Buscar

Poderes da Administração Pública

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 44 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 44 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 44 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

�PAGE �10�
UFBA - DIREITO ADMINISTRATIVO
Prof. Durval Carneiro Neto
OS PODERES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Sumário: 1) Fundamentos. As idéias de “relação de administração” e “dever poder”. O abuso de poder. 2) Poder vinculado e poder discricionário. 2.1) Tratamento clássico do tema. 2.2) Críticas à classificação tradicional. 2.3) O pensamento de Augustin Gordillo. 2.4) Os graus de vinculação à juridicidade. 3) Poder Normativo. 3.1) Os regulamentos e os instrumentos regulamentares. 3.2) A técnica da remissão normativa. 3.3) Os poderes normativos implícitos. 3.4) A técnica da deslegalização (não admitida no Brasil). 3.5) Regulamentos Executivos e Regulamentos Autônomos. 3.6) Obrigações primárias (originárias) e obrigações subsidiárias (derivadas). 3.7) Órgãos com competência normativa primária localizados fora do Poder Legislativo. 3.8) Decretos e outros atos administrativos de efeitos concretos. 3.9) Controle do poder normativo da Administração. 4) Poder de Polícia. 4.1) Sentido amplo e sentido estrito. 4.2) Origem da expressão police power e o emprego do conceito no Direito brasileiro. 4.3) Supremacia geral e supremacia especial. 4.4) Distinção entre poder de polícia e os poderes hierárquico e disciplinar. 4.5) Distinção entre poder de polícia e outras atividades estatais. 4.6) Críticas atuais à terminologia. 4.7) Competências e áreas de atuação. 4.8) Polícia administrativa e polícia judiciária. 4.9) Polícia geral e polícia especial. 4.10) Formas de atuação. 4.11) Características. 4.12) A questão da delegação de atos a entes privados. 4.13) Limites e controle do poder de polícia. 4.14) A adequada noção de poder de polícia no Direito Administrativo contemporâneo.
1) FUNDAMENTOS.
Para cumprir as suas finalidades, a Administração se vale de poderes por meio dos quais consegue fazer prevalecer a vontade da lei sobre a vontade individual, o interesse público sobre o interesse privado. 
Celso Antônio Bandeira de Mello qualifica as prerrogativas da Administração como sendo deveres-poderes, esclarecendo que “quem exerce função administrativa está adstrito a satisfazer interesses públicos, ou seja, interesses de outrem: a coletividade”; razão pela qual “o uso das prerrogativas da Administração é legítimo se, quando e na medida do indispensável ao atendimento dos interesses públicos”.� Com isso, põe em evidência o aspecto do dever, conferindo-se ao poder um caráter secundário e instrumental.
Na Ciência Jurídica, a idéia de potestade, em sentido amplo, está ligada basicamente a duas situações: a) o poder como direito subjetivo, assegurado a alguém para defender seu próprio interesse perante terceiros; b) o poder como função, assegurado a alguém para que proteja interesses alheios perante terceiros. 
Em suma, o poder se revela ou como poder-direito ou como poder-dever. Os poderes da Administração Pública, aqui estudados, enquadram-se nesta segunda situação. A Administração não age porque tem direito; ela age porque tem funções a cumprir, ou seja, porque tem deveres.
Esta distinção é importante, pois, como alude Luís Manuel Fonseca Pires, “enquanto o titular de um ‘direito subjetivo’ opta por exercer, ou não, o seu direito, o titular do ‘poder’ não pode deixar de cumprir suas funções de acordo com sua competência porque está é indisponível”.�
Nessa toada, merece menção ainda o ensinamento de Ruy Cirne Lima, baseado na clássica distinção francesa entre a “relação de propriedade” (baseada no exercício de direitos disponíveis) e a “relação de administração” (baseada no desempenho de funções indisponíveis, segundo uma finalidade cogente). Enquanto aquele que exerce direito subjetivo pratica atos de propriedade, aquele que exerce função pratica atos de administração.�
Consoante escreve o mestre gaúcho, enquanto na relação de propriedade o que predomina é a vontade do agente, na relação de administração “o dever e a finalidade são predominantes”. Daí sentenciar que “no Direito Administrativo, a relação de administração domina e paralisa a de direito subjetivo”.� 
Destarte, os poderes da Administração Pública são “deveres-poderes” irrenunciáveis; prerrogativas de autoridade, usufruídas nos estritos limites da lei e na medida essencial à finalidade perseguida. 
O administrador tem o dever de direcionar os seus atos ao interesse público e, para isso, utiliza-se do poder que lhe é conferido. O interesse público é a finalidade. O poder é apenas o instrumento e não um fim em si mesmo. Nenhum agente público exerce o poder por direito, mas sim porque tem um dever a cumprir. Outrossim, a liberdade dos indivíduos somente pode ser restringida pelo Estado nos termos da lei e em prol do interesse público. Fora disso, haverá abuso de poder.
Para José dos Santos Carvalho Filho, “é impossível conceber que o Estado alcance os fins colimados sem a presença de seus agentes, estes, o elemento físico e volitivo através do qual atua no mundo jurídico. Logicamente, o ordenamento jurídico há de conferir a tais agentes certas prerrogativas peculiares à sua qualificação de prepostos do Estado, prerrogativas estas indispensáveis à consecução dos fins públicos. Constituem elas os poderes administrativos. Mas, ao mesmo tempo em que confere poderes, o ordenamento jurídico impõe, de outro lado, deveres específicos para aqueles que, atuando em nome do Poder Público, executam as atividades administrativas em geral. (...) Vimos que sem determinadas prerrogativas aos agentes administrativos não poderia o Estado alcançar os fins a que se destina. Essas prerrogativas são exatamente os poderes administrativos. Pode-se, pois, conceituar os poderes administrativos como o conjunto de prerrogativas de direito público que a ordem jurídica confere aos agentes administrativos para o fim de permitir que o estado alcance seus fins”.�
A utilização do poder pelo agente público há de ser feita no estrito limite adequado ao cumprimento do dever legal, fora do que haverá abuso de poder.
Tal “abuso de poder” (gênero), como ensina Carvalho Filho, pode decorrer de duas causas (espécies): 
“1ª) o agente atua fora dos limites de sua competência; 2ª) o agente, embora dentro de sua competência, afasta-se do interesse público que deve nortear todo o desempenho administrativo. No primeiro caso, diz-se que o agente atuou com ‘excesso de poder’ e no segundo, com ‘desvio de poder’”. O desvio de poder também é chamado de “desvio de finalidade”.
2) PODER VINCULADO E PODER DISCRICIONÁRIO.
Quando estudamos o regime-jurídico administrativo, foi dito que o exercício da função administrativa há de obedecer aos ditames da legalidade. Essa é uma premissa fundamental do Estado de Direito.
Porém, esta vinculação à legalidade (melhor dizendo, à juridicidade) não segue um único padrão normativo, variando de grau a depender de como o legislador tenha prescrito o modo de agir da Administração. É nesse contexto que surgem as expressões “poder vinculado” e “poder discricionário”.
Fala-se em poder vinculado (ou poder regrado) “quando a lei atribui determinada competência definindo todos os aspectos da conduta a ser adotada, sem atribuir margem de liberdade para o agente público escolher a melhor forma de agir. Onde houver vinculação, o agente público é um simples executor da vontade legal. O ato resultante do exercício dessa competência é denominado de ato vinculado. Exemplo de poder vinculado é o de realização do lançamento tributário (art.3º do CTN)”.�
Fala-se em poder discricionário (atuação com discricionariedade), quando “o legislador atribui certa competência à Administração Pública, reservando uma margem de liberdade para que o agente público, diante da situação concreta, possa selecionar entre as opções predefinidas qual a mais apropriada para defender o interesse público. Ao invés de o legislador definir no plano da norma um único padrão de comportamento, delega ao destinatário da atribuição a incumbência de avaliar a melhor solução para agir diante das peculiaridades da situação concreta. O atopraticado no exercício de competência assim conferida é chamado de ato discricionário. Exemplo: decreto expropriatório”.�
2.1) Tratamento clássico do tema.
De forma simplificada, diz-se que atos vinculados “são aqueles em que a Administração não dispõe de qualquer liberdade para a sua expedição. Para essa espécie de ato a lei regula antecipada e exaustivamente o comportamento a ser seguido pelo agente público”. Já os atos discricionários “são aqueles que, embora regulados em lei, permitem ao agente público certa margem de liberdade ao serem editados. Importante é reter a idéia de que não se está falando de liberdade total, mas, sim, de certa liberdade deixada pela própria lei ao administrador no momento da prática do ato”.� 
Em outras palavras, atos administrativos vinculados são aqueles em que o administrador público fica adstrito aos limites dispostos na lei em relação ao objeto, à forma ou ao motivo, devendo praticá-lo de acordo com a previsão normativa aplicável à espécie, sem que para isso possa dispor. Já os atos administrativos discricionários são aqueles em que o administrador público, para praticá-lo, goza de certa liberdade para dispor, de acordo com o seu juízo de conveniência e oportunidade.
Saliente-se que tais conceitos não podem ser aplicados de forma estática ou absoluta, mormente quando não existem, na dinâmica da Administração Pública, atos puramente vinculados ou atos puramente discricionários. Na verdade, os atos administrativos se revestem de maior ou menor carga discricionária ou vinculada, conforme o caso, de acordo com a parcela de liberdade que seja concedida ao administrador público.
Nesse prisma, ressalte-se que todo ato administrativo, mesmo os tipicamente discricionários, revestem-se de alguma carga vinculada no que concerne a sua finalidade, que deve ser sempre de interesse público, bem como quanto à legalidade, já que ao administrador só é dado fazer o que a lei permite.
Posta a questão nesses termos, surge a problemática dos chamados atos arbitrários e da teoria do desvio de poder como limites ao exercício dos poderes discricionários. Sob tal aspecto, tem-se que os atos discricionários praticados com finalidade desviada do interesse público revelam-se substancialmente nulos, porquanto ferem o conceito de legalidade na esfera do Direito Administrativo, que envolve necessariamente o aspecto da moralidade. 
Assim, atos arbitrários seriam aqueles praticados sob o rótulo da oportunidade e da conveniência, porém, de forma desvirtuada, sem a devida pertinência com o interesse coletivo, traduzindo-se no desvio de finalidade. 
Sabe-se que o exame dos elementos de conveniência e oportunidade, típicos os atos discricionários, não se sujeitam, em regra, ao controle de validade por parte do Poder Judiciário, dada a autonomia conferida ao administrador e em respeito ao princípio constitucional da separação dos poderes. Entrementes, mister se faz verificar, segundo a ótica do princípio da razoabilidade, se tais critérios de conveniência e oportunidade refletem, em cada caso, verdadeiro interesse público, ou se traduzem mero interesse pessoal do administrador público, ardilmente camuflado e, portanto, com desvio de finalidade. Nesse caso, é dado ao Judiciário agir, anulando o ato.
A respeito do tema, confira-se o teor do seguinte julgado originário do Superior Tribunal de Justiça:
“ADMINISTRATIVO - ATO DISCRICIONÁRIO - CONTROLE JURISDICIONAL - PORTARIA QUE OBRIGA A VENDA DE COMBUSTÍVEIS A PREÇOS MENORES QUE OS RESPECTIVOS CUSTOS - INCOMPETÊNCIA - DESVIO DE FINALIDADE. I - Em nosso atual estágio, os atos administrativos devem ser motivados e vinculam-se aos fins para os quais foram praticados (V.Lei 4.717/65, Art. 2º). Não existem, nesta circunstância, atos discricionários, absolutamente imunes ao controle jurisdicional. Diz-se que o administrador exercita competência discricionária, quando a lei lhe outorga a faculdade de escolher entre diversas opções aquela que lhe pareça mais condizente com o interesse público. No exercício desta faculdade, o Administrador é imune ao controle judicial. Podem, entretanto, os tribunais apurar se os limites foram observados. II - A Portaria 324/98, em estabelecendo preços insuficientes à correta remuneração dos comerciantes varejistas de combustíveis sediados na Amazônia, inviabilizou a atividade econômica de tais negociantes, atingindo fim diverso daquele previsto na Lei 8.175/95”.�
Nesse mesmo diapasão, convém transcrever a lição de Maria Sylvia Di Pietro:
“Algumas teorias têm sido elaboradas para fixar limites ao exercício do poder discricionário, de modo a ampliar a possibilidade de sua apreciação pelo Poder Judiciário. Uma das teorias é a relativa ao desvio de poder, formulada com esse objetivo; o desvio de poder ocorre quando a autoridade usa do poder discricionário para atingir fim diferente daquele que a lei fixou. Quando isso ocorre, fica o Poder Judiciário autorizado a decretar a nulidade do ato, já que a Administração fez uso indevido da discricionariedade, ao desviar-se dos fins de interesse público definidos em lei. Outra é a teoria dos motivos determinantes, já mencionada: quando a Administração indica os motivos que a levaram a praticar o ato, este somente será válido se os motivos forem verdadeiros. Para apreciar esse aspecto, o Judiciário terá que examinar os motivos, ou seja, os pressupostos de fato e as provas de sua ocorrência. Por exemplo, quando a lei pune um funcionário pela prática de uma infração, o Judiciário pode examinar as provas constantes do processo administrativo, para verificar se o motivo (a infração) realmente existiu. Se não existiu ou não for verdadeiro, anulará o ato. Começa a surgir no direito brasileiro forte tendência no sentido de limitar-se ainda mais a discricionariedade administrativa, de modo a ampliar-se o controle judicial (...) Essa tendência que se observa na doutrina, de ampliar o alcance da apreciação do Poder Judiciário, não implica invasão na discricionariedade administrativa; o que se procura é colocar essa discricionariedade em seus devidos limites, para distingui-la da interpretação (apreciação que leva a uma única solução, sem interferência da vontade do intérprete) e impedir as arbitrariedades que a Administração Pública pratica sob o pretexto de agir discricionariamente”.�
2.2) Críticas à classificação tradicional
Já é tradicional a classificação dos atos administrativos, quanto ao grau de liberdade da Administração em sua prática, em vinculados e discricionários, tal como faz Hely Lopes Meirelles. Isso, porém, veio sendo objeto de críticas.
Posteriormente, alguns doutrinadores, calcados na lição de HAURIOU, passaram a falar em “poderes vinculados” e “poderes discricionários”. Nessa linha, se tem ensinado que a forma, a competência e a finalidade do ato administrativo seriam sempre elementos regrados (vinculados), podendo a discricionariedade recair sobre o objeto e o motivo.
Victor Nunes Leal já dizia que não existe ato discricionário, mas sim poder discricionário. Seabra Fagundes discorda, ponderando que as expressões “ato vinculado” e “ato discricionário”, além de já serem de uso generalizado, são apenas imagens de síntese que, no dizer de Bénoit, são necessárias na ciência jurídica para evitar circunlóquios.
Seabra Fagundes fala em competência vinculada (liée do direito francês, vincolata do direito italiano) e competência discricionária. Como exemplos de competência livre quanto a motivo, cita dois casos: 1) promoção por merecimento; 2) cargo de confiança demissível ad nutum.
Como situação de vinculação estrita, costuma-se citar o exemplo da aposentadoria compulsória do servidor público. Mas essa hipótese de vinculação, como diz Florivaldo Dutra de Araújo, é menos freqüente. O autor critica inclusive a expressão “poder vinculado”, considerando que o poder do administrador público é um só e indivisível. Propõe que sejam utilizada a expressão “aspectos vinculados do ato administrativo”, ao invés de“ato” ou “poder vinculado”.
2.3) O pensamento de Augustin Gordillo
Gordillo entende que todo ato é em parte regrado e em parte discricionário, havendo com isso graus de predeterminação da conduta administrativa.
Em sua obra “Princípios gerais do direito público” (1977), o autor argentino propõe interessante classificação dos aspectos que compreendem a regulação da atividade administrativa, levando em conta os graus de predeterminação da conduta administrativa através das normas jurídicas.
Regulação direta = ocorre quando a lei prevê, de forma expressa ou razoavelmente implícita, a competência que têm os órgãos administrativos para atuar, ou então a forma, o procedimento, objeto proibido, objeto autorizado somente para determinadas circunstâncias.
Regulação indireta ou inversa = ocorre quando, apesar de a lei não regulamentar a atividade administrativa, estabelece as condições sob as quais os administrados não podem ser molestados pela Administração. São situações de direito subjetivo dos particulares a que ninguém interfira em suas atividades.
Regulação residual = quando falta a regulação direta e também a inversa, tem-se ainda a regulação residual que oferece a Constituição quando a atividade administrativa afeta a essência do direito. Por exemplo, os atos administrativos normativos não podem ser praticados de forma a alterar ou restringir os direitos que se propõem a regulamentar.
Regulação técnica = antes chamada “discricionariedade técnica”. Se uma técnica é científica e, portanto, por definição, certa, objetiva, universal, sujeita a regras uniformes que não dependem da apreciação pessoal de um sujeito individual, é óbvio que não pode neste aspecto falar-se de completa discricionariedade. Alessi afirma que os termos “discricionariedade” e “técnica” são inconciliáveis. Diez assevera que os vícios sobre a operação técnica influem na legitimidade do ato administrativo.
Por tudo isso, Gordillo critica a atitude da doutrina, considerando errado se falar que, não havendo regramento da conduta administrativa (regramento direto), haveria discricionariedade, eventualmente limitada por alguma proibição ou norma geral. Prefere dizer que a atividade administrativa estará sempre regulada, seja direta, indireta ou residualmente, além do que existem as regulações técnicas.
2.4) Os graus de vinculação à juridicidade
Discorrendo sobre os novos paradigmas do direito administrativo contemporâneo, Gustavo Binenbojm propõe que substitua a tradicional dicotomia “ato vinculado versus ato discricionário” pela teoria dos graus de vinculação à juridicidade.
O autor explica a evolução que teve a “discricionariedade”, desde a sua origem ainda no Estado de Polícia como espaço de arbitrariedade do monarca absoluto, passando ao Estado de Direito, quando se construiu uma doutrina jurídica conciliadora da liberdade decisória com o princípio da legalidade, daí decorrendo a concepção de interesse público. 
Por força da tradição do antigo regime, a doutrina da legalidade administrativa revelou-se, no primeiro momento, como vinculação negativa à lei (negative Bindung), de modo que grande parte das decisões administrativas ficaram fora do controle judicial. Tratou-se de liberdade no espaço não abrangido pela lei, ou seja, um poder administrativo externo ao próprio ordenamento jurídico, de modo que o administrador poderia fazer não apenas aquilo que a lei expressamente autorizasse, mas também aquilo que a lei não proibisse.
Posteriormente, desde o século XIX a jurisprudência francesa veio construindo parâmetros jurídicos balizadores da discricionariedade administrativa, e, sobretudo após o século XX, por influência da doutrina de Kelsen no pensamento de Merkl, passou-se a conceber a discricionariedade como conseqüência inelutável das etapas de produção normativa, afirmando-se a concepção de vinculação positiva à lei (positive Bindung). Tratou-se de liberdade dentro da moldura legal, ou seja, todo poder legítimo passou a ser necessariamente um poder jurídico, ainda que possa haver certa indeterminação.
Essa juridicização da discricionariedade administrativa teve as seguintes etapas de desenvolvimento: 1) teoria dos elementos do ato (competência, forma, finalidade, motivo e objeto), com a possibilidade de sindicação dos elementos vinculados dos atos ditos discricionários (competência, forma e finalidade); 2) teoria de controle a partir de parâmetros implícitos na lei (como o desvio de poder, o excesso de poder e a teoria dos motivos determinantes); 3) teoria dos conceitos jurídicos indeterminados; 4) teoria da vinculação direta dos atos administrativos aos princípios constitucionais.
Por isso, há tempos que não mais se discute a possibilidade de controle jurisdicional dos atos administrativos discricionários, repousando a discussão nos limites (intensidade) e parâmetros (critérios) que devem presidir esse controle.
Para Binenbojm, deve-se superar a tradicional dicotomia “atos vinculados x atos discricionários”, passando-se a uma classificação que leve em conta os graus de vinculação à juridicidade, numa escala decrescente de densidade normativa vinculativa:
Vinculação por regras (constitucionais, legais ou regulamentares) = trata-se do mais alto grau de vinculação, quando se emprega no texto normativo conceitos objetivos ou ao menos decifráveis objetivamente.
Vinculação por conceitos jurídicos indeterminados = ocorre quando se emprega no texto normativo conceitos que comportam valoração, em que o grau de vinculação é intermediário. 
Muitos autores praticamente igualam tais situações ao exercício de poder discricionário. Mas Binenbojm critica isso, apontando a distinção entre discricionariedade e os conceitos jurídicos indeterminados. Explica que a evolução da doutrina dos conceitos indeterminados na Alemanha, sobretudo após a queda do nazismo e o advento, em 1949, da Lei Fundamental de Bonn (título adotado para reservar o termo constituição para um momento de reunificação da Alemanha, então dividida), fez com que se reduzisse o âmbito do poder discricionário, considerando-se que, ao contrário da discricionariedade, os conceitos indeterminados devem conduzir a uma única solução em cada caso, sujeitando-se, portanto, a juízos de legalidade e não de oportunidade. Neste mesmo sentido a opinião de Eros Grau.
Binenbojm salienta que os atos fundados em conceitos jurídicos indeterminados não são fruto de uma opção do administrador. Se é que há uma eleição, esta é do próprio legislador, que escolheu o uso de termos vagos e conceitos imprecisos, sendo que a sua aplicação resolve-se com a interpretação do seu sentido. Daí a maior possibilidade de controle jurisdicional dos atos fundados em conceitos jurídicos indeterminados (no que diz respeito ao núcleo preciso de significação, dentro das zonas de certeza positiva e negativa), não obstante sempre haja limites a este controle, tendo em vista a zona intermediária ou de penumbra (halo periférico do conceito). Dentro desta zona, o juiz não examina se a solução encontrada é a “correta”, mas, sim, se é “sustentável”. Se as razões da autoridade administrativa são “sustentáveis”, o juiz deve reverenciar a expertise na estimativa feita pela Administração.
Um controle judicial gradual dos conceitos indeterminados, variando a sua densidade de acordo com a respectiva área temática e o grau de objetividade do conceito, parece a solução mais adequada para alcançar uma concordância prática entre os princípios da separação dos poderes e da inafastabilidade do controle jurisdicional.
Vinculação diretamente por princípios = atualmente não se pode mais imaginar que a Administração esteja vinculada tão-somente à lei. A vinculação obedece a uma unidade normativa sistemática que envolve sobretudo a Constituição (um bloco de legalidade como um todo sistêmico, ao que Merkl chamou pela primeira vez de juridicidade administrativa). 
Por isso Juares Freitas defende um “controle sistemático” das relações administrativase o direito fundamental a uma boa administração, com afirmação concreta da hegemonia dos princípios constitucionais,num ambiente em que se tenha “a Constituição que administra”.
Binenbojm defende inclusive a possibilidade de haver um ato administrativo violador de preceito legal mas que, ainda assim seja válido, por força de princípios constitucionais. É o que ele chamada de juridicidade contra legem, em que, a despeito do vício de legalidade, reconhece-se a juridicidade dos efeitos do ato administrativo (ou a convalidação do próprio ato de origem) por motivos ligados normalmente à segurança jurídica e à boa-fé objetiva, as quais, numa equação de ponderação, devam prevalecer sobre a legalidade estrita. Mas o autor reconhece que o tema é complexo e controvertido, sobretudo quando se trata de possibilidade de repúdio a lei havida como inconstitucional pela Administração, sem prévio pronunciamento judicial.
É de se reconhecer ainda que poderão surgir casos nos quais se verificará um estreitamento do “mérito administrativo” e outros até mesmo de discricionariedade reduzida a zero. Com efeito, Binebojm sustenta que a incidência direta de princípios constitucionais por si só já causa um considerável estreitamento do mérito administrativo, mas haverá ainda situações excepcionais em que a discricionariedade estará reduzida a zero, ou seja, uma redução da possibilidade de escolha a uma alternativa, se todas as outras resultarem vedadas por incidência de princípios. São situações em que, por haver uma solução possível perante o direito, o juiz estará autorizado a determinar o conteúdo da decisão a adotar em substituição à anulada.
Por derradeiro, devemos advertir que vinculação (“poder vinculado”) e discricionariedade (“poder discricionário”) são realidades inerentes a toda e qualquer atuação da Administração Pública, inclusive no âmbito dos demais poderes que serão estudados a seguir. Na verdade, o poder administrativo é um só, e se revela sob diversos aspectos. O estudo separado desses aspectos cumpre apenas um fim didático, daí porque se fala em “poderes” da Administração. Assim, conforme veremos mais adiante, o poder de polícia é, ao mesmo tempo, um poder discricionário e um poder vinculado. E o poder normativo, que estudaremos no tópico a seguir, ocorre inclusive no âmbito do poder de polícia.
3) PODER NORMATIVO
O poder normativo da Administração Pública, também chamado de poder regulamentar (poder de expedir regulamentos), está relacionado à edição de normas gerais e abstratas pela Administração Pública, de caráter secundário em relação aos atos legislativos. Tal função normativa se expressa basicamente por meio de instrumentos regulamentares tais como os decretos, resoluções, portarias, instruções etc. 
A expedição de regulamentos consubstancia uma função típica da Administração Pública (portanto, é uma função administrativa), que não deve ser confundida com o poder normativo atipicamente exercido pelo Executivo ao expedir atos normativos primários (medidas provisórias e leis delegadas).
Dispõe o art.84, IV, da CF/88 que “compete privativamente ao Presidente da República: (...) “sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução”.
Com base nesse dispositivo constitucional, o conceito estrito de “regulamento” é traçado como sendo “ato administrativo, editado privativamente pelo Chefe do Poder Executivo, segundo uma relação de compatibilidade e hierarquia com a lei, a fim de assegurar seu fiel cumprimento e execução”.� 
Porém, à vista dos demais instrumentos regulamentares referidos, a doutrina tem também concebido a expressão “regulamento” numa significação mais ampla, de modo a abranger todos os atos normativos expedidos por órgãos e entes da Administração Pública, nos mais diversos escalões de competência, com o escopo de viabilizar a aplicação da lei.
3.1) Os regulamentos e os instrumentos regulamentares.
Tendo em vista a complexidade da organização da Administração Pública no Estado contemporâneo, cada vez mais descentralizada, é inevitável que outras autoridades, que não apenas o Chefe do Executivo, disponham também de competências para editar normas administrativas. A própria CF/88 assim sinaliza quando prevê, por exemplo, a competência dos Ministros de Estado para “expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos” (art.87, II). 
Segundo Clèmerson Merlin Clève, "a importância do poder regulamentar vem aumentando, ultimamente, em virtude da complexidade da sociedade contemporânea, exigente da exasperação das responsabilidades do Estado. O número de matérias a exigir ou aceitar disciplina normativa cresce de modo assustador. Nas áreas de cunho absolutamente técnico, mesmo de natureza econômica ou financeira, o legislador, inclusive por não dispor de formação adequada ou de capacidade de prognose, sempre difícil numa sociedade de risco, vê-se compelido a transferir ao Executivo o encargo de completar a disciplina normativa contida em lei com as soluções técnicas mais recomendáveis para cada situação. Não se pode negar que o poder regulamentar, embora os limites a ele inerentes, constitui mecanismo inevitável, muitas vezes suspeito, é verdade, pelo qual o Executivo contribui para a formação da ordem jurídica. Submetidos à lei e à Constituição, os regulamentos vão constituindo importante fonte do direito".�
Como bem destaca Fabrício Mota, “o constitucionalismo contemporâneo não somente admite como exige, por razões diversas, que o Executivo dite normas”, considerando que “não há possibilidade de se governar uma sociedade como a atual, cujas inter-relações são cada vez mais complexas e sutis, sem atribuir ao Executivo função normativa”.�
“O fundamento da função regulamentar é a Constituição, que deve discipliná-lo em todos seus aspectos; suas justificativas atuais são a necessidade de assegurar a correta e equânime execução das leis, mediante procedimentos e determinações dirigidas aos agentes que irão executá-la; e ainda a necessidade ativa do Estado de movimentar-se, utilizando-se de diversos mecanismos além das leis, para atender às exigências contempladas na Constituição (...) Pode-se sintetizar que o regulamento executivo, expedido para dar cumprimento à lei, deve ser editado para: a) precisar e padronizar os procedimentos que serão adotados em alguma ação administrativa determinada pela lei; b) precisar o conteúdo de conceitos enunciados, na lei, de modo vago ou impreciso; c) delimitar os contornos da competência discricionária legal”.�
“O instrumento do regulamento jurídico é, no estado moderno, indispensável. Ele serve, em primeiro lugar, ao alívio do parlamento, que nem está chamado a isto, nem por fundamentos temporais e objetivos está em condições disto, regular mesmo todos os detalhes, em especial tais de tipo mais técnico. Ademais, o regulamento jurídico possibilita uma adaptação rápida a circunstâncias que se modificam, o que exatamente em questões particulares técnicas freqüentemente é necessário”.�
Daí porque, explica Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “além do decreto regulamentar, o poder normativo da Administração ainda se expressa por meio de resoluções, portarias, deliberações, instruções editadas por autoridades que não o Chefe do Executivo”.� Tais atos, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, “alojam-se em nível inferior ao próprio regulamento. Enquanto este é ato do Chefe do Poder Executivo, os demais assistem a autoridades de escalão mais baixo e, de conseguinte, investidas de poderes menores. Tratando-se de atos subalternos e expedidos, portanto, por autoridades subalternas, por via deles o Executivo não pode exprimir poderes mais dilatados que os suscetíveis de expedição mediante regulamento”.�
Apesar de reconhecer a existência de instrumentos normativos inferiores, Fabrício Mota não aceita incluí-los no conceito de “regulamento”, aduzindo que:
“Tradicionalmente e há um bom tempo, parte da doutrina e da jurisprudência costumaunificar sob o desígnio regulamento, em maior ou menor grau, todas as normas editadas pelo Poder Executivo (seus órgãos e entidades) com hierarquia inferior à lei, dando margem à elaboração de um conceito hipertrofiado de regulamento. (...) A utilização de um conceito hipertrofiado de regulamento possui o inconveniente de unificar, sob um mesmo nome, manifestações editadas no exercício de diferentes funções (inclusive funções de governo e administração), que devem possuir distintos fundamentos e regime jurídico. (...) Ainda que inexista, a priori, uniformidade e mesmo relevância na nomenclatura atribuída às diversas espécies (p. ex. resolução, instrução, portaria, regimento), é importante verificar o regime jurídico destes atos e diferenciá-los dos regulamentos editados pelo Chefe do Poder Executivo”.�
Como se vê, há certa divergência sobre a natureza dos atos normativos expedidos pelas autoridades subalternas, em contraponto aos decretos e regulamentos de competência privativa do Chefe do Executivo. Parece-nos, todavia, que a questão se resolve simplesmente recorrendo-se à distinção entre a substância e a forma do regulamento, atentando-se, é claro, para os distintos regimes jurídicos a que se submete cada espécie normativa. 
A substância traduz a essência dos regulamentos, ou seja, o seu aspecto intrínseco, aquilo que revela a natureza regulamentar do ato normativo secundário (estabelecimento de normas de conduta, gerais e abstratas, desdobradas a partir da lei). Já a forma diz respeito aos variados instrumentos dos regulamentos, o seu aspecto extrínseco, aqueles atos administrativos através dos quais os regulamentos se revelam. No tocante a este aspecto, os regulamentos podem ser exteriorizados através de decretos, portarias, resoluções, instruções normativas, dentre outros.
Os decretos são atos de competência dos Chefes do Poder Executivo, nas três esferas de poder: Presidente, Governadores e Prefeitos. No dizer de Geraldo Ataliba, “decreto é a forma (veículo) de manifestação da vontade do chefe do Executivo. Quando essa manifestação se dá no exercício de competência regulamentar, tem-se o decreto regulamentar. Dessa consideração se vê que o decreto é a forma, o continente. Regulamento é a matéria, o conteúdo”.�
Do mesmo modo, todos os demais atos normativos secundários expedidos por órgão e entes da Administração são instrumentos (forma) regulamentares, isto é, são atos de natureza normativa (regulamentos, em sentido substancial). As portarias em geral competem ao escalão administrativo superior, onde se situam os ministros e secretários de governo. As resoluções são atos de competência de órgãos colegiados, como, por exemplo, o CONTRAN. Já as instruções são atos normativos de nível inferior, destinados aos agentes subalternos investidos de menores poderes. 
Desta distinção entre substância e forma, infere-se claramente que nem todo decreto terá caráter normativo. De fato, tal como acontece inclusive com alguns atos legislativos (v.g. leis que tratam de movimentação no orçamento público), há decretos que funcionam não como veículos de normas gerais e abstratas, mas, sim, para estabelecer efeitos concretos.
“O principal revestimento da materialização de competência do Chefe do Poder Executivo é o decreto. O decreto, nestes termos, é a fórmula ou o meio mais comumente utilizado, em princípio, com exclusividade pelo Chefe do Executivo para a prática de atos de sua competência. Pois bem, em alguns casos, a Constituição da República atribui competências que serão exercidas por meio da edição de atos administrativos com o nomen júris ‘decreto’, com efeitos concretos, que não serão regulamentos. A título de exemplo, pode-se fazer referência ao decreto que declara imóvel como de interesse social, para fins de reforma agrária (art.148, §2º)”.�
Voltando ao tema dos atos de natureza regulamentar, tem-se, como dito, a utilidade de melhor viabilizar a aplicação da lei. Vejamos agora de que modo isso pode ser tratado em cada direito positivo.
3.2) A técnica da remissão normativa.
Em alguns casos, é a própria lei que expressamente fixa a necessidade de regulamento para complementar a ordenação por ela estabelecida. É o que se chama de remissão normativa, como explica Fabrício Mota:
“(As remissões normativas) se verificam quando uma lei reenvia a um ato normativo inferior e posterior, a ser elaborado pela Administração, a regulação de certos elementos que complementam a ordenação estabelecida pela própria lei. (...) A lei, no caso, incumbe expressamente a Administração de elaborar ato normativo secundário, subordinado à mesma lei, para tratar de determinado assunto. Destaca-se que o ato normativo estará obrigatoriamente sujeito à preferência de lei posterior, devendo, obviamente, respeitar as reservas legais. A tais atos normativos aplica-se o que foi dito a respeito dos regulamentos. A utilização desta técnica é bastante comum e necessária, sobretudo em razão da necessidade de pormenorizar alguns pontos específicos da atividade administrativa, que costumam mudar com facilidade, e que por isso não podem encontrar tratamento adequado no rígido processo de elaboração da lei. É possível perceber que se trata de remissões normativas explícitas, atribuindo parcela de função normativa a algum órgão ou entidade administrativa. Certamente, os atos normativos editados com apoio em lei devem obedecer, em seu conteúdo, aos parâmetros legalmente estabelecidos. A obediência aos princípios constitucionais também é imperativa, inclusive na ausência de parâmetros legais claros”.�
A remissão obedece a certos parâmetros normativos pré-fixados na própria lei (“standards”), com base nos quais o administrador, dentro do âmbito da norma (o que Kelsen denominou de “moldura”�), especifica as suas hipóteses de incidência.
Exemplo desse tipo de remissão normativa é encontrado no Código de Trânsito (Lei 9.503/97), no tocante às atribuições normativas do CONTRAN:
“Art. 12. Compete ao CONTRAN: I – estabelecer as normas regulamentares referidas neste Código e as diretrizes básicas da Política Nacional de Trânsito; (...) V – estabelecer seu regimento interno e as diretrizes para o funcionamento dos CETRAN e CONTRADIFE; (...) VI – estabelecer as diretrizes do regimento das JARI; (...)VIII – estabelecer e normatizar os procedimentos para a imposição, a arrecadação e a compensação das multas por infrações cometidas em unidade da Federação diferente da do licenciamento do veículo; (...)X – normatizar os procedimentos sobre a aprendizagem, habilitação, expedição de documentos de condutores e registro e licenciamento de veículos”.
Sobre isso escreve Fabrício Mota:
“Com efeito, a Lei n. 9.503, de 23 de setembro de 1997, que institui o Código de Trânsito, incumbiu expressamente a Administração de elaborar atos normativos versando sobre diversas matérias ligadas ao assunto tratado na lei. (...) Com a referida habilitação legal, são editados pelo Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) diversos atos normativos secundários (na maioria das vezes, sob a forma de Resolução) que possuem alcance geral, sujeitando diariamente às suas prescrições praticamente todos os cidadãos no território nacional”.�
Na área eleitoral, a Lei 4.737/65 (Código Eleitoral) faz remissões normativas ao atribuir ao TSE a competência “para expedir as instruções que julgar convenientes à execução deste Código” (art.23, IX).
“Com base nesta atribuição normativa legal, foram elaboradas as principais regras que trataram das eleições no ano de 2006. Pode-se exemplificar a importância e a ampla utilização desta remissão invocando as resoluções n. 22.437 (dispôs sobre a utilização do horário gratuito de propaganda eleitoral reservado aos candidatos no segundo turno da eleição presidencial de 2006 e aprovou o plano de mídia das inserções) e n. 22.261 (dispôs sobre a propaganda eleitoral e as condutas vedadas aos agentes públicos em campanha eleitoral)”.�
O mesmo se diga da política ambiental fixada na Lei 6.938/81e Decreto n. 99.274/90, com relação às atribuições normativas do CONAMA:
“Art.8º. Compete ao CONAMA: I – estabelecer, mediante proposta do IBAMA, normas e critérios para o licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras a ser concedido pelos Estados e supervisionado pelo IBAMA; II – determinar, quando julgar necessário, a realização de estudos das alternativas e das possíveis conseqüências ambientais de projetos públicos ou privados, requisitando aos órgãos federais, estaduais e municipais, bem assim a entidades privadas, as informações indispensáveis para apreciação dos estudos de impacto ambiental, e respectivos relatórios, no caso de obras ou atividades de significativa degradação ambiental, especialmente nas áreas consideradas patrimônio nacional; (...) VI – estabelecer, privativamente, normas e padrões nacionais de controle da poluição por veículos automotores, aeronaves e embarcações, mediante audiência dos Ministérios competentes; VII – estabelecer normas, critérios e padrões relativos ao controle e à manutenção da qualidade do meio ambiente com vistas ao uso racional dos recursos ambientais, principalmente os hídricos”.
Atualmente, a técnica da remissão normativa vem sendo muito utilizada no tocante às agências reguladoras, a exemplo do que acontece com a Agência Nacional de Saúde – ANS (art.32 da Lei 9.656/98), a Agência Nacional do Petróleo – ANP (art. 15, XV da Lei 9.478/97), a Agência Nacional de Telecomunicações – ANATEL (art.19, XIX, da Lei 9.472/97), dentre outras.
3.3) Os poderes normativos implícitos.
Noutros casos, porém, não raramente a lei nada estabelece em seu texto, o que não afasta, por si só, a competência regulamentar da autoridade administrativa encarregada de zelar, da melhor forma, pelo seu cumprimento, bem como, sobretudo, pelo cumprimento dos ditames constitucionais. Trata-se aí de poderes normativos implícitos, que decorrem da própria razão de ser da competência administrativa fixada na Constituição:
“É interessante reconhecer a existência de competências implícitas, sobretudo em razão da força normativa da Constituição, da necessidade de concretizar seus preceitos e dos efeitos decorrentes dos princípios constitucionais antes comentados. A doutrina dos chamados poderes implícitos (implied powers) é clássica no direito americano, tendo, inclusive, irradiado sua compreensão para o constitucionalismo contemporâneo. (...) Nesse sentido, ainda quando a competência normativa não esteja expressamente determinada na norma, é possível deduzi-la recorrendo a uma interpretação finalística ou sistemática da mesma. A questão ganha relevância quando se trata de interpretação de normas constitucionais, sobretudo em decorrência do postulado hermenêutico de acordo com o qual deve ser assegurado o entendimento que maior eficácia lhe confira. (...) Não se pode, desta feita, considerar tais competências como um privilégio da Administração, pois estão necessária e estritamente ligadas ao alcance de objetivos constitucionais, possuindo natureza instrumental. Para evitar que a adoção da técnica das competências implícitas signifique adesão à máxima maquiavélica de que os fins justificam os meios, é também sumamente importante assegurar seu exercício rigidamente subordinado aos princípios e valores constitucionais. Também não custa ressaltar que tais competências devem profundo respeito aos princípios da reserva legal e da preeminência da lei”.�
3.4) A técnica da deslegalização (não admitida no Brasil). 
Saliente-se que a remissão deve obedecer a certos parâmetros normativos pré-fixados na própria lei (“standards”), sob pena de se configurar uma indevida delegação de função legislativa ao Executivo, chamada pela doutrina de deslegalização e não admitida no ordenamento brasileiro:
“Em nosso entendimento, a questão deve ser tratada com cautela. Para adequação ao ordenamento jurídico brasileiro, a lei atributiva de determinada parcela de poder normativo depende do estabelecimento mínimo de standards suficientes ao exercício de tal função. Bem por isso, o mínimo que se exige do Congresso é a predeterminação das finalidades e a medida do poder que se transfere. Deve existir, na lição de Marcos Juruena Villela Souto, ‘um início de legislação apta a confirmar, dentro de limites determinados, a normatização secundária do órgão delegado; se abdica do seu dever de legislar, transferindo a outros a responsabilidade pelas alternativas políticas e diretrizes a seguir, a invalidade seria patente’. A existência desse ‘início de legislação’ caracterizaria, bem se percebe, remissão normativa, adequada ao ordenamento, e não mera deslegalização. O oposto ao que aqui se propugna representaria, na concepção defendida, indevida – e em branco – delegação de função legislativa”.�
Deveras, de acordo com a Constituição Federal de 1988, a delegação legislativa somente é possível nos casos e segundo o procedimento expressamente previstos em seu art. 68. Fora daí haverá ilícito constitucional, consoante já se posicionou o STF:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI ESTADUAL QUE OUTORGA AO PODER EXECUTIVO A PRERROGATIVA DE DISPOR, NORMATIVAMENTE, SOBRE MATÉRIA TRIBUTARIA - DELEGAÇÃO LEGISLATIVA EXTERNA - MATÉRIA DE DIREITO ESTRITO - POSTULADO DA SEPARAÇÃO DE PODERES - PRINCÍPIO DA RESERVA ABSOLUTA DE LEI EM SENTIDO FORMAL - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA - CONVENIENCIA DA SUSPENSÃO DE EFICACIA DAS NORMAS LEGAIS IMPUGNADAS - MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA. - A essência do direito tributário - respeitados os postulados fixados pela própria Constituição - reside na integral submissão do poder estatal a rule of law. A lei, enquanto manifestação estatal estritamente ajustada aos postulados subordinantes do texto consubstanciado na Carta da Republica, qualifica-se como decisivo instrumento de garantia constitucional dos contribuintes contra eventuais excessos do Poder Executivo em matéria tributaria. Considerações em torno das dimensões em que se projeta o princípio da reserva constitucional de lei. - A nova Constituição da Republica revelou-se extremamente fiel ao postulado da separação de poderes, disciplinando, mediante regime de direito estrito, a possibilidade, sempre excepcional, de o Parlamento proceder a delegação legislativa externa em favor do Poder Executivo. A delegação legislativa externa, nos casos em que se apresente possível, só pode ser veiculada mediante resolução, que constitui o meio formalmente idôneo para consubstanciar, em nosso sistema constitucional, o ato de outorga parlamentar de funções normativas ao Poder Executivo. A resolução não pode ser validamente substituída, em tema de delegação legislativa, por lei comum, cujo processo de formação não se ajusta a disciplina ritual fixada pelo art. 68 da Constituição. A vontade do legislador, que substitui arbitrariamente a lei delegada pela figura da lei ordinária, objetivando, com esse procedimento, transferir ao Poder Executivo o exercício de competência normativa primaria, revela-se irrita e desvestida de qualquer eficácia jurídica no plano constitucional. O Executivo não pode, fundando-se em mera permissão legislativa constante de lei comum, valer-se do regulamento delegado ou autorizado como sucedâneo da lei delegada para o efeito de disciplinar, normativamente, temas sujeitos a reserva constitucional de lei. - Não basta, para que se legitime a atividade estatal, que o Poder Público tenha promulgado um ato legislativo. Impõe-se, antes de mais nada, que o legislador, abstendo-se de agir ultra vires, não haja excedido os limites que condicionam, no plano constitucional, o exercício de sua indisponível prerrogativa de fazer instaurar, em caráter inaugural, a ordem jurídico-normativa. Isso significa dizer que o legislador não pode abdicar de sua competência institucional para permitir que outros órgãos do Estado - como o Poder Executivo - produzam a norma que, por efeito de expressa reserva constitucional, só pode derivar de fonte parlamentar. O legislador, em conseqüência, não pode deslocar paraa esfera institucional de atuação do Poder Executivo - que constitui instância juridicamente inadequada - o exercício do poder de regulação estatal incidente sobre determinadas categorias temáticas - (a) a outorga de isenção fiscal, (b) a redução da base de calculo tributaria, (c) a concessão de crédito presumido e (d) a prorrogação dos prazos de recolhimento dos tributos -, as quais se acham necessariamente submetidas, em razão de sua própria natureza, ao postulado constitucional da reserva absoluta de lei em sentido formal. - Traduz situação configuradora de ilícito constitucional a outorga parlamentar ao Poder Executivo de prerrogativa jurídica cuja sedes materiae - tendo em vista o sistema constitucional de poderes limitados vigente no Brasil - só pode residir em atos estatais primários editados pelo Poder Legislativo” (ADI-MC 1296/PE, Rel.  Min. Celso de Mello, julgamento em 14/06/1995).
3.5) Regulamentos Executivos e Regulamentos Autônomos.
A doutrina faz algumas classificações sobre os regulamentos. A principal delas é que a classifica os regulamentos em executivos e autônomos. 
Tudo o que foi dito linhas atrás, aplica-se aos regulamentos executivos, por meio dos quais se busca tão-somente assegurar a fiel execução da lei (CF, art.84, IV). Não inovam a ordem jurídica, pois visam apenas desdobrar os comandos normativos da lei a fim de melhor instrumentalizar a sua aplicação pelos seus destinatários, em especial os agentes administrativos. São estes os regulamentos atualmente previstos no Brasil, onde só os atos legislativos podem inovar na ordem jurídica (fontes primárias do Direito). Os regulamentos, como atos administrativos, são fontes secundárias do Direito.
Já os regulamentos autônomos (também chamados de independentes), inovam a ordem jurídica, não sendo admitidos pela Carta Magna de 1988, haja vista as garantias individuais asseguradas pelo princípio da legalidade (CF, art.5º, II), segundo o qual somente os atos legislativos podem criar, modificar ou extinguir direitos e obrigações. No Brasil, sob a égide da atual Carta Magna, apenas se admitiu a superveniência de regulamentos autônomos em situações excepcionais autorizadas pela própria Constituição, no tocante aos regulamentos editados por alguns órgãos do Executivo cuja competência normativa era prevista anteriormente a 1988, pelo prazo de cento e oitenta dias prorrogável por lei, na forma do art.25, I do ADCT. 
Não obstante, alguns doutrinadores entendem que a Emenda Constitucional n.32/2001 teria excepcionalmente criado outra espécie de regulamento autônomo entre nós, ao modificar o art.84, VI, da Carta Magna, passando a admitir que o Presidente da República possa dispor, mediante decreto, sobre: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos. 
Essa não é propriamente a opinião de Celso Antônio Bandeira de Mello, para quem o Direito brasileiro apenas admite a existência de regulamentos executivos, sendo equívoco “imaginar que o art.84, VI, da Constituição do País introduziu em nosso Direito os chamados ‘regulamentos independentes ou ‘autônomos’ encontradiços no Direito europeu”.� Em relação ao disposto na letra ‘a’ do inciso VI, nada de autônomo se extrai propriamente; já no que concerne ao previsto na letra ‘b’, o autor até admite haver aí certa inovação, na medida em que o Executivo extingue funções e cargos que haviam antes sido criados por lei.
“Com efeito, se o Chefe do Executivo não pode nem criar nem extinguir órgão, nem determinar qualquer coisa que implique aumento de despesa, que pode ele, então, fazer, a título de dispor sobre ‘organização e funcionamento da Administração Federal?’ Unicamente transpor uma unidade orgânica menor que esteja encartada em unidade orgânica maior para outra destas unidades maiores – como, por exemplo, passar um departamento de um dado Ministério para outro Ministério ou para uma autarquia, e vice-versa; uma divisão alocada em certo departamento para outro departamento, uma seção pertencente a determinada divisão para outra divisão; e assim por diante. Pode, ainda, redistribuir atribuições preexistentes em dado órgão, passando-as para outro, desde que sejam apenas algumas das atribuições dele – pois, se fossem todas, isto equivaleria a extinguir o órgão, o que é vedado pela Constituição. Este é o regulamento previsto no art. 84, VI, ‘a’. Mera competência para um arranjo intestino dos órgãos e competências já criados por lei. Como é possível imaginar que isto é o equivalente aos regulamentos independentes ou autônomos do Direito europeu, cuja compostura, sabidamente, é muitíssimo mais ampla? Anote-se, por fim, que neste mesmo art. 84, VI, já agora na letra ‘b’, está contemplado um caso em que é permitido ao Executivo expedir ato concreto de sentido contraposto a uma lei, pois ali se prevê a possibilidade de o Presidente da República extinguir cargos vagos. Como os cargos públicos são criados por lei, sua extinção por decreto, tal como ali prevista, implica desfazer o que por lei fora feito”�.
Em suma: “entre nós, por força dos arts. 5º, II, 84, VI, e 37 da Constituição, só por lei se regula liberdade e propriedade; só por lei se impõe obrigações de fazer ou não fazer. Vale dizer: restrição alguma à liberdade ou à propriedade pode ser imposta se não estiver previamente delineada, configurada e estabelecida em alguma lei, e só para cumprir dispositivos legais é que o Executivo pode expedir decretos e regulamentos”.�
Fato é que o tratamento jurídico dado aos regulamentos no Direito brasileiro difere daquele existente em outros países. Aqui o vetor constitucional que contempla o princípio da legalidade é deveras forte para se admitir genericamente competências normativas primárias atribuídas ao Executivo. Predomina, então, a figura do regulamento executivo. O contrário se vê, por exemplo, na França, onde a própria Constituição prevê expressamente um rol aberto de matérias afetas ao campo normativo regulamentar, ou seja, há grande espaço para regulamentos autônomos. Conforme explica Fabrício Mota:
“Cabe, neste momento, alertar para a aplicação irrefletida da análise do regulamento autônomo constante da Constituição francesa de 1958 ao ordenamento brasileiro. A Carta francesa separa o domínio da lei (art. 34) do domínio do regulamento (art.37), sendo exaustivamente enumeradas somente as matérias que compõe o primeiro domínio. Na lição de Jean Rivero, ‘no domínio da lei, o legislador é o único senhor; mas é, ao mesmo tempo, prisioneiro; sendo só ele competente para estatuir acerca das matérias que lhe são reservadas, é incompetente em relação a todas as outras. (...) o domínio do regulamento deduz-se, pois, a contrário, da enumeração das matérias legislativas dada no artigo 34º: só por esta enumeração é limitado’. Apesar disto, a interpretação conferida pelo Conselho de Estado ao dispositivo ressalta a vinculação dos regulamentos autônomos aos princípios gerais do Direito Administrativo. No ordenamento brasileiro, como se viu, aplica-se como regra o princípio da preferência da lei, que lhe confere maior status hierárquico incompatível com a enumeração taxativa de matérias. A competência normativa do Executivo, ao contrário, por ser excepcional, deve ser interpretada restritivamente. A Constituição brasileira dispõe em sentido inverso da Constituição francesa: o domínio do regulamento é expressamente delimitado e, no caso do regulamento executivo, sempre subordinado à lei”.�
3.6) Obrigações primárias (originárias) e obrigações subsidiárias (derivadas).
Importante destacar, ainda, que o fato de os regulamentos executivos não inovarem na ordem jurídica não impede que eles especifiquem certas normas de conduta diretamente decorrentes das normas de conduta instituídas pela lei. Ora, um regulamento que apenas repetisse textualmente o que consta na lei seria inútil. É perfeitamente admissível que o regulamento,buscando garantir a fiel execução da lei, estabeleça certas condutas a serem seguidas pelos agentes administrativos e pelos administrados, como mero desdobramento das obrigações legais.
“Essa proibição de inovação deve ser entendida em seus devidos termos – não cabe atribuir à afirmativa valor absoluto a ponto de tornar o regulamento inútil, limitando-se a repetir a lei. Deve existir entre o regulamento e a lei uma relação de compatibilidade, e não de mera conformidade”.�
“A noção de regulamento de execução não pode ser circunscrita a uma atividade basicamente repetidora da lei. (...) sempre, em maior ou menor medida – ressalvadas, é claro, as hipóteses de reservas de lei, notadamente a absoluta – haverá espaço para atividade criativa do poder regulamentar de execução”.�
É preciso, então, em cada caso concreto averiguar se a obrigação prevista no regulamento (obrigação secundária) é simples desdobramento da obrigação prevista na lei (obrigação originária), ou se houve abuso do poder regulamentar, isto é, se a Administração, a pretexto de regulamentar uma lei, inovou indevidamente na ordem jurídica. 
“O poder regulamentar é subjacente à lei e pressupõe a existência desta. É com esse enfoque que a Constituição autorizou o Chefe do Executivo a expedir decretos e regulamentos: viabilizar a efetiva execução das leis (art.84, IV). Por essa razão, ao poder regulamentar não cabe contrariar a lei (contra legem), pena de sofrer invalidação. Seu exercício somente pode dar-se secundum legem, ou seja, em conformidade com o conteúdo da lei e nos limites que esta impuser. Decorre daí que não podem os atos formalizadores criar direitos e obrigações, porque tal é vedado num dos postulados fundamentais que norteiam nosso sistema jurídico: ‘ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei´(art.5o, II, CF). É legítima, porém, a fixação de obrigações subsidiárias (ou derivadas) – diversas das obrigações primárias (ou originárias) contidas na lei – nas quais também se encontra imposição de certa conduta dirigida ao administrado. Constitui, no entanto, requisito de validade de tais obrigações sua necessária adequação às obrigações legais. Inobservado esse requisito, são inválidas as normas que as prevêem e, em conseqüência, as próprias obrigações. Se, por exemplo, a lei concede algum benefício mediante a comprovação de determinado fato jurídico, pode o ato regulamentar indicar quais documentos o interessado estará obrigado a apresentar. Esta obrigação probatória é derivada e legítima por estar amparada em lei. O que é vedado e claramente ilegal é a exigência de obrigações derivadas impertinentes ou desnecessárias em relação à obrigação legal; neste caso, haveria vulneração direta ao princípio da proporcionalidade e ofensa indireta ao princípio da reserva legal, previsto, como vimos, no art.5o, II, da CF. Por via de conseqüência, não podem considerar-se legítimos os atos de mera regulamentação, seja qual for o nível de autoridade de onde se tenha originado, que, a pretexto de estabelecerem normas de complementação da lei, criam direitos e impõem obrigações aos indivíduos. Haverá, nessa hipótese, indevida interferência de agentes administrativos no âmbito da função legislativa, com flagrante ofensa ao princípio da separação dos Poderes insculpido no art.2o da CF. Por isso, de inegável acerto a afirmação de que só por lei se regula liberdade e propriedade; só por lei se impõe obrigações de fazer ou não fazer, e só para cumprir dispositivos legais é que o Executivo pode expedir decretos e regulamentos”.�
Feitas todas estas ponderações, cabe transcrever a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello sintetizando qual será o objeto da competência regulamentar da Administração Pública:
“Os regulamentos serão compatíveis com o princípio da legalidade quando, no interior das possibilidades comportadas pelo enunciado legal, os preceptivos regulamentares servem a um dos seguintes propósitos: (I) limitar a discricionariedade administrativa, seja para (a) dispor sobre o modus procedendi da Administração nas relações que necessariamente surdirão entre ela e os administrados por ocasião da execução da lei; (b) caracterizar fatos, situações ou comportamentos enunciados na lei mediante conceitos vagos cuja determinação mais precisa deva ser embasada em índices, fatores ou elementos configurados a partir de critérios ou avaliações técnicas segundo padrões uniformes, para garantia do princípio da igualdade e da segurança jurídica; (II) decompor analiticamente o conteúdo de conceitos sintéticos, mediante simples discriminação integral do que neles se contém”.�
3.7) Órgãos com competência normativa primária localizados fora do Poder Legislativo.
Já se falou anteriormente que a função legislativa é exercida tipicamente por órgãos que integram o chamado Poder Legislativo, que, no sentido orgânico, abrange as diversas casas parlamentares existentes no país (no âmbito federal, o Congresso Nacional, composto pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados; no âmbito estadual, as Assembléias Legislativas; no âmbito municipal, as Câmaras de Vereadores).
Não obstante, a própria Constituição admite que outros órgãos, não integrantes do Legislativo, exerçam atipicamente a função legislativa. O exemplo clássico é o das Medidas Provisórias editadas pelo Chefe do Executivo, com força de lei. O mesmo ocorre com as leis delegadas. São, ambos, atos legislativos. Não são meros regulamentos executivos, eis que inovam na ordem jurídica. Vale dizer, trata-se aí de competência normativa primária (função legislativa) e não competência regulamentar (função administrativa normativa). 
Mas essa função legislativa atípica não se resume ao exemplo das medidas provisórias. Existem também outros órgãos e entidades aos quais a Constituição atribui a competência normativa primária, em função da autonomia que devem dispor em respeito ao princípio da separação dos poderes, entendimento que já encontra força na doutrina e na jurisprudência. Seria o caso, por exemplo, dos regimentos internos editados pelos Tribunais, Casas Parlamentares e órgãos do Ministério Público, bem como certas resoluções expedidas pelo Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público. 
Nessa linha de pensamento, tais disposições não seriam meros regulamentos, mas, sim, atos com o mesmo grau hierárquico dos atos legislativos e, portanto, inovadores da ordem jurídica. Como explica Fabrício Mota:
“A verificação da existência de autonomias consagradas pela Constituição tem importante razão de ser: os atos editados pelos órgãos ou entidades autônomos, no estrito limite de suas atribuições, serão considerados primários, ligados por grau de dependência somente à mesma Constituição, possuindo a natureza de lei material e, conseqüentemente, o mesmo grau hierárquico conferido à lei formal. Em outras palavras: constituirão exceções ao princípio da primazia da lei. A ingerência do Executivo ou do Legislativo no campo específico destinado à normatização pelas entidades ou órgãos autônomos consistirá, por isso, em violação à ordem constitucional. Com efeito, a Constituição da República assegura aos poderes Judiciário e Legislativo e ao Ministério Público autonomia administrativa. A opção constitucional é, mais que adequada, necessária à configuração do Estado de Direito calcado na independência e harmonia dos poderes. Não se admitem, no exercício de cada um dos poderes, interferências recíprocas que não sejam constitucionalmente admitidas, sob pena de comprometer a necessária independência de cada qual. A independência destas instituições deve ser, por isso, vista como garantia do próprio regime republicano e democrático, tendo nítido caráter instrumental”.�
Em relação aos regimentos internos dos Tribunais, conforme dispõe o art.96, I, a, da Carta Magna de 1988, desde que respeitem as normas sobre processo e garantias processuais das partes, poderão dispor primariamente sobre a competência e funcionamentodos seus respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos. São, deste modo, atos de natureza mista, dispondo, os Tribunais, por meio deles, tanto de competência normativa primária quanto secundária:
 
“O art. 96, I, ‘a’, determina competir privativamente aos tribunais ‘eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos’. O delineamento constitucional faz destes regimentos, na visão de Carlos Ayres de Britto (ADC 12 MC-DF), ato normativo ao mesmo tempo primário e secundário – primário, no tocante à competência e ao funcionamento dos órgãos jurisdicionais e administrativos de cada tribunal; secundário, no que tange ao dever de observância das normas processuais e de garantia das partes”.�
Neste mesmo sentido, confira-se o seguinte precedente do STF:
 
“(...) 2. Com o advento da Constituição Federal de 1988, delimitou-se, de forma mais criteriosa, o campo de regulamentação das leis e o dos regimentos internos dos tribunais, cabendo a estes últimos o respeito à reserva de lei federal para a edição de regras de natureza processual (CF, art.22, I), bem como às garantias processuais das partes, ‘dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos’ (CF, art. 96, I, a). 3. São normas de direito processual as relativas às garantias do contraditório, do devido processo legal dos poderes, direitos e ônus que constituem a relação processual, como também as normas que regulem os atos destinados a realizar a causa finalis da jurisdição. 4. Ante a regra fundamental insculpida no art.5º, LX, da Carta Magna, a publicidade se tornou pressuposto de validade não apenas do ato de julgamento do Tribunal, mas da própria decisão que é tomada por esse órgão jurisdicional. Presente, portanto, vício formal consubstanciado na invasão da competência privativa da União para legislar sobre direito processual. Precedente: HC 74761, rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 12.09.97. 5. Ação direta parcialmente conhecida para declarar a inconstitucionalidade formal dos arts. 144, par. Único e 150, caput do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios”.�
Em relação aos atos normativos expedidos pelo CNJ (o mesmo se aplicando aos atos do CNMP), Fabrício Mota comenta o posicionamento do STF ao considerar constitucional a Resolução n.07/05 daquele órgão (que tratou de fixar procedimentos para evitar a prática de nepotismo no Judiciário), concluindo, assim, tratar-se de atos normativos primários:
“Interessa, contudo, especificamente a regra inscrita no art. 103-B, §4º, inciso I, que atribui ao Conselho competência para zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências. Em nosso entendimento, a expressão ‘atos regulamentares’ foi utilizada em sentido impróprio, não dizendo respeito somente aos atos complementares necessários à execução das leis. Tratam, ao contrário, de atos diretamente subordinados à Constituição, expedidos pelo Conselho somente para permitir o adequado manejo de suas competências. De acordo com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, o Conselho edita atos de caráter normativo primário, os quais retiram seu fundamento de validade e seu limite diretamente do §4º do art. 103-B da Constituição, tendo como finalidade desenvolver os próprios conteúdos lógicos ligados às suas competências. É dizer: os atos normativos expedidos pelo Conselho, no estreito limite de suas competências, encontram campo exclusivo para seu nascimento e desenvolvimento, imune à preferência da lei, sendo a ela vedado – e não só a ela, mas também ao Legislativo e ao Executivo – qualquer tipo de invasão, sob pena de afronta à Constituição. Aplicam-se, pois, ao Conselho, as conclusões parciais acima delineadas. Finalmente, dois pontos importantes ligados à competência normativa dos Conselhos podem ser destacados: a) no exercício de suas competências, claro que os Conselhos devem respeitar as matérias constitucionalmente reservadas ao tratamento por lei formal; b) a competência dos Conselhos para ‘zelar pela autonomia’ do Judiciário (no caso do CNJ) e do Ministério Público (no caso do CNMP) reforça a necessidade de respeito ao âmbito de autonomia das instituições, devendo ser preservado seu espaço de atuação conferido pela própria Constituição. Com efeito, as matérias que devem ser tratadas nas leis de organização judiciária e nas leis complementares de cada ramo do Ministério Público, como consectário lógico e necessário da autonomia de cada ente, não devem ser objeto de normatização por parte dos Conselhos”.�
Com efeito, a Resolução 07/2005 do CNJ é dotada de caráter normativo primário, “dado que arranca diretamente do §4º, do art. 103-B, da Carta-cidadã, e tem como finalidade debulhar os próprios conteúdos lógicos dos princípios constitucionais de centrada regência de toda a atividade administrativa do Estado, especialmente o da impessoalidade, o da eficiência, o da igualdade e o da moralidade. Dessa forma, compreende-se que CNJ tem, sim, poder normativo para estabelecer, em caráter geral e abstrato, proibição de nepotismo”.�
Em suma, essa Resolução é um ato normativo primário e não um simples regulamento executivo.
3.8) Decretos e outros atos administrativos de efeitos concretos.
Nem todos os decretos, portarias ou resoluções funcionam como regulamentos. Apesar de serem instrumentos normalmente utilizados para esta finalidade, há casos em que eles são expedidos sem qualquer natureza regulamentar, isto é, somente têm forma de decreto, portaria ou resolução, mas não estabelecem propriamente normas de conduta de caráter geral e abstrato. 
Diz-se, então, que são atos de efeitos concretos, como é o caso, por exemplo, de um decreto de desapropriação ou uma portaria que nomeia um servidor público.
Os atos de efeitos concretos são aqueles que produzem efeito diretamente sobre o patrimônio jurídico das pessoas a eles submetidas, não dependendo, para tanto, da intermediação de qualquer outro ato. Já se o ato é meramente normativo, seja lei, seja regulamento, sendo abstratos os seus efeitos, ainda dependerá da prática de outro ato para tornar concretas as suas disposições.
A distinção é deveras importante porque somente os atos de efeitos concretos comportam questionamento na via do mandado de segurança, descabendo este remédio contra atos normativos (Súmula 266 do STF). Outrossim, não é possível questionamento de ato de efeito concreto por via de controle concentrado de constitucionalidade. Confira-se a jurisprudência do STF sobre o tema:
“CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. LEI EM TESE: NÃO-CABIMENTO. Súmula 266-STF. I. - Se o ato normativo consubstancia ato administrativo, assim de efeitos concretos, cabe contra ele o mandado de segurança. Todavia, se o ato - lei, medida provisória, regulamento - tem efeito normativo, genérico, por isso mesmo sem operatividade imediata, necessitando, para a sua individualização, da expedição de ato administrativo, então contra ele não cabe mandado de segurança, já que, admiti-lo implicaria admitir a segurança contra lei em tese: Súmula 266-STF. II. - Segurança não conhecida”. (RMS 24266/DF, Rel.  Min. Carlos Velloso, julgamento em 07/10/2003)
“Ação direta de inconstitucionalidade: inviabilidade: ato normativo de efeitos concretos. 1. O Decreto Legislativo 121/98, da Assembléia Legislativa do Estado do Piauí, impugnado, impõe a reintegração de servidores, que teriam aderido ao Programa de Incentivo ao Desligamento Voluntário do Servidor Público Estadual (L. est. 4.865/96). 2. O edito questionado, que, a pretexto de sustá-los, anula atos administrativos concretos - quais os que atingiram os servidores nominalmente relacionados - não é um ato normativo, mas ato que,não obstante de alcance plural, é tão concreto quanto aqueles que susta ou torna sem efeito. 3. É da jurisprudência do Supremo Tribunal que só constitui ato normativo idôneo a submeter-se ao controle abstrato da ação direta aquele dotado de um coeficiente mínimo de abstração ou, pelo menos, de generalidade. 4. Precedentes (vg. ADIn 767, Rezek, de 26.8.92, RTJ 146/483; ADIn 842, Celso, DJ 14.05.93)”. (ADI-MC-QO 1937, Rel.  Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em  20/06/2007)
“MANDADO DE SEGURANÇA. RESOLUÇÃO N. 10/2005, DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. VEDAÇÃO AO EXERCÍCIO DE FUNÇÕES, POR PARTE DOS MAGISTRADOS, EM TRIBUNAIS DE JUSTIÇA DESPORTIVA E SUAS COMISSÕES DISCIPLINARES. ESTABELECIMENTO DE PRAZO PARA DESLIGAMENTO. NORMA PROIBITIVA DE EFEITOS CONCRETOS. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA N. 266 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE DE ACUMULAÇÃO DO CARGO DE JUIZ COM QUALQUER OUTRO, EXCETO O DE MAGISTÉRIO. 1. A proibição jurídica é sempre uma ordem, que há de ser cumprida sem que qualquer outro provimento administrativo tenha de ser praticado. O efeito proibitivo da conduta - acumulação do cargo de integrante do Poder Judiciário com outro, mesmo sendo este o da Justiça Desportiva - dá-se a partir da vigência da ordem e impede que o ato de acumulação seja tolerado. 2. A Resolução n. 10/2005, do Conselho Nacional de Justiça, consubstancia norma proibitiva, que incide, direta e imediatamente, no patrimônio dos bens juridicamente tutelados dos magistrados que desempenham funções na Justiça Desportiva e é caracterizada pela auto-executoriedade, prescindindo da prática de qualquer outro ato administrativo para que as suas determinações operem efeitos imediatos na condição jurídico-funcional dos Impetrantes. Inaplicabilidade da Súmula n. 266 do Supremo Tribunal Federal. 3. As vedações formais impostas constitucionalmente aos magistrados objetivam, de um lado, proteger o próprio Poder Judiciário, de modo que seus integrantes sejam dotados de condições de total independência e, de outra parte, garantir que os juízes dediquem-se, integralmente, às funções inerentes ao cargo, proibindo que a dispersão com outras atividades deixe em menor valia e cuidado o desempenho da atividade jurisdicional, que é função essencial do Estado e direito fundamental do jurisdicionado. 4. O art. 95, parágrafo único, inc. I, da Constituição da República vinculou-se a uma proibição geral de acumulação do cargo de juiz com qualquer outro, de qualquer natureza ou feição, salvo uma de magistério. 5. Segurança denegada” (MS 25938/DF, Rel.  Min. Cármen Lúcia, julgamento em  24/04/2008).
3.9) Controle do poder normativo da Administração.
Por fim, traçadas as balizas constitucionais no que concerne ao poder regulamentar, torna-se necessário examinar quais os mecanismos jurídicos de controle do exercício da função normativa da Administração Pública.
Primeiramente, tem-se o controle pelo Poder Legislativo, a quem cabe precipuamente zelar pela sua autonomia no exercício da atividade legiferante, obstando a ocorrência de usurpação pelo Poder Executivo. Daí que a Constituição Federal de 1988 prevê a possibilidade de sustação de atos regulamentares que extrapolem os limites da função normativa secundária:
“Art.49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: (...) V – sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa; (...) XI – zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa de outros Poderes”.
Ao lado disso, o controle do poder regulamentar pode ser feito pela própria Administração (Súmula 473 do STF) ou mediante provocação do Poder Judiciário, toda vez em que se questionar a ilegalidade ou inconstitucionalidade de um ato administrativo de caráter normativo.
4) PODER DE POLÍCIA
Nenhum direito individual, por mais precioso que seja, é absoluto, pois sempre encontrará limites em outros direitos individuais e, sobretudo, em direitos coletivos. 
“A liberdade 
“Não há direitos individuais absolutos a esta ou àquela atividade, mas ao contrário deverão estar subordinados aos interesses coletivos. Daí poder dizer-se que a liberdade e a propriedade são sempre direitos condicionados, visto que sujeitos às restrições necessárias a sua adequação ao interesse público”.� 
Discorrendo sobre o tema, são valiosas as palavras de Celso Ribeiro Bastos, quando diz que “no Estado de Direito o cidadão goza de um número bastante grande de direitos individuais, que decorrem da própria Constituição. Acontece, entretanto, que esses direitos não são passíveis de fruição absoluta por parte de seus destinatários. Não é da índole do direito, e as liberdades públicas não fazem exceção, conferir prerrogativas ilimitadas. Todo direito deve encontrar um ponto ótimo de utilização. É dizer, a satisfação de um direito individual pelo seu destinatário não pode ferir o direito de outros indivíduos, nem o interesse coletivo. A fruição de um direito de forma exagerada, extremada, desproporcional acaba por desnaturar o próprio direito”.�
Fazendo uma analogia com a física estática, tal como duas forças em sentido contrário devem encontrar o seu ponto de equilíbrio estrutural, cabe precipuamente ao Estado utilizar as regras do Direito para “equilibrar” os interesses individuais com os interesses públicos.
Quando assim atua, diz-se que o Estado exerce o seu poder de polícia administrativo, que, segundo Hely Lopes Meirelles, “é a faculdade de que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado”.� Sobreleva acentuar, então, que o fundamento único do poder de polícia da Administração é o interesse público em prol da coletividade.
Simplificando, o citado autor qualifica o poder de polícia com um “mecanismo de frenagem” de que dispõe a Administração Pública para conter os abusos do direito individual.
4.1) Sentido amplo e sentido estrito.
Celso Antônio Bandeira de Mello e José dos Santos Carvalho Filho identificam o poder de polícia em sentido amplo e em sentido estrito:
“A atividade estatal de condicionar a liberdade e a propriedade ajustando-as aos interesses coletivos designa-se ‘poder de polícia’. A expressão, tomada neste sentido amplo, abrange tanto atos do Legislativo quanto do Executivo. Refere-se, pois, ao complexo de medidas do Estado que delineia a esfera juridicamente tutelada da liberdade e da propriedade dos cidadãos. Por isso, nos Estados Unidos, a voz police power reporta-se sobretudo às normas legislativas através das quais o Estado regula os direitos privados, constitucionalmente atribuídos aos cidadãos, em proveito dos interesses coletivos, como bem anota Caio Tácito. A expressão ‘poder de polícia’ pode ser tomada em sentido mais restrito, relacionando-se unicamente com as intervenções, quer gerais e abstratas, como os regulamentos, quer concretas e específicas (tais as autorizações, as licenças, as injunções), do Poder Executivo destinada a alcançar o mesmo fim de prevenir e obstar ao desenvolvimento de atividades particulares contrastantes com os interesses sociais. Esta acepção mais limitada responde à noção de polícia administrativa”.�
“A expressão poder de polícia comporta dois sentidos, um amplo e um restrito. Em sentido amplo, poder de polícia significa toda e qualquer ação restritiva do Estado em relação aos direitos individuais. Sobreleva nesse enfoque a função do Poder Legislativo, incumbido da criação do ius novum, e isso porque apenas as leis, organicamente consideradas, podem delinear o perfil dos direitos, elastecendo ou reduzindo o seu conteúdo. É princípio constitucional o de que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (art.5o, II, CF). Em sentido estrito, o poder de polícia se configura como atividade administrativa, que consubstancia, como vimos, verdadeira prerrogativa conferida aos agentes da Administração,

Continue navegando