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Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 7: ENERGIAS DE ORDEM MISTA 1 1. Introdução As energias de ordem mista, também conhecidas como energias de ordem bioquímica e biodinâmica, compreendem determinados grupos de ação produtores de lesões corporais ou de morte analisados na causalidade de dano. Além do seu interesse nas demandas criminais e civis, o tema desperta muito a atenção do capítulo das doenças profissionais e dos acidentes de trabalho. Nesta modalidade de energia, enquadram-se a fadiga, algumas doenças parasitárias e todas as formas de sevícias. Sevícias → Em virtude das várias tipicidades de sevícias: mecânica, bioquímica ou biodinâmica, mais próprio é vê-las no âmbito das energias de ordem mista. Raramente as sevícias mostram apenas uma forma de energia: lesões corporais (mecânica); choque (biodinâmica); inanição (bioquímica). No entanto, mesmo isolando-se um tipo de ação, a vítima não deixa de apresentar grave comprometimento da emotividade, levada pelo terror, medo, revolta, ódio ou submissão. A perícia deve seguir o itinerário das alterações físicas e psíquicas, avaliando não só determinadas lesões isoladas, mas, sobretudo, suas repercussões na economia geral. A natureza jurídica das sevícias é de caráter exclusivamente doloso. 2. Tipos de energias Energias de ordem bioquímica → Inanição Energias de ordem biodinâmica → Choque Energias de ordem mista → Sevícias e autolesões ❖ Síndrome da criança maltratada ❖ Síndrome de alienação parental ❖ Síndrome de Munchausen ❖ Síndrome de Estocolmo ❖ Síndrome do ancião maltratado ❖ Violência contra a mulher ❖ Tortura ❖ Autolesões 3. Síndrome da criança maltratada Ultimamente, vêm-se tornando cada vez mais frequentes a sevícia e os maus-tratos a crianças, que vão desde a prisão e o isolamento em ambientes insalubres até os espancamentos brutais seguidos de morte. Esse conjunto de lesões e agressões é conhecido pela denominação de síndrome da criança maltratada ou síndrome de Silverman (“battered child syndrome”) por ter sido esse pediatra norte-americano que, em 1953, chamou a atenção mais seriamente para um quadro que ele rotulava de trauma esquelético em crianças, de etiologia desconhecida. Também conhecida como síndrome de Caffey-Kamp. A experiência tem demonstrado que 80% desses menores maltratados têm menos de 3 anos e 40% deles são menores de 6 meses, com ligeira predominância do sexo masculino, socialmente carentes e débeis ou retardados. As formas mais comuns de maus-tratos são: a) por omissão – carência física (falta de alimentação e de proteção) e carência afetiva (falta de carinho); b) por ação – maus-tratos físicos, abuso sexual e maus-tratos psíquicos. Maus tratos ❖ Por omissão ➢ Carência física ➢ Carência afetiva Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 7: ENERGIAS DE ORDEM MISTA 2 ❖ Por ação ➢ Maus tratos físicos ➢ Maus tratos psíquicos ➢ Violência sexual Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): ❖ Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. ❖ Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais. ❖ Art. 13. Os casos de suspeita ou confirmação de castigo físico, de tratamento cruel ou degradante e de maus-tratos contra criança ou adolescente serão obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais. (Redação dada pela Lei nº 13.010, de 2014) ❖ Art. 18-A. A criança e o adolescente têm o direito de ser educados e cuidados sem o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante, como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto, pelos pais, pelos integrantes da família ampliada, pelos responsáveis, pelos agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou por qualquer pessoa encarregada de cuidar deles, tratá-los, educá- los ou protegê-los. (Incluído pela Lei nº 13.010, de 2014) ❖ Art. 245. Deixar o médico, professor ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde e de ensino fundamental, pré-escola ou creche, de comunicar à autoridade competente os casos de que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou confirmação de maus-tratos contra criança ou adolescente: ➢ Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência. Ficha de notificação compulsória Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 7: ENERGIAS DE ORDEM MISTA 3 Síndrome de Silverman ❖ Perícia ➢ Atitude da criança ➢ Lesões mais comuns → Hematomas, equimoses, feridas contusas, queimaduras mordidas, desnutrição, lesões genitais por abuso, ruptura de vísceras. ❖ Lesões ósseas ➢ Fraturas transfisárias ➢ Fraturas escalonadas de costelas (praticamente patognomônicas, quando presentes em diferentes fases de consolidação) ➢ Fratura da escápula ➢ Síndrome metafisária de Straus → Arrancamento epifisário ❖ Hemorragia retiniana ❖ Hematoma subdural ❖ Administração intencional de drogas e venenos ❖ Diagnóstico diferencial com outras causas de lesões 4. Síndrome de alienação parental (Síndrome de Medeia) Essa síndrome se caracteriza por alterações e perturbações que podem ocorrer nas crianças quando o pai ou mãe guardião, por motivos injustificáveis, tenta isolá-las gradativamente do outro progenitor. Isso sempre ocorre depois da separação ou do Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 7: ENERGIAS DE ORDEM MISTA 4 divórcio de pais biológicos ou adotivos, embora isso possa ocorrer com avós, tios ou parentes afins. E ainda pode ocorrer até entre pais que não passaram pela separação. Gardner definiu a síndrome da alienação parental como “um transtorno que surge principalmente no contexto de disputas para custódia de crianças”. E diz que o objetivo principal do genitor alienador é a doutrinação da criança em uma campanha de difamação contra o outro genitor e com isso levar vantagem nos Tribunais. Conhecida também como síndrome de Medeia em referência a essa personagem mitológica que mata os filhos depois de saber que o marido irá se casar com outra. Na maioria dos casos a alienação ocorre no âmbito materno tendo em vista que a guarda definitiva é na maioria das vezes dada às mães. Quando o pai é o guardião alienador um dos motivos mais frequentes é o sentimento de vingança pela ruptura do casamento ou as razões que deram motivo à separação. Some-se a isso ainda a participação de familiares nessa ação alienante. O alienador muitas vezes não se apercebe de que suas emoções e reações podem alterar a estrutura psicológica do filho que, em última análise, é o mais prejudicado nessa conturbada relação. Em situações muito raras e graves, quando o genitor alienante não alcança o efeito desejado, pode partir para o desesperado gesto do assassinato do próprio filho. Gardner, em seus estudos, considera os três estágios das alterações e perturbações do filho: ❖ Estágio I → Leve, a motivação principal do filho é conservar um laço sólido com o genitor alienador. ❖ Estágio II → Médio, os filhos, que sabem o que genitor alienador quer escutar, intensificam sua campanha de desmoralização. ❖ Estágio III → Grave, os filhos em geral estão perturbados e frequentemente fanáticos, compartilhando as mesmas reações paranoicas que o genitor alienador tem em relação ao outro genitor. “Um distúrbio infantil, que surge, principalmente, em contextos de disputa pela posse e guarda de filhos. Manifesta-se por meio de uma campanha de difamação que a criança realiza contra um dos genitores, sem que haja justificativapara isso.” Lei 12318 de 2010: “Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.” Presença de um indivíduo alienador Possibilidade de graves danos psicológicos Crime com Lei 12319 de 26 de agosto de 2010 Perícia deve envolver menor, genitores/cuidadores, familiares, responsáveis envolvidos Atendimento pericial multidisciplinar 5. Síndrome de Munchausen É um tipo de transtorno mental em que o paciente, de forma compulsiva, deliberada e contínua, causa, provoca ou simula sintomas de doenças, com a única finalidade de obter cuidados médicos ou assistenciais. Quando retratada pela mãe que assim procede em menores sob sua guarda por considerá-los doentes ou para conseguir a atenção do marido ou de familiares chama-se “síndrome de Munchausen por transferência”. Na maioria das vezes, tal atitude não tem nenhum sentido lógico. Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 7: ENERGIAS DE ORDEM MISTA 5 Trata-se, portanto, de uma “doença crônica factícia (criada artificialmente) com sintomas físicos”. Nessa forma de maus-tratos, a criança é submetida a repetidos exames e quando avaliada observa-se falta de coerência anatomopatológica e ausência de resposta aos tratamentos; as consultas ou hospitalizações são continuadas; e o agressor exibe uma postura de quem é bem relacionado com o menor ou mostra exagerada solicitude a quem trata e cuida. Os sinais mais comuns nessa modalidade de maus-tratos são simulação de sangramento por contaminação da urina ou das fezes, conjuntivites provocadas por substâncias irritantes, sonolência oriunda do uso de barbitúricos ou psicotrópicos, entre outros (in Almada, HR – Maltrato y abuso sexual de menores, una revisión crítica, Granada: Editorial Comares, 2006). Embora possam existir formas as mais variadas, há, no entanto, um perfil aproximado na maioria dos casos: na maioria das vezes o responsável é a mãe, cuja idade está entre 20 e 30 anos; ela é vista como afetuosa, levando a sensibilização das equipes de saúde, e quase sempre apresenta um transtorno psiquiátrico; a criança geralmente é menor de 5 anos. O nome deste mal foi dado como referência ao Barão de Munchausen, um oficial da cavalaria alemã do século 18 que ficou conhecido por contar, nas tabernas que frequentava, histórias fantásticas de sua vida como soldado, caçador e esportista. Paciente de forma compulsiva, deliberada e contínua provoca ou simula sintomas de doenças para obtenção de cuidados médicos ou assistenciais. Síndrome de Munchausen por transferência ou por procuração Agressões para simulações de sinais/sintomas 6. Síndrome de Estocolmo Chama-se de síndrome de Estocolmo um estado psicológico próprio, que determinadas pessoas podem apresentar quando submetidas a um tempo prolongado de sofrimento e intimidação, em que passam a ter uma certa forma de simpatia e afeição pelo seu opressor, inclusive apresentando justificativas diante do agir do agressor. Uma espécie de gratidão para com os seus raptores, principalmente pelo fato de terem sido mantidas vivas e salvas. Este mecanismo não deixa de ser até certo ponto compreensível; em tais circunstâncias, o raptado mostra-se afável com seus agressores como gesto de gratidão e alívio. E, dessa forma, cria-se inconscientemente um mecanismo de defesa que o protege contra o sofrimento e a humilhação. Começa a ser criado, então, um sentimento de identificação e simpatia e até afeição. "Ele me acolheu sob seu manto protetor e me disse: 'Nada vai acontecer com você'. É difícil explicar a pessoas que não passaram por essa situação o quanto isso foi importante para mim. Sentia que alguém se importava comigo. Talvez fosse um tipo de dependência." Pessoas que desenvolvem simpatia e afeição pelo seu agressor Vítima se identifica com seus agressores e possui reações de simpatia e agradecimento inclusive após livre do cativeiro Diferença da Síndrome de indefensividade adquirida 7. Síndrome do Ancião Maltratado Na Inglaterra, aproximadamente em 1975, surgiu pela primeira vez o conceito de ancião maltratado, como uma síndrome de características da violência intrafamiliar. Na maioria das vezes é desconhecido, tornando difícil seu diagnóstico e sua distinção com os acidentes próprios da idade, a exemplo das fraturas, contusões e ferimentos outros, muitas vezes pelo temor de o ancião denunciar seus próprios filhos, parentes próximos e serviçais Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 7: ENERGIAS DE ORDEM MISTA 6 Violência geralmente intrafamiliar, mas pode ocorrer em abrigos e clínicas de idosos Classificação dos maus tratos: ❖ Físicos → Queimaduras, escoriações, fraturas, equimoses ❖ Psíquicos → Agressão verbal, desprezo, isolamento, ameaças ❖ Econômicos → Privação de alimentos, supressão dos bens, mau uso dos recursos Lei nº12.461 de 26 de julho de 2021 8. Violência contra a mulher Na madrugada de 29 de maio de 1983, Maria da Penha foi acordada com um estouro no quarto. Assustada, tentou se mexer, mas não conseguia. Ela havia levado um tiro. Seu primeiro pensamento naquele momento foi: “O Marco [seu então marido] me matou”. O homem foi encontrado pelos vizinhos sentado no chão da cozinha da residência, com o pijama rasgado e uma corda no pescoço. Ele criou uma versão falsa da história: afirmou que quatro assaltantes entraram na residência e tentaram enforcá-lo. (...). Foram meses de resistência para sobreviver à tentativa de assassinato. Após vários exames, ela recebeu uma notícia que mudaria sua vida: não conseguiria mais andar. Logo que retornou para casa, de cadeira de rodas, Maria da Penha viveu outra violência. Marco tentou eletrocutá- la no chuveiro elétrico, mas a vítima conseguiu se salvar a tempo. Mesmo assim, ainda não tinha noção de que vivia ao lado de um assassino. A violência doméstica representa não só a mais dolorosa ocorrência de ordem afetivo sentimental, por atingir o âmago da estrutura familiar, senão também um assunto da mais alta complexidade sob o ponto de vista médico-pericial. Esta não é uma situação nova. Hoje ela se torna mais clara pela oportunidade de denúncia pelos movimentos em defesa dos direitos humanos e pelos movimentos feministas e de defesa da dignidade da mulher. Acrescente-se a isso a evolução econômico-social da mulher na sociedade contemporânea. Sem nenhuma dúvida, tem sido a mulher a maior vítima da violência no meio familiar. Por uma distorção histórica e cultural, as mulheres, principalmente em determinadas regiões de nosso país, sempre foram tratadas com restrições, preconceitos e limites. Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 7: ENERGIAS DE ORDEM MISTA 7 Mesmo que exista uma luta permanente e um sentimento desfavorável a essas posições, pouco tem sido o avanço de suas conquistas sociais. As estatísticas, em geral, atestam que apenas 10% das agressões contra mulheres são denunciadas e sua incidência maior se dá em torno dos 30 anos de idade. E a idade do agressor, em torno de 42 anos. A contribuição pericial nessa forma de agressão é de fundamental interesse para sua efetiva reparação, tanto pela caracterização das agressões físicas com suas mais variadas formas de lesões, como pela avaliação das agressões psíquicas, algumas delas aproximadas da chamada síndrome de estresse pós-traumático. Impacto importante na estrutura familiar Perícia: ❖ Descrever e valorizar todas as lesões ❖ Avaliar danos psíquicos ❖ Estabelecer nexo de causalidade Lei Maria da Penha: Lei 11340 de 7 de agosto de 2006 ❖ Art. 5o Paraos efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial Tipifica e define a violência doméstica e familiar contra a mulher. ❖ Estabelece as formas da violência doméstica contra a mulher como física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. ❖ Determina que a violência doméstica contra a mulher independe de sua orientação sexual. ❖ Determina que a mulher somente poderá renunciar à denúncia perante o juiz. ❖ Ficam proibidas as penas pecuniárias (pagamento de multas ou cestas básicas). ❖ Altera o Código de Processo Penal para possibilitar ao juiz a decretação da prisão preventiva quando houver riscos à integridade física ou psicológica da mulher. ❖ Altera a lei de execuções penais para permitir ao juiz que determine o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação. ❖ Determina a criação de juizados especiais de violência doméstica e familiar contra a mulher com competência cível e criminal para abranger as questões de família decorrentes da violência contra a mulher. ❖ Caso a violência doméstica seja cometida contra mulher com deficiência, a pena será aumentada em um terço. Art. 9º § 3o A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar compreenderá o acesso aos benefícios decorrentes do desenvolvimento científico e tecnológico, incluindo os serviços de contracepção de emergência, a profilaxia das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e outros procedimentos médicos necessários e cabíveis nos casos de violência sexual. Art. 10. Na hipótese da iminência ou da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, a autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência adotará, de imediato, as providências legais cabíveis. Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo ao descumprimento de medida protetiva de urgência deferida. Art. 10-A. É direito da mulher em situação de violência doméstica e familiar o atendimento policial e pericial especializado, ininterrupto e prestado por servidores - preferencialmente do sexo feminino - previamente capacitados. Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 7: ENERGIAS DE ORDEM MISTA 8 Art. 11. No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá, entre outras providências: ❖ II - Encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal; Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal: ❖ VII - Remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério Público. ❖ § 3o Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde. Lei nº 13.931 de 10 de dezembro de 2019 9. Tortura A Convenção da Organização das Nações Unidas contra a Tortura a define como “qualquer ato pelo qual são infligidos, intencionalmente, a uma pessoa, dores ou sofrimentos graves, sejam eles físicos ou mentais, com o fim de obter informações ou uma confissão, de castigá-la por um ato cometido ou que se suspeita que tenha cometido, de intimidá-la ou coagi-la, ou por qualquer razão baseada em qualquer tipo de discriminação”. A Convenção Interamericana para Prevenir e Sancionar a Tortura dá definição mais avançada que está da Convenção da ONU quando define a tortura como “a aplicação, em uma pessoa, de métodos que tendem a anular a personalidade da vítima ou diminuir sua capacidade física ou mental, embora não causem dor física ou angústia psíquica”. Artigo 1º - Para fins da presente Convenção, o termo "tortura" designa qualquer ato pelo qual dores ou sofrimentos agudos, físicos ou mentais, são infligidos intencionalmente a uma pessoa a fim de obter, dela ou de terceira pessoa, informações ou confissões; de castigá-la por ato que ela ou terceira pessoa tenha cometido ou seja suspeita de ter cometido; de intimidar ou coagir esta pessoa ou outras pessoas; ou por qualquer motivo baseado em discriminação de qualquer natureza; quando tais dores ou sofrimentos são infligidos por um funcionário público ou outra pessoa no exercício de funções públicas, ou por sua instigação, ou com o seu consentimento ou aquiescência. Não se considerará como tortura as dores ou sofrimentos que sejam consequência unicamente de sanções legítimas, ou que sejam inerentes a tais sanções ou delas decorram. (Convenção contra a tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes, 1984) Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 7: ENERGIAS DE ORDEM MISTA 9 Art. 5º da CF: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: ❖ III - Ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; Protocolo de Istambul → Orientação proposta pela ONU para investigação e documentação de tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. Maus tratos ❖ Físicos ❖ Morais ❖ Sexuais ❖ Omissivos Atendimento assistencial: profissionais de saúde têm o dever moral de proteger a saúde física e mental ❖ Ação imparcial ❖ Não compartilhamento de informações técnicas para perpetuação da tortura ❖ Uso adequado das técnicas médicas ❖ Fornecimento de relatórios médicos ❖ Respeito ao sigilo profissional ❖ Respeito à dignidade humana ❖ Respeito ao direito de escolha do paciente ❖ Encaminhamento para outros serviços Atendimento pericial: ❖ Atitude diversa do exame assistencial ❖ Que a vítima tenha possibilidade de escolha do gênero do examinador, sempre que possível. ❖ Exame físico detalhado, com descrição detalhada e registro das lesões em fotografias, exames complementares se necessário, sempre que possível, avaliação objetiva e imparcial, com privacidade. ❖ Exame psíquico ❖ Necrópsia: ➢ Identificação, condição geral do cadáver, fenômenos cadavéricos, tempo estimado de morte, meio em que o cadáver se encontrava, causa da morte ➢ Lesões → Local, multiplicidade, cronologia, etiologia ➢ Exame interno → Lesões cranianas e cervicais, toracoabdominais, em extremidades, genitais, ruptura de vísceras, drogas. Conclusões ❖ Inconsistente ❖ Consistente ❖ Altamente consistente ❖ Típica de ❖ Diagnóstico de certeza 10. Autolesões Deve-se levar em conta sempre a necessidade de uma avaliação sobre a possibilidade de uma simulação ou metassimulação de danos caracterizada dentro do chamado autolesionismo, situação não tão rara no cotidiano da prática pericial. Entende-se por autolesionismo um conjunto de lesões, perturbações e alterações causadas pelo próprio Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 7: ENERGIAS DE ORDEM MISTA 10 indivíduo que vão desde as simples escoriações mais superficiais até as mutilações mais graves. Quando essas autolesões existem são na sua maioria de interesse pessoal (afetivo ou material), como forma de chamar a atenção ou culpar alguém. Essa avaliação encerra aspectos muito complexos e por isso exige do perito cuidados especiais tanto no estudo da personalidade do examinado como nas características das lesões. O exame clínico deve ser minucioso e demorado valorizando-se a história contada pelo examinado, principalmente levando-se em conta a coerência ou incoerência de suas informações, sua cooperação ao exame e os seus antecedentes psicossociais.Quando esses autoferimentos existem, no que se refere aos seus elementos físicos constitutivos, são caracterizados por: a) regularidade, direção, multiplicidade, superficialidade e simetria das lesões; b) localização em áreas menos sensíveis. Na maioria das vezes essas lesões são encontradas em regiões alcançadas pela mão direita do autor, quando destro, fato que explica a presença de ferimentos quase sempre na parte anterior do corpo, nos braços, nas coxas e mais raramente no dorso. É também importante analisar o tipo de meio ou instrumento utilizado. Deve-se levar em conta também a existência das chamadas “lesões consentidas”, como aquelas produzidas por terceiros e com o consentimento da vítima, e as “metassimulações”, em que o próprio examinado agrava uma pequena lesão já existente. Em face das repercussões que pode ter o diagnóstico de autolesões, o exame deve ser feito com a atenção redobrada e sempre fundamentado em justificativas técnicas e científicas que não deixem dúvidas quanto às suas conclusões. Lesões causadas intencionalmente pelo próprio indivíduo que podem ter gravidade variável ❖ Autolesão suicida ❖ Autolesão não-suicida Observar → Regularidade, multiplicidade, superficialidade, simetria, localização (áreas mais sensíveis, ao alcance das mãos) Lesões consentidas Lei nº 13.819 de 26 de abril de 2019 ❖ Art. 6º Os casos suspeitos ou confirmados de violência autoprovocada são de notificação compulsória pelos: ➢ I → Estabelecimentos de saúde públicos e privados às autoridades sanitárias; ➢ II → Estabelecimentos de ensino públicos e privados ao conselho tutelar. ❖ § 1º Para os efeitos desta Lei, entende-se por violência autoprovocada: ➢ I → O suicídio consumado; ➢ II → A tentativa de suicídio; ➢ III → O ato de automutilação, com ou sem ideação suicida. ❖ 3º A notificação compulsória prevista no caput deste artigo tem caráter sigiloso, e as autoridades que a tenham recebido ficam obrigadas a manter o sigilo. ❖ Art. 7º Nos casos que envolverem investigação de suspeita de suicídio, a autoridade competente deverá comunicar à autoridade sanitária a conclusão do inquérito policial que apurou as circunstâncias da morte. Crime ❖ Art. 184 CPM → Criar ou simular incapacidade física, que inabilite o convocado para o serviço militar: Pena - detenção, de seis meses a dois anos. Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 7: ENERGIAS DE ORDEM MISTA 11 ❖ Art. 172, § 2º, V CP - destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa própria, ou lesa o próprio corpo ou a saúde, ou agrava as consequências da lesão ou doença, com o intuito de haver indenização ou valor de seguro; ❖ Falso testemunho ❖ Lei 13.968 de 26 de dezembro de 2019; 11. Discussão do caso Henry Borel O garoto chegou cansado e, ao chegar, pediu para dormir na cama do casal, pedido acatado. Por volta das 3h30 da madrugada ao verificar o pequeno, notaram que seu corpo estava gelado e desacordado. O casal ainda tentou realizar respiração boca-a-boca, sem sucesso, deixando o jovem no pronto-socorro. No entanto, o vereador confirmou que não tentou realizar procedimentos de reanimação, alegando que não fazia massagem cardíaca desde a época da graduação em medicina. O pai do garoto, no entanto, desconfiou do caso e, orientado pelos médicos, abriu um boletim de ocorrência. As três médicas pediatras que atenderam o menino na emergência do Hospital Barra D’Or já foram ouvidas e garantiram que ele chegou morto a unidade de saúde e com as lesões externas no corpo. A explicação de Monique e Jairinho foi obtida após 12 horas de depoimento, com a justificativa de que o garoto possivelmente teria ficado em pé na cama e sofrido as lesões após uma queda abrupta no encosto de uma poltrona, caindo no chão Laudo necroscópico ❖ Múltiplos hematomas no abdômen e nos membros superiores; ❖ Infiltração hemorrágica na região frontal do crânio, na região parietal direita e occipital, ou seja, na parte da frente, lateral e posterior da cabeça; Marina Ribeiro Portugal MARINA RIBEIRO PORTUGAL AULA 7: ENERGIAS DE ORDEM MISTA 12 ❖ Edemas no encéfalo; ❖ Grande quantidade de sangue no abdome; ❖ Contusão no rim à direita; ❖ Trauma com contusão pulmonar; ❖ Laceração hepática (no fígado); ❖ Hemorragia retroperitoneal. ❖ O documento informa que a causa da morte foi hemorragia interna, laceração hepática causada por uma ação contundente. “Uma queda de uma altura baixa é pouco provável que esteja na origem dessas lesões traumáticas”, afirmou perito legista Carlos Durão. “Nós observamos esses tipos de lesões em acidentes de trânsito, com muito mais energia” O perito ainda complementou: "Mas acontece que há outras lesões, fígado grave, no rim, pulmão, sangue no abdômen, então, não foi só na cabeça". "A morte dessa criança veio por uma série de lesões universais que provocaram a morte." Já Talvane de Moraes, também ouvida pelo jornal, acrescenta que há lesões em áreas diversas do corpo, “o que uma queda não proporcionaria” “Pode haver equimoses [manchas], mas em regiões onde o corpo colidiu com o chão. Acho difícil colidir com a cabeça, fígado, pulmão, rim e abdômen [de uma vez só], explicou. Os advogados do pai também afirmaram ao UOL que cogitam a possibilidade de contratar um perito particular para realizar uma exumação, de maneira que averigue maiores detalhes sobre as lesões no corpo. A polícia faz, nesta quinta-feira (01/04), a reprodução simulada da morte do menino Henry Borel, de 4 anos. Referências bibliográficas Aula de Dra. Adriana Mello (14/10/2021) Picini, M., Gonçalves, J. R. R., Bringhenti, T., & Forlin, E. (2017). Avaliação de crianças com suspeita de maus-tratos físicos: um estudo de 500 casos☆. Revista brasileira de ortopedia, 52, 284-290. de França, G. V. (2000). Medicina Legal . Grupo Gen-Guanabara Koogan. Kuss, J. C., Lipka, R., Bridi, C. N., Colaço, M. R., & Sanches, C. (2017). A IMPORTÂNCIA DA TRAUMATOLOGIA NA ELUCIDAÇÃO DO CRIME. Extensão em Foco (ISSN: 2317-9791), 5(1). Croce, D., & Júnior, D. C. (2017). Manual de medicina legal. Saraiva Educação SA.
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