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CAPÍTULO 5. Teoria de Representações de Grupos 211 sobre o sistema físico consiste em modificar as coordenadas do mesmo. O termo “coordenadas” aqui possui um significado amplo. Este pode significar de fato as coordenadas das posições das partículas do sistema físico em relação a um determinado sistema de referência em um espaço métrico, mas podem também se referir a coordenadas no espaço de fase, ou a outras propriedades que caracterizam o estado físico do sistema, tais como spin, carga elétrica, cor,17 etc. A dinâmica deste sistema, por sua vez, será determinada por um conjunto de leis (e. g., Leis de Newton, equações de Maxwell, equação de Schroedinger, etc) que fornecerão uma descrição quantitativa da evolução do mesmo. Esta descrição será usualmente realizada por intermédio de uma classe de funções que irão depender das coordenadas (no sentido amplo) do sistema. Essas funções serão elementos de um espaço funcional, isto é, de um espaço vetorial (de dimensão finita ou infinita), cujas bases são conjuntos de funções das coordenadas. Seja agora o grupo PR = {PR} formado por operadores lineares que executam transformações sobre as funções das coordenadas do sistema, ao invés das coordenadas propriamente ditas. Como o sistema físico permanece indistinguível após ser atuado por uma transformação isomé- trica R ∈ R, as leis que regem a sua evolução também devem também permanecer invariantes frente a ação de um operador PR ∈ PR que atua sobre uma função das coordenadas. Para que esta exigência seja satisfeita, é necessário que exista um isomorfismo entre o operador R ∈ R e um (e somente um) operador PR ∈ PR. Este isomorfismo é garantido pelo seguinte mapeamento: se r denota as coordenadas (no sentido amplo) do sistema físico e f (r) é uma função dessas coordenadas, então PRf (Rr) = f (r) PRf (r) = f ( R−1r ) , (5.44) sendo ambas as expressões equivalentes. Pode-se dizer que o operador PR muda a forma funci- onal de f (r) de maneira tal que compensa a transformação nas coordenadas r executada pelo operador R. Antes de se mostrar alguns exemplos, será verificado agora que o grupo PR é de fato isomór- fico a R. Para tanto, é necessário demonstrar que para R,S ∈ R, os correspondentes operadores PR, PS ∈ PR, dados por (5.44), satisfazem PSPR = PSR. Procede-se por etapas. Inicialmente, dada uma função das coordenadas f (r), a ação de PR executa a transformação f (r)→ g (r), sendo esta última uma outra função das mesmas coorde- nadas. Ou seja, PRf (r) = f ( R−1r ) = g (r) . Assim, g (r) é a nova função que incorpora a ação de R−1 sobre as coordenadas na sua forma funcional. Aplicando agora o operador PS, obtém-se PS [PRf (r)] = PSg (r) (5.44) = g ( S−1r ) = f [ R−1 ( S−1r )] = f ( R−1S−1r ) R,S∈R−−−−−−−−−−−→ R−1S−1=(SR)−1 f [ (SR) −1 r ] = PSRf (r) . Portanto, a transformação PSR correspondente ao elemento SR ∈ R é de fato o “produto” das transformações PS por PR. Algumas das transformações isométricas mais comuns e seus respectivos operadores funci- onais serão apresentados a seguir. 5.9.1.1 TRANSLAÇÕES ESPACIAIS Seja um sistema físico cujas coordenadas são descritas como pontos no espaço Euclideano E 3. Uma translação no sistema de coordenadas do E3 consiste na operação r → r′, onde r′ = Tρr . = r + ρ, sendo r = (x1, x2, x3) ∈ E3 uma posição no espaço, Tρ o operador de translação atuando sobre E 3 e ρ = (ρ1, ρ2, ρ3) ∈ E3 um vetor constante. A isometria do sistema físico frente a ação T irá 17No sentido da cromodinâmica quântica. Autor: Rudi Gaelzer – IF/UFRGS Início: 06/2013 Impresso: 8 DE DEZEMBRO DE 2022 212 5.9. Aplicações físicas da teoria de representações de grupo estabelecer os grupos cristalográficos espaciais. Como T pertence a um grupo, sempre existe a transformação inversa T−1 ρ r = r − ρ. Seja agora uma função das coordenadas ψ (r). Esta função pode ser, por exemplo, a solução da equação de Schroedinger para uma rede cristalina. Então, como após a transformação r → r′ a relação r = r′ − ρ é válida, a função ψ (r) passa a ser escrita como ψ (r) = ψ (r′ − ρ) r′;r−−−→ ψ (r − ρ) , sendo que a última forma foi obtida simplesmente eliminando o apóstrofo. Esta transformação possui duas interpretações. A translação r → r′ ocorreu no sistema de referências, cuja origem foi colocada no ponto r = −ρ do sistema original. Esta transformação é dita ser do ponto de vista passivo. De forma equivalente, a transformação ψ (r) → ψ (r − ρ) consiste em manter o referencial fixo e deslocar a função ψ (r) pela quantidade ρ. Esta é uma transformação do ponto de vista ativo.18 Por exemplo, se ρ1 > 0, a ação Tρ1r = Tx1 = x′1 = x1 + ρ1 significa que a origem do referencial foi deslocada para a esquerda e colocada no ponto x1 = −ρ1 do referencial anterior (transformação passiva). De forma equivalente, ψ (x1)→ ψ (x1 − ρ1) signi- fica que a função foi deslocada em relação à origem para a direita pela quantidade ρ1 (transfor- mação ativa), pois o valor da função na origem ψ (0) irá ocorrer agora em x1 = ρ1. Define-se então um operador linear PTρ que atua sobre as funções ψ (r) e que realiza sobre as mesmas a transformação correspondente a Tρ. Este operador é definido por PTρψ (r) = ψ ( T−1r ) ≡ ψ′ (r) = ψ (r − ρ) . (5.45) Busca-se agora uma expressão para o operador de translação PTρ . Escrevendo r = (x, y, z), considera-se inicialmente o caso particular onde ρ = (ρ, 0, 0). Então, dada a função ψ (x, y, z), PTρψ (x, y, z) = ψ (x− ρ, y, z) . Desenvolvendo ψ (x− ρ, y, z) em uma série de Taylor em torno de r, resulta ψ (x− ρ, y, z) = ( 1− ρ∂ ∂x + ρ2 2! ∂2 ∂x2 + · · · ) ψ (x, y, z) = exp ( −ρ∂ ∂x ) ψ (x, y, z) , onde o operador exp (−ρ∂/∂x) pode ser interpretado no contexto de uma série de Taylor. Estendendo essa operação agora para translação arbitrária ρ = (ρx, ρy, ρz), resulta ψ (r − ρ) = exp (−ρ · ∇)ψ (r) = exp (−iρ · p/~)ψ (r) , onde p = −i~∇ é o operador momento linear empregado na descrição de Schroedinger da mecâ- nica quântica. Comparando este resultado com (5.45), identifica-se PTρ = exp ( − i ~ ρ · p ) = 1− i ~ ρ · p+ · · · . Uma vez que ρ é real e p é um operador Hermitiano,19 resulta que PTρ é unitário. Neste caso, o operador inverso de PTρ satisfaz ψ′ (r) = PTρψ (r) =⇒ P−1 Tρ ψ′ (r) = P †Tρψ ′ (r) = ψ (r) . Uma interpretação mais clara do significado matemático do operador PTρ é a seguinte. Su- pondo que PTδr seja o operador que executa uma translação infinitesimal por ρ = δr. Então, adotando a notação r = (x1, x2, x3), pode-se escrever PTδr = 1− i ~ p· δr = 1− i ~ 3∑ j=1 pjδxj . = 1− i 3∑ j=1 Ixjδxj , onde Ixj = pj ~ . Este deslocamento arbitrário por δr pode ser escrito em termos de deslocamentos infinitesimais ao longo de cada eixo coordenado como PTδr = 3∏ j=1 PTδxj , sendo PTδxj = 1− iIxjδxj . 18Transformações ativas ou passivas serão novamente abordadas na seção 6.2.1. 19Ver definição 4.23. Autor: Rudi Gaelzer – IF/UFRGS Início: 06/2013 Impresso: 8 DE DEZEMBRO DE 2022 1 Sistemas de Coordenadas Curvilíneas Ortogonais 5 Teoria de Representações de Grupos 5.9 Aplicações físicas da teoria de representações de grupo 5.9.1 Isomorfismo entre transformações sobre sistemas físicos e transformações sobre espaços funcionais 5.9.1.1 Translações espaciais