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1 | P á g i n a QUESTÕES SOBRE O LIVRO DOZE ANOS DE ESCRAVIDÃO DE SOLOMON NORTHUP 1) O início do livro segue procedimentos típicos dos livros memorialistas, em que o autor reafirma sua boa fé e sua respeitabilidade. Para um homem de baixa condição e herança de sangue escravo isso era ainda mais difícil. Como Solomon Northup faz esse convencimento? Northup começa o seu livro já justificando que tudo relatado são fatos verdadeiros vivenciado por ele mesmo, e se ele está escrevendo-o é para mostrar ao povo as características de uma realidade daquele momento. Para convencer as pessoas de sua boa fé Northup promete não exagerar no que diz: “Posso falar sobre a escravidão apenas na medida em que foi por mim observada — apenas na medida em que a conheci e vivenciei em minha própria pessoa. Meu objetivo é dar uma declaração simples e verdadeira dos fatos: repetir a história de minha vida, sem exageros, deixando para outros determinarem se as páginas da ficção apresentam um retrato de uma maldade mais cruel ou de uma servidão mais severa” (capítulo 1). Para demonstrar a sua respeitabilidade ele deixa ao leitor a função de escolher se Hamilton e Brawn foram os culpados de sua escravidão, isto é, ele não pretende influenciar nas interpretações do leitor: “Aqueles que lerem estas páginas terão os mesmos meios que eu de determinar. Se eles eram inocentes, meu repentino desaparecimento de fato não deve ter sido culpa deles; mas, repassando mentalmente todas as circunstâncias, ainda não consegui agraciá-los com uma hipótese tão favorável” (capítulo 2). Além disso, Northup descreve sua vida e família destacando sempre pontos positivos, atraindo a atenção do leitor para ideia de que ele é um bom homem. 2) No começo da obra, Solomon faz a seguinte reflexão de homem livre: "eu era ignorante demais, talvez independente demais, para entender como alguém poderia se contentar em viver na condição abjeta de escravo." No fundo, é a mesma reflexão que muitos de nós HISTÓRIA Valderisso Alfredo 2 | P á g i n a fazemos. Tendo lido a obra e estudado a escravidão ao longo de um semestre, como alguém pode "aceitar" viver na condição de escravo? Justifique utilizando trechos do texto. Para quem é livre ou era livre, mas se tornou escravo, como Northup, é difícil entender como alguém poderia aceitar a escravidão. Mas alguém que nasce escravo acaba se tornando dependente do seu dono, pois nunca viveu de outra forma, não sabe como viverá se sair dessa situação já que sempre viveu para servir. Se ele fugisse seria difícil lidar com a sociedade, pois como é mostrado no próprio livro é preciso levar consigo provas de que é livre para não ser maltratado pelas pessoas de uma sociedade escravista: “Sem ter um salvo-conduto, qualquer homem branco poderia me prender e me colocar na prisão até que meu senhor comprovasse minha posse, pagasse os custos e me levasse embora”. Além disso, havia o medo do seu senhor, de trai-lo e sofrer as consequências. Ainda no 1 capítulo Northup diz que alguns negros expressavam a mais ardente vontade de fugir e o perguntavam o melhor método de fazê-lo. Porém o medo da punição que os esperavam quando recapturados e retornados bastavam para demove-los da tentativa de fuga e tornarem-se livres. Eles acabavam aceitando a condição e achando impossível sair daquela vida. Existe também a questão religiosa, estudamos em sala de aula que a condição de escravo era explicada religiosamente e se passam por tudo aquilo é para poder ir para o céu, assim como Jesus, que sofreu muito enquanto vivo. No cap. 9 Northup fala que Tanner, um dono de escravos, um dia estava lendo a bíblia e disse para seus escravos que ali estava escrito que se desobedecesse ao senhor ele deveria ser açoitado com numerosos golpes, o que amedrontava ainda mais os escravos. 3) "Se fôssemos seres razoáveis, teríamos que aceitar essa evidência, que não podemos, absolutamente, prever nosso destino; que qualquer desenrolar é arbitrário e carece de todo fundamento. Raramente, porém, os homens são razoáveis quando está em jogo a sua própria sorte; eles preferem sempre as atitudes extremas; conforme seu caráter, alguns de nós convenceram-se logo de que tudo está perdido, de que aqui não dá para viver, de que o fim está próximo e inevitável." A frase acima é de Primo Levy, famoso escritor judeu, narrando sua triste experiência no campo de concentração de Auschwitz. Compare esse depoimento com a mentalidade de Solomon e de Patsey, conforme narrado no livro. 3 | P á g i n a Solomon e Patsey possuem mentalidades diferentes, enquanto Solomon persiste na ideia de que a liberdade chegará, Patsey está cansada daquela vida e não acredita em um futuro melhor, vendo a morte como única alternativa de se ter paz. Enquanto para Northup há esperança, para Patsey há o desespero, a dor e a humilhação. Northup, é portanto, um homem razoável, aceita a imprevisibilidade do futuro, tentando sempre manter uma mente positiva, pois, embora nada que acontecia fazia por valer a pena viver, queria voltar para casa, junto da sua família, e abomina a ideia de morrer: “Imaginei que ia morrer. Embora houvesse pouca coisa em minhas perspectivas futuras que fizesse com que valesse a pena viver, a proximidade da morte me perturbou. Pensei que poderia me resignar a dar meu último suspiro no seio de minha família, mas morrer nas mãos de estranhos, sob tais circunstâncias, era uma ideia amarga” (capítulo 6). Já Patsey não se mostra razoável, não acredita em dias melhores e fugir é impossível, sendo o suicídio o único recurso, mas nem isso ela tem coragem de fazer e pede ajuda a Northup: “Vítima escravizada da luxúria e do ódio, Patsey não tinha descanso nessa vida” (capítulo 13). 4) Embora escrito muito tempo depois dos primeiros acontecimentos descritos, o livro Doze Anos de Escravidão prima pela riqueza de detalhes e pela acurácia nos nomes e sobrenomes dos envolvidos. Qual a intenção do autor ao proceder dessa forma? O autor descreve detalhadamente tudo que ele passou, todo sofrimento que foi submetido. Ele quer com isso mostrar a tão cruel realidade da escravidão, e permitir a cada um uma interpretação, contando fatos verdadeiros que ele vivenciou. A descrição com todos os nomes indica que o texto não é um simples relato neutro, tem importância histórica e a presença dos nomes de todos os envolvidos é de extrema importância para comprovar todos os acontecimentos, além do mais, citar os nomes é uma forma de provar que o que escreve é verdade. 5) A Guerra da secessão americana ocorreu entre 1861 e 1865, portanto próximo da data da publicação do livro. Nesse sentido, o depoimento de Solomon é não apenas uma memória, mas também um livro político. Explique o sentido dessa afirmação, tendo em vista o contexto estadunidense da época. A Guerra de Secessão americana foi um conflito ocorrido entre os estados do norte e sul dos Estados Unidos devido as fortes diferenças culturais e políticas que existiam 4 | P á g i n a entre eles. Essas diferenças baseavam-se principalmente na adoção da escravidão como prática legal pelos estados do sul, enquanto os do Norte eram contrários a essa prática. Se levarmos isso em conta, com certeza a narrativa de Solomon Northup se enquadra como um livro político, pois mostra diretamente essa diferença existente entre os estados. Na verdade, tudo o que ocorre na vida dele se dá por essa diferença, pois enquanto morava no Norte era livre e ao chegar no Sul, estados com política escravista, é escravizado. O livro de Northup serve, portanto, como um documento histórico para mostrar as características políticas estadunidenses período antes da Guerra de Secessão. 6) Por vários momentos ao longo do livro, é feita a comparação entre a ideia dos Estados Unidos como uma terra da liberdade e a escravidão que acontecia livrementeem alguns estados sulistas. Explicite momentos em que isso é feito, e explique qual a lógica da democracia americana que permitia o convívio com a escravidão negra. Muitas vezes Northup mostra a diferença entre os Estados do Norte e do Sul, enquanto uma parte preza pela liberdade a outra preza pela escravidão. Podemos ver isso ainda no segundo capítulo quando ele escreve:” estávamos para entrar em um estado escravocrata, calharia bem, antes de partir de Nova York, providenciar documentos que atestem minha liberdade”; essa passagem mostra que escravidão e liberdade conviviam mutuamente em um só país, o que determinava sua liberdade era a sua localização. A existência da escravidão ocorre principalmente devido dois modelos econômicos, totalmente diferentes, presente nos EUA. Enquanto o Norte encontrava-se em expansão econômica devido a industrialização, baseada na mão de obra livre e assalariada, o Sul apresentava um sistema tradicional de produção, com uma economia baseada na plantação de grandes propriedades e na mão de obra escrava. Devido essa característica a aristocracia agraria do Sul do país não queria abolir a escravidão, pois se fizessem isso não teriam quem trabalhar nas suas terras. Para os senhores, a escravidão era também uma maneira de mostrar superioridade, pois ao terem escravos são eles que realizam as atividades inferiores, permitindo que apenas eles tenham status na sociedade e sejam iguais apenas entre si. Até mesmo Solomon não consegue entender a lógica de como um país que se diz ser democrático continua utilizando-se da escravidão: “Não conseguia entender a moral da lei, ou da religião, que sustenta e reconhece o princípio da Escravidão” (capítulo 1). 5 | P á g i n a 7) A primeira abordagem de Radburn e Burch sobre Solomon é extremamente parecida com aquela utilizada pelos senhores de engenho ao receber os escravos africanos. Explique e descreva as semelhanças, assim como o objetivo desse tratamento. Foi estudado que os escravos africanos recebiam um péssimo tratamento pelos senhores de engenho. Alencastro, em um dos seus textos, diz que a primeira hospedagem que os senhores fazem aos escravos, logo que comprados e aparecem na sua presença, e manda-los açoitar rigorosamente. É exatamente isso que ocorre com Solomon ao ser comprados por Radbrern e Burch. Assim como ocorria com os escravos africanos, Solomon foi preso e açoitado pelos seus compradores. No livro a cena é descrita da seguinte forma: “com o remo, Burch começou a bater em mim. Golpe após golpe foi infligido sobre meu corpo nu. Quando seu incansável braço finalmente se fatigou, ele parou e perguntou se eu ainda insistia em ser um homem livre. Eu insisti, e então os golpes recomeçaram, mais rápidos e com mais força” (cap.2). Isso tudo era feito com o objetivo de mostrar superioridade e amedrontar os escravos. Alencastro diz no seu texto que os senhores faziam isso com o objetivo de mostrar “que só eles nasceram para competentemente dominar escravos, e serem eles temidos e respeitados”. Era, portanto, uma forma de tentar evitar a revolta dos escravos, mostrando o que ocorreria se não seguissem as regras. 8) As cenas que se passam no local de venda de escravos chocam pela maneira com que seres humanos são tratados, e também pela forma com que a crueldade é narrada pelo protagonista. Ao mesmo tempo, há, por parte do dono, a intensão de passar uma imagem civilizada. Explique e descreva essa aparente contradição, relacionando-a com o desenvolvimento da elite estadunidense. Os escravos eram severamente maltratados até mesmo na hora da venda. Apesar de estar passando por um momento tão horrível são forçados a parecer elegantes, de modo a chamar a atenção da elite que pagaria muito por um bom escravo. No cap.6 Solomon descreve a cena de venda de escravas, no qual diz: “exigiam que nos lavássemos cuidadosamente e, aqueles que tivessem barba, que se barbeassem. Então forneciam uma roupa nova para cada um de nós, uma roupa barata, porém limpa. Os homens recebiam chapéu, casaco, camisa, calça e sapatos; as mulheres, vestido de chita e lenço para enrolar na cabeça ... ele nos treinava na arte de ‘parecer elegante’ ... “. Isso mostra que a sociedade rica exigia muito. Porém, ao mesmo tempo que deveriam passar elegância os escravos 6 | P á g i n a eram tratados como meros animais, mercadorias quaisquer. No mesmo capítulo Solomon diz: “nos fazia erguer a cabeça de forma altiva, caminhar de um lado para outro enquanto os clientes podiam apalpar nossas mãos, nossos braços e nosso corpo, fazer-nos virar, perguntar o que sabíamos fazer, fazer-nos abrir a boca e mostrar os dente, exatamente do mesmo modo como um jóquei examina um cavalo que está prestes a comprar ou aceitar numa troca”. 9) Uma das personagens mais marcantes da obra é William Ford, proprietário de escravos e homem extremamente religioso. Embora Solomon não compreenda, o método de domínio de Ford pode ser descrito como paternalista. Explique o que é o paternalismo de Ford e compare-o com o que acontecia no Brasil ao longo de quatro séculos de escravidão. A prática do paternalismo consiste em oferecer um favor em troca de algum benefício. Ou seja, eu ajudo, porém, quero em troca alguma ajuda. É exatamente isso que ocorre com William Ford. Ressalta-se nele o tratamento paternalista com seus escravos, faz-se de bom, trata bem e ajuda os escravos, mas isso tudo é para ter em troca escravos que o respeite e trabalhe como forma de agradecimento, sem que nada seja forçado. Isso é comprovado quando Solomon diz: “aqueles que tratavam seus escravos de maneira mais leniente eram recompensados com mais trabalho. Sei por experiência própria. Era uma fonte de prazer surpreender o senhor Ford com uma produção diária maior do que nos era pedido ... (cap.7)”. Em várias situações o senhor Ford mostrou-se preocupado e ajudou Solomon, porém isso é apenas uma forma estratégica de conquistar seus escravos, evitar revoltas e ainda por cima ter uma maior produção, é sem dúvida uma troca de favores. Algo semelhante ocorria no Brasil, embora tenha falado anteriormente em paternalismo como algo que evoca uma boa ação, alguns falam que paternalismo pode ser qualquer ação, independente de boa ou não, mas que seja mais eficaz que o chicote, podendo manter a relação entre o senhor e o escravo. Essas relações de paternalismo se deram aqui no Brasil por meio de certos momentos de afetividade e reciprocidade entre negros e senhores, acarretando como consequência a miscigenação cultural. Segundo Gilberto Freyre em seu livro Casa-Grande e Senzala não havia apenas momentos perversos, havia também harmonia entre negros e brancos. 7 | P á g i n a 10) A descrição do trabalho no campo de algodão parece bastante rústico, com baixa tecnologia. No entanto, se pensarmos que na mesma época estava sendo desenvolvido o trabalho fabril, com destaque mesmo nos Estados Unidos, é possível achar semelhanças na organização do trabalho. Quais as semelhanças entre o Taylorismo e o trabalho no campo de algodão? O Taylorismo é um sistema de organizações do trabalho que está diretamente relacionado ao tempo e ao máximo de produção possível. Embora esteja mais ligado ao trabalho fabril podemos identificar algumas de suas caraterísticas no trabalho do campo de algodão. No livro vemos que os escravos passam o dia trabalhando e estes possuem uma meta de colheita a cumprir, algo semelhante ao que ocorre nas fábricas. Os escravos sofrem com isso, pois se produzirem mais ou menos terão problemas; se produzir mais será determinada uma nova meta de colheita, terá que trabalhar mais, já se produzir menos será açoitado por não cumprir a meta. Há uma passagem no livro que Solomon diz: “o trabalho de um dia normal rende noventa quilos. Um escravo eu esteja habituado colher é punido se trouxer uma quantidade menor doque isso”. Outra coisa que se destaca é o tempo, a hora de começar a trabalhar. Assim como nas fábricas os escravos tinham que acordar cedo para trabalhar e passavam muito tempo na lavoura ao contrário seriam açoitados. “Os escravos precisam estar no campo de algodão assim que há luz de manhã cedo e, à exceção de dez ou quinze minutos que lhes são dados na hora do almoço... não lhes é dado nenhum momento de descanso ... muitas vezes eles trabalham inclusive à noite ... eles não ousam parar ... até que a ordem de cessar seja dada pelo capataz”.
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