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Educação, Inclusão e Cidadania MÉRCIA APARECIDA DA CUNHA OLIVEIRA SUELENE REGINA DONOLA MENDONÇA EDUCAÇÃO, INCLUSÃO E CIDADANIA 1ª Edição Taubaté Universidade de Taubaté 2014 Copyright© 2013. Universidade de Taubaté. Todos os direitos dessa edição reservados à Universidade de Taubaté. Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio, sem a prévia autorização desta Universidade. Administração Superior Reitor Prof.Dr. José Rui Camargo Vice-reitor Prof.Dr. Marcos Roberto Furlan Pró-reitor de Administração Prof.Dr.Francisco José Grandinetti Pró-reitor de Economia e Finanças Prof.Dr.Luciano Ricardo Marcondes da Silva Pró-reitora Estudantil Profa.Dra.Nara Lúcia Perondi Fortes Pró-reitor de Extensão e Relações Comunitárias Prof.Dr. José Felício Goussain Murade Pró-reitora de Graduação Profa.Dra.Ana Júlia Urias dos Santos Araújo Pró-reitor de Pesquisa e Pós-graduação Prof.Dr.Edson Aparecida de Araújo Querido Oliveira Coordenação Geral EaD Profa.Dra.Patrícia Ortiz Monteiro Coordenação Acadêmica Profa.Ma.Rosana Giovanni Pires Clemente Coordenação Pedagógica Profa.Dra.Ana Maria dos Reis Taino Coordenação Tecnológica Profa. Ma. Susana Aparecida da Veiga Coordenação de Mídias Impressas e Digitais Profa.Ma.Isabel Rosângela dos Santos Ferreira Coord. de Área: Ciências da Nat. e Matemática Profa. Ma. Maria Cristina Prado Vasques Coord. de Área: Ciências Humanas Profa.Ma. Fabrina Moreira Silva Coord. de Área: Linguagens e Códigos Profa.Dra. Juliana Marcondes Bussolotti Coord. da Área: Pedagogia Coord. de Cursos de Tecnol. Área de Gestão e Negócios Coord. de Cursos de Tecnol. Área de Recursos Naturais Revisão ortográfica-textual Projeto Gráfico e Diagramação Autoras Unitau – Reitoria Educação a Distância (EaD) Profa. Dra. Ana Maria dos Reis Taino Profa. Ma. Márcia Regina de Oliveira Profa. Dra. Lídia Maria Ruv Carelli Barreto Prof. Me. João de Oliveira Ms.Benedito Fulvio Manfredini – Analista de Sistemas Mércia Aparecida da Cunha Oliveira Suelene Regina Donola Mendonça Rua Quatro de Março, 432 - Centro Taubaté – São Paulo CEP: 12.020-270 Central de Atendimento: 0800557255 Avenida Marechal Deodoro, 605 – Jardim Santa Clara Taubaté – São Paulo CEP: 12.080-000 Telefones: Coordenação Geral: (12) 3621-1530 Secretaria: (12) 3625-4280 Ficha catalográfica elaborada pelo SIBi Sistema Integrado de Bibliotecas / UNITAU O482e Oliveira, Mércia Aparecida da Cunha Educação, inclusão e cidadania / Mércia Aparecida da Cunha Oliveira; Suelene Regina Donola Mendonça. Taubaté: UNITAU, 2010. 76p. : il. ISBN 978-85-62326-48-6 Bibliografia 1. Educação especial. 2. Educação inclusiva. 3. Alunos com necessidades especiais. 4. Cidadania. I. Mendonça, Suelene Regina Donola. II. Universidade de Taubaté. III. Título. http://www.unitau.br/universidade/pro-reitorias/financas-pref/prof-dr-francisco-jose-grandinetti v PALAVRA DO REITOR Palavra do Reitor Toda forma de estudo, para que possa dar certo, carece de relações saudáveis, tanto de ordem afetiva quanto produtiva. Também, de estímulos e valorização. Por essa razão, devemos tirar o máximo proveito das práticas educativas, visto se apresentarem como máxima referência frente às mais diversificadas atividades humanas. Afinal, a obtenção de conhecimentos é o nosso diferencial de conquista frente a universo tão competitivo. Pensando nisso, idealizamos o presente livro- texto, que aborda conteúdo significativo e coerente à sua formação acadêmica e ao seu desenvolvimento social. Cuidadosamente redigido e ilustrado, sob a supervisão de doutores e mestres, o resultado aqui apresentado visa, essencialmente, a orientações de ordem prático-formativa. Cientes de que pretendemos construir conhecimentos que se intercalem na tríade Graduação, Pesquisa e Extensão, sempre de forma responsável, porque planejados com seriedade e pautados no respeito, temos a certeza de que o presente estudo lhe será de grande valia. Portanto, desejamos a você, aluno, proveitosa leitura. Bons estudos! Prof. Dr. José Rui Camargo Reitor vi vii Apresentação Caros(as) alunos(as), sejam bem-vindos. Neste livro-texto, você iniciará os estudos da disciplina “Educação, inclusão e cidadania, que compõe os cursos de licenciatura da Universidade de Taubaté, na modalidade Educação a Distância. Diante do contexto atual de discussão sobre as políticas educacionais de inclusão, os temas selecionados para este livro-texto são de extrema relevância para sua formação pessoal e profissional, uma vez que você terá a oportunidade de conhecer e compreender não só os caminhos percorridos e as dificuldades enfrentadas pelas pessoas com deficiência, como também os conceitos e as concepções sobre a educação especial e inclusiva e as possibilidades de intervenção, para que você atuar, de forma efetiva, atendendo às necessidades de pessoas com essa condição. Seria bom iniciar as abordagens, que neste livro-texto serão feitas, procurando refletir acerca de algumas questões, como, por exemplo: O que já sei sobre educação especial e inclusão? O que penso a respeito? Será gratificante compartilharmos nossas ideias, construirmos e ampliarmos nossos conhecimentos? Então, vamos lá. viii ix Sobre as autoras MÉRCIA APARECIDA DA CUNHA OLIVEIRA é doutora em Educação: História, Política, Sociedade e mestre em Educação: Distúrbios da Comunicação; ambas as titulações obtidas na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. É graduada em Pedagogia na habilitação: ensino para deficientes da audiocomunicação pela Universidade de Taubaté e licenciada em Biologia pela mesma Instituição de ensino superior. Foi professora do curso de Pedagogia da Universidade de Taubaté das disciplinas referentes à Educação Especial e Educação Inclusiva, à Orientação Educacional, à Psicologia Aplicada à Deficiência Mental, à Avaliação e Orientação Psicopedagógica para o Deficiente Mental e à Psicologia da Educação. É coordenadora do curso de Pós-graduação - Especialização em Psicopedagogia, na Universidade de Taubaté e professora dos cursos de Especialização em Gestão Educacional e Psicopedagogia na mesma entidade de ensino. Tem experiência de quase 30 anos como professora e psicopedagoga no trabalho com alunos portadores de necessidades educacionais especiais, decorrentes de deficiências, distúrbios globais do desenvolvimento e dificuldades de aprendizagem em escola e clínica particular. Foi professora do Ensino Fundamental e Médio de escola pública municipal e estadual. Prestou assessoria pedagógica para o projeto de inclusão escolar do aluno surdo e formação de professores do sistema de ensino municipal de Taubaté-SP. Coordenou o Projeto de atendimento pedagógico aos alunos com necessidades educacionais especiais da Universidade de Taubaté. SUELENE REGINA DONOLA MENDONÇA é doutora em Educação: História, Política, Sociedade e Mestre em Educação: Psicologia da Educação, ambas as titulações obtidas na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. É especializada em Psicopedagogia e graduada em Pedagogia, com habilitação no ensino para deficientes da audiocomunicação, pela Universidade de Taubaté. É professora (especialista em deficiência auditiva) da rede pública estadual há mais de 25 anos, atuando nas classes especiais e de recurso. Durante os dez anos atuando como professora da Universidade x de Taubaté, tem lecionado asdisciplinas: Fundamentos da Educação Especial, Didática, Psicologia da Educação, Educação de Jovens e Adultos, Coordenação Pedagógica. É professora do curso de Pós-graduação - Especialização em Psicopedagogia da Universidade de Taubaté. Atuou na área psicopedagógica em clínica particular com alunos portadores de necessidades educacionais especiais, decorrentes de deficiências, distúrbios globais do desenvolvimento e dificuldades de aprendizagem. xi Caros(as) alunos(as), Caros( as) alunos( as) O Programa de Educação a Distância (EAD) da Universidade de Taubaté apresenta-se como espaço acadêmico de encontros virtuais e presenciais direcionados aos mais diversos saberes. Além de avançada tecnologia de informação e comunicação, conta com profissionais capacitados e se apoia em base sólida, que advém da grande experiência adquirida no campo acadêmico, tanto na graduação como na pós-graduação, ao longo de mais de 35 anos de História e Tradição. Nossa proposta se pauta na fusão do ensino a distância e do contato humano-presencial. Para tanto, apresenta-se em três momentos de formação: presenciais, livros-texto e Web interativa. Conduzem esta proposta professores/orientadores qualificados em educação a distância, apoiados por livros-texto produzidos por uma equipe de profissionais preparada especificamente para este fim, e por conteúdo presente em salas virtuais. A estrutura interna dos livros-texto é formada por unidades que desenvolvem os temas e subtemas definidos nas ementas disciplinares aprovadas para os diversos cursos. Como subsídio ao aluno, durante todo o processo ensino-aprendizagem, além de textos e atividades aplicadas, cada livro-texto apresenta sínteses das unidades, dicas de leituras e indicação de filmes, programas televisivos e sites, todos complementares ao conteúdo estudado. Os momentos virtuais ocorrem sob a orientação de professores específicos da Web. Para a resolução dos exercícios, como para as comunicações diversas, os alunos dispõem de blog, fórum, diários e outras ferramentas tecnológicas. Em curso, poderão ser criados ainda outros recursos que facilitem a comunicação e a aprendizagem. Esperamos, caros alunos, que o presente material e outros recursos colocados à sua disposição possam conduzi-los a novos conhecimentos, porque vocês são os principais atores desta formação. Para todos, os nossos desejos de sucesso! Equipe EAD-UNITAU xii xiii Sumário Palavra do Reitor .............................................................................................................. v Apresentação .................................................................................................................. vii Sobre as autoras ............................................................................................................... ix Caros(as) alunos(as) ........................................................................................................ xi Ementa .............................................................................................................................. 1 Objetivos ........................................................................................................................... 2 Introdução ......................................................................................................................... 3 Unidade 1. Os aspectos filosóficos, culturais, sociais, educacionais, políticos e legais da educação especial no processo de inclusão.................................................................. 5 1.1 Marcos históricos: definindo a educação especial até o processo de inclusão ........... 5 1.2 Política educacional brasileira da educação especial na perspectiva da educação inclusiva .......................................................................................................................... 10 1.3 Síntese da Unidade ................................................................................................... 21 1.4 Atividades ................................................................................................................. 22 1.5 Para saber mais ......................................................................................................... 23 Unidade 2. Cidadania e educação inclusiva: diferença e diversidade ........................... 25 2.1 A questão da conceituação da deficiência: deficiência, incapacidade, desvantagem e necessidades especiais ................................................................................................. 26 2.2 O direito de ser, sendo diferente, na escola: quem são os diferentes? ...................... 28 2.3 Diversidade, diferença, deficiência, necessidades especiais .................................... 30 2.4 Síntese da unidade .................................................................................................... 32 2.5 Atividades ................................................................................................................. 32 2.6 Para saber mais ......................................................................................................... 32 Unidade 3. Inclusão escolar de alunos com necessidades educacionais especiais ......... 35 3.1 Alunos atendidos pela educação especial ................................................................. 37 3.2 Currículo escolar para a diversidade ........................................................................ 38 3.3 O cotidiano na sala de aula ....................................................................................... 43 3.4 Avaliação inclusiva................................................................................................... 44 3.5 Sintese da Unidade ................................................................................................... 47 3.6 Atividades ................................................................................................................. 48 xiv 3.7 Para saber mais ......................................................................................................... 48 Unidade 4. Conhecendo a diversidade dos alunos na escola .......................................... 49 4.1 Alunos com deficiência ............................................................................................ 49 4.1.1 Surdez/deficiência auditiva.................................................................................... 49 4.1.2 Indivíduos parcialmente surdos e indivíduos surdos ............................................. 50 4.1.3 Períodos de aquisição da surdez ............................................................................ 51 4.1.4 Graus de perda auditiva ......................................................................................... 52 4.1.5 Aparelhos/dispositivos de amplificação sonora .................................................... 53 4.1.6 Educação de surdos ............................................................................................... 55 4.1.7 Filosofia do ensino dos surdos .............................................................................. 56 4.1.8 Língua Brasileira de Sinais - Libras ...................................................................... 58 4.2 Alunos com transtornos globais do desenvolvimento .............................................. 60 4.2.1 Transtorno de deficit de atenção e hiperatividade (TDAH) .................................. 60 4.2.2 Dificuldades de aprendizagem............................................................................... 64 4.3 Síntese da Unidade ................................................................................................... 72 4.4 Atividades ................................................................................................................. 724.5 Para saber mais ......................................................................................................... 72 Referências ..................................................................................................................... 75 Referências complementares .......................................................................................... 78 11 ORGANIZE-SE!!! Você deverá usar de 3 a 4 horas para realizar cada Unidade. Educação, Inclusão e Cidadania Ementa EMENTA Os aspectos filosóficos, políticos e legais da Educação Especial na perspectiva da inclusão. Cidadania e Educação Inclusiva. Diferença e diversidade. A importância da família e da comunidade no desenvolvimento do ensino inclusivo. Currículo e diversidade. Intervenções e estratégias pedagógicas para o atendimento às necessidades especiais. Avaliação inclusiva, orientação para o trabalho no contexto inclusivo. 22 Objetivo Geral Este livro-texto tem por objetivo geral propiciar aos participantes do curso os fundamentos da educação inclusiva, quanto aos aspectos históricos, políticos e pedagógicos, tendo em vista a efetiva inclusão dos alunos com necessidades educacionais especiais. Obj eti vos Objetivos Específicos Proporcionar aos alunos de graduação (licenciaturas) a compreensão da educação especial, considerando os diferentes momentos históricos e sociais; Possibilitar a ampliação de suas reflexões sobre as políticas públicas de inclusão; Possibilitar o conhecimento e a identificação de alguns tipos de deficiência para que possam atuar junto aos alunos deficientes inseridos nas classes comuns dos sistemas de ensino; Estimular, formando continuamente e valorizando o professor para a tarefa da aprendizagem dos alunos. 33 Introdução Atualmente, inclusão é a palavra de ordem nos diversos setores da sociedade. Os meios de comunicação – imprensa falada, escrita e televisiva – têm apresentado, de diversas maneiras, o tema inclusão, por meio de discussões, entrevistas e ações quem vêm sendo desenvolvidas em favor da inclusão social de pessoas com necessidades educacionais, seguindo as orientações legais do Ministério da Educação, publicadas e disponíveis na Internet. Dentre os meios de comunicação, a mídia televisa se destaca apresentando-nos os mais diferentes programas e as mais diferentes histórias de vida de pessoas que apresentam algum tipo de deficiência, as formas de discriminação e preconceito em relação a elas e os trabalhos educacionais que vêm sendo realizados com o objetivo de incluir essas pessoas na sociedade. Também encontramos trabalhos de pesquisa, relatos de experiência de inúmeros casos de pessoas com deficiências que conseguem estudar, concluir os mais diferentes cursos, chegando, até mesmo, aos níveis mais elevados do ensino, como o ensino superior e a pós-graduação. As mensagens veiculadas pela televisão, muitas vezes, têm procurado mostrar que a deficiência é apenas uma dimensão da personalidade humana e, portanto, as pessoas deficientes são também dotadas de capacidades que podem ser desenvolvidas por meio de atendimento educacional especializado, contemplando a escolarização e a formação profissional, para que elas sejam incluídas na sociedade. O que queremos dizer é que a sociedade precisa mudar sua forma de pensar e entender a deficiência e as pessoas com deficiência, isto é, não tomar a parte pelo todo e perceber as inúmeras possibilidades de superação das dificuldades oriundas da deficiência, como, por exemplo, surdez, cegueira, intelectualidade, multideficiência, transtornos do desenvolvimento, dentre outros. 44 Também nos meios escolares a inclusão tem sido a palavra de ordem: todos parecem concordar e defender o direito à educação de todas as crianças, independentemente de suas condições pessoais decorrentes de deficiências ou não. De um lado se defende a democratização do ensino, de outro lado é comum o discurso do despreparo da escola, dos gestores e dos professores do ensino comum para receber em grupo/classe alunos com deficiência. Para alcançar os objetivos propostos, este livro-texto será divido em cinco unidades. Na Unidade I, discutiremos os aspectos filosóficos, culturais, sociais, educacionais, políticos e legais que fundamentaram a educação especial e o processo de inclusão. Na Unidade II, desenvolveremos e focaremos os aspectos relacionados à cidadania e à educação inclusiva, bem como a questão dos conceitos de deficiência, incapacidade e desvantagem; dos direitos das pessoas diferentes. Também definiremos os termos diversidade, diferença, deficiência, necessidades especiais e suas relações com educação. Na terceira Unidade, será abordado o tema inclusão escolar de alunos com necessidades especiais: currículo e diversidade, intervenções e estratégias pedagógicas para o atendimento das necessidades específicas dos alunos e avaliação inclusiva. Na Unidade IV, será aprofundada a questão da diversidade, esclarecendo o que são alunos com necessidades educacionais especiais e alunos com deficiências (surdez, cegueira e deficiência visual, surdo-cegueria, deficiência intelectual, múltipla deficiência, deficiência física (paralisia cerebral ou deficiência neuromotora), além dos transtornos globais do desenvolvimento (autismo, síndrome de Asperger), além de serem tratados o transtorno de deficit de atenção e a hiperatividade (TDAH). Os conhecimentos sobre alunos com altas habilidades/superdotação e alunos com dificuldades de aprendizagem também serão expostos nessa Unidade. 55 Unidade 1 Unidade 1 . Os aspectos filosóficos, culturais, sociais, educacionais, políticos e legais da educação especial no processo de inclusão 1.1 Marcos históricos: definindo a educação especial até o processo de inclusão Como mencionamos na introdução deste livro-texto, o tema inclusão, atualmente, está presente nos mais diferentes setores da sociedade e, sobretudo, na escola. Parece existir, hoje, um consenso de que todos, independente de suas características individuais, têm os mesmos direitos. Mas nem sempre foi assim. Em épocas remotas, as pessoas que se diferenciavam dos demais, devido as suas anormalidades físicas ou mentais, eram desvalorizadas e desprezadas pelas diversas culturas, por isso é importante que se reporte à história para tomar conhecimento de como as pessoas com deficiências eram tratadas. As deficiências sempre existiram em todas as culturas, etnias e níveis socioeconômicos. Os valores vigentes em cada momento histórico é que vão determinar as relações entre as pessoas deficientes e a sociedade. Segundo diversos autores, praticamente não existem registros, em Roma e na Grécia antigas, sobre a caracterização da relação entre sociedade e deficiência; mas, a partir da literatura da época e dos escritos bíblicos, é possível identificar passagens que nos permitem fazer inferências sobre a natureza e os procedimentos dessa relação (MEC/SEESP, 2000, p. 8). 66 A seguir, vamos apresentar a você como eram a economia e a organização sociopolítica na Antiguidade: Antiguidade Em Roma e na Grécia antigas, a economia baseava-se nas atividades da produção e do comércio agrícola, pecuário e artesanal. Nesse período da história, a vida em sociedade caracteriza-se pela existência de dois agrupamentos sociais: o da nobreza, que detinha o poder social, político e econômico, e o do populacho, considerado sub-humano, que dependia economicamente dos nobres. O populacho trabalhava e produzia e a nobreza usufruía dos produtos para consumo próprio e para comercialização. Quem produzia ficava com assobras que a nobreza desprezava. Nesse tipo de organização social, o valor de um homem era concedido pela nobreza, à medida que fosse capaz de atender a seus próprios desejos e as suas necessidades. Assim, nesse contexto, a pessoa com deficiência era abandonada à própria sorte, sem que isso representasse um problema ético ou moral. De acordo com Bueno (2004) e Lemos (1981), em épocas passadas os deficientes encontraram muitas dificuldades. Os deficientes físicos, por exemplo, além de serem colocados entre os demais deficientes, recebiam designações pejorativas (coxo, aleijado, perneta, maneta). Os que apresentavam deficiência não eram vistos como pessoas, mas como objetos, e, como tal, podiam ser usados, dispostos e expostos, conforme a vontade alheia. As pessoas com deficiência eram praticamente exterminadas por meio do abandono. Você deve estar pensando que hoje isso não acontece mais, não é mesmo? Será? Você já assistiu ao filme “O homem elefante”? Vale a pena assisti-lo para você ter uma ideia de como eram tratadas as pessoas com deficiência. É mostrada nesse filme a história do inglês John Merrick (John Hurt) e o tratamento a ele dispensado, em virtude das deformidades físicas que apresentava. 77 Idade Média A economia nesse período, no ocidente, continuou de acordo o período anterior, baseada nas atividades de agricultura, pecuária e artesanato. Entretanto, na organização político-administrativa, houve uma significativa mudança. Com a difusão do cristianismo e o consequente fortalecimento da Igreja Católica, o clero (padres e bispos) acabou assumindo o poder social, político e econômico, ou seja, a Igreja Católica se apropriou do conhecimento já produzido e dominou as ações da nobreza, passando a comandar toda a sociedade. E em relação ao povo, houve mudança? Da mesma forma que no período anterior, o povo continuou na produção de bens e serviços, na constituição dos exércitos e na contribuição para o enriquecimento do clero e da nobreza, permanecendo sem o direito de participar de decisões administrativas da sociedade. Nesse período, as atitudes para com os deficientes eram de proteção e compaixão. As pessoas deficientes não podiam mais ser exterminadas, pois passaram a ser consideradas como criaturas de Deus. Foram, então, acolhidas em conventos ou igrejas, sob condição ambígua. Por um lado, a deficiência era a marca da punição divina, expiação dos pecados; por outro lado, era a manifestação do poder sobrenatural, significando o privilégio de acesso às verdades que não estavam ao alcance da maioria. No entanto, alguns continuaram, como na Antiguidade, a ser objetos de diversão (bobos da corte) e de exposição. Idade Moderna Na chamada Idade Moderna (de 1453 até 1789), ocorreu a Revolução Francesa, que se deu no âmbito das ideias, derrubando as monarquias, destruindo a hegemonia religiosa, implantando uma nova forma de produção denominada capitalismo mercantil (primeira forma de capitalismo). Foi nesse contexto que teve início a formação dos estados modernos e surgiu uma nova forma de divisão social do trabalho – os que detinham os 88 meios de produção e os operários (que passaram a viver com a venda de sua força de trabalho). Nesse período, a deficiência passou a ser explicada segundo uma ótica mais natural. A deficiência era de natureza orgânica, produto de causas naturais e não mais causada por fatores espirituais, transcendentais. Sendo assim, começou a ser tratada por meio da alquimia, da magia e da astrologia, que eram métodos da medicina que se iniciava. Os avanços no conhecimento produzido na área da Medicina fortaleceram a tese da organicidade, ampliando a compreensão da deficiência como processo natural. Essa nova visão da deficiência fez com que surgissem ações de tratamento médico das pessoas com deficiência. Assim, entendemos que, na realidade, não se pode falar em avanço e sim em retrocesso, pois tais instituições eram, e muitas vezes ainda o são, pouco mais do que prisões. No entanto, a medicina evoluiu, produziu e sistematizou novos conhecimentos, como também outras áreas do conhecimento. Consequentemente, novas informações foram dadas sobre a deficiência, sua etiologia, seu funcionamento e seu tratamento. Nesse momento, os conventos e asilos e, depois, hospitais psiquiátricos, constituíram-se em locais de confinamento e não de tratamento de pessoas com deficiência. Permanecia, portanto, o isolamento (agora em lugar específico) das pessoas portadoras de deficiência. Novamente a ambiguidade aparece. Ao lado dos avanços científicos em busca de maiores esclarecimentos sobre as deficiências, as pessoas eram retiradas do convívio social e das suas comunidades de origem para viver em instituições residenciais segregadas ou em escolas especiais localizadas em lugares distantes de suas famílias. A educação especial na sociedade moderna Para Bueno (1997), as referências sobre educação especial consideram o século XVIII como marco definitivo no esforço da sociedade moderna no sentido de proporcionar educação especializada compatível com a necessidade das crianças deficientes. 99 A expansão da Educação Especial, iniciada no século XVIII, foi assumindo, no decorrer do século XX, proporções cada vez maiores, no sentido de atingir uma institucionalização como subsistema significativo dentro do sistema educacional na maioria dos países. Quando teve início o atendimento às pessoas com deficiências no Brasil? No Brasil, o atendimento às pessoas com deficiências teve início com a criação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos (atual Instituo Benjamin Constant), em 1854, e do Instituto de Surdos-Mudos (atual Instituto Nacional para Educação de Surdos - INES), em 1857, ambos no Rio de Janeiro. Iniciou-se também o tratamento de deficientes mentais no Hospital Psiquiátrico da Bahia, em 1874, e com a criação do pavilhão Bourneville no Hospital D. Pedro II. Em 1926, foi fundado o Instituto Pestalozzi, destinado ao atendimento de deficientes mentais. A primeira Associação de Pais e Amigos dos Excepcionias – APAE foi fundada em 1954 e o primeiro atendimento educacional especializado voltado às pessoas com superdotação foi criado em 1945, por Helena Antipoff, na Sociedade Pestalozzi. Dessa forma, a deficiência mental foi assumindo primazia, não só pelo maior número de instituições a ela dedicadas, mas pela preocupação que se foi adquirindo em relação à deficiência mental, em virtude da preocupação com a eugenia da raça. O surgimento das primeiras entidades privadas de atendimento aos deficientes mentais espelha o início de duas tendências importantes da Educação Especial no Brasil: a inclusão dessa modalidade de educação no âmbito das instituições filantrópico- assistenciais e a sua privatização. Além do surgimento das entidades privadas, a rede pública escolar começou a se preocupar com isso, como decorrência da influência que a psicologia passou a ter na determinação dos processos de ensino por meio dos testes psicométricos (legitimação e segregação do aluno diferente). Conforme Bueno (2004), a grande expansão do setor privado voltado para o atendimento aos deficientes ocorreu entre 1960 e 1970, o que influenciou as políticas de 1100 educação e a qualificação técnica das equipes de algumas entidades assistenciais e das empresas que prestavam serviços de alto nível. Essa ampliação foi importante para a distinção entre as entidades filantrópico- assistenciais, destinadas aos deficientes pertencentes às famílias dos segmentos menos favorecidos da sociedade, que não podiam arcar financeiramente com a reabilitação e educação de seus filhos. As empresas prestadoras de serviços de reabilitação se destinavam aos deficientes de elevado poder aquisitivo. Isso, segundo Bueno (2004, p. 120), “representou a concretização do processode privatização que ocorreu no país nos campos da saúde e da educação”. 1.2 Política educacional brasileira da educação especial na perspectiva da educação inclusiva Você pôde perceber, pelas informações expostas até aqui, como foi difícil a caminhada das pessoas com deficiência em direção à conquista de direitos iguais aos de todas as outras. Neste subitem, apresentaremos alguns dos dispositivos legais que foram elaborados, no decorrer do tempo, com a finalidade de garantir os direitos das pessoas com deficiência, bem como corrigir distorções de interpretações das leis. Apresentaremos também os documentos internacionais que provocaram mobilizações em favor da educação inclusiva. Como acontece em qualquer contexto de mudança, é comum surgirem perguntas. Assim, você deverá estar se perguntando: Por que colocaram o aluno deficiente no ensino regular? Não seria melhor para ele permanecer na classe especial, pois lá há professores especializados que saberão como ensiná-lo? O que eu, professor, farei com os alunos com deficiência presentes em minha sala se nunca fui preparado para trabalhar com eles? Meus alunos “normais” não serão prejudicados se colocados com um aluno deficiente? Não sou especializado, não sei ensinar um aluno com necessidades especiais. Além do mais, minha sala é superlotada. Diante disso, o que farei com os outros alunos? Será que irão aprender? 1111 Esses são alguns questionamentos que refletem as representações dos professores a respeito das diferenças entre os alunos. Essa forma de pensamento incide significativamente na atuação dos professores juntos aos alunos com deficiências. Se esses alunos não são capazes de aprender e o professor de ensinar, o processo ensino- aprendizagem certamente ficará prejudicado em relação ao desempenho dos alunos. Para você poder entender melhor a trajetória da conquista dos direitos das pessoas diferentes, temos que retroceder um pouco no tempo. Vamos lá? Tudo começou com a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948. A Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1948, proclamou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, na qual reconhece, no seu Art. 1, que "Todos os seres humanos nascem livres e iguais, em dignidade e direitos”, e no seu Art. 2, “sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação". Em seu Art. 7, proclama que "todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual proteção da lei". No Art. 26, proclama, no item 1, que "toda pessoa tem direito à educação”. De maneira geral, essa Declaração assegura a todos os mesmos direitos à liberdade, à vida digna, à educação fundamental, ao desenvolvimento pessoal e social e à livre participação na vida da comunidade. Dentre esse todos, estão as pessoas com necessidades educacionais especiais. Apesar do reconhecimento dos direitos iguais de todas as pessoas à educação, muitos anos se passaram até que a educação das pessoas com necessidades educacionais especiais (denominadas excepcionais na época) fosse contemplada e regulamentada por lei. Então, vamos juntos, conhecer alguns pontos relevantes de documentos e leis vigentes no Brasil, que fundamentam a atual política educacional da educação inclusiva. 1122 É importante que nos conscientizemos da importância de se conhecer os dispositivos legais que, no Brasil, determinam, definem e orientam a organização da educação especial na educação básica, para que possamos refletir sobre os aspectos positivos, as conquistas, as limitações e os inúmeros desafios ainda a serem vencidos em suas aplicações. A questão da inclusão de alunos com necessidades especiais é uma preocupação recente? No Brasil, o atendimento educacional às pessoas com deficiências passou a ser fundamentado em 1961, pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), número 4.024/61, que dispunha sobre o direito dos excepcionais, preferencialmente, dentro do sistema geral de ensino. Será que, a partir dessa Lei, a situação escolar dos alunos com deficiência ficou resolvida? Na realidade, a LDBEN número 4.024/61 não foi cumprida, pois não promoveu a organização de um sistema escolar que fosse capaz de atender às necessidades específicas dos alunos. A criação e a ampliação das escolas especiais e das classes especiais no sistema público de ensino fizeram com que a educação especial se constituísse num subssistema da educação geral, um sistema de educação separado, para onde deveriam ir aqueles alunos com deficiência física, mental, ou com atraso considerável quanto à idade regular de matrícula, além dos superdotados. Você sabe o que aconteceu em decorrência disso? Com isso, reforçou-se o encaminhamento de alunos para as escolas e classes especiais. Você sabe qual foi o agravante desse procedimento? 1133 Tanto nas escolas como nas classes especiais, a porta de entrada era muito larga, mas a porta de saída era muito estreita. Assim, os alunos que eram encaminhados para esses atendimentos especializados permaneciam ali por muitos anos, sem ultrapassar os anos iniciais do ensino fundamental (BUENO, 1999) e, portanto, sem condições de prosseguir os estudos para que pudessem se preparar e conquistar seu espaço no mercado de trabalho. A ampliação e a criação de classes e escolas especiais culminaram, em 1970, com a criação de serviços de Educação Especial em todas as Secretarias Estaduais de Educação e, em 1973, com a criação do Centro Nacional de Educação Especial (CENESP), que era a instância responsável pela educação especial no Brasil. A Lei número 4.024/61 foi alterada pela Lei número 5.692/71, que definiu o tratamento especial para os alunos com as já citadas deficiências, reforçando o seu encaminhamento para escolas e classes especiais. Segundo Glat e Ferreira (2004), o período compreendido entre o início dos anos 70 e início da década de 80 foi marcado pelo processo de institucionalização da Educação Especial nos sistemas públicos de ensino. Trata-se de amplas reformas educacionais promovidas pelos governos militares. A Educação Especial foi incluída nos planos setoriais do governo, promovendo o desenvolvimento nas redes escolares e nos programas de formação de profissionais. Ainda na década de 80, ocorreu a redemocratização do país e os partidos de oposição conseguiram chegar aos governos dos estados mais importantes do Brasil. Nesse contexto, ocorreram reformas importantes das políticas educacionais no âmbito estadual, que foram favoráveis à universalização do acesso e à democratização do ensino básico e público. Foi a época dos ciclos básicos e das escolas de tempo integral, dentre outras iniciativas que tentavam reverter o quadro do fenômeno do fracasso escolar, colocando em xeque o ensino da chamada Educação Especial. Mas, felizmente, muitas pessoas continuaram lutando pelos direitos daqueles que, por serem diferentes, permaneciam à margem da sociedade sem que seus direitos fossem respeitados. 1144 A luta pelos direitos das pessoas com deficiência foi um dos destaques dos movimentos sociais da época e culminou com a aprovação da nova Constituição do Brasil em 1988, que reafirmou o direito de todos à educação. Vejamos, então, o que determina a Constituição em favor das pessoas com deficiência. A Constituição de 1988 assume o princípio da igualdade como pilar fundamental de uma sociedade democrática e justa. Em seu Art. 205, está proclamado que a educação é um direito de todos e dever do estado e da família. No Art. 206 consta que o ensino será ministrado com base nos seguinte princípio: igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola. No Art. 208 consta que o dever do Estado com a Educação será efetivadomediante a garantia de atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino. De acordo com Glat e Ferreira (2004), no Brasil a discussão sobre a construção da escola inclusiva foi intensificada nos anos 90, no contexto das reformas educacionais, principalmente, da Educação Básica desenvolvida sob a influência de movimentos e políticas internacionais, voltadas para a ampliação do acesso à escola fundamental das populações dos países subdesenvolvidos e em desenvolvimento (educação para todos). Nesse sentido, na década de 90, foram elaborados documentos internacionais, oriundos de conferências que influenciaram de maneira significativa as políticas públicas da educação inclusiva de diversos países, inclusive do Brasil. Em nosso país, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei número 8069/90, em seu Capítulo IV, Art. 54, inciso III, dispõe: “É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente portadores de deficiência atendimento educacional especializado, preferencialmente na rede regular de ensino”. Em março de 1990, o Brasil participou da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, em Jomtien, Tailândia, na qual foi proclamada a Declaração de Jomtien. Nessa Declaração, os países reforçam (sim, reforçam, pois não foi a primeira discussão sobre 1155 a universalização da educação) a ideia de que "a educação é um direito fundamental de todos, mulheres e homens, de todas as idades, no mundo inteiro". Declararam, também, entender que a educação é de fundamental importância para o desenvolvimento das pessoas e da sociedade, sendo um elemento que "pode contribuir para conquistar um mundo mais seguro, mais sadio, mais próspero e ambientalmente mais puro, e que, ao mesmo tempo, favoreça o progresso social, econômico e cultural, a tolerância e a cooperação internacional". Reconhecendo a necessidade e urgência de providenciar educação para as crianças, jovens e adultos com necessidades educacionais especiais dentro do sistema regular de ensino, o Brasil, embora não estivesse presente, apoiou as propostas da Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais em Salamanca (Espanha, 1994). Essa Conferência deu origem à Declaração de Salamanca, que reafirma o compromisso já assumido anteriormente para com a educação para todos. Esse evento contou com a participação de delegados de 88 governos e 25 organizações internacionais, com o objetivo de estabelecer princípios, políticas e práticas na área das necessidades educativas especiais. Entre outros aspectos, é proclamado no documento que: toda criança tem direito fundamental à educação e deve lhe ser dada a oportunidade de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem; toda criança tem características, interesses, habilidades e necessidades de aprendizagem que são únicos; sistemas educacionais deveriam ser designados e programas educacionais deveriam ser implementados no sentido de se levar em conta a vasta diversidade de tais características e necessidades. Na Declaração de Salamanca, as crianças com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola regular, que deveria acomodá-las dentro de uma Pedagogia centrada na criança, capaz de satisfazer tais necessidades. Escolas regulares que tenham tal orientação inclusiva constituem o meio mais eficaz de combater atitudes discriminatórias. Tais escolas proveem uma educação efetiva à maioria das crianças e aprimoram a eficiência e, em última instância, o custo da eficácia de todo o sistema educacional. 1166 O documento aponta para o papel da escola: ela é que deve se adaptar para atender às necessidades de todos os seus alunos e não o contrário. O documento orienta ainda que as escolas deveriam acomodar todas as crianças independentemente de suas condições (física, intelectual, social, emocional, linguística etc). Deveriam incluir crianças deficientes e superdotadas, crianças de rua e que trabalham, crianças de origem remota ou de população nômade, crianças pertencentes a minorias linguísticas, étnicas ou culturais, e crianças de outros grupos desvantajados ou marginalizados. Tais condições geram uma variedade de diferentes desafios aos sistemas escolares. Segundo o documento, muitas crianças experimentam dificuldades de aprendizagem e, portanto, têm necessidades educacionais especiais em algum ponto durante a sua escolarização. Nessa perspectiva, cabe às escolas buscar formas diversificadas para educar tais crianças de modo bem sucedido, incluindo aquelas que tenham desvantagens severas. ”O mérito de tais escolas não reside somente no fato de que elas sejam capazes de prover uma educação de alta qualidade a todas as crianças; o estabelecimento de tais escolas é um passo crucial no sentido de modificar atitudes discriminatórias, de criar comunidades acolhedoras e de desenvolver uma sociedade inclusiva” (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994). Para que o aluno seja realmente incluído, é necessário que todas as suas necessidades sejam efetivamente atendidas. Este é o desafio das escolas inclusivas. A Lei 9394/96, das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) em vigor, dedica o capítulo V à educação especial, definindo-a no Art. 58: “Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais”. Em seu Art. 59, inciso I, dispõe que os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais: currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e 1177 organização específica, para atender às suas necessidades. Cabe ressaltar, que não está sugerindo a elaboração de um novo currículo, mas sim que o oferecido aos demais alunos seja adaptado às suas necessidades. No inciso II, dispõe que deve ter uma terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências; e que deve haver aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados. No inciso III, dispõe que os professores devem ter especialização adequada, em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como os do ensino regular devem estar capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns. Vale destacar que a LDBN 9364/96 apresenta alguns avanços com relação ao atendimento e apoio dos alunos com necessidades especiais, especialmente no que diz respeito a garantir aos alunos o acesso à escola comum e a permanência nela. A escola comum deverá remover barreiras que impeçam a frequência desses alunos no espaço social chamado escola. O atendimento educacional especializado é uma forma de garantir que sejam reconhecidas e atendidas as particularidades de cada aluno com deficiência, ”como por exemplo o ensino da Língua Brasileira de Sinais, do código Braille, o uso de recursos de informática e outras ferramentas tecnológicas, além de linguagens que precisam estar disponíveis nas escolas comuns para que elas possam atender com qualidade aos alunos com e sem deficiência” (FAVERO et al., 2007, p. 26). Percebe-se que a legislação atual garante aos alunos com necessidades especiais que os currículos, os métodos e as técnicas de ensino sejam organizados de maneira especifica a fim de atender às necessidades desses alunos. Nesse contexto de mudança, a Resolução 02/01, do Conselho Nacional de Educação - CNE/CEB número 02/2001, instituiu as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, que manifesta o compromisso do país com o desafio de construir coletivamente as condições para atender bem à diversidade de seus alunos. A Resolução determina que: 1188 - o atendimento escolar dos alunos com necessidadeseducacionais especiais terá início na educação infantil, nas creches e nas pré-escolas, assegurando-lhes os serviços de educação especial sempre que se evidencie, mediante avaliação e interação com a família e a comunidade, necessidade de atendimento educacional especializado; - a educação especial é uma modalidade da educação escolar, definida por uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais especiais, organizados na instituição para apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica; - os educandos com necessidades educacionais especiais são aqueles que, durante o processo educacional, necessitarem que algum tipo de atendimento diferenciado; - as escolas da rede regular de ensino devem prever e prover a organização de suas classes comuns e da educação especial capacitados e especializados, respectivamente, para o atendimento às necessidades educacionais dos alunos. - as flexibilizações e adaptações curriculares que considerem o significado prático e instrumental dos conteúdos básicos e metodológicos de ensino, dos recursos didáticos diferenciados e dos processos de avaliação adequados ao desenvolvimento dos alunos que apresentam necessidades educacionais especiais devem estar em consonância com o projeto pedagógico da escola, respeitando a frequência obrigatória; - a acessibilidade aos conteúdos curriculares, mediante a utilização de linguagens e códigos aplicáveis (como o sistema Braille e a língua de sinais), deve ser assegurada no processo educativo de alunos que apresentam dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais educandos, sem prejuízo do aprendizado da língua portuguesa, facultando- lhes e as suas famílias a opção pela abordagem pedagógica que julgarem adequada, ouvidos os profissionais especializados em cada caso. A Lei 10.172/01 aprovou o Plano Nacional de Educação cujos objetivos se resumem a quatro pontos: elevação do nível de escolaridade da população; 1199 melhoria da qualidade da educação; democratização educacional, em termos sociais e regionais; democratização da gestão do ensino público. Quanto à educação das pessoas com necessidades educacionais especiais, o Plano Nacional de Educação estabelece vinte e oito objetivos e metas, dentre os quais destacamos: a formação inicial e continuada dos professores para atendimento às necessidades dos alunos; a disponibilização de recursos didáticos especializados de apoio à aprendizagem nas áreas visual e auditiva; a articulação das ações de educação especial com a política de educação para o trabalho; o incentivo à realização de estudos e pesquisas nas diversas áreas relacionadas com as necessidades educacionais dos alunos. Já mencionamos que a concretização do reconhecimento dos direitos das pessoas com deficiências não tem sido fácil, mas muitos países tem se preocupado com inclusão social escolar dessas pessoas. Tanto é assim que, em 7 de junho de 1999, ocorreu a Convenção interamericana para a eliminação de todas as formas de discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência (Convenção de Guatemala), reiterando que as pessoas portadoras de deficiência têm os mesmos direitos humanos e a mesma liberdade fundamentais e que estes direitos, inclusive o direito de não serem submetidas à discriminação com base na deficiência, emanam da dignidade e da igualdade que são inerentes a todo ser humano. Assim, a Convenção de Guatemala teve por objetivo prevenir e eliminar todas as formas de discriminação contra as pessoas portadoras de deficiência e propiciar a sua plena integração à sociedade. Nessa esteira, [O] o Brasil é signatário desse documento, que foi aprovado pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 198, de 13 de 2001, e promulgado pelo Decreto nº 3.956 de 8 de outubro de 2001, da Presidência da Republica, portanto, no Brasil, ele tem tanto valor quanto uma lei ordinária, ou até mesmo (de acordo com o entendimento de alguns juristas) como norma constitucional, já que se 2200 refere a direitos e garantias fundamentais da pessoa humana, estando acima de leis, resoluções e decretos” (FAVERO et al., 2007, p. 29). Assim, a promulgação do Decreto Lei no. 3956/01 surge com a força de uma nova lei, que tem como objetivo revogar ou complementar disposições anteriores. Nesse caso, esse documento exige uma reinterpretação da LDBEN, que, se mal interpretada, pode admitir diferenciações com base na deficiência, que sugerem restrições ao acesso de um aluno com deficiência ao mesmo ambiente que os demais colegas sem deficiência. Para os efeitos desta Convenção, [O] o termo "deficiência" significa uma restrição física, mental ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social (CONVENÇÃO DE GUATAMALA, 1999). O termo discriminação, em relação às pessoas portadoras de deficiência, significa toda diferenciação, exclusão ou restrição baseada em deficiência, em antecedente de deficiência, em consequência de deficiência anterior ou em percepção de deficiência presente ou passada, que tenha o efeito ou propósito de impedir ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício, por parte das pessoas portadoras de deficiência, de seus direitos humanos e suas liberdades fundamentais. A Língua Brasileira de Sinais (Libras) é reconhecida pela Lei 10436/02 como meio legal de comunicação e expressão de comunidades de pessoas surdas do Brasil, conforme observa-se no parecer do texto abaixo: [E] entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical própria, constitui um sistema linguístico de transmissão de idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do Brasil (BRASIL, Lei 10436/02). Também o estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Educação, no sentido de atender às especificidades do alunado em questão, reconhece o atendimento de alunos com necessidades especiais nas escolas da rede estadual de ensino. Esse atendimento está previsto na Resolução da SE nº 95, de 21 de novembro de 2000. Consta no seu Art. 7º: [C] consideradas as especificidades regionais e locais, com o objetivo de viabilizar gradativamente o disposto na presente resolução, serão 2211 organizados Serviços de Apoio Pedagógico Especializado (SAPEs), no âmbito da Unidade Escolar, por solicitação desta, com anuência da Diretoria de Ensino e da respectiva Coordenadoria de Ensino. A Resolução SE nº 038/2009 dispõe sobre a admissão de docentes com qualificação em Libras nas escolas da rede estadual de ensino. 1.3 Síntese da Unidade Nesta Unidade, vimos que até que se desse o reconhecimento dos direitos das pessoas com deficiências ou com necessidades educacionais especiais e o advento da educação inclusiva, elas sofreram toda ordem de maus tratos: extermínio, exibição pública, isolamento em hospitais e asilos. Vimos também que, mesmo tendo seus direitos reconhecidos, essas pessoas continuaram segregadas em escolas e classes especiais. Ficou claro que o fortalecimento e o aumento do número das instituições especializadas, de caráter filantrópico assistencial, influenciaram as políticas de educação e a preparação de pessoal para trabalhar tanto em entidades assistenciais como nas empresas que prestavam serviços à população de deficientes. Nem mesmo a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN, Leino. 4.024/61, que contemplou em seu texto o direito à educação dos deficientes (excepcionais), de preferência dentro do sistema comum de ensino, foi capaz de promover a organização de um sistema escolar para atender às necessidades especificas dos alunos. A educação especial no Brasil acabou se constituindo como um subssistema da educação geral, um sistema de educação separado, que segregava aqueles alunos com deficiências físicas, mentais, com atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e aqueles alunos superdotados. Os alunos que foram para as escolas e classes especiais, apesar de permaneceram muitos anos nessa modalidade de ensino, não conseguiram ultrapassar os anos iniciais do ensino fundamental, conforme Bueno (1999). 2222 Com a redemocratização do país na década de 80, as reformas das políticas educacionais no âmbito estadual e a democratização do ensino básico e público, a educação especial passou a ser questionada. Os movimentos sociais pelos direitos das pessoas com deficiência tiveram êxito com a aprovação da Constituição do Brasil, em 1988, devido ao fato de ela ter afirmado o direito de todos à educação, fazendo referências às pessoas com deficiências. A partir daí, outros dispositivos legais foram fundamentais para a consolidação dos direitos dessas pessoas: o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBEN nº 9394/96, os decretos e as resoluções que dispõem, determinam e orientam a organização escolar. Destacam-se, ainda, os documentos internacionais, oriundos de conferências, como, por exemplo, a Declaração Mundial do Direito de Todos à Educação (1990), a Declaração de Salamanca (1994) e a Convenção de Guatemala (1999). 1.4 Atividades 1- Em relação a pessoas com necessidades especiais, relate suas experiências (pensamentos, sentimentos), pontuando o que você acha dessas pessoas e como reage diante delas. 2- Após ter assistido ao filme O Homem elefante, discuta o tema com seus amigos e aponte as contribuições do filme para a sua formação pessoal e docente. Em grupo, responda às seguintes questões: O que você entende por educação inclusiva? O que é necessário para que ela ocorra? Quais os desafios enfrentados na educação inclusiva? 3- Em grupo, responda às seguintes questões: O que você entende por educação inclusiva? O que é necessário para que ela ocorra? Quais os desafios enfrentados na educação inclusiva? 4- Leia o texto da DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, sobre princípios, políticas e práticas na área das Necessidades Educativas Especiais (disponível em 2233 http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf) e destaque no texto palavras-chave que, a seu ver, representem o conjunto de ideias principais do tópico em questão 5- Visite a página http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/arquivos/11-08.HTM e pesquise o que vem a ser Serviço de Apoio Pedagógico (SAPE). 6- Entre no fórum e discuta com seus colegas o processo de inclusão. 1.5 Para saber mais Livro EDLER-CARVALHO, R. A nova LDB e a educação especial. Rio de Janeiro: WVA, 1997. Sites http://www.anped.org.br/reunioes/27/gt15/t1510.pdf Neste site, você encontrará discursos políticos sobre inclusão e políticas públicas de educação especial no Brasil. http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/fundamentacaofilosofica.pdf http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12907:legisl acoes&catid=70:legislacoes http://lise.edunet.sp.gov.br/sislegis/detresol.asp?strAto=200906190038 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9394.htm acesso em 14/01/2010 http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/fundamentacaofilosofica.pdfs http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12907:legisl acoes&catid=70:legislacoes Nestes sites, você encontrará legislações referentes à educação especial. Filme Para você ter uma ideia de como os deficientes eram tratados em épocas passadas, assista ao filme O homem elefante. Título original The elephant man. Drama http://siau.edunet.sp.gov.br/ItemLise/arquivos/11-08.HTM 2244 americano de 1980 com 118 minutos de duração. No filme, é contada a história de John Marrick (John Hurt), um cidadão da Inglaterra vitoriana. Ele é acometido pelo caso mais grave já registrado de neurofibromatose múltipla. Com 90% de seu corpo deformados, passou a ser exibido em circos. Foi considerado um débil mental pela sua dificuldade de falar, até ser descoberto por um médico, Frederick Treves (Anthony Hopkins) que o levou para o hospital onde trabalhava. Video A declaração universal dos direitos humanos (1948) O vídeo está disponível no site http://www.youtube.com/watch?v=cs5- rbwUGQQ&feature=related. Com certeza, o seu conteúdo lhe trará conhecimento para a efetuação de grande reflexão a respeito do tema neste livro-texto abordado. 2255 Unidade 2 Unidade 2 . Cidadania e educação inclusiva: diferença e diversidade Antes de prosseguirmos com nossos estudos, que tal recapitularmos a Unidade I? Como você viu na Unidade I, desenvolvemos os aspectos filosóficos, culturais, sociais, educacionais, políticos e legais da educação especial até o advento do processo de inclusão social de pessoas com deficiência. Vimos que, no decorrer da história, as concepções sobre essas pessoas se modificaram, dependendo dos valores vigentes nas diferentes sociedades. Na Antiguidade, por exemplo, as pessoas deficientes foram maltratadas, segregadas e isoladas do convívio familiar e social por serem consideradas inaptas e incapazes para exercer qualquer função na sociedade, em decorrência do defeito que apresentavam. Na moderna sociedade industrial, cujas características principais eram a produtividade e homogeneidade (BUENO, 1996), essas pessoas eram consideradas improdutivas e atrapalhavam a nova organização social; assim foram segregadas em asilos, escolas e classes especiais. No entanto, havia, por parte de algumas pessoas, a preocupação com a inclusão desses indivíduos, tanto na família, como na escola e na sociedade. Como consequência dessa preocupação, surgiram movimentos de grande repercussão mundial como a Conferência Mundial de Educação para Todos, em 1990, em Jonteim, Tailândia e a Conferência Mundial de Educação Especial, em 1994, em Salamanca (Espanha), que defenderam a inclusão dessas pessoas. No Brasil, foram aprovados vários dispositivos legais, amparando a organização de um sistema educativo inclusivo e oferecendo fundamentos para que isso fosse possível, como, por exemplo, a Constituição do Brasil (1988), o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, 1990), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB no. 9393/96), entre outros. 2266 Após essa breve recapitulação, abordemos a Unidade 2, cujos objetivos são: definir quem são os diferentes e esclarecer alguns conceitos como deficiência, incapacidade, desvantagem, diversidade, diferença e necessidades especiais. 2.1 A questão da conceituação da deficiência: deficiência, incapacidade, desvantagem e necessidades especiais Iniciemos este subitem com duas questões: Você já parou para pensar no significado de deficiência? Ter deficiência é ter incapacidade? As definições de deficiência divergem em consequência das diferenças culturais, das atitudes e dos valores e da organização da sociedade. Muitas expressões estão desgastadas e carregadas de preconceitos, como é o caso de “doente”, “excepcional”, anormal”. Em 1980, segundo Ribas (1995), a Organização Mundial da Saúde (OMS) estabeleceu uma distinção entre três condições físicas e mentais com a classificação internacional dos casos de: impedimento (do inglês impairment): relaciona-se a uma alteração (dano ou lesão) psicológica, fisiológica ou anatômica em um órgãoou estrutura do corpo humano; deficiência (disability): está ligada a possíveis sequelas que restringem a execução de uma atividade; incapacidade (handicap): relacionada aos obstáculos encontrados pela pessoa com deficiência e sua interação com a sociedade. De acordo com a OMS, deficiência é uma anomalia de estrutura ou de aparência do corpo humano e do funcionamento de um órgão ou sistema, independentemente de sua causa, tratando-se em princípio de uma perturbação de tipo orgânico. No Decreto Federal nº 3.956/2001, deficiência está definida como “uma restrição física, mental ou sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de 2277 exercer uma ou mais atividades essenciais da vida diária, causada ou agravada pelo ambiente econômico e social”. Dica Ao se referir a uma pessoa com deficiência, evite palavras como “defeituoso”, “incapacitado” ou “inválido”. Da mesma forma, pessoas sem deficiência podem ser chamadas de “comuns” ou “sem deficiência”, mas não de “normais”, afinal este é um conceito muito relativo e polêmico. E o que significa incapacidade? A incapacidade reflete as consequências da deficiência no âmbito funcional e da atividade do indivíduo, representando, desse modo, uma perturbação no plano pessoal. E desvantagem, o que é? A desvantagem refere-se às limitações experimentadas pelo indivíduo em virtude da deficiência e da incapacidade, refletindo-se, portanto, nas relações do indivíduo com o meio e na sua adaptação. IMPORTANTE A OMS (Organização Mundial da Saúde) é uma das organizações mais importantes que trabalham continuamente com a definição geral da deficiência. Desde 1980, a Classificação Internacional de Deficiências, Incapacidades e Desvantagens (ICIDH) tem sido o mais importante sistema de classificação no processo de compreender e definir a deficiência; Evite supervalorizar a pessoa, com deficiência, bem sucedida (a que supera limitações). Nem todos têm as mesmas oportunidades e quem não as teve pode se sentir inferior. Em tempo de inclusão, quando se reafirma e se defende os direitos de todas as pessoas, direitos esses dispostos na Constituição Brasileira de 1988, como ficam os termos mencionados anteriormente? Essa é uma questão bem complicada, pois, nos próprios 2288 dispositivos legais encontram-se diferentes termos para nos referirmos às pessoas que apresentam algum tipo de deficiência. 2.2 O direito de ser, sendo diferente, na escola: quem são os diferentes? A alma dos diferentes é feita de uma luz além. Sua estrela tem moradas deslumbrantes que eles guardam para os poucos capazes de os sentir e entender. Nessas moradas estão tesouros da ternura humana dos quais só os diferentes são capazes. Não mexa com o amor de um diferente. A menos que você seja suficientemente forte para suportá-lo depois (Arthur da Távola). Você já parou para pensar sobre o que é ser diferente? Quando se discute a questão da inclusão, é necessário, em primeiro lugar, aceitar que os seres humanos, pelo simples fato de serem pessoas, são diferentes entre si. Podemos citar algumas diferenças, sem, no entanto, esgotar o assunto. Há, por exemplo, uma variedade enorme de diferenças físicas. Muitas são determinadas pela genética, como a cor dos olhos, a cor e o tipo de cabelo, a cor da pele, a altura etc. Outras são determinadas pela interação da genética com o meio ambiente, como ser gordo ou magro (excesso ou escassez de alimento). Outras, ainda, são influenciadas pela cultura. Também, existem diferenças entre as pessoas na forma de sentir, pensar, agir, aprender, interesses e necessidades. Segundo Bueno (1996), a institucionalização da educação especial oportunizou às pessoas deficientes acesso à educação. Elas eram excluídas na medida em que as escolas e as classes especiais não lhes eram destinadas. Assim, eram excluídas do sistema educacional comum, por apresentarem deficits em uma ou mais dimensões da personalidade humana: intelectual, sensorial ou física, que as faziam diferentes dos demais alunos. A escola, por sua vez, baseada no princípio da homogeneidade, não sabia trabalhar com os diferentes e suas diferenças. 2299 PARA VOCÊ REFLETIR O direito à educação não restringe o acesso. A educação precisa ter qualidade de tal forma que garanta que todos os alunos aprendam e se desenvolvam como pessoas. Para que isso seja possível, é imprescindível assegurar a igualdade de oportunidades, proporcionando a cada um o que necessita, em função de suas características e necessidades individuais. Na esteira da homogeneidade, os alunos que fugiam do padrão ou do ideal de aluno esperado pelos profissionais da educação eram excluídos da escola e, mais tarde, excluídos do mercado de trabalho, devido à falta de escolarização. Você saberia dizer quem são os diferentes na escola? Podemos encontrar resposta para essa pergunta na Declaração de Salamanca (1994). O princípio fundamental do Marco de Ação da Conferência Mundial sobre Necessidades Especiais (Salamanca, 1994) indica, segundo Guijarro (2005), que todas as escolas devem acolher a todas as crianças, independentemente de suas condições pessoais, culturais ou sociais; crianças deficientes e superdotados/altas habilidades, crianças de rua, minorias étnicas, lingüísticas ou culturais, de zonas desfavorecidas ou marginalizadas, o qual traça um desafio importante para os sistemas escolares (GUIJARRO, 2005, p. 7). Você percebeu que as diferenças podem estar nas condições pessoais, como, por exemplo, na presença de deficiência, de altas habilidades/superdotação; mas também podem ser decorrentes de outros fatores que são externos à criança: como as condições de vida, origem social, segmento social a que pertence, cultura, raça, entre outros. De acordo com a Declaração de Salamanca (1994), [C] cada criança tem características, interesses, capacidade e necessidades de aprendizagem que lhe são próprios, e todos os sistemas educacionais devem ser projetados e os programas aplicados de modo que tenham em vista toda a gama dessas diferentes características e necessidades (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994, p. 16). Assim, os desafios que se apresentam às escolas inclusivas são vários: garantir a todas as crianças igualdade de oportunidades e completa participação, contribuir para uma educação mais personalizada, fomentar a solidariedade entre todos os alunos e melhorar a relação custo-benefício de todo o sistema educacional. 3300 Figura 2.1 – Mostragem da diversidade Fonte: http://3.bp.blogspot.com/_HfZ- kGV6AlY/RzNYspr_W- I/AAAAAAAAAFA/KrH6-g4WpcI/s1600- h/incl_socialP.gif. Acesso em 29 fev. 2010. Figura 2.2 – A escola recepcionando a diversidade Fonte: Erro! A referência de hiperlink não é válida.. Acesso em 29 fev. 2010. 2.3 Diversidade, diferença, deficiência, necessidades especiais E a questão da diversidade? Hoje, é comum você ouvir que é preciso contemplar a diversidade da escola. O que significa isso? A diversidade que se encontra na escola diz respeito às características de seus alunos. Necessidades educacionais, por exemplo, podem ser identificadas em diversas situações representativas de dificuldades de aprendizagem, como consequência de condições individuais, econômicas ou socioculturais dos alunos. Assim, podemos encontrar na escola, segundo consta no MEC (2005, p. 41): - crianças com condições físicas (deficiência física, paralisia cerebral), intelectuais (deficit intelectual ou habilidades altas/superdotação) sociais, emocionais e sensoriais (cegueira/baixa visão; surdez/deficiência auditiva) diferenciadas; - crianças com deficiência e bem dotadas; - crianças que trabalham ou vivem nas ruas; - crianças de minorias linguísticas, étnicas ou culturais; - crianças de grupos desfavorecidos oumarginalizados; - crianças de populações distantes ou nômades. Nesse sentido, está pressuposto na atenção à diversidade dos alunos na escola que as adequações curriculares podem atender às suas necessidades http://images.google.com.br/imgres?imgurl=http://2.bp.blogspot.com/_-hHNnJOLXxs/Stjlc6YYfiI/AAAAAAAABLA/eGskUECG5do/s320/Escola.jpg&imgrefurl=http://somosglbt.blogspot.com/2009_10_01_archive.html&usg=__ArmQR2CqBzBjdCwCU4We2nrbvSo=&h=281&w=320&sz=28&hl=pt-BR&start=5&um=1&itbs=1&tbnid=RCCpP8m1lGixwM:&tbnh=104&tbnw=118&prev=/images?q=diversidade+na+escola&um=1&hl=pt-BR&sa=N&rlz=1T4ADFA_pt-BRBR371BR371&ndsp=20&tbs=isch:1 3311 particulares de aprendizagem. Assim, uma escola que se quer inclusiva busca consolidar o respeito às diferenças, e as diferenças não são vistas como obstáculos para o desenvolvimento da ação educativa, podem e devem ser vistas como fatores de enriquecimento. O que significa necessidades educacionais especiais? Por que surgiu tal expressão? Necessidades especiais é uma expressão que pode ser usada para se referir a crianças e jovens cujas necessidades decorrem de sua elevada, ou não, dificuldade para aprender. Está associada às dificuldades de aprendizagem, mas não é necessariamente uma dificuldade vinculada à deficiência. Quer dizer: a criança ou o jovem pode ter dificuldades para aprender, mas não é necessariamente deficiente. Mas preste atenção: o atendimento educacional especializado é destinado aos alunos com deficiência. Se nos reportarmos à história da educação especial, vamos encontrar diversos termos utilizados no âmbito escolar para designar a pessoa com deficiências intelectual, física, sensorial: idiota, imbecil, aleijado, excepcional, subnormal, superdotado, incapacitado etc. Esses termos tinham efeitos negativos. O termo necessidades educacionais especiais surgiu para evitar os efeitos negativos dos termos utilizados anteriormente e tem o propósito de deslocar o foco do aluno e direcioná-lo para as respostas educacionais que eles requerem, evitando-se, assim, enfatizar as suas condições pessoais que podem interferir no processo de escolarização (ensino-aprendizagem). Ao se falar em necessidades educacionais especiais, desloca-se o foco do aluno para as condições da escola. Em outras palavras, em vez de se pensar nas dificuldades específicas do aluno, procura-se pensar no que a escola pode fazer para dar respostas às necessidades do aluno. 3322 2.4 Síntese da unidade Nesta Unidade, procuramos oferecer alguns esclarecimentos sobre as diferentes terminologias usadas na referência às pessoas que, por alguma razão, desviam-se do padrão estipulado como desejável dentro de uma sociedade. Vimos que, muitas vezes, os termos deficiência, incapacidade, desvantagem, diversidade, diferença e necessidades especiais são usados como sinônimos. Vimos, por exemplo, que nem sempre uma deficiência gera uma incapacidade e que as desvantagens podem ser decorrentes das condições socioambientais. A diversidade é uma condição natural entre as pessoas, incluindo aquelas que têm deficiência. Na Unidade seguinte, você encontrará mais elementos para compreender melhor o tema aqui abordado ficará sabendo quem são os alunos com Necessidades Educacionais Especiais. 2.5 Atividades 1- Leia a DECLARAÇÃO DE SALAMANCA (1994), linha de ação sobre necessidades educacionais especiais, e destaque as novas ideias sobre as necessidades educacionais especiais. 2- Você já vivenciou alguma situação em que tivesse de fazer algumas mudanças ou adaptações para atender às necessidades especiais de alguém? Descreva como foi e como se sentiu (pode ser uma situação vivenciada na escola ou num espaço não escolar). 2.6 Para saber mais Sites http://www.youtube.com/watch?v=clS0a02UvCU&feature=related Trata-se de um vídeo que mostrará a diversidade que aqui abordamos. http://www.youtube.com/watch?v=v7S06iN5P34&feature=related 3333 Este site disponibiliza os vídeos Diversidades culturais e Diversidade: convivendo com as diferenças. Assistir a esses vídeos o fará compreender melhor o tema em questão. Livros Viva as diferenças, de João Baptista Ribas, editora Moderna (1995). 3344 3355 Unidade 3 Unidade 3 . Inclusão escolar de alunos com necessidades educacionais especiais Na Unidade 2, definimos alguns termos que estão presentes hoje no discurso educacional para se referir às pessoas que têm algum tipo de necessidade educacional especial. Esta Unidade tem por objetivos procurar esclarecer quem são os alunos atendidos pela educação especial, tratar do currículo e das estratégias pedagógicas para atender às suas necessidades especiais e da avaliação que deve ser realizada em consonância com os princípios da inclusão. Antes de definir quem são os alunos atendidos pela educação especial, é preciso entender o que é educação especial. Conforme a Resolução nº 2 do Conselho Nacional de Educação, de 11 de setembro de 2001, que instituiu diretrizes para a educação especial na educação básica, Art. 3º, [P] por educação especial, modalidade da educação escolar, entende- se um processo educacional definido por uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais, organizados institucionalmente para apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica. Como sabemos, o Brasil vem tomando providências e realizando ajustes necessários a esse respeito, com o objetivo de garantir o acesso dos alunos com necessidades educacionais especiais ao sistema regular de ensino, assim como garantir a sua permanência. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional utilizava a terminologia Educação Especial, que até pouco tempo, por uma interpretação talvez equivocada, era vista como 3366 uma educação a parte. Na verdade, essa faceta da Educação Especial é a mais conhecida, levando à organização de escolas separadas, chamadas de especiais ou especializadas (por isso, segundo Bueno (1996), trata-se, na verdade, de um ensino segregado). Elas substituíam o ensino regular. Atualmente, sob uma nova leitura, a Educação Especial ou o Atendimento Educacional Especializado (AEE) tem sido entendido como apoio e complemento “destinado a oferecer aquilo que há de específico na formação de um aluno com deficiência” (FÁVERO, 2007, p. 17) em todos os seus níveis e as suas modalidades, ou seja, desde a educação infantil até o ensino superior. Você pode estar se perguntando: Mas então não existe mais educação especial, já que todos os alunos deverão frequentar o ensino regular? Os alunos com deficiência deverão ser matriculados no ensino regular e a Educação Especial ou Atendimento Educacional Especializado deverá disponibilizar recursos educacionais e estratégias de apoio a esses alunos, de acordo com as necessidades de cada um. Assim, a educação especial é uma forma de tratamento diferenciado que leva à inclusão e não à exclusão de direitos (FÁVERO, 2007, p. 20). O AEE é uma forma de garantir que sejam reconhecidas e atendidas as especificidades de cada aluno com deficiência. Os alunos com deficiência frequentam a classe de ensino regular em um período e em outro são inscritos no Atendimento Educacional Especializado (sala de recursos). Esse atendimento destina-se às pessoas com surdez, deficiência física, deficiência mental, deficiência visual. São consideradas matérias do AEE: Língua Brasileira de Sinais, Língua Portuguesa para surdos, código Braille, orientação e mobilidade, utilização do soroban,
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