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O trabalho do assistente social no CREAS

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO 
PUC-SP 
 
 
FLÁVIA RODRIGUES LIMA DA HORA 
 
 
Cotidiano profissional do assistente social no Creas-Paefi: 
trabalho com famílias na perspectiva de matricialidade sociofamiliar 
 
 
 
 
MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SÃO PAULO 
2014 
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO 
PUC-SP 
 
 
FLÁVIA RODRIGUES LIMA DA HORA 
 
 
Cotidiano profissional do assistente social no Creas-Paefi: 
trabalho com famílias na perspectiva de matricialidade sociofamiliar 
 
 
 
Dissertação apresentada à Banca Examinadora da 
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como 
exigência parcial para a obtenção do título de MESTRE 
em Serviço Social sob a orientação da Professora 
Doutora Myrian Veras Baptista. 
 
MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL 
 
 
 
SÃO PAULO 
2014
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Banca Examinadora 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Às minhas avós Nelinha e Cida 
Mulheres guerreiras que admiro e amo muito! 
AGRADECIMENTOS 
 
 
Neste espaço agradeço a todos que, de alguma maneira, próxima ou distante, viveram 
comigo esta fase tão importante da minha vida. 
Às professoras da PUC-SP: Maria Lúcia Martinelli, Maria Carmelita Yazbek e Maria 
Lúcia Rodrigues. À minha orientadora, Myrian Veras Baptista, obrigada por ter se 
dedicado em cada detalhe desta dissertação e, por meio das reflexões, nas orientações, 
ter me deixado livre e ao mesmo tempo próxima para expor minhas ideias. Obrigada pelo 
compromisso com o Serviço Social, pela sede de aprender, pelo prazer em partilhar e amor 
em ensinar! Minha gratidão e admiração! 
Aos amigos da Prefeitura de São Paulo, Creas Ipiranga, que me encorajaram e 
ajudaram para que essas angústias se transformassem num projeto de pesquisa para o 
mestrado. Agradeço também às colegas e coordenadoras do Creas, com quem pude 
debater a política pública de assistência social na cidade de São Paulo. 
Aos colegas de trabalho do INSS que compreenderam a intensidade desta etapa! À 
Vânia Nery e Stela Ferreira pela inspiração e incentivo ao pensar a Assistência Social! 
Às amigas de faculdade, Ana Paula, Cíntia, Bianca, Sirlene e Dani, que se dispuseram a 
ajudar e refletir comigo as várias etapas do mestrado. Às colegas de mestrado, Keu, 
Edlaine, Fernanda e Alberta, que demonstraram o valor da parceria nessa fase! 
Aos amigos que respeitaram minhas ausências e que sonharam comigo. Obrigada, Tom 
e Mi, Débora e Arnoldo, por serem suporte em amor. Agradeço às minhas amigas de 
jornada, Francini, Anita, Cris e Aline – companheiras para a vida toda. 
Aos meus pais, Cláudio e Cida: essa conquista também é de vocês! 
Aos meus irmãos, Rafael e Natália, às minhas avós, Cida e Nelinha, aos meus tios, 
primos, sogros e cunhada. Muito obrigada pelo amor, incentivo, sonhos e orações! 
Ao meu marido e melhor amigo, Gustavo: ninguém mais que você viveu comigo cada 
alegria e angústia, cada dúvida e descoberta que as páginas desta dissertação contêm! 
Obrigada por ter discutido incansavelmente o tema desta pesquisa comigo, sua sede 
por conhecimento continua me fascinando! Obrigada por ter sido meu editor e revisor, 
por ter disposto da sua profissão para me ajudar. Obrigada por ter sacrificado feriados e 
fins de semana para estar comigo em períodos de estudo, por ter tido paciência! 
RESUMO 
 
 
Título: Cotidiano profissional do assistente social no Creas-Paefi: trabalho com 
famílias na perspectiva de matricialidade sociofamiliar 
 
Autor: Flávia Rodrigues Lima da Hora 
 
 
Esta dissertação trata da prática profissional do assistente social nos Creas-Paefi da 
cidade de São Paulo (SP). Sua elaboração partiu de uma pergunta: como tem se 
dado a prática profissional dos assistentes sociais nos Creas-Paefi, sobretudo no 
que diz respeito ao trabalho com famílias? De acordo com a Política Nacional de 
Assistência Social, de 2004, o Centro de Referência Especializado de Assistência 
Social é o principal equipamento dos serviços prestados no âmbito da proteção 
social especial. Cabe ao Creas o desenvolvimento das ações do Serviço de 
Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos, denominado pela 
sigla Paefi. Este estudo busca apresentar elementos sobre a atual estrutura dos 
Creas da capital do estado de São Paulo e sobre as características das equipes. O 
Paefi tem como característica principal o atendimento a famílias e indivíduos em 
situação de risco e vulnerabilidade por violação de direitos. Para desenvolver suas 
ações, o assistente social se encontra envolto por desafios no âmbito da política de 
assistência social e no sistema de garantia de direitos como um todo. Além dos 
desafios na estrutura da política pública e suas articulações, existem desafios 
relacionados especificamente à prática profissional do assistente social neste 
contexto. Na tentativa de responder à pergunta original, a pesquisa aqui 
apresentada foi desenvolvida com profissionais que trabalham e já trabalharam no 
Paefi e com profissionais envolvidos com a proposta de educação permanente dos 
trabalhadores do Suas. Assim, os sujeitos e o percurso da pesquisa foram definidos 
a partir do entendimento de que o profissional possui potencial de refletir e construir 
conhecimento em seu cotidiano quando estabelecidas as necessárias mediações. 
 
 
 
 
 
Palavras-chave: Assistência social. Prática profissional. Trabalho com famílias. 
Creas. 
ABSTRACT 
 
 
Title: Social Worker Professional Everyday in Creas-Paefi: working with families from 
the perspective of sociofamiliar matriciality 
 
Author: Flávia Rodrigues Lima da Hora 
 
 
 
This dissertation deals with the professional practice of social workers in Creas-Paefi 
of São Paulo (SP). Its preparation began with a question: how has it been the social 
workers professional practice in Creas-Paefi, particularly with regard to work with 
families? According to the 2004 National Social Assistance Policy, the Specialized 
Reference Center for Social Assistance (Creas) is the main equipment of the 
services provided under the special social protection. A Creas is responsible to 
develop the actions of Specialized Care and Protection Services to Families and 
Individuals (named by the acronym Paefi). This study seeks to present the current 
structure and teams' characteristics of Creas working at São Paulo state's capital. 
The Paefi's main goal is to care of families and individuals under rights violation risk 
or vulnerability. To develop their actions the social worker is surrounded by 
challenges within the social assistance policy and rights guarantee system as a 
whole. In addition to the challenges in the structure of public policy and their joints, 
there are challenges related specifically to professional practice of social workers in 
this context. In an attempt to answer the original question, this presented research 
was developed with professionals who work and have worked in Paefi and 
professionals involved with the proposed Suas employees continuing education. 
Thus, the subjects and the course of the study were identified based on the 
understanding that the professional has the potential to reflect and construct 
knowledge in their daily lives when they established the necessary mediations. 
 
 
 
 
 
Keywords: Social work. Professional practice. Working with families. Creas. 
 
LISTA DE SIGLAS 
 
 
BPC Benefício de Prestação Continuada 
CF Constituição Federal 
CNAS Conselho Nacional da Assistência Social 
Cras Centro de Referência da Assistência Social 
Creas Centro de Referência Especializado de Assistência Social 
DOU Diário Oficial da União 
Drads Diretoria Regional de Assistência e Desenvolvimento Social 
ECA Estatuto da Criança e do Adolescente 
Espaso Espaço Público do Aprender Social 
Loas Lei Orgânica de Assistência Social 
MAS Ministério da Assistência e Promoção Social 
MDS Ministério do DesenvolvimentoSocial e Combate à Fome 
MP Ministério Público 
NOB Norma Operacional Básica de Assistência Social 
Paif Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família 
Paefi Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos 
Peti Programa de Erradicação do Trabalho Infantil 
PFA Plano Familiar de Atendimento 
PIA Plano Individual e/ou Familiar de Atendimento 
PMSP Prefeitura do Município de São Paulo 
PNAS Política Nacional de Assistência Social 
PNCFC Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária 
PSB Proteção Social Básica 
PSDB Partido da Social Democracia Brasileira 
PSE Proteção Social Especial 
PT Partido dos Trabalhadores 
SAS Supervisão de Assistência Social 
Smads Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social 
SNAS Secretaria Nacional de Assistência Social 
Suas Sistema Único de Assistência Social 
SUS Sistema Único de Saúde 
UBS Unidade Básica de Saúde 
SUMÁRIO 
 
 
INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 10 
 
CAPÍTULO 1 
 
ORIGENS E MANIFESTAÇÕES DA QUESTÃO SOCIAL: RISCO, 
VULNERABILIDADE E EXCLUSÃO SOB A ÓTICA DA MEDIAÇÃO E DO 
COTIDIANO ...................................................................................................... 25 
 
1.1 Trabalho, Questão Social e a Perspectiva de Totalidade ..................... 25 
1.2 Violência, Violação, Vulnerabilidade, Risco e Exclusão: Faces do 
Sofrimento Ético-Político ................................................................................ 28 
1.3 Cotidiano e o Conceito de Mediação ............................................................. 35 
1.4 Serviço Social na Prática Profissional ........................................................... 40 
 
CAPÍTULO 2 
POLÍTICA SOCIAL, ASSISTÊNCIA SOCIAL: PARA A COMPREENSÃO DO 
LUGAR DO CREAS-PAEFI ................................................................................. 43 
 
2.1 A Política Social ......................................................................................... 43 
2.2 Política Social Brasileira.......................................................................... 47 
2.3 A Política de Assistência Social no Brasil ............................................. 50 
 2.3.1 A Política Nacional de Assistência Social .............................................. 61 
 2.3.2 Creas e Paefi .................................................................................. 65 
 2.3.3 Os Creas na cidade de São Paulo .................................................. 69 
2.4 NOB-Suas, NOB-RH e Política Nacional de Educação Permanente .... 73 
 
CAPÍTULO 3 
A PRÁTICA PROFISSIONAL DO ASSISTENTE SOCIAL NO CREAS: O 
TRABALHO COM FAMÍLIAS E INDIVÍDUOS NO PAEFI ................................... 77 
 
3.1 Notas para Compreender o Percurso da Análise dos Dados ............... 77 
3.2 O Creas – A Unidade Central da Proteção Social Especial .................. 79 
3.3 Creas e Intersetorialidade ....................................................................... 92 
3.4 Os Assistentes Sociais nos Creas-Paefi da Capital na Atualidade ..... 96 
 3.4.1 Núcleo de Proteção Jurídico Social e Apoio Psicológico ................ 97 
3.5 O Cotidiano do Assistente Social no Creas: o Trabalho com 
Famílias e Indivíduos no Paefi .................................................................... 100 
 3.5.1 O trabalho com famílias no Paefi .................................................. 101 
 3.5.2 A articulação intersetorial no Paefi e a questão da judicialização 
da proteção social especial ......................................................... 104 
 3.5.3 A matricialidade sociofamiliar como enfrentamento à visão 
conservadora no trabalho com famílias ...................................... 113 
3.6 O Cotidiano e a Prática Profissional no Trabalho com Famílias ....... 124 
 
 
CAPÍTULO 4 
A PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO PERMANENTE COMO POSSIBILIDADE 
DE MEDIAÇÕES NO COTIDIANO DE TRABALHO ......................................... 132 
 
4.1 O Porquê de Aproximar as Reflexões da Educação Permanente ao 
Creas-Paefi ............................................................................................. 132 
4.2 Sobre a Educação Permanente ............................................................. 133 
4.3 A Formação no Percurso Profissional ................................................. 139 
4.4 Gestão e Autogestão do Tempo e do Trabalho: a Criação de 
Espaços de Reflexão ............................................................................. 141 
4.5 Amarrando as Ideias .............................................................................. 146 
 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 148 
 
REFERÊNCIAS .................................................................................................. 152 
APÊNDICES 
 
10 
 
INTRODUÇÃO 
 
O presente é tão grande, não nos afastemos. [...] 
O tempo é minha matéria, o tempo presente, 
os homens presentes, a vida presente. 
(Mãos Dadas – Carlos Drumonnd de Andrade) 
 
 
O interesse pelo estudo da proteção social advém da etapa de graduação da 
pesquisadora deste trabalho, período em que, gradativamente, buscou-se estudar e 
aprofundar as temáticas de política social e de proteção social. A partir da 
participação no Programa de Educação Tutorial (PET) – Serviço Social da 
Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (Unesp) de Franca, foi 
possível traçar contornos, seja pelos estudos e pesquisas desenvolvidos em grupo, 
seja pelo desenvolvimento do próprio projeto de pesquisa para a elaboração do 
Trabalho de Conclusão de Curso, construído em dupla com uma colega de classe e 
de PET, donde frutificou uma bela amizade. 
O referido trabalho, intitulado FOME – Miséria e Privação: avaliação de 
impacto do Bolsa Família no município de Barra do Turvo-SP1, sob orientação da 
Profa. Dra. Patrícia Soraya Mustafa, deu-se em parte pela efervescência do tema na 
época – a unificação de diversos Programas de Transferência de Renda, a criação 
do Programa Bolsa Família e a discussão sobre políticas sociais de combate à fome 
por meio do Programa Fome Zero – e, em parte, pela preocupação das 
 
1
 No período da pesquisa para a elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso, o Município de 
Barra do Turvo (SP), no Vale do Ribeira, possuía o quinto menor Índice de Desenvolvimento Humano 
(IDH) do estado de São Paulo. O Vale do Ribeira, localizado no sul do estado de São Paulo, ainda é 
a região como menor desenvolvimento econômico e indicadores sociais mais desfavoráveis, como o 
analfabetismo e mortalidade materno-infantil. A pesquisa foi realizada com profissionais da Diretoria 
Regional de Assistência e Desenvolvimento Social (Drads) de Registro, do Centro de Referência da 
Assistência Social (Cras) de Barra do Turvo (SP), com famílias beneficiárias do Bolsa Família e com o 
senador Eduardo Suplicy (PT-SP), autor do livro Renda Básica de Cidadania – A saída é pela porta 
(CORTEZ; PERSEU ABRAMO, 2003) e da Lei 10.835\2003, que institui a Renda Básica de 
Cidadania. Em síntese, a pergunta originária do estudo era: qual o impacto do Bolsa Família no 
combate à fome das famílias beneficiárias? Há que se ressaltar que o combate à fome não foi 
abordado no referido trabalho em uma perspectiva de focalização para satisfação apenas do mínimo 
de sobrevivência como ração humana, mas do ponto de vista de Direito Humano à Alimentação, que 
aponta, como horizonte, para a satisfação das necessidades humanas (PEREIRA, 2002) e dos 
direitos sociais como um todo. Outras discussões sobre a temática do direito humano à alimentação 
se desenvolveram, mas as pesquisadoras não deram seguimento à análise do tema, pois em seus 
percursos profissionais realizaram outros estudos.Contudo, cabe destacar a Ementa Constitucional 
064\2010, que incluiu no artigo 6
o
 da Constituição Federal o direito à alimentação como direito social, 
ao lado da saúde, educação, do trabalho, da moradia, do lazer, da previdência social, assistência aos 
desamparados e proteção à maternidade e à infância. 
11 
 
pesquisadoras com a realidade extrema a que pode chegar a exclusão no sistema 
capitalista. 
Assim, desde aquele momento, já havia preocupação desta pesquisadora 
com o sofrimento e a dor oriundos da situação de pobreza e subalternidade, de ser 
considerado como “apêndice da sociedade” (SAWAIA, 2001). 
A primeira experiência profissional da pesquisadora, como assistente social 
formada, deu-se no município de Registro (SP), no Vale do Ribeira, no extinto 
Serviço Sentinela, cujo trabalho era voltado para o atendimento a crianças e 
adolescentes em situação de violência doméstica (negligência, violência física, 
psicológica, abuso e exploração sexual). Posteriormente, após determinações do 
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), o Serviço Sentinela 
passou a ser denominado Serviço de Enfrentamento à Violência, Abuso e 
Exploração Sexual Contra Crianças e Adolescentes. Tal mudança não representou 
apenas alteração de nomenclatura, mas um redirecionamento das ações que 
passaram a ser mais exógenas, articuladas com as demais políticas públicas, por 
meio de ações preventivas. 
Entre 2008 e 2009, iniciou-se no município de Registro (SP) o processo de 
transição da tipologia “Serviço de Enfrentamento” para Centro de Referência 
Especializado de Assistência Social (Creas). Neste ínterim, a pesquisadora foi 
aprovada em concurso público da Prefeitura do Município de São Paulo, (PMSP) 
para o posto de trabalho como assistente social em uma Unidade Básica de Saúde 
(UBS) da zona norte da capital. 
Além das atividades peculiares da prática profissional na atenção básica no 
Sistema Único de Saúde (SUS), a pesquisadora participou de reuniões do Comitê de 
Violência, a fim de identificar na rotina da UBS e do Programa de Saúde da Família 
(PSF) situações de negligência e violência. Eram recorrentes situações de violência, 
sobretudo com mulheres, crianças, idosos e pessoas com deficiência. E não poucas 
vezes foram realizados atendimentos a bolivianas, vítimas de violência sexual nas 
oficinas de costura, onde eram submetidas também a situações degradantes de 
trabalho e moradia. 
12 
 
Em maio de 2011, a pesquisadora assumiu, na Secretaria Municipal de 
Assistência Social (Smads), a coordenação do Creas Ipiranga – inaugurado em 
março daquele mesmo ano. 
O Creas é uma unidade pública, inserida no Sistema Único de Assistência 
Social (Suas), e parte constitutiva da Proteção Social Especial de média 
complexidade. Conforme o artigo 6o C - § 3o, da nova redação da Lei Orgânica de 
Assistência Social (Loas)2, destina-se à prestação de serviços a indivíduos e famílias 
em situação de risco pessoal ou social por violação de direitos ou por contingência. 
No âmbito do Creas é desenvolvido o Serviço de Proteção e Atendimento 
Especializado a Famílias e Indivíduos (Paefi), que, de acordo com a Tipificação 
Nacional de Serviços Socioassistenciais (BRASIL, 2009, p. 20), destina-se ao 
atendimento de famílias e indivíduos que vivenciam violações de direitos por 
ocorrência de: 
 Violência física, psicológica ou negligência; 
 Violência sexual: abuso, e\ou exploração sexual; 
 Afastamento do convívio familiar devido à aplicação de medida 
socioeducativa ou medida de proteção; 
 Tráfico de pessoas; 
 Situação de mendicância; 
 Abandono; 
 Vivência de trabalho infantil; 
 Discriminação em decorrência da orientação sexual e\ou raça\etnia; 
 Outras formas de violação de direitos decorrentes de 
discriminações\submissões a situações que provocam danos e agravos 
a sua condição de vida e os impedem de usufruir autonomia e bem 
estar; 
 Descumprimento de condicionalidades do PBF e do PETI em 
decorrência da violação de direitos. 
 
Desse modo, o Paefi tem como objetivos contribuir para o fortalecimento da 
família em sua função protetiva, para incluí-la no sistema de proteção social, 
restaurando e preservando a dignidade dos usuários, a fim de romper uma cultura 
violadora de direitos e prevenir a reincidência dessa violação. 
Também no âmbito do Creas deve ser desenvolvido o Serviço de Proteção 
Especial a Adolescentes, para o cumprimento de Medidas Socioeducativas em meio 
aberto de Liberdade Assistida (LA) e de Prestação de Serviços à Comunidade 
(PSC), com o objetivo de acompanhar o adolescente em seu processo de 
 
2
 Lei 12.435, de 6 de julho de 2011. 
13 
 
desenvolvimento, buscando romper com a prática do ato infracional, e facilitando 
seu acesso aos direitos e à garantia da convivência familiar e comunitária. 
Como visto, a oferta de serviço no Creas preconiza o preparo para o 
atendimento de situações diversas e adversas. O Guia de Orientações Técnicas – 
Creas (BRASIL, 2011, p. 28, grifo nosso) expõe que: 
O trabalho social especializado ofertado pelo Creas [...] implica, ainda, em 
maior domínio teórico-metodológico por parte da equipe, intencionalidade e 
sistematicidade no acompanhamento a famílias/indivíduos em situação de 
risco pessoal e social, por violação de direitos. 
 
Assim, formulam-se as seguintes perguntas, frutos de inquietações: como se 
dá, no cotidiano, o domínio teórico-metodológico por parte dos profissionais no 
Creas? De que modo ocorre a intencionalidade no acompanhamento a 
famílias/indivíduos? Particularmente, como são a apreensão e vivência no cotidiano 
dos assistentes sociais? 
O Creas, que a pesquisadora teve a oportunidade de coordenar, está 
localizado na zona sul da capital paulista, especificamente no bairro do Ipiranga – e 
por esse motivo é denominado Creas Ipiranga – e abarca os distritos dos bairros 
Ipiranga, Sacomã e Cursino, totalizando 463.804 habitantes3. 
Ao Creas Ipiranga cabia o atendimento e acompanhamento de famílias e 
indivíduos em situação de ameaça ou violação de direitos, por meio do Paefi, e a 
supervisão técnica da rede de serviços socioassistenciais conveniados pela Smads. 
À época, essa rede continha: cinco Serviços de Acolhimento Institucional para 
Crianças e Adolescentes; um Centro de Acolhida 24 Horas para População em 
Situação de Rua; dois Serviços de Proteção Especial a Adolescentes em 
Cumprimento de Medidas Socioeducativas; um Centro de Defesa e Convivência da 
Mulher; e um Núcleo de Proteção Jurídico Social. 
No cotidiano profissional, observou-se que a composição das equipes do 
Creas não estava em consonância com o previsto na NOB-RH Suas4. Na realidade 
de São Paulo, em muitos casos, os Creas funcionavam com equipes incompletas. 
 
3
Dados de 2010, disponíveis em: 
<http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/subprefeituras/subprefeituras/dados_demograficos
/index.php?p=12758>. Acesso em: 20 maio 2014. 
4
 A NOB RH –SUAS preconiza que as equipes referência do Creas contenham: 1 coordenador, 2 
assistentes sociais, 2 psicólogos, 1 advogado, 4 educadores sociais e 1 funcionário administrativo. 
14 
 
Outra questão delicada se constituía na supervisão de serviços 
socioassistenciais agregada à implantação do Paefi. Em algumas situações, os 
técnicos encontravam-se sobrecarregados tendo de conciliar as tarefas de 
supervisão e atendimento no Paefi. 
Há que se destacar que, na capital, os Serviços de Proteção Especial a 
Adolescentes em Cumprimento de Medidas Socioeducativas e, mais recentemente, 
o Paefi – por meio do Núcleo de Proteção Jurídico Social – têm sido desenvolvidos 
mediante parcerias público/instituições privadas, o que confronta gravemente o que 
está previsto na Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais, e, por 
conseguinte, no Suas como um todo. Dessemodo, em muito há divergências na 
execução da política de assistência social em âmbito municipal. 
Além dessas características, a própria identidade do Creas se constituía como 
um desafio para os profissionais, a rede de serviços socioassistencial e as outras 
políticas públicas. Eram recorrentes as situações em que outros representantes do 
Sistema de Garantia de Diretos não reconhecia ou tinha dúvidas quanto às 
atribuições do Creas. 
Ademais das questões estruturais, a complexidade das demandas e as 
estratégias a serem adotadas no atendimento à população também se revelaram 
como foco de preocupação e angústia no cotidiano dos assistentes sociais no 
Creas-Paefi. 
A curiosidade inicial da pesquisadora estava em como fazer o trabalho com 
as famílias, mas, quando do estudo da Política Nacional de Assistência Social 
(PNAS), essa indagação se estendeu, também, para a realidade do Creas, 
justamente por entender que não há como tratar do fazer profissional sem tratar da 
estrutura em que esse profissional se insere. 
Contudo, há que se destacar que o tema “trabalho com famílias” tem se 
mostrado um tanto nebuloso no Serviço Social, configurando-se em campo de 
tensão nos últimos anos, seja pelas tendências ao neoconservadorismo, seja por 
uma vertente crítica que defende que qualquer forma de trabalho com famílias já 
caracteriza-se per si como conservadora. 
Sobre o desenvolvimento de pesquisas acerca do trabalho com famílias, 
Iamamoto (2011, p. 461) ressalta: 
15 
 
É fundamental a retomada dos estudos sobre a família trabalhadora e as 
transformações que nela vêm sendo operadas como parte das relações 
sociais abrangentes: adensar de historicidade a análise social das famílias 
como contraponto às análises do campo da clínica, de teor psicologizante, 
como a única alternativa para os estudos das relações familiares. O estudo 
da família foi alvo de pouco investimento de pesquisa no passado recente 
da profissão, o que abriu caminho às abordagens sistêmicas e 
psicossociais, inspiradas em áreas correlatas e com forte teor conservador. 
Mas a retomada do tema está também relacionada ao fato de a família ser 
alvo da maior parte dos programas previstos pelas políticas sociais públicas 
(criança e adolescente, idoso, segurança alimentar, portadores de 
necessidades especiais, etc.). 
A partir da afirmação da autora, é possível reconhecer que deixar de 
pesquisar ou desqualificar as pesquisas relacionadas à família tem sido um 
equívoco na profissão, tanto pelo risco de assumir “teor psicologizante” no trabalho 
com elas, quanto pelas demandas cotidianas de trabalho apresentadas pela atual 
configuração das políticas sociais. 
Diante desse dilema, nesta dissertação, buscou-se trazer à pauta diferentes 
ênfases a respeito dessa discussão, a partir de leituras que atentam para o efetivo 
risco do conservadorismo e tendência ao familismo apontada por Campos e Mioto 
(2012), bem como de outras que indicam a matricialidade sociofamiliar como um dos 
eixos da PNAS que requer mais estudo e atenção. 
Assim, no ambiente da prática profissional, as primeiras perguntas que 
constituiriam o projeto começaram a tomar forma: Qual a estrutura dos Creas em 
São Paulo? Como tem se configurado o ambiente de trabalho? De que maneiras, e 
com que possibilidades, entraves e perspectivas os assistentes sociais vêm 
construindo sua prática profissional no Creas? Como tem se dado o trabalho com 
famílias no Paefi? Que possibilidades esses profissionais vislumbram no Suas, a 
partir desse espaço de trabalho? 
A intenção de alinhavar as perguntas formuladas na trajetória profissional, 
sobretudo nos desafios prementes postos ao Creas, culminou, em 2012, no projeto 
de pesquisa para o mestrado. A pesquisadora traz consigo a inquietação de outros 
profissionais – colegas assistentes sociais e coordenadores de Creas –, mas traz 
também inquietações suas que espera responder ou – quem sabe? – contribuir para 
reflexões presentes e futuras sobre a realidade do assistente social nesse contexto. 
16 
 
A pesquisa outrora proposta e aqui desenvolvida tem por objetivo geral 
analisar – a partir das categorias cotidiano e mediação – a prática profissional do 
assistente social nos Creas-Paefi na cidade de São Paulo. 
Os objetivos específicos são: 
 Compreender a estrutura do Creas-Paefi na cidade de São Paulo; 
 Conhecer o cotidiano do assistente social no Creas; e 
 Refletir a respeito do trabalho que o assistente social desenvolve com 
famílias e indivíduos no Paefi. 
Na qualificação do projeto, foi possível redefinir os objetivos específicos, bem 
como receber importantes indicações de bibliografias e sugestões de abordagens 
para a pesquisa. Na ocasião, foi sugerido que, à indagação pelo fazer profissional no 
trabalho com famílias, fosse agrupada a reflexão acerca da Política Nacional de 
Educação Permanente, visto que esse debate abarca tanto a questão da estrutura e 
da gestão do trabalho como a formação profissional para as especificidades do 
Suas. 
Inicialmente, a proposta era realizar uma entrevista grupal com assistentes 
sociais inseridos no Paefi e com profissionais da gestão da Smads atuantes na 
chamada “frente de Creas”. Entretanto, como dito anteriormente, no exame de 
qualificação, aventou-se a possibilidade de incluir na pesquisa sujeitos envolvidos na 
discussão acerca da educação permanente. Tomou forma, então, um processo para 
decidir quem seriam os sujeitos desta pesquisa, a quantidade de profissionais a 
serem pesquisados e suas características, e qual seria a estrutura do convite à 
pesquisa. 
Nesse processo de escolha e preparo, foi necessário retomar os objetivos do 
trabalho e os caminhos que a pesquisadora desejava percorrer para alcançá-los. 
Nesse sentido, Martinelli (1999, p. 115) reforça que 
[...] o que determina a dimensão do grupo de sujeitos com os quais vamos 
dialogar é “o quê” estamos buscando, é o sentido da pesquisa, o objetivo 
para o qual se direciona, o que torna evidente que a seletividade do sujeito 
deve estar a favor da pesquisa e não contra ela. 
 
17 
 
Considerando que cada palavra é revestida de especial significado, pois cada 
sujeito (na perspectiva de sujeito coletivo) participante da pesquisa traz consigo a 
fala de seus pares, de seu grupo, 
[...] trabalhamos com a concepção de sujeito coletivo, no sentido de que 
aquela pessoa que está sendo convidada para participar da pesquisa tem 
uma referência grupal, expressando de forma típica o conjunto de vivências 
de seu grupo. Importante nesse contexto, não é o número de pessoas que 
vai prestar a informação, mas o significado que esses sujeitos têm em 
função do que estamos buscando na pesquisa. (MARTINELLI, 1999, p. 24). 
 Assim, esta pesquisa conta com sete participantes: dois profissionais 
envolvidos com a educação permanente; três assistentes sociais inseridas no Creas-
Paefi; e dois assistentes sociais que passaram pelo Creas-Paefi, mas atualmente 
estão na gestão (gabinete) da Secretaria Municipal de Assistência Social. 
Optou-se pela metodologia de entrevista grupal, pois, segundo Lakatos e 
Marconi (1986), auxilia os entrevistados a se transportarem mais facilmente à sua 
realidade e proporcionam a interação entre o pesquisador e os sujeitos da pesquisa. 
A pesquisadora fez uso apenas de perguntas norteadoras, abertas, e os 
encontros aconteceram com duas duplas e um trio de profissionais. Ter optado por 
não entrevistar profissionais sozinhos evidencia a intencionalidade de imprimir o 
caráter coletivo no estudo. O fato de terem sido entrevistados poucos profissionais 
foi considerado positivo, uma vez que todos puderam discorrer largamente sobre o 
tema. A esse respeito, Martinelli (2005, p. 122-3) avalia: 
[...] uma característica bastante marcante da pesquisa qualitativa é 
trabalhar-se com pequenos grupos de sujeitos. O importante é a densidade 
da experiência e não a extensão do grupo [...] o interessedo pesquisador é 
conhecer a experiência social de sujeitos específicos, os significativos que 
atribuem ao tema pesquisado. 
Buscou-se proporcionar um ambiente em que as entrevistadas se sentissem à 
vontade para expor suas ideias. Assim, a temática da entrevista grupal foi 
esquematizada em três pilares: o Creas, a prática profissional no Creas e a 
educação permanente. 
A primeira entrevista foi realizada com duas profissionais (Quadro 1), que, em 
suas trajetórias profissional e acadêmica, estavam habituadas a tratar de temas 
como: assistência social, interdisciplinaridade e educação permanente. Ocorreu em 
18 
 
dois encontros: no início e no fim do mês dezembro de 2013, ambas com duração 
de aproximadamente uma hora. 
 
Quadro 1 – Perfil das profissionais de educação permanente 
Perfil Formação 
Trajetória profissional 
na PMSP 
Profissional de 
educação 
permanente 1 
Graduada em Serviço Social e 
Psicologia; mestra em Psicologia 
Social; e doutora em Serviço Social 
pela PUC-SP 
Servidora da PMSP no 
Espaço do Aprender Público 
e Social (Espaso) 
Profissional de 
educação 
permanente 2 
Graduada em Ciências Sociais; 
mestra e doutoranda em Serviço 
Social 
Atuou por um período (no ano 
de 2013) na PMSP no Espaso 
Fonte: Elaboração própria. 
 
A segunda etapa de entrevistas ocorreu em março de 2014. Enviou-se um 
convite com o resumo da proposta da pesquisa aos profissionais assistentes sociais 
que atuam no Paefi. Nesse ponto foi necessário decidir se a pesquisa abarcaria 
também profissionais que atuam no Paefi via parceria público-privada. 
Considerando os princípios que norteiam este estudo – sobretudo a defesa da 
política pública de assistência social como direito e, por conseguinte, do Creas como 
serviço continuado –, optou-se por enfatizar que a pesquisa apenas seria realizada 
com assistentes sociais servidores públicos. 
Com isso, evidenciou-se o quadro dos 26 Creas5 da capital: em apenas 
quatro deles, a equipe é composta por servidores públicos; desses, dois são Creas 
POP – destinados exclusivamente ao atendimento à população em situação de rua – 
e dois executam o Paefi, Creas Mooca e Creas Sé. Nos 22 demais, o serviço do 
Paefi é ofertado por meio do Núcleo de Proteção Jurídico Psicossocial (NPJ). 
 
5
 São estes os Creas: Norte – Jaçanã/ Tremenbé; Vila Maria; Casa Verde; Santana; Freguesia do Ó; 
Pirituba; Perus; Sul – Campo Limpo; M’Boi Mirim; Capela do Socorro; Cidade Ademar; Santo Amaro; 
Leste – Itaim Paulista; Itaquera; São Matheus; Guaianases; Sudeste – Mooca; Vila Prudente; 
Ipiranga; Jabaquara; Penha; Aricanduva; Centro/Oeste – Sé, Creas POP Bela Vista; e Creas POP 
Barra Funda. Disponível em: 
<http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/assistencia_social/creas/index.php?p=2003>. 
19 
 
Dado o pequeno número de profissionais lotados nos dois únicos Paefis de 
execução direta, o fato de, em resposta ao convite inicial, três assistentes sociais 
terem se prontificado a participar da pesquisa, permite inferir que poucos deixaram 
de dar a sua contribuição. Portanto, apesar do pequeno número de profissionais, tal 
presença tem expressão. 
Nesta etapa, a entrevista grupal foi realizada em apenas um encontro, com 
duração aproximada de duas horas, e teve como base três grandes eixos: o Creas, 
a prática profissional do assistente social no Creas e o trabalho com famílias 
no Paefi. As entrevistadas (Quadro 2) puderam discorrer sobre as temáticas 
propostas e, esporadicamente, a pesquisadora acrescentava questões norteadoras. 
 
Quadro 2 – Perfil das assistentes sociais do Creas-Paefi 
Perfil Formação 
Trajetória profissional 
na PMSP 
Assistente social 
do Creas-Paefi 1 
Graduada em Serviço Social 
há 27 anos; especialista em 
Gestão de Políticas Públicas 
Experiência profissional em dois 
Creas (Guaianases – zona leste – e 
Sé) 
Assistente social 
do Creas-Paefi 2 
Graduada em Serviço Social 
há 8 anos; especialista em 
Gestão de Pessoas 
Experiência profissional na 
Secretaria Municipal de Saúde; 
atualmente, assistente social no 
Creas-Sé 
Assistente social 
do Creas-Paefi 3 
Graduada em Serviço Social 
há 10 anos 
Quatro anos de experiência 
profissional no Creas-Mooca como 
coordenadora; atualmente, 
assistente social 
Fonte: Elaboração própria. 
 
Na terceira e última etapa de coleta de dados, a entrevista foi realizada com 
duas assistentes sociais (Quadro 3) que passaram pelo Creas e pelo Paefi e 
atualmente exercem sua prática profissional no gabinete da Secretaria Municipal de 
Assistência Social – ambas na área da proteção social especial de média e alta 
complexidade. 
 
20 
 
Quadro 3 – Perfil das assistentes sociais do Creas-Paefi - gestão 
Perfil Formação 
Trajetória profissional na 
PMSP 
Assistente 
social – 
gestão 1 
Graduada em Serviço 
Social há 14 anos; mestra 
em Gerontologia (PUC-
SP); especialista em 
Violência Doméstica e 
Saúde Mental 
Três anos de experiência no Creas-Vila 
Prudente, como assistente social, membro e 
coordenadora da equipe de proteção especial 
da extinta CAS – Sudeste; atualmente, membro 
da equipe de proteção especial do gabinete de 
Smads na frente de serviços de acolhimento 
institucional para crianças e adolescentes 
Assistente 
social –
gestão 2 
Graduada em serviço 
social há 11 anos 
Assistente social no Creas-Vila Prudente e 
coordenadora no Creas-Aricanduva; 
atualmente, membro da equipe de proteção 
especial do gabinete de Smads na frente de 
Creas 
Fonte: Elaboração própria. 
 
Essa entrevista transcorreu como as anteriores, de modo fluido, em que as 
entrevistadas discorreram a partir dos três eixos: o Creas, a prática profissional do 
assistente social no Creas e o trabalho com famílias no Paefi. O foco foi o relato 
de suas experiências no Paefi e as reflexões sobre as suas atuações como 
assistentes sociais inseridas na gestão da política, na cidade de São Paulo. 
Importa destacar que, como se sabe, a assistência social é uma política em 
movimento e que no período de elaboração do projeto de pesquisa, no exame de 
qualificação e na fase de coleta dos dados, mudanças significativas ocorreram na 
cidade de São Paulo: de gestão municipal, em razão das eleições realizadas em 
outubro de 2012 (quando foi eleito o prefeito Fernando Haddad – PT-SP para o 
período de 2013-2016); realização de concurso público no Tribunal de Justiça do 
Estado de São Paulo, que resultou na exoneração de várias assistentes sociais que 
estavam lotadas nos Creas. Em âmbito nacional, as mudanças significativas foram a 
publicação da nova versão da Norma Operacional Básica (NOB) do Suas, em 3 de 
janeiro de 2013, e a da Política Nacional de Educação Permanente, em 20 de março 
de 2013. 
Diante do exposto, a presente dissertação de mestrado foi construída com o 
intuito de contribuir para a reflexão da prática profissional do assistente social no 
21 
 
Creas-Paefi, com base na perspectiva marxista e a partir da compreensão do serviço 
social como prática profissional, elemento constitutivo da prática social. 
Assim, para alcançar os objetivos propostos, este trabalho foi estruturado em 
duas partes. A primeira contém dois capítulos: o primeiro capítulo trata das bases 
teóricas do estudo e o segundo capítulo trata da política social. 
No primeiro capítulo, julgou-se como etapa necessária ao caminho a ser 
percorrido abordar os temas trabalho, questão social, violação, vulnerabilidade, 
risco, exclusão, bem como o conceito de sofrimento ético-político. Buscou-se avaliar 
e situar cada uma dessas temáticas no solo do sistema capitalista e em suas 
características excludentes. 
 No transcorrer desse capítulo, com o intuito de definir o eixo norteador para a 
análise da pesquisa, as categorias cotidiano e mediação foram abordadas com base 
nos escritos de Lukács (1979), Heller (1994, 2008) e Pontes (2001). Tal ênfase se 
justifica pela compreensãodas potencialidades e dos riscos implícitos na 
cotidianidade, bem como das necessárias mediações implícitas no fazer profissional. 
No último item, desfecho do capítulo, refletiu-se acerca da possibilidade de 
considerar o “que fazer” do assistente social como trabalho ou como prática 
profissional. Nessa reflexão, foi possível – e necessário – pontuar a preferência da 
pesquisadora pela premissa de considerar esse “que fazer” como prática profissional 
do assistente social. 
O segundo capítulo desenvolve a temática da política social, notadamente a 
política de assistência social. A política social na cena brasileira é abordada com 
ênfase no período pós-Constituição de 1988, por ser este um momento emblemático 
para a Seguridade Social, sobretudo pelo reconhecimento da assistência social 
como política pública de seguridade. 
No mesmo capítulo, é apresentado um rápido panorama da configuração da 
assistência social como política pública da seguridade social, seus percalços e suas 
conquistas até a criação do Suas, a publicação da PNAS, que, por sua vez, implicou 
a criação dos níveis de proteção básica e especial e, no bojo desta última, o Creas. 
Também são temas abordados: as Normas Operacionais Básicas do Suas (NOB-
2005, NOB-2012 e NOB-RH) e a Política Nacional de Educação Permanente do 
Suas, publicada em 2013. 
22 
 
A opção por mencionar essas normativas, na sequência do item Creas 
justifica-se pela intencionalidade deste estudo de refletir sobre o profissional, o 
assistente social no Creas. Por isso, as informações sobre equipes de referência, 
sobre a estrutura do Creas, a gestão do trabalho no Suas e a formação continuada 
de seus profissionais, aparecem como coadjuvantes – muito importantes! – para 
promover a reflexão sobre a prática profissional do assistente social no Creas-Paefi. 
Assim, neste capítulo, optou-se apenas por apresentar a política de 
assistência social, notadamente, o Creas, centrando-se em sua estrutura e 
características, a fim de compartilhar na reflexão sobre os avanços e retrocessos, 
limites e possibilidades, contidos no panorama dos Creas – o que se dará nos 
capítulos de análise dos dados. 
Na segunda parte desta dissertação, estão contidos o terceiro e o quarto 
capítulos. No terceiro capítulo, debruçou-se sobre o conhecimento e a reflexão 
acerca da realidade do Creas na capital paulista. Não foi possível realizar – e não 
era proposta desta pesquisa – a análise de cada unidade do Creas, mas buscou-se 
conhecer o panorama atual geral dos Creas no município. 
Como já exposto, na realização das entrevistas, foram eleitos três pilares 
temáticos para análise: o Creas; o assistente social no Creas; e a prática profissional 
do assistente social no Paefi. A análise da fala dos profissionais, a partir desses três 
pilares, deu-se com base nas categorias cotidiano e mediação. 
O referencial teórico da pesquisadora e os elementos apresentados nos 
capítulos anteriores serviram como linha para alinhavar as falas, as experiências, as 
análises e a realidade de cada profissional. Assim, o exercício neste capítulo 
consistiu em acolher a fala dos profissionais, refletir sobre elas e analisá-las, com o 
intuito de extrair destas – nas palavras de Lefebvre – “as riquezas do cotidiano”. 
Por esse motivo, optou-se por não fazer muitos cortes nas falas das 
profissionais entrevistadas. Suas falas foram longas, intensas, ricas de história, de 
preciosas análises, de alegria e de sofrimento vividos na prática profissional. O ritmo 
e a intensidade de cada fala representam bem os desafios da política de assistência 
social, sobretudo no Creas-Paefi. Nesse sentido, Martinelli (2005, p. 74) contribui 
para a reflexão da prática teórica sob uma perspectiva histórica: 
 
23 
 
O saber que decorre da própria prática e que acumulamos na vivência com 
os sujeitos usuários das instituições é extremamente valioso, e se bem 
soubermos utilizá-lo teremos aí excelente material para produção de novas 
mediações capazes de nos levar a atingir os objetivos buscados. Não há 
prática pronta, tampouco prática neutra; sua produção como teoria em 
movimento é um ato coletivo, político, uma ação cooperativa e 
complementar entre os sujeitos sociais, sejam eles agentes, sejam usuários 
institucionais. 
 
É importante destacar que, intencionalmente, buscou-se abordar o “trabalho 
com famílias” justamente por se tratar de assunto estigmatizado no serviço social, de 
forma que, sempre que possível, ao longo deste estudo, esse tema foi situado como 
“trabalho com famílias e indivíduos” na perspectiva da matricialidade sociofamiliar. 
No quarto capítulo, prossegue-se à apresentação do material colhido nas 
entrevistas, contudo com um direcionamento para a temática da formação 
continuada do assistente social para as demandas do Paefi. 
Num primeiro momento, a pesquisadora aventou a possibilidade de trazer o 
conteúdo deste capítulo como apêndice da dissertação, porém, após refletir, ficou 
clara sua vinculação com o terceiro capítulo – que trata especificamente do Paefi. 
Assim, por compreender que esse tema não está diretamente ligado ao objeto da 
pesquisa – mas se constitui como uma importante perspectiva a ser discutida a 
respeito da prática profissional –, neste item não foi realizada uma análise profunda 
da temática, tampouco se teve por proposta debater a perspectiva da educação 
permanente, mas sim fomentar seu potencial para a reflexão da prática profissional 
cotidiana do assistente social nos Creas. Nesse sentido, buscou-se enfatizar o valor 
dos percursos formativos da trajetória profissional e a indicação da perspectiva da 
educação permanente como instrumento potente para o fortalecimento da prática 
profissional no Suas. 
Em suma, esta dissertação é parte de uma série de produções que vem 
debatendo a assistência social como política pública. Espera-se que as reflexões e 
os resultados aqui apresentados subsidiem o amadurecimento acerca da prática 
profissional do assistente social nesta política e o seu trabalho no Creas. 
Tomando como inspiração a reflexão da Profa. Dra. Aldaíza Sposati – que fez 
uma interessante análise da Loas e a denominou de “a meninas Loas” –, pode-se 
dizer que se acompanha no Brasil o desenvolvimento da “menina PNAS”, que conta 
com 10 anos de idade, e do “menino Suas”, que – no momento desta pesquisa – 
24 
 
conta com apenas com 3 anos e alguns meses6. Que esse crescimento e esse 
desenvolvimento se deem de forma saudável, protegida de riscos e violações, e que 
prossigam, com status de direito de cidadania a quem dela necessitar e, quem sabe, 
até um dia em que o trabalho com vítimas de violação não seja mais necessário. 
 
6
 A contar da publicação da Lei 12.435, de 6 de julho de 2011. 
25 
 
CAPÍTULO 1 
ORIGENS E MANIFESTAÇÕES DA QUESTÃO SOCIAL: RISCO, VULNERABILIDADE 
E EXCLUSÃO SOB A ÓTICA DA MEDIAÇÃO E DO COTIDIANO 
 
1.1 Trabalho, Questão Social e a Perspectiva de Totalidade 
 
 
Para refletir sobre as temáticas de risco, exclusão e violência, é fundamental 
compreender o contexto em que são geradas. Desse modo, neste capítulo, realiza-
se o exercício de – a partir das características da sociedade capitalista – identificar a 
configuração e as manifestações da questão social. 
Importa considerar, também, que o risco, a exclusão e violência são 
fenômenos a serem compreendidos na perspectiva da totalidade, ainda que 
manifestados, por exemplo, de forma singular, na realidade de determinada família 
atendida no Creas. Esse exercício de mediação será realizado ao longo deste 
estudo. 
Para Kosik (2002, p. 44): 
Totalidade significa: realidade como um todo estruturado, dialético, no qual 
ou do qual um fato qualquer (classes de fatos, conjuntos de fatos) pode vir 
a ser racionalmente compreendido. Acumular todos os fatos não significa 
conhecer a realidade; e todos os fatos(reunidos em seu conjunto) não 
constituem, ainda, a totalidade. Os fatos são conhecimento da realidade se 
são compreendidos como fatos de um todo dialético – isto é, se não são 
átomos imutáveis, indivisíveis e indemonstráveis de cuja reunião a realidade 
saia constituída – se são entendidos como partes estruturais do todo. 
 
A concreticidade, desse modo, é a realidade manifestada em todos os fatos 
que permeiam a vida em sociedade. Na reflexão, a partir da totalidade e da 
concreticidade, é que se encontra o desafio de compreender os fatos da realidade 
social. Isso não significa que, a partir dessa premissa, se conheçam exatamente 
todos os fatos, mas que todos os fatos são compreendidos em um todo, ou seja, em 
sua totalidade. 
O autor ainda alerta que, no desafio de conhecer o que é real, não se deve 
cair na pseudoconcreticidade (um fetichismo aparente do que é o fenômeno), pois: 
“Na ‘má totalidade’ a realidade social é instituída apenas sob as formas de objeto, 
26 
 
resultados e fatos já dados, e não subjetivamente, como práxis humana objetiva” 
(KOSIK, 2002, p. 62). Também atenta que há de se considerar o caráter histórico do 
fenômeno, sua função objetiva e o lugar histórico que ocupa na realidade social 
(KOSIK, 2002, p. 61). 
O trabalho, por sua vez, é categoria central para a compreensão da realidade 
social e dos modos de vida dos homens na sociedade. No trabalho, o homem 
constitui-se, transforma-se e à natureza. Marx (1983) destaca que nem mesmo o 
trabalho minucioso de uma aranha em sua teia, ou de uma abelha na colmeia, é 
semelhante ao de um péssimo arquiteto, pois a diferença está no fato de que o 
arquiteto planeja a construção em sua mente. 
A intencionalidade e a capacidade de planejar fazem com que o trabalho do 
homem seja único em relação ao dos demais seres vivos. Todo trabalho pressupõe 
uma atividade, um instrumento e um fim. Aqui, cabe destacar o caráter de mediação 
que o instrumento exerce entre quem executa o trabalho e o resultado dele obtido. 
Netto e Braz (2007, p. 32) definem que a natureza não cria por si 
instrumentos, quem o faz é o homem, sujeito do trabalho, e essa relação (homem-
instrumento-resultado do trabalho) evidencia o importante processo de escolha de 
como ocorrerá a construção dos instrumentos, como serão utilizados, enfim, coloca 
em pauta o “problema dos meios e dos fins”. Como no conhecido ditado “os fins 
justificam os meios”, no capitalismo, o objetivo do lucro implica a exploração e o 
acirramento da desigualdade social. 
 Nesse ponto, é imprescindível considerar a questão social, fruto da relação 
capital-trabalho, pois nem sempre o trabalho leva o homem e a sociedade a 
patamares mais elevados de vida. Na lógica do capital, há diversos antagonismos, 
pois o trabalhador não conhece e não detém os frutos de seu trabalho. A riqueza 
socialmente produzida é centrada nas mãos de poucos e os meios produtivos são 
apropriados por uma classe privilegiada em detrimento da classe que vive do 
trabalho. Em suma, na sociedade do capital, não é possível acumular riqueza sem 
exploração. Assim, a questão social é produto da sociedade de classes e 
inseparável do processo de acumulação capitalista. 
Pereira (2004) ressalta que há duas vertentes na análise da questão social. A 
primeira diz respeito à perspectiva positivista, que “culpabiliza” o indivíduo pela 
27 
 
condição em que se encontra. A segunda vertente relaciona-se com a visão 
estruturalista, na qual se faz uso de um discurso genérico, em que se observam 
apenas as questões estruturais e são deixadas de lado as mediações devidas e o 
impacto que a questão social tem na vida de cada sujeito. 
Assim, é imperativo lembrar que o acirramento da questão social manifesta-se 
em graus mais elevados na realidade da classe que vive do trabalho7, seja esta 
marcada pelo desemprego, subemprego, ou, ainda, pela miséria, fome, e exclusão 
social, aspectos que caracterizam as mais variadas formas de violência. 
Kosik (2002, p. 222, grifo do autor) afirma que na produção e reprodução da 
vida social, as categorias econômicas são incompreensíveis se não forem vistas 
segundo a práxis. 
A práxis, na sua essência e universalidade, é revelação do segredo do 
homem como ser ontocriativo, como ser que cria a realidade (humano-
social) e que, portanto, compreende a realidade (humana e não humana, a 
realidade na sua totalidade). A práxis do homem não é atividade prática 
contraposta à teoria; é determinação da existência humana como 
elaboração da realidade. 
A práxis compreende, além da esfera laborativa, a esfera existencial, pois 
envolve tanto a atividade objetiva do homem que transforma a natureza, quanto a 
atividade subjetiva humana, como também a angústia, o medo, a alegria, e a 
esperança. Sem a esfera existencial, o trabalho deixaria de ser práxis (KOSIK, 2002, 
p. 224). 
Netto e Braz (2007, p. 44, grifo dos autores), nessa mesma ideia – o homem é 
muito mais do que trabalho –, lembram que a categoria práxis envolve o trabalho, e 
inclui todas as objetivações humanas: 
A categoria práxis permite apreender a riqueza do ser social desenvolvido: 
verifica-se, na e pela práxis, como, para além de suas objetivações 
primárias constituídas pelo trabalho, o ser social se projeta e se realiza nas 
objetivações materiais e ideais da ciência, da filosofia, da arte, construindo 
um mundo de produtos, obras e valores – um mundo social, humano enfim, 
em que a espécie humana se converte inteiramente em gênero humano. 
Na sua amplitude, a categoria de práxis revela o homem como ser criativo e 
autoprodutivo: ser da práxis, o homem é produto e criação da sua auto-
atividade, ele é o que (se) fez e (se) faz. 
 
7
 Para este trabalho, usa-se como referência o termo “classe que vive do trabalho”, utilizado por 
Antunes (2005), pois possibilita a interpretação da classe trabalhadora para além da classe operária. 
28 
 
Assim, mais do que produzir apenas produtos ou coisas, com o trabalho, os 
homens constroem quem são e como são seus modos de vida. 
Ao produzirem meios de vida, homens produzem sua vida material. O modo 
de produzir os meios de vida refere-se não só à reprodução física dos 
indivíduos, mas à reprodução de determinado modo de vida. A produção da 
própria vida no trabalho e da alheia na procriação dá-se numa dupla relação 
natural e social; social no sentido de que compreende a cooperação de 
muitos indivíduos. Portanto, determinado modo de produzir supõe, também, 
determinado modo de cooperação entre os agentes envolvidos, 
determinadas relações sociais estabelecidas no ato de produzir, as quais 
envolvem o cotidiano de vida da sociedade (IAMAMOTO, 2012, p. 21, grifo 
da autora). 
É importante mencionar que na realidade vivida se estabelecem as relações 
sociais, 
trata-se, portanto, de uma totalidade concreta em movimento, em processo 
de estruturação permanente. Entendida dessa maneira, a reprodução das 
relações sociais atinge a totalidade da vida cotidiana, expressando-se tanto 
no trabalho, quanto na família, no lazer, na escola, no poder, etc., como 
também na profissão (IAMAMOTO, 2012, p. 79, destaques da autora, grifo 
nosso). 
 
 
1.2 Violência, Violação, Vulnerabilidade, Risco e Exclusão: Faces do 
Sofrimento Ético-Político 
 
 
Neste item, na perspectiva da totalidade, importa compreender a violência, 
para além da ocorrência doméstica, como violação de direitos sociais, sem, contudo, 
perder de vista o sujeito e suas relações familiares e sociais. Nessa premissa, 
qualquer forma de violência, dentro ou fora do âmbito familiar, é uma violação à vida. 
Assim, neste trabalho, utiliza-se o termo “violação”, compreendida em um panorama 
mais abrangente, ainda que a palavra “violência” seja utilizada. 
Sobre o tema “vulnerabilidade social”, Eufrásio (2014) auxilia na síntese a 
respeito de seu uso no Serviço Social e nas políticas sociais,notadamente na de 
assistência social. A autora afirma que o termo vulnerabilidade social passou a ser 
utilizado a partir da década de 1990 por organismos como o Banco Mundial, a 
Organização das Nações Unidas (ONU) e a Comissão Econômica para a América 
Latina e o Caribe (Cepal), com a finalidade de orientar os países periféricos. Surgiu 
associado ao conceito de risco e passou a ser usado na área de políticas públicas 
29 
 
com o objetivo de ampliar o entendimento de exclusão social e pobreza. Nesse 
cenário, é interessante compreender a vulnerabilidade social como a exposição ou 
a propensão a um ou diversos tipos de risco. 
Sposati (2009, p. 34) caracteriza a vulnerabilidade relacionada ao fato de 
estar predisposto à “precarização”/violação. Destaca que o uso indiscriminado do 
termo vulnerabilidade, desassociado da compreensão do “risco”, deixa a pessoa, 
ou população chamada de vulnerável, num lugar permeado por estigmas, vinculado 
à ideia de “carente”. Por esse motivo, a autora orienta que o conceito de 
vulnerabilidade deve ser sempre acompanhado e referenciado ao conceito de risco. 
O risco deriva da ideia de risco econômico (PAULILO, 1999 apud DOUGLAS, 
1994). Essa autora menciona que, no século XVII, o termo passou a ser utilizado por 
ocasião dos jogos de aposta e, posteriormente, no século XVIII, estendeu-se para a 
realidade dos seguros de comércio marítimo em seus cálculos probabilísticos. Mais 
tarde, no século XIX, a teoria do risco desenvolveu-se e passou a ser usada nas 
situações de investimentos financeiros. Mais recentemente, a ideia de risco deixou 
de ser apenas associada à probabilidade, revestiu-se de conotação de perigo e 
passou a ser usada também na análise de conflitos entre países ou, ainda, na 
análise de risco de catástrofes ambientais. Assim, Paulilo (1999, p. 23) também 
relaciona essa transformação com o fenômeno da globalização: 
E o termo risco é a palavra que melhor se ajusta à nova cultura global dos 
tempos modernos na medida em que supre as demandas políticas e 
coletivas de um mundo mais amplo. Risco distanciou-se, portanto, de sua 
antiga conexão com cálculos técnicos de probabilidade e nos dias de hoje 
está muito mais associado à possibilidade de resultados negativos. Na 
medida em que a palavra risco tornou-se um constructo cultural na América, 
seu significado foi transformado. Riscos altos significam hoje muito perigo. 
 
O termo também se tornou referência na área da saúde, sobretudo 
relacionado às iniciativas de enfrentamento à síndrome decorrente do Human 
Immunodeficiency Virus-Acquired Immunodeficiency Syndrome (HIV-Aids). A PNAS 
(2004) traz em seu texto os termos risco e vulnerabilidade social. 
Em face do exposto, a discussão acerca da vulnerabilidade e do risco abre 
espaço para as estratégias de prevenção dessas situações. E esse é um desafio 
latente, na política social, notadamente na Política de Assistência Social brasileira. 
30 
 
Para além de uma questão adjetiva, é mister refletir sobre a origem e as 
consequências do risco. Na sociedade capitalista, o risco social pode surgir pela 
apropriação desigual da riqueza produzida e pelas formas de exploração advindas 
desse processo, as quais expõem contingentes populacionais a situações de risco, 
como moradia precária, fome, desemprego e violência. Nesse sentido, Sposati 
(2009) destaca que discutir o risco pressupõe a análise de seu conteúdo adjetivo, 
substantivo e temporal – o que é risco, o que representa e as consequências futuras 
ou, ainda, as estratégias de prevenção a serem adotadas no seu entorno. 
Para este trabalho, interessa destacar a análise de Sping Andersen (2000, 
apud SPOSATI, 2009), ao considerar que os riscos atuais manifestam-se de 
maneira diferenciada, em relação aos surgidos no período do Estado de Bem-Estar 
(welfare state), na metade do século XX. Além das situações de desemprego e 
ingresso precário no mercado de trabalho, o autor atenta para os riscos vivenciados 
pelas famílias, como pobreza na infância, rearranjos familiares e famílias 
monoparentais. Para ele, essas modificações requerem novas estratégias das 
políticas sociais de proteção. 
Aqui cabe mencionar o conceito de exclusão, pois, além de emblemático no 
estudo das manifestações da questão social, é objeto de diversas discussões no 
âmbito das ciências sociais. 
Sawaia (2001), organizadora da obra As Artimanhas da Exclusão Social: 
Análise Psicossocial e Ética da Desigualdade Social – que conta com a participação 
de autores oriundos da Psicologia Social, Sociologia e do Serviço Social –, enfatiza 
no prefácio que exclusão não é sinônimo de pobreza ou discriminação, pois, se 
assim o fosse, o escopo maior – o da injustiça social – ficaria apartado dessa 
discussão. Assim, exclusão “é processo sócio-histórico que se configura pelos 
recalcamentos em todas as esferas da vida social, mas é vivido como necessidade 
do eu, como sentimentos, significados e ações” (SAWAIA, 2001, p. 8). 
Em artigo na obra supracitada, Wanderley (2001) apresenta as diferentes 
formas do conceito de exclusão utilizadas na década de 1990 nas literaturas 
francesa e brasileira: a) desqualificação (PAUGAM, 1991): para o autor, é o inverso 
da integração social, fruto da pobreza e da falta de integração social. Nessa 
perspectiva, o Estado deve oferecer mecanismos de coesão social; b) desinserção 
(GAUJELAC; LEONETTI, 1994): também é caracterizada como o inverso da 
31 
 
integração, porém, os autores não a relacionam com a pobreza. A análise dá ênfase 
às características simbólicas: é o sistema de uma sociedade que define quem são 
os que não têm utilidade social; c) desafiliação (CASTELL, 1995): é compreendida 
como o processo de sucessivas rupturas, não apenas na ordem da “pauperização”, 
mas também nas relações de vínculo. 
 Dentre os autores brasileiros, destacam-se: a) Cristovam Buarque (1995), 
com sua definição de apartação social. O autor lembra que, no Brasil, o verbo 
“apartar” é utilizado para separar o gado e, aplicado nesse caso, representa 
caracterizar o outro como apartado da vida social como um todo, apartado como não 
humano; b) José de Souza Martins (1997), que rebate o conceito de exclusão e 
defende que este é insuficiente e perigoso, pois, além de não contemplar a inclusão 
perversa, pode confundir a compreensão das origens da exclusão. 
Por isso, rigorosamente falando, não existe exclusão: existe contradição, 
existem vítimas de processos sociais, políticos e econômicos excludentes, 
existe conflito pelo qual a vítima de processos excludentes proclama seu 
inconformismo, seu mal-estar, sua revolta, sua esperança, sua força 
reivindicativa e sua reivindicação corrosiva (MARTINS, 1997, p. 14). 
Na conclusão de sua análise, Wanderley (2001, p. 23) ressalta que: 
A exclusão contemporânea é diferente das formas existentes anteriormente 
de discriminação ou mesmo de segregação, uma vez que tende a criar, 
intencionalmente, indivíduos inteiramente desnecessários ao universo, para 
os quais parece não haver mais possibilidades de inserção. 
 A autora também lembra que, no Brasil, a exclusão tem particularidades 
sociais, econômicas e históricas (um exemplo é a herança escravocrata que ainda 
deixa seus traços na realidade da população). 
Assim, importa destacar que a integração e coesão de que tratam, sobretudo, 
os autores franceses, não significam a resolução ou o fim das formas de exclusão. 
São, sim, instrumentos paliativos de sobrevivência – e, no caso de coesão, num 
sentido limitado – num sistema que, em sua concepção, é excludente. Dessa forma, 
Sawaia (2201, p. 9, grifo nosso) conclui: 
Em síntese, a exclusão é processo complexo e multifacetado, uma 
configuração de dimensões materiais, políticas, relacionais e subjetivas. É 
processo sutil e dialético, pois só existe em relação à inclusão como parte 
constitutiva dela. Não é uma coisa ou um estado, é processo que envolve 
o homem porinteiro e suas relações com os outros. Não tem uma única 
forma e não é falha do sistema, devendo ser combatida como algo que 
perturba a ordem social, ao contrário, ele é produto do funcionamento do 
sistema. 
32 
 
Após refletir sobre violência, vulnerabilidade, risco e exclusão, cabe 
mencionar a relevância do tema “subjetividade”. Sobre a premissa de uma teoria 
marxista da subjetividade, Bertrand (1989, p. 21) defende que “Marx não renunciou à 
procura do fundamento tanto subjetivo, quanto social, do imaginário e das 
ideologias”. Ressalta que a crítica ao Estado e ao mundo “real” dá lugar à crítica da 
economia, à divisão do trabalho em a Ideologia Alemã e, mais tarde, aos modos de 
produção em O Capital. 
A autora enfatiza, contudo, que a subjetividade deixa de ser uma 
característica premente da obra marxiana. Nesse sentido, para ela, é preciso rebater 
os argumentos de divisão entre a obra do jovem Marx e sua obra na maturidade. Há 
que se lembrar de que Marx trata de temas como a ideologia, ilusão, o genérico e a 
alienação, ao longo de sua obra. 
Doray (1989, p. 85) aponta que é preciso admitir que as perspectivas 
marxistas no campo da dimensão subjetiva das relações de produção têm sido 
pouco trabalhadas, o que, para o autor, é surpreendente, pois a teoria marxista 
parece rica em potencialidades, nesse terreno. Sobre a subjetividade, define que 
O campo da subjetividade engloba o conjunto dos processos pelos quais o 
indivíduo em estreito contato com as estruturas simbólicas da cultura 
humana, tenta assumir e abrir um acesso à forma genérica de seu ser 
(DORAY, 1989, p. 85, grifo do autor). 
Sawaia (2009) chama a atenção para o fato de que um dos desafios no 
combate à exclusão social é a elucidação do sistema afetivo-criativo, pois é o que 
sustenta a servidão nos planos intersubjetivo e macropolítico. Para a autora, essa 
elucidação é imperativa para o planejamento da práxis. 
Nesse sentido, a psicologia social, em sua vertente sócio-histórica, propõe a 
análise da relação entre subjetividade e desigualdade social, para romper com a 
dualidade universal-singular, pois, no bojo da desigualdade, há também vida, 
sofrimento, medo, humilhação e vontade de ser feliz. 
Em síntese, nesse entendimento, a subjetividade constitui a objetividade 
social; contudo, é necessário trazer à memória que a subjetividade não tem sido 
aceita pelo paradigma científico clássico, por não ser mensurável. Por esse motivo, 
urge combater compreensões unilaterais dos fenômenos e, sobretudo, dos 
desdobramentos dos fenômenos na sociedade e no cotidiano dos homens. 
33 
 
Colocar a subjetividade em lugar de destaque que propicie profunda reflexão 
é fundamental para que as ciências humanas, sobretudo na vertente sócio-histórica 
materialista-dialética, avancem em temas como vida cotidiana e sofrimento, 
rebatendo com sólido embasamento teorias pós-modernas. 
Nessa perspectiva, Sawaia (2001) se apoia na “filosofia da alegria”, de Baruch 
Espinosa (1632-1677), e na “teoria sócio-histórica libertária”, de Lev Vigotski8 (1896-
1934), e na produção acerca do cotidiano de Agnes Heller (1979), pois a leitura 
desses pensadores contribui para a compreensão de uma práxis social 
transformadora. 
Quando se aborda subjetividade, sobretudo, a partir de uma perspectiva 
crítica, para subsidiar as discussões no Serviço Social, o termo “sofrimento ético-
político” revela-se como imprescindível suporte. A premissa é refletir a exclusão a 
partir da afetividade e qualificá-la como “ético-política”, a fim de demarcar um 
enfoque epistemológico e ontológico. Essa demarcação é necessária, pois a 
tendência clássica é combater a afetividade e subjetividade como antagônicas à 
razão e ordem. 
A autora alerta que o psicólogo – e o assistente social, como reflete a 
pesquisa aqui exposta –, por medo do psicologismo, tende a abandonar o sujeito, 
suas alegrias, seus sofrimentos e tudo o que representa o singular, criando, assim, 
uma “cilada mortífera à sua práxis” (SAWAIA, 2001). Assim, a escolha do conceito 
“sofrimento” é emblemática, pois indica que um sofrimento social redunda em um 
sofrimento concreto, podendo, inclusive, gerar morte biológica. 
Com base nos estudos de Sawaia (2001, p. 100), esse conceito traz em seu 
bojo elementos importantes para a reflexão sobre desigualdade e exclusão: 
Perguntar por sofrimento e por felicidade no estudo da exclusão é superar a 
concepção de que a preocupação do pobre é unicamente a sobrevivência e 
que não tem justificativa trabalhar a emoção quando se passa fome. 
Epistemologicamente, significa colocar no centro das reflexões sobre 
exclusão a ideia de humanidade e como temática o sujeito e a maneira 
como se relaciona com o social (família, trabalho, lazer e sociedade) de 
forma que, ao falar de exclusão, fala-se de desejo, temporalidade e 
afetividade, ao mesmo tempo que de poder, de economia e direitos sociais. 
 
8
 Psicólogo social russo, crítico de arte que desejava estudar a emoção na arte. Não encontrou isso 
na psicologia formal e buscou referenciar-se na dialética de Marx e em Espinosa. É considerado o 
fundador da psicologia marxista. 
34 
 
[...] A exclusão vista como sofrimento de diferentes qualidades recupera o 
indivíduo perdido nas análises econômicas e políticas, sem perder o 
coletivo, Dá força ao sujeito, sem tirar a responsabilidade do Estado. 
A autora lembra que o conceito de “sofrimento ético-político” deve estar 
sempre associado à perspectiva dialética, sob os temas inclusão/exclusão e 
desigualdade. Assim, reitera que é no sujeito que se manifestam as mais variadas 
formas de exclusão, é ele que as sente em seu cotidiano, em sua vida; contudo, é 
necessário lembrar as causas da exclusão e que o sujeito não pode superá-las 
sozinho, pois 
Sofrimento é a dor mediada pelas injustiças sociais. É o sofrimento de estar 
submetido à dor e à opressão, e pode não ser sentido como dor por todos. 
É experimentado como dor, na opinião de Heller, apenas por quem vive a 
situação de exclusão ou por “seres humanos genéricos” e pelos santos, 
quando todos deveriam estar sentindo-o, para que todos se implicassem 
com a causa da humanidade (SAWAIA, 2001, p. 104, grifo nosso). 
Sawaia (2001) aponta que o oposto do sofrimento ético-político é a “felicidade 
pública”, que difere do prazer e da alegria, pois não é um fim em si mesmo. Sawaia 
(2009, p. 370) avança nessa reflexão e refuta a ideia de que a busca da felicidade é 
uma ato de egoísmo e de que é preciso ser consciente para ser livre. Para a autora, 
Espinosa e Vigotski vão na direção contrária, pois “[...] a busca da felicidade é um 
ato político e que só se é consciente quando se é livre, isto é, quando a consciência 
resultar de uma decisão interior, autônoma, e não de obediência a um comando ou 
pressão externa”. 
Enfim, o estudo da violência, do risco, da vulnerabilidade e da exclusão (suas 
origens e possibilidades de enfrentamento), sob a ótica do sofrimento ético-político, 
requer uma reflexão a respeito da manifestação dessas mazelas cotidianas, na vida 
de todo homem. Aponta, também, para a categoria mediação, pois se faz necessário 
desvelar essas manifestações nas esferas universal, particular e singular. Para 
tanto, no próximo item, realiza-se essa reflexão. 
 
 
 
 
 
 
35 
 
1.3 Cotidiano e o Conceito de Mediação 
 
 
Para tratar da categoria “cotidiano”, as reflexões aqui expostas são pautadas 
nos escritos de Henri Lefebvre, em A Vida Cotidiana no Mundo Moderno, e Agnes 
Heller, em O Cotidiano e a História, respectivamente. 
Lefebvre (1968, p. 37) reforça o que já havia tratado em sua obra Introduction 
à la Critique de la Vie Quotidienne (1946) e critica o estudo da sociedade sob a ótica 
marxista de modo polarizado: pela ênfase no “economicismo” ou pela ênfase no 
“filosofismo”. Não aceita que a herança deixada pelo pensamento marxianoseja 
reduzida a uma (crítica) economia política ou um sistema filosófico (materialismo 
dialético). Defende, sim, que, quando Marx aplica o termo “produção” – sobretudo 
quando se recorre às obras do jovem Marx – este está revestido de um sentido 
amplo. Assim, para além da produção das coisas (produção material), é possível 
falar em produção “espiritual”, a produção do ser humano por si mesmo, ou seja, a 
produção das “relações sociais”. 
E, a partir dessa premissa, é possível avançar para a reflexão do cotidiano, 
pois a esfera do cotidiano não é inferior à filosófica. O autor afirma que, quando a 
filosofia se declara suficiente, refutando o não filosófico, esta destrói a si mesma. 
Vamos separar definitivamente a pureza filosófica e a impureza cotidiana? 
Vamos considerar desamparado o cotidiano, abandonado pela sabedoria à 
sua própria sorte? Podemos dizer que é a tela que impede a profundidade 
luminosa de jorrar contra o ser, deturpação da verdade, e “na medida em 
que é isso tudo”, faz parte da verdade do ser? Ou tornamos vã a filosofia, 
ou fazemos dela a cabeça e o ponto de partida de uma transformação do 
mundo não filosófico, na medida em que ele se revela trivialidade, 
banalidade prática e prática banal. (LEFEBVRE, 1968, p. 18). 
Não é desnecessário repetir que na vida cotidiana é que se expressam as 
relações sociais, os modos de vida dos homens. O cotidiano não é uma categoria 
lógica, mas ontológica. Na esfera do cotidiano é que as pessoas nascem, vivem e 
morrem. Nele é que manifestam suas necessidades, vivem ou sobrevivem, 
trabalham, comem, vestem, reproduzem valores e culturas. “É no cotidiano que se 
tem prazer ou se sofre. Aqui e agora” (LEFEBVRE, 1968, p. 27). 
Para não incorrer no risco de cair numa dualidade maniqueísta de bem/mal, é 
importante considerar que o cotidiano, assim como a filosofia, tem seus dilemas. 
36 
 
Heller (2008, p. 57) ressalta que “a vida cotidiana, de todas as esferas da realidade, 
é aquela que mais se presta à alienação”. Lefebvre (1968, p. 23) reforça que “o 
homem cotidiano se mostra perdido: entravado, preso por mil laços, às voltas de mil 
probleminhas miúdos”. Por esse motivo, cabe desvelar a riqueza e a miséria do 
cotidiano, pois a alienação filosófica pressupõe verdade sem realidade e a alienação 
cotidiana pressupõe realidade sem verdade (LEFEBVRE, 1968). Assim, segundo 
Heller (1994, p. 18), não é a abolição da vida cotidiana que deve ser buscada, mas a 
formulação de uma vida cotidiana não alienada. 
Para o objeto deste estudo, importa considerar a inserção do assistente social 
no Creas em seu trabalho no Paefi. Como, estando “às voltas com mil probleminhas 
miúdos”, trabalhar numa perspectiva e consciência de totalidade? 
Heller (2008, p. 34), por sua vez, aponta que a vida cotidiana não está fora da 
história, mas no centro do acontecimento histórico, pois os acontecimentos 
marcantes da vida cotidiana contados nos livros partem da história e a ela retornam. 
Desse modo, quando uma pessoa assimila a cotidianidade de sua época, assimila, 
também, o passado da humanidade. 
A autora descreve a vida cotidiana como do “homem inteiro”, compreendendo 
que o homem participa com todos os aspectos de sua individualidade, 
personalidade, e nela expressa suas paixões, seus afetos e suas ideologias. Assim, 
apoiada no pensamento de Georg Lukács, Heller (2008) lembra que o homem inteiro 
é que tem condições de intervir na sociedade. E essas condições só lhe são 
favoráveis quando a atividade cotidiana se eleva ao nível da práxis e torna-se 
“atividade humano-genérica consciente”. 
Contudo, só se atinge o patamar de atividade humano-genérica por meio da 
suspensão do cotidiano. O sujeito interrompe o curso natural de seu cotidiano para 
se dedicar às atividades únicas, que, em outro momento, se refletirão na vida 
cotidiana. A autora explica que a suspensão do cotidiano traz a possibilidade de 
homogeneização, na qual o homem que a vivencia “homogeneíza” os fatos 
cotidianos para se concentrar em um de seus aspectos (por ex.: grandes cientistas, 
artistas e escritores que se isolam, ou se concentram, tanto em sua obra por 
determinado período que passam a viver num outro patamar da cotidianidade: o 
patamar da genericidade). Assim, essa homogeneização consiste no que a autora 
chama de “homem inteiro e pode abrir caminho para o “humano-genérico”, em que o 
37 
 
homem viveria a completa saída da cotidianidade alienante na qual se insere; a 
completa suspensão da individualidade; e ocorreria a passagem de “homem inteiro” 
até tornar-se, também, “homem inteiramente”, enfim, o “humano-genérico”. 
 O termo “humano-genérico” refere-se ao homem que se coloca pleno e livre 
para exercer suas habilidades, seu trabalho; remete sempre para uma “consciência 
de nós”, nunca para o “eu”. O homem é um ser genérico: produto e expressão das 
relações sociais. O representante do humano-genérico não é jamais um homem que 
se entende isolado, mas aquele que busca sempre estar em integração, tendo como 
ponto de partida a consciência do “nós”. Só a partir da consciência do eu, é possível 
avançar para a consciência do nós. 
Desse modo, na aliança individualidade e genericidade, ocorre a produção da 
individualidade comunitária. Essa concepção de mundo, baseada no humano-
genérico será possível somente quando abolidas as formas de enquadramento e de 
hierarquia da cotidianidade e quando, enfim, cada um tiver condições de escolha e 
“condução da própria vida”. 
Contudo, a condução da própria vida não está restrita ao representante do 
humano genérico. Heller (1994), em sua obra La Revolución de la Vida Cotidiana, 
apresenta perspectivas para superar a alienação da vida cotidiana mediante a ação 
do indivíduo. Para a autora, indivíduo é todo ser particular que compreende 
conscientemente que a própria vida passa a ser um objeto na vida cotidiana, mas 
tem essa compreensão porque se assume conscientemente como membro de uma 
espécie, ou seja, como parte do todo social. Heller (1994, p. 11) defende que: 
[...] la alienación de la vida cotidiana no ha de buscarse en el pensamiento o 
en las formas de actividad de la vida diária, sino en la relación del individuo 
con estas formas de actividad, así como en su capacidad o incapacidad 
para jerarquizar, por si mismo estas mismas formas ; em su capacidad o 
incapacidad, en fin, para sintertizarlas en uma unidad. De hecho, esta 
capacidad depende de la relación que el individuo mantiene con lo no 
cotidiano, es decir, con las diversas objetivaciones orientadas en el sentido 
de la espécie. 
Nesse sentido, “El individuo es un particular que ‘sintetiza’ em si mismo la 
singularidad casual de su individualidad y la generalidad universal de la espécie” 
(HELLER, 1994, p.13). Na sociedade, todo homem tem consciência do eu, no 
entanto, só o indivíduo pode ter autoconsciência, o que quer dizer que só o indivíduo 
pode perceber, refletir e intervir na vida cotidiana de modo consciente. É para essa 
38 
 
análise que Heller utiliza o termo “condução da própria vida”, pois nem todos os 
homens têm condições de conduzir a própria vida; somente é capaz de fazê-lo o 
indivíduo que conscientemente consegue sintetizar as objetivações de sua espécie. 
Com base nesse pensamento, interessa tratar do cotidiano dos assistentes 
sociais com as famílias em situação de violência. Cabe saber quais mediações são 
utilizadas, que estratégias são desenvolvidas em face das demandas miúdas do seu 
cotidiano e como esses profissionais interpretam os aspectos da vida de todo dia em 
seu trabalho e em suas relações – aspectos vistos na etapa de pesquisa deste 
trabalho. 
O espaço privilegiado da intervenção profissional é o cotidiano, o “mundo da 
vida”, o “todo dia” do trabalho, que se revela como “o ambiente no qual emergem 
exigências imediatas e são desenvolvidos esforços para satisfazê-las [...]” 
(BAPTISTA, 2001, p. 111). 
Desta feita, na

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