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1 2 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .................................................................................. 3 2.1 Um pouco de história ....................................................................... 16 3.1 O Romantismo e suas gerações no Brasil: Primeira geração ......... 29 3.2 Segunda geração ............................................................................ 31 3.3 Terceira geração ............................................................................. 32 4 O REALISMO CONTEMPORÂNEO E A ESCOLA REALISTA DO SÉCULO XIX .................................................................................................... 36 5 REALISMO / NATURALISMO ......................................................... 37 5.1 O problema do Real – conhecimento e experiência ........................ 38 5.2 Realismo e Naturalismo: a distinção na literatura brasileira ............ 41 6 TEMPOS MODERNOS E MODERNISMO NO BRASIL .................. 45 7 MODERNISMO E LITERATURA MODERNA BRASILEIRA ........... 47 7.1 Modernismo e crítica literária........................................................... 51 8 MODERNISMO: A CONTRIBUIÇÃO DE OSWALD DE ANDRADE 54 8.1 O antropófago Mário de Andrade .................................................... 60 9 PÓS-MODERNISMO E LITERATURA ............................................ 63 11 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................ 71 3 1 INTRODUÇÃO Prezado aluno! O Grupo Educacional FAVENI, esclarece que o material virtual é semelhante ao da sala de aula presencial. Em uma sala de aula, é raro – quase improvável - um aluno se levantar, interromper a exposição, dirigir-se ao professor e fazer uma pergunta , para que seja esclarecida uma dúvida sobre o tema tratado. O comum é que esse aluno faça a pergunta em voz alta para todos ouvirem e todos ouvirão a resposta. No espaço virtual, é a mesma coisa. Não hesite em perguntar, as perguntas poderão ser direcionadas ao protocolo de atendimento que serão respondidas em tempo hábil. Os cursos à distância exigem do aluno tempo e organização. No caso da nossa disciplina é preciso ter um horário destinado à leitura do texto base e à execução das avaliações propostas. A vantagem é que poderá reservar o dia da semana e a hora que lhe convier para isso. A organização é o quesito indispensável, porque há uma sequência a ser seguida e prazos definidos para as atividades. Bons estudos! 4 2 OS PRIMEIROS PASSOS DO ROMANTISMO NO CONTEXTO BRASILEIRO Fonte: portuguescompleto.com.br O Romantismo é, sem dúvida, ao lado do Modernismo, o mais importante momento literário no Brasil. E isto se deve ao fato de que é com ele que a literatura adquire sua autonomia, pois, até então, ela estava ligada, colonialmente, à literatura portuguesa, embora possuísse características brasileiras, conforme estudado na aula passada a partir do pensamento de Afrânio Coutinho (2008). É significativo o fato de Antonio Cândido dar por encerrada sua história da literatura brasileira, denominada Formação da literatura brasileira (1997), Para Ferreira (2012), construir uma literatura nacional fazia parte do projeto nacionalista, que surgiu no início do século XIX e levou o país à independência em 1822. A literatura romântica surgiu num momento político extremamente importante, incorporando os ideais de uma nação livre e independente. Por isso foi tão rica e exuberante, com muitos poetas e prosadores que exaltavam a natureza e o homem brasileiros. Para avaliar devidamente uma obra romântica é preciso não perder de vista o momento político em que surgiu. 5 De acordo com foi no período do Romantismo que o Brasil floresceu enquanto nação independente e buscou alçar voo em áreas distintas, entre estas, está literária, pois até então, tudo que era produzido no Brasil era “exportado” da Europa de forma que a produção acontecia em terras brasileiras, porém os temas e formas de composição das obras literárias eram inspirados em padrões europeus. O verbete romantismo, junto com o próprio movimento artístico e filosófico que posteriormente levaria o seu nome, seria de origem Inglesa ou francesa. Apalavra seria oriunda destes países e eram designadas as narrativas do início do século XII, narrativas que eram de feitos heroicos, aventura e amor. Somente pela análise etimológica do próprio nome, já seria possível notar que o que fosse de origem romântica não poderia ser clássico, pois segundo “Já a etimologia do termo indigita o gosto das tradições medievais e cultura folclórica”. (Schlegel, apud :Coutinho, 2004, p .4).Ou seja, não estava ligada á tradições e ritos da aristocracia. Ainda de acordo com Ferreira (2012), a literatura, enquanto forma de arte acompanha toda a dinâmica social e acontecimentos do plano político, filosófico e econômico são retratados em obras de seus respectivos períodos, pois esta arte secular e tão sublime além de poder representar de forma artística e simbólica as experiências da vida humana, também retrata o que acontece na sociedade onde nasce a respectiva obra literária. O século XIX foi marcado por acontecimentos que de certa forma mudaram o curso político do velho e do novo mundo. A revolução francesa foi um marco que impulsionou o Romantismo e colocou a baila a nova classe que seria então a dominante, a burguesia. Para Ferreira (2012), esse novo movimento filosófico e literário que surgira na Inglaterra, na Alemanha e depois se espalhara pela Europa culminou no Brasil, sobretudo, n´um sentimento de nacionalismo e de independência, pois nessa época, o Brasil ainda era colônia de Portugal. Apesar de, no Arcadismo ter surgido os primeiros sinais de insatisfação com a situação de submissão á coroa Lusitana, foi no Romantismo que a esse sentimento antilusitano se consolidou. Mesmo com Inconfidência Mineira, e obras de cunho satírico, como Cartas Chilenas, de Tomás Antônio Gonzaga, a colônia ainda continuava sob- forte domínio de Portugal. A grande quantidade de impostos que os brasileiros 6 pagavam aos nobres portugueses também foi fato que contribuiu mais ainda para com a insatisfação da colônia portuguesa, com isso, seria natural que o desejo de emancipação aos poucos aparecesse. Ferreira (2012). É no Arcadismo que a figura do índio começa a aparecer pela primeira vez, ainda não como herói tão nobre como veremos nas representações românticas, entretanto como simples nativo elemento da terra Apesar de o Brasil ter tido uma boa produção durante o arcadismo, tudo o que se produziu aqui era considerado artificial e superficial, visto que apesar de alguns escritores serem brasileiros, os temas eram puramente estrangeiros, o que rendeu também ao Neoclassicismo-forma como o Arcadismo também era conhecido- títulos de não muitos honrosos, muito do que era produzido era considerado artificial, resultado do puro convencionalismo árcade. Seria possível lançar um questionamento: Se a literatura é produzida no Brasil, por qual motivo ela não seria genuinamente brasileira? Ora, pois, muitos desses questionamentos e colocações dos intelectuais que aqui viviam estavam ligados também a questões políticas e sociais, pois se o Brasil, na condição de colônia, dependia de Portugal, nossa literatura não poderia ser livre e soberana se olharmos por esse prisma. Com toda a turbulência que a Revolução Francesa causou naquela época, pois o absolutismo estava declinando e o liberalismo ascenderia com a tomada de poder pela burguesia. A família Real, em 1808 vem para a sua Colônia mais desenvolvida, o Brasil, fato este que, de certa forma fora decisivo para o desenvolvimento da então colônia á emancipação desta que seria uma jovem nação. O Romantismo se manifesta como um movimento artísticoe filosófico que aparece no fim do século XIII e no começo do século XIX. Essa nova estética e ideais que é trazida é uma reação á estética e a filosofia iluminista, a qual embasou o Neoclassicismo, movimento anterior á era romântica. O Neoclassicismo, ou Arcadismo como também era conhecido, teve início no Brasil com a publicação de Obras Poéticas de Cláudio Manuel da Costa, em 1768. Foi no período de produção neoclássica que começou a surgir os primeiros sentimentos anseio por liberdade, o que deslanchou no movimento da Inconfidência Mineira, visto que Minas Gerais foi o principal cenário no qual os poetas árcades viveram e descreveram em suas obras. 7 No Brasil, o Romanticismo não chegou e se consolidou de forma direta. Antes da era romântica o nosso país passou por um período de transição: O Pré-romantismo. Essa época de transição que ocorreu em 1808-1836, entre o fim do apogeu da estética clássica e dos padrões árcades foi importante para que os ideais e os valores românticos depois se consolidassem e corroborassem de forma mais incisiva á formação dessa nova era, a era nacional na nossa literatura. O pré-romantismo descreve um estado de coisas que ainda são um prolongamento das ideias do século XIII, mas contraditoriamente prenuncia a fisionomia na nossa literatura. O Pré- romantismo no Brasil teve uma adjetivação oriunda da influência a da colaboração dos franceses na nossa nação, por isso, pode-se chamar essa época de Pré-romantismo Franco-Brasileiro. “O Pré-romantismo é um corpo de tendências, temas, ideias, sem construir doutrina literária homogênea, com remanescentes clássicas e arcádicas, e elementos novos” (COLTINHO, 2004, apud FERREIRA, 2012, p. 4). Tal denominação não foi dada por acaso, dada á importância que os alguns franceses tiveram na formação da nossa literatura, a contribuição deles não ficou só no plano literário, mas também em estudos naturalistas e históricos da jovem nação que acabara de sair dos domínios portugueses. Dentre estas figuras que corroboraram ao desenvolvimento da nossa literatura, está o Francês Ferdinand Denis. Em 1826 Denis publica sua primeira obra no Brasil: RESUMÈ DE L´HISTTORIE LITERARIE DU BRÉSIL , que falaria sobre nossa literatura. “Denis foi o primeiro a traçar um esboço de visão histórica das manifestações literárias do Brasil colônia e sugerir a projeção de uma literatura brasileira”. (COLTINHO, 2004, apud FERREIRA, 2012, p. 4). Outro francês que produziu em terras brasileiras na época do pré- romantismo foi Teodoro Taunay, membro da uma família que faria história dentro da nossa literatura com outros filhos Ilustres. Teodoro escreveu Os Índios Brasileiros (1830) obra que fala dos nossos nativos e da nobreza deles diante das adversidades oriundas do processo de colonização. Segundo Candido (2004), Teodoro Contribuiu ao sugerir aos brasileiros a importância da 8 poética da independência. Edouard Corbiére foi também outra figura importante nessa época de transição da nossa literatura, pois em Èlègies Bréseiliennes (1823) ele fala sobre a coragem dos índios brasileiros que preferiam a morte á escravidão. Teria sido talvez, esse o precursor do indianismo posteriormente na era romântica. No Brasil, o Romantismo teve início em 1836 com a publicação de Suspiros Poéticos, de Gonçalves de Magalhães, que poderia ser considerado o patrono do romantismo brasileiro devido a sua contribuição e atuação na produção desse período. O senso de relativismo colocado por Magalhães foi primordial ao desenvolvimento e concretização do movimento no Brasil. O período romântico brasileiro rendeu frutos na poesia, na prosa e no teatro. A poesia desse período, atendia, é claro aos ideais colocados em pauta pela ação revolucionária do Romantismo em oposição às formas e temas clássicos. Saindo da perspectiva clássica e aristocrática, esses novos moldes deixavam o poeta livre para criar e as formas outras canonizadas e retomadas pelo Arcadismo, - soneto, ode etc.- deixam de vigorar. “Quanto à forma, nenhuma ordem seguiu; exprimindo as ideias como elas se apresentam, para não destruir o acento da inspiração...”. (CANDIDO, 2004, apud FERREIRA, 2012, p. 4). Nos primeiros manifestos dos primeiros periódicos e revistas notava-se todo o sentimento de liberdade política, social, filosófica, o que refletiria diretamente na produção literária. Magalhães foi um dos escritores que encabeçaram essa primeira fase da poesia romântica, qual ficaria conhecida como nacionalista graças ao espírito patriótico o ufanismo. Não, oh! Brasil! No meio do geral merecimento tu não deves ficar imóvel e tranqüilo, como o colono sem ambição e sem esperança. O germe da civilização, depositado em teu seio pela Europa, não tem dado ainda todos os frutos que deveria dar, vícios radicais têm tolhido o seu desenvolvimento. Tu afastaste do teu colo a mão estranha que te sufocava, respira livremente, respira e cultiva as ciências, as artes, as letras, as indústrias, e combate tudo o que entrevá-las pode. (DAUVIM ET ́FONTAINE, LIBRARIES, 1836, apud FERREIRA, 2012, p. 4). A poética romântica pode ser considerada simples e singela, mas não é por acaso, pois já que a palavra de ordem era liberdade, o poeta 9 romântico não estava preso ás formas fixas e clássicas outrora vigentes. É na simplicidade e melancolia-sentimento muito comum em obras românticas –que a Canção do Exílio(1843),de Gonçalves Dias, que a escreveu quando estava exilado na África,torna-se um símbolo do romantismo no Brasil, pois tal poema e estrutura simples e fácil compreensão. Tamanha importância dessa obra reflete-se no fato de que alguns nos seus versos depois foram incorporados ao nosso hino Nacional. Canção do Exílio Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá, As aves que aqui gorjeiam, Não gorjeiam como lá. Nosso céu tem mais estrelas, Nossas várzeas têm mais flores, Nossos bosques têm mais vida, Nossa vida mais amores. Em cismar, sozinho, à noite, Mais prazer encontro eu lá, Minha terra tem palmeiras, Onde canta o Sabiá (...) (DIAS IN:COUTINHO, 2004, apud FERREIRA, 2012, p. 5). O sentimento de nacionalismo e o amor á pátria é algo presente nesse poema de Gonçalves e tal sentimento de apreço pela nação estende-se em outras obras. Os elementos da natureza brasileira são exaltados e a melancolia junto ao sentimento de saudade acentuam mais ainda a simples composição poética consagrando-a na poética romântica e nacionalista.Gonçalves Dias, de certo modo, na era romântica, fora o primeiro indianista, visto que antes, o Padre José de Anchieta já descrevera os nativos locais como bons selvagens, o padre que também era dramaturgo já incluía os índios em suas obras do período Barroco, porém, para o índio ser catequizado, o que na verdade era um aculturamento, o nativo precisaria estar inserido no contexto de civilidade europeu. O indianismo Gonçalviano, foi o primeiro a descrever o índio de forma heroica sem pagar tributos á estética e valores europeus.Gonçalves Dias foi o primeiro a fazer o binômio indianismo-Romantismo. No poema épico I-juca-Pirama(1848)que em Tupy significa “digno de morte” ou “aquele que há de morrer”, Gonçalves retrata toda a dignidade e valentia de um 10 indígena que se recusa a lutar e pede para não morrer após ser capturado pelos Timbiras, tribo inimiga, que após o pedido de soltura, acaba libertando-o por julgá-lo covarde. O valente guerreiro quer voltar á sua tribo para cuidar do seu pai que era doente e cego, no entanto,a após voltar á sua tribo de origem, o nobre guerreiro obedecendo ao pedido do velho pai, para não parecer covarde, volta a tribo inimiga paralutar e lavar sua honra que ficara em cheque após todo o ocorrido. O próprio poema I- Juca-Pirama além ressaltar o valor da figura do nativo brasileiro, nos dá um exemplo de musicalidade e fluência da poesia romântica. Musicalidade essa que poderia até nos remeter a rituais indígenas devido ao ritmo cadenciado e compassado do poema Canto de Morte: Meu canto de morte, Guerreiros, ouvi: Sou filho das selvas, Nas selvas cresci; Guerreiros, descendo Da tribo tupi. Da tribo pujante, Que agora anda errante Porfado inconstante, Guerreiros, nasci: Sou bravo, sou forte, Sou filho do Norte; Meu canto de morte, Guerreiros ouvi (...) (DIAS, 1997, apud FERREIRA, 2012, p. 6). Concebendo a era romântica como puramente burguesa e composta por aspectos contraditórios, é possível notar que o romantismo mantem certa unidade em alguns aspectos, porém em outros, ele é dualista, tendo como maior exemplo os autores da geração “Ultrarromântica”, a qual era pessimista e desacreditava nos ideais patrióticos. Contudo, no romantismo, o indianismo foi o movimento marcado pela idealização da figura do nativo que se manteve estável tanto na poesia quanto na prosa. Dentre todos os escritores da era romântica no Brasil, um dos mais notáveis, quiçá o mais importante de todos seria José Martiniano de Alencar Júnior, ou simplesmente José de Alencar. Esta cearense que nasceu em 1829, em Mecejana, um lugarejo na periferia de Fortaleza, foi o primeiro a criar um programa de identidade nacional a partir da literatura, apesar de também ter 11 sido jurista, filósofo do direito e político.Com apenas um ano de idade, Alencar muda-se para o Rio de Janeiro acompanhando os seus pais, pois o seu pai acabara de ser eleito senador do Império do Brasil. Porém a moradia na capital fluminense demorou pouco tempo, porquanto oito anos de idade o jovem voltou a morar na capital cearense quando o seu pai foi eleito governador daquele estado. Foi no período de sua infância que Alencar conviveu com a natureza exuberante daquele lugar. Foi com o conhecimento das leituras e peças de grandes obras francesas que, Alencar, morando na cidade de São Paulo, enquanto estudava direito tornou-se um ambicioso e promissor escritor pronto a estrear nas letras da jovem nação. Em 1854, após formar-se em direito Alencar vai morar na capital fluminense e começa a escrever no rodapé de um jornal. Desse episódio é possível notar a interação da imprensa com o público leitor e perceber a contribuição desse veículo midiático para com a formação do público ledor, pois foi com a impressão dos folhetins, tipo de publicação “importada” da França que grandes obras da nossa literatura começaram a publicar no Brasil. Foi na intenção de atrair leitores aos jornais que Alencar começou a escrever esses romances que eram um tipo de brinde aos leitores do jornal. Em 1857, Alencar lança em forma de folhetins O Guarany, romance considerado um dos maiores representantes do indianismo. Pois a trama contava a história de Pery, um nobre índio brasileiro e Cecília, a qual era chamada de Cecy, uma bela moça que descendia de europeus. Teria sido, talvez, o folhetim, um tipo de precursor das nossas novelas, visto que a técnica narratológica dos folhetins que fora inspirada em narrativas francesas, fora aplicada de forma genial por Alencar, pois no final de um capítulo ele sempre deixava algo despertando a curiosidade de quem lia para o próximo. Com o Romantismo, pois, nasceu a novelística brasileira e suas primeiras manifestações pertencem, hoje, ao domínio pouco acessível da arqueologia literária: de consulta difícil muitas vezes impossível, já não figuram nem mesmo nos estudos especializados, nos quais não deveriam faltar, pela contribuição que, como inauguradores da forma prestaram ao desenvolvimento do nosso romance. (DIAS, 1997, apud FERREIRA, 2012, p. 7). 12 Em O Guarani, trama alencariana, é possível notar como o a figura do indígena brasileiro é exaltada e mostrada de forma magistral pelo autor. O romance de Peri e Ceci poderia ser uma metáfora, do que seria a aproximação do velho mundo, que estava representado na figura de Ceci, que ás vezes agia de forma contraditória quantos aos seus sentimentos por Peri, enquanto o guerreiro indígena poderia representar o novo mundo, e toda a nobreza dos seus habitantes. No desenrolar do romance, Peri sempre é visto pelo narrador como um figura nobre que se sacrifica para ceder ao que seria caprichos de Ceci, que certa vez pede que o valente índio desça até um penhasco cheio de serpentes para resgatar um lencinho dela. Nessa trama Alencariana é possível notar a genialidade do autor, pois de forma magistral ele relata o episódio que Peri, pensando que seria devorado por uma tribo inimiga, ingere o veneno de uma cobra que picara Ceci, e com isso, a tribo que supostamente o devoraria, morreria envenenada. Ou seja, Alencar o canibalismo dos indígenas brasileiros fora superado pelo heroísmo de Peri, pois a figura do herói da nação não poderia ser canibal. O indianismo deu origem ao que ficou conhecido como o “mito do bom- selvagem”, mito esse que trouxe a baila questões filosóficas relacionadas ao discurso de Jean-Jacques Rousseau, pois este grande pensador do século XIII dizia que todo homem nasceria bom, mas seria corrompido pela sociedade, partindo desse postulado, o índio seria um ser sem a corrupção trazida pela colonização, portanto, a figura do índio era vista como um convite a um retorno ás formas primitivas da natureza humana as quais estaria livres da corrupção .Além promover o índio ao título de “herói nacional” esses romances também discorriam sobre o nosso processo de colonização e, no caso do O Guarani, como a figura do índio sempre tem vantagens pelo seu conhecimento da natureza e no fim da narrativa, Peri salva Ceci e os dois saem flutuando numa palmeira que o índio arranca livram-se de um dilúvio. O hálito ardente de Peri bafejou-lhe a face. Fez-se no semblante da virgem um ninho de castos rubores e lânguidos sorrisos: os lábios abriram como as asas purpúreas de um beijo soltando o vôo. A palmeira arrastada pela torrente impetuosa fugia... E sumiu-se no horizonte. (ALENCAR, 2012, apud FERREIRA, 2012, p. 7). 13 Apesar de a prosa romântica fosse basilarmente apoiada em fatos ficcionais, os romances que produzidos em terras brasileiras da época do romantismo foram subdivididos por temáticas. Entre as narrativas que eram produzidas, ou direcionadas na corte, levava-se o nome de “romances urbanos, e o que era produzido ou direcionado nas províncias, ou seja nos interior ou nas partes menos desenvolvidas naquela época eram chamados de “romances; regionalistas, ou históricos. Nessas narrativas era possível notar como a vida no pais era vislumbrada na filosofia e na estética do um socialismo utópico, pois a vida e as paisagem eram descritas e idealizadas pela, e para a nova classe que surgia, a burguesia. Dentre esses romances aqui produzidos, os urbanos era o tipo de narrativa na qual, basicamente, retratava-se o cotidiano da burguesia nos grandes centros urbanos, naquela época, as cidades do Rio de Janeiro e São Paulo. Nesse tipo de narrativa destacou-se A moreninha(1844), de Joaquim Manoel de Macedo. Essa narrativa de enredo e estrutura simples foi considerada pela críticauma obra simples e ingênua. Dentro dos moldes românticos, a trama retratava a vida cotidiana da burguesia em meados no século XIX e evidenciava as discussões sobre o amor e os casamentos arranjados naquela época. Mas, como em boa parte das obras românticas, sempre havia um final feliz por parte dos protagonistas, os quais se apaixonam na infância e depois se reencontram e tem um digno de uma trama romântica. A importância desse tipo de narrativa á sociedade era notável, pois naquela época, a literatura e leitura, serviriam como um “manual de bons costumes”, ou seja, esta arte retrataria o que seria um ideal de sociedade e famílias exemplares. Um grande exemplo do patriarcalismo que era refletido na literatura poderia ser Lucíola (1862), de Alencar. A trama narra a história de uma mulher do baixo meretrício que conhece Paulo, com quem tem um filho e no fim da história ela morre e é reclusa da sociedade por conta do pecado que cometera, o adultério. A morte da protagonista simboliza “o castigo merecido” que uma cortezã teria de ter naquela sociedade, afinal, seria inaceitável que uma mulher de conduta abominável tivesse um final feliz. 14 Em outra vertente, mas inda dentro da proposta do nacionalismo, os romances regionalistas tiveram uma função notável dentro do que se propunha: Divulgar os costumes e regiões ainda desconhecidas por grande maioria dos leitores daquela época. O sentimento de apreço pelas origens ainda é o mesmo, não obstante nos romances regionalistas, o autor parte do nacional, para o regional. Esse tipo de romance também trouxe a baila uma questão que iria de encontro a postulados da filosofia romântica, pois o romance regionalista foca mais em questões e descrições do coletivo , ao invés de aprofundar-se na subjetividade do próprio autor, visto que a subjetividade era um dos traços mais marcantes das obras românticas, demonstrando-nos mais uma vez as contradição desse período literário O romance regionalista, na literatura universal, nasceu da atividade da estética romântica como possível fruto da reação contra o subjetivismo exagerado, cujo epifenômeno era a hipertrofia do eu. (COUTINHO, 2004, apud FERREIRA, 2012, p.9). De acordo com Ferreira (2012), dentre vários escritores da prosa regionalista, Visconde de Taunay, descendente de franceses, é uma das figuras mais notórias, pois Inocência (1972), considerado a sua obra prima, o qual fora traduzido para quase todas as línguas modernas, fora um dos romances desse tipo que mais se destacou na época. Essa narrativa conta uma história de amor que se passa no interior do Brasil e mostra com tom romântico e realista as cores daquele lugar e daqueles costumes até então inéditos na literatura. Além de físico, matemático engenheiro e geógrafo, Taunay também era militar e foi nas expedições militares ele assimilou a cultura, a linguagem, os hábitos e tudo de mais singular que a região “norte”, como era conhecida, tinha de singular. Nesse conciso percurso de estudo sobre o período romântico, além de falar da poesia e da prosa, é necessário ressaltar também a importância do teatro romântico, pois foi nele e na literatura oral que os nossos romances de ficção tiveram sua obra arquitetônica. Na era romântica brasileira o teatro também contribuiu de firma significativa para com a formação da autonomia da nossa cultura. Apesar de não ter tradição teatral no Brasil, foi na época do romantismo que o teatro renovou e inovou o pouco desenvolvimento que as artes cênicas tinham no pais. Junto com a 15 literatura a dramaturgia brasileira também trouxe a proposta de inovar e sair dos moldes clássicos. Houve rompimento nos tríade que compunha o teatro: Tempo espaço e ação. As cenas tiveram a dinâmica modificada, elas aconteciam em lugares diversos e com recursos antes não utilizados, tais como animais que subiam no palco. Os textos eram mais voltados para temas sociais e retratava o cotidiano da burguesia. José de Alencar também escreveu peças para o tetro, mas não se enveredou muito na dramaturgia, uma das obras, talvez a melhor, intitulava- se O demônio familiar (1858) uma comédia feita em quatro atos de costumes leves. A trama narra a história de um escravo que quer casar os patrões com parceiros mais abonados e acaba sendo o capeta da trama. O castigo que ele recebe é a alforria. Fica a ideia de que o negro tem de ser tutelado. Vale lembrar que o autor era um aristocrata rural. Outro grande autor brasileiro que contribuiu para com a produção teatral foi Álvares de Azevedo, este ultrarromântico que também sofrera influência da cultura gótica europeia, pouco antes de morrer de tuberculose escreveu Macário (1852). A narrativa rela a história de um homem que após sonhar com Satã, faz uma viagem ele pelo mundo e discute sobre vários temas com a figura-mor do mal. Apesar de não ter contribuído com temas nacionalistas, esta obra de Azevedo incorpora uma das características fortes da geração ultrarromântica, o satanismo e a atração pela obscuridade da vida. Mas, não é possível falar da fundação da dramaturgia brasileira sem falar de Gonçalves de Magalhães, fundador do conservatório de Dramaturgia em 1843 e autor da primeira obra do teatro brasileiro. Antônio José ou o poeta e a inquisição (1838) a peça teve como principal protagonista João Caetano, o primeiro grande ator brasileiro que organizou e encenou a peça na praça da constituição no Rio de Janeiro em 13 de março de 1838, e foi bem recebido pelo público e crítica teatral, pela coragem de abordar este tema na época em questão, pois era baseada nos últimos dia de vida de um autor português, João Antônio da Silva, também conhecido como “o judeu”, que era um autor lusitano. Pode parecer incoerente, por conta do sentimento antilusitano aflorado no 16 romantismo brasileiro, Magalhães ter escrito uma peça sobre um escritor português, mas o sentimento nacionalista da crítica daquela época levou em consideração o fato de a peça ter sido escrita por um brasileiro e em terra brasileira. 2.1 Um pouco de história No início do século XIX, quando D. João VI embarcou com a corte para o Brasil, o projeto de civilizar a ex-colônia se tornou uma necessidade, para tanto, houve uma sucessão de transformações concretas na cidade sede da corte, Rio de Janeiro, logo após sua chegada. Além disto, várias expedições estrangeiras chegaram ao país com o intuito de explorar as características do novo reino. Acompanhando a Missão Artística Austríaca, o botânico alemão Carl Friedrich Philipp Von Martius ficou conhecido não apenas por seu trabalho de pesquisa, mas, sobretudo como vencedor do concurso para a escrita da história do Brasil pelo IHGB (Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro). O texto de von Martius (1845), Como escrever a história do Brasil, traçava a formação da história brasileira a partir das três raças: branco, índio e negro. O pesquisador estabeleceu uma maneira singular de dar a nacionalidade brasileira uma gênese baseada na miscigenação, creditando ao branco, no entanto, toda a força para o nascimento desta nova nação: “que o português se apresenta como o mais poderoso e essencial motor” (MARTIUS, 1845, p. 382) e atribuindo um papel proeminente na metáfora simbólica ao sangue português: “o sangue português em um poderoso rio deverá absorver os pequenos confluentes das raças índia e etiópica” (MARTIUS, 1845, p. 383). No entanto, apesar do destaque à figura do português, Martius (1845), ao mesmo tempo em que não fez maiores discussões acerca dos povos de origem africana, mostrou inquietação sobre a faltade entendimento acerca dos povos indígenas. Para ele, saber de onde vêm estes povos, como vivia antes da chegada dos brancos e, ainda, conhecer mais sobre sua cultura, era relevante para o desenvolvimento das relações com o homem civilizado. 17 O autor chegou a propor ao IHGB um dicionário com os termos das línguas indígenas, enfatizando a importância de se conhecer mais a história dos povos autóctones brasileiro: Como documento mais geral e mais significativo deve ser considerada a língua dos índios. Pesquisas nesta atualmente tão pouco cultivada esfera não podem jamais ser suficientemente recomendadas, e tanto mais que as línguas americanas não cessam de achar-se continuamente em uma certa fusão, de sorte que algumas delas em breve estarão inteiramente extintas. Muito há que dizer sobre este objeto; mas como devo supor que poucos historiógrafos brasileiros se ocuparão com estudos linguísticos, deixo à parte este assunto: aproveito, porém esta ocasião de exprimir o meu desejo que o Instituto Histórico Geográfico Brasileiro designasse alguns linguistas para a redação de dicionários e observações gramaticais sobre estas línguas, determinando que estes fossem ter com os mesmos índios (MARTIUS, 1845,apud FIGUEIREDO, 2020, p. 80). A preocupação de Von Martius se insere no processo de construção social da ideia de nação brasileira. Esse contexto apontava para a importância do conhecimento da cultura autóctone e suas especificidades e, sobretudo, do aproveitamento das línguas destes povos, como lembra a historiadora Lília Moritz Schwarcz (1999) em As barbas do imperador. Mesmo o conhecimento acerca dos indígenas sendo ínfimo, à temática reverberava na literatura, com os escritores utilizando até mesmo os antigos dicionários dos jesuítas, para entremear nas estrofes poéticas termos das línguas indígenas. O pensamento do cientista alemão influenciou o romantismo nacional na medida em que alguns elementos são característicos da gênese romântica literária. A importância do texto de van Martius está justamente em sua recepção e reverberação, como confirma Maria Ligia Coelho Prado (2001, p. 130) no artigo O Brasil e a distante América do Sul, pois “fundou uma linhagem interpretativa da História do Brasil, copiada à exaustão em manuais escolares, em artigos de jornais, em discursos políticos”. A visão do país alimentada por referências que se mantinham presentes e continuaram repercutindo no imaginário coletivo. Outro ponto que chama atenção em relação ao início do romantismo em território nacional diz respeito ao tratamento dado aos povos de origem 18 africana. Bernardo Ricúpero (2004) em O romantismo e a ideia de nação no Brasil (1830 – 1870) reflete sobre como o posicionamento frente a estes povos foi escamoteado, lembrando o silêncio em relação à escravidão. Enquanto os precursores do romantismo nacional fizeram do indígena o principal assunto, e mais que isso “um herói”, como lembra Nelson Werneck Sodré (1995, p. 264) em História da literatura brasileira, o negro foi legado ao esquecimento intencional. Em uma sociedade escravista, a figura indígena correspondia “ao quadro das relações sociais dominantes” (SODRÉ, 1995, p. 267), ao passo que evidenciar a figura do negro, seria negar o quadro destas relações. A posição ocupada pelos indivíduos de origem africana na literatura era aquela imposta pelo papel que ocupavam enquanto força de trabalho: O negro não podia ser tomado como assunto, e muito menos como herói, não porque, segundo escreveu um estudioso moderno, refletindo a ideia generalizada de sua classe, fosse submisso, passivo, conformado, em vez de altivo, corajoso, orgulhoso, dado que não podia ser senão assim, submetido que estava ao regime de escravidão – mas porque representava a última camada social, aquela que só podia oferecer o trabalho e para isso era até compelida. Numa sociedade escravocrata, honrar o negro, valorizar o negro, teria representado uma heresia. Não chegaria a ocorrer aos escritores do tempo, oriundos da classe dominante, e nem teria tido o romantismo, posto nesses termos, afinidade alguma com o mundo dos leitores, também recrutado naquela classe (SODRÉ, 1995, apud FIGUEIREDO, 2020, p. 81). Esta situação de escamoteamento da condição de sofrimento imposta aos povos de origem africana não se perpetuou durante todo romantismo, alguns nomes insurgiram neste contexto acentuando o problema da escravidão, como Tobias Barreto, Castro Alves, Joaquim Nabuco, a precursora do posicionamento feminino sobre os problemas sociais, Nísia Floresta Brasileira Augusta, e ainda a escritora e professora maranhense Maria Firmina dos Reis, autora de Úrsula (1859), considerado o primeiro romance abolicionista escrito por uma mulher no Brasil (MENDES, 2007). Dentro do estilo circundante de seu tempo, a autora elabora um enredo em que consegue trazer aspectos aceitos pela literatura romântica, permeado pelo amor da protagonista e do mocinho branco, mas, também inova, ao denunciar os maus tratos dados aos escravizados de seu país, dando voz aos personagens 19 negros, deixando que estes demonstrem toda a sua humanidade. Assim, a autora rompe com o discurso racista hegemônico perpetrado no ocidente por muitos séculos, principalmente na literatura, em que a ótica nacional era emitir ideais das classes dominantes. Portanto, mesmo se ajustando aos interesses da elite nacional desde sua fundação, o romantismo brasileiro era uma via de mão dupla da realidade. Isto porque, não se prendeu somente à recepção dos cânones marcados pela dependência dos modelos europeus, mas por meio de alguns escritores e escritoras, tentou ultrapassar o horizonte da visão emotiva e se assentar na leitura analítica da realidade, mesmo no que se refere ao tema indianista. Neste sentido, está à poesia aguda de Sousândrade, como lembra Haroldo de Campos (2001, p. 226) em uma análise de o Guesa Errante (1874- 1877), do referido poeta maranhense: Se o indianismo em nossa poesia romântica acabou resultando numa apologética artificiosa e decorativa do “bom selvagem”, nobre e heróico, em Sousândrade a temática indígena tomou inflexão diversa. Em primeiro lugar, a forma de seu longo poema não é afetada pela obsolescência daquela adotada seja por Gonçalves de Magalhães em A Confederação dos Tamoios (1856), seja por Gonçalves Dias no inacabado (e superior) Os Timbiras (1857), mas é, antes, fruto de uma inovadora mistura de gêneros, sob a tônica da “narrativa de viagem” [...]. Em segundo lugar, o poema não é exclusivamente brasileiro, mas “transamericano” (com um breve interlúdio na África, Canto VII, apenas iniciado). Essa singularidade já se define na eleição do protagonista, o novo Guesa, o poeta errante [...] gue equivale a “casa”, sendo, pois, guesa o “sem casa”, condição essa de “desterro” e orfandade com a qual o poeta maranhense se identificava inclusive biograficamente. (AROLDO, 2001, apud FIGUEIREDO, 2020, p. 83). Sousândrade propõe um modo diferente de representar o indígena em relação aos seus contemporâneos, somado à busca por uma construção representativa do povo americano, não apenas do povo brasileiro. A definição de elementos que reproduzam um espaço ainda não transformado pela colonização americana é uma das imagens que aparece em Guesa errante. O americanismo ou o “instinto de americanidade”, como nomeia o pesquisador Luiz Roberto Velloso Cairo (2009) no estudo A condição americana da nossa identidade é outro tema presente em muitos textos românticos brasileiros, na medida em que se observa o sentido de 20 pertencimento continental nestas publicações da época. A aproximação das composições brasileiras com textos publicados na América hispânica delineia os matizes que marcam o espaço compartilhado desta americanidade. Exemplo destes textos é a antologia poética escritapor autores de vários países americanos lembrados por Cairo (2009): América poética, Colección escojida de composiciones en verso, escritas por americanos en el presente siglo é uma delas. Organizada pelo crítico argentino Juan María Gutiérrez, esta antologia teve sua primeira edição em fascículos, publicados entre fevereiro de 1846 e junho de 1847 pela Imprensa de El Mercurio, de Valparaíso, no Chile, e a segunda edição, já no formato de livro, em 1866, publicado pela Imprensa de Mayo, de Buenos Aires. América poética reúne poemas de 53 poetas, sendo catorze da Argentina, onze do México, cinco do Chile, cinco do Uruguai, quatro de Cuba, três da Bolívia, três da Colômbia, três do Peru, três da Venezuela, um do Equador e um da América Central, e constitui a primeira coletânea sistemática de poesia americana em língua espanhola e busca sintetizar ‘a progressiva ascensão da inteligência americana’, conforme aponta o crítico José Enrique Rodó, no ensaio ‘Juan María Gutiérrez (Introducción a un estudio sobre literatura colonial)’. (CAIRO, 2009, apud FIGUEIREDO, 2020, p. 84). Estas produções concentravam “o claro desígnio de traçar uma nova cartografia poética de um território profundamente comovido pelas revoluções políticas” (CHIAROTTI, 2013, p. 8, tradução nossa). O que se pode apreender é que as trajetórias culturais e políticas estavam intimamente ligadas à ideia de cooperação entre os países da América hispânica com seus ideais de independência. A figura de destaque neste quadro é Simón Bolívar que, além de promover ativamente a independência de países latino-americanos, conclamava a necessária distância entre a América e a Europa, nos sentidos político, social e cultural. A ruptura almejada pelas literaturas americanas em relação às europeias era condição de fundação de um arcabouço literário nacional. No Brasil, a dificuldade maior estava no distanciamento com a metrópole portuguesa, já que, de acordo com Schwarcz (1999), a independência de 1822 e sua concretude permeada por acordos intercontinentais em um contexto americano republicano não era fácil, pois se mantinha o regime monárquico herdado do colonizador. Nesta condição, a aproximação com a cultura portuguesa continuava, a ponto do autor lusitano Almeida Garret (1826) unificar a literatura 21 portuguesa e a brasileira. Precursor do romantismo em Portugal com Camões (1825), e sempre lembrado pela forte influência que exercia sobre os literatos da primeira fase romântica brasileira, o escritor, em seu Bosquejo da história da poesia e língua portuguesa, uma introdução ao Parnaso Lusitano – seleção de poesias de autores portugueses antigos e modernos – aproxima as literaturas e comenta a partir de aspectos ufanistas, a maneira com que os poetas brasileiros deveriam construir seus textos: E agora começa a literatura portuguesa a avultar e enriquecer-se com as produções dos engenhos brasileiros. Certo é que as majestosas e novas cenas da natureza naquela vasta região deviam ter dado a seus poetas mais originalidade, mais diferentes imagens, expressões e estilo, do que neles aparece: a educação europeia apagou-lhes o espírito nacional; parece que receiam de se mostrar americanos; e daí lhes vem uma afetação e impropriedade que dá quebra em suas melhores qualidades (GARRET, 1826, apud FIGUEIREDO, 2020, p. 85). Interessante notar que o autor subtrai a nacionalidade da literatura brasileira e a apresenta como deficiente. Em sua concepção, o elemento necessário de uma poesia que trouxesse o frescor da arte dos trópicos e ainda oficializasse a nacionalidade, deveria estar voltado para a natureza circundante. E se “a nossa literatura colonial manteve aqui tão viva quanto lhe era possível à tradição literária portuguesa”, como escreve José Veríssimo (1915, p. 04), foi somente a partir do XIX que o distanciamento em relação ao colonizador começou a ser sentido e a conquista da liberdade literária tão sonhada pôde ser concretizada. Por isso, a “representação da nacionalidade, sintetizada na expressão da cor local” como esclarece Regina Zilberman (2001, p. 34) era tão importante para independência da literatura brasileira. Outras atitudes também foram necessárias para ajudarem a demarcar o cânone da literatura brasileira. Nesse sentido, os estudos histórico-literários com suas propostas nacionalizantes, muitas delas de críticos estrangeiros, se enquadravam neste contexto, e a partir de 1833, surgiram periódicos que expressavam uma tentativa de conscientização crítica da atividade literária do país. Os que tiveram maior repercussão foram a Revista da sociedade filomática e Niterói divulgado na atmosfera das manifestações pré-românticas, além de Minerva brasiliense já em pleno romantismo. 22 É na efervescência do ideário pré-romântico nacional que os jovens brasileiros residentes na França – Francisco de Sales Torres Homem, Manuel de Araújo Porto Alegre e Gonçalves de Magalhães – lançaram a revista Niterói (1836) em Paris. Com o lema “Tudo pelo Brasil, e para o Brasil”, a força da publicação assentava-se nas ideias de Ferndinad Denis, que chamava atenção para os temas que deveriam gravitar em torno da natureza, dos costumes locais e do indígena. Este contexto evidenciou-se já no primeiro número com o ensaio de Magalhães intitulado História da literatura do Brasil. Em seu ensaio sobre a “História da Literatura do Brasil”, estampado no primeiro número da revista, trabalhado por um conjunto de influências de época, entre os quais, desde logo, as dos já referidos visitantes europeus das Américas (mas também, por aquelas que Madame de Staël, sob a batuta de seu mentor Schlegel, difundira com ressonância em De l´Alemagne, 1813), Magalhães tentou expressar, por assim dizer, a ideologia do romantismo brasileiro; o jovem poeta extraiu elementos do ideário desses autores e os fundiu “medíocre, mas fecundamente, para uso nosso”. (CAMPOS, 2001, apud FIGUEIREDO, 2020, p. 88). Assim, neste texto, Gonçalves de Magalhães (1836) tentou construir tangencialmente um quadro da arte nacional, no qual expunha a potencialidade da arte escrita. Para tanto, o ensaio falando da importância da literatura para seu povo, como o desenvolvimento literário estava ligado a ideias sublimes e como sua representação conseguiu reunir filosofia, heroísmo, beleza e paixão, um reflexo da própria inteligência. O autor recebeu as concepções românticas de Staël e divulgou os elementos necessários para a construção de uma arte poética própria de uma nação, para tanto, apoiou-se na figura do gênio: O aparecimento de um grande homem é uma época para a história, e semelhante a uma joia preciosa, que só possuímos quando a podemos possuir, o grande homem jamais se apresenta quando nós não o merecemos. Ele existe no meio de nós sem ser conhecido, sem se conhecer a si mesmo, como ouro nas entranhas da terra, e só espera que o desencavem para adquirir seu valor. Empreguemos os meios necessários e nós possuiremos grandes homens. Se é verdade que a paga anima o trabalho, a recompensa do Gênio é a glória, e segundo o belo pensamento de Staël (MAGALHÃES, 1836, apud FIGUEIREDO, 2020, p. 88). A ideia do gênio era inerente ao contexto romântico, sendo assim, Gonçalves de Magalhães (1836) que foi construindo um percurso histórico da 23 literatura brasileira, enfatizando a necessidade da construção de uma literatura própria desvinculada dos padrões da metrópole e embasada nos valores nacionais, problematizando a necessidade e a dificuldade do surgimento de um gênio no Brasil: E poder-se-á com razão acusar o Brasil de não ter produzido gênios de mais súbito quilate? Mas que povo escravizado pode cantar com harmonia, quando o retinido das cadeias, e o ardor das feridas sua existência torturam? Que colono tão feliz, inda com o peso sobre os ombros, e curvado para a terra, o voz ergueu nomeio do universo, e gravou seu nome nas páginas da memória? Quem não tendo o conhecimento de sua existência, e só de cenas de miséria rodeado, pôde soltar um riso de alegria, e exalar o pensamento de sua individualidade? (MAGALHÃES, 1836, apud FIGUEIREDO, 2020, p. 89). A cisão decisiva com Portugal poderia se dar por meio da criatividade inovadora do gênio. E considerando que: “a genialidade não se aprende. O gênio nasce. É uma força elementar, como a Natureza que o criou, e a Natureza lhe inspira seus sentimentos e seus versos”, como confirma Otto Maria Carpeaux (1985, p. 158) em Prosa e ficção do romantismo, o Brasil teria, devido à sua natureza exuberante, todas as condições necessárias para o nascimento de um gênio “autêntico”. Acompanhado de um sentimento antilusitano, Magalhães (1836, p. 150), o colonizado, em evidente oposição ao pensamento de Almeida Garret, o colonizador, reitera o aspecto da cor local e a importância da independência para o novo país: O Brasil então não podia mais viver de baixo da tutela de uma metrópole, que de suas riquezas se nutria, e o pertencia reduzir ao antigo estado de colônia. Necessário era a Independência; todos a desejavam, impossíveis eram sufocar o grito unânime dos corações brasileiros ávidos de liberdade, e de progresso. Dentro dos aspectos próprios da nação para despertá-lo de sua literatura, estava à figura que apareceu como possível inspiração para os poetas brasileiros. A interrogativa de Magalhães (1836) se construiu de maneira provocativa, instigando a imaginação dos artistas. Apontou o indígena como possível detentor de todo ideal poético necessário para o desenvolvimento grandioso da literatura brasileira: “Uma questão se levanta, e requer ser aqui tratada, questão toda concernente ao país, e aos seus 24 indígenas. Pode o Brasil inspirar a imaginação dos Poetas? E seus indígenas cultivaram por ventura a poesia?” (MAGALHÃES, 1836, p.153). O poeta nascido no Brasil ainda possuía uma especificidade, pois “o poeta brasileiro não é guiado pelo interesse, e só o amor mesmo da poesia, e de sua pátria o arrasta”. (MAGALHÃES, 1836, p. 143). Ele não precisaria imitar as coisas de fora, tudo o que necessitava estava em sua nação. Por isso, outra condição para se construir uma literatura realmente nacional, na visão de Gonçalves de Magalhães (1836, p. 141), era o conceito de pátria, pois “quando a ideia de pátria apareceu aos poetas, começaram eles a invocá-la para objeto de seus cânticos”. A partir de noções de patriotismo, autonomia e religiosidade, os artistas brasileiros buscavam uma arte que expressasse a identidade do seu país. Em um ambiente preso ao neoclassicismo, como observa Schwarcz (1999), o desejo de reforma até mesmo intelectual, somado ao tom provocativo, porém moderado do grupo fundador de Niterói ajudou na recepção do manifesto. Com isso, percebe-se que os poetas nacionais responderam positivamente aos questionamentos de Magalhães e muitos passaram a aplicar as ideias manifestas em Niterói e a literatura brasileira foi sendo construída dentro do quadro de especificidades do novo mundo, especialmente o tema indígena, que era colocado em um lugar de inspiração poética. Dentre os que adotaram conscientemente o ideal pensado por Magalhães está Joaquim Norberto de Sousa, como comenta Antônio Candido em Formação da literatura brasileira (1997, p. 329): “a exemplo de Magalhães, assinala a capacidade poética dos índios e chega a considerá-los iniciadores da nossa literatura”. Norberto mantinha estreita ligação com o Gonçalves de Magalhães, além dos literatos Porto Alegre, Francisco Adolfo de Varnhagen, Joaquim Manuel de Macedo e Gonçalves Dias, que também formavam o grupo fundador e perpetuador do IHGB. De acordo com Schwarcz (1999, p. 201), com o mecenato de D. Pedro II, e sua entrada na instituição, o romantismo “se transforma em projeto oficial, em verdadeiro nacionalismo, e como tal passa a inventariar o que deveriam ser as ‘originalidades locais’”. Na década de 1840, outro que ainda continuava o pensamento de Magalhães era Santiago Nunes Ribeiro (1843). Considerado portador de um 25 senso crítico com maior argumentação teórica, e também pertencente ao IHGB, escreveu para a Revista Minerva Brasiliense de 1843 a 1845. Em seus embates, dava ênfase ao nexo entre as letras e os contextos histórico- geográficos. Em seu ponto de vista: Não é princípio incontestável que a divisão das literaturas deva ser feita invariavelmente segundo as línguas, em que se acham consignadas. Outra divisão mais filosófica seria a que atendesse ao espírito, que anima à idéia que preside aos trabalhos intelectuais de um povo, isto é, de um sistema, de um centro, de um foco de vida social. Este princípio literário e artístico é resultado das influências, do sentimento, das crenças, dos costumes e hábitos peculiares a um certo número de homens, que estão em determinadas relações e que podem ser muito diferentes entre alguns povos, embora falem a mesma língua (RIBEIRO, 1843, FIGUEIREDO, 2020, p. 91). Santiago Nunes Ribeiro (1843) discordava da divisão das literaturas por meio das línguas. Confirmou a similitude entre a língua falada no Brasil e em Portugal, no entanto, apontou especificidades atribuídas a aspectos sociais, geográficos e culturais. O ensaísta também colocou o povo como o motivo principal para uma produção artística, pois o povo, em sua concepção, seria aquele que manifestava por meio de suas relações a própria representação da arte. O Brasil visto a partir do prisma de suas riquezas naturais, apresentava todas as condições para desenvolver uma literatura singular. A língua, mesmo sendo traço do colonizador europeu, não era empecilho para a proliferação da arte que representava uma nacionalidade nativa. A nação tornou-se, então, como na visão de Benedict Anderson (2015) em Comunidades imaginadas, “objeto de aspiração consciente” e a literatura assumiu a incumbência de transformar o país em uma comunidade idealizada, portanto uma “invenção sem patente, e seria impossível registrá-la. Pôde ser copiada por mãos muito diversas, e às vezes inesperadas” (ANDERSON, 2015, p. 107). Assim, todo o contexto romântico era justamente a representação de uma nação, uma única linguagem. Os novos parâmetros academicistas buscados pelos grupos à frente dos manifestos românticos expressavam as novas tendências com o uso de seu material de trabalho: a literatura. Para tanto, a literatura e seu estilo de escrita precisavam se adequar ao estilo romântico, que passou a se caracterizar pela naturalização, pela liberdade, 26 pela aproximação com suas próprias aspirações para conceber o tipo de nacionalidade imaginada. 3 O ROMANTISMO NO BRASIL SUA FASE INICIAL Em terra brasileira o romantismo se desenvolve diante do grande conflito que busca o aprimoramento para a formação da identidade do país com os surgimentos das diferentes culturas locais e com as influências europeias. De acordo com Coutinho (2002, p. 22-25), o romantismo brasileiro se inicia diante de grandes divergências nas idealizações e produções das obras literárias, mas foi possível integrar com unidade em torno de um mesmo objetivo, expandir com uma literatura brasileira, com as inovações românticas. Um momento de junção de novas ideias, “o Romantismo brasileiro tem muito de seu a fusão que realizou do momento pessoal ao momento coletivo”. O individualismo existente entre escritores posteriormente dá lugar ao coletivo e culmina com uma estética romântica melhor definida e engajada. Este período que se desenvolve com grande entusiasmo tem como aspectos importantes “o literário e o artístico, o político e o social, envolvendo gêneros variados como a poesia lírica, o romance, o drama, o jornalismo, a eloquência, o ensaio a crítica”. Todas as inovações estavam voltadaspara as questões do aprimoramento do movimento literário, o improviso, a inspiração a espontaneidade faziam parte deste grande circulo de transformações, a liberdade de expressão, a liberdade política, a autonomia ganha força em diferentes setores da sociedade, características próprias do Romantismo. De acordo com Coutinho (2001, p. 152-153), posteriormente à introdução do Romantismo na Europa vai se desencadeando uma sequência de difusões do movimento enquanto um sistema inovador na literatura, chegando ao Brasil com algumas diferenças em relação ao movimento ocorrido no contexto europeu após a Revolução Industrial e a Revolução Francesa. No entanto, a introdução do Romantismo no Brasil tem como referência o início da história política brasileira como um país independente, fato que se desenvolveu 27 em meados do século XIX, com os conflitos que tiveram origem na invasão de Napoleão Bonaparte em Portugal. Ainda de acordo com Coutinho (2001, p. 154-156), diante do grande movimento que se expande na Europa intensificando as transformações sociais, culturais, que culmina com a queda do regime monárquico, a Coroa Portuguesa (D. João VI) e boa parte de seus aliados instalam-se no Brasil, mais precisamente no Rio de Janeiro, no ano de 1808. Com estes acontecimentos, o Brasil, ainda vivia a condição de colônia de Portugal, mas posteriormente com a conquista da independência, inicia um novo período, estruturando melhor as organizações locais em diferentes frentes, desenvolvendo e garantindo as ações não somente na literatura. Estes fatores foram importantes porque veio trazer o progresso local que cresceu na fase inicial o avanço e o aprimoramento da indústria, bem como a relação comercial dentro e fora do país, interferindo no ensino local e implantando o nível superior, difundindo assim a cultura social no Brasil. Conforme as mudanças foram se desenvolvendo inicialmente, em uma região que tinha muito a ser construindo nas culturas sociais de um povo e até mesmo nas estruturas comerciais e políticas, envolvendo todo território brasileiro a presença de D. Pedro II que residia no Brasil, foi um momento importante nesta fase inicial. Os movimentos se intensificam, o pensar e o agir das pessoas se repercutem fazendo melhor compreender a leitura da realidade, o que, posteriormente, traz resultados positivos para a construção ideológica de uma das maiores escola literária, o Romantismo, que apresenta características culturais e sociais diferentes em terras brasileiras. Sobre essas questões, afirma Coutinho (2001), a respeito do desenvolvimento romântico na colônia de Portugal e posteriormente no Brasil: O progresso geral do país durante a fase da permanência da Corte portuguesa (1808-1821), imediatamente seguida pela independência (1822), teve indisputável expressão cultural e literária. O Rio de Janeiro tornou-se, além da sede do governo, a capital literária e, com a liberdade de prelos, desencadeou-se intenso movimento de imprensa por todo o país, em que se misturavam a literatura e a política numa feição bem típica da época. (COUTINHO, 2001, apud RODOVALHO, 2010, p. 16). 28 O Romantismo no Brasil torna-se um símbolo na criação literária, buscando a aproximação da realidade brasileira, evitando assim a simples imitação dos moldes clássicos estrangeiros. Considerando que o Romantismo é a, força de expressão artística de um povo, a exemplo do que já aconteceu na Europa os grandes movimentos como a Revolução Industrial e Revolução Francesa, que molda um novo estilo de homem, mais crítico, livre para pensar e inovar na literatura que antes era contemplação de poucos. Um pouco diferente, mas também com expressões literárias inovadoras surgiu no Brasil, ainda colônia de Portugal e posteriormente vice-reino, uma literatura própria em um ambiente propício para a criação e a inovação, expressando assim as primeiras manifestações culturais do País através da literatura. Segundo Coutinho, (2001, p.176-177), o Romantismo é um movimento que se identifica com o ambiente brasileiro. Os poetas que iniciaram a literatura aqui no Brasil souberam valorizar o ambiente local, a natureza e a pátria, com uma predisposição que lança com criticidade um futuro posicionamento brasileiro, fugindo das idealizações clássicas. [...] o Romantismo é das nossas glórias maiores e mais brasileiras, visto ter tido manifestações que só entre nós seriam possíveis, porque trouxe representações da natureza e da alma humana, e não de alguma vista através de livros; porque então, como nunca, os acontecimentos sociais e políticos refletiram-se fundamente na poesia e sofreram por sua vez a poderosa e benéfica reação desta. (MURICI apud. COUTINHO, 2001, p. 177). Posicionando assim, Coutinho (2001), considera o desenvolvimento do Romantismo no Brasil a partir de 1808, momento de transição da condição de para posteriormente Brasil independente, como nada jamais visto. A literatura brasileira ganha características próprias de acordo com o entusiasmo que desperta na inovação dos escritores, que, nos versos livres, expressam a glória maior de um povo que olha o horizonte com sede de construção do saber poético na forma mais natural possível. Diante do grande entusiasmo, surge o Romantismo brasileiro, configurando, a partir deste momento, a existência de uma literatura própria que promove a consciência no conteúdo original e na forma mais completa na difusão da poética nacional. 29 Com um olhar um pouco mais amplo, Bosi (2003, p. 11-13) afirma que: Inicialmente o Brasil de hoje era considerado colônia de Portugal, portanto objeto de uma cultura, já desenvolvida. E diante das primeiras ações tudo que se pretendia a princípio era o carrear de bens materiais para fora da colônia, ou seja, a verdadeira exploração das riquezas para o mercado externo (Portugal) principalmente, incluindo produtos do tipo vegetal e mineral. E a conquista para sair deste espaço do não ser objeto explorado, para ser sujeito de sua história, desenvolveram muitas lutas, e este foi um processo lento porque dependia do aprimoramento cultural de seu povo para o enfrentamento dos desequilíbrios desta fase inicial. (BOSSI, 2003, apud RODOVALHO, 2010, p. 18). Mas o Romantismo no Brasil ganha entusiasmo a partir das influências de D. Pedro II, que contribuiu muito para a consolidação da cultura nacional. Expandindo o desenvolvimento nas pesquisas, analisando o passado histórico e os acontecimentos, procurando nos vestígios locais, e observando os nativos, redescobrindo as imagens, implantando instituições de ensino que culminaram com a ampliação do público leitor e o aumento na publicação de obras que serviram como referencial teórico para o início da historiografia e a linguagem literária do Brasil. Considerando as ideias de Coutinho (2001) e Bosi (2003) sobre a iniciação literária no Brasil, é possível caracterizar que este é um período bastante crítico sendo que as especulações, o aproveitar das riquezas, e até chegar ao posicionamento mais elaborado para a formação cultural linguística de um povo o amadurecimento com o olhar voltado para a pátria. 3.1 O Romantismo e suas gerações no Brasil: Primeira geração Segundo Coutinho (2001, p. 157-158), posteriormente à fase inicial, considerada como pré-romantismo, período que ainda não tinha uma definição apropriada para as obras literárias no território brasileiro (1808-1836), posteriormente ao Brasil colônia, inicia-se a primeira geração do Romantismo brasileiro com uma visão nacional e revolucionária. Quem melhor se destacou no inicio da era romântica foi Gonçalves de Magalhães, sendo o responsável pela criação de uma literatura nacional ainda não existente, uma vez que o que se prevalecia até aquele momento era as correntes portuguesas, ou seja, a 30 literatura brasileira aindanão tinha os méritos de uma visão própria. Nas palavras de Afrânio Coutinho, “o nosso primeiro homem de letras, e quem iniciou a carreira literária entre nós, Domingues José Gonçalves de Magalhães (1836), o visconde de Araguaia.” (COUTINHO, 2001, p.159). Este por sua vez é o introdutor da ideia romântica no Brasil, prevendo o mesmo uma transformação no estilo poético brasileiro, vendo o índio como um marco para a transformação da literatura brasileira. [...] a sua atitude intencionalmente revolucionaria, de renovação total da literatura brasileira, expressa no manifesto com que lançam a revista Niterói (1836); a intenção antilusa, com a indicação de transferir para a França a fonte de inspiração literária e artística, de onde, aliás, simbolicamente lançou a revista e o seu livro Suspiros e Poetas e Saudades (1836); a preferência dada ao tema do indianismo, tudo justifica a posição de introdutor do Romantismo que detém Gonçalves de Magalhães na literatura brasileira. (COUTINHO, 2001, apud RODOVALHO, 2010, p. 20). É possível constatar, deste modo, que a atuação de Gonçalves de Magalhães se limitou mais à introdução da literatura no Brasil, destacando o índio como puro e natural, para introduzir a escola romântica no Brasil. Conforme Bosi (2003, p. 97-99), Gonçalves de Magalhães é inicialmente o incentivador da literatura no Brasil, desenvolvendo uma poesia ainda arcádica. Porém, com as viagens pela Europa, o escritor desenvolve estudos que terminam influenciando suas idéias sobre o Romantismo. Vivendo na Europa, mas com lembranças recentes da Colônia de Portugal, posteriormente Brasil, Magalhães lança definitivamente em Paris uma de suas obras que introduz o romantismo no Brasil, Suspiros Poéticos e Saudades, de 1836. Cheio de entusiasmo, com as inovações românticas lança pouco tempo depois a revista Niterói, que também retrata em tese um pouco das transformações brasileiras, sendo produzida por um grupo de escritores que idealizavam e seguiam estilos idênticos aos estilos de Magalhães. Segundo o crítico, o trabalho desenvolvido pelo grupo segue um padrão pouco inovador, com influências de Lamartine e Masone, tendo como pensamento ideológico romper com os padrões clássicos mitológicos pagãos. De acordo com Bosi (2003, p. 104-105), quem realmente se comprometeu com uma literatura mais crítica e brasileira, com menor influência 31 europeia foi Gonçalves Dias, o poeta brasileiro mais original do século XIX. Um conhecedor da realidade brasileira, isso lhes proporcionou uma produção de obras que não se comparavam aos estilos anteriores porque se aproximava muito da realidade local, com visão originalmente brasileira. O índio nativo neste território brasileiro teve seus privilégios de estar sempre presente em suas publicações, por que este índio brasileiro figura real e não apenas idealização, ele conheceu muito bem desde sua infância e os tratava em suas obras como substância poética e não apenas como um acessório, para o enriquecimento de estilo poético. Suas obras apresentavam estilo inovador, suas preferências que envolviam as observações eram inspiradas na vida cotidiana da pátria residente Brasil, se destacou com diferentes obras primas como Canção do Exílio e I Juca Pirama que fazem parte das discussões literárias até os dias atuais. 3.2 Segunda geração De acordo com Bosi (2003, p. 109-110), a “segunda geração romântica” se desenvolve com uma ideologia de extremo subjetivismo sofrendo as fortes influências de Lord Byron e a Musset. Toda construção poética desenvolvida se volta para os pensamentos emotivos que trouxeram sérias consequências para a vida pessoal dos poetas, “alguns poetas adolescentes, mortos antes de tocarem a plena juventude, darão exemplo de toda uma temática emotiva de amor e morte, dúvidas e ironia, entusiasmo e tédio”. Conforme Coutinho (2002, p. 139), essa geração de poetas passa a ser conhecida como geração “mal do século”, justamente por sua poesia pessimista e decadente, pela influência da tristeza, pela ansiedade, pelo delírio desenfreado e sem visão para a vida em sociedade, e pela valorização da morte. Um dos escritores que se destaca neste estilo de poesia seria Joaquim de Souza Andrade (Sousândrade) e posteriormente se destaca Álvares de Azevedo. Com todo subjetivismo ultrarromântico que Azevedo desenvolve seus poemas, Coutinho (2002, p. 142) descreve o modo de vida que o poeta devaneia o sentimentalismo, tédio e desencanto, constantes fugas da 32 realidade, o prolongamento das dores, o proibido e o obscuro, em suas produções literárias, “Absurdo no pensamento da morte, só se preocupava com o lado noturno: as sombras, o crepúsculo, à noite, os túmulos”. Introduzindo a poesia decadentista com uma visão ou sonho e as emoções, tendo a figura feminina (mulher) como algo a ser idealizado e não concretizado na vida real, enxergando aos olhos do sobrenatural são fortes características deste estilo poético que faz parte da escola romântica e contribuiu para desperta-lo a novas idealizações. 3.3 Terceira geração De acordo com Bosi (2003), a terceira geração da poesia romântica foi caracterizada por versos sociais e libertários que refletiam as questões que envolviam o Brasil Império. Essa geração sofreu as influências de Victor Hugo, poeta que também desenvolveu uma poesia política e social. Coutinho, por sua vez, assinala o fato de que o grupo de poetas brasileiros posterior a 1860 desenvolveu um novo estilo: Romantismo liberal e social: intensa impregnação política social, nacionalista ligada às lutas pelo abolicionismo (especialmente depois de 1866) e um lirismo intimista e amoroso, por influencia de Victor Hugo tende para um lirismo de metáforas arrebatadas e ousadas, que se batizou (Capistrano de Abreu) de poesia “Condoreira” ou “condoreirismo”. (COUTINHO, 2001, apud RODOVALHO, 2010, p. 21). Na visão do crítico, trata-se de uma poesia que veio movendo com o silêncio de uma sociedade que se acomodava ao sistema de privilégios de poucos. Com poucas divergências em suas abordagens, Bosi e Coutinho consideram a poesia condoreira como inovadora, surgindo com um novo conceito na realidade daquela época. Da mesma forma, ambos reconhecem Castro Alves como um dos mais representativos e inovadores poetas na literatura da terceira geração romântica. De acordo com Luiz Henrique Silva de Oliveira (2007, p. 46), ainda muito jovem Castro Alves já despertava atenções em suas produções “colegiais”, e 33 sempre gostava de recitar seus poemas em público e no Ginásio Baiano (1861). O ambiente propício para declamar e conduzir as denúncias contra as ações da classe dominante. Alves sempre olhando as condições em que encontravam os oprimidos, defendia a abolição e a República. Com estes atos, muitas outras pessoas passaram a adotar a ideia fortalecendo ainda mais a inovação do jovem poeta. Exemplificando as atitudes de Alves, assim comenta Oliveira (2007, p. 46- 47), “o poema recitado pelo aluno Antônio de Castro Alves no “Outeiro que teve lugar no Ginásio Baiano a 3 de julho de 1861”, foi um momento de grande repercussão; Se o índio, o negro africano, E mesmo o perito Hispano Tem sofrido servidão; Ah! Não pode ser escravo quem nasceu no solo bravo Da brasileira região! (ALVES, 1997, apud RODOVALHO, 2010, p. 22). Posicionando assim com seu estilo inovador o jovem sai em defesa do índio, do negro e o mais extraordinário acontece em seu quinto verso “solo bravo” não só em defesa dos oprimidos, mas o reconhecimento da pátria. O solo fértil para se construir uma nação estava habitado por portugueses que a princípio tenta escravizar os índios, projeto que não prosperou, porque os nativos tinham facilidade para se deslocar na floreta. E posteriormente às tentativas com os índios, é a vez do negro, que tirado a força da Áfricae trazido para o Brasil, vira mão-de-obra com facilidade uma vez que pouco reagia contra ao sistema. Por estes e outros motivos, Alves ganha às expressões de poeta condor justamente porque soube enfrentar a realidade fazendo aquilo que outros de seu Ginásio Baiano não fizeram. A sua estreia coincide com o amadurecimento de uma situação nova a crise do Brasil puramente rural o lento mais firme crescimento da cultura urbana, dos ideais democráticos e, portanto o despertar de uma repulsa pela moral do senhor – e- servo, que poluía as fontes da vida familiar e social no Brasil – Império. (BOSI, 2003, apud RODOVALHO, 2010, p. 22). Castro Alves, enquanto representante desta geração, é visto como inovador, apresentando uma nova linguagem poética. Sua obra rompe com o 34 silêncio existente sobre os negros escravos e expõe um problema social que se desenvolvia na colonização do país, distinguindo-se assim da literatura clássica, que voltava o olhar para o índio, o amor e as diferentes culturas urbanas. Como afirma Bosi (2003, p.120), as palavras do poeta Castro Alves são abertas para a realidade de uma nação que sobrevive à custa da escravidão, como pode ser observado nos seguintes versos do poema “Navio negreiro”: E existe um povo que a bandeira empresta P’ra cobrir tanta infâmia e cobardia!... E deixa-a transformar-se nessa festa Em manto impuro de bacante fria!... Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta, Que impudente na gávea tripudia? Silêncio. Musa... chora, e chora tanto Que o pavilhão se lave no teu pranto! ... Auriverde pendão de minha terra, Que a brisa do Brasil beija a balança, Estandarte que a luz do sol encera E as promessas divinas da esperança... Tu, que da liberdade após a guerra, Foste hasteado dos heróis na lança, Antes te houvessem roto na batalha, Que servires a um povo de mortalha! (ALVES, 2005, RODOVALHO, 2010, p. 22). A indignação de Castro Alves faz dele uma nova voz na poesia brasileira, envolvida com o povo e rompendo com um dogma impregnado nas classes mais privilegiadas. Deste modo, deixa de se restringir aos simples sentimentos individuais, despertando para novos temas, mais abrangentes, como a igualdade de direitos e a luta de classes, diferenciando-se assim dos demais poetas. Fazendo uma denúncia dos acontecimentos “existe um povo que a bandeira empresta/ P’ra cobrir tanta infâmia e cobardia” a bandeira o símbolo nacional manchada pela conivência que encobriam os problemas da escravidão. Segundo Bosi (2003, p. 120-121), a poesia social de Castro Alves também apresenta uma nova imagem sobre a mulher, considerando-a como aquela que está próxima da figura sensual, enquanto os demais poetas viam a 35 mulher como algo a ser idealizado. Castro Alves ocupa assim um lugar diferenciado, comparando aos demais poetas, no que diz respeito ao olhar para a natureza, à linguagem inovadora e a critica social sobre o sistema implantado mesmo depois da independência do Brasil. Na visão de Coutinho (2002, p. 04-21) O movimento romântico surge como um amplo movimento internacional com características próprias que vai se constituindo gradativamente com seus diferentes escritores. No Brasil seria difícil limitar momentos diferenciados nas características românticas, mas fica compreendido o pré-romantismo (1808-1836), período de transição, e construção e definição literária no país. Posteriormente outro período compreendido como Romantismo oficial no Brasil (1836-1860). Este foi o período em que se desenvolvem as três principais gerações românticas: A Primeira Geração com a introdução de Gonçalves de Magalhães, e o Indianismo de Gonçalves dias, seguindo a Segunda Geração com a poesia byroniana ou satânica, (Byron), na representação do mais influente, Álvares de Azevedo, com o forte subjetivismo. E finalmente, a Terceira Geração que tem como principal representante, Castro Alves com seus usados poemas representando forte critica social, que surgem nas aulas do Ginásio Baiano. As três gerações que se desenvolvem no Romantismo são frutos do amplo movimento que se estende diante das diferentes transformações sociais, culturais e políticas em nosso país, promovendo uma literatura a ser explorada e contemplada em suas diferentes áreas de conhecimento humano. 36 4 O REALISMO CONTEMPORÂNEO E A ESCOLA REALISTA DO SÉCULO XIX Fonte: virusdaarte.net A literatura latino-americana recente, na qual se insere a obra Passaporte, representa uma volta ao realismo, com forte repercussão na linguagem literária e na expressão artística. Não apenas a questão representativa é trabalhada, mas todo o aspecto performático da comunicação, como se vê na forma, na cor, no tamanho do livro, na distribuição dos textos, além da formatação das páginas de Passaporte, que em tudo imita um passaporte de verdade. Segundo Karl Erik Schollhammer: Outra perspectiva emerge hoje na literatura e em certas experiências artísticas, reivindicando a presença do real na obra não apenas na temática, mas, por exemplo, por meio da acentuação de suas qualidades materiais, afetivas e estético-expressivas e firmando um compromisso com a criatividade técnica e artística, à procura da criação literária de efeitos de realidade (SCHOLLHAMMER, 2011, OLIVEIRA, 2019). 37 5 REALISMO / NATURALISMO Fonte: figuradelinguagem.com A distinção entre Realismo e Naturalismo coloca, ainda hoje, problemas fundamentais. Os debates que envolveram importantes teóricos marxistas por volta dos anos 30 colaboraram de maneira decisiva para a crítica da posteridade. Naqueles idos, o interesse acerca do tema Literatura e Revolução, e o que deveria ser a estética própria de uma sociedade marcada pelos pressupostos da socialização do trabalho e do fim da opressão, colocava em xeque as produções soviéticas, que pareciam assumir, nos dizeres de Lukács, o tom e o esquematismo das “mal vistas” obras naturalistas. Muito do debate produzido neste período contribuiu para um maior entendimento das estéticas Realista e Naturalista. No nosso caso, por entender a atualidade de tal questão, buscaremos compreender o quanto o Realismo e o Naturalismo se manifestaram enquanto concepção literária aqui no Brasil (mesmo não se estabelecendo, à época, confrontos tão explícitos ou programáticos) e, para isso, utilizará como ponto de partida basicamente três romances representativos do período: Memórias Póstumas de Brás Cubas e Quincas Borba, de Machado de Assis, e O Cortiço, de Aluísio Azevedo. A partir dessas obras, nos apoiaremos, principalmente, no aparato crítico de Geogy Lukács (figura central, à época, na delimitação deste problema). 38 5.1 O problema do Real – conhecimento e experiência De início, pode-se dizer que há uma necessidade comum que se estrutura enquanto centro da diferenciação entre Realismo e Naturalismo: ambos possuem uma espécie de comprometimento com o real. Esse “comprometimento com o real assume formas diferenciadas em ambas estéticas”. Ao abandonarem, não de maneira brusca e uniforme, a visão de mundo romântica (aquela assentada num polo oposto – o da “realidade intangível, não captável, que foge às palavras”), o Realismo e o Naturalismo, cada um a seu modo, buscaram ora compreender os “processos lógicos e interligados” que movem os personagens e ações, ora descrever os “fenômenos da trama” tal como se apresentam. Neste polo ocorre mesmo nas elaborações em primeira pessoa, o desejo por vezes explícito de maior “compreensão” da realidade, com uma ligação maior ao universo objetivo, material. Em todo este conjunto de concepções, que de início configuravam-se como que mais voltados a um antirromantismo que a um realismo propriamente dito, há a preocupação com certa “impessoalidade” diante da elaboração poética. Entretanto, antes que o raciocínio aponte
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