainda mais próximo do aluno, como o uso de termos regionais em sua fala, a descrição de objetos antigos, cultura familiar e tantos outros meios que podem fazer esse movimento, atraindo o aluno a compreensão histórica. Cainelli e Schmidt (2009) nos traz uma classificação da relação entre passado-presente em duas dimensões. A primeira com a ideia de que o passado ajuda a explicar o presente. Explicar os fatos históricos é um meio eficaz porque torna acessível à compreensão do aluno, mas, que deve ser utilizado com atenção. Alertam sobre a utilização dessa primeira dimensão Cainelli e Schmidt (2009)9, onde “à proporção que o ensino factual predomine sobre o 6 KOSELLECK, 2014, p. 9. 7 KOSELLECK, 2014, p. 9. 8 KANT. 1755. p. 335. 9 CAINELLI. SCHIMIDT. 2009. p. 99. 8 explicativo, há o perigo de se utilizar a inteligibilidade do presente para explicar ou ilustrar o passado e deslizar para o senso comum”. A segunda é a de respeitar a peculiaridade do próprio passado, não significando que os fatos passados devam ser remetidos ao presente. Uma forma de evitar essa confusão na cabeça do aluno, como as autoras apontam, é fazendo-o se interessar por outras civilizações, entendendo suas diferenças e evitando o anacronismo e analogias duvidosas, ensinando-o a contextualizar as informações e incluir-se nela. Ressaltando essa ideia afirmam que “na verdade é importante entender a originalidade de civilizações em que as representações coletivas e a mentalidade não podem ser comparadas as nossas. (CAINELLI. SCHIMIDT. 2009. p. 99). É importante frisar quanto ao uso dessa segunda ideia o seguinte, o aluno precisa entender sua própria realidade, de onde veio e onde está inserido e os porquês disso, e só após essa compreensão de si, partir para conhecimentos externos a sua realidade. Esse movimento acaba fomentando no aluno a alteridade, o respeito, empatia e interesse pelo outro, construindo um discurso que desprivilegie a figura do vencedor e do correto. Essa perspectiva promove um movimento facilitador a compreensão do aluno, principalmente quanto as noções de sucessão, durações, simultaneidade, mudanças e permanências. Tendo em vista que a construção de imagens representativas e os eventos, que dentro de um tempo cronológico são de número limitado, acabam ganhando um reforço no discurso histórico. Imaginemos que fatores biológicos, genéticos e comportamentais já são um grande “fio da meada” para discutir sobre o local social do aluno.Questões como sobrenomes, sotaque e cultura são também elementos que interessam, inserem e cativam a atenção. A compreensão do termo “justiça”, como por exemplo, sempre foi usada por diversos povos, essa como uma das instituições humanas mais antigas, no entanto, a diferença situava-se no senso de justiça, pelas experiencias vividas e observações de si próprios, influenciados pelos modos operantes divinos, essas civilizações criavam um código de conduta a ser seguido, tanto por eles quanto pelas futuras gerações. A essência do termo permanecia, no entanto, as noções do que seria submetido a justiça mudavam de civilização para civilização. Outra questão, são as apropriações, como no exemplo do termo “burguês”, uma classe que surgiu na transição entre a Idade Medieval para a Idade Moderna. O termo é usado para julgar a ação de qualquer indivíduo que esteja ostentando, ou não, um bem recém-adquirido. 9 UTILIZAÇÃO DAS LINHAS TEMPORAIS NO ENSINO DE HISTÓRIA O exercício de construção das noções de temporalidade, em Cainelli e Schmidt (2009) 10 é indicado a partir dos primeiros anos, afirmando que “com alunos dos anos iniciais, por exemplo, atividades de observação de dois objetos iguais, de épocas diferentes, podem ser úteis para desenvolver essas noções.”. Fotos, figuras, ilustrações, filmes, o fato narrado, propriamente dito, palavras-chaves como por exemplo: durante, enquanto isso, por enquanto, são todos instrumentos que podem ser usados em sala de aula. Em Huerta (1999) 11, “a linha do tempo estabelece a relação entre o tempo e seus conteúdos.”. É pela linha temporal que é possível compreender a medida e as mudanças do tempo e fazer relação com as informações. Geralmente, utilizando apenas como suporte pedagógico, os gráficos das linhas temporais têm maior eficácia, salientando que o aluno assimila as imagens e as proporções com maior facilidade. Promovendo a capacidade de identificação histórica, uma visão mais sensível e o aprimoramento da compreensão de fatos que já foram compreendidos no passado. Os calendários, um instrumento a ser utilizado na construção da noção temporal, ajudam-nos a entender a necessidade de relativizar e discutir os períodos, é importante mobilizar o tempo para que haja a compreensão das durações. Como em Braudel (1990), onde as durações são estabelecidas numa divisão tripartite da noção temporal, o primeiro como um tempo estrutural, longo, imóvel e duradouro relacionando com a história das mentalidades; conjunturais e médias, a exemplo da história da vida social, constituído pelas ciclicidade da história e por último episódicas e curtas, como na história das biografias e acontecimentos cotidianos. Muitas vezes, o aluno está limitado as descrições perceptíveis do passado como se esse passado e o próprio presente fossem estáticos e sem interação alguma com o presente, consequentemente não conseguem estabelecer qualquer diálogo. Nos anos iniciais, como aponta Cainelli e Schmidt, o aluno tem a percepção de um passado fixo, a medida que vai sendo trabalhado essa percepção o passado passa a ser melhor interpretado e mais à frente nos últimos anos, esse passado deve tomar um caráter reconstruído e interagido com o presente, ao menos essa é a proposta. Mas essa percepção precisa ser aguçada de modo que primeiramente ele compreenda a sí e seu próprio passado. Como entender a sí e seu próprio passado, a História Local pode ser um ponto de partida, pois já é exercitada no âmbito social e familiar. Depois 10 CAINELLI. SCHIMIDT. 2009. p. 100. 11 HUERTA. 1999. p. 57-59. 10 para entender os contextos da sua localidade a História Nacional pode trazer respostas as peculiaridades do tempo. Adentrando a História Moderna, o aluno passa a entender de onde vieram seus antepassados e quais costumes e cultura trouxeram consigo, já na História Medieval ele entende como questões pertinentes a ele foram construídos e fixados. Por último, o aluno compreende como essa jornada que está intrinsecamente ligada a ele, começou com a Pré- História, como a evolução trouxe peculiaridades importantes a sobrevivência, e que se mantiveram até hoje, no cotidiano desse aluno. CONSIDERAÇÕES FINAIS Compreender a temporalidade e suas particularidades implica na construção da relação entre passado, presente e futuro, isto é, entender a importância do ensinar História promovendo no aluno um reconhecer de tempos distintos, personagens singulares, experiências coletivas, práticas socioculturais, cotidiano e valores que perpassaram milênios e ainda mantem traços preservados (mesmo que fora da vida cotidiana contemporânea). Esses são revisitados pelos alunos de forma imprecisa, sendo necessário a inclusão desse aluno para que perspectivem a temporalidade de modo a evitar equívocos quanto a leitura do tempo. Ao discente é função essencial intermediar essa conexão do tempo vivenciado e tempo contemporâneo com o passado, tendo em vista a unicidade do passado e suas características socio-individualizantes que por si já o distingue do presente, todavia fatos ocorridos nesse contexto adquirem formas enraizadas na sociedade e algumas delas sobressaem ao tempo e configuram ativamente no presente, a exemplo disso, as grandes invenções do período renascentistas que marca um novo olhar para o homem sobre si mesmo e o que se passa ao seu redor. Nesse sentido, a conceituação e compreensão do tempo no ensino prioriza que o alunado situe-se nele e atente as particularidades de cada momento sem deixar de reparar naquilo que respinga sobre o mundo ao qual ele vivencia cotidianamente. 11 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRAUDEL, Fernand. História e ciências sociais. Lisboa: Presença, 1990. CAINELLI, Marlene; SCHMIDT, Maria Auxiliadora. Ensinar História. Editora Scipione: São Paulo, 2009. CAINELLI, Marlene; SCHMIDT, Maria Auxiliadora, Educação histórica, Teoria e pesquisa, Ijuí: Ed.Unijuí, 2011. CARVALHO, José Murilo de. A vida política. História do Brasil Nação (1808-2010), v. 2, p. 83-130, 2012. FORNECK, Mara Betina. ENSINO DE HISTÓRIA, TEMPO E TEMPORALIDADES: UMA EXPERIÊNCIA DE FORMAÇÃO CONTINUADA COM PROFESSORES DE HISTÓRIA DE ARROIO DO MEIO/RS. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ensino de História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 2017. HUERTA, Mireya L. La temporalidad y ias lineas dei tiempo en la ensefianza de ia historia. Iii: TERRAZAS, L. H. G.; HUERTA, Mireya L. Un Reto: La ensnfiana de la historia hoy. México: Instituto Superior de Ciencias de ia Educacíón de Estado de México/Sindicato de maestros ai servicio dei Estado de México, 1999 p. 57-9. ROUSSEAU. Jean-Jacques. Contrato Social, 1762.
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