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CENTRO UNIVERSITÁRIO FAVENI 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
MOVIMENTOS SOCIAIS NO BRASIL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
GUARULHOS – SP 
 
1 
 
SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 2 
2 MOVIMENTOS SOCIAIS ........................................................................................ 3 
2.1 Teorias sobre movimentos sociais ...................................................................... 6 
2.2 Principais movimentos sociais no Brasil ............................................................. 13 
2.3 Objetivos dos movimentos sociais ...................................................................... 16 
2.4 Conscientização para os movimentos sociais ..................................................... 21 
2.5 Relação entre movimentos sociais, leis e políticas públicas ............................... 25 
3 OS MOVIMENTOS SOCIAIS NA CONTEMPORANEIDADE................................ 28 
3.1 Movimentos sociais e sua formação e desenvolvimento no Brasil ..................... 30 
3.2 Evolução e importância dos movimentos sociais na contemporaneidade .......... 34 
4 ESTADO E CLASSES SOCIAIS ........................................................................... 37 
4.1 O Estado e os seus papéis ................................................................................. 38 
4.2 O Serviço Social e a divisão de classes ............................................................. 41 
5 AS RELAÇÕES ENTRE POLÍTICA SOCIAL E CIDADANIA NO BRASIL ............ 44 
5.1 O que é cidadania? ............................................................................................. 44 
5.2 O desenvolvimento das políticas sociais a partir da concepção de cidadania .... 46 
5.3 Efetivação das políticas sociais: garantia de cidadania ...................................... 48 
6 LUTA E MOBILIZAÇÃO SOCIAL .......................................................................... 50 
6.1 Democracia e cidadania...................................................................................... 51 
6.2 Luta e mobilização social .................................................................................... 54 
6.3 Papel e funções da comunicação nos processos de mobilização ...................... 59 
7 REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 63 
 
 
 
 
 
2 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
Prezado aluno! 
 
O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante 
ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um 
aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma 
pergunta, para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é 
que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a 
resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas 
poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em 
tempo hábil. 
Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa 
disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das 
avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora 
que lhe convier para isso. 
A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser 
seguida e prazos definidos para as atividades. 
 
Bons estudos! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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2 MOVIMENTOS SOCIAIS 
 
Os movimentos sociais apresentam as demandas da sociedade, enfrentadas 
por determinada classe social, que na ação concreta adotam diferentes estratégias 
que variam de simples denúncia, passando mobilizações, marchas, concentrações, 
passeatas, distúrbios à ordem constituída, até atos de desobediência civil, 
negociações etc. Essas ações são capazes de sensibilizar os participantes, pois, “ao 
realizar essas ações, projetam em seus participantes sentimentos de pertencimento 
social. Aqueles que eram excluídos passam a se sentir incluídos em algum tipo de 
ação de um grupo ativo” (GOHN, 2011, p. 336). Para Frank e Fuentes (1989, p. 19), 
os movimentos sociais se apoiam “num sentimento de moralidade e (in) justiça e num 
poder social baseado na mobilização social contra as privações (exclusões) e pela 
sobrevivência e identidade”. 
 
Fonte: www.abrasco.org.br 
Os movimentos sociais podem ser motivados por diversas razões, como a 
insatisfação da sociedade diante dos problemas de gestão dos governos, nas áreas 
de saúde, educação, meio ambiente, entre outras, que causam indignação na 
população fazendo emergir os movimentos e as manifestações populares. Cabe 
destacar que não existe uma definição única na literatura para o termo movimento 
social, mas você verá algumas definições sob o olhar de alguns autores. 
Ferreira (2003) considera os movimentos sociais uma ação coletiva de grupos 
que se organizam com a finalidade de realizar mudanças sociais por meio da luta 
política, compartilhando valores ideológicos e questionando determinada realidade. 
Para Gohn (1995, p. 44) os movimentos sociais são: 
 
4 
 
Ações coletivas de caráter sociopolítico, construídas por atores sociais 
pertencentes a diferentes classes e camadas sociais. Eles politizam suas 
demandas e criam um campo político de força social na sociedade civil. Suas 
ações estruturam-se a partir de repertórios criados sobre temas e problemas 
em situações de: conflitos, litígios e disputas. As ações desenvolvem um 
processo social e político-cultural que cria uma identidade coletiva ao 
movimento, a partir de interesses em comum. Esta identidade decorre da 
força do princípio da solidariedade e é construída a partir da base referencial 
de valores culturais e políticos compartilhados pelo grupo. 
O movimento social é caracterizado pela união de pessoas em torno de um 
objetivo comum, que compartilham valores políticos e culturais, criando, assim, uma 
identidade comum ao movimento. Cabe destacar que dependendo do que se 
pretende, o movimento pode ser composto por diferentes classes e estratos sociais, 
não se baseando apenas na relação contraditória entre capital e trabalho como 
percussores de tais movimentos (GOHN, 1995). 
Para Scherer-Warren (1984), o movimento social deixou de se fundamentar 
apenas no conflito, incorporando uma visão de mundo divergente, na busca pela 
liberdade social e individual. Para a autora, o movimento social é a reunião de pessoas 
que buscam superar os modos de opressão, de forma ativa ou passiva. Já Silva (2001) 
considera o movimento social como um agir por meio de vários procedimentos e um 
pensar por meio de ideias que motivam ou embasam a ação individual e coletiva. 
Dessa forma, você pode entender movimento social como um instrumento que 
possibilita o alcance de objetivos individuais e coletivos, permitindo a superação de 
condições de opressão, possibilitando mudanças sociais e construindo uma nova 
forma de sociedade (MIRANDA; CASTILHO; CARDOSO, 2009). Avritzer (1994) 
afirma que os movimentos sociais não são apenas um simples objeto social, mas sim 
um meio de abordar problemas mais gerais. 
Na realidade, os movimentos sociais sempre existiram e, no Brasil, se 
intensificaram na década de 1970, em oposição ao regime militar, travando uma luta 
social e uma forte resistência à ditadura e ao autoritarismo estatal. Esse período da 
ditadura militar fez os movimentos sociais surgirem com maior efervescência por meio 
de movimentos estudantis, sindicatos, comunidades e pastorais que eram impactadas 
por essa forma de governo, etc. Gohn (2011, p. 23) afirma “que os movimentos sociais 
dos anos 1970/1980, no Brasil, contribuíram decisivamente, via demandas e pressões 
organizadas, para a conquista de vários direitos sociais, que foram inscritos em leis 
na nova ConstituiçãoFederal de 1988”. Assim, os movimentos sociais vêm 
 
5 
 
acompanhando os passos da democracia não só do Brasil, mas de diversas nações 
nas últimas décadas, com presença constante nos acontecimentos históricos 
relevantes, principalmente no que diz respeito às conquistas sociais. Na verdade, 
esses movimentos são uma forma de os cidadãos reivindicarem e terem seus 
interesses e anseios coletivos reconhecidos (GOHN, 2004). 
Nos anos de 1980 é notável a relevância dos movimentos sociais nos avanços 
importantes referentes aos direitos dos cidadãos. Movimentos com foco em questões 
éticas e valorização da vida também surgiram, motivados pela violência, pelos 
escândalos políticos, pelo clientelismo e pela corrupção, levando a população a reagir. 
Nos anos 1990, as intensas mobilizações da sociedade civil culminam no 
impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello, com destaque para os 
“cara-pintadas”, cujo objetivo era o de estabelecer a ética na política. Nos anos 2000, 
os movimentos sociais e a participação popular assumem nova configuração em 
função da globalização, inclusive por meio de organizações não governamentais 
(ONGs), que surgem como uma nova forma de resistência, em substituição aos 
movimentos sociais (MIRANDA; CASTILHO; CARDOSO, 2009). 
Nos dias de hoje, a situação sociopolítica, econômica, cultural e tecnológica é 
diferente da década de 1990, o que faz os movimentos sociais serem diferentes. 
Atualmente, vemos os movimentos sociais acontecerem sob a forma de 
manifestações, marchas e ocupações com o intuito de reagir contra a política e o 
comportamento antiético de muitos políticos. 
Em geral, são promovidos por grupos organizados que se estruturam, 
convocam/convidam e se organizam por meio das redes sociais. O perfil dos 
participantes também se modificou, passando da condição de militante para a de 
ativista; as “marchas” se transformaram em protestos; a participação nos eventos 
acontece eventualmente, conforme a necessidade; e os simpatizantes de determinada 
causa podem se tornar participantes ativos de um novo movimento social. Dessa 
forma, crê-se que os movimentos sociais sempre existirão, uma vez que representam 
forças sociais organizadas que unem as pessoas não como força tarefa, de ordem 
numérica, mas como campo de atividades e de experimentação social, gerando 
criatividade e inovações socioculturais (GOHN, 2004). 
 
 
 
6 
 
2.1 Teorias sobre movimentos sociais 
 
As transformações que vem acontecendo no mundo, nas últimas décadas, têm 
influenciado a motivação dos movimentos sociais, evidenciando que eles não se 
limitam mais à política, à religião ou às demandas socioeconômicas e trabalhistas, 
mas também acontecem por motivos de reconhecimento, de identidade e culturais, se 
destacando ao lado de movimentos sociais globais. Portanto, os movimentos sociais 
no novo milênio deparam-se com novas demandas, novos conflitos e novas formas 
de organização, gerados pelos efeitos da globalização, em suas múltiplas faces 
(GOHN, 2008). 
 
Fonte: www.revistaensinosuperior.gr.unicamp.br 
O tema movimento social é motivo de vários estudos e, por isso, existem muitas 
e amplas abordagens teóricas com eixos analíticos, como as que você verá a seguir 
(GOHN, 2008). 
- Culturais: relacionados à construção de identidades atribuídas ou adquiridas, 
em que os diferentes tipos de pertencimentos são fundamentais em um determinado 
contexto. As ações nascem de processos reflexivos entre os participantes que criam 
vínculos e constroem sentidos e significados para suas ações coletivas. 
- Da justiça social: com foco em questões relacionadas ao reconhecimento de 
diferenças e desigualdades e de redistribuição de bens ou direitos, como 
recompensas às injustiças acumuladas ao longo da história. Abordagens sustentadas 
pelas teorias críticas. 
 
7 
 
- Capacidade de resistência dos movimentos sociais: com foco em 
questões como autonomia, formas de lutas a favor da construção de um novo mundo, 
de novas relações sociais e da luta contra o neoliberalismo. Essa abordagem critica a 
luta pela emancipação e cidadania por meio de políticas públicas que visam à 
integração social, ao consenso e à participação. 
- Institucionalização das ações coletivas: preocupa-se com a criação de 
vínculos e redes de sociabilidade entre as pessoas e seu desempenho em instituições, 
organizações, espaços segregados, associações, entre outros. É uma abordagem 
baseada nas teorias da privação social. 
São muitas as teorias que tentam explicar o fenômeno dos movimentos sociais. 
Você verá a seguir a TMR, a TPP e a TNMS. 
A TMR surgiu motivada pelas transformações políticas que ocorreram na 
sociedade norte-americana nos anos de 1960. Movimentos como os dos direitos civis, 
contra a guerra do Vietnã e os do feminismo levaram à elaboração da TMR. Essa 
teoria enfatiza que os movimentos sociais resultam da união de grupos que 
compartilham os mesmos interesses e, em ação coletiva, buscam estratégias para 
alcançar seus objetivos. Os autores mais importantes da primeira fase dessa teoria 
foram Olson, McCarthy e Zald (1965, 1973 e 1977). McCarthy e Zald eram contra o 
funcionalismo e defendiam movimentos, como os dos direitos civis nos Estados 
Unidos, por terem sentido e organização. Opunham-se também às versões 
economicistas do marxismo, argumentando que insatisfações e motivos para a 
mobilização, de qualquer natureza, sempre existirão, sendo insuficientes para explicar 
a formação de mobilizações coletivas. 
Dessa forma, mais importante que identificar as razões seria explicar o 
processo de mobilização. A decisão de agir seria por vontade individual, resultando 
da reflexão racional entre custos e benefícios e, a ação coletiva só seria viável se 
houvessem recursos financeiros e infraestrutura; ativistas e apoiadores e organização, 
ou seja, coordenação entre indivíduos, em forma de associações ou estruturas 
comunitárias, que seriam a base organizacional para os movimentos sociais (GOHN, 
1997; ALONSO, 2009). 
A TMR aplicou a sociologia das organizações no estudo dos movimentos 
sociais fazendo analogia com uma organização. Os movimentos sociais vão se 
burocratizando conforme a racionalização da atividade política, criando normas, 
 
8 
 
hierarquia interna e divisão do trabalho, especializando seus participantes como 
gerentes, administradores de recursos e coordenadores das ações (McCARTHY; 
ZALD, 1977). Dessa forma, quanto mais longos, mais burocratizados eles vão se 
tornando. Além disso, essa longevidade estaria condicionada à capacidade de os 
movimentos sociais vencerem a concorrência, pois vários movimentos podem ser 
constituídos em torno de um mesmo tema, formando uma “indústria de movimento 
social”, na qual, além da cooperação, há também competição em torno de recursos 
materiais e de participantes a serem atraídos para um mercado de consumidores de 
bens políticos. Assim, surgiriam os conflitos internos, resultando em formação de 
facções, rompimento de movimentos grandes e formação de subunidades acerca de 
uma mesma causa, ou seja, apenas sucesso os movimentos que possuíssem 
características de uma organização formal hierárquica (GOHN, 1997; ALONSO, 
2009). 
Olson (1965) tem sua teoria focada nos indivíduos, estudando os grupos de 
interesse em vez dos movimentos sociais. Para ele, é muito mais fácil organizar 
interesses coletivos em grupos compostos por muitos membros do que em grupos 
pequenos, destacando a importância do papel dos líderes organizadores desses 
interesses. 
Na TMR, as ações coletivas são analisadas sob a “perspectiva da relação 
custo/benefício, excluindo valores, normas, ideologias, culturas dos movimentos 
sociais estudados” (SILVA, 2001, p. 20). É uma teoria que compara os movimentos 
sociais a um fenômeno social com características de uma organização formal. Por 
esses e outros motivos, foi uma teoria que recebeu críticas devários autores, entre 
elas o fato que excluía valores, normas, ideologias, projetos, cultura e identidade dos 
grupos sociais estudados (COHEN, 1985) e que possuía uma visão burocrática dos 
movimentos sociais (FERREE, 1992). 
Com o evento da globalização, a TMR entrou em uma nova etapa, ampliando 
seu campo explicativo, com ênfase no desenvolvimento do processo político no 
campo da cultura e na interpretação das ações coletivas. Nessa nova fase, podemos 
destacar os trabalhos teóricos de autores como Klandermas; Friedman; Tarrow; Taylor 
e Whitter; Traugott; entre outros (GOHN, 1997). 
A TPP nasceu de debates marxistas sobre as possibilidades da revolução, e 
protestava contra explicações deterministas e economicistas da ação coletiva e contra 
 
9 
 
a ideia de um sujeito histórico universal. É uma teoria que rejeita a economia como 
explicação chave e combina política e cultura para explicar os movimentos sociais, 
considerando a coordenação dos ativistas como fundamental na construção de atores 
coletivos que se formam durante o processo de contestação. Essa coordenação é 
condicionada à solidariedade, que resulta da combinação do sentimento de 
pertencimento a uma categoria e da densidade das redes interpessoais que vinculam 
os membros do grupo entre si (TILLY, 1978 apud ALONSO, 2009). No entanto, a 
solidariedade só gera ação se puder contar com estruturas de mobilização como 
recursos formais (organizações civis) e informais (redes sociais, que favorecem a 
organização). Dessa forma, a solidariedade entre um grupo e o controle coletivo sobre 
os recursos necessários para sua ação são criados pelo processo de mobilização. 
 
Fonte: www.engenheiropassos.com 
Nessa teoria a mobilização tem por base o conflito entre Estado e sociedade, 
em que é possível que as posições variem e os atores migrem entre elas. Por isso, é 
preciso superar as barreiras estabelecidas sobre a definição de “Estado” e “sociedade” 
como duas entidades coesas e monolíticas. ATPP considera o Estado como detentor 
do poder, membros da política possuem, portanto, controle ou acesso ao governo que 
rege uma população; e a sociedade civil como desafiante, que busca ter influência 
sobre o governo e acesso aos recursos controlados pela política. Dessa forma, na 
TPP, o movimento social é definido como uma interação contenciosa, envolvendo 
 
10 
 
necessidades recíprocas entre sociedade (desafiantes) e Estado (detentores do 
poder), em nome de uma população sob litígio (TILLY, 1993 apud ALONSO, 2009). 
A ênfase na teoria da mobilização política e o esforço para inserir aspectos 
culturais e ideológicos, mesmo que limitadamente, são características fundamentais 
da TPP, e as oportunidades políticas e os frames são suas categorias mais relevantes 
(CORRÊA; ALMEIDA, 2012). 
As oportunidades políticas referem-se a fatores externos à sociedade civil que 
influenciam a capacidade de mobilização e recrutamento de grupos sociais, ou seja, 
são dimensões do contexto político capazes de estimular ou desestimular as pessoas 
a participarem de ações coletivas. A ideia central é muito simples: quando as 
estruturas de oportunidade política reduzem os custos da participação, há mobilização 
social (TARROW, 1994 apud RENNÓ, 2003). Para Goffman (1974), os frames dizem 
respeito à forma como os indivíduos dão significado a suas experiências e ações, ou 
seja, como eles percebem a realidade e, enquanto atores dos movimentos sociais, 
elaboram seu entendimento sobre justiça/injustiça, moral/imoral, tolerável/intolerável, 
que influenciam em sua motivação para se mobilizar (CORRÊA; ALMEIDA, 2012). 
Essa teoria foi amplamente criticada por Goodwin (1996), que considera a tese 
das oportunidades políticas confusa e imprecisa, com resultados repetitivos e sem 
nada novo, ambíguos e insuficientes. O autor criticou ainda os conceitos de frame e 
estruturas de mobilização destacando que aspectos culturais são excluídos, reduzindo 
a compreensão da cultura a uma perspectiva instrumental e trabalhando apenas com 
movimentos que a auxiliam na área da contracultura (GOHN, 1997). 
Em relação à cultura, a TPP abriu espaço para ela por meio do conceito de 
repertório. Para Tilly (1995, p. 26), repertório é um “conjunto limitado de rotinas que 
são aprendidas, compartilhadas e postas em ação por meio de um processo 
relativamente deliberado de escolha”. Assim, os atores escolhem quais as formas de 
interação mais adequadas aos seus propósitos, isto é, eles atribuem o sentido às 
formas, que podem ser tanto de contestação como de reiteração da ordem. 
A TNMS possui foco nas mudanças de ordem cultural e diz respeito a 
movimentos sociais dos ambientalistas, das mulheres, pela paz e outros. Os novos 
movimentos se opõem às práticas e aos objetivos dos velhos movimentos sociais 
organizados a partir do mundo do trabalho, ou seja, se opõem ao movimento operário-
sindical (GOHN, 1995). Os novos movimentos sociais possuem foco em questões que 
 
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vão além do conflito de classes, envolvendo questões culturais. Esses movimentos 
surgiram em meados do século XX e têm como objetivo atuar como complemento às 
lutas de classes dos movimentos clássicos, como alternativa aos movimentos de 
classes tradicionais e como alternativa aos partidos políticos de esquerda. Assim, os 
novos movimentos sociais poderão surgir como complemento ou como oposição aos 
partidos políticos de esquerda e aos movimentos de classes tradicionais. Os novos 
movimentos sociais ganharam força na década de 1970 com as lutas sindicais contra 
a divisão hierárquica do trabalho (MONTAÑO; DURIGUETTO, 2010). É nesse mesmo 
período que os novos movimentos sociais surgem, como o movimento mundial de 
protesto contra a guerra dos Estados Unidos no Vietnã, pelos direitos civis dos negros 
nos no mesmo país, movimentos feministas e urbanos, entre outros (MONTAÑO; 
DURIGUETTO, 2010, p.265). 
São características fundamentais dos novos movimentos sociais, as 
mobilizações situadas fora do contexto do trabalho e da reprodução da força de 
trabalho, destacando o não envolvimento de seus protagonistas nas formas de 
organização e com a ideologia do movimento operário, de forma direta, e sua postura 
contra Estado e partidos políticos revolucionários. Assim, os novos movimentos 
sociais surgem de novas demandas da sociedade contemporânea que requerem 
respostas diferenciadas. 
Outras características dos novos movimentos sociais são seus valores 
antimodernistas; suas formas de ação não convencionais; sua formação, por grupos 
marginalizados pelo status quo vigente ou sensíveis aos resultados do capitalismo; as 
novas aspirações e a satisfação de necessidades que se colocam em risco frente às 
exigências da burocratização e o aumento da industrialização, rompendo laços 
tradicionais e estruturas de lealdade existentes. Como resultado tem-se maior 
receptividade às novas visões sobre novas utopias sociais (ALONSO, 2009). 
Os novos movimentos sociais se preocupam em garantir direitos sociais que já 
existem ou que ainda deverão ser conquistados, por meio da mídia e de atividades de 
protestos visando à mobilização da opinião pública a seu favor, para pressionar os 
órgãos e as políticas estatais. Dessa forma, se valendo de ações diretas, buscam 
mudar os valores dominantes e as situações de discriminação, principalmente dentro 
de instituições da própria sociedade civil (PONTES, 2015). 
 
12 
 
Uma crítica a essa teoria é que ela apresenta novidades na prática histórica 
dos movimentos, no entanto, utiliza categorias que não permitem explicar de forma 
clara as novas formas de processo social, uma vez que partem dos resultados nos 
quais a identidade coletiva é sua maior expressão, é a categoria mais relevante na 
análise da TNMS. Assim, essa teoria fez uso do binômio causa e efeito, sem se 
aprofundar no conjunto de processos que formam os movimentos sociais. Extraiu da 
política a questãoda ideologia, mas não abordou o caráter dessas representações 
coletivas, como parte de projetos políticos mais abrangentes. Dessa forma, as 
análises possuem lacunas em certos aspectos da realidade que podem não se 
relacionar com as formas empíricas em um dado momento histórico. Tanto os códigos 
culturais como a identidade coletiva são produtos do movimento social, que é um 
processo de articulação de ações coletivas (PONTES, 2015). 
 
Fonte: www.correiodobrasil.com.br 
Alguns dos autores dessa teoria não fazem distinção entre velhos e novos 
movimentos, portanto, essa distinção é criada com base em análises sobre questões 
culturais, ideológicas, de consciência, crença, micromobilização e solidariedade, com 
foco principalmente no papel que os processos de construção de identidades coletivas 
desempenham na formação dos movimentos (LARAÑA, 1999). São autores dessa 
teoria Alain Touraine, Jurgen Habermas, Alberto Melucci e Claus Offe. 
Podemos dizer que as três teorias sobre movimentos sociais aqui apresentadas 
possuem formas bastante particulares. A TMR focou na dimensão micro 
organizacional e na estratégica da ação coletiva; a TPP focou o ambiente 
macropolítico, incorporando a cultura na análise e utilizando o conceito de repertório, 
 
13 
 
mesmo que de forma limitada; e a TNMS focou em aspectos simbólicos e cognitivos 
e nas emoções coletivas incluindo-os na própria definição de movimentos sociais, 
dando menor importância ao ambiente político em que ocorrem as mobilizações e aos 
interesses e recursos materiais envolvidos nela. 
Na dimensão histórica, o desenvolvimento da TPP reduziu o espaço da TMR e 
logo a derrubou; a TNMS continuou a existir e desenvolveu-se para além da Europa. 
Ainda assim, o debate entre a TPP e a TNMS, foi essencial para estabelecer 
consensos (ALONSO, 2009). 
 
2.2 Principais movimentos sociais no Brasil 
 
No Brasil, os movimentos sociais ganharam força e destaque a partir da década 
de 1960 contra o regime militar. No entanto, a sociedade brasileira é marcada por lutas 
e movimentos sociais desde os tempos do Brasil colônia, por movimentos contra a 
dominação, a exploração econômica e a exclusão social, como as lutas de índios, 
negros, brancos, mestiços pobres e brancos da camada média, influenciados pelas 
ideologias de libertação, contra a opressão dos colonizadores europeus. 
Veja os movimentos com maior destaque no Brasil colônia e na fase do Império 
até o século XX (GOHN, 2000): 
 Zumbi dos Palmares (1630-1695); 
 Inconfidência Mineira (1789); 
 Conspiração dos Alfaiates (1798); 
 Revolução Pernambucana (1817); 
 Balaiada (Maranhão, 1830-1841); 
 Revolta dos Malés (1835); 
 Cabanagem (1835); 
 Revolução Praieira (1847-1849); 
 Revolta de lbicaba (1851); 
 Revolta de Vassouras (1858); 
 Quebra-Quilos (1873); 
 Revolta Muckers (1874); 
 Revolta do Vintém (1880); 
 Canudos (1874-1897). 
 
14 
 
Com a chegada da República, o cenário social se modifica, substituindo a mão 
de obra escrava pela mão de obra assalariada. O modo de produção também se altera 
com o início, ainda incipiente, da industrialização e com o proletariado urbano. 
Surgem, então, as organizações de luta e resistência dos trabalhadores por meio de 
ligas, uniões, associações de auxílio mútuo etc. Veja alguns movimentos ocorridos 
nas duas primeiras décadas do século que reivindicavam serviços urbanos ou 
protestavam contra políticas locais (GOHN, 2000): 
 Revolta da Vacina (1905); 
 Revolta da Chibata (1910); 
 Revolta do Contestado (1912); 
 Ligas contra o analfabetismo (1915). 
 
Entre os movimentos ocorridos na década de 1930 estão (GOHN, 2000): 
 Movimento dos Pioneiros da Educação (1931); 
 Marcha Contra a Fome (1931); 
 Revolução Constitucionalista de São Paulo (1932); 
 Revolta do Caldeirão no Ceará (1935); 
 Criação da Aliança Libertadora Nacional (1935); 
 Movimento Pau de Colher (1935). 
 
No período entre 1945 e 1964 muitas lutas e movimentos sociais aconteceram 
no cenário de redemocratização do país, aliados a um cenário internacional de 
desenvolvimento da sociedade de consumo e à política da Guerra Fria entre Estados 
Unidos e ex-União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, as potências mundiais na 
época. 
Entre os anos de 1961 a 1964 os seguintes movimentos podem ser destacados 
(GOHN, 2000): 
 Ligas Camponesas do Nordeste; 
 Movimento dos Agricultores Sem-Terra (MASTER), no Sul do país; 
 Movimento de Educação de Base (MEB); 
 Círculos Populares de Cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes 
 (UNE). 
 
15 
 
A partir de 1974 o país entra em crise e os movimentos sociais ressurgem. 
Entre 1978-1979 tivemos os seguintes (GOHN, 2000): 
 Associação Nacional de Movimentos Populares e Sindicais (ANAMPOs); 
 Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT); 
 Central Única dos Trabalhadores (CUT); 
 Confederação Nacional das Associações de Moradores (CONAM). 
 
Em 1984, o movimento “Diretas Já” marca a história sociopolítica do Brasil. 
Entre os anos de 1984 e 1988, o país se mobiliza em prol de uma nova Constituição. 
Os anos de 1990 foram marcados pelo capitalismo globalizado que se espalhou pelo 
mundo, foram tempos marcados pelo desemprego, reestruturações no mercado de 
trabalho, flexibilização dos contratos, reformas, etc., com destaque para o movimento 
dos “cara-pintadas”. 
 
Fonte: www.marcelocoruja.blogspot.com 
Nos anos 2000 os movimentos sociais retornam ao cenário da política nacional 
com força total. De lá para cá, podemos citar os seguintes movimentos (GOHN, 2000): 
 Movimentos dos índios; 
 Via Campesina; 
 Movimento Passe Livre; 
 Movimentos Brasil Livre. 
 
16 
 
Em um sistema democrático, a sociedade está em constante construção, por 
meio da participação cidadã. Dessa forma, os movimentos sociais, no Brasil e no 
mundo, expressam esse esforço de construção social a partir da atuação coletiva dos 
indivíduos. Nesse contexto, os movimentos sociais possuem relevância para a 
sociedade civil, enquanto instrumento de manifestação e reivindicação. Movimentos 
como dos negros, feminista, ambientalistas, da causa operária, estudantis, LGBT e 
outros, centralizam-se em algumas regiões específicas, no entanto, outros 
movimentos, estimulados pelo processo de globalização e pela disseminação da 
informação e meios de comunicação, rompem fronteiras geográficas, em razão da 
natureza de suas causas, ganhando adeptos por todo o mundo, como é o caso do 
Greenpeace. 
A necessidade de os movimentos sociais contarem com uma organização bem 
desenvolvida e planejada, demanda a mobilização de recursos e pessoas realmente 
comprometidas. Assim, você pode concluir que os movimentos sociais não se limitam 
a manifestações públicas, contando também com organizações que atuam com a 
finalidade de alcançar seus objetivos políticos, o que significa que há uma luta 
constante e em longo prazo, de acordo com cada causa que se quer defender. 
 
2.3 Objetivos dos movimentos sociais 
 
Os movimentos sociais envolvem grande complexidade em decorrência de 
suas características próprias e específicas, além de seu vínculo com todo um conjunto 
de relações sociais e sua formação social em uma sociedade também complexa. 
Nesse contexto, as teorias sobre os movimentos sociais necessitam de amplo 
desenvolvimento e, cada novidade teórica que ajude a compreender esse fenômeno, 
traz consigo novas questões a serem analisadas e novos problemas que devem ser 
abordados e resolvidos. Dessa forma, o estudo sobre movimentos sociais ainda 
necessita de desenvolvimento em diversas questões, sendo um processo sem fim 
(VIANA, 2016). 
Uma dessas questões se refere aos objetivos dos movimentos sociais. 
Pesquisadores dos movimentos sociais já realizaram alguns estudos sobre o tema, 
mas, de forma superficial ou descritiva, com abordagens ingênuas e com pouca 
criticidade, ou seja, de maneira oposta ao que deve ser,pois, para que os movimentos 
 
17 
 
sociais sejam compreendidos, bem como qualquer outro fenômeno que se queira 
estudar, é necessário um estudo realizado a partir de uma abordagem crítica e geral. 
Essa questão sobre objetivos dos movimentos sociais, talvez uma das mais 
importantes nesse contexto, ainda é pouco discutida, o que causa certo 
estranhamento, uma vez que sem objetivo não existe movimento. 
Grande parte dos estudos sobre movimentos sociais apresenta o objetivo sem 
análise ou problematização e, outras vezes, apenas o colocam de modo superficial ao 
lado de outras questões. O mais comum é a apresentação do objetivo como sendo a 
“mudança social”, de forma generalizada. Essa é uma visão hegemônica, que, apesar 
de superficial, é muito utilizada no contexto dos movimentos sociais. A ideia de 
mudança social equivale à ideia de transformação social, que na verdade significa 
substituir uma forma de sociedade por outra, dando um caráter revolucionário para os 
movimentos, o que não corresponde à realidade (BOTTOMORE, 1981; TOURAINE, 
1997). Alguns sociólogos enxergam a mudança social como uma simples alteração 
de algum aspecto da realidade social, reproduzindo uma ideologia em vez de produzi-
la. 
Você já se perguntou qual é ou quais são os objetivos dos movimentos sociais? 
A importância do objetivo dos movimentos sociais fica evidente no conceito desse 
fenômeno, considerado por Viana (2016) como ações coletivas compartilhadas por 
grupos sociais que se originam de situações que causam insatisfação, sentimento de 
pertencimento e possuem um objetivo a ser perseguido, sendo este um dos elementos 
que definem um movimento e que não pode ser deixado em segundo plano. Portanto, 
um movimento social surge motivado pela insatisfação gerada por determinada 
situação, que é sentida pelo grupo atingido, gerando um sentimento de pertença e o 
objetivo que provoca a mobilização. Dessa forma, o objetivo é a meta a ser alcançada 
e a razão de ser do movimento social, justificando a mobilização. O objetivo então 
existe para que ações sejam implementadas, visando transformar uma situação 
problemática. Nesse contexto, o objetivo visa a uma transformação situacional. 
Viana (2016) considera que a transformação situacional pode assumir um 
estado defensivo, que busca manter a situação impedindo que ocorram mudanças 
prejudiciais, ou a volta da situação social anterior, sem que as mudanças tenham 
ocorrido; já o estado ofensivo, busca modificar determinada situação social que causa 
insatisfação em seu grupo social de base. Você pode entender o primeiro caso como 
 
18 
 
uma conservação e não uma transformação da situação. No entanto, o autor 
considera que, ainda assim, existe um elemento de transformação que é a ação contra 
tendências, atos, posições, etc., de outros grupos, do Estado, etc., que pode gerar a 
mudança que se quer evitar e que se considera prejudicial. Dessa forma, a 
transformação situacional defensiva só terá sentido se houver alguma mobilização na 
sociedade que ameace a continuidade daquilo que se quer manter. 
Transformação situacional e transformação social são ações distintas. A 
transformação situacional diz respeito à situação do grupo social ou situação 
relacionada a outros grupos. No entanto, se o grupo social que gera o movimento 
considerar que sua transformação situacional só é possível com uma transformação 
social, o que na maioria dos casos é verdadeiro, então se tem um objetivo de 
transformação situacional e social. 
A transformação situacional pode ser conservadora, o que significa retomar 
uma situação existente anteriormente ou impedir que as reivindicações do grupo 
social oposto se mantenham. É reformista e visa à mudança da situação do grupo 
social e revolucionária, pois acontece simultaneamente a uma transformação social, 
uma vez que somente com uma mudança radical da situação é que pode surgir uma 
nova sociedade em substituição da atual, sendo um processo que efetiva a resolução 
do problema do grupo social. A transformação social, por sua vez, significa uma 
revolução que atinge a toda a sociedade, caracterizando-se como uma mudança 
radical, por exemplo, a passagem do feudalismo para o capitalismo (VIANA, 2016). 
Observe um exemplo dos tipos de transformações na Figura 1. 
 
19 
 
 
 
Agora que você já viu alguns elementos que podem ajudá-lo a compreender os 
objetivos dos movimentos sociais, reflita: como os objetivos são formados? De que 
forma eles podem ser identificados? Como se materializam? 
Os objetivos se formam motivados pela insatisfação em relação a alguma 
situação indesejada, que gera um objetivo individual em determinados indivíduos de 
um grupo que, tomados pelo sentimento de pertencimento, compartilham com seu 
grupo social, por considerar que se trata de um problema coletivo, do grupo todo. 
Sendo um problema de todos, gera um objetivo coletivo que irá gerar uma 
mobilização. Dessa forma, temos um movimento social (VIANA, 2016). 
Um aspecto fundamental para que os objetivos se concretizem é que todos 
possuam interesses comuns. Nos movimentos sociais estão presentes interesses 
pessoais e grupais, sendo estes últimos os que movem o grupo na mesma direção. 
Cabe destacar que interesses divergentes dentro do grupo social ou a predominância 
de interesses pessoais sobre os interesses coletivos podem causar situações 
constrangedoras dentro dos movimentos sociais, como a formação de um subgrupo 
com a finalidade de lutar por benefícios pessoais em vez de lutar pela solução do 
problema do grupo social. O interesse pessoal pode fazer com que o indivíduo resolva 
seu problema de forma individual, usando o movimento para essa finalidade ou 
abandonando a luta do grupo, entre outros. 
 
20 
 
Viana (2016) alerta que nos movimentos sociais conservadores o interesse 
pessoal coincide com o interesse do grupo, não havendo contradição. No caso das 
tendências conservadoras e reformistas dos movimentos sociais reformistas, existem 
contradições, mas são encobertas por ideologias, doutrinas, etc. No caso de 
movimentos sociais com tendências revolucionárias, os interesses pessoais podem 
ser incompatíveis com o interesse grupal, motivando o abandono da luta ou sua 
substituição por formas oportunistas. Há de se ter cuidado, pois muitos indivíduos 
focados em interesses pessoais tendem a gerar o oportunismo nos movimentos 
sociais. No entanto, indivíduos voltados aos interesses fundamentais tendem a 
reforçar os interesses do grupo. 
Para identificar o objetivo de um movimento social é importante distinguir 
objetivos reais e objetivos declarados, que possibilitam verificar se há diferença entre 
os objetivos que constam nos discursos e os que são efetivos, chamando a atenção 
para uma possível dicotomia entre eles. Se uma organização mobilizadora tem como 
objetivo a defesa do meio ambiente e busca garantir sua preservação, temos o seu 
objetivo declarado. No entanto, é preciso verificar se esse objetivo é real, ou seja, é o 
objetivo verdadeiro e efetivo de tal organização. 
Etzioni (1976) recomenda que os gastos sejam analisados, bem como as 
despesas com recursos e energia da organização, pois se há um gasto maior para 
sua manutenção do que com a mobilização em defesa do meio ambiente, então há 
uma dicotomia entre objetivo real e declarado. Caso a situação seja inversa, ou seja, 
se os gastos forem inferiores e as energias e recursos forem voltados para a 
preservação ambiental, então objetivos reais e declarados estão em equilíbrio. Claro 
que existem outros aspectos a serem considerados, mas a partir dessa comparação 
já é possível verificar se há ou não compatibilidade entre discurso e ação efetiva 
(ETZIONE, 1976). 
Outra forma de identificar os objetivos é por meio da análise do 
desenvolvimento histórico do movimento social e suas ramificações. Entender as 
ramificações é fundamental para compreender qualé o objetivo que predomina no 
interior do movimento, lembrando que uma organização mobilizadora pode 
inicialmente apresentar um objetivo e, posteriormente, alterá-lo devido a mudanças 
de hegemonia na sociedade civil, nos integrantes da organização, etc. Esta ação a 
chamada substituição de objetivos que para Etzioni (1976) é mais comum ocorrer 
 
21 
 
entre meios e fins. A organização para ação é o meio para se atingir o fim, que é o 
objetivo do movimento social do qual se faz parte. 
Outra forma de identificar os objetivos de um movimento social é por meio das 
reivindicações, que são a forma concreta de explicitação dos objetivos dos 
movimentos sociais. Sem as reivindicações, qualquer objetivo declarado em 
documentos, manifestos, e outras formas, não possuem valor e estarão em oposição 
aos objetivos reais. Nesse contexto se encontram as reivindicações específicas, 
ligadas aos interesses imediatos e específicos; e as reinvindicações gerais, ligadas 
aos interesses gerais ou universais/fundamentais. Dessa forma, as reivindicações dos 
movimentos sociais ou de suas ramificações são as fontes de revelação dos seus 
reais objetivos, ou seja, os objetivos dos movimentos sociais são a verdadeira 
expressão dos interesses de seus grupos sociais de base, que estão ligados ao 
contexto social e histórico mais amplo (ETZIONI, 1976; VIANA, 2016). 
 
Portanto, você pode entender que os objetivos dos movimentos sociais são 
formados a partir da consciência e geração de valores, concepções, sentimentos, etc. 
e com uma gama de opções. No entanto, isso não é suficiente para explicar o motivo 
de escolha de um objetivo, pois, como é possível notar nos exemplos apresentados, 
os movimentos podem ter objetivos distintos, dependendo da causa que se quer 
defender ou da situação a ser transformada, etc. 
 
2.4 Conscientização para os movimentos sociais 
 
Vamos iniciar este tema fazendo uma reflexão sobre o que é um problema no 
contexto dos movimentos sociais. Você já parou para pensar que um problema é o 
elemento principal dos movimentos sociais? Assim, é fundamental compreendê-lo 
 
22 
 
para fornecer aos integrantes dos movimentos, uma base sólida de conhecimento e 
uma capacidade consistente de análise, que permitam a elaboração do/dos objetivos 
que devem ser alcançados por meio dos movimentos sociais. Podemos pensar em 
problema social como uma situação que causa mal-estar, insatisfação e 
consequências negativas a alguém, uma comunidade, sociedade, instituições, etc. 
Entender o problema/a situação que se deseja mudar é fundamental para que as 
pessoas se comprometam com a causa. 
Um passo importante é diagnosticar a situação que causa insatisfação, listando 
suas consequências e avaliando-as sob a ótica dos integrantes dos movimentos, 
situando os problemas no tempo e no espaço, verificando a relação ou contradição 
entre esses problemas, identificando os fatores que evidenciam sua existência, 
realizando um levantamento de suas causas e consequências e destacando entre elas 
as mais críticas e que podem sofrer intervenção. São três os tipos de problemas 
existentes (DAGNINO, 2009): 
 Os que representam uma ameaça, ou seja, o perigo de agravar uma situação 
ou a possibilidade de perda de algo conquistado; 
 Os que representam uma oportunidade, ou seja, podem ser aproveitados ou 
descartados pelos atores sociais; 
 Os que representam um obstáculo, dificultando uma conquista ou benefício. 
 
É importante compreender corretamente o problema porque será ele o motivo 
da ação com o intuito de reduzi-lo ou soluciona-lo. Do contrário, há risco de se chegar 
a uma visão distorcida da situação e, consequentemente, tomada de decisões 
equivocadas. Perceba que um problema pode ser, por exemplo, uma situação ou um 
estado negativo que influencia a vida de várias pessoas, a utilização de recursos de 
forma indevida que impacta na qualidade de vida dessas pessoas, uma ameaça ou 
uma intenção de provocar algo que já foi conquistado, etc. Daí a importância de 
identificar problemas atuais ou realmente potenciais, evitando “achismos” e 
imaginação, pois um problema não significa ausência de uma solução. 
Os problemas devem ser detalhados em sua reivindicação e não de forma 
generalista como saúde, meio ambiente, direitos humanos, etc., pois, dessa forma, 
indicam um sentido amplo sem necessariamente indicar qual é a situação que se 
busca resolver/transformar. Portanto, você pode concluir que compreender a origem 
 
23 
 
do problema é fundamental para a formulação dos objetivos dos movimentos sociais, 
ou seja, conhecer as causas do problema permite identificar quais opções têm chance 
de funcionar (DAGNINO, 2009). 
Nesse contexto, outro elemento fundamental para o movimento social é a 
conscientização. Para Freire (1980), a conscientização é um processo que se constrói 
quando o indivíduo se aproxima da realidade. 
A conscientização não pode existir fora da “práxis”, ou melhor, sem o ato 
ação-reflexão. [...] Por isso mesmo, a conscientização é um compromisso 
histórico. É também consciência histórica: é inserção crítica na história, 
implica que os homens assumam o papel de sujeitos que fazem e refazem o 
mundo. [...] A conscientização não está baseada sobre a consciência, de um 
lado, e o mundo, de outro; por outra parte, não pretende uma separação. Ao 
contrário, está baseada na relação consciência-mundo. [...] (FREIRE, 1980, 
p. 26 e 90). 
Para Sandoval (1994) a consciência está ligada aos significados que os 
indivíduos dão às interações e aos acontecimentos em sua vida. Para o autor, 
consciência, antes de tudo, refere-se à atribuição dada pelos indivíduos ao ambiente 
social em que estão inseridos, significados esses que guiam sua conduta e que 
apenas são compreendidos dentro do contexto no qual se inserem. Tal afirmação 
corrobora com o pensamento de Marx (1845) de que o ser social é que determina a 
consciência do homem. 
Existem dois momentos em um processo de mobilização: o momento do 
despertar do desejo e da consciência sobre a necessidade de mudanças e de atitudes; 
e o momento da transformação desse desejo e dessa consciência em disposição para 
agir e na própria ação (TORO; WERNECK, 2004). 
 
24 
 
 
Fonte: www.uipi.com.br 
No contexto dos movimentos sociais, a conscientização é fundamental para o 
surgimento do sentimento de pertencimento social, pois, aqueles que se sentem 
excluídos passam a se sentir incluídos em um grupo de ação ativo, acolhidos e iguais 
(GOHN, 2011). A compreensão do problema motiva o processo de conscientização, 
principalmente quando é entendido como um problema coletivo e não somente 
individual. Despertar a consciência sobre os problemas vividos estimula a participação 
e o comprometimento das pessoas nos movimentos sociais que, para consolidação e 
ampliação dos direitos sociais e a manutenção dos direitos já conquistados, deve ser 
um processo constante e contínuo. 
Para que as mudanças sociais ou políticas ocorram, as pessoas devem ter 
consciência de sua capacidade de desempenhar papéis importantes para a 
construção dessas mudanças; ter conhecimento sobre a realidade, descobrir a si 
próprio e refletir sobre as relações com os outros e com o meio em que estão inseridas. 
Isso faz com que valores como respeito, solidariedade, empatia e outros sejam 
repensados e orientem a nova forma de agir. Apenas quando o valor individual é 
despertado que se pode acreditar no potencial transformador. Assim, a 
conscientização é capaz de promover a interiorização e apreensão da realidade, 
levando à reflexão sobre o papel do indivíduo enquanto cidadão, sua relação com os 
outros e suas atitudes em relação à realidade (TORO; WERNECK, 2004). 
 
 
25 
 
2.5 Relação entre movimentos sociais, leis e políticas públicas 
 
A política pública refere-se à ação cuja finalidade é atender às necessidades 
sociais que não conseguem ser resolvidas na esferaprivada, individual ou 
espontânea, necessitando ser resolvida por decisão coletiva sob os princípios de 
justiça social, protegidos por leis que efetivam direitos. É denominada política pública 
porque contempla todas as forças e sujeitos sociais. Nesse contexto, a palavra política 
refere-se às medidas que são formuladas e executadas para o atendimento de 
demandas e necessidades sociais, caracterizando-se como uma estratégia de ação 
planejada e avaliada, na qual o Estado e a sociedade civil desempenham papéis 
específicos, em uma relação recíproca e antagônica. 
Desse modo, a política pública envolve a intervenção do Estado com a 
participação de diferentes atores sociais, públicos e privados, contemplando 
demandas da sociedade e resultados da ação política dos governos. Portanto, a 
política pública assume o significado de ação e não de ação intencional de autoridade 
pública diante de um problema ou necessidade. Sob essa ótica, a função da política 
pública é efetivar os direitos conquistados pela sociedade, incluindo-os nas leis, o que 
caracteriza o caráter universal dos bens públicos (PEREIRA, 2008). 
As políticas públicas são classificadas por tipo em decorrência de sua 
complexidade e, também, para facilitar sua análise. Cabe ressaltar que elas podem 
variar dependendo do contexto histórico e geográfico, sendo formuladas em uma 
arena de conflito associada à forma de regulação. 
Entre os vários tipos de arena, você verá a seguir os quatro principais 
(PEREIRA, 2008). 
 Arena regulamentadora: na qual normas e regras são estabelecidas pelo 
Estado de forma coercitiva. 
 Arena redistributiva: refere-se ao acesso de vantagens a determinados 
sujeitos em detrimento de outros, estabelecidas pelo poder público, utilizando 
recursos obtidos em outros grupos específicos. 
 Arena distributiva: quando as necessidades sociais de determinado grupo 
são atendidas com recursos obtidos por meio da arrecadação de impostos, 
contribuições sociais e econômicas e taxas (tributos), mantendo um caráter 
compensatório. 
 
26 
 
 Arena constitutiva: em que decorrem ações públicas cuja coerção afeta 
indiretamente o cidadão, ou seja, define regras e procedimentos sobre a 
formulação e implementação de políticas públicas nas demais arenas. 
 
A interação entre Estado e sociedade civil, no contexto das políticas públicas, 
está inserida em um processo histórico complexo, no qual os dois possuem 
particularidades e interesses próprios, apesar de sua interdependência e autonomia, 
ou seja, ambos se influenciam mutuamente. Montaño e Duriguetto (2010) contam que 
os movimentos sociais são representações do processo de organização da classe 
trabalhadora, da luta de classes e das lutas sociais existentes no Brasil desde o início 
do século XX. No entanto, foi na década de 1970 que eles se intensificaram, quando 
se opunham ao regime militar, por meio de uma luta social que resistia à ditadura e 
ao autoritarismo estatal. Esse foi um período que propiciou o surgimento de vários 
movimentos sociais, como os movimentos estudantis, os da classe operária e os das 
comunidades que sofriam os impactos causados por essa forma de governo. 
Os movimentos sociais dos anos de 1970 e 1980 foram decisivos para a 
conquista de vários direitos sociais, instituídos por lei na Constituição Federal de 1988 
(CF/88) (GOHN, 2011). Esses movimentos contribuíram para a redemocratização do 
Brasil, que teve como característica a inclusão de novos atores sociais na esfera 
política, fazendo surgir, ao longo dos anos de 1980 e 1990, os espaços públicos 
destinados à participação da sociedade civil, por exemplo, os conselhos, os fóruns e 
os comitês. 
Nesse período houve também uma mudança no perfil dos movimentos sociais, 
que passaram da atuação por meio de manifestações e reivindicações para uma 
atuação mais focada em ações propositivas, por meio de ONGs. 
Para Gohn (2007), com uma atuação mais participativa e de parceria com o 
Estado, os movimentos sociais ajudaram a construir os vários canais de participação 
e a institucionalização de espaços públicos relevantes, como os fóruns e os conselhos, 
nas esferas municipais, estaduais e federais. Também assumiram posturas menos 
reivindicatórias e mais construtivistas e produtivas, tendo como principais 
características a participação cidadã e a dimensão estratégica. Dessa maneira, os 
novos associativismos, sob a ótica da participação cidadã, atuam na prestação de 
 
27 
 
serviços à comunidade e à população, distanciando-se do campo das reivindicações 
e atuando em parceria com o Estado. 
 
Fonte: www.brainly.com.br 
Apesar de ainda existir certa dificuldade de esses movimentos se inserirem na 
sociedade civil, em razão de valores tradicionais da política brasileira, eles vêm ao 
longo do tempo contribuindo para levar ao espaço público, a discussão e a construção 
coletiva e pública sobre temas e questões que antes eram considerados problemas 
privados e individuais, constituindo-os como objetos de políticas públicas. Nesse 
sentido, para efetivar a democracia em nosso país, é preciso fortalecer as esferas 
públicas não estatais como espaço de condução das ações coletivas organizadas, em 
que as prioridades para a formulação e a implementação de políticas públicas possam 
ser definidas, bem como sua fiscalização e execução, efetivadas. 
Dessa forma, os movimentos sociais enquanto expressões dos movimentos de 
luta de classes e lutas sociais atuam como atores políticos do processo de formação 
das políticas sociais, em que as necessidades dos indivíduos se transformam em 
demandas a serem reivindicadas por meio de mobilizações, pressões e lutas sociais, 
levando-as a uma instância de negociação, consentimento e, dentro do possível, 
devido às diversas condições necessárias e escassas, chegando ao patamar de 
políticas públicas (GOHN, 2007). 
 
28 
 
3 OS MOVIMENTOS SOCIAIS NA CONTEMPORANEIDADE 
 
Atualmente, os movimentos sociais protagonizados pela sociedade civil somam 
um conjunto variado de demandas por meio de múltiplas bandeiras de lutas sociais. 
A partir dos anos 1970 e 1980, houve uma intensificação importante da sua 
organização/instituição, bem como na amplitude das demandas que passaram a fazer 
parte de suas lutas. 
Lüchmann e Sousa (2005) analisam os movimentos sociais em dois 
importantes polos: os novos instituintes/instituídos e os novos contrainstituintes. Os 
primeiros fazem parte de um grupo geracional que lutou pela redemocratização e pela 
ampliação dos espaços de participação democrática do país. Trata-se de um coletivo 
que surge das lutas contra a ditadura e as barbáries das perseguições políticas. 
(...) novos, porque num movimento de afirmação geracional de luta contra a 
falta de liberdade política visam ampliar os espaços de participação social 
junto às instituições políticas, interferindo diretamente nas definições das 
políticas públicas, tendo em vista não apenas a efetivação dos direitos 
instituídos, mas também a criação de novos direitos (LÜCHMANN; SOUSA, 
2005, p. 97). 
Após as conquistas de direitos prometidas pela promulgação da Constituição 
de 1988 e pelas vitórias de significativas demandas dos trabalhadores tanto no âmbito 
das leis quanto na conquista de espaços políticos, inclusive partidários, novas 
transformações se sucedem durante os anos 1990. Na época, o Brasil viveu um 
período de desmontes de direitos já conquistados. 
O contexto de globalização e governo de ideologia neoliberal, na qual o Estado 
deve ser mínimo e os direitos sociais são vistos enquanto gastos que travam o 
desenvolvimento econômico, os movimentos sociais passaram a enfrentar novos 
desafios. 
A sociedade civil organizada vive um dilema entre a luta institucional versus a 
mobilização social, pois é chamada pelo Estado para “[...] administrar a crise que se 
aprofunda frente ao esfacelamento dos serviços públicos e sociais [...]” (LÜCHMANN;SOUSA, 2005, p. 99). A partir disso, as Organizações da Sociedade Civil (ONGs) 
passam a ter reconhecimento público e assumem papel ativo e propositivo acerca das 
questões sociais no país. 
Assim, os movimentos sociais que possuíam caráter reivindicativo, em sua 
maior expressão, passam a atuar direta e administrativamente nas questões sociais. 
 
29 
 
Ocorre, então, um aumento expressivo de ONGs no Brasil durante a década de 1990, 
remetendo-nos a outro estudo significativamente importante sobre a terceirização dos 
serviços públicos, o qual não poderemos incluir neste capítulo pela sua complexidade 
e abrangência. 
Com relação aos novos contrainstituintes, as autoras os relacionam às novas 
gerações de brasileiros que vivem a partir da consolidação democrática uma nova 
estruturação social, na qual as demandas sociais possuem vazão através de diversas 
formas de manifestações. Com a globalização e com o desenvolvimento das 
comunicações, os novos movimentos sociais juvenis “[...] convidam à revolução do 
cotidiano, realizando a arte nas ruas com ações contrainstituintes e de caráter 
anticapitalista, revelando a ressignificação que fazem de um passado recente [...]” 
(LÜCHMANN; SOUSA, 2005, p. 105). 
As formas de articulação via internet são comuns para os novos movimentos 
sociais juvenis. Através da dinâmica realidade tecnológica, ações sociais diversas são 
eficazmente organizadas, possuindo grande alcance entre os participantes. São 
organizados movimentos sociais que podem se materializarem em denúncias, abaixo-
assinados, mobilizações, marchas, concentrações, passeatas, distúrbios, 
negociações, expressões culturais temáticas, entre outros. 
Gohn (2011) afirma que as negociações, diálogos ou confrontos nos atos 
participativos não são processos isolados, mas de caráter político-social. São ações 
sociais coletivas de caráter sociopolítico e cultural que viabilizam formas distintas de 
a população se organizar e expressar suas demandas. 
 
Fonte: www.politize.com.br 
 
30 
 
Atualmente, temos movimentos sociais diversos do âmbito rural e urbano, dos 
direitos sociais, direitos trabalhistas, direitos humanos, contra formas de violências a 
segmentos da sociedade e gêneros, movimentos sociais de valorização da cultura 
étnica racial, religiosa, entre tantos outros movimentos instituídos em Associações, 
ONGs, Fundações e Sindicatos. São expressões da participação da sociedade civil, 
mais diretamente relacionados às gerações mais antigas ligadas aos chamados 
novos-instituintes, nas questões sociais, conquistadas pela luta de movimentos 
sociais e políticos que atuaram insistentemente e corajosamente na história da 
constituição do processo democrático brasileiro. Além desses, temos ainda, os jovens 
contrainstituintes, que transformam realidades através de suas manifestações 
independentes. 
 
3.1 Movimentos sociais e sua formação e desenvolvimento no Brasil 
 
Para entender a sociedade brasileira tal como ela é hoje, faz-se necessário 
estudar a respeito da história e do processo evolutivo da sociedade no Brasil. Sendo 
assim, é preciso conhecer os movimentos sociais basilares que estão intrínsecos às 
atividades em prol da luta pela democracia brasileira, igualdade e justiça social. O 
primeiro movimento social expressivo foi formado quando o Brasil passou a ser colônia 
de Portugal, que trouxe para o País pessoas oriundas do continente Africano para 
serem escravizadas. Nesse período, houve um movimento social organizado em prol 
da abolição da escravidão (OLIVEIRA, 2017). 
Passados alguns séculos, outros movimentos ocorreram já no primeiro governo 
da República, como: a Guerra de Canudos (1893–1897), no estado da Bahia, em que 
as pessoas lutavam por cidadania e melhores condições de vida no sertão nordestino, 
tendo como líder Antônio Conselheiro; e a Guerra do Contestado (1912–1916), 
formada por pessoas que foram expulsas de suas terras, em virtude de estas terem 
sido concedidas a um grupo norte-americano para a construção de uma estrada de 
ferro, na região entre os estados do Paraná e Santa Catarina. Esses dois movimentos 
sociais marcaram o início do Brasil republicano, e ambos foram intensamente 
perseguidos por parte do Estado (TOMAZI, 2000). 
Outro importante movimento que ficou marcado na história da recém-República 
é a Greve Geral de 1917, promovida pelos operários no Brasil. Essa greve ocorreu 
 
31 
 
devido ao processo tardio de industrialização no País, pois, ao contrário dos países 
da Europa, que já haviam passado pela Revolução Industrial, aqui ainda não se tinha 
indústrias, apenas a forma artesanal e as atividades rurais, que predominavam até 
então. 
Com a entrada do século XX, inicia-se o procedimento de industrialização no 
Brasil, isto é, o País passa por várias mudanças na sua economia e no seu modo de 
produção. Com isso, há um intenso êxodo dos lugares mais remotos do País, bem 
como a chegada de imigrantes, advindos sobretudo da Europa, para os centros 
urbanos da época, que eram Rio de Janeiro e, principalmente, São Paulo. No entanto, 
as cidades não comportavam todo esse acréscimo populacional, visto que ainda não 
tinham saneamento básico, entre outras necessidades elementares da vida humana. 
Além disso, essas recém-indústrias necessitavam de mão de obra, de modo 
que se apropriaram desse movimento de êxodo rural para fazer essa população atuar 
como mão de obra nos polos industriais. As formas de contratação eram semelhantes 
às da época da Revolução Industrial na Europa. Entretanto, é preciso ressaltar que a 
Revolução Industrial da Europa ocorreu entre os séculos XVIII e XIX, ao passo que o 
Brasil iniciou a sua industrialização no século XX, de modo que poderia ter buscado 
conhecer os erros da Europa no passado para não os repetir — o que não aconteceu. 
Em pleno século XX, os capitalistas industriais contratavam os trabalhadores 
para extensas jornadas de trabalho, sem qualquer tipo de garantias trabalhistas, locais 
com péssimas condições de higiene, além de contratarem crianças e mulheres para 
fazer o mesmo trabalho e com a mesma jornada que os homens. Segundo Iamamoto 
e Carvalho (2012, p. 126): 
A exploração abusiva a que é submetido – afetando sua capacidade vital – e 
a luta defensiva que o operariado desenvolve, aparecerão, em determinado 
momento, para o restante da sociedade burguesa, como uma ameaça a seus 
mais sagrados valores, “a moral, a religião e a ordem pública”. 
Diante desse cenário, em meados do ano de 1917, em São Paulo, o País 
passou por intensas ondas de protestos por parte desses trabalhadores, que 
buscavam, além de melhores condições de trabalho, condições de direitos sociais e 
trabalhistas que regulassem as jornadas de trabalho, com licença maternidade, 
salários adequados, entre outros (OLIVEIRA, 2017). Cabe ressaltar que as pessoas 
recém-chegadas ao País enquanto imigrantes da Europa e que já tinham experiências 
 
32 
 
com movimentos sociais deram uma importante contribuição para a sistematização 
dos movimentos sociais brasileiros nesse período. 
Assim, grandes movimentos foram organizados para exigir que o Estado 
regulamentasse políticas que dessem amparo às questões do trabalho e leis que 
pudessem garantir e respaldar seus direitos de trabalhadores e cidadãos. Nesse 
contexto, o Estado passou a sistematizar legislações para regulamentar tudo o que os 
movimentos sociais dos operários estavam reivindicando. Conforme Iamamoto e 
Carvalho (2012, p. 126): 
As leis sociais, que representam a parte mais importante dessa 
regulamentação, se colocam na ordem do dia a partir do momento em que as 
terríveis condições de existência do proletariado ficam definitivamente 
retratadas para a sociedade brasileira por meio dos grandes movimentos 
sociais desencadeados para a conquista de uma cidadania social. 
As leis sociais foram sistematizadas a partir da Constituição de 1934, que 
regulaa carga horária diária de trabalho para 8 horas, além de um salário mínimo que 
pudesse garantir as condições mínimas de sobrevivência da família e dos operários. 
Em 1943, no governo Varguista, é promulgada a Consolidação das Leis Trabalhistas 
(CLT) (OLIVEIRA, 2017). 
Cabe ressaltar que outras importantes manifestações populares foram se 
organizando não apenas no meio urbano brasileiro, mas também no campo. De 
acordo com Tomazi (2000), alguns movimentos sociais no meio rural conseguiram 
garantir a conquista da promulgação de um Estatuto que preservava os direitos dos 
trabalhadores rurais. Entretanto, com a destituição da democracia, em 1964, por meio 
do regime ditatorial militar, os movimentos sociais, que estavam em plena expansão 
e fortalecimento no Brasil, foram considerados movimentos subversivos e 
clandestinos pelo governo, que proibiu qualquer tipo de manifestação popular com o 
intuito de criticá-lo. 
 
33 
 
 
Fonte: www.querobolsa.com.br 
Desse modo, as necessidades da população por melhores condições de vida, 
tanto na cidade quanto no campo, dificilmente eram atendidas, e muitos tiveram suas 
vidas aniquiladas. Todavia, ao longo de todo o regime militar, muitos foram os 
confrontos, sobretudo para voltar à democracia, à escolha livre e direta de seus 
governantes. Além disso, a Igreja Católica, por meio da teologia da libertação, e o 
movimento estudantil tiveram uma intensa participação de resistência ao governo 
ditatorial brasileiro. 
Outro movimento social de base operária ocorreu no Brasil no final da década 
de 70: a greve geral dos metalúrgicos da região do ABC paulista. Esse movimento foi 
muito significativo para a classe trabalhadora, pois reivindicava melhores salários e 
condições de vida para essa população. Com a chegada nos anos de 1980, teve 
origem o movimento pelas Diretas Já, que reuniu pessoas das mais diversas e 
diferentes concepções políticas e de classes, como artistas, intelectuais, estudantes, 
camponeses, trabalhadores, entre outros. Esse importante movimento social 
conclamava pela abertura do Congresso e o voto direto para a escolha dos 
representantes nos Poderes. Com o fim do regime militar, em 1985, outro movimento 
se sistematizou em prol de uma Constituição que fosse democrática e que se 
baseasse nos direitos humanos e na justiça social: o movimento da Constituinte. 
 
 
34 
 
De acordo com Gohn (1995b, p. 61): 
É o caso das organizações anarco-sindicalistas introduzidas pelos 
trabalhadores italianos. Estas formas politizadas de organização conviveram 
com as associações de auxílio mútuo, de caráter marcadamente pré-político; 
[...] combinadas com as reivindicações salariais e com as demandas pela 
modernização das relações de trabalho. 
Portanto, a Constituição Federal promulgada em 1988 foi resultado dessas 
inúmeras manifestações de vários segmentos da sociedade brasileira, que buscavam 
ter uma Constituição que atendesse aos anseios da população em relação à liberdade 
e ao acesso a políticas públicas sociais de forma universal, respeitando o princípio da 
equidade e da justiça social. 
Por fim, outro importante destaque da Constituição Federal, que lhe confere o 
reconhecimento de Constituição cidadã e democrática, é a participação ativa da 
população nos centros de decisão, não cabendo mais ao Estado decidir todas as 
questões relacionadas às políticas públicas sociais de forma centralizada e 
verticalizada. Assim, a Constituição Federal apresentou, em seu texto, que o Estado 
deve discutir e decidir em conjunto com a população, por meio da formulação de 
conselhos de direitos, as diversas políticas públicas, de forma a tomar as decisões de 
modo descentralizado e considerando os pontos de vista tanto do próprio Estado 
quanto da sociedade civil organizada. 
 
3.2 Evolução e importância dos movimentos sociais na contemporaneidade 
 
Uma das premissas basilares a respeito dos movimentos sociais, desde a sua 
origem até a contemporaneidade, é o fator político social e educativo que os 
movimentos sociais proporcionam às pessoas que deles participam. Os movimentos 
sociais são mecanismos fundamentais na sociedade, uma vez que permitem que 
situações sejam transformadas por meio de pessoas que se articulam na sociedade, 
organizam suas demandas e desenvolvem formas de chamar a atenção do Estado e 
dos demais membros da sociedade, visando a garantir que suas necessidades e 
demandas se tornem direitos e benefícios garantidos pelo Estado. 
De acordo com Castells (2013), o exato escopo dos movimentos sociais é 
aumentar a consciência dos cidadãos em geral e qualificá-los pela participação, 
visando a alcançar a informação e o conhecimento a respeito de sua cidadania e de 
 
35 
 
seus direitos individuais e coletivos perante o Estado. Com o passar dos anos, esses 
movimentos sociais foram se alterando e surgiram novos, os quais buscam garantir 
os direitos humanos e alterar comportamentos e atitudes de toda a sociedade. 
De acordo com Gohn (1995a), os movimentos sociais se constituem enquanto 
atos coletivos de atitude sociopolítica, estabelecidos por atores sociais de distintas 
classes sociais. A partir dos movimentos sociais, é possível alcançar o grau de 
politização e educação crítica e cidadã, a compreensão sobre o jogo político e 
econômico, entre outros. Desse modo, esses movimentos instituem uma arena 
política de força social na sociedade civil. 
Atualmente, os movimentos sociais representam as novas demandas 
apresentadas à sociedade contemporânea, e existem diversas respostas e formas 
distintas para atender aos anseios desses inúmeros movimentos (CRAVEIRO; 
HAMDAN, 2015). Alguns dos importantes movimentos sociais que foram se 
estabelecendo, com pautas de lutas por visibilidade, direitos e reivindicações, são: 
movimentos ambientais, movimentos culturais, movimentos de luta por igualdade de 
gênero, Movimento Sem-Terra (MST), movimento em defesa da cultura e da arte, 
movimento LGBTQIA+, movimento negro, movimento de luta pelo direito à moradia, 
movimento das pessoas em situação de rua, entre outros. 
Em se tratando dos movimentos sociais contemporâneos, estes possuem 
algumas distinções em relação aos movimentos sociais originários. Por exemplo, 
quando analisamos os movimentos sociais mais tradicionais, eles se articulam a partir 
de necessidades de elevação de salários, melhores condições de trabalho e direitos 
(p. ex., férias remuneradas, descanso no final de semana remunerado, etc.). Contudo, 
hoje, muitos trabalhadores podem usufruir dessas reinvindicações, fruto do processo 
de luta desses movimentos sociais. 
 
 
36 
 
Fonte: www.cursoenemgratuito.com.br 
Os movimentos sociais que foram se constituindo no cenário contemporâneo 
também lutam por direitos, porém em esfera mais específica, como é o caso do 
movimento LGBTQIA+, que luta por direitos sociais, civis e políticos de pessoas que 
se identificam por sua orientação sexual e de gênero ser distinta daquela determinada 
pelos setores mais conservadores da sociedade. 
Segundo Tomazi (2000), esses movimentos foram se formando em prol de 
lutas por necessidades específicas e porque negam a moral de meritocracia 
apregoada na sociedade. 
Portanto, na cena contemporânea, tanto os movimentos que têm pautas mais 
gerais quanto os que têm pautas mais específicas, como o movimento negro e o 
LGBTQIA+, têm algo em comum: lutar por direitos sociais, por melhores condições de 
vida, respeito, igualdade e dignidade. Somado isso, eles tecem críticas ao Estado, 
para que este intervenha de maneira mais inclusiva e com políticas sociais que 
promovam a igualdade de oportunidade para todos. 
Na contemporaneidade, vários movimentos sociais têm influência em diversos 
setores da sociedade civil, além de partidos políticos. Todavia, é importante ressaltar 
que tanto os movimentos sociais mais tradicionais como os movimentos 
contemporâneos possuem importância,pois ambos lutam por transformações 
necessárias. Além disso, eles buscam apresentar as diversas insatisfações que a 
população possa ter diante de uma tomada de decisão por parte de algum gestor 
público, seja na esfera municipal, estadual ou federal. 
 
37 
 
Ferraz (2019, p. 360) faz uma importante ponderação em relação a uma 
especificidade a respeito dos movimentos sociais que se formam na 
contemporaneidade: 
Embora algumas das atuais características dos movimentos sociais 
estivessem presentes desde o final dos anos 1990 e início dos anos 2000, as 
novas mídias sociais e tecnologias de informação e comunicação parecem 
ter proporcionado uma maior visibilidade a um número também crescente de 
inquietações e demandas e aumentado sua capacidade de articulação [...]. 
Portanto, os movimentos sociais são organizados de forma a alcançar as suas 
reivindicações, bem como dar visibilidade à realidade social vivenciada. Além disso, 
os movimentos sociais têm por característica apresentar as conquistas adquiridas, 
para que todos da sociedade possam perceber que muito dos direitos que eles podem 
acessar são frutos de intensos debates, articulações e reivindicações por parte dos 
movimentos sociais. 
É fato que houve avanços na forma de os movimentos sociais se organizarem, 
visto que a sociedade adentrou a era da tecnologia, com diversos meios de 
comunicação acessíveis a uma boa parcela da população. Isso tem sido um fator 
preponderante entre os movimentos sociais que utilizam redes sociais, grupos de 
discussão em aplicativos de mensagens, blogs, entre outros. Contudo, é 
imprescindível destacar que os espaços de ruas e praças são fundamentais para os 
processos de organização dos grupos coletivos que executam manifestações em prol 
das lutas sociais, com vistas a conquistar direitos, visibilidade, respeito e demais 
necessidades que se formam na vida das pessoas na sociedade civil. 
 
4 ESTADO E CLASSES SOCIAIS 
 
O Estado é um fenômeno histórico e relacional que deve ser tratado como um 
processo. Afinal, ele não existe de forma absoluta nem é inalterável. Sua finalidade é 
garantir a liberdade e a igualdade entre os homens. Para isso, o Estado exerce 
controle sobre a sociedade, mas também possui a função de protegê-la. Na 
atualidade, predomina o Estado neoliberal, que interfere de forma parcial na economia 
e visa a proteger as classes mais desfavorecidas por meio de políticas sociais 
paliativas. 
 
38 
 
Contudo, o que se vê é o Estado atuando a favor de determinados grupos. 
Nesse contexto, surgem questões importantes, especialmente ligadas aos 
movimentos de resistência como forma de oposição e luta por igualdade de direitos. 
 
4.1 O Estado e os seus papéis 
 
A fim de compreender a formação do Estado na atualidade, você deve refletir 
sobre os pressupostos ontológicos que pontuam a constituição dessa instância, que 
é um marco na história das sociedades. O homem, em seu estado de natureza, possui 
sua liberdade natural e a protege com sua força física. Como disse Thomas Hobbes 
(1588–1679) “o homem é o lobo do homem”, ou seja, o homem é seu próprio inimigo. 
Essa premissa levou as sociedades primitivas a criarem a ordem em meio ao caos. 
A sociedade que surge do estado de natureza se constitui por meio de um 
contrato social. Quando a força física já não é mais suficiente para a manutenção da 
ordem, é necessária uma força superior. Nesse sentido, o homem sai de seu estado 
natural para o estado civil e perde a liberdade natural. Em uma sociedade, existe a 
liberdade política, que é garantida pelo Estado e não mais pela força física. Assim, ela 
se iguala à liberdade natural — desde que o homem não deixe de exercer as suas 
vontades. 
Rousseau explica que o homem possui duas vontades: uma pública e outra 
particular. Sendo a vontade pública uma vontade geral, ela se sobrepõe à vontade 
particular de cada um. Em um Estado legítimo, a vontade particular deve se adaptar 
à vontade geral. Caso contrário, ocorre o fim do Estado. A vontade geral leva os 
homens a se tornarem um só corpo e a terem uma única direção política. O corpo 
político possui caráter moral e se torna existente a partir do pacto social. Ele só existe 
se todos dispuserem de tudo para toda a comunidade, porque um corpo não pode 
denegrir a si mesmo. Veja: 
Se a vontade do corpo político é feita, tem-se um Estado legítimo. Estado 
esse que é guiado pela vontade geral, e preza pela preservação da liberdade 
e dos bens de cada associado. O homem natural, que vivia isolado e bastava 
a si mesmo, agora, através do pacto, faz parte de um todo maior, o corpo 
político. No corpo político, sua liberdade é ainda mais assegurada, já que não 
depende de sua força física. O que limita essa liberdade é a vontade geral, 
que, por sua vez, está diretamente ligada à criação e observância das leis 
(SILVA; CUNHA, 2013, p. 218). 
 
39 
 
Nesse contexto, é importante você notar a compreensão que se tem das leis, 
que são uma declaração geral sobre um interesse comum. Elas existem a fim de 
garantir a liberdade e a igualdade entre os homens. Além disso, a lei é sempre justa, 
pois o homem não pode ser injusto consigo mesmo. Assim, “Se quisermos saber no 
que consiste, precisamente, o maior de todos os bens, qual deva ser a finalidade de 
todos os sistemas de legislação, verificar-se-á que se resume nestes dois objetivos 
principais: a liberdade e a igualdade [...]” (ROUSSEAU, 1999, p. 127 apud SILVA; 
CUNHA, 2013, p. 219). 
O que fundamenta e garante que a finalidade do Estado se cumpra é a 
preservação da liberdade e da igualdade entre os homens. Esse também é o 
fundamento da vontade geral, das leis e do corpo político. Segundo Silva e Cunha 
(2013, p. 220), “[…] A vontade do corpo político é a vontade geral. Por meio dela o 
homem continua a ser livre, e por ser membro deste corpo ele é igual a todos os 
demais membros […] o Estado dirigido pela vontade geral é um Estado social legítimo 
[...]”. 
 
Fonte: www.politize.com.br 
Segundo Pereira (2009), três elementos constituem o Estado. Veja a seguir. 
1. Um conjunto de instituições e prerrogativas, entre as quais o poder coercitivo, 
que só o Estado possui, por delegação da própria sociedade. 
2. O território, isto é, um espaço geograficamente delimitado onde o poder 
estatal é exercido. Muitos denominam esse território de “sociedade”, ressaltando a 
 
40 
 
sua relação com o Estado, embora este mantenha relações com outras sociedades, 
para além de seu território. 
3. Um conjunto de regras e condutas reguladas dentro de um território, o que 
ajuda a criar e manter uma cultura política comum a todos os que fazem parte da 
sociedade nacional ou do que muitos chamam de “nação”. 
O Estado é um fenômeno histórico e relacional. Portanto, deve ser tratado como 
processo. Afinal, ele não existe de forma absoluta nem é inalterável. Veja: 
Por ser um processo histórico, que contempla passado, presente e futuro, 
bem como a coexistência de antigos e novos elementos e determinações, a 
relação praticada pelo Estado tem caráter dialético — no sentido de que 
propicia um incessante jogo de oposições e influências entre sujeitos com 
interesses e objetivos distintos. Ou, em outros termos, a relação dialética 
realizada pelo Estado comporta igualmente antagonismos e reciprocidades 
e, por isso, permite que forças desiguais e contraditórias se confrontem e se 
integrem a ponto de cada uma deixar sua marca na outra e ambas 
contribuírem para um resultado final (PEREIRA, 2009, p. 345). 
É nessa relação com a sociedade que o Estado abrange toda a dimensão da 
vida social, indivíduos e classes, assumindo diferentes responsabilidades. Entre elas, 
a de atender às demandas e reivindicações da sociedade como um todo e não apenas 
de uma classe. Mesmo possuindo um poder coercitivo, o Estado também exerce 
funções protetoras, sendo pressionado e controlado pela sociedade. Pereira (2009)ainda afirma que o Estado não é uma entidade desgarrada da sociedade. Ele não é a 
única força organizada e autossuficiente na sociedade e não é um instrumento 
exclusivo da classe dominante. É uma instituição constituída e dividida por interesses 
diversos, que possui a tarefa primordial de administrar tais interesses sem 
neutralidade. O Estado deve se relacionar com todas as classes para se legitimar e 
construir sua base material de sustentação, e não apenas com a classe com que mais 
se identifica. 
O Estado é a expressão de todas as classes. Embora zele pelos interesses da 
classe dominante, acata outros interesses para manter a classe dominada afastada 
do bloco de poder. Segundo Pereira (2009, p. 346), é “relacionando-se com todas as 
classes que o Estado assume caráter de poder público e exerce o controle político e 
ideológico sobre todas elas [...]”. Se o Estado se exime de suas responsabilidades 
com certos grupos ou classes, pode perder o seu apoio ou a sua confiança. Isso abre 
brechas para a sociedade se organizar autonomamente por meio de movimentos. 
Além disso, isso põe em risco o bloco de poder e possibilita o surgimento de poderes 
 
41 
 
paralelos. É por isso que o Estado é, por um lado, uma relação de dominação (ou a 
expressão política da dominação de quem está no poder) e, por outro, um conjunto 
de instituições mediadoras e reguladoras dessa dominação. 
Como você pode notar, o Estado exerce uma forma de controle sobre a 
sociedade, mas também possui a função de protegê-la e está estruturado de forma a 
garantir o seu poder e a sua autonomia. Na atualidade, se vive sob os mandos do 
Estado neoliberal, que interfere de forma parcial na economia e visa a proteger as 
classes mais desfavorecidas por meio de políticas sociais paliativas, ofertando o 
mínimo para sobreviverem. Em tempos de capital, o que se vê é o Estado atuando a 
favor de determinados grupos em vez de cumprir o seu papel de protetor de toda a 
sociedade. 
 
4.2 O Serviço Social e a divisão de classes 
 
Segundo Marx e Engels (2008, p. 8), “A história de todas as sociedades até 
agora tem sido a história das lutas de classe [...]”. A concepção de classe social 
adotada pelo Serviço Social está fundamentada na teoria social de Marx. Ela parte do 
pressuposto de que nos primórdios do capitalismo havia duas classes fundamentais: 
a dos proprietários e a dos proletários. A primeira detinha os meios de produção e a 
segunda vendia a sua força de trabalho em troca de um salário, que em parte também 
era apropriado pela primeira classe. A divisão da sociedade em classes permite a 
concorrência e a liberdade econômica que geram lucratividade e consumo. 
Com a ascensão da burguesia no período do declínio da sociedade feudal, o 
antagonismo de classes foi ficando cada vez mais aparente. Nesse contexto, as 
contradições não eram eliminadas; pelo contrário, surgiam novas classes e novas 
condições de opressão. Para compreender isso melhor, considere o seguinte: 
A burguesia não pode existir sem revolucionar constantemente os 
instrumentos de produção, portanto as relações de produção e, por 
conseguinte, todas as relações sociais. A conservação inalterada dos antigos 
modos de produção era a primeira condição de existência de todas as classes 
industriais anteriores. A transformação contínua da produção, o abalo 
incessante de todo o sistema social, a insegurança e o movimento 
permanente distinguem a época burguesa de todas as demais. As relações 
rígidas e enferrujadas, com suas representações e concepções tradicionais, 
são dissolvidas, e as mais recentes tornam-se antiquadas antes que se 
consolidem. Tudo o que era sólido desmancha no ar, tudo o que era sagrado 
é profanado, e as pessoas são finalmente forçadas a encarar com serenidade 
sua posição social e suas relações recíprocas (MARX; ENGELS, 2008, p. 14). 
 
42 
 
A burguesia expandiu o mercado por meio dos oceanos a fim de que o comércio 
chegasse a todos os cantos do mundo, criando uma interdependência geral entre os 
países. Com o passar do tempo, as duas classes fundamentais foram se 
estratificando, ganhando novas conotações, mas, em suma, se resumem à burguesia 
e ao proletariado. Segundo Marx e Engels (2008, p. 29–30), “[...] a condição essencial 
para a existência e a dominação da classe burguesa é a concentração de riqueza nas 
mãos de particulares, a formação e a multiplicação do capital; a condição de existência 
do capital é o trabalho assalariado [...]”. 
 
Fonte: www.mundoeducacao.uol.com.br 
Via de regra, a burguesia (ou classe dominante) não se preocupa em retirar da 
classe proletária o pouco que ela possui. A burguesia utiliza a propriedade privada, a 
apropriação dos meios de produção, a apropriação da riqueza socialmente produzida 
e a extração da mais-valia para manter o seu status quo. Entretanto, no decorrer da 
história, a classe trabalhadora sempre demonstrou o seu descontentamento com a 
condição de vida e de trabalho que lhe foi imposta. Ela tem encontrado nos 
movimentos de oposição uma forma de lutar por seus direitos. Toda luta de classes é, 
portanto, uma luta política (MARX; ENGELS, 2008). 
Assim, você pode considerar que a divisão de classes sociais existe apenas no 
modo de produção capitalista e que, portanto, é produto consolidado da lógica 
capitalista. Segundo Frederico (2009, p. 1), classes sociais “[...]são entendidas como 
um componente estrutural da sociedade capitalista e, ao mesmo tempo, como sujeitos 
coletivos que têm suas formas de consciência e de atuação determinadas pela 
 
43 
 
dinâmica da sociedade [...]”. Em suma, a conformação das classes sociais depende 
do desenvolvimento da sociedade capitalista. 
Nesse sentido, Duriguetto (2013) destaca a relação orgânica entre a sociedade 
civil e o mundo das relações sociais de produção. É a partir dela que se desenvolvem 
as classes sociais, bem como seus interesses conflitantes, suas expressões 
organizativas, suas formas de consciência e até mesmo a função do Estado. A 
sociedade é uma esfera em que as classes lutam pela hegemonia, e há aquelas que 
transitam na contra-hegemonia, buscando aliados, articulando interesses e 
necessidades. O Serviço Social, em seu Código de Ética (CONSELHO FEDERAL DE 
SERVIÇO SOCIAL, 1993), assume o compromisso de atuar juntamente à classe 
trabalhadora, lutando pelos interesses dos menos favorecidos. O projeto ético-político 
definido no seio da profissão visa ao fortalecimento das lutas a favor da classe 
trabalhadora, o que a leva a fazer alianças com os sujeitos coletivos. 
Percebe-se que aumenta cada vez mais o nível de divisão entre as classes. 
Isso remonta ao conceito de Antunes (2008): “classe que vive do trabalho”. Tal 
conceito exprime e dá relevância àqueles que não têm acesso aos bens produzidos 
pela sociedade, mas que têm no trabalho o motivo da sua existência e da sua 
sobrevivência. Na medida em que o capital vai se complexificando, a divisão de 
classes vai ficando também cada vez mais complexa. 
O Serviço Social, com base nos pressupostos teóricos da profissão, assume a 
posição política de voltar suas ações para a defesa dos direitos da classe 
trabalhadora. A ideia é fortalecer vínculos, estreitar laços com as lideranças dos 
movimentos e contribuir para a construção de sujeitos coletivos, visando à 
emancipação política dessa classe. Em seu Código de Ética, está expressa a “[...] 
opção por um projeto profissional vinculado ao processo de construção de uma nova 
ordem societária, sem dominação/exploração de classe, etnia e gênero [...]” 
(CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 2013, p. 24). Além disso, está 
prevista a “[...] articulação com os movimentos de outras categorias profissionais que 
partilhem dos princípios deste Código e com a luta geral dos trabalhadores [...]” 
(CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 1993, p. 24). 
Assim, como evidenciam o Código de Ética do Serviço Social, a lei de 
regulamentaçãoda profissão e o seu projeto ético-político, o Serviço Social serve 
como um mecanismo para a concretização das políticas públicas. Ele atua no 
 
44 
 
enfrentamento das manifestações da Questão Social e a favor da classe trabalhadora 
(CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 1993). 
 
5 AS RELAÇÕES ENTRE POLÍTICA SOCIAL E CIDADANIA NO BRASIL 
 
5.1 O que é cidadania? 
 
A palavra cidadania vem de civitas, que, do latim, refere-se ao indivíduo que 
habita a cidade. Assim, com o início da vida na cidade, em coletividade, surge a 
necessidade de os indivíduos exercerem seu papel de cidadãos — com direitos e 
deveres (MANZINI-COVRE, 2010). 
A partir desse momento, a vivência na cidade, em coletivo, fez nascer a 
necessidade de se estabelecer direitos e deveres de cada um, para a manutenção da 
vida e das relações sociais. 
É possível observar que, desde a Antiguidade Clássica, lutas sociais ocorreram 
e podem ser correlacionadas com o sentido de cidadania, que conhecemos 
atualmente. Já, na Grécia Antiga, o conceito de cidadania resumia-se aos direitos 
políticos, e, ainda assim, nem todos eram considerados cidadãos (MANZINI-COVRE, 
2010). 
Na Roma Antiga, o conceito de cidadania está ligado à classe social à qual o 
indivíduo pertencia. Havia três classes sociais: os patrícios, descendentes dos 
fundadores; os plebeus, descendentes dos estrangeiros; e os escravos, prisioneiros 
das diversas guerras e, também, aqueles que não pagavam seus débitos. Assim, 
somente os patrícios eram considerados cidadãos e possuíam direitos políticos, civis 
e religiosos (MANZINI-COVRE, 2010). 
Já com o monopólio da Igreja Cristã na Idade Média, a ampliação do conceito 
de cidadania foi esquecida — destruída quando a Igreja alega ter sido Deus que 
designou essas hierarquizações e sucessões hereditárias de Reis e Rainhas 
(MANZINI-COVRE, 2010). 
Assim, exercer a cidadania significa viver em constante luta por melhorias na 
qualidade de vida — individuais e coletivas, em busca de liberdade, dignidade e 
igualdade. Autores, como Rousseau, Montesquieu, Diderot e Voltaire, já defendiam 
essa ideia de cidadania, onde existiria um governo democrático e ampla participação 
 
45 
 
popular, findando os privilégios de classe e inaugurando os ideais de liberdade e 
igualdade como direitos fundamentais dos homens (MANZINI-COVRE, 2010). 
Cidadania é a prática do indivíduo em exercer seus direitos e deveres, no 
âmbito de uma sociedade do Estado. Não se restringe somente ao ato de votar e ser 
votado, como pensado por muitos, mas envolve viver em sociedade, cumprir seus 
deveres e ter seus direitos garantidos, por meio da justiça social (PEREIRA, 2011). 
 
Fonte: www.osbrasil.org.br 
A cidadania, pois, deve garantir a plena emancipação dos indivíduos que, por 
meio de seus deveres com a sociedade, têm seus direitos inerentes à vida — como 
saúde, assistência social, educação, moradia, renda, alimentação, entre outros 
garantidos pelas políticas sociais. 
Tendo em vista que cidadania é sinônimo de garantia de direitos, podemos 
considerar que, no Brasil, temos vivenciado uma cidadania relativa, ou regulada — 
nome proposto pelo sociólogo brasileiro Wanderley Guilherme dos Santos, na década 
de 1970, para descrever uma “cidadania restrita e sempre vigiada pelo Estado”. 
A cidadania brasileira, nesse sentido, permanece em uma constante 
construção, num movimento de ampliação e encolhimento das políticas sociais, à 
medida que, em muitos momentos históricos, inclusive atualmente, muitos indivíduos 
não têm o direito de ter suas necessidades básicas garantidas ou, nem mesmo, o 
mínimo necessário para sua subsistência e da família (PEREIRA, 2011). 
Em momentos de crise, as políticas sociais sofrem um encolhimento e 
focalizam suas ações, violando a condição de cidadãos, à medida que parcelas 
 
46 
 
significativas da população têm seus direitos violados — direitos estes já adquiridos, 
pelo que deveria ser a cidadania, por meio do que chamamos de Constituição Cidadã: 
a Constituição Federal de 1988. 
É por meio do exercício de cidadania, assumindo o papel de cidadãos, que se 
dará a ampliação dos direitos mediante políticas sociais. As ações coletivas, nesse 
sentido, são mais eficazes do que as individuais, e o que é conquistado por meio do 
coletivo fortalece a cidadania de todos. 
 
5.2 O desenvolvimento das políticas sociais a partir da concepção de 
cidadania 
 
Tendo em vista o conceito de cidadania, que é a prática do indivíduo em exercer 
seus direitos e deveres, no âmbito de uma sociedade, e tendo seus direitos inerentes 
à vida garantidos mediante políticas sociais, o desenvolvimento das políticas sociais 
está diretamente relacionado à concepção de cidadania, com cidadãos portadores de 
direitos e deveres. 
Sendo assim, a conquista da cidadania perpassa a efetivação dos direitos 
sociais, políticos e civis, dentro de uma perspectiva de universalização dos direitos, 
por meio das políticas sociais (PIANA, 2009). 
Nesse sentido, o desenvolvimento das políticas sociais, pautada numa 
concepção de cidadania, vai contra o discurso capitalista, que (des)responsabiliza o 
Estado das responsabilidades sociais e faz das políticas sociais uma política para a 
classe social menos favorecida — a dos “pobres mais pobres” —, transformando-as 
em medidas compensatórias, paliativas e focalizadas, e não em políticas de direito 
com vistas à emancipação dos indivíduos (PIANA, 2009). 
É possível afirmar, então, que, a partir do momento em que os indivíduos se 
reconheceram como cidadãos pertencentes a um grupo social e ansiando pela sua 
condição de cidadania, passaram a enfrentar, sobretudo em coletivo, a forma de 
organização e produção da sociedade, sendo que os padrões de proteção social e as 
políticas sociais são as respostas para esses enfrentamentos. 
A partir do século XIX, o cenário político mundial, sobretudo no contexto 
europeu, iniciou um movimento e reconhecimento dos direitos civis relacionados à 
 
47 
 
propriedade privada. O Estado deveria proteger o direito à vida, à liberdade e aos 
direitos de segurança e propriedade (BEHRING; BOSCHETTI, 2007). 
Contudo, o Estado era repressor, e os trabalhadores eram explorados. Foram 
as mobilizações e a organização da classe trabalhadora (operária), reivindicando sua 
cidadania, numa perspectiva de emancipação humana e na socialização da riqueza 
socialmente produzida, que os cidadãos conseguiram assegurar importantes 
conquistas no que diz respeito aos direitos (BEHRING; BOSCHETTI, 2007). 
Conforme apontam Behring e Boschetti: 
O surgimento das políticas sociais foi gradual e diferenciado entre os países, 
dependendo dos movimentos de organização e pressão da classe 
trabalhadora, do grau de desenvolvimento das forças das forças produtivas, 
e das correlações e composições de força no âmbito do Estado. Os autores 
são unânimes em situar o final do século XIX como período em que o Estado 
capitalista passa a assumir e a realizar ações sociais de forma mais ampla, 
planejada, sistematizada e com caráter de obrigatoriedade (BEHRING; 
BOSCHETTI, 2007, p. 64). 
Já no contexto brasileiro, por suas particularidades históricas de colonização, 
dependência, escravatura e posterior independência, o desenvolvimento das políticas 
sociais deu-se de forma diferente, e ainda se encontra em construção, assim como a 
nossa cidadania, enquanto cidadãos brasileiros. 
Assim, de maneira geral, as condições de trabalho e vida dos cidadãos têm 
forte relação com o surgimento das primeiras iniciativas de proteção social e políticas 
sociais, já que estas têm correlação direta com a luta de classes, ou seja, relação 
capitalismo versus trabalhador. 
Sendo a cidadania o direito de se ter direitos, para os cidadãos, as políticas 
sociais são a forma de garanti-la. Para o sistema capitalista, as políticas sociais são 
uma forma de amenizar os enfrentamentos da classe trabalhadorae dar conta, ao 
menos, dos mínimos sociais. 
No Brasil, a partir das décadas de 20 e 30, surgiram as primeiras medidas de 
proteção social, e as políticas sociais fragilmente começam a ser desenhadas. 
É importante ressaltar algumas das políticas sociais que marcam o período, por 
ordem cronológica, quase sempre em resposta às lutas coletivas pelos direitos 
sociais. São elas: 
 1923 – Lei Eloy Chaves, que cria as Caixas de Aposentadorias e Pensões 
(CAP), para os trabalhadores ferroviários; 
 
48 
 
 1933 – Criação dos Institutos de Aposentadorias e Pensões (IAPs); 
 1942 – Criação da Legião Brasileira de Assistência (LBA), destinada ao 
atendimento de pessoas pobres, com apoio à maternidade e infância; 
 1943 – Promulgação das Consolidações das Leis Trabalhistas (CLT); 
 1960 – Aprovação da Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS); 
 1966 – Criação do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS); 
 1988 – Promulgação da Constituição Federal do Brasil, a chamada 
Constituição Cidadã. 
 
5.3 Efetivação das políticas sociais: garantia de cidadania 
 
A noção de cidadania permeia a garantia de direitos políticos, civis e sociais. 
Não é à toa que a Constituição Federal de 1988 foi chamada de Constituição Cidadã, 
já que foi um marco nos direitos políticos, civis e sociais dos cidadãos brasileiros, após 
duas décadas de Ditadura Militar e muita repressão. Com ela, a concepção de 
cidadania e as políticas sociais, ao menos na lei, foram ampliadas. 
Assim, os direitos sociais expressos na Constituição visavam a ajustar as 
desigualdades existentes, à medida que afirma que a sua natureza jurídica é o direito 
à igualdade, logo que todos os cidadãos são iguais e têm os mesmos direitos e a 
mesma condição de cidadania (ZANETTI, 2011). 
É justamente por meio das políticas sociais que nos aproximamos do princípio 
de igualdade, dignidade e cidadania, tendo em vista que podemos, a partir da garantia 
de nossos direitos, viver com dignidade e nossas necessidades básicas garantidas. 
Obviamente, a Constituição Federal de 1988 trouxe inúmeros e importantes 
avanços no que diz respeito aos direitos sociais, sobretudo aos mais pobres e 
vulneráveis (ABREU, 2011). 
A Constituição de 1988 tentou dar conta das profundas mudanças ocorridas 
em nosso país na economia, nas relações de poder e nas relações sociais 
globais, nos últimos 20 anos, introduzindo temas, redefinindo papéis, 
incorporando às instituições sociais segmentos historicamente 
marginalizados, sem, no entanto, alterar substantivamente as relações 
sociais vigentes (NEVES, 1999, p. 99). 
 
49 
 
Assim, as políticas sociais não devem focalizar o mínimo existencial como 
preservação somente da própria vida humana, mas, sim, a se atingir um mínimo 
desejável para uma vivência digna dentro da construção da cidadania. 
 
Fonte: www.revistaviag.com.br 
A Constituição Federal de 1988 inaugurou o que chamamos de Seguridade 
Social Brasileira, formada pelo tripé: “saúde, assistência social e Previdência Social. 
Nesse sentido, podemos entender que a satisfação das necessidades sociais 
básicas dos cidadãos deve ser por meio da Seguridade Social, sendo que, nesta, a 
saúde é considerada um direito universal, a assistência social para quem dela 
necessitar e a Previdência Social sendo a única possível de acessar por meio de 
prévia contribuição. 
Conforme aponta Pereira (2006): 
Reconhecer, portanto, a existência de necessidades humanas como 
necessidades sociais, com valores, finalidades e sujeitos definidos, tem sido 
um grande passo para a construção da cidadania, pois isso equivale 
reconhecer a existência de uma força desencadeadora de conquistas sociais 
e políticas (p. 68). 
Nessa linha, as políticas sociais atuam diretamente no processo de 
emancipação do cidadão e conquista da cidadania. Atuam numa perspectiva de 
inclusão e reparação das desigualdades sociais, que perpassam os momentos 
históricos de nossa sociedade, à medida que permitem o acesso aos direitos básicos 
 
50 
 
dos indivíduos, como saúde, moradia, trabalho e qualificação profissional, 
alimentação, entre outros. 
As políticas sociais governamentais são entendidas como um movimento [...] 
resultante do confronto de interesses contraditórios e também enquanto 
mecanismos de enfrentamento da questão social, resultantes do 
agravamento da crise socioeconômica, das desigualdades sociais, da 
concentração de renda e da pauperização da população (SOUZA et al., 
2013). 
Embora as conquistas já tenham sido inúmeras, vivemos em tempos de 
encolhimento de direitos, onde o Estado é máximo para o capital e mínimo para o 
social. O momento exige que o conceito de cidadania seja resgatado e que cada 
cidadão atue numa perspectiva de enfretamento à redução dos direitos já 
assegurados. 
Para Afonso (2016), a Seguridade Social é instrumento de inclusão social, já 
que propicia a inserção e reinserção no mundo do trabalho, a interação social, 
promovendo a cidadania consciente. Assim, é instrumento de efetivação dos direitos 
fundamentais, já que garante aos cidadãos o mínimo para sua subsistência, sendo 
possível manter a dignidade humana. 
Cabe ao Estado garantir a proteção social como política pública de cidadania e 
de direitos, excluindo as formas de políticas sociais focalizadas e assistencialistas, 
que somente reafirmam e mantêm a condição de desigualdade entre os cidadãos. 
 
6 LUTA E MOBILIZAÇÃO SOCIAL 
 
A mobilização social não é uma realidade contemporânea ou algo inventado 
pelas sociedades em sua nova configuração, trata-se de um processo que sempre 
esteve presente em toda a história da humanidade. Desde que as pessoas 
descobriram que poderiam agir no mundo e que se viram em coletividade, elas se 
mobilizam coletivamente e compartilham desejos, sentimentos e ações, buscando a 
construção de uma vida que lhes permita ter liberdade, autonomia e o direito de ser 
um ser humano com direitos e reconhecido como sujeito. 
 
 
 
 
 
51 
 
6.1 Democracia e cidadania 
 
Conceituar democracia não é uma tarefa fácil, pois seu conceito está em 
constante construção. Uma vez que a democracia decorre de acontecimentos 
históricos, é dinâmica e está em constante aperfeiçoamento. Dessa forma, não existe 
um conceito claro e direto sobre democracia que a defina sob diversos aspectos. 
Contudo, cabe destacar que além da mudança que sofre ao longo dos tempos, a 
democracia se apresenta em diferentes e variados graus de desenvolvimento, com 
características autoritárias e até democracias mais desenvolvidas (BASTOS, 1992; 
CANOTILHO, 2002; MATTOS, 2016). 
 
Fonte: www.santafeideias.com.br 
São várias as teorias que tentam descrever a democracia. Dahl (1997) 
desenvolveu um modelo que lista as condições necessárias para uma democracia 
perfeita, o qual denominou poliarquia (governo de muitos), capaz de absorver as 
diferenças em uma sociedade e refletir a vontade da população. Entre as 
características desse modelo estão: 
Liberdade de formar e aderir a organizações; a liberdade de expressão; o 
direito de voto; a elegibilidade para cargos públicos; o direito de líderes 
políticos disputarem apoio e, consequentemente, conquistarem votos; a 
garantia de acesso a fontes alternativas de informação; eleições livres, 
frequentes e idôneas; e instituições para fazer com que as políticas 
governamentais dependam de eleições e de outras manifestações de 
preferência do eleitorado (DAHL, 1997, p. 27). 
 
52 
 
No entanto, muitas destas características não estão presentes nos sistemas 
políticos. Para Rousseau (1981), a democracia verdadeira nunca existiu e não existirá, 
uma vez que é difícil reunir as condições necessárias para isso, por exemplo, 
facilidade de reunir o povo e que ele se conheça com facilidade; costumes simples 
que não permitam a multiplicação de problemas e de discussões espinhosas; 
condições de igualdade entre o povo (incluindo renda e poucoou nenhum luxo). Já 
para Bobbio (1986), só se governaria democraticamente se existisse um povo de 
deuses, ou seja, um governo perfeito não é um governo feito para os homens. 
Esses foram apenas alguns exemplos de que a democracia não é perfeita, mas 
é o melhor regime de poder que temos disponível. Na verdade, cada sociedade deve 
adotar o sistema de governo que melhor se adapta a sua cultura, costumes, crenças, 
leis e realidade social, características que se modificam com o tempo e com a própria 
evolução política. 
A democracia é um regime político em que o poder é representado pela vontade 
do povo, sendo garantido como um dos direitos universais e fundamentais do homem, 
na Declaração de Direitos de Virgínia (1776), na Declaração dos Direitos do Homem 
e do Cidadão (1789) e na Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), na qual 
todo indivíduo pode participar do governo de seu país, de forma direta ou indireta, por 
meio dos representantes escolhidos livremente por eles. Portanto, como previsto na 
Constituição Federal de 1988 (CF/88), parágrafo único do art. 1º, “todo o poder emana 
do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente [...]” 
(BRASIL, 1988). 
A democracia direta diz respeito à forma de organização social onde os 
indivíduos, sem distinção, podem participar ativamente da tomada de decisões, com 
direito a se manifestar e votar, exercendo a democracia. A participação popular, a 
discussão e o debate entre as pessoas eram características da democracia antiga 
onde as decisões eram tomadas de forma coletiva. Nesse sistema de governo é a 
população quem decide sobre os interesses públicos e administra a cidade decidindo 
desde realização de obras até a elaboração de leis. Cabe destacar que a democracia 
direta funciona melhor em pequenas populações. 
Grandes populações adotam a democracia indireta ou representativa, em que 
os cidadãos participam indiretamente na elaboração das normas e na administração 
pública por meio dos representantes que elegem para cuidar dos assuntos de governo 
 
53 
 
em seu nome por um determinado período de tempo (SILVA, 2000; MATTOS, 2016). 
Nos Estados modernos predomina a democracia representativa, dada a complexidade 
e a contingência de pessoas que as caracterizam atualmente. As críticas a esse 
modelo estão ligadas à falta de legitimidade e a discordância existente entre a vontade 
dos eleitores e de seus representantes. 
A democracia representativa se torna frágil quando poucos decidem por muitos. 
Essa fragilidade levou à busca por alternativas que fossem capazes de abraçar a 
vontade popular sem desistir do sistema representativo, fazendo surgir a democracia 
participativa ou semidireta, que tenta aproximar a vontade popular e o cidadão da 
decisão política, sem intermediação. A democracia participativa é baseada no sistema 
indireto, em que os representantes são escolhidos por meio de eleições e com 
características do sistema direto, como a iniciativa popular e o referendo, que dá ao 
povo o direito de propor e aprovar leis e normas (FERREIRA FILHO, 1994). Assim, a 
participação representativa, além de atribuir aos cidadãos maior comprometimento e 
responsabilidade em relação ao rumo político-jurídico do Estado no qual estão 
inseridos, exige deles maior conscientização e educação política, uma vez que se 
podem eleger seus representantes, devem também participar diretamente na 
formação dos atos legislativos (ZANETTI, 2013). 
 
Fonte: www.pt.slideshare.net 
 
54 
 
É na sociedade que o interesse público é construído e fortalecido, seja ele 
contraditório ou não, por meio da participação dos indivíduos na vida política do 
Estado. A partir disso, é possível desenvolver o conceito de cidadania, que não se 
restringe ao direito de votar e ser votado. Cidadania é o ato de participar ativamente 
da vida política de um Estado, seja por meio do voto, referendo, plebiscito, iniciativa 
popular ou do controle social, em que é possível fiscalizar as ações dos governantes 
e se os princípios da moralidade, probidade e legalidade estão sendo respeitados 
(TAVEIRA, 2009). Dessa forma, a cidadania é condição fundamental para a existência 
do sistema democrático e, para sua sobrevivência, é necessário que: “O povo esteja 
disposto a aceitá-lo; que tenha a vontade e a capacidade de fazer o necessário para 
a sua preservação e vontade e a capacidade de cumprir os deveres e exercer as 
funções que lhe impõe este governo. ” (MILL, 1981, p. 39). 
Portanto, você pode considerar que um povo que não exerce sua cidadania não 
possui representatividade e corre o risco de ser comandado por uma pequena classe, 
cujo interesse é satisfazer suas próprias necessidades e desejos. Cabe destacar que 
a cidadania é o pleno exercício da democracia, em que os indivíduos possuem direitos 
civis, políticos e sociais perante a lei e pertencem a uma sociedade organizada 
(TORO; WERNECK, 2004; TAVEIRA, 2009). 
 
6.2 Luta e mobilização social 
 
As lutas sociais estão diretamente relacionadas ao exercício da cidadania, pois, 
à medida que as pessoas tomam consciência de seu papel na sociedade, passam a 
reivindicar seus direitos e a contestar ou se inconformar com certas normas sociais 
que lhe são impostas, se organizando em movimentos de caráter político, religioso, 
etc. A organização em lutas não é algo novo no Brasil, sendo relatada desde os 
tempos de colônia e motivada por diversos fatores. No entanto, somente a insatisfação 
não é sufi ciente para iniciar um movimento de mobilização, ele só é possível por meio 
da ação coletiva (GOHN, 2000). 
Quando você houve falar em mobilização social o que vem à sua mente? 
Pessoas na rua com faixas e cartazes, passeatas, concentração? Isso são 
manifestações públicas, muitas vezes confundidas com mobilização social. Para 
Henriques, Braga e Mafra (2004, p. 36): 
 
55 
 
A mobilização social é a reunião de sujeitos que definem objetivos e 
compartilham sentimentos, conhecimentos e responsabilidades para a 
transformação de uma dada realidade, movidos por um acordo em relação a 
determinada causa de interesse público. 
A mobilização social é uma forma de construir soberania, cidadania, dignidade, 
entre outros, propostos na CF/88. A mobilização social acontece quando um grupo de 
pessoas, seja a sociedade de modo geral ou uma comunidade, se une em torno de 
um mesmo objetivo, buscando, cotidianamente, os resultados esperados por todos. 
Por que cotidianamente? Porque a mobilização requer uma dedicação contínua e, por 
isso, participar de um processo de mobilização deve ser um ato de escolha, uma vez 
que a participação é um ato de liberdade e uma decisão de cada um e, por isso, 
convoca a participação (TORO; WERNECK, 2004). 
Participa quem quer e quem se sente capaz de contribuir para a construção de 
mudanças, pois isso deve ser um ato de paixão e de razão, pois a mobilização existe 
para o alcance de um objetivo pré-definido e de um objetivo comum. Dessa forma, o 
desenvolvimento da mobilização social deve ser motivado por um sentido maior, por 
um propósito consistente capaz de fazer as pessoas imaginarem uma situação futura, 
adotando práticas transformadoras em sua rotina, participando, assim, de um 
consenso social que, para Toro e Werneck (2004), pode ser definido como a escolha 
e a construção de um interesse compartilhado. 
 
Fonte: www.sasop.org.br 
Para isso, é necessária a criação de conteúdos suficientemente fortes que 
estimulem a sociedade a realizar mudanças significativas. Isso significa que, no 
processo de mobilização, deve haver claramente e de forma simples, uma declaração 
 
56 
 
do motivo principal para a ação, por meio da análise da realidade social que se deseja 
mudar, do problema a ser solucionado, do projeto que se tem em mente, etc. Dessa 
forma, é importante saber quais ações podem solucionar os problemas ou transformar 
a realidade constatada e quaisefeitos são esperados (TORO; WERNECK, 2004; 
BOCK, 2008). 
Veja, a seguir e na Figura 1, as etapas do processo de mobilização social 
propostas por Toro e Werneck (2004) e Souza (1999): 
 Contextualização crítica da realidade local, conscientização; 
 Formulação de um imaginário coletivo; 
 Organização social; 
 Coletivização e corresponsabilidade; 
 Capacitação técnica; 
 Acompanhamento e avaliação. 
 
Em um primeiro momento torna-se fundamental ter percepção crítica da 
realidade em que os problemas sociais são diagnosticados, para que as políticas de 
enfrentamento possam ser definidas. Aqui, é necessário problematizar a realidade que 
se apresenta, buscando realidades implícitas. A conscientização, por sua vez, é a 
etapa referente ao ponto de partida para que a mobilização social se desencadeie. A 
conscientização se dá quando os atores assumem a posição de protagonistas sociais 
e conseguem problematizar e refletir sobre as condições em que vivem. A 
conscientização envolve a produção de um imaginário que, uma vez compartilhado 
 
57 
 
entre os atores sociais, permite orientar os objetivos que deverão ser alcançados por 
meio da mobilização social (SOUZA, 1999). 
A próxima etapa é a da organização social, que pressupõe a conscientização, 
que permite o aprimoramento para a tomada de atitude diante da realidade social que 
se apresenta. A organização é uma ampliação do processo de conscientização que 
leva a formas concretas de enfrentamento da realidade. A coletivização e 
corresponsabilidade, por sua vez, dizem respeito ao sentimento e a certeza que se 
tem de que aquilo que a pessoa faz, em seu campo de atuação, é também feito por 
outras pessoas, da mesma categoria, com os mesmos propósitos e sentidos. 
Por fim, chega-se a etapa da capacitação técnica, que tem como objetivo 
manter e fortalecer a organização social para que ela não se desarticule, o que não é 
impossível. A capacitação atua como uma estratégia de sustentabilidade, na qual os 
atores ampliam sua articulação coletiva para outros âmbitos, em busca de novas 
formas de intervir na realidade. Dessa forma, “a capacitação é um processo em que 
as experiências realizadas servem de base para a implementação das novas”, sendo 
um recurso para o gerenciamento e a avalição das práticas sociais (SOUZA, 1999, p. 
95). 
Para motivar as pessoas a participar e de que forma podem fazer isso, é preciso 
oferecer a elas informações claras sobre os objetivos, metas, a situação atual que se 
quer modificar e as prioridades da mobilização a cada momento, fazendo-as se 
sentirem seguras em relação ao respeito e à valorização de sua forma de pensar e 
agir e em relação a sua capacidade de contribuir para o alcance dos objetivos. 
Dessa forma, um projeto de mobilização deve permitir a compreensão 
adequada do campo de atuação de cada pessoa, conter explicações claras e 
consistentes sobre os problemas a serem resolvidos, as situações que serão criadas 
ou modificadas, o sentido e a finalidade das decisões que serão tomadas e das ações 
a serem perseguidas diariamente. Ainda, é preciso indicar quais decisões competem 
às pessoas dentro de seu campo de atuação e trabalho, explicando de que forma elas 
irão contribuir com o propósito da mobilização. Tudo isso deve ser apresentado de 
forma estimulante, para que as pessoas, em momento algum, se acomodem ou se 
sintam desestimuladas ou com sua autonomia à prova. Portanto, é fundamental que 
os produtores sociais da mobilização possuam conhecimento profundo sobre o campo 
de atuação e os papéis de cada um dos atores que podem participar da mobilização. 
 
58 
 
Você já se perguntou quem são os atores da mobilização social? Pode ser uma 
pessoa, um grupo, uma instituição que inicia um movimento com o intuito de alcançar 
algo, ou todos esses atores juntos, mobilizados para um ou mais propósitos ao mesmo 
tempo. O importante é que eles tenham a preocupação em seguir os critérios já 
mencionados. 
Cabe destacar que para que um processo de mobilização aconteça é preciso 
haver condições financeiras, institucionais, técnicas e profissionais. Dessa forma, o 
responsável por viabilizar o movimento de mobilização e conduzir as negociações 
necessárias para a legitimidade social e política é chamado de produtor social. O 
produtor social é primeiro ator de uma mobilização, que pode ser uma instituição 
pública, uma secretaria de Estado, uma empresa privada, uma pessoa, um grupo, e 
que tenha como intenção a transformação de uma realidade e esteja disposto a 
compartilhar isso com outras pessoas que possam ajuda-los nesse processo. 
É preciso que o produtor social tenha legitimidade, para que consiga 
credibilidade diante das outras pessoas, instituições, grupos, etc. O ideal é que o 
produtor social seja visto como alguém que possui uma preocupação e uma imensa 
vontade de realizar mudanças de forma compartilhada e não como o dono do 
processo. Para isso, ele precisa respeitar e confiar nas decisões coletivas, 
estimulando esse comportamento nas pessoas e a energia e criatividade delas e da 
coletividade, bem como o seu espírito empreendedor delas. Deve ser capaz de 
conhecer e interpretar a nossa realidade social; orientar um editor na produção de 
materiais adequados, com conhecimento sobre as possibilidades e limites da 
comunicação social; ter claros os conceitos de democracia, cidadania, público e 
participação; e ter tolerância e sensibilidade para trabalhar com as redes de reeditores, 
transformando-as em redes autônomas e doadoras de sentido próprio. 
A mobilização social é uma oportunidade de congregar pessoas para a 
construção de um projeto futuro que passa a ser de todos, e ela só tem utilidade e 
sentido para a sociedade se for assim, caso contrário deixa de ser uma mobilização 
para se tornar um evento, uma campanha ou algo semelhante. A mobilização social é 
vista, então, como um processo intimamente ligado à possibilidade de incluir os 
sujeitos em suas principais questões, criando mecanismos para sua participação 
(MAFRA, 2007). Dessa forma, podemos entender que a mobilização social é, para os 
indivíduos, um recurso para a construção e transformação de seus entornos, que se 
 
59 
 
realizam em nível coletivo, ou seja, por meio de ação e interação entre os sujeitos, 
cujo objetivo é a emancipação social. Assim, que para haja mobilização social é 
preciso entrar em relação, é preciso comunicar-se. 
 
6.3 Papel e funções da comunicação nos processos de mobilização 
 
Para funcionar como agente de transformação de determinada realidade, a 
mobilização social necessita da criação de vínculos coletivos, e a utilização 
estratégica de instrumentos da comunicação possibilita isso. Para manter esses 
vínculos, é preciso que haja uma constante troca de informação sobre os objetivos a 
serem alcançados, sem a necessidade de uma ligação formal para as pessoas agirem. 
Esses vínculos e relações devem ser alimentados e fortalecidos pelo contato 
constante entre as pessoas e pela troca de informações. 
A comunicação é tão essencial em um processo de mobilização social porque 
faz as informações circularem, promovendo a participação e o aumento do nível de 
vinculação entre os atores desse movimento (MAFRA, 2007). 
 
Fonte: www.crfsp.org.br 
O uso de instrumentos da comunicação permite que os atores conheçam o 
movimento e possam analisa-lo, julgá-lo e decidirem se participam ou não. Portanto, 
a mobilização social é um ato de comunicação, pois exige divulgação, discurso e 
informações. É necessário que haja um projeto de comunicação, cuja meta seja o 
compartilhamento de todas as informações relacionadas ao movimento, incluindo os 
 
60 
 
objetivos, as justificativas para a mobilização, o propósito, as ações que serão 
desenvolvidas, os lugares em que a mobilização acontecerá, etc. 
A comunicação e a informação são necessárias em um processo de 
mobilização social para: Informar as pessoas, dando a elas a autonomia, a iniciativa e a 
responsabilidade compartilhada necessárias; 
 Divulgar os propósitos da mobilização, justificando seu objetivo, ampliando 
suas bases e dando a ela visibilidade, abrangência e pluralidade; 
 Informar os reeditores, de modo que eles consigam verificar se o que estão 
fazendo ou falando está sendo compartilhado, dando-lhes mais segurança 
para agir; 
 Divulgar as ações e decisões dos diversos grupos de mobilização, formando 
um banco de ideias que podem ser copiadas por outras pessoas ou grupos, 
bem como divulgar a experiência de outros grupos ou pessoas em processos 
de transformação, servindo de incentivo para os que estão na ação e para 
aqueles que pretendem participar, uma vez que veem que agir e alcançar 
resultados é possível (toro; werneck, 2004). 
Cada processo de mobilização exige um modelo específico de comunicação, 
ou seja, a comunicação pode ser estruturada de acordo com o tipo de projeto e 
propósitos de cada um. Veja a classificação dos modelos de comunicação (TORO; 
WERNECK, 2004; RABELO, 2002). 
Comunicação de massa: voltada às pessoas anônimas, com o intuito de dar 
informações gerais sobre a mobilização e seus resultados. As mensagens são 
codificadas de forma a facilitar o entendimento, com informações mais genéricas que 
os outros níveis. 
 
Macrocomunicação: comunicação voltada às pessoas de acordo com seu 
papel ou ocupação na sociedade, também chamada de comunicação segmentada, 
construída utilizando códigos específicos de uma profissão ou ocupação. 
 
61 
 
 
Microcomunicação: voltada a grupos ou pessoas por sua especificidade ou 
diferença, também chamada de comunicação dirigida, construída sobre as 
características próprias e diferenciais do receptor. 
 
Os diferentes meios de comunicação podem ser utilizados em cada um dos 
modelos de comunicação citados, no entanto, há diferenciação em relação ao alcance 
de cobertura deles em cada nível, ou seja, quanto maior for a cobertura na 
comunicação de massa, menor será a efetividade da comunicação e a possibilidade 
de criar mudanças estáveis; a microcomunicação tem maiores chances de efetividade; 
e a macrocomunicação, tem a efetividade e a cobertura combinadas de forma 
específica. Apesar disso, não se pode afirmar que exista um tipo de comunicação 
melhor que o outro. Em geral, os três tipos de comunicação são necessários em um 
projeto de comunicação participada, mesmo sendo a macrocomunicação, a 
fundamental (TORO; WERNECK, 2004). 
Comunicar não é somente transmitir mensagens. Em um processo de 
mobilização, comunicar é criar vínculos e relações com outras pessoas. Para 
Henriques, Braga e Mafra (2004, p. 21): 
[...] a principal função da comunicação em um projeto de mobilização é gerar 
e manter vínculos entre os movimentos e seus públicos, por meio do 
reconhecimento da existência e importância de cada um e do 
compartilhamento de sentidos e de valores. 
 
62 
 
Dessa forma, os processos de construção e manutenção da mobilização estão 
intimamente ligados ao uso de técnicas de comunicação. Para Toro e Werneck (2004), 
as ações de comunicação, por permitirem a troca de repertório entre as pessoas, 
também possuem caráter educativo. 
O grande desafio da comunicação em um processo de mobilização social é 
mexer com a emoção das pessoas, fazendo elas quererem fazer parte dos processos 
de transformação de uma determinada realidade. As estratégias de comunicação 
visam, além de convocar, despertar ações e emoções ativas que se desdobram em 
outras ações participativas, solidárias e políticas. Outro desafio é gerar processos de 
comunicação e transformar pessoas comuns em atores, sujeitos, cidadãos (RABELO, 
2002). 
Esses movimentos têm como características o exercício da decisão partilhada 
e, por isso, exigem canais de comunicação desobstruídos, abundância de 
informações, autonomia, corresponsabilidade e representatividade. Dessa forma, o 
caminho ideal para gerar a participação, a verdadeira mobilização e a efetividade das 
iniciativas é planejar a comunicação, estabelecendo fluxos que estimulem a criação 
da corresponsabilidade. Assim, você pode compreender a comunicação mobilizadora 
como uma experiência e uma convivência entre sujeitos cujo objetivo é a alocar 
esforços, atitudes e comportamentos em busca de ações do ponto de vista social, 
cultural e político (PERUZZO, 1998; HENRIQUES; BRAGA; MAFRA, 2004). 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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7 REFERÊNCIAS 
 
BIBLIOGRAFIA BÁSICA 
 
ALVAREZ, S. Cultura e política nos movimentos sociais latino-americanos. Belo 
Horizonte: UFMG, 2000. 
 
CASTELLS. Manoel. O poder da identidade. São Paulo: Paz e Terra, 1999. 
 
GOHN, Maria da Glória. Movimentos Sociais no início do século XXI. Petrópolis, 
Vozes, 2003. 
 
OLIVEIRA, Roberto Veras de. Sindicalismo e democracia no Brasil: do novo 
sindicalismo ao sindicato cidadão. São Paulo: Annablume; Fapesp, 2011. História dos 
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Movimentos Sociais. São Paulo: Loyola, 1997. 
 
SHERER-WARREN, Ilse. Redes de movimentos sociais. São Paulo: Loyola, 1993. 
Cidadania sem fronteiras: ações coletivas na era da globalização. São Paulo: Hucitec, 
1999. 
 
 
BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR 
 
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Disponível em: . Acesso em: 28 jun. 2017. 
 
GOHN, M. G. Movimentos sociais na contemporaneidade. Revista Brasilera de 
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Acesso em: 26 jun. 2017. 
 
LÜCHMANN, L. H. H.; SOUSA, J. T. P. Geração, democracia e globalização: faces 
dos movimentos sociais no Brasil contemporâneo. Serviço Social & Sociedade, São 
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MEDEIROS, A. M. Jusnaturalismo e contratualismo. Portal Consciência Política, 
2016. Disponível em: . Acesso em: 27 jun. 2017. 
 
MONTAÑO, C.; DURIGUETTO, M. L. Estado, classe e movimento social. 3. ed. São 
Paulo: Cortez, 2011. (Coleção Biblioteca Básica/Serviço Social, v. 5).