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6ºAula Território e Turismo na perspectiva geográfica Objetivos de aprendizagem Ao término desta aula, vocês serão capazes de: • conhecer as diversas abordagens conceituais da categoria de análise geográfica do território; • entender como o turismo se insere na discussão territorial; • compreender a atividade turística enquanto agente de apropriação territorial. Prezados(as) estudantes, Como vimos nas primeiras aulas, sobretudo na aula 2 quando trabalhamos as categorias de análise geográficas, desde que o turismo passou a ser objeto de estudo no âmbito espacial, como é o caso da Geografia, a categoria território vem sendo utilizada com bastante constância. Nesse sentido, pode-se questionar a relação do turismo com a categoria território, como fez Cruz (2001, p. 5): “Qual o papel que cabe ao turismo no (re)ordenamento de territórios, considerando-se o imenso jogo de relações em que essa atividade se insere?” A autora ainda pontua na sequência: “Quando falamos de turismo, a que territórios estamos nos referindo, ou seja, qual o ‘território do turismo’, na atualidade?” Nesta aula, iremos refletir sobre essas questões e buscar respostas. Para isso, é importante relembrar alguns conceitos e conhecimentos já trabalhados, para irmos tecendo nossas discussões sobre a temática, sobretudo no que diz respeito ao espaço e sua produção, apropriação e consumo pelo turismo, ou seja, a produção de territórios turísticos. Boa aula! Bons estudos! Bons estudos! 36Geografia, Turismo e Território Seções de estudo 1 - Território: um conceito, várias abordagens 1. Território: um conceito, várias abordagens 2. A utilização do território pelo turismo 3. Planejamento e (re)ordenamento do território pelo turismo 1.1 - O que é território? A categoria de análise e seus conceitos Bordo (et. al.) abordam em seu texto os vários conceitos, bem como seus autores, que trabalham com essa categoria, sobretudo na Geografia. Para os autores, a importância desse estudo/relato encontra-se justamente no sentido de se aprofundar as discussões no campo de formação geral do geógrafo, pois: [...] o espaço, o território, a região e a paisagem são os conceitos-chave da ciência geográfica e foram adquirindo concepções variadas no decorrer da história do pensamento geográfico, sendo trabalhados de diferentes maneiras pelos principais autores que contribuíram para um enriquecimento maior dos principais conceitos da Geografia. [...] Cada autor, dependendo da sua linha de trabalho e de suas concepções teóricometodológicas, dá ênfase a alguns aspectos dentro do território, seja o aspecto econômico, político e cultural ou o entrelaçamento destes fatores, para explicar o conceito e a dinâmica de um espaço que está sempre em construção (BORDO et. al., s.d., p. 1-2). Nesse sentido, veremos agora os principais conceitos/ autores que estudam o território na perspectiva geográfica: Autor Abordagem Leituras do território Claude Raffestin (1993) Política - Entende o espaço geográfico como substrato, um palco, preexistente ao território. - O território é tratado, principalmente, como o território nacional, espaço físico onde se localiza uma nação; um espaço medido e marcado pela projeção do trabalho humano com suas linhas, limites e fronteiras. - A construção do território revela relações marcadas pelo poder. Poder e território, apesar da autonomia de cada um, vão ser enfocados conjuntamente para a consolidação do conceito de território. Assim, o poder é relacional, pois está intrínseco em todas as relações sociais. Rogério Haesbaert Jurídico-política; Cultural(ista); Econômica - No panorama atual do mundo com todas as suas complexidades e processos, muitas vezes excludentes, como a crescente globalização e a fragmentação a um nível micro ou local, servindo de refúgio à globalização, HAESBAERT (2002) identifica uma multiterritorialidade reunida em três elementos: os territórios- zona, os territórios-rede e os aglomerados de exclusão. - Nos territórios-zona prevalece a lógica política; nos territórios-rede prevalece a lógica econômica e nos aglomerados de exclusão ocorre uma lógica social de exclusão sócio-econômica das pessoas. HAESBAERT (1997) também analisa a questão do conceito de território com um enfoque cultural, quando estuda a des- territorialização e a identidade na rede gaúcha no nordeste. Marcelo Lopes de Souza (2001) Política; Cultural - O território é um espaço definido e delimitado por e a partir de relações de poder, e que o poder não se restringe ao Estado e não se confunde com violência e dominação. Assim, o conceito de território deve abarcar mais que o território do Estado-Nação. - Não um território ideologizado com um poder centralizador como o Estado- Nação, mas um território autônomo, onde as pessoas têm a liberdade de manifestar suas escolhas e potencialidades, gerando um espaço socialmente equitativo. - O autor aponta a existência de múltiplos territórios, principalmente nas grandes cidades, como o território da prostituição, do narcotráfico, dos homossexuais, das gangues e outros que podem ser temporários ou permanentes. Marcos Aurélio Saquet Econômica; Política; Cultural - SAQUET (2004), faz um resgate das diferentes interpretações do conceito de território levando em consideração as três vertentes mencionadas por Haesbaert (jurídicopolítica, econômica e cultural), como sendo essenciais para se fazer as interligações necessárias. - Também considera a vertente da natureza, que sempre estará presente dentro do território. A natureza está no território, é dele indissociável. Manuel Correia de Andrade (1995) Política Econômica - O território associa-se mais à idéia de integração nacional, de uma área efetivamente ocupada pela população, pela economia, a produção, o comércio, os transportes, a fiscalização etc. É no território que as relações capitalistas efetivamente se fazem presentes. - Já territorialização é a forma de como se materializa o território, bem como a manifestação das pessoas, a especialização de qualquer segmento da sociedade como, por exemplo, a produção econômica de um determinado produto. Caio Prado Júnior (1987) Econômica O território é sempre visto como porção territorial, palco dos acontecimentos econômicos e das transformações vivenciadas pela sociedade. 37 Milton Santos Várias - A formação do território é algo externo ao território. Segundo Santos (1985) a periodização da história é que define como será organizado o território, ou seja, o que será o território e como serão as suas configurações econômicas, políticas e sociais. - O território poderá adotar espacialidades particulares, conforme há o movimento da sociedade (nos seus múltiplos aspectos: sociais, econômicos, políticos, culturais e outros). - Para SANTOS (2002a), a formação do território perpassa pelo espaço e a forma do espaço é encaminhada segundo as técnicas vigentes e utilizadas no mesmo. Configura- se pelas técnicas, pelos meios de produção, pelos objetos e coisas, pelo conjunto territorial e pela dialética do próprio espaço. Fonte: Adaptado de BORDO (et. al. , s. d., p. 1-8). Dessa forma, nota-se que todos os autores apresentados, direta ou indiretamente, utilizam a ideia de relação de poder para caracterizar e discutir o território em suas mais diversas abordagens. Tais abordagens percorrem as questões políticas, econômicas, jurídicas, sociais, culturais e históricos. Assim, todas essas percepções serão importantes para entendermos, a partir de agora, a relação do território com o Turismo, e do Turismo com o território. 2 - A utilização do território pelo turismo 2.1 - Território e Turismo: uma reflexão inicial Entre os pesquisadores do turismo esse conceito é abordado de formas distintas, porém, é necessário que essa categoria seja trabalhada em uma visão múltipla e abrangente, uma vez que o território turístico deve ser analisadoenquanto um articulador de conexões de caráter global. Cruz (2001) relata algumas particularidades inseridas nesse contexto, no sentido de entendermos essa questão. Diversas particularidades caracterizam a relação turismo-território no que concerne a produção e ao consumo de territórios pelo turismo. Uma dessas especificidades diz respeito ao fato de o principal objeto de consumo do turismo ser o espaço, entendido como um conjunto indissociável de objetos e de ações, de fixos e de fluxos. Nenhuma outra atividade consome, elementarmente, espaço, como faz o turismo e esse é um fator importante da diferenciação entre turismo e outras atividades produtivas. É pelo processo de consumo dos espaços pelo turismo que se gestam os territórios turísticos. O turismo concorre, no processo de transformação dos territórios para seu uso, com outros usos do território, bem como com formações socioespaciais precedentes a seu aparecimento. Apesar desses confrontamentos, a força do turismo é dada por sua capacidade “de criar, de transformar e, inclusive, de valorizar, diferencialmente, espaços que podiam não ter valor no contexto da lógica de produção...” (Nicolás, 1996) (CRUZ, 2001, p. 17). Fratucci (2014, p. 92-93) nos explica como funciona o processo de utilização do espaço pelo/para o turismo, resultando em territórios turísticos. Para tentar entender esse debate, vamos ler um trecho de seu artigo: Turismo e território: relações e complexidades. Partindo do entendimento do espaço como uma instância da sociedade contemporânea, formado pelo movimento dialético entre forma e conteúdo (SANTOS, 1997), podemos afirmar que é a partir dele que os agentes sociais do turismo produzem seus processos de turistificação que resultam em territórios do turismo, os quais se revelam como destinos turísticos. O turismo, “em sua essência e natureza primeira se compõe dos movimentos e das paradas dos turistas pelo espaço” (FRATUCCI, 2014, p. 45). Nesses momentos de paradas ocorre o processo de territorialização do visitante, quando ele se apropria, mesmo que fugidiamente, dos elementos do espaço visitado a partir da sua lógica reticular, onde se fixa em alguns pontos enquanto ignora outros. A partir dessa ação primeira do visitante (turista), os demais agentes sociais envolvidos por ele e para ele, vão se apropriando de trechos do espaço e criando os seus territórios, também predominantemente a partir de lógicas de apropriação reticulares. Temos então, sobre um mesmo trecho de espaços, diversos processos de territorialização que se superpõem e compõem o que denominamos de território do turismo. Esse território é descontínuo, reticular e, por isso, pode ser visto como um território-rede (FRATUCCI, 2008, 2014). Entretanto, buscando uma visão mais ampliada desses territórios do turismo, devemos cuidar para não nos limitarmos à nossa leitura pelos padrões da lógica reticular, uma vez que, em determinados momentos, de maneira sincrônica ou diacrônica, alguns dos agentes sociais envolvidos no processo de turistificação também podem agir a partir de lógicas mais zonais, como é o caso dos agentes do poder público e da população residente que, antes de tudo, tem ali o seu lugar de vida permanente. As territorialidades dos diversos agentes sociais produzem, a partir de lógicas zonais e reticulares que se complementam e se articulam no espaço e no tempo, o território do turismo. Temos assim que o par espaço-território torna-se básico para os processos de ordenamento das formas de desenvolvimento dos destinos turísticos. Os trechos do espaço apropriados por cada um dos diversos agentes sociais envolvidos com o turismo estruturam-se em um território-rede complexo, sazonal, dinâmico e “líquido” (BAUMAN, 2001). Visto dessa forma, o território do turismo é uma composição dos territórios construídos por cada um dos agentes sociais responsáveis pelo acontecer do fenômeno turístico e não apenas pelo território que contém a atividade turística. O território do turismo é, portanto, a soma dos territórios dos turistas, dos agentes do mercado, do poder público, dos trabalhadores da atividade (diretos e indiretos) e do território da população local dos destinos turísticos. Nos processos de planejamento e de gestão desses territórios é condição sine qua non a contemplação das relações e interações que se estabelecem entre os territórios de cada agente social, pois é a partir delas que se estabelece o território do turismo, em sua concretude e totalidade. Fonte: Fratucci (2014, p. 92-93) GAZIN Highlight 38Geografia, Turismo e Território Knafou (2001, p. 72-73) aponta que há diferentes tipos de relações entre turismo e território. Para o autor, “a análise do turismo e de sua dimensão territorial é um dos meios de (re)pensar este fenômeno multiforme e inapreensível, duplamente marcado pelo peso dos interesses econômicos e pelo domínio das abordagens flus” (KNAFOU, 2001, p. 71). Nesse sentido, o autor analisa as relações entre território e turismo de acordo com três tipos de situações: Podem existir territórios sem turismo? Segundo o autor, foi este o caso até a invenção do turismo na Europa Ocidental, no século XVIII. E ainda hoje, apesar da turistificação de uma parte do espaço mundial, ainda há territórios sem turismo. No entanto, com o progresso dos transportes, da tecnologia e da ideia de que o espaço mundial é acessível, existem cada vez menos territórios sem turismo. Mesmo os turistas podendo acessar quase toda a extensão do espaço mundial, essa prática deve ser realizada em número e sob formas que permitam aos lugares existirem. Pode existir também um turismo sem território Na verdade o autor fala de um tipo de turismo que não procede da iniciativa de turistas, e sim das operadoras de turismo que colocam um produto no mercado, sendo o mesmo localizado, com alguma relação com o território, mas um produto que não é suficiente para produzir um território turístico. Geralmente caracterizado por lugares de passagem, onde o turista faz uma incursão ou uma excursão. Nesses locais, o planejamento do território é apenas um planejamento do espaço, no qual o turismo constitui-se em um princípio de organização. Nesse sentido, o turismo é reduzido somente à uma atividade econômica, criadora de empregos e lucrativa. Como exemplo de turismo que se contenta com sítios e lugares equipados, está o “turismo fora do solo”, quase indiferente à região que o acolhe e onde a extensão planejada nada mais é do que um espaço-espetáculo. Os parques aquáticos e as chamadas “bolhas tropicais” ilustram bem esse tipo de equipamento turístico, criando seu próprio clima, em lugares banais, escolhidos por sua acessibilidade, próximos das grandes cidades. Podem, enfim, existir territórios turísticos Nesse sentido, são territórios inventados e produzidos pelos turistas, mais ou menos retomados pelos operadores e planejadores turísticos. Isso traz alguns problemas, pois não é somente o espaço que se planeja, mas toda uma sociedade. Por fim, o autor destaca sua preocupação com a apropriação e utilização do território pelo turismo, esclarecendo e nos levando a refletir sobre a seguinte situação: Se nos lembrarmos que não há turismo sem turistas; se recusarmos as ideias prontas; se recusarmos o domínio exclusivo do mercado sobre esta atividade humana que é um importante meio de desabrochamento do indivíduo e se tentarmos colocar um pouco de ordem num fenômeno multiforme, teremos então feito um pouco de progresso (KNAFOU, 2001, p. 73). 2.2 - Diversidade de territórios e sua relação com o Turismo Diante desse contexto, é relevante também mencionar que inseridos na categoria território, outros conceitos se inter-relacionam, como o de territorialidade, entendido como um conjunto de práticas que garantam a apropriação e a permanência de um dado território por um determinado grupo social (CORIOLANO; SILVA, 2005). Adyr Rodrigues (2006) aponta a questãoda territorialidade, utilizando como exemplos, os equipamentos turísticos. [...] são territórios duais que assumem temporalidades igualmente híbridas. O mesmo ocorre nos centros comerciais que se tornam movimentados territórios de lazer, acumulando num mesmo espaço usos distintos, substituindo as antigas ruas centrais das grandes cidades, que aglutinavam cinemas, teatros, galerias de arte, cafés bares, restaurantes, etc. (RODRIGUES, 2006, p. 300). Ou seja, todas as relações sociais existentes entre turistas x residentes x turistas se expressam a partir da territorialidade, como práticas e expressões materiais e simbólicas que buscam garantir a apropriação e a permanência do território. O espaço do turismo deve ser entendido como condicionante econômico, social, político e cultural e não ser visto apenas como produto das relações sociais. Castro (2006) nos ajuda a pensar essa questão, na perspectiva da contemporaneidade: A diversidade atual dos territórios turísticos está estreitamente relaciona às transformações da sociedade contemporânea que, por sua vez, são captadas pelo gênio edificador da produção turística. Desse modo, podemos citar como territórios turísticos: a orla marítima com seu tradicional turismo de sol e praia; as áreas naturais protegidas que carregam o selo verde e controverso da sustentabilidade turística; a natureza das águas, do ar, das trilhas, das cavernas, de paredões dos batólitos; o meio rural com sua vida bucólica; as cidades e as metrópoles (CASTRO, 2006, p. 47). Entretanto, a existência de territorialidades diferenciadas possibilita a organização desse espaço como fruto das relações sociais empreendidas pelo turismo. A mesma autora supracitada continua sua linha de raciocínio, afirmando que: [...] o turismo constrói novos territórios e territorialidades ao promover inovações relacionadas à infraestrutura energética, transportes e comunicações, saneamento básico, expansão imobiliária com a valorização do solo urbano; ao afetar valores, costumes e cultura da comunidade local, resultando numa série de efeitos favoráveis e desfavoráveis ao inscrever uma nova racionalidade espacial, numa conexão sistêmica entre o local e o GAZIN Highlight GAZIN Highlight GAZIN Highlight 39 global. Desse modo, como lugar de vida, de trabalho e de circulação, é a categoria chave para o planejamento, a análise espacial e a compreensão da prática social do turista e do turismo como atividade produtiva (CASTRO, 2006, p. 49-50). Outro conceito importante para inserirmos nessa discussão é o de desterritorialização. Esse conceito refere-se aos processos de perda de território derivados da dinâmica territorial e/ou conflitos de poder. A compreensão da categoria território e seus desmembramentos são de fundamental importância para o estudo do turismo. É correto afirmar que a atividade turística transcende a esfera da organização espacial, mas também devemos considerar que se trata de um fenômeno territorial. Em outras palavras, os territórios são anteriormente relações sociais projetadas nos espaço, podem formar-se e dissolver-se, ser estáveis ou instáveis, ter a existência regular ou apenas periódica. Os territórios são construídos e descontruídos socialmente, podendo ter um caráter permanente ou subsistir de maneira cíclica (FONTOURA; ANDRADE, 2008, p. 3-4). De fato, o território turístico é uma construção social, uma vez que é produzido pelas relações sociais, sobretudo, as existentes entre a sociedade e a natureza. Porém, é importante ressaltar que o território turístico é sempre percebido como um espaço de poder, de gestão e de domínio por parte dos gestores, dos turistas e das comunidades receptoras. Percebe-se desta forma que a relação entre turismo, espaço e território depende imprescindivelmente dos fluxos e fixos, ou seja, da estrutura composta pelos equipamentos turísticos e pela mobilidade provisória do homem de seu território original, gerando uma desterritorialização e criando um novo território em outro lugar, um território turístico (FONTOURA; ANDRADE, 2008, p. 5). 3 - Planejamento e (re)ordenamento do território pelo turismo 3.1 – A “criação” de territórios: suporte e atratividade para o turismo “Atualmente, o turismo deixou de ser um usuário passivo dos territórios para tornar-se um agente condicionador de seu ordenamento” (FONTOURA; ANDRADE, 2008, p. 9). A transformação do espaço geográfico em produto turístico, atualmente em escala global, necessita de uma crescente racionalidade, devido à intensa competitividade entre os produtos turísticos. Nesse sentido, tanto a competitividade quanto a racionalidade interferem na organização dos setores produtivos, utilizando-se do planejamento territorial como condição para o adequado desenvolvimento da atividade. O processo de transformação de um determinado espaço em território turístico requer a readequação desse espaço à sua nova funcionalização. Essa readequação significa a criação de um sistema de objetos que se aproxime e identifique ao sistema de ações advindo da demanda social do turismo (FONTOURA; ANDRADE, 2008, p. 11). Cruz (2001, p. 23), estabelece através dos estudos de Sanches (1991) duas situações relacionadas à questão turismo – território e que tem relação direta com o planejamento e ordenamento do território: 1) Um turismo que não estabelece vínculos territoriais permanentes com o espaço do ócio a que se dirige como, por exemplo o “turismo de hotelaria”. Essa não é uma modalidade de turismo, e sim uma prática da atividade turística onde o hotel corresponde ao meio de hospedagem. 2) Um tipo de turismo permanente no uso do mesmo espaço. Nesse caso, ocorre uma espécie de vínculo territorial psicológico como, por exemplo, nas “segundas-residências”. A autora ainda destaca outros aspectos que envolvem a relação turista, turismo e território e que influenciam na prática da atividade: efemeridade da relação do turista com o território visitado; tempo de ócio integralmente utilizado enquanto tempo de consumo do lugar turístico; rigidez dos pacotes turísticos que resultam em uma apropriação inapropriada do território visitado; turistas mais preocupados em conhecer o maior número de lugares em detrimento do envolvimento mais profundo com o local visitado (CRUZ, 2001, p. 23-24). No entanto, no sentido de amenizar tais questões, a autora salienta que: Apesar dos fatores contrários, todo turista poderia em princípio, estabelecer relações menos fugidias com os territórios que visitam, se assim desejassem. O que se passa, na verdade, é que a apropriação do espaço pelo turismo é restrita ao trade turístico, aos atores hegemônicos que controlam a atividade, e a forma como se dá essa apropriação, principalmente no turismo de hotelaria, acaba por se configurar como um impeditivo à apropriação desses territórios pelos turistas (CRUZ, 2001, p. 24). Cruz (2003, p. 22-24) propõe uma reflexão sobre a (re)apropriação dos territórios pelo turismo, a partir da interferência do turismo em três porções do espaço geográfico: os polos emissores de fluxos, os espaços de deslocamento e os núcleos receptores de turistas. Vejamos: 3.2 - Os territórios emissores de turistas A emissividade de turistas está fortemente associada ao fenômeno urbano, o qual também pode ser explicado pela concentração populacional e estilo de vida. Porém, esses fatores não são suficientes para explicar a emissividade de determinado lugar, pois outras questões estão instaladas nesse contexto. Não basta o estresse urbano e o desejo em se praticar turismo para que seja criada uma demanda efetiva. Nesse GAZIN Highlight 40Geografia, Turismo e Território sentido, os polos emissores de turistas também podem ser transformados pelo turismo, na perspectiva da emissividade. Além disso, em função dessa emissão, multiplicam-se as agências e operadoras de viagem nos centros emissores, gerando empregos nesses locais. Outras demandasse fazem necessárias nesse contexto como, por exemplo: infraestruturas relacionadas ao deslocamento, rodoviárias, aeroportos, estradas, dentre outros. Tais equipamentos, de uso fundamental à prática do turismo, não são exclusivos deste, como nenhum equipamento ou infraestrutura é. Importante salientar também que, em diversos casos, grandes polos emissores de turistas também são receptores, demandando outros elementos de (re)ordenamento do território. Além disso, não se pode deixar de mencionar que a necessidade de viajar é inerente à sociedade de consumo e criada, em grande parte, pelos agentes de mercado. 3.3 - Os espaços de deslocamento O fato do turista se deslocar até o atrativo ou destino a fim de consumir o produto, implica que a prática social do turismo crie ou se aproprie de espaços de deslocamentos, sobretudo no que se refere aos deslocamentos rodoviários. Assim, ao longo desses espaços, das rodovias, surge uma diversificada infraestrutura como, por exemplo: postos de gasolina, restaurantes, meios de hospedagem, lojas de artesanato local, infraestruturas de lazer, dentre outras. Nesse sentido, o turismo não apenas se apropria de rodovias preexistentes ao seu surgimento em dado território, mas também pode criar seus espaços de deslocamento. Por outro lado, nota-se também que algumas rodovias podem servir de motivação para viagens como, por exemplo, a Estrada da Graciosa, no Paraná e a Rota 66, nos Estados Unidos. Além disso, a qualidade dos espaços de deslocamentos pode inibir ou incentivar os fluxos turísticos. Estradas mal cuidadas, mal sinalizadas, que oferecem perigo ao trafego de turistas, podem ser motivos de diminuição nas práticas de turismo de qualquer localidade. 3.4 - Os núcleos receptores de turistas Logicamente que é sobre os núcleos receptores que o Turismo irá impactar as transformações socioespaciais em determinadas localidades. Infraestrutura turística e de apoio podem ser criadas e/ou apropriadas pelo Turismo, sendo ele capaz de reorganizar sociedades inteiras para que isso aconteça. O setor de prestação de serviços é diretamente impactado pela presença dos turistas, gerando impacto também no mercado informal. O que o turismo faz nos núcleos receptores é impor sua lógica de organização dos espaços (a lógica do lazer) às lógicas preexistentes. Daí as transformações que se colocam nos territórios em função do turismo. O turismo cria novos objetos, mas também se apropria de objetos já existentes (naturais e culturais) atribuindo-lhes novos significados e/ou novas feições. Finalizando nossa discussão, percebemos que os territórios constituem, ao mesmo tempo, suporte e atratividade para o turismo. Já o consumo do espaço pelo turismo é formado pelo consumo da natureza ou de suas parcelas, além do consumo da infraestrutura turística e de suporte (acesso ao atrativo, infraestrutura básica no destino, infraestrutura de apoio ao turista, dentre outras). Assim, podemos dizer que: Em outras palavras, o turismo enquanto fenômeno sócio-espacial se apropria de trechos do espaço, cria territórios e move territorialidades, em um conjunto de recursos naturais e culturais que incita o fluxo de pessoas até ele. Nesse sentido, apreender o seu papel no ordenamento e reordenamento de territórios, requer a análise de diversas variáveis que compõe as relações nas quais o turismo se insere. Para a consideração dessas variáveis em territórios protegidos, como os parques nacionais ou estaduais, além da análise de todos os fatores mencionados ainda devem ser contempladas as dimensões ecológicas e de conservação, para um correto planejamento e ordenamento do turismo, vislumbrando a sustentabilidade das ações nesses locais (FONTOURA; ANDRADE, 2008, p. 14). Retomando a aula Chegamos, assim, ao final da sexta aula. Espera-se que agora tenha ficado mais claro o entendimento de vocês sobre a categoria de análise geográfica do território e suas contextualizações sociais. Além disso, espera-se ter contribuído para a compreensão da importância do turismo para o (re)ordenamento territorial. 1 – Território: um conceito, várias abordagens Nesta seção, conceituamos “território” a partir de diferentes autores e das diversas abordagens. Tais abordagens percorrem as questões políticas, econômicas, jurídicas, sociais, culturais e históricas. 2 – A utilização do território pelo turismo Aqui, inserimos a discussão territorial no âmbito do Turismo, com algumas reflexões iniciais sobre o território turístico. Além disso, aprendemos que há diferentes tipos de relações entre turismo e território, além da existência de territorialidades diferenciadas que, dessa forma, possibilitam a organização do espaço como fruto das relações sociais empreendidas pelo turismo. Discutimos também a questão da desterritorialização, entendendo-a como um ou mais processos de perda de território derivados da dinâmica territorial e/ou conflitos de poder. 3 - Planejamento e (re)ordenamento do território pelo turismo Aqui estudamos o turismo enquanto atividade importante no planejamento e ordenamento do território, propondo uma reflexão sobre a (re)apropriação dos territórios pelo turismo, a partir da interferência do turismo em três porções do espaço geográfico: os polos emissores de fluxos, os espaços de deslocamento e os núcleos receptores de turistas. 41 BORDO et. al. As diferentes abordagens do conceito de território. Disponível em: <http://forumeja.org.br/sites/forumeja.org. br/files/diferentesabordterr.pdf>. Acesso em: 10/03/2018. FONTOURA, L. M.; ANDRADE, S. A. Turismo e geografia: o planejamento territorial do turismo. Anais do II Fórum Internacional de Turismo do Iguassu. Foz do Iguaçu/PR, 2008. Disponível em: <http://festivaldeturismodascataratas. com/wp-content/uploads/2014/01/41.-TURISMO-E- GEOGRAFIA-O-PLANEJAMENTO-TERRITORIAL- DO-TURISMO.pdf>. Acesso em: 10/03/2018. OURIQUES, H. R. Território e turismo: uma reflexão inicial. Disponível em: <http://www.revistaturismo.com.br/ artigos/territorioturismo.html>. Acesso em: 15/03/2018. Disponível em: <http://mundoeducacao.bol.uol. com.br/geografia/conceito-territorio.htm>. - Conceito de território. Disponível em: <https://brasilescola.uol.com.br/o- que-e/geografia/o-que-e-territorio.htm>. - O que é território? Vale a pena Vale a pena ler Vale a pena acessar Minhas anotações
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