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A herança escravocrata Um dos principais ingredientes da dieta brasileira é o ovo. Ele vai na massa do bolo, ao lado do arroz e feijão… os ovos são essenciais e, independentemente da cor de suas cascas, sempre tiveram a mesma função e gosto popular, já que o importante é que tenham clara e gema a serem saboreadas. Porém, o mesmo não pode ser dito sobre o povo brasileiro. Hoje, lamentavelmente, aquele que mistura as duas cores de ovos no almoço não consegue colocar a obra de um escritor negro ao lado da de um branco na estante ou parar para pensar se lutar pelo fim das cotas raciais realmente faz sentido. Dessarte, podendo muitas vezes ser sem consciência, a sociedade brasileira segue enraizada ao período escravocrata e às suas ideologias racistas, sem realizar que, por dentro, todos são iguais, que todos compartilham das mesmas clara e gema. Em uma primeira análise, o racismo, principal legado da escravidão no Brasil, está presente na literatura brasileira, especialmente na incrível personagem literária que foi Machado de Assis. Desse modo, infelizmente, o preconceito no escritor não está em suas obras realistas, mas, sim, contra ele. Por exemplo, Assis, mesmo sendo afrodescendente, sempre foi retratado como branco, uma vez que não era aceitável para a elite alguém com sua cor de pele ser famoso e bem sucedido, muito menos no âmbito literário. Assim, utilizando-se de sua herança histórica, a sociedade tem dificuldade em aceitar o potencial intelectual dos negros, sendo que, se preciso, está até disposta a retratá-los como brancos, pois sua superioridade deve manter-se intacta. Assim como o legado racista interveio eiona literatura brasileira, ele, também, teve - e ainda tem - forte influência na educação da sociedade negra no Brasil. Por exemplo, em 2018, segundo o IBGE, a taxa de analfabetismo e de abandono escolar foi, respectivamente, 233% e 165% maior que a de brancos. Porém, em 2012, junto a outras políticas públicas, foi aprovada a Lei das Cotas, que define que certas instituições de ensino devem reservar pelo menos 20% de suas vagas para o ingresso de pessoas com raças diferentes da branca. Assim, o sistema de cotas visa, paulatinamente, desarraigar o racismo herdado do Brasil Colônia, ao garantir aos negros maiores chances de se graduar, entrar no mercado de trabalho e, finalmente, melhorar suas vidas. Dessa forma, graças à herança escravocrata brasileira, a sociedade branca apresenta dificuldades em tratar negros como iguais e reconhecer seus feitos, assim como os afrodescendentes têm encontrado obstáculos na sua formação acadêmica e desenvolvimento profissional. Desse modo, por mais que o desenvolvimento de políticas públicas ajude na luta contra o racismo, ele só será extinto quando a sociedade reconhecer, por conta própria, a simplicidade do problema - pois, nesse caso, a diferença entre ovos e humanos não é grande: ambos são diferentes por fora, mas iguais, especiais e indispensáveis por dentro.
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