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Relatorio sobre o livro? NO QUARTO ESCURO NO PALACIO DA ALVORADA.

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João Marcos Praxedes

A política brasileira em forma de romance

Krishnamurti Góes dos Anjos Ver Perfil

A política brasileira em forma de romance

 

Ezra Pound (1885-1972), afirmou que “os artistas são como antenas de suas épocas. Eles captam os acontecimentos de seu tempo e os refletem em suas obras”. E, por mais que não haja uma intencionalidade do autor ou por mais involuntário que se pretenda ser ao escrever uma obra literária, ela sempre se impregna por aspectos da realidade social na qual foi gestada. Há mesmo escritores que vão direto ao ponto a falar clara e explicitamente da política, embora nem sempre com um intuito ideológico marcado, entrelaçam arte e política sem que uma se sujeite a outra; testemunhos que denunciam as tramas da baixa política, as ambições de poder e as marginalizações daí decorrentes. Em suma. Molda-lhes um caráter de protesto e resistência.

E eis que, na volúpia de acontecimentos escandalosos que nos assolam, surge o romance “Num quarto escuro no palácio da alvorada” de Fabiano Viana Oliveira que constitui uma verdadeira retrospectiva de nosso passado de redemocratização nos últimos 30 anos. O autor constrói sua ficção apoiado na técnica do Flashback narrativo.  Interrupções na seqüência temporal do texto que levam a narrativa de volta no tempo a partir do ponto em que a história chegou, a fim de apresentar o relato de eventos passados. Muito útil para refrescar nossa memória sempre voltada para o que virá. Assim, certa ação presente é interrompida de forma instantânea e uma cena anterior é mostrada ao leitor. Técnica usada também para criar suspense, e um efeito dramático mais forte, ao tempo em que desenvolve o personagem central que é o Sr. Label Marques.

Label Marques é um jovem (30 e poucos). Ingênuo coitado, professor e doutor em Sociologia pela Sorbonne que, de volta ao Brasil, dá aulas em universidades privadas as quais não geram nem renda e nem status suficiente para compensar os anos de mestrado e doutorado. Para complicar ainda mais a situação do jovem professor, morre-lhe o pai, e é corneado pela mulher com seu melhor amigo Valner.

Segundo a visão de outro amigo (narrador em boa parte do texto), Label, tinha uma mente atormentada e via a situação do país como algo pessoal, um problema de pesquisa quase, que ele tinha que resolver.... uma verdadeira obsessão o assalta no sentido de saber a verdade dos fatos em relação às acusações de corrupção contra os políticos e do papel da mídia em tudo isso. Almejava lutar de alguma forma, contra “... a presença do patrimonialismo  no Estado brasileiro. Mas no final das contas ainda eram as mesmas famílias, as mesmas siglas e as mesmas corporações que mandavam no país...” p.30.  O lema do protagonista era a idéia de Nietzsche expressa em “A Gaia Ciência”: Nada é mais necessário do que o verdadeiro: tudo o mais, em relação com ele, tem importância secundária”. Label que é sociólogo até a medula, cita as Revoluções francesa, russa e cubana com as suas motivações iniciais e os desastres que acabaram por representar. Bem que poderiam servir de lições ao povo brasileiro...

Ante o estado de hospício geral que toma conta do Brasil hodierno, ele começa a investigar a vida e os atos (“supostos” e “verdadeiros”, tudo entre aspas como deve ser num ambiente de hospício geral), dos presidentes da república nos últimos 30 anos desde que saímos da ditadura até os estertores do governo Dilma. Assim; lá estão enfileirados a sofrer os “justiçamentos” de Label, (porque Label, que é um sujeito meio fraco de atitudes, um “banana” na versão da esposa adúltera, começa a coisa matando dois logo de cara. “o velinho do maranhão” e “o caçador de marajás”. O homem é de “um brilhantismo e habilidades de antecipação só vistas em personagens da ficção tais como o professor Moriarty, o arquival de Sherlock Holmes” ). Depois a vingança maligna se volta contra  “o sociólogo” para seguir-se um papo muito “light” com  “o homem barbudo, simpático e sem um dedo mínimo em uma das mãos”.

Label, é um Quaresma bem intencionado e puro do século XXI. (a pureza deixou-nos já de há muito, que tristeza). Lembra mesmo um Policarpo Quaresma, só que atualizado, usuário da rede web, informatizado e aliado das putas (ops! Garotas de programas). E o homem investiga e lê tudo sobre os escândalos que dariam páginas e páginas de resenha (a política, porque a literária já não aceita tanta ilusão). Dos escândalos: sivam, marajás, PC, banestado, mensalão, anões, sanguessugas, pasta rosa, tremsalão, aeroaécio, mensalinho, escândalo da mandioca, merenda escolar, furnas, violação do painel do congresso, compra de votos, petrolão. Label põe-se a escrever um calhamaço de 300 páginas com suas conclusões:

 “Temia que com tanta controvérsia no país entre esquerdas e direitas sem rumo numa ilusão constante de que estão falando coisas opostas, suas descobertas possam ser usadas para benefícios de alguns. Curioso como estes grupos antagônicos não se vêm dentro do mesmo caminho histórico” p.92.

Label tem lampejos de lucidez como o do trecho acima, e segue de entrevista em entrevista (engenhosamente forçadas), com os ex-mandatários até que “Num quarto escuro no palácio da alvorada” dá de cara com a Presidenta! Aí um nó violentíssimo.

Na literatura a realidade é criada ou recriada, inventada ou reinventada, imaginada, fantasiada, através de metáforas, alegorias, linguagem simbólica, mas nem por isso deixa de contribuir para desvendar aspectos das relações sociais e de poder. Serve de instrumento para a emancipação humana: sonhos e aspirações ganham asas e podem ser saciados. Fabiano Oliveira alimentou sua obra com elementos da experiência corrente e simultaneamente, exprimiu as aspirações da maioria que pasma e inerte assiste a tanto descalabro.

Voltemos mais uma vez ao último e trágico capítulo “De volta ao quarto escuro no Palácio da Alvorada”. Datado de 15 de dezembro de 2015. Label tem uma conversa muito esclarecedora com a Presidenta. Pena que a narrativa se encerre aí (o livro foi escrito em 2015). Em 31 de agosto de 2016 a cruel realidade nossa de cada dia nos apresentou o Impeachment de Dilma Rousself. Em seu lugar assumiu Michel Temer, dando corpo a uma previsão do próprio Label:

- O senhor está me comparando com Hitler, senhor Label? “Não senhora presidenta. Estou dizendo que se uma atitude de liderança não for tomada agora, talvez tenhamos no Brasil uma figura tão tenebrosa quanto Hitler num futuro próximo.”

 A literatura às vezes acerta prognósticos, às vezes não. O futuro dirá.

 

Livro: Num quarto escuro no Palácio da Alvorada – romance de Fabiano Oliveira. Edição do autor, Salvador-Ba.,2015, 104 p.

EM TEMPO: O livro pode ser lido GRATUITAMENTE no seguinte link:

https://issuu.com/fvianaoliveira/docs/quarto_escuro_3

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