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Mises Brasil - Artigos -Anarcocapitalismo

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Por que ser um anarcocapitalista?
É cada vez maior o número de indivíduos (provavelmente nunca foi tão grande) que se declaram defensores do livre mercado, apesar da incansável e implacável propaganda contra esse sistema.  E isso é sensacional.
No entanto, essas declarações sempre são complementadas pelo inevitável mas: mas precisamos de um governo que ao menos garanta a segurança e resolva contendas judiciais, que são os serviços mais críticos de todos.
Quase sem pensar, pessoas que em outras circunstâncias defendem o mercado querem atribuir ao governo a responsabilidade pela produção dos mais importantes bens e serviços existentes em uma economia.  Muitas dessas pessoas são a favor de que o governo seja o monopolista da produção de dinheiro, e todas elas defendem um monopólio estatal da produção de leis, direitos e de serviços de proteção.
Não estou aqui dizendo que essas pessoas são tolas ou parvas.  É fato que quase todos nós também já vivenciamos essa fase do "governo limitado" — rotulando-nos de "minarquistas" —, e, quando éramos assim, simplesmente nunca nos ocorreu de examinar mais detidamente as nossas premissas.
Só para começar, alguns poucos princípios econômicos básicos já seriam o bastante para, no mínimo, nos fazer refletir um pouco antes de já sairmos pressupondo que o monopólio estatal é a melhor opção:
· Os monopólios (dos quais o próprio governo é o principal exemplo) levam, com o tempo, a preços mais altos e pior qualidade.
· O livre mercado e seu sistema de preços estão continuamente direcionando recursos escassos de maneira a atender os desejos dos consumidores de uma forma menos custosa possível em termos de oportunidades renunciadas. 
· Os preços formados no livre mercado refletem as preferências dos consumidores e faz com que o capital privado seja direcionado para as aplicações que melhor irão satisfazer os desejos dos consumidores.  Simultaneamente, os empreendedores têm de lidar constantemente com as contínuas mudanças nos desejos dos consumidores.  Isso garante um mercado dinâmico e sempre voltado para o desejo dos consumidores.
· Já o governo, mesmo que fosse formado exclusivamente por anjos, não seria capaz de gerenciar uma empresa eficientemente, e nem poderia ser "gerenciado como uma empresas eficiente," como já explicou Ludwig von Mises. Por não ter de operar segundo a lógica do sistema de lucros e prejuízos, uma agência estatal não tem ideia do que produzir, em qual quantidade, em qual localização, e utilizando qual método. Todas as suas decisões são arbitrárias.
Em outras palavras, no que diz respeito à oferta estatal de qualquer bem ou serviço, há bons motivos para esperar qualidade baixa, preços altos e uma alocação arbitrária e irracional de recursos.
São várias as razões por que o mercado — que é a arena na qual ocorrem interações voluntárias entre indivíduos — merece o benefício da dúvida em relação ao estado, e por que não deveríamos pressupor a priori que o estado é indispensável sem antes analisarmos seriamente o que a engenhosidade humana e a harmonia econômica do mercado já fizeram sem o estado.
Por exemplo:
· O estado adquire a sua renda coagindo indivíduos pacíficos e produtivos, e ameaçando de violência em caso de resistência.
· O estado estimula as pessoas a acreditarem que existem dois conjuntos distintos de regras morais: um é aquele que aprendemos quando crianças, o qual inclui a abstenção de violência e roubo; e o outro é aquele que se aplica somente ao governo, que é o único ente que pode atacar indivíduos pacíficos e produtivos de todas as maneiras possíveis.
· O sistema educacional, o qual os governos sempre acabam dominando (nem que seja por meio de ministérios que impõem os currículos escolares), doutrina as crianças e os adolescentes a verem, desde cedo, todos os ataques e depredações do estado como atitudes moralmente legítimas, e o mundo das trocas voluntárias como algo moralmente inferior e até mesmo duvidoso.
· O setor público é dominado por grupos de interesses empresariais e por movimentos sociais formados por poderosas "minorias" que fazem lobby para conseguir benefícios especiais à custa dos impostos de toda a população.  Por outro lado, para ser bem-sucedido no livre mercado — naqueles setores cujos empreendedores não recorrem ao governo — é necessário agradar e satisfazer as necessidades e desejos do público consumidor.
· O desejo de agradar a esses grupos de interesse quase sempre supera o desejo de agradar as pessoas que gostariam de ver os gastos públicos reduzidos (e olha que a maioria dessas pessoas quer apenas que os gastos sejam reduzidos marginalmente).
· O judiciário estatal tende a promulgar leis absurdas que visam a agradar exclusivamente esses grupos de interesse e esses movimentos minoritários.
· Os governos doutrinam seus súditos, por meio de intelectuais defensores do regime e da mídia governista, a acreditar que qualquer ideia de resistência às expropriações do governo é traição e preconceito — o que significa que, para ser honesto e puro, você tem necessariamente de ser pró-governo.
E a lista continua.
É perfeitamente compreensível que as pessoas possam não entender como o judiciário — algo que supõem ter de ser ofertado de cima pra baixo — poderia surgir e funcionar na ausência de estado, muito embora existam várias obras demonstrando precisamente como isso já ocorreu (ver aqui, aqui, aqui e aqui).  Porém, se o governo houvesse historicamente monopolizado a oferta de qualquer bem ou serviço, escutaríamos objeções aterrorizadas a respeito da eventual privatização desse bem ou serviço.
Por exemplo, se o governo detivesse o monopólio da produção de lâmpadas, os intelectuais a serviço do regime nos alertariam que seria impossível o setor privado assumir a produção de lâmpadas.  O setor privado não produziria lâmpadas no tamanho ou na voltagem que as pessoas desejariam, diriam eles.  O setor privado não produziria lâmpadas especiais voltadas exclusivamente para um determinado mercado, já que será pouco lucrativo fazer isso.  O setor privado fabricaria apenas lâmpadas perigosas e explosivas.  
O mesmo raciocínio ocorreria caso o governo sempre houvesse sido o único fabricante de sapatos: a maioria das pessoas seria incapaz de imaginar como o mercado poderia ser capaz de produzir sapatos.  Como o mercado poderia acomodar todos os tamanhos?  Não seria um desperdício produzir estilos para todos os gostos?  Quantas marcas existiriam?  Quantas lojas de sapato haveria em cada cidade?  Em cada município? Como isso seria definido?  Qual seria o arranjo de preços?  E quanto aos sapatos ruins?  Não seria necessário haver regulamentação da indústria de calçados para garantir que o produto seja confiável?  E quem iria fornecer sapatos aos pobres? E se a pessoa não tiver o dinheiro necessário para comprar um par?  Sapatos são, indiscutivelmente, bens muito importantes para ser entregues às vicissitudes da anarquia do mercado.
Uma vez que vivemos em um mundo em que as lâmpadas e os sapatos sempre foram de produção privada, essas objeções parecem risíveis.  
Mas o fato é que a provisão concorrencial de justiça está longe de ser um fenômeno atípico na história da civilização ocidental.  Quando o rei começou a monopolizar a função jurídica, ele o fez não por um desejo abstrato de estabelecer uma ordem — a qual já existia —, mas sim porque ele agora poderia coletar taxas sempre que os tribunais reais fossem utilizados.  A ingênua teoria do "interesse público", na qual nenhuma pessoa sensata acredita em qualquer outro contexto, não se torna repentinamente convincente nesse contexto em específico.
Murray N. Rothbard gostava de citar Franz Oppenheimer, que identificava duas maneiras pelas quais é possível adquirir riquezas.  O meio econômico de se adquirir riqueza implica o enriquecimento por meio de trocas voluntárias: você tem de cria algum bem ou serviço pelo qual as pessoas voluntariamente queiram pagar. Já o meio político, dizia Oppenheimer, seria "a apropriação não recompensada do trabalho de terceiros".
Logo, como é que nós, queestamos nesse campo rothbardiano, vemos o estado? Não como o indispensável provedor de justiça, ordem, segurança e outros chamados "bens públicos". (Aliás, a própria teoria dos bens públicos é repleta de falácias). O estado é, ao contrário, uma instituição parasitária que vive das riquezas de seus súditos, ocultando sua natureza anti-social e depredadora sob uma bem trabalhada aparência de interesse público.  É, como dizia Oppenheimer, a organização dos meios políticos para o confisco da riqueza alheia.
"O estado", escreveu Rothbard,
é a organização social que visa a manter o monopólio do uso da força e da violência em uma determinada área territorial; especificamente, é a única organização da sociedade que obtém a sua receita não pela contribuição voluntária ou pelo pagamento de serviços fornecidos, mas sim por meio da coerção.  
Enquanto os outros indivíduos ou instituições obtêm o seu rendimento por meio da produção de bens e serviços e da venda voluntária e pacífica desses bens e serviços ao próximo, o estado obtém o seu rendimento por meio do uso da coerção; isto é, pelo uso de armas e pela ameaça de prisão.  Depois de usar a força e a violência para obter a sua receita, o estado geralmente passa a regular e a ditar as outras ações dos seus súditos.
O estado fornece um meio legal, ordeiro e sistemático para a depredação da propriedade privada; ele torna certa, segura e relativamente "pacífica" a vida da casta parasita na sociedade. Dado que a produção sempre deve preceder qualquer depredação, conclui-se que o livre mercado é anterior ao estado.  O estado nunca foi criado por um "contrato social"; ele sempre nasceu da conquista e da exploração.  
Se é verdadeira essa descrição do estado, e creio que temos boas razões para crer que é, seria possível ou mesmo desejável apenas limitá-lo?  
Antes de rechaçar de imediato a possibilidade, teríamos de considerar ao menos se podemos viver completamente sem ele.  Poderia o livre mercado, a grande arena da cooperação voluntária, ser realmente o grande motor da civilização (e já sabemos na prática que ele é)?
"Vamos apenas nos concentrar em manter o estado limitado", dizem os minarquistas. Um estado limitado seria sem dúvida uma grande melhora em relação ao atual arranjo, mas a experiência já nos ensinou que um "governo limitado" é um equilíbrio instável. Governos não têm nenhum interesse em se manter limitados, quando sabem que podem utilizar seu monopólio da violência para expandir a sua riqueza e, assim, aumentar seu poder.
Da próxima vez que você se flagrar insistindo que precisamos de um governo limitado, pergunte a si próprio por que nenhum governo jamais se mantém reduzido. Será que você não estaria à procura de um unicórnio?
E quanto ao "povo"?  Não poderíamos confiar na sua capacidade de manter um governo limitado? A resposta a essa pergunta está totalmente ao seu redor.
Ao contrário do minarquismo, o anarcocapitalismo não fornece expectativas insensatas e absurdas às pessoas.  O minarquista tem de imaginar como irá convencer o público de que, embora o estado tenha o poder de redistribuir a riqueza e de financiar projetos que agradem a todos, ele na realidade não deve e nem irá fazer isso.  O minarquista tem de explicar, um por um, os problemas com toda e qualquer intervenção estatal concebível, ao passo que, nesse meio tempo, a classe intelectual, as universidades, os meios de comunicação e a classe política já se coligaram contra ele para transmitir a mensagem oposta.
Em vez de exigir as infrutíferas tarefas de ensinar a todas as pessoas o que há de errado com os subsídios, com o protecionismo, com as agências reguladoras, com o Banco Central e com o controle de preços — em outras palavras, em vez de ter de ensinar a todos os indivíduos o equivalente a três cursos universitários de economia, história e filosofia política —, a sociedade anarcocapitalista exige das pessoas que elas reconheçam as ideias básicas e morais que são comuns para quase todos: não agrida inocentes e não roube.
Tudo em que cremos derivam desses simples princípios.
Não é o escopo desse artigo explicar em detalhes como funcionaria uma sociedade sem estado.  Já há vários artigos voltados exclusivamente para isso.  Há também uma vasta literatura voltada para abordar as objeções mais frequentes e evidentes — por exemplo, a sociedade não se degeneraria em uma batalha violenta e sanguinária comandada por grupos armados e senhores da guerra?  Como seriam resolvidas as pendengas judiciais se o meu vizinho escolher um juiz e eu escolher outro?  Para tudo isso, sugiro a bibliografia comentada do anarcocapitalismo reunida por Hans-Hermann Hoppe.
Há uma piada que se tornou corriqueira nos últimos anos no meio libertário: qual a diferença entre um minarquista e um anarquista? Resposta: seis meses.  Se você valoriza princípios, coerência e justiça, e se você se opõe à violência, ao parasitismo e ao monopólio, pode ser que nem sejam necessários seis meses.  Comece a ler e veja até onde essas ideias levarão você.
O contrato social e o consentimento do governado
Não há consentimento para algo que ninguém assinou voluntariamente
O que dá a algumas pessoas o direito de dominar, ordenar e governar as outras? 
Pelo menos desde a época de John Locke, a mais comum e aparentemente mais convincente resposta tem sido a do tal "consentimento do governado". 
Quando os revolucionários norte-americanos justificaram sua secessão do Império Britânico, dentre outras coisas eles falaram que "Governos são instituídos entre os Homens, derivando seus justos Poderes do Consentimento dos Governados". Aparentemente, isso soou bem, especialmente se o indivíduo não pensar a respeito por muito tempo ou muito profundamente. 
Porém, quanto mais profunda e demoradamente alguém se puser a pensar sobre o assunto, mais problemático ele se revela.
Várias perguntas imediatamente vêm à mente. Todas as pessoas devem consentir? Se não, quantas devem? E quais opções restam àqueles que porventura optam por não consentir? Qual deve ser o formato do consentimento — verbal, escrito, explícito ou implícito? Se implícito, como ele deve ser registrado? Dado que a composição da sociedade está em constante mudança — em decorrência de nascimentos, óbitos e migrações internacionais —, com qual frequência devem os governantes confirmar que ainda retêm o consentimento dos governados? 
A legitimidade política, pelo que se pode ver, apresenta uma variedade de dificuldades quando saímos do âmbito das abstrações teóricas e partimos para a percepção prática.
Levanto essa questão porque, no que concerne ao chamado contrato social, frequentemente tive a chance de protestar dizendo que jamais havia visto tal contrato, muito menos havia sido consultado sobre meu consentimento quanto a ele. Para ser válido, um contrato requer oferta voluntária, aceitação e compensação. Como jamais recebi tal oferta de meus governantes, certamente jamais aceitei tal contrato; e, em vez de compensação, tudo que recebi dos meus governantes foram desconsideração, desrespeito e desdém — para não mencionar o fato de que os governantes, não obstante a ausência de qualquer acordo, sempre ameaçaram explicitamente me infligir grandes danos caso eu não obedeça aos seus éditos. 
Mas que insolência monumental a dessa gente! O que lhes dá o direito de me roubar, de me perseguir e de me ameaçar? Certamente não é o meu desejo ser um cordeirinho que eles podem tosar e trucidar sempre que considerarem conveniente para a consecução de seus próprios fins.
Ademais, quando desdobramos a ideia do "consentimento do governado" em detalhes realistas, toda a noção imediatamente se torna completamente ilógica e absurda. Apenas considere como tudo iria funcionar. Um pretenso governante se aproxima de você oferecendo um contrato, esperando a sua aprovação. Eis o acordo, diz ele.
Eu, a pessoa da primeira parte ("o governante"), prometo:
(1) Estipular quanto do seu dinheiro você deve me entregar, bem como quando, de que maneira e para onde a transferência será feita. 
Você não terá nenhuma vozativa na questão, exceto implorar por minha clemência; e caso não cumpra meus ditames, meus agentes irão puni-lo com multas, aprisionamento, confisco de bens e, na eventualidade de uma obstinada resistência, até mesmo com a morte.
(2) Criar milhares e milhares de regras, às quais você deve obedecer sem questionar, novamente sob pena de sofrer as punições supracitadas, que serão instantaneamente ministradas por meus agentes. 
Você não terá nenhuma voz ativa na determinação do conteúdo destas regras, as quais serão tão numerosas, complexas e, em vários casos, além de qualquer possibilidade de compreensão, que nenhum ser humano seria capaz de saber pouco mais do que um punhado delas, menos ainda seu caráter específico. Ainda assim, caso você não cumpra todas elas, sentir-me-ei livre para puni-lo de acordo com as leis criadas por mim e por meus aliados.
(3) Ofertar para você, de acordo com os termos estipulados por mim e por meus aliados, os chamados bens e serviços públicos. 
Embora você realmente possa dar algum valor a alguns destes bens e serviços, a maioria terá pouco ou nenhum valor para você, e há alguns que você considerará totalmente abomináveis. Porém, sempre relembrando, você, como indivíduo, em nenhuma circunstância terá qualquer voz ativa sobre os bens e serviços que eu venha a fornecer, seja sobre a qualidade deles, seja sobre o custo total que sai do seu bolso para bancá-los.
(4) Na eventualidade de uma contenda judicial entre nós, os juízes — todos eles gratos a mim por seus empregos e magnânimos salários — é que decidirão como solucionar o litígio.  
É claro que eu recomendo que você nem sequer se dê ao trabalho de fazer tudo isso, pois é de se esperar que você irá perder essa batalha; aliás, terá muita sorte caso consiga efetivar sua queixa em algum tribunal.
Em troca destes "benefícios" governamentais supracitados, você, a pessoa da segunda parte ("o governado"), promete:
(5) Ficar calado, não protestar, não questionar, obedecer a todas as ordens expedidas pelo governante e seus agentes, e prostrar-se em servidão diante deles como se fossem pessoas importantes e honrosas. Quando ordenarem "Pule!", limite-se apenas a perguntar "Até que altura?"
Que negócio! Alguma pessoa que faça o mínimo uso de suas faculdades mentais aceitaria tal trato? Isso seria imaginável?
No entanto, a descrição acima do verdadeiro contrato social que, dizem, todos os indivíduos aceitaram é abstrata demais para capturar a crua realidade que é ser governado.  
Para enumerar os reais detalhes, até hoje ninguém superou Pierre-Joseph Proudhon, que escreveu:
Ser GOVERNADO significa ser observado, inspecionado, espionado, dirigido, legislado, regulamentado, cercado, doutrinado, admoestado, controlado, avaliado, censurado, comandado; e por criaturas que para isso não têm o direito, nem a sabedoria, nem a virtude para fazê-lo.
Ser GOVERNADO significa que todo movimento, operação ou transação que realizamos é anotada, registrada, catalogado em censos, taxada, selada, avaliada monetariamente, patenteada, licenciada, autorizada, recomendada ou desaconselhada, frustrada, reformada, endireitada, corrigida.
Submeter-se ao governo significa consentir em ser tributado, adestrado, redimido, explorado, monopolizado, extorquido, pressionado, mistificado, roubado; tudo isso em nome da utilidade pública e do bem comum.  Então, ao primeiro sinal de resistência, à primeira palavra de protesto, somos reprimidos, multados, desprezados, humilhados, perseguidos, empurrados, espancados, garroteados, aprisionados, fuzilados, metralhados, julgados, sentenciados, deportados, sacrificados, vendidos, traídos e, para completar, ridicularizados, escarnecidos, ultrajados e desonrados.
Isso é o governo, essa é a sua justiça e sua moralidade! (P.-J. Proudhon, Idée générale de la révolution au XIXe siècle)
Portanto, voltando à questão de a legitimidade política ser determinada pelo consentimento do governado, ao se fazer uma reflexão sóbria, toda a ideia de que há esse tal consenso parece ser tão extravagante e fantasiosa quanto o unicórnio. Ninguém em seu juízo perfeito, exceto talvez um masoquista irrecuperável, iria voluntariamente consentir em ser tratado como os governos de fato tratam seus súditos.
Mesmo assim, pouquíssimos de nós estamos, hoje, ativamente engajados em uma rebelião armada contra nossos governantes. E é exatamente essa ausência de uma sincera e total revolta violenta que, estranho de dizer, alguns comentaristas midiáticos tomam como evidência de nosso consentimento para com a maneira ultrajante com que o estado nos trata.  
Uma condescendência relutante e prudencial, entretanto, não é a mesma coisa que consentimento, especialmente quando as pessoas, como eu, aquiescem fervendo em silêncio, mantendo latente sua furiosa resignação.
Só para constar, posso declarar com total sinceridade que eu não aprovo a maneira como sou tratado pelos mentirosos, ladrões, imorais e corruptos que se autoqualificam como sendo o governo, e nem por aqueles que constituem a tirânica pirâmide dos governos estaduais e municipais que infestam o país.  
Meu desejo sincero é que todos esses indivíduos façam, ao menos uma vez em suas desprezíveis vidas, uma coisa honrosa: sugiro que considerem seriamente a prática do seppuku. Se eles vão utilizar uma espada afiada ou rombuda é o de menos; o que interessa é que tenham a dignidade de conduzir o ato até sua exitosa conclusão.
Um adendo sobra o "ame-o ou deixe-o": sempre que escrevo as linhas acima, recebo inúmeras mensagens de vários Neandertais que, imaginando que odeio meu país, exigem que eu caia fora o mais rápido possível, e volte para de onde jamais deveria ter saído. Tais reações evidenciam não somente uma total falta de educação, mas também uma fundamental incompreensão acerca da natureza da minha queixa e do meu descontentamento.
Em primeiro lugar, posso afirmar que não odeio meu país, e nem teria motivos para tal, dado que não existe essa entidade chamada "país"; há apenas os indivíduos que residem dentro de determinadas fronteiras
Em segundo lugar, e ainda mais importante, por que sou eu quem tem de sair? Não estou agredindo ninguém, não estou roubando e nem espoliando ninguém, e não vivo à custa de ninguém. Por que sou eu, e não os agressores, quem tem de se mudar? 
Quando sou convidado a me retirar e ir morar em outro lugar, sinto-me como alguém que mora em uma cidade que foi tomada por um bando de arruaceiros que deram a seguinte ordem: quem não gostar de ser roubado, ameaçado, intimidado e molestado por rufiões indesejados, que se mude para outra cidade. 
Para mim, parece muito mais moralmente certo fazer com que sejam os criminosos aqueles que tenham de sair correndo.
Quando foi que você e eu assinamos o tal 'contrato social'?
A farsa de exigir submissão a algo que nunca foi acordado
"Se vocês libertários não gostam da existência de um governo detentor do monopólio da coerção, da segurança e da justiça, não gostam de impostos, não gostam de regulamentações, e não gostam do status quo, então por que simplesmente não fazem as malas e vão embora? 
Vocês implicitamente concordaram com as regras vigentes. Se não gostam delas, então deem o fora!"
Este é o argumento comum oferecido por estatistas sempre que um libertário se põe a falar sobre a imoralidade da coerção estatal, de seus impostos, de suas regulamentações, de seu confisco de renda e de propriedade, e de seu monopólio sobre a justiça, a segurança e a moeda.
Embora tal argumento seja extremamente fraco, vale a pena nos concentrarmos mais detidamente nele, pois ele mostra de maneira bastante acurada o quão profundo o estatismo está enraizado na mentalidade das pessoas.
Primeiro ponto: o mais básico
A primeira e mais fácil resposta a este "desafio" estatista é: Por que sou eu quem deve dar o fora? Não estou roubando ninguém, não estou agredindo ninguém. Por que o fardo moral recai sobre mim quando, na verdade, é você quem está me apontando uma arma?  
Eu sou apenas uma pessoa pacífica pedindo para não ser espoliada, ao passo que você estáme apontando uma arma com o intuito de me expropriar e utilizar a minha propriedade e a minha renda para financiar aqueles programas governamentais que você acha o máximo.
Não creio ser nada controverso dizer que, em termos morais, é o estatista quem tem a obrigação de comprovar ter o direito intrínseco de coagir e ameaçar os outros. Enquanto isso não for feito, o ameaçado não tem nenhuma obrigação de comprovar seu direito de ser deixado em paz, sem ser molestado. O ônus cabe ao agressor e não ao agredido.
Esse é o ponto mais básico. Enquanto o estatista não responder de onde vem seu direito natural de espoliar terceiros para proveito próprio ou para o proveito de outrem, a "negociação" está emperrada e ele não tem nenhum direito de seguir adiante com sua espoliação. Toda a pendenga poderia terminar aqui.
Segundo ponto: nunca houve "aceitação tácita"
Porém, em prol do debate, vamos mais adiante.  
Falemos agora sobre o argumento de que o seu consentimento está explicitado no simples fato de você permanecer no país. 
"Se você está aqui e continua morando aqui, então você está automaticamente consentindo com as regras vigentes!", bradam os estatistas.
Este é outro raciocínio sem nenhuma sustentação e sem nenhuma lógica. 
Suponha que você se muda para uma nova vizinhança e, do nada, seu vizinho começa a despejar o lixo dele na porta da sua casa. Pela lógica estatista, se você não concorda com este comportamento dele, então é você quem tem de se mudar dali. Se você não se mudar, então você está automaticamente consentindo em ter sua propriedade violada desta forma.
Faz sentido? Pois é isso que os estatistas estão defendendo, embora não utilizem este cenário.
Confrontados com esta situação, os estatistas recorrem então à regra da "aceitação implícita e tácita". Mais especificamente, eles dizem que, ao se mudar para esta vizinhança, você estaria implícita e tacitamente aceitando o comportamento dos seus vizinhos, não podendo, portanto, reclamar das regras deles. 
O problema deste raciocínio é que ele ignora o status moral e legal de quem faz as leis.  
Por exemplo, suponha que eu convide você para vir à minha casa. Quando você chega, eu abro a porta e lhe digo: para ficar aqui em casa, você tem de usar este nariz de palhaço. Isto certamente vai lhe parecer bastante estranho, mas ainda assim eu posso dizer: "Ei, é a minha casa e estas são minhas regras. Se quiser entrar, tem de ser assim".  
Neste caso, sendo eu o proprietário, você não pode simplesmente dizer: "Olha, eu vou entrar na sua casa, sim, e não vou usar o nariz de palhaço." Se fizer isso, você estará invadindo a minha propriedade e desrespeitando as leis vigentes dentro dela, as quais foram estipuladas antes da sua entrada.  Isso, portanto, é algo que você não tem o direito de fazer.
Agora, imaginemos o cenário contrário. Suponha que eu vá à sua casa e lhe diga: "Você tem de usar um nariz de palhaço". Além do espanto total, sua outra provável reação será a de perguntar quando foi que você disse que concordava em ser obrigado a utilizar um nariz de palhaço dentro da sua casa.  
Ao que irei responder: "Ora, você se mudou para perto de mim. E eu uso nariz de palhaço na minha casa. Portanto, o simples fato de você estar morando perto de mim significa que você, de uma maneira um tanto mística e tácita, consente em também utilizar nariz de palhaço dentro da sua casa, mesmo que você não goste da ideia."
Os estatistas simplesmente pegam este cenário que é evidentemente absurdo em nível local e o expandem para um nível nacional: se você está aqui, então você deu seu consentimento tácito a tudo o que se passa nele.
Mas é realmente assim que as coisas devem funcionar? Como seria a sua vida se todos lhe atribuíssem "consentimentos implícitos e tácitos"? Como seria o mundo? Alguém aceitaria este sistema?
Portanto, quando os estatistas dizem que "ao estar aqui, você automaticamente consentiu com as regras", eles estão fugindo da questão principal. Eles já estão pressupondo a nossa aceitação daquilo que ainda tem de ser provado. 
No exemplo do nariz de palhaço, há uma distinção clara entre o sujeito que diz que você tem de usar o nariz na propriedade dele e o sujeito que diz que você tem de usar o nariz na sua própria casa. 
O primeiro sujeito tem o direito de lhe impor o uso do nariz (e, se você não aceitar, tem a liberdade de sair da casa dele); já o segundo não tem este direito. Tudo depende de quem está legitimamente exercendo sua jurisdição. Na propriedade dele, ele é soberano. Na sua propriedade, ele não é.
A mesma regra tem de ser aplicada ao estado.  
As pessoas que fazem as leis de um país são as genuínas donas do país? O país é propriedade delas? Desde quando? Elas adquiriram esta suposta propriedade do país de maneira justa? Houve o consentimento de 100% da população (qualquer porcentagem abaixo desta indica que há indivíduos sendo espoliados)? 
Estas são perguntas morais que não podem ser ignoradas, mas que são totalmente desconsideradas pelos estatistas.
O terceiro ponto: pagamos pela infraestrutura estatal
E há, por último, o argumento de que nós libertários estamos constantemente utilizando algumas infraestruturas estatais, como estradas, ruas, aeroportos, correios.  
Sendo assim, o simples fato de utilizarmos estes bens e serviços significa que estamos consentindo com a existência do estado e com a espoliação de nossa renda para a consecução destes serviços.
Outro problema de raciocínio.  
Em primeiro lugar, o fato de eu inevitavelmente utilizar sistemas monopolísticos, dos quais eu simplesmente não tenho como escapar, de modo algum indica consentimento. Dizer que utilizar as ruas de uma cidade indica consentimento com o estado é o mesmo que dizer que um prisioneiro que come a comida fornecida pela penitenciária está consentindo em estar preso. 
Em segundo lugar, sempre é bom lembrar que libertários, como todos os outros cidadãos, também pagam impostos. Sendo assim, é nosso dinheiro que foi utilizado para a construção destas infraestruturas estatais. Logo, não há absolutamente nada de contraditório em utilizá-las. Aliás, você tem todo o direito de fazer uso delas, mesmo desprezando-as profundamente.
Para finalizar: eu não consinto
No fim, todo este argumento de 'consentimento implícito' e 'consentimento tácito' não passa de uma patética cortina de fumaça criada para se desviar a atenção daquilo que realmente importa: as minhas palavras.  
E as minhas reais palavras (aquilo que realmente penso, e não aquilo que estatistas querem imputar a mim) não são de consentimento, mas sim de discordância e dissenso. 
Que isso fique bem claro. As minhas verdadeiras palavras são: Eu não dou meu consentimento. 
E estas minhas palavras claramente explicitadas e proferidas não podem ser sobrepujadas por um místico 'consentimento implícito' que magicamente passa a existir em decorrência do simples fato de eu estar em um determinado local.
Resta óbvio que tudo isso não passa de um estratagema ridículo criado por pessoas que simplesmente querem ter poder absoluto, mandar na vida dos outros e escolher vencedores e perdedores.  
Uma vez perpetrado o esbulho, elas tentam embasá-lo e justificá-lo recorrendo a truques comportamentais, dizendo que determinadas atitudes minhas significam que eu realmente estou pedindo para ser governado, que eu implicitamente estou suplicando para ser controlado e mandado.
Não, eu não pedi implicitamente por nada disso. E eu explicitamente digo que "Não, eu não consinto em ser espoliado e controlado".
Por que o princípio da não-agressão é o único condizente com a moralidade e com a ética
Todo o credo libertário se baseia em um axioma central: nenhum homem, ou grupo de homens, pode cometer uma agressão contra a pessoa ou a propriedade de terceiros inocentes. Isso pode ser chamado de "axioma da não-agressão".  
"Agressão" é definida como o uso, ou ameaça de uso, da violência física contra a pessoa ou propriedade de qualquer outro indivíduo. Agressão é, portanto, um sinônimo de invasão.
Se nenhum indivíduo pode cometer uma agressão contraoutro inocente; se, em suma, todos os inocentes têm o direito absoluto de estar "livres" da agressão de terceiros, então isso implica diretamente que o libertário se encontra firmemente ao lado daquilo que se convencionou chamar de "liberdades civis": a liberdade de falar, de publicar, de se reunir, e de se envolver em qualquer um dos chamados "crimes sem vítima", como pornografia, desvios sexuais, e prostituição (ações essas que o libertário não entende como "crimes", uma vez que, para algo ser um genuíno "crime", tem de haver uma invasão violenta da pessoa ou propriedade de outro indivíduo).
No que mais, o libertário entende que atitudes como o alistamento militar compulsório são uma forma de escravidão em escala colossal.  E, uma vez que a guerra, especialmente as guerras modernas, provoca a chacina em massa de civis inocentes, o libertário vê tais conflitos como assassinatos em massa e, portanto, totalmente ilegítimos.
Atualmente, na balança ideológica contemporânea, todas estas posições são consideradas "de esquerda".  
Por outro lado, como o libertário também se opõe a todos os tipos de ataque à propriedade privada, isso também significa que ele se opõe com a mesma ênfase à interferência do governo sobre todos os direitos de propriedade e sobre todos os contratos voluntariamente firmados e cumpridos, o que significa que o libertário se opõe a toda e qualquer interferência governamental sobre a economia por meio de regulamentações, subsídios, tarifas, controles, impostos e proibições. 
Se todo indivíduo tem o direito de possuir sua própria propriedade legitimamente adquirida sem sofrer ataques, então ele também tem o direito de transmitir a sua propriedade (legado ou herança) ou de trocá-la pela propriedade de outros indivíduos (livre contrato e a economia de livre mercado) sem interferência.
O libertário defende o direito irrestrito à propriedade privada e à livre troca.  Ele defende, portanto, um sistema de livre mercado baseado no "capitalismo laissez-faire".
Portanto, na terminologia corrente, a posição libertária a respeito da propriedade privada e da economia seria chamada de "ultra-direita".  
O libertário, no entanto, não vê inconsistência alguma em ser rotulado de "esquerdista" em algumas questões e de "direitista" em outras.  Pelo contrário, ele vê a sua própria posição como sendo a única consistente — consistente com os interesses da liberdade de cada indivíduo.
Afinal, como pode o esquerdista se opor à violência da guerra e do alistamento militar compulsório ao mesmo tempo em que apóia a violência da tributação (e do encarceramento para os "sonegadores"), das tarifas protecionistas (que sustentam os fartos lucros dos grandes empresários) e dos controles e regulamentações governamentais — que impedem pessoas inocentes de entrarem livremente em um determinado mercado para ofertar seus serviços?  
E como pode o direitista alardear sua devoção à propriedade privada e à livre iniciativa ao mesmo tempo em que defende a guerra, o alistamento compulsório, e a proibição de atividades empreendedoriais não-invasivas, mas que ele julga imorais?  
E como pode o direitista ser a favor de um livre mercado ao mesmo tempo em que defende a tributação de empreendedores e da renda das pessoas para financiar as forças armadas e todas as ineficiências improdutivas que envolvem o complexo militar-industrial?
Ao mesmo tempo em que se opõe a toda e qualquer agressão, privada e coletiva, contra os direitos do indivíduo inocente, o libertário entende que, ao longo da história e até os dias de hoje, sempre existiu um agressor central, dominante e preponderante sobre todos esses direitos: o estado.
Diferentemente de todos os outros pensadores, sejam eles de esquerda, de direita ou de centro, o libertário se recusa a conceder ao estado a legitimidade moral para cometer atos que quase todos concordam que seriam imorais, ilegais e criminosos caso fossem cometidos por qualquer indivíduo ou grupo de indivíduos na sociedade.  O libertário, em suma, insiste em aplicar as mesmas leis morais a todos, e não permite isenções especiais a nenhum indivíduos ou grupo de indivíduos.
Porém, se examinarmos o estado nu, por assim dizer, veremos que ele recebe permissão universal, e é até mesmo estimulado, a cometer atos que até mesmo os não-libertários admitem ser crimes repreensíveis.  O estado sequestra as pessoas e rotula essa prática de "alistamento militar obrigatório".  O estado encarcera pessoas que ingeriram substâncias não-aprovadas pelo governo e rotula essa prática de "guerra contra as drogas".  O estado pratica o roubo e a espoliação em massa e rotula essa prática de "tributação".  O estado pratica homicídios em massa e rotula essa prática de "política externa".  O estado pratica privilégios para grandes empresas e rotula essa prática de "políticas de proteção à indústria".  O estado destrói o poder de compra da moeda e rotula essa prática de "política monetária".  O estado impõe restrições à liberdade de empreendimento e rotula essa prática de "regulamentação".  O estado estimula o parasitismo e rotula esta prática de "políticas de bem-estar social".
O libertário insiste que o fato da maioria da população apoiar ou não essas práticas é absolutamente irrelevante para a moralidade de cada ato.  A despeito de uma eventual sanção popular, guerra é assassinato em massa, alistamento compulsório é escravidão, impostos, subsídios e tarifas são roubo, encarceramento por crimes sem vítima é imoral, e restrições ao empreendedorismo é uma prática anti-liberdade e com fins de privilegiar poderosos já estabelecidos.
O libertário, em suma, é aquela criança da fábula, avisando insistentemente que o rei está nu.
Ao longo dos tempos, o rei foi presenteado com uma série de roupas fajutas que lhe foram fornecidas pela casta intelectual da nação.  Em séculos passados, os intelectuais informavam o público que o estado ou seus governantes eram divinos, ou pelo menos estavam investidos da autoridade divina e, portanto, o que poderia parecer ao olho ingênuo e inculto como despotismo, assassinato em massa e roubo em grande escala era apenas o divino agindo de sua maneira misteriosa e benigna sobre o corpo político.
Nas últimas décadas, à medida que a sanção divina começou a ficar um pouco puída, os "intelectuais da corte" do rei começaram a tecer apologias cada vez mais sofisticadas, informando ao público que tudo aquilo que o governo faz é para o "bem comum" e para o "bem-estar público", que o processo de tributar-inflacionar-gastar funciona por meio do misterioso "multiplicador keynesiano", que isso mantém a economia equilibrada, e que, de qualquer maneira, uma vasta gama de "serviços" governamentais não poderia ser executada apenas por cidadãos agindo voluntariamente, no mercado ou na sociedade.
Tudo isso é negado pelo libertário; ele vê estas diversas apologias como meios fraudulentos de obter o apoio do público ao estado, e insiste que quaisquer serviços que o governo possa de fato realizar poderiam ser fornecidos de maneira muito mais eficiente e muito mais moral pela iniciativa privada e pela interação voluntária entre os cidadãos.
O libertário considera, portanto, uma de suas tarefas educacionais primordiais espalhar a desmistificação e dessantificação do estado entre seus súditos desafortunados.  Sua tarefa é demonstrar repetidamente, e a fundo, que não apenas o rei, mas também o estado "democrático", estão nus; que todos os governos subsistem por meio do domínio explorador sobre o público; e que este domínio é o oposto da necessidade objetiva.
Ele luta para mostrar que a própria existência dos impostos e do estado instaura, obrigatoriamente, uma divisão de classes entre os governantes exploradores e os governados explorados. Ele procura mostrar que a tarefa dos intelectuais da corte que constantemente apoiaram o estado sempre foi a de tecer mistificações para induzir o público a aceitar o governo do estado, e que estes intelectuais obtêm, em troca, uma parcela do poder e da pilhagem extraída pelos governantes de seus súditos iludidos.Pegue-se, por exemplo, a instituição da tributação, que os estatistas alegam ser, de certa forma, realmente "voluntária". Qualquer um que realmente acredite na natureza "voluntária" dos impostos está convidado a se recusar a pagar seus impostos e ver o que acontecerá a ele.  Se analisarmos a tributação, descobriremos que, entre todas as pessoas e instituições da sociedade, apenas o governo obtém seus rendimentos por meio da violência.  Todo o resto da sociedade obtém sua renda ou por meio de doações voluntárias (associações, instituições de caridade, clubes de xadrez) ou por meio da venda de mercadorias ou serviços adquiridos voluntariamente por consumidores.
Se qualquer um além do governo começasse a "taxar", seria evidentemente acusado de coerção e de banditismo. No entanto, os adornos místicos da "soberania" encobriram de tal maneira o processo, que apenas os libertários estão preparados para chamar o imposto do que ele é: roubo, legalizado e organizado, em grande escala.
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Para um maior aprofundamento de cada uma das questões abordadas neste texto, inclusive sobre o funcionamento de uma sociedade sem estado, tenham a bondade os artigos contidos no link abaixo:
http://www.mises.org.br/Subject.aspx?id=16
Como parei de inventar desculpas e finalmente libertei minha mente
É com bastante frequência que recebo as seguintes perguntas: "Quando foi que você percebeu que não era necessário haver um estado?", "Quando foi que você deixou de defender a existência de um estado?", ou até mesmo "Como foi que você percebeu que era incoerente ser pró-liberdade e ao mesmo defender o monopólio da violência para uma instituição política?".  E há também a pergunta que resume tudo: "Quando foi que você se tornou um anarcocapitalista?"
Não é uma pergunta fácil de ser respondida.  Mudanças profundas na perspectiva intelectual de uma pessoa não ocorrem da noite para o dia.  Primeiro, você cogita a ideia.  Em seguida, você avalia sua plausibilidade.  Você pode até abraçar completamente a ideia, mas apenas de forma abstrata.  A verdadeira mudança intelectual ocorre apenas quando você se torna capaz de ver a ideia funcionando no mundo real — até mesmo em sua vida cotidiana.  É aí que a confiança em uma ideia se impõe.
É justamente por esta razão que nunca entendi como é possível alguém se tornar socialista.  É algo que vai totalmente contra a lógica.  O socialismo é a ideia menos plausível que pode ser imaginada.  Bens escassos não podem ser propriedade de todos.  Não é uma questão de ideologia, mas sim de lógica pura.  Tente socializar seu notebook, ou seus sapatos, seu carro ou qualquer bem de capital ou de consumo.  Duas pessoas não podem ser proprietárias de forma simultânea e integral do mesmo bem.  O socialismo inevitavelmente sempre terminará em controle estatal total.  É por isso que o socialismo gera desastres humanitários sempre que é integralmente implementado.  Socialistas genuínos ou não entendem essa lógica ou simplesmente querem viver no perpétuo autoengano.
A primeira vez em que ouvi falar em anarcocapitalismo — ou 'anarquismo baseado na propriedade privada' — foi quando vi o livro de Murray Rothbard Man, Economy, and State na estante de livros de um professor.  Só o título [Homem, Economia e Estado] já abordava diretamente alguns problemas que vinham me atormentando à época.  Perguntei ao professor sobre aquele livro e ele ficou alarmado, como se eu houvesse visto algo que não podia ver.  Ele rapidamente me alertou que eu não deveria ler o livro. "Rothbard é um anarquista", disse ele de forma soturna.  É claro que, por causa desta antipropaganda, eu imediatamente quis ler aquela obra (mas não podia porque não havia dela na biblioteca da escola e eu não consegui bolar uma maneira de pegar furtivamente o livro da estante do professor).
Tive de deixar este objetivo temporariamente de lado, mas passei a me dedicar mais profundamente à leitura de livros pró-livre mercado.  Quanto mais eu lia, mais eu me impressionava.  Milton Friedman estava certo.  Henry Hazlitt estava certo.  Ludwig von Mises estava certo.  F.A. Hayek estava certo.  Leonard Read estava certo.  Toda esta tradição, que remetia a Adam Smith, apresentava uma lógica de raciocínio espetacular.  O mundo estava tentando gerenciar suas economias por meio de decretos estatais, mas tudo estava dando errado.  Com essas leituras, aprendi que somente a liberdade e a propriedade privada são genuinamente produtivas, criativas e evolutivas, e somente elas realmente dão poder para as pessoas comuns da sociedade.
E, ainda assim, cada um desses pensadores, por algum motivo que me escapava, não levava essas ideias ao seu extremo lógico.  Eles não chegavam ao ponto de dizer que nós realmente não precisamos de um estado.  Todos eles pareciam concordar que o estado era necessário para manter a paz; que o estado é realmente tudo o que se interpõe entre nós e o caos total.  Sem o estado, não seríamos capazes nem mesmo de dar aquele primeiro passo rumo à ordem social.  Não haveria como usufruir aquela segurança que tomávamos como natural.  Bens e serviços essenciais não poderiam ser ofertados.  Não haveria tribunais, serviços de segurança e defesa, e talvez nem mesmo estradas.  O estado fornece coisas que o mercado não pode fornecer — ou pelo menos era o que dizia tal raciocínio.
Com o passar do tempo, e com minhas leituras, estas ilusões foram sendo destroçadas uma por uma.  Descobri que estradas, correios, comunicações e até mesmo aqueles lendários 'bens públicos' como faróis de navegação marítima foram, de uma perspectiva puramente histórica, todos ofertados pelo livre mercado.  Só depois é que o governo monopolizou estes serviços.  Tribunais?  Na década de 1980, as cortes estatais já estavam tão cheias e eram tão ineficientes, que empresas e indivíduos não queriam utilizá-las.  A arbitragem privada era uma opção muito melhor.  Mesmo nos empreendimentos cotidianos, contratos eram formulados de modo que contendas fossem resolvidas em tribunais privados.  Para mim, tudo aquilo significava que mesmo estes serviços não eram algo exclusivo do governo; eles poderiam ser ofertados exclusivamente pelo livre mercado.  O mesmo se aplicava à segurança.  Não é o estado o que nos dá segurança diariamente, mas sim nossas próprias precauções e medidas preventivas, como fechaduras, armas e a contratação de serviços de segurança privados.
E vale ressaltar que toda essa transformação estava ocorrendo em minha mente durante os anos finais da Guerra Fria.  Um holocausto nuclear era uma ameaça real e diária.  Inimigos estrangeiros nos rodeavam.  Os comunistas queriam destruir nosso modo de vida.  Falar sobre isso atualmente parece uma grande tolice, principalmente quando se descobriu, após 1989, o quão inacreditavelmente pobres e patéticos eram todos os países do bloco soviético.  Porém, naquela época, tudo era amedrontador.  Não poderíamos abrir mão de nossas armas nucleares porque isso colocaria em risco nosso modo de vida.
Aprofundando meus estudos de história, comecei a descobrir coisas interessantes.  Ocorre que a Ameaça Vermelha era algo recorrente na história dos EUA.  As pessoas tinham tanto pavor dos comunistas na década de 1920 quanto na década de 1980.  Neste ínterim, no entanto, houve aquele estranho período em que os líderes americanos e soviéticos eram considerados aliados próximos na batalha contra os japoneses e os alemães.  Com efeito, os EUA fizeram de tudo para manter o regime soviético intacto, e, após a Segunda Guerra Mundial, os próprios EUA ajudaram a entregar o Leste Europeu ao jugo soviético.  Após isso, os soviéticos repentinamente se tornaram novamente o inimigo.  Foi para chamar a atenção para esse absurdo que George Orwell escreveu 1984. (O título faz um trocadilho com 1948. O livro foi publicado em 1949).
Estes fatos começaram a complicar o cenário.  Não é necessário relatar todo o revisionismo histórico aqui; basta dizer que as guerras em que os EUA se meteram no século XX se tornaram bem menos claras e muitomais confusas para mim do que aparentavam ser para a mídia ideologicamente polarizada.  A Guerra Fria não era uma história de anjos e demônios, não obstante os impulsos nacionalistas para se torcer por seus respectivos governos.  A Guerra Fria foi uma batalha entre estados, ambos os quais estavam perfeitamente dispostos a mentir para seus cidadãos, a explorar sua população e a preferir o conflito à paz.  Era também impossível não perceber que, quanto mais os EUA elevavam o tom belicista contra o comunismo, mais o próprio governo americano se tornava uma ameaça às liberdades dos cidadãos.  A guerra, como descobri, nunca foi uma aliada da liberdade.
Enquanto isso, comecei a perceber que, se os EUA realmente fossem invadidos por um inimigo estrangeiro, os governos federal, estaduais e municipais poderiam até ajudar, mas a maior probabilidade é que atrapalhassem impondo leis marciais, estatizando a indústria e confiscando nossas armas — como todos os governos tendem a fazer em qualquer emergência.  Na prática, na iminência de uma invasão, os cidadãos e os mercados é que serão decisivos para combater e derrotar os invasores utilizando meios privados: nossas próprias armas, nosso aparato de segurança, nossas redes de amizade, e nossos esforços individuais e comunitários.  Quanto mais eu pensava sobre isso, mais ridícula se tornava a ideia de que deveríamos depender do governo para toda a nossa proteção.  Tomando-se por base a experiência, governos podem agravar ainda mais os malefícios, simplesmente porque eles tendem a usar situações de emergência em proveito próprio — e em benefício daqueles que lhes garantem poder (os grupos de interesse e os lobistas).  O que é ainda pior: pessoas com poder tendem a estimular ou até mesmo a criar emergências quando têm o poder para tal.
Esta foi a evolução do meu progresso intelectual durante um período de aproximadamente cinco anos.  Finalmente, em um belo dia, parei para refletir melhor e me fiz a seguinte pergunta: existe alguma coisa que o governo faz, que tem de ser feita e que não pode ser efetuada de maneira mais eficiente e mais completa pela livre e voluntária associação entre indivíduos?
Fiquei revirando esta pergunta em minha mente.  Não conseguia pensar em outra resposta senão a de que não há absolutamente nada de essencial que o governo faça que não possa ser mais bem efetuado pela livre iniciativa e pela livre associação entre as pessoas.  Confesso que foi um pensamento amedrontador.  Será que eu estava me tornando um anarquista?  Será que esse pensamento iria mudar minha vida?  Se eu seguisse nessa direção, estaria eu fazendo algo terrivelmente irresponsável?  Encontrei consolo na possibilidade de que talvez eu não houvesse raciocinado corretamente; de que talvez houvesse algo de errado na maneira em que eu havia formulado a pergunta.  Tentei confortar-me na hipótese de que eu havia desconsiderado alguma pequena característica positiva do governo, característica essa que eu poderia defender de modo a não ter de me considerar um maluco.
Foi no saguão de um hotel em que Murray Rothbard estava hospedado que eu finalmente fiz a ele esta pergunta.  Formulei de maneira bem direta.  Se eu respondesse 'não' àquela pergunta acima, seria eu um anarquista?  Murray disse que sim.  Assustado, tentei esclarecer melhor: se eu cheguei à conclusão de que o estado não contribui com absolutamente nada de valor para a ordem social, e de que ele não pode trazer nenhum aprimoramento para aquilo que criamos com nosso próprio esforço, seria eu um anarquista?  Ele novamente disse que sim.  E eu respondi: bom, então acho que sou um.  E ele então soltou uma gargalhada efusiva, apertou vigorosamente minha mão, e me congratulou de forma exuberante, tudo naquele seu bem conhecido estilo jubiloso.  Uau.  O feito havia sido consumado, pensei.
E, ainda assim, eu estava enganado.  O feito intelectual havia sido consumado, mas ainda era muito fácil manter esta ideia como uma abstração, como algo que não afetava em nada meu trabalho diário ou minha vida.  Uma coisa é você enxergar a luz lá longe; outra bem diferente é ver essa luz ao seu redor constantemente.  Este passo me tomou vários outros anos de meditação acerca de questões específicas como direitos humanos, serviços de mercado, a maneira como a liberdade funciona, a maneira como o estado se portou ao longo da história, e a maneira como ele funciona hoje.  Os últimos estágios desse processo de pensamento levaram vários anos para serem processados.
O que eu fui descobrindo de maneira gradual em minha rotina diária é que o anarquismo está inteiramente ao nosso redor.  O estado não nos acorda de manhã, não arruma nossa cama, não tece nossos lençóis, não constrói nossas casas, não faz nossos carros funcionarem, não prepara nossa comida, não nos faz trabalhar com mais afinco e dedicação, não produz os livros que lemos, não gerencia nossas igrejas, não nos dá roupas, não escolhe nossas amizades e nossos amores, não toca a música de que gostamos, não produz os filmes a que assistimos, não cuida de nossos filhos, não cuida de nossos pais, não escolhe onde passamos férias, não dita o assunto de nossas conversas, não torna nossos feriados mais bonitos e alegres, não cria nada de positivo para nós.
Tudo isso são coisas que fazemos por conta própria.  Nós moldamos o nosso próprio mundo.  Por meio da prática da vontade humana, todos nós trabalhamos para fazer com que o mundo à nossa volta seja ordeiro.  Isso é o que toda a população mundial faz.  Todos nós trabalhamos motivados pelo nosso interesse próprio com o intuito de encontrar maneiras de ter uma vida melhor.  Mais ainda: todos nós nos esforçamos para trabalhar com terceiros em um arranjo que seja mutuamente benéfico, de modo que o aprimoramento de nossa vida não ocorra à custa dos direitos e das liberdades de terceiros.  A liberdade está onde são geradas as coisas bonitas de nossas vidas.  E isso é válido em todos os cantos do mundo.  Sempre foi.  Uma bela anarquia é a principal fonte da própria civilização.
Qual o papel do estado?  Ele interfere.  Ele confisca nossa propriedade e reduz nossa riqueza individual.  Ele bloqueia oportunidades por meio de suas regulamentações e subsequentes criações de cartéis.  Na verdade, ele faz ainda pior: ele busca desculpas para iniciar guerras, ele se intromete em nossas famílias, ele pune o comportamento pacífico que não prejudica ninguém — em suma, ele obstrui o progresso de variadas formas.  O estado é o grande forasteiro.  Ele é exógeno à própria sociedade.  A maior parte do mundo ainda funciona, e a civilização ainda prospera, porque as pessoas se esforçam para ignorar o estado o máximo possível.  E se ele desaparecesse?  Eu realmente não consigo ver nenhuma consequência negativa neste fenômeno.  Mas vejo várias positivas.
E ainda assim há aqueles que alertam para o iminente apocalipse caso o estado desapareça.  A maioria das pessoas que acreditam em um governo limitado ("minarquistas") nutre essa ideia.  Mesmo grandes pensadores como Ludwig von Mises e Henry Hazlitt acreditavam nisso.  Todos eles aceitavam alguma versão do pesadelo imaginado por Thomas Hobbes: na ausência do estado, a vida seria sórdida, solitária, bestial e curta.  Mas o fato é que ele escreveu isso durante uma época de turbulência política, uma época em que tribos religiosas guerreavam para controlar o estado.  A vida sem o estado teria sido exatamente daquela maneira — mas exatamente por causa da presença do estado que todos queriam controlar, e não por sua ausência.
Não irei aqui analisar todas as distorções já feitas em relação a esta ideia, e nem irei utilizar este espaço para tentar refutar todas as justificativas já apresentadas em defesa do estado.  Irei apenas mencionar uma intuição bastante comum que muitas pessoas têm.  As pessoas dizem que não faz muito sentido eliminar o estado porque outras pessoas irão simplesmente criar outro em seu lugar.  Não duvido que esta afirmação seja verdadeira.  As pessoas de fato têm a ilusão de que o estado contribui com algo de positivoe importante para a sociedade.  Elas querem líderes que governem desde lá de cima, ainda que elas próprias estejam aqui em baixo.
Pense em Samuel, do Velho Testamento.  As pessoas vinham até ele implorando por um rei.  Ele advertiu que um rei confiscaria suas propriedades, colocaria seus filhos em servidão, iniciaria guerras terríveis e, no final, escravizaria a todos.  Não importava.  Elas queriam um rei de qualquer maneira.
Este é exatamente o comportamento das pessoas de hoje.  Nada mudou.  Elas continuam implorando por sua própria escravidão.  Pior ainda: temem viver em liberdade.  É por isso que o estado continua se reinventando.  Aqueles que ao menos entendem que o estado deve ser limitado caso tenha de existir merecem alguns créditos.  Mas o problema é que tais limites nunca de fato funcionaram.  É por isso que é melhor simplesmente deixar a sociedade prosperar sem o jugo de um estado.  O grande projeto da liberdade é fazer as pessoas entenderem que elas não devem abraçar a ilusão de que um estado — qualquer estado — pode ser um aliado e um benfeitor da liberdade humana.  Foi isso que a revolução liberal que ocorreu no final da Idade Média até o Iluminismo pregou.  É imprescindível entender a real beleza da liberdade para se poder alcançá-la.
Desde o início da era digital, estamos tendo o privilégio de observar em primeira mão o atordoante poder criativo da volição humana.  A cada bilionésimo de segundo, indivíduos ao redor de todo o mundo estão trabalhando para criar novos tipos de associações, instituições, capital e meios de prosperidade.  Estamos vendo se desenrolar perante nossos olhos coisas que até a década passada eram tidas como impossíveis.  E tudo está apenas começando.  Estamos ainda nos primórdios de coisas como impressora 3-D, moedas alternativas, e civilizações com bases digitais capazes de nos ofertar mais filmes, mais livros, mais arte e mais sabedoria do que qualquer ser humano de épocas passadas seria capaz de obter durante várias vidas.  Este mundo recém-surgido está transformando nossa existência.  Tome nota: nenhum estado foi responsável por isso, nenhum estado criou isso, nenhum estado aprovou isso e nenhum estado está administrando tudo isso.
Por fim, deixe-me admitir aqui que meu anarquismo é provavelmente de ordem mais prática do que ideológica — o que é exatamente o oposto da postura dos mais bem conhecidos pensadores anarquistas da história.  Vejo a regularidade e a harmonia da ação e da volição humana ao meu redor o tempo todo.  Acho tudo isso totalmente inspirador.  É algo que liberta a minha mente e me permite entender o que é realmente importante na vida.  Essa capacidade de observação me permite ver a realidade como ela é.  Não é uma ideologia inalcançável o que me deixa ansioso por um mundo sem estado, mas sim o fato de eu saber do que é capaz o ser humano quando tem liberdade para melhorar este mundo por meio de seus próprios esforços.  Somente seres humanos podem superar a irremediável realidade da escassez que o mundo impôs sobre nós.  Até onde sei, o estado é, na melhor das hipóteses, o grande distúrbio que retarda esse poderoso projeto de construção da civilização.
Por que me tornei um anarcocapitalista
Antes de qualquer coisa, devo esclarecer que imagino o anarcocapitalismo como resultado evolucionário da civilização humana, como uma ordem espontânea, e não como um modelo imposto de cima para baixo, nem instalado via revolução ou a partir de quaisquer arranjos técnicos ou filosóficos preconcebidos.  
Acredito que esse modelo, se um dia vingar, só poderá florescer a partir de sociedades moral, econômica e civicamente muito avançadas.
Não tenho qualquer pretensão de ver o anarcocapitalismo em funcionamento onde quer que seja.  Se um dia vier a ocorrer, será apenas muitas gerações à frente.  Portanto, minha opção "ancap" é muito mais uma questão moral do que pragmática. Simplesmente, não consigo admitir que o ser humano será, para todo sempre, refém do "mais frio e cruel dos monstros".
Qualquer pessoa normal concordaria que um indivíduo que atenta contra a vida, a liberdade ou a propriedade de outro comete um mal, um ato injusto.  Por outro lado, a maioria de nós também aceita a existência de certas circunstâncias atenuantes que poderiam mitigar uma ação injusta.  Mesmo nesse último caso, porém, a violência seria ainda lamentável e, portanto, algo a ser evitado.  Em outras palavras, embora uma ação criminosa jamais se torne realmente boa, ela pode tornar-se defensável e até desculpável.
Em quaisquer casos, entretanto, o que justifica uma ação é o motivo, a circunstância, e não a entidade, a organização ou a quantidade de pessoas que a praticam.
Se eu afirmasse que um atentado à vida, à liberdade ou à propriedade torna-se menos nocivo na proporção em que aumenta o número de agentes que o cometem, você pensaria que sou estúpido, louco ou moralmente deficiente.  Todavia, muitas pessoas entendem que a violência contra direitos individuais elementares, não importa quão absurda e vil, pode tornar-se boa e justa, desde que executada por agentes governamentais empossados através de eleições democráticas.
Como bem resumiu Maggie McNeill, chega a ser patética a ginástica mental de certas pessoas (muitos liberais aí incluídos) na tentativa de justificar o injustificável.  Elas entendem que a democracia, como num passe de mágica, absolve quase todos os crimes e injustiças cometidos coletivamente, do mesmo modo que nossos antepassados atribuíam um certo direito divino a seus monarcas e imperadores.  Alguns chegam a fazer pronunciamentos apologéticos sobre o poder da lei votada democraticamente, como se esta houvesse sido ditada por uma divindade celestial e esculpida em pedra.
Ora, um governo é apenas um grupo de indivíduos, selecionados por meios arbitrários, de acordo com regras arbitrárias acordadas por grupos poderosos o suficiente para impor sua própria opinião sobre o resto da população.  Pior: nenhum governo pode impor suas leis e decretos senão através da ameaça e da violência, o que o torna inexoravelmente um ente tirânico, cuja intensidade do mal perpetrado dependerá da índole daqueles que o controlam.  A tirania é, portanto, inerente a qualquer governo, variando apenas em gênero e grau.
Isso não significa que a humanidade possa ficar inteiramente sem governo, pelo menos nesta fase de nossa evolução.  Eu seria ingênuo se acreditasse que uma sociedade completamente anárquica poderia sobreviver atualmente sem degenerar no caos, na lei do mais forte.  Por outro lado, não há nada que justifique a crença de que esta realidade será permanente.  Pensemos, por exemplo, nas práticas médicas do passado.  Quantas intervenções absolutamente insanas para os padrões atuais — como lobotomia, sangrias, choques elétricos, ingestão de urina, entre outras — não foram um dia consideradas males necessários e praticadas sob efusivos aplausos e reconhecimentos?
Como nos lembra Bryan Caplan, há mil anos, se alguém sugerisse que o sistema democrático seria hoje o arranjo comum na maioria das nações, certamente seria tachado de louco.  Segundo ele, a "loucura", nesse caso, tem a ver com expectativas.  Durante a Idade Média, todos estavam acostumados ao despotismo.  Ninguém esperava que um governante derrotado entregasse voluntariamente o poder.  Com efeito, a recusa de entregar o poder não parecia loucura aos olhos de ninguém. 
Nas sociedades modernas, em contraste, todos estão acostumados à democracia.  Todos esperam de um derrotado que entregue voluntariamente o poder.  A recusa, neste caso, é que parecerá loucura, a qual resultaria provavelmente não no fim da democracia, mas da carreira desse governante.
Imagine agora alguém que, há dois milênios, se insurgisse contra a escravidão ou previsse que, dois mil anos depois, a escravidão não apenas estaria extinta da face da Terra, como seria considerada crime hediondo em todos os lugares.  Nem Jesus Cristo ousou tanto, pois certamente seria visto como louco.  O que dizer então de alguém que, há apenas duzentos anos, falasse de coisascomo viagens espaciais, aviões, automóveis, televisão, computador, internet e edifícios com duzentos metros de altura?  Não seriam tais coisas, naquela época, mais inverossímeis (utópicas?) do que imaginarmos, nos dias de hoje, uma eventual futura sociedade sem Estado, vivendo de forma ordeira e próspera?  Não seria muita arrogância de nossa parte pretender saber como se organizarão as civilizações futuras?
Não importa.  Como disse acima, minha opção pelo anarcocapitalismo é muito mais uma opção moral do que pragmática.  Mas deixo que o grande Bob Higgs a explique:
Muitas discussões sobre o anarquismo poderiam ser evitadas se esses dois aspectos distintos da ideologia estivessem sempre em mente — sua possibilidade prática e seu ideal moral.
Sinto-me sem qualquer obrigação de argumentar de forma convincente de que forma esta ordem social pode ser estabelecida na prática. Não sei se é possível ou não, assim como desconheço muitos outros desenvolvimentos que podem ou não vir a tornar-se realidade no futuro.
No entanto, vou continuar a defender o anarquismo libertário como um ideal moral que, acredito, todas as pessoas decentes deveriam defender. Se nós anarcocapitalistas tivermos sucesso, o resultado será esplêndido, de fato, mas se falharmos, acho que teremos feito a coisa certa. Afinal, que mal podemos fazer por abster-nos de apoiar certos crimes? Qual é o mal em denunciar quem os comete ou quem contribui para justificar os crimes inerentes ao funcionamento do estado?
Em outra passagem, ele é ainda mais enfático:
Embora eu não peça desculpas por essa escolha ideológica, tampouco compartilho da expectativa aparente de alguns companheiros anarquistas libertários, segundo os quais a revolução é iminente, ou ocorrerá muito em breve (…)
Se eu entendo o mundo desta forma, algumas pessoas perguntam, qual é o meu objetivo ao abraçar o anarquismo libertário? Bem, obviamente não estou nisso a fim de ficar do lado vencedor. Se esse fosse meu objetivo, eu já teria encontrado uma maneira de tornar-me útil participando de lobbies no Congresso. Não, eu pus-me onde estou agora um pouco como Martinho Lutero fez quando anunciou: "Eis-me aqui. Não consigo estar em nenhum outro lugar".
No meu caso, esta declaração significa que eu estou simplesmente fazendo o que me parece a coisa decente a fazer; que tomar qualquer outra posição ideológica iria envolver-me em males dos quais eu não quero participar.  Embora eu sinceramente acredite que um mundo sem  estado seria melhor do que o mundo atual de inúmeras maneiras, tais como melhor saúde, maior riqueza e maior bem-estar material, eu não sou um anarquista libertário por razões consequencialistas, mas sim, e principalmente, porque acredito que é errado para qualquer um — inclusive aqueles designados governantes e seus funcionários —  fazer o que é considerado errado para mim ou para qualquer outro indivíduo na esfera privada.
Invalidando o estado - quatro argumentos contra o governo
Sempre que a questão da dissolução do estado é levantada, há duas objeções que inevitavelmente surgem. 
A primeira objeção é aquela que diz que uma sociedade livre e sem estado só seria possível se absolutamente todas as pessoas fossem perfeitamente boas e racionais.  Em outras palavras, isso significa que os cidadãos de hoje devem ser submetidos a um estado centralizador e detentor do monopólio da violência porque existem pessoas ruins no mundo.
O primeiro e mais óbvio problema com este argumento é que, se existem pessoas ruins na sociedade, então inevitavelmente também haverá pessoas ruins dentro do estado — e, consequentemente, tais pessoas serão ainda mais perigosas.
Em um arranjo sem estado, os cidadãos são capazes de se proteger de indivíduos malvados; porém, se estes indivíduos malvados agora estiverem no controle de um aparato estatal agressivo, detentor do monopólio da violência, armado até os dentes e com um grande poderio policial e militar, tais cidadãos não terão a mais mínima chance.
Logo, o argumento de que precisamos do estado porque existem pessoas malvadas é inerentemente falacioso.  É justamente por existirem pessoas malvadas que o estado tem necessariamente de ser desmantelado, uma vez que tais pessoas malvadas serão tentadas a utilizar o poder do estado para alcançar seus próprios objetivos — e, ao contrário dos ladrões e assaltantes comuns, pessoas malvadas no comando de um aparato estatal usufruirão do poderio policial e militar para impor seus caprichos sobre uma população indefesa e compulsoriamente desarmada.
Por uma questão de lógica, há quatro possibilidades quanto à combinação de pessoas boas e más no mundo:
1. Todos os indivíduos são morais
2. Todos os indivíduos são imorais
3. A maioria dos indivíduos é imoral, e uma minoria é moral
4. A maioria dos indivíduos é moral, e uma minoria é imoral
(Um equilíbrio perfeito entre bem e mal é estatisticamente impossível)
Analisemos cada um destes casos.
1. Quando todos os indivíduos são morais
Neste primeiro caso, o estado é obviamente desnecessário, dado que não há como existir o mal.
2. Quando todos os indivíduos são imorais
Neste segundo caso, não se pode permitir que o estado exista, e por um motivo muito simples.  Como geralmente se argumenta, o estado tem de existir porque há no mundo pessoas más que querem fazer maldades e que só podem ser contidas por meio de uma represália do estado (polícia, prisões etc.).  Um corolário desse argumento é que, quanto menor for o temor de represálias, mais maldades essas pessoas estarão propensas a fazer. 
No entanto, o estado em si não está sujeito a nenhum controle.  O estado é a própria lei.  A única restrição teórica sobre o aparato estatal é decisão voluntária de seus próprios membros.  Mesmo nas democracias ocidentais mais avançadas, quantos políticos e policiais realmente vão para a cadeia?  Sendo assim, se pessoas más existem e estão sempre propensas a cometer maldades, e se elas sabem que só podem ser contidas pela força, então esta sociedade jamais pode permitir a existência de um estado, pois estas pessoas más irão imediatamente tomar o controle deste aparato estatal com o intuito de cometer maldades e ao mesmo tempo evitar represálias. 
Portanto, em uma sociedade totalmente formada por indivíduos maus e imorais, a única esperança para a estabilidade seria um regresso ao "estado natural", no qual a totalidade da população estaria armada.  Neste arranjo, o constante temor de retaliação iria ao menos arrefecer os impulsos maléficos dos mais diversos grupos.
3. Quando a maioria dos indivíduos é imoral, e uma minoria é moral
O terceiro caso é aquele em que as pessoas são majoritariamente más, e apenas algumas são boas.
Se o arranjo é este, então também não se pode permitir a existência do estado, uma vez que, por uma questão de distribuição estatística, a maioria daqueles que estiverem no controle do aparato estatal será composta por pessoas más, as quais terão poderes sobre a minoria de pessoas boas.
Mais ainda: não se pode permitir qualquer resquício de democracia sob este arranjo, dado que a minoria de pessoas boas será inevitavelmente subjugada pelas vontades democráticas da maioria de malvados.  Defender democracia sob este arranjo é uma completa irracionalidade.
As pessoas más, que querem infligir maldades sem qualquer temor de represálias, irão inevitavelmente assumir o controle do aparato estatal e utilizar seus poderes para cometer suas maldades sem qualquer temor de represálias.  As pessoas boas não agem moralmente porque temem represálias, mas sim porque apreciam a bondade, a serenidade e a paz de espírito — e por isso, e ao contrário das pessoas más, elas não têm nada a ganhar caso assumam o controle do estado.
Portanto, neste arranjo podemos ter a certeza de que o estado será controlado por uma maioria formada por pessoas más e irá subjugar todo o resto da população (tanto as pessoas boas quanto as pessoas más).  Os maiores perdedores serão, obviamente, as pessoas morais.
4. Quando a maioria dos indivíduos é moral, e uma minoria é imoral
O quarto caso é aqueleem que as pessoas são majoritariamente boas, e apenas algumas poucas são más.
Esta possibilidade está sujeita aos mesmos problemas delineados acima.  As pessoas más estarão sempre querendo assumir o controle do estado com o intuito de se protegerem de retaliações.
Mas esta opção, no entanto, altera a aparência da democracia: dado que a maioria das pessoas é boa, as pessoas más que querem chegar ao poder terão de mentir para as pessoas boas, fazendo inúmeras promessas aparentemente sensatas, bondosas e caritativas para que assim consigam chegar ao poder. 
E então, uma vez no poder (algo que sempre irá ocorrer, pois pessoas más são naturalmente astutas na arte do engano e da dissimulação), essas pessoas más irão imediatamente revelar sua verdadeira face e sair em busca de seus objetivos perversos, impingindo seus desejos por meio do aparato regulatório, jurídico, policial e militar do estado.  Este, é claro, é o arranjo vigente nas democracias atuais.
Assim, o estado permanece sendo o maior prêmio a ser conquistado pelas pessoas más.  Uma vez conquistado, essas pessoas más irão rapidamente assumir o controle total de seu assombroso poder — consequentemente, a existência do estado também não pode ser permitida neste cenário.
Consequências
Não há, portanto, nenhuma situação na qual a existência de um estado pode ser defendida por meio da lógica. 
O único arranjo em que a existência do estado pode ser justificada seria aquele em que a maioria dos indivíduos é má, mas o controle do estado está — e para sempre estará — nas mãos de uma minoria de indivíduos bons.
Esta situação, embora seja interessante na teoria, não se sustenta logicamente pelos seguintes motivos:
a) A maioria formada por indivíduos maus iria rapidamente desalojar a minoria de bons por meio do voto; ou então iria sobrepujá-la por meio de um golpe;
b) Não há nenhuma maneira de garantir que somente as pessoas boas estarão para sempre no controle do estado; e
c) Ao longo de toda a brutal história da existência do estado, não há absolutamente nenhum caso em que tal arranjo tenha prevalecido.
O erro lógico em que as pessoas incorrem ao defender a existência do estado é que, por algum motivo insondável, elas genuinamente supõem que o estado será necessariamente controlado por pessoas ínclitas, probas, honestas e bem-intencionadas, e que as pessoas más estarão para sempre fora do aparato estatal e permanentemente pacificadas.  Os juízos morais coletivos que elas aplicam aos cidadãos comuns não são igualmente aplicados ao grupo que as governa. 
Por uma questão puramente estatística, se 50% das pessoas são más, então pelo menos 50% das pessoas que estarão no comando também serão más (aliás, muito provavelmente esta porcentagem será maior, uma vez que pessoas más sempre estão propensas a buscar poder).  Logo, a existência da maldade jamais pode justificar a existência do estado.  Se não há maldade, o estado é desnecessário.  Se a maldade existe, o estado passa a ser perigoso demais para que se permita sua existência.
A segunda objeção
Como mencionado no primeiro parágrafo deste artigo, as pessoas geralmente cometem dois erros quando confrontadas com a ideia da dissolução do estado. 
O primeiro erro é acreditar que o estado é necessário porque existem pessoas más.  Os problemas lógicos desta crença foram explicitados acima. 
O segundo erro é acreditar que, na ausência do estado, surgirão instituições muito piores, as quais crescerão e inevitavelmente assumirão o lugar do estado.  Consequentemente, agências de segurança privada, seguradoras, e organizações de arbitração de litígios passam a ser consideradas como cânceres em potencial, que irão crescer, se avolumar e assumir o controle do organismo político.
Este raciocínio tem as mesmas raízes do primeiro erro analisado.  Ora, se todas as instituições sociais estão continuamente tentando aumentar seu poder e impor suas vontades sobre terceiros, então, por essa mesma razão, não se pode permitir a existência de um estado centralizado.
Afinal, se é inevitável que um grupo sempre irá tentar adquirir poder sobre todos os outros grupos e indivíduos, então esta sede de poder não irá acabar se um deles chegar ao poder.  Ao contrário: uma vez no poder, sua ânsia de dominação irá se espalhar por toda a sociedade, até que a escravidão seja a norma.  Em outras palavras, a única esperança para a liberdade individual é que haja uma total proliferação de grupos armados, cada um com o poder de infligir males ao outro, de modo que todos terão medo uns dos outros, o que consequentemente os tornará relativamente pacíficos.
É muito difícil entender a lógica e a inteligência do argumento de que, para nos protegermos de um grupo que pode nos sobrepujar, temos de apoiar um grupo que já nos sobrepujou.  Tal argumento é similar àquele outro argumento estatista sobre monopólios privados: os cidadãos devem criar um monopólio estatal porque receiam que surja algum monopólio privado.  Não é necessária uma inteligência aguçada para perceber a tolice deste raciocínio.
Conclusão
Por fim, qual é a evidência que sustenta o raciocínio de que poderes descentralizados e concorrentes promovem a paz?  Em outras palavras, existe algum fato que podemos usar para sustentar a ideia de que um equilíbrio de poder é a única chance que o indivíduo tem para a liberdade?
O crime organizado não é um bom exemplo, pois quadrilhas regularmente corrompem, manipulam e utilizam o poder da polícia estatal para impingir suas próprias regras.  Logo, máfias e outras quadrilhas organizadas não podem ser consideradas um arranjo que opera em um estado natural, pois elas próprias fazem uso do aparato estatal que detém o monopólio da violência. 
Um exemplo mais útil seria o fato de que nenhum líder político jamais declarou guerra a outro líder político que possuísse armas nucleares.  No passado, quando havia líderes que se sentiam imunes a retaliações, eles estavam mais do que dispostos a matar sua própria população ao enviá-las a guerras.  Atualmente, dado que eles próprios estão sujeitos a uma aniquilação nuclear, tais líderes só têm coragem de atacar países que não têm como contra-atacar.
Eis aí uma lição instrutiva sobre por que líderes políticos se esforçam para desarmar sua população e torná-la dependente do governo.  E eis aí um bom exemplo de como o temor de represálias — o qual é inerente a um sistema equilibrado de poderes descentralizados e concorrenciais — é único método comprovado de assegurar e manter a liberdade individual. 
Temer fantasmas imaginários e se entregar à falsa sensação de proteção fornecida pela opressão estatal irá apenas garantir a destruição de todas aquelas liberdades que fazem com que a vida valha a pena ser vivida.
Sociedades sem estado - não há respostas fora do indivíduo
Coerção é um mal.  Talvez seja necessário para a vida em sociedade.  Nesse caso, será um mal necessário.  Seja como for, podemos concordar que, tudo o mais constante, quanto menos coerção, melhor.  Em um mundo ideal, perfeito, utópico, não haveria coerção nenhuma.  Como o estado é um ente necessariamente coercitivo, segue-se que num mundo perfeito não haveria estado.
Ainda não chegamos ao mundo ideal; nunca chegaremos.  Sempre haverá alguma coerção. Mas nem por isso o ideal morre.  Na maioria das áreas da vida, quando o estado impõe regras que vão além do direito individual, ele apenas atrapalha as coisas.  A formulação de leis e o aparato bélico para garantir que elas sejam seguidas (chamo isso de "lei e ordem") são serviços como tantos outros, que podem ser ofertados de maneira boa ou ruim.  Que tal quebrar esse monopólio?
Reza a cartilha liberal clássica que as características desse setor fazem com que o uso inicial da força seja necessário.  Pode ser; não tenho opinião formada.  Você também não sabe.  No mínimo, temos que experimentar.  Não precisa ser o mundo inteiro — ou o Brasil inteiro — de uma vez.  Bastaria um território pequeno graciosamente cedido pelo estado (coisa que ele nunca fará, não importa quantas pessoas tenha que matar para impedi-lo).

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