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UM BREVE PANORAMA SOBRE FREUD, NIETZSCHE E SCHOPENHAUER FREUD (1856-1939) Sigmund Freud, considerado um dos maiores especialistas no estudo da mente humana e pai da psicanálise, era um médico austríaco que iniciou sua atividade como neurologista. Descobriu fatos importantes sobre o inconsciente e sobre o papel das necessidades instintivas, dessas descobertas surgiu a psicanálise. Entusiasta da hipnose, escreveu livros importantes que são considerados legados para a psicanálise, como Totem e Tabu (1913), O Ego e o Id (1923) e O Mal-Estar na Civilização (1929). Freud desenvolveu diferentes conceitos teóricos para sustentar suas pesquisas. A partir da leitura do artigo Considerações teóricas sobre a psicanálise freudiana: da metapsicologia aos textos sociais (Próchno & Lemos, 2006), foi possível fazer uma sucinta definição de alguns dos principais conceitos da psicanálise: Inconsciente: Para Freud a maior parte da vida psíquica acontece sem que tenhamos acesso a ela. É no inconsciente que se encontra principalmente ideias reprimidas que aparecem disfarçadas nos sonhos e nos sintomas neuróticos. Ego: Seria a parte organizada do sistema psíquico que entra em contato direto com a realidade e tem a capacidade de atuar sobre ela numa tentativa de adaptação. Neste sentido ego é o mediador dos impulsos instintivos do id e das exigências do superego. Id: Freud define o id como fonte de energia psíquica, onde é formado por pulsões e desejos inconscientes. Sua interação com as outras instâncias é, em geral, conflituosa, porque o ego, sob os imperativos do superego e as exigências da realidade, tem que avaliar e controlar os impulsos do id, permitindo sua satisfação, adiando-a ou inibindo-a totalmente. Superego: É formado a partir das identificações com os pais, dos quais assimila ordens e proibições. Freud define como uma espécie de autoconsciência moral, em que o superego assume o papel de juiz e vigilante. É o controlador, por excelência, dos impulsos do id e age como colaborador nas funções do ego. Pulsão: Freud define a pulsão como conceito situado na fronteira entre o psíquico e o somático, onde a pulsão é a representante psíquica dos estímulos que se originam no organismo e alcançam a mente. Difere do instinto por não apresentar finalidade biologicamente pré-determinada, e é insaciável, pois tem relação com o desejo e não com uma necessidade. NIETZSCHE (1844-1900) Friedrich Nietzsche, considerado um grande pensador do século XIX, foi um filósofo, escritor e crítico alemão. Influenciou as gerações futuras com temas sobre moral, religião, filosofia e ciência. Foi como professor na Universidade da Basileia, em 1869, onde conheceu a filosofia de Schopenhauer. Entre suas obras mais conhecidas estão Assim falava Zaratrusta (1883), Humano, demasiado humano, um livro para espíritos livres (1886) e Além do bem e do mal (1886). Na obra Assim falava Zaratrusta (1998) Nietzsche apresenta ideias chaves de seu pensamento, são elas: a ideia de Super-Homem, de Transmutação de Valores, de Espírito Senhoril e do Eterno Retorno. Esses conceitos derrotariam a moral cristã e o ascetismo servil. A filosofia de Nietzsche estava centrada na dicotomia razão/emoção, representadas nas figuras de Apolo e Dionísio, respectivamente. Para ele o homem foi tomado pela razão, deixando de lado a emoção e, concomitante a isso, defendia que deveria haver um equilíbrio entre os elementos supracitados. Ele acreditava que o pensamento deveria ser livre do controle moral ou cultural. Foi um escritor notável, pela força de suas ideias. Escrevia contra tudo que era estabelecido em seu tempo. Se propôs a mostrar que haviam interesses e motivações ocultas, e não valores absolutos, em conceitos como verdade, bem e mal. SCHOPENHAUER (1788-1860) Arthur Schopenhauer, filósofo alemão conhecido por sua filosofia do pessimismo, além de filósofo da representação, é conhecido como filósofo da vontade. Sua principal obra, considerada uma obra-prima, foi publicada em 1819, O mundo como vontade e representação. Nessa obra, o ponto de partida do pensamento de Schopenhauer é que o mundo é uma representação individual, onde tudo que existe para o indivíduo é o que ele percebe a partir de formas a priori da consciência. O real enquanto coisa em si, é impenetrável a nosso conhecimento, que atinge apenas as representações. Essas representações se interpõem entre nós e o real, como um véu que o encobre. Este seria o seu conceito de representação. No que tange a vontade, essa seria a principal essência do mundo, sendo expressada nos animais através do instinto. Diferente dos outros animais, o homem possui consciência de sua vontade, que seria o fundamento do desejo de viver, em outras palavras, a vontade é o motor da vida humana. Schopenhauer foi fundamental para o desenvolvimento das reflexões sobre a psicologia. Defendendo a ideia de que o homem não é um ser unificado e racional, que age conforme os interesses, mas um ser fragmentado e passional, que age influenciado por forças que fogem de seu controle. Sua obra influenciou Freud e Nietzsche. O CONCEITO DE VONTADE PARA SCHOPENHAUER E NIETZSCHE Com base nas anotações feitas nas aulas ministradas pela professora Regina Schöpke, na disciplina Filosofia e Psicologia, o conceito de vontade ocupa o centro do pensamento de Schopenhauer. A vontade tem um caráter absoluto e determina tudo o que existe. Ele a considera sob dois aspectos: o fenômeno e a coisa em si, ambos categorias de Kant. O fenômeno é a forma pela qual a nossa sensibilidade apreende o mundo. Na medida em que o fenômeno é um construto que reúne sensibilidade e cognição, ele é representação. A coisa em si aparece no sistema de pensamento Kantiano, como aquilo que não pode ser representado, ou seja, a coisa em si não pode ser conhecida. Mas para Schopenhauer a coisa em si é a própria essência do mundo, isto é, ela é a vontade. Todo sistema schopenhauriano, principalmente sua estética, se baseia na coisa em si. A arte é constituída por representações da coisa em si do mundo, que é a vontade. A essas representações Schopenhauer chamou de ideias. Para ele a condição da vontade é o sofrimento, que seria uma das coisas que define o homem. Isso porque a cada desejo existe atrelado um estado de falta, de carência. Neste sentido, o homem vive em um circuito de desejo que Schopenhauer imagina como o pêndulo do desejo. O homem cria sempre um objeto para cada desejo, objeto este que estará sempre mudando e que sempre poderá ser substituído. Diferentemente do pessimismo schopenhauriano que descreve a existência submetida à doutrina da vontade, Nietzsche propõe uma filosofia trágica. Depois de descrever a dimensão monstruosa da vida da vontade, Schopenhauer recua diante do sofrimento e propõe duas saídas para a dor da existência: a primeira pela arte e a segunda pelo ascetismo, ou negação dos desejos. Nessa medida, Schopenhauer se torna o filósofo de pessimismo. Nietzsche, por sua vez, assumirá uma postura completamente diferente. Sua proposta é conceber uma filosofia que possa dizer sim ao absurdo, a falta de sentido, ao sofrimento da vida, ou seja, ele deseja positivizar a existência humana mediante uma atitude ativa e criadora do homem face aos homens do mundo. Para ele o homem não tem que fugir do sofrimento que chega a ele, é preciso sucumbir ao sofrimento. Para Nietzsche existe uma relação necessária entre tragédia e alegria. E ele acredita que a arte é a única maneira de transformar a dor em beleza. Sua filosofia trágica leva o homem a assumir a atitude oposta ao espectador de Schopenhauer: Nietzsche vê o homem como o artista, supremo criador e destruidor de valores. À vontade de viver de Schopenhauer, Nietzsche opõe o seu conceito de vontade de potência, como o qual ele vê possível a transfiguração estética do mundo, da vida. A imanência da vontade marca fortemente a filosofia de Schopenhauer e posteriormente a filosofia de Nietzsche. IDEIAS DA METAFÍSICADE SCHOPENHAUER QUE ENCONTRAMOS NAS OBRAS DE FREUD Embora Freud tenha considerado a filosofia um obstáculo para a ciência, é notório que sua base filosófica, pela qual demonstrou interesse antes mesmo de decidir cursar medicina, serviu de apoio para suas obras. É possível encontrar semelhanças entre os pensamentos de Schopenhauer e Freud em seus estudos sobre a psicanálise. No livro Freud e a filosofia (Birman, 2003), o autor trata das relações como inconsciente e desejo, de como a metafísica se faz presente em seus estudos, entre outros temas caros a Freud e à psicanálise, procurando delinear as ambiguidades do discurso freudiano face à filosofia e às interpelações que esta colocou para a psicanálise. Portanto, com base na leitura do livro e das anotações feitas nas aulas, abaixo estão algumas semelhanças percebidas entre o filósofo e o médico precursor da psicanálise supracitados. O primeiro é acerca do recalque para Freud, um dos primeiros conceitos postulados por ele. Trata-se de um acontecimento tão doloroso que o Ego apaga esta lembrança, tornando-a inconsciente, evitando que o sujeito tenha contato com ela. Para Schopenhauer a vontade não deixaria que certos conteúdos chegassem ao intelecto porque isso o prejudicaria. Dando sequência podemos falar da ideia do inconsciente de Freud. Para ele o inconsciente seria uma espécie de força maior que a vida consciente do homem, que funciona como um impulso cego que se manifesta apenas de forma indireta na realidade. No conceito de Schopenhauer de vontade esse impulso se manifesta através da representação, para Freud o inconsciente se manifesta através dos sonhos e dos atos falhos. Já o conceito de morte ganha destaque na obra de Freud com a publicação do livro Além do princípio do prazer (1920). Nele é postulado o conceito de pulsão de vida/pulsão de morte. Freud conclui que a pulsão de morte seria uma força que supera tudo, buscando trazer todas as coisas para a quietude e, neste sentido, a causa da morte do indivíduo seria sempre interna. A relação com Schopenhauer é quase explícita, porque para ele a vontade consome a si mesma porque ela é toda a realidade e isso levaria o sujeito à morte, onde a morte seria a meta final de todo ser vivo. O último conceito em comum seria o do pessimismo, no qual Schopenhauer afirma que a vida é um pêndulo que oscila entre o tédio e o sofrimento. Este ciclo se dá da seguinte forma: surge o desejo de algo, consegue-se o objeto de desejo, fica-se entediado e volta-se ao sofrimento por desejar outra coisa ainda não alcançada. Para acabar com esse ciclo, a saída seria a vida ascética, onde o indivíduo mataria o desejo, buscaria a quietude da vida dos monges, a contemplação do mundo. Freud parte do mesmo ponto, definindo que a psicoterapia livraria o homem de um grande tormento para voltar a conviver com o sofrimento cotidiano, onde o mundo é considerado sofrimento.
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