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FUNDAÇÃO COMUNITÁRIA DE ENSINO SUPERIOR DE ITABIRA-FUNCESI FACULDADE DE CIENCIAS ADMINISTRATIVAS E CONTABEIS DE ITABIRA-FACCI Rosiméia Aparecida da Silva PERCEPÇÃO DA POPULAÇÃO ACERCA DA ATIVIDADE MINERÁRIA E CONTAMINAÇÃO DO SOLO E DA ÁGUA POR ARSÊNIO NO MUNICÍPIO DE SANTA BÁRBARA - MG Itabira 2015 Rosiméia Aparecida da Silva PERCEPÇÃO DA POPULAÇÃO ACERCA DA ATIVIDADE MINERÁRIA E CONTAMINAÇÃO DO SOLO E DA ÁGUA POR ARSÊNIO NO MUNICÍPIO DE SANTA BÁRBARA – MG Trabalho de conclusão de curso apresentada a Faculdade de Ciências Administrativas e Contábeis de Itabira como requisito parcial para obtenção de título de bacharel em Engenharia Ambiental. Orientador (a): Juni Cordeiro Itabira 2015 Dedico este trabalho a todos que estiveram ao meu lado em todos os momentos em que tive que me dedicar aos estudos, principalmente nos mais difíceis. Aos meus pais, irmãos, filho, marido e amigo, que sem a força, apoio e incentivo, a superação de mais este desafio em minha vida seria bem mais difícil. Ás vezes, quando queremos conquistar determinados objetivos precisamos abrir mãos de alguns confortos, momentos de lazer e diversas outras coisas, mas, apesar disto encontramos pessoas com as quais podemos recorrer e apoiar. Por isso, este trabalho é dedicado a estas pessoas, importantes em minha caminhada. AGRADECIMENTOS Agradeço a todos os meus familiares, marido, filho e amigos pelo apoio nas horas difíceis, e nos momentos que por muitas vezes estive ausente para me dedicar aos estudos. Agradeço a todos os meus professores pelo apoio e incentivo em especial a Juni Cordeiro por ter me aturado e por não me deixar desistir, à Lorena Oporto e a Giovanna por terem dedicado algumas horas do seu dia para me ajudar, nos momentos que por muitas vezes pensei em desistir. Agradeço a um amigo muito especial, Eustáquio Dehon que contribuiu e muito para que eu chegasse até aqui. Agradeço a minha turma pelo privilégio de ter compartilhado estes anos com pessoas especiais e que ficarão marcadas pela cumplicidade e companheirismo. A todos que direta e indiretamente estiveram presentes na efetivação de mais esta difícil etapa em minha vida. Àqueles que de alguma forma estiveram presentes neste período e de alguma forma contribuíram para que este novo desafio fosse conquistado. Sei que tenho inúmeras pessoas a agradecer, mas, por serem tantas não cabe aqui serem nomeadas uma a uma, somente lembradas e agradecidas por meio deste trabalho. Muito obrigada! “Quando a última árvore tiver caído, quando o último rio tiver secado, quando o último peixe for pescado, vocês vão entender que dinheiro não se come”. Greenpeace RESUMO A mineração evidencia-se como uma das principais fontes de renda impulsionadora do desenvolvimento econômico de numerosos municípios do Quadrilátero Ferrífero no estado de Minas Gerais. Porém, como diversas outras atividades econômicas, a mineração acarreta problemas ambientais na água, solos, ar, paisagem e outros. Neste contexto, esta pesquisa teve por objetivo verificar se a população do município de Santa Bárbara - (MG) tem conhecimento da existência de uma possível contaminação por arsênio na água e nos solos do município. A abordagem metodológica foi definida como quali-quantitativa, do tipo descritiva, sendo caracterizada como pesquisa de campo pela obtenção dos dados diretamente no ambiente de estudo. O universo desta pesquisa foi formado pela população. A amostra é formada por uma parte significativa da população, sendo definido o critério de amostragem como não probabilístico por conveniência. Os instrumentos utilizados para coleta dos dados foi a realização de questionário aplicado junto à comunidade, aliado a entrevista realizada com secretários municipais de saúde e meio ambiente e análise documental de planilhas de dados fornecida pelo sistema DATASUS, sendo que, para o tratamento dos dados foram utilizadas as técnicas de análise de conteúdo e as estatísticas descritiva e inferencial. A mineração foi mencionada como sendo uma atividade negativa, em virtude dos desmatamentos e a degradação do solo, poluição visual, sonora e do ar, aqueles que consideraram esta atividade como positiva, destacaram a geração de empregos, desenvolvimento e aumento da renda para o município. O principal impacto causado pela mineração de ouro na área de estudo além da possível contaminação da água e sedimentos, segundo relato do secretário do meio ambiente está relacionado ao rebaixamento do lençol freático, visto que a mina é subterrânea. Ainda segundo o secretário não foi detectada contaminação advinda da mineração em níveis acima do limite estabelecido por lei. Verificou-se que, de acordo com dados do DATASUS, que o índice de neoplasias (tumores) apresentados não pode ser relacionado diretamente à atividade mineraria. Ficando, portanto, evidenciado através da pesquisa o quanto é importante que a população tenha um conhecimento adequado dos riscos ambientais que a cerca, e para que possa exigir dos órgãos públicos seus direitos como cidadãos, objetivando a minimização dos impactos. Palavras chave: Arsênio, População, Mineração, Percepção socioambiental, Contaminação ambiental. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 - Principais regiões com depósitos minerais no Brasil ............................................. 13 Figura 2 - Alguns compostos de arsênio comuns na natureza................................................. 28 Quadro 1 - Descrição das 17 leis ambientais mais importantes com relação à proteção do patrimônio cultural, fauna, recursos hídricos e florestais ......................................................... 20 Quadro 2 - Padrões e valores orientadores da utilização de arsênio ....................................... 35 Quadro 3 - Informações gerais acerca do município de Santa Bárbara, MG .......................... 40 Mapa 1 - Localização do município de Santa Bárbara, MG...................................................40 Mapa 2 - Geologia simplificada da região abrangida pelo município de Santa Bárbara, MG.42 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 - Participação dos estados brasileiros na arrecadação da CFEM no segundo semestre de 2014. .................................................................................................................................... 15 Gráfico 2 - Principais municípios brasileiros arrecadadores da CFEM no segundo semestre de 2014. ......................................................................................................................................... 15 Gráfico 3 - Idade dos participantes da pesquisa no município de Santa Bárbara/MG (n=380). .................................................................................................................................................. 57 Gráfico 4 – Tempo de residência dos participantes da pesquisa no município de Santa Bárbara/MG (n=380). ............................................................................................................... 59 Gráfico 5 - Grau de instrução dos participantes da pesquisa (n=380) realizada no município de Santa Bárbara/MG .................................................................................................................... 62 Gráfico 6 - Origem da água consumida pelos moradores entrevistados (n=380) no município de Santa Bárbara/MG ............................................................................................................... 63 Gráfico7 - Forma de abastecimento dos moradores que participaram da pesquisa (n=380) no município de Santa Bárbara/MG .............................................................................................. 64 Gráfico 8 - Existência de corpos hídricos próximos à residência dos moradores que participaram da pesquisa (n=380) no município de Santa Bárbara/MG .................................. 65 Gráfico 9 - Moradores que usam a água desse córrego ou rio próximos de sua residência (n=380) no município de Santa Bárbara/MG ........................................................................... 66 Gráfico 10 - Participantes (n=380) que consomem peixes, verduras, legumes, ovos, frango ou leite de vaca produzidos na região de Santa Bárbara/MG ........................................................ 67 Gráfico 11 - Participantes da pesquisa (n=380) no município de Santa Bárbara/MG que utilizam produtos da mineração ................................................................................................ 70 Gráfico 12 - Tabulação cruzada em relação ao conhecimento do uso de produtos da Mineração x escolaridade ........................................................................................................................... 70 Gráfico 13 - Principais impactos ambientais desencadeados pela atividade minerária........... 72 Gráfico 14 - Tabulação cruzada em relação ao que é arsênio x escolaridade ......................... 74 Gráfico 15 - Tabulação cruzada em relação a toxidade do arsênio x escolaridade ................. 75 Gráfico 16 - Percepção dos respondentes (n=380) acerca da responsabilidade pela contaminação por arsênio ......................................................................................................... 76 Gráfico 17 - Responsabilidade pela preservação da agua e do solo por arsênio ..................... 77 Gráfico 18 - Distribuição percentual de internação por neoplasias (tumores em geral) em todas as idades considerando dados de 2009 apresentados pelo DATASUS .................................... 88 Gráfico 19 - Distribuição percentual de mortalidade proporcional por neoplasias (tumores em geral) por faixa etária, considerando dados de 2008 apresentados pelo DATASUS ............... 89 LISTA DE TABELA Tabela 1 - Naturalidade dos participantes da pesquisa (n=380), do município de Santa Bárbara/MG. ............................................................................................................................. 58 Tabela 2 - Bairros no município de Santa Bárbara/MG onde residem os participantes da pesquisa (n=380) ...................................................................................................................... 61 Tabela 3 - As 05 primeiras palavras que vêm à mente dos respondentes (n=380) do município de Santa Bárbara – MG, ao ouvirem a palavra “mineração” .................................................... 69 LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS AIA - Avaliação de Impactos Ambientais ANA - Agência Nacional das Águas APM - Materiais Particulados Atmosféricos AS - Arsênio CETESB - Companhia Ambiental do Estado de São Paulo CFEM - Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente COPASA - Companhia de Saneamento de Minas Gerais CPRM - Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais CREA-MG - Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais DNPM - Departamento Nacional de Produção Mineral EIA - Estudo de Impacto Ambiental FEAM - Fundação Estadual do Meio Ambiente IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBRAM - Instituto Brasileiro de Mineração IEF - Instituto Estadual de Florestas IGEO - Índice de Geoacumulação INCA - Instituto Nacional de Câncer LI - Licença de Instalação LP - Licença Prévia LO - Licença de Operação OGM - Organismos Geneticamente Modificados OMS - Organização Mundial de Saúde ONU - Organização das Nações Unidas PRAD - Plano de Recuperação de Áreas Degradadas POA - Processos Oxidativos Avançados QF - Quadrilátero Ferrífero RIMA - Relatório de Impacto Ambiental SAA - Sistemas de Abastecimento de Água SABESP - Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo SUS - Sistema Único de Saúde USGS - United States Geological Survey SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 5 1.1 Problema de pesquisa ........................................................................................................ 6 1.2 Objetivo geral .................................................................................................................... 6 1.3 Objetivos específicos .......................................................................................................... 6 2 REFERENCIAL TEÓRICO .............................................................................................. 10 2.1 Mineração e meio ambiente ............................................................................................. 10 2.1.1 Panorama da mineração no Brasil ................................................................................. 12 2.1.2 Impactos ambientais causados pela mineração .............................................................. 16 2.1.3 Legislação ........................................................................................................................ 19 2.1.3.1 Legislação ambiental .................................................................................................... 20 2.1.3.2 Código de Mineração.................................................................................................... 23 2.1.4 A sustentabilidade em atividades minerárias .................................................................. 24 2.2 A química do arsênio ........................................................................................................ 26 2.2.2.1 Ocorrência natural de arsênio ....................................................................................... 29 2.2.2.2 Ocorrência antropogênica do arsênio ........................................................................... 31 2.2.3 O arsênio e a saúde humana ........................................................................................... 31 2.2.3.1 Efeitos e riscos à saúde ................................................................................................. 33 2.2.4 Contaminação por arsênio .............................................................................................. 36 2.2.4.1 Contaminação por arsênio no mundo ........................................................................... 36 2.2.4.2 Contaminação por arsênio no Brasil ............................................................................. 37 2.2.4.3 Contaminação por arsênio no Quadrilátero Ferrífero ................................................... 38 2.3 Município de Santa Bárbara ........................................................................................... 39 2.4 Alternativas para a remediação de solos e águas contaminados por arsênio ............. 45 3 METODOLOGIA ................................................................................................................ 47 3.1 Abordagem ........................................................................................................................ 47 3.2 Tipo de pesquisa ............................................................................................................... 48 3.3 Método de pesquisa ..........................................................................................................49 3.4 Universo ............................................................................................................................. 49 3.5 Amostra e critério de amostragem .................................................................................. 50 3.6 Coleta de dados ................................................................................................................. 51 3.7 Tratamentos dos dados .................................................................................................... 53 3.8 Unidade de análise ............................................................................................................ 54 3.9 Limitações da pesquisa ..................................................................................................... 54 4 ANÁLISE DE DADOS ........................................................................................................ 56 4.1 Percepção ambiental da população de Santa Bárbara acerca das formas de abastecimento de água e utilização deste recurso ................................................................ 56 4.2 Percepção da população de Santa Bárbara acerca da importância da atividade minerária e impactos ambientais, sociais e econômicos associados à esta ........................ 68 4.3 Percepção ambiental da população acerca do arsênio .................................................. 73 4.4 – Percepção dos gestores de saúde e meio ambiente de Santa Bárbara acerca da possível presença de arsênio na água e solos do município ................................................ 78 4.4.1 – Percepção do secretário municipal de saúde ............................................................... 78 4.4.2 – Percepção do secretário municipal de meio ambiente ................................................. 83 4.5 - Ocorrências de neoplasias no município de Santa Bárbara/MG ............................... 88 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 90 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 93 APENDICES ........................................................................................................................... 93 5 1 INTRODUÇÃO Os minerais estão presentes em quase todos os bens duráveis fabricados atualmente, podendo ser encontrados desde as máquinas modernas às mais simples, trespassando pelos materiais que constroem as residências. O Brasil detém uma grande variedade de formações geológicas, distribuídas em mais de 8,5 milhões de quilômetros quadrados, o que lhe confere uma grande diversidade de minerais, dentre metálicos, não metálicos e energéticos (YOUNG, 2014). Neste contexto, pode-se ressaltar que o Brasil está posicionado entre os três maiores fabricantes mundiais de minério de ferro, substância empregada nas estruturas prediais, em quase todos os eletrônicos e eletrodomésticos e tudo que é composto de metal, com fabricação de 390 milhões de toneladas em 2013; destacando-se também na manufatura de ouro, que chegou a 75 toneladas fabricadas anualmente no Brasil, indo muito além das joias e adornos, com várias aplicações na indústria aeroespacial e eletrônica (YOUNG, 2014). Desse modo, a atividade minerária mostra-se importante para o desenvolvimento da região onde encontra-se inserida pois a mesma gera emprego e renda para o município, bem como possui grande importância na a produção de materiais e serviços que podem beneficiar toda uma sociedade. Por outro lado, a atividade minerária pode desencadear impactos ambientais e socioeconômicos negativos quando executada em desacordo com a legislação vigente. Nesta acepção, Mechi e Sanches (2010) relatam que quase, toda atividade minerária acarreta, dentre outros, supressão de vegetação ou impedimento de sua regeneração, remoção do solo superficial de maior fertilidade e exposição dos solos remanescentes aos processos erosivos, assoreamento dos corpos d'água, bem como pela poluição provocadas por lixiviação. No Brasil, o estado Minas Gerais irá responder por 41% das aplicações financeiras disponíveis para o setor minerário, respondendo por 53% da produção de minerais metálicos e 29% de minérios em geral. Salienta-se ainda que a mineração está situada em mais de 250 municípios mineiros, nos quais estão localizadas as 10 maiores minas do Brasil. Além disso, 67% das denominadas minas brasileiras classe A, com produção superior a 3 milhões de toneladas por ano, estão situadas no estado de Minas Gerais (YOUNG, 2014). 6 O município de Santa Bárbara, localizado no Quadrilátero Ferrífero, no estado de Minas Gerais, é uma região conhecida por seus recursos minerais e por possuir diversas empresas que atuam com a exploração mineral. Face ao exposto, esta pesquisa visa analisar a percepção da população desta região referente aos impactos socioambientais desencadeados pela atividade minerária e acerca de pesquisas desenvolvidas que indicam uma possível contaminação por arsênio na água e solos do município. Dessa forma, este estudo está dividido em cinco capítulos. O primeiro capítulo contém a introdução, o problema de pesquisa, os objetivos e a justificativa do estudo. O segundo capítulo apresenta o referencial teórico da pesquisa, abordando, dentre outros aspectos, o panorama da mineração no Brasil; a legislação ambiental e o Código de Mineração; a caracterização química do arsênio, abrangendo sua toxicidade; além de uma breve descrição dos aspectos fisiográficos e geológicos do município de Santa Bárbara, MG. O terceiro capítulo apresenta a metodologia utilizada para a realização desta pesquisa. O quarto capítulo contém a análise dos dados e, por último, o quinto capítulo aborda as considerações finais da pesquisa. 1.1 Problema de pesquisa A população de Santa Bárbara (MG) tem conhecimento acerca da possível contaminação por arsênio no solo e na água bem como dos seus impactos à saúde? 1.2 Objetivo geral Verificar se a população do município de Santa Bárbara (MG) tem conhecimento de uma possível contaminação por arsênio na água e nos solos do município. 1.3 Objetivos específicos - Analisar a percepção ambiental da população acerca das formas de abastecimento de água e utilização deste recurso; - Verificar a opinião da população de Santa Bárbara acerca da importância da atividade minerária e impactos ambientais e socioeconômicos associados à esta; 7 - Identificar se a população tem conhecimento da toxicidade do arsênio e de pesquisas realizadas na região de Santa Bárbara a respeito desse elemento; - Verificar se os gestores do município têm conhecimento acerca de uma possível presença de arsênio na água e solos do município; - Analisar as ocorrências de neoplasias no município de Santa Bárbara e comparar com as informações dos munícipios vizinhos. 1.4 Justificativa O setor de mineração no Brasil é um arrimo financeiro e econômico para a nação, correspondendo a uma grande fonte de renda, que pode equilibrar os índices de desenvolvimento do país em um grau significativo (LOPES, 2014). Ainda de acordo com Lopes (2014), isso ocorre, principalmente, ao se considerar a capacidade do subsolo brasileiro para apresentar-se em formas bem atípicas e ricas em minérios, com potencial para situá-lo à frente de outros países. Os recursos minerais são extremamente importantes para que ocorra o desenvolvimento de um determinado lugar, uma vez que os minerais utilizados como matérias-primas são aproveitados em diferentes áreas da construção civil, do setor industrial, além de serem utilizados como fontes de energia. Contudo, a atividade minerária pode desencadear uma série de problemas ambientais e socioeconômicos, atingindo diretamente a qualidade de vida da população e o meioambiente. Desta forma, mesmo sendo de grande relevância para o país e para a sociedade como um todo, essa atividade, tem sido a causa de acidentes ao longo dos anos e causadora de impactos ambientais negativos. Segundo o Serviço Geológico do Brasil - CPRM (2002), os mais relevantes problemas originários da mineração podem ser agrupados em cinco categorias: poluição da água, poluição do ar, poluição sonora, subsidência do terreno, incêndios causados pelo carvão e rejeitos radioativos. Diversas ações antrópicas também são responsáveis por problemas de ordem 8 geotécnica, tais como subsidência, deslizamentos e erosão acelerada, que resultam na degradação do solo e do subsolo. Após a década de 1950, o Centro-Sul de Minas Gerais passou a ser chamado de Quadrilátero Ferrífero (QF), correspondendo ao maior distrito de minério do Brasil, situado na área central do estado. Contudo, na concepção de Franco (2014), esta região sofre as consequências diretas da atividade minerária, exemplificadas pela poluição das águas superficiais por elementos tóxicos. Corroborando este dado, o município de Santa Bárbara, localizado na porção noroeste do QF, tem sido objeto de pesquisas que apontam para uma possível contaminação da água e do solo por arsênio, tornando esta questão uma situação preocupante do ponto de vista da saúde pública e ambiental, “visto que os pontos amostrados estão situados em distritos com potencial contato direto pela população e utilização doméstica das águas destes córregos” (FRANCO, 2014, p.41). Desta forma, este trabalho mostra-se relevante para o Engenheiro Ambiental, pois o aumento no consumo de matérias primas, com o intuito de proporcionar maior conforto à uma sociedade cada vez mais exigente, tornam cada vez mais graves os impactos gerados no meio ambiente. Com isso as empresas, o poder público e os cidadãos, devem cada vez mais procurar aprimorar a relação com o meio ambiente, exercendo um monitoramento e controle rígido de suas atividades, buscando diminuir os impactos ambientais e expandindo, assim, o mercado para a área de engenharia ambiental. Ademais, o desenvolvimento desta pesquisa pode tornar-se para o meio acadêmico um instrumento importante ao corroborar para o aprimoramento do conhecimento e consolidação da aprendizagem. Esta pesquisa também é pertinente por proporcionar o levantamento da percepção dos moradores acerca da contaminação de arsênio nas águas e solos do município de Santa Bárbara, a qual poderá servir como uma base inicial para o desenvolvimento de trabalhos de conscientização e educação ambiental dessa população. Faz-se fundamental o conhecimento de toda a sociedade sobre os riscos decorrentes da exposição, a longo prazo, aos metais pesados através da água, uma vez que esta pode causar vários problemas à saúde pública, já que é utilizada para diversas atividades como criação 9 animal, abastecimento público, atividades industriais, higiene, irrigação, navegação, limpeza, produção de energia elétrica, e outros, podendo ser também fonte de transmissão de doenças. Assim, o conhecimento deste problema poderá possibilitar que a sociedade exija dos responsáveis o monitoramento constante das fontes geradoras de contaminação para prevenir o risco ao qual está exposta. 10 2 REFERENCIAL TEÓRICO Prodanov e Freitas (2013) relatam que no referencial teórico são analisadas obras científicas acessíveis que abordam o conteúdo a ser trabalhado, fornecendo fundamento teórico para a continuação do projeto de pesquisa. É nessa fase que também são esclarecidos os conceitos predominantes e as expressões técnicas utilizadas no estudo. Dessa forma, livros já publicados, artigos em periódicos nacionais e internacionais, além de monografias, dissertações e teses, podem ser utilizados como fontes de consulta. Assim, este referencial teórico aborda os principais aspectos relacionados à atividade minerária, ressaltando a legislação pertinente ao tema, assim como seus principais impactos ambientais e socioeconômicos; uma breve caracterização química do arsênio, destacando seu comportamento no meio ambiente e riscos para a saúde humana, além de uma caracterização geológica sucinta da área abrangida pelo município de Santa Bárbara, MG. 2.1 Mineração e meio ambiente A mineração é um dos pilares da economia de um país, colaborando de maneira categórica “para o bem-estar e a melhoria da qualidade de vida das presentes e futuras gerações, sendo fundamental para o desenvolvimento de uma sociedade equânime, desde que seja operada com responsabilidade social”, fazendo-se sempre necessários os preceitos do desenvolvimento sustentável (FARIAS, 2002, p. 2). Entretanto, é fato que a raça humana, com a busca cada vez maior por sua evolução científica, cultural e tecnológica, sempre dilapidou os bens minerais e deles se tornou cada vez mais dependente. Neste sentido, é verdade que o homem interfere no meio ambiente utilizando a mineração como meio para desfigurá-lo, degradá-lo e poluí-lo, não sendo menos verdade que a mesma mineração que comete todos estes danos também retrata um dos meios para suprir as demandas que a sociedade atual não consegue mais renunciar (RIBEIRO FILHO, 1992). De forma geral, a regulamentação da atividade minerária deve garantir sua permanência e estabilidade diante do seu papel desenvolvido na construção da sociedade, tendo por base normas e requisitos fundamentados na preservação do meio ambiente, uma vez que existem 11 incompatibilidades entre o arranjo das leis de zoneamento municipais e a aptidão mineral das zonas determinadas na legislação municipal de uso e ocupação do solo (FARIAS, 2002). Segundo Scliar (2004), é fato que os impactos oriundos da atividade minerária estão agregados à competição pelo uso e ocupação do solo, gerando conflitos socioambientais devido à falta de metodologias de intervenção que certifiquem a multiplicidade dos interesses envolvidos. Entretanto, para Farias (2002), vários problemas ambientais, relacionados ao uso do solo e subsolo, são criados por atividades antropogênicas, não se resumindo apenas à mineração, tais como o uso não controlado de água subterrânea; a urbanização desordenada; a pecuária; a agricultura e a construção de barragens objetivando a geração de hidroeletricidade. Por outro lado, os recursos minerais levaram centenas de milhões de anos para se formarem, portanto, a mineração, assim como qualquer outra atividade que dependa de recursos naturais, tal como o meio ambiente, precisa estar em harmonia com a necessidade e a vontade dos cidadãos que povoam as regiões onde estão localizadas as minas, devendo ser enunciado por fóruns colegiados bem informados e representativos, que demarquem e sugiram a conveniência e a convivência da atividade minerária com outras atividades e com o meio ambiente (RODRIGUES; MALAFAIA, 2008). Para mais, ao instaurar o dever de recuperação a área degradada na exploração dos recursos minerais, a Constituição Federal de 1988 indica seu caráter integrador da ordem econômica com o meio ambiente, adaptando a defesa ambiental às características da mineração, possibilitando o exercício da atividade e proporcionando a continuação do desenvolvimento econômico, de forma que os valores econômicos e ambientais se realizem de forma conjunta e equilibrada (BARROSO, 1992). O homem sempre interferiu no meio ambiente através da atividade minerária e essa ação permanecerá sendo um processo atuante na degradação e agressão ambiental uma vez que para o conforto no seu dia a dia o mesmo depende quase sempre da extração mineral. De acordo com Ribeiro Filho (2002), a experiência brasileira indica que mais do que normas formais, deverão preponderar a compreensão e a colaboração das empresas de mineração, que deverão ter seus custos com a reabilitação do meio ambiente introduzidosnos investimentos dos projetos, abrangendo desde a fase de pesquisa até as etapas de implantação e abandono das atividades minerárias. 12 A compatibilidade entre a atividade minerária e a preservação ambiental torna-se ainda mais relevante ao se constatar que o Brasil ocupa um lugar importante no ranking mundial das principais reservas minerais, destacando-se aquelas de minério de ferro, ouro, nióbio, bauxita e grafita. 2.1.1 Panorama da mineração no Brasil A mineração, uma das principais atividades econômicas do Brasil, remonta ao período colonial, a aproximadamente dois séculos após à vinda dos portugueses para a América do Sul, ocorrida de modo mais preciso no século XVII. O primeiro grande boom mineral ocorreu no século XVIII, motivado pelo descobrimento do ouro, que colocou o Brasil à frente de outros países como grande produtor mundial deste minério e que deu início ao aparecimento dos princípios fundamentais à formação do setor mineral brasileiro (BARRETO, 2001). Segundo dados apresentados pela empresa Vale S/A (2012) o panorama da mineração brasileira passou por processos de mudanças a partir do século XX, especialmente entre as décadas de 1930 e 1980. A mineração se desenvolveu a partir de uma política governamental, fundamentada especialmente em incentivos financeiros diretos do governo, servindo para desenvolver o alicerce de uma economia industrial, que de certo modo produziu alguns efeitos negativos sobre a eficácia e o crescimento minerário. Mesmo com o desenvolvimento tecnológico e com equipamentos mais potentes, somente uma pequena parte do enorme potencial minerário do Brasil foi reconhecido internacionalmente. Esta informação é corroborada pelo Instituto Brasileiro de Mineração - IBRAM (2012), que afirma que o Brasil é um dos países com maior potencialidade minerária do mundo. Com um potencial geológico imenso a ser conhecido em um território com extensão continental de 8.514.876,599 km2, e sendo detentor de mão-de-obra qualificada e de uma infraestrutura em processo de fortalecimento, que utiliza de tecnologias modernas, verifica-se um ambiente favorável ao crescimento da metalurgia e da mineração no país. De acordo com dados do CPRM (2002), o Brasil dispõe de importantes recursos naturais em seu subsolo, tais como minerais, incluindo carvão, petróleo e gás; além da água, que também contribui para o desenvolvimento socioeconômico do país. Um percentual desses recursos 13 compõem as reservas minerais, podendo ser destacados aqueles de origem metálica, como alumínio, ferro, chumbo, cobre, lítio, manganês, estanho, níquel, nióbio, ouro, zircônio, tungstênio, zinco, titânio e os de composição não-metálica, como bentonita, amianto, caulim, diatomita, granitos ornamentais, enxofre, mica, potássio, gipsita, rocha fosfática, calcário, quartzo, fluorita, magnesita, sal-gema talco, turfa e como energéticos xisto betuminoso, petróleo, carvão, urânio e gás. Considerando os dados de 2006 apresentados pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), Neves e Silva (2007), indicaram a presença de 2.641 minas no país, das quais, 2.597 minas operavam na modalidade a céu aberto, 41 na forma subterrânea e 3 eram consideradas minas mistas. Dentre estas, assim como destacado por IBRAM (2012), merecem ser ressaltadas aquelas consideradas de classe mundial, como a de nióbio, localizada em Araxá (MG); minério de ferro situadas no Quadrilátero Ferrífero (MG) e Carajás (PA); bauxita presente em Oriximiná (PA); caulim em Barcarena e Ipixuna do Pará (PA), grafita em Pedra Azul (MG) e magnesita em Brumado (BA), indicadas na Figura 1. Figura 1 - Principais regiões com depósitos minerais no Brasil Fonte: IBRAM, 2012, p. 8. 14 Na Figura 1 é possível verificar que a região sudeste, se destaca pela presença de rochas ornamentais no estado do Espírito Santo; depósitos de agregados para construção civil nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo e uma grande diversidade de recursos minerais no estado de Minas Gerais, tais como ouro, ferro, nióbio, gemas, grafita, manganês e bauxita. Em outros estados como a Bahia, destacam-se as ocorrências de vanádio, cromo, níquel e alumínio; enquanto no estado do Pará são conhecidos depósitos de alumínio, ferro, ouro, cobre, níquel e manganês. Já, em relação aos outros estados brasileiros percebe-se que, na região sul do país estão localizados os depósitos de talco (estado do Paraná), carvão (estado de Santa Catarina) e ametista (estado do Rio Grande do Sul). Diante de tal cenário, em 2013, quando consideradas as reservas minerais, o país obteve participação relevante no cenário mundial, visto que, em comparação com os dados de reservas econômicas cedidos pelo United States Geological Survey (USGS), o Brasil pode ser considerado como o possuidor das maiores reservas de nióbio (98,2%), barita (53,3%) e grafita natural (50,7%). Tendo se destacado também por suas reservas de tântalo (36,3%) e terras raras (16,1%), além destes, os minérios de estanho, ferro e níquel também mostraram participação expressiva nos valores de reserva mundial, levando o país a conquistar o segundo lugar como maior depositário destes bens minerais (DNPM, 2014b). Baseando-se no recolhimento da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), os estados de Minas Gerais, com 45,7%; Pará com 27,7%; Goiás apresentando 4,8%, São Paulo com 4,0%, Bahia detendo 2,9% foram os estados detentores das maiores arrecadações no segundo semestre de 2014, conforme apresentado no Gráfico 1, sendo que os demais estados compartilharam 14,9% da arrecadação (DNPM, 2014a). 15 Gráfico 1 - Participação dos estados brasileiros na arrecadação da CFEM no segundo semestre de 2014. Fonte: DNPM, 2014a, p. 24. Os municípios com maiores arrecadações do país no segundo semestre de 2014, em função de atividades minerárias, foram: Parauapebas - PA (18,7%), Nova Lima - MG (6,2%), Mariana - MG (5,2%), Itabira - MG (5,0%), Congonhas - MG (4,5%). As outras cidades brasileiras compartilharam 60,5% da arrecadação da CFEM, tal como indicado no Gráfico 2 (DNPM, 2014b). Gráfico 2 - Principais municípios brasileiros arrecadadores da CFEM no segundo semestre de 2014. Fonte: DNPM, 2014b, p. 24. Dessa forma, considerando todo este potencial mineral do país, faz-se importante destacar os principais impactos ambientais relacionados à atividade minerária. 16 2.1.2 Impactos ambientais causados pela mineração A Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981, que instituiu a Política Nacional de Meio Ambiente, traz em seu artigo 3º, no inciso II, a definição de degradação ambiental como sendo “a alteração adversa das características do meio ambiente” (BRASIL, 1981, Art. 3º). Já o Art. 1º da Resolução nº 01 de 1986 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), relata que o impacto ambiental pode ser compreendido como qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetem a saúde, a segurança e o bem-estar da população; as atividades sociais e econômicas; a fauna e a flora; as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; e a qualidade dos recursos ambientais. (BRASIL, 1986, Art.1º). Neste sentido, os impactos ambientais decorrentes da mineração não provocam somente a degradação paisagística, mas também um declínio na qualidade de vida das populações, além de um vasto aumento de diversos problemas relacionados à saúde pública, podendo, na maioria dos casos, afetar toda a fauna e flora de uma região, uma vez que de acordo com Silva (2007) a destruição de matas, serras e nascentes com fins exploratórios, pode levar a extinção de espécies animais e vegetais endêmicas, que deveriam ser preservadas e protegidas.Dessa forma, Penna (2009) cita os impactos desencadeados pela mineração, como sendo a intensificação da turbidez, com consequente alteração na qualidade da água e na penetrabilidade da luz solar, no interior do corpo d’agua; diminuição do oxigênio dissolvido nos ecossistemas aquáticos; derramamentos de óleos, graxas e metais pesados (altamente tóxicos, com sérios danos aos seres vivos do meio receptor); variação do pH da água, tornando-a comumente mais ácida; poluição do ar, principalmente por material particulado; assoreamento de rios e perdas de grandes áreas de ecossistemas nativos ou de uso humano. Na concepção de Silva (2007), as mudanças ocorridas nas paisagens do estado de Minas Gerais nos últimos séculos decorrem, principalmente, da extração mineral. Assim, para este autor, o progresso obtido com esta atividade é imprescindível, porém, a forma com que vem crescendo tem contribuído com a promoção da degradação ambiental que, em alguns casos, seja relacionada às paisagens ou aos cursos d'água, pode ser evidente e irreversível. 17 Segundo Penna (2009), a mineração, inserida no setor industrial, é a atividade que tem mostrado o nível mais baixo de compromisso social e ambiental, sendo também um dos setores mais conservadores e mais resistentes aos ajustes ambientais. Para Mechi e Sanches (2010), quase todas as atividades minerárias resultam em extinção de vegetação ou em um empecilho à sua regeneração, existindo situações nas quais o horizonte mais superficial do solo, que seria o mais fértil, pode ser também removido, deixando os horizontes remanescentes expostos à erosão, a qual pode conduzir ao assoreamento dos corpos d’água dos arredores do empreendimento. Ademais, os processos erosivos podem ainda prejudicar a qualidade das águas dos mananciais e reservatórios da bacia hidrográfica localizada a jusante do empreendimento, em razão da turbidez causada pelos sólidos em suspensão, assim como também pela poluição provocada pela presença de substâncias transportadas e lixiviadas ou contidas nos efluentes dos locais de mineração, tais como graxa, óleos e metais pesados. Além disso, Silva (2007) destaca os fatores geográficos e o tipo de lavra como os principais elementos que podem influenciar a extensão dos impactos ambientais e a natureza destes. De modo geral, os fatores geográficos estão relacionados com a posição da jazida, assim como a topografia, a densidade da população, os aspectos socioeconômicos e o clima, os quais podem interferir de forma positiva ou negativa no consumo das riquezas minerais. Silva (2007) ainda salienta que, repetidas vezes, a objeção às atividades minerárias é mais forte nas áreas propensas à escassez de espécies de fauna e flora ou regiões de elevado valor cênico. Examinando os impactos negativos, Silvestre (2007) reconhece que os mesmos são inevitáveis, porém não são irreparáveis e nem irreversíveis, uma vez que a atividade só pode ser desenvolvida e, desta forma autorizada, caso não comprometa os interesses públicos subsequentes. Há também a previsão de recuperação obrigatória do local minerado, fundamentada na sua devolução à sociedade, de maneira adequada ao desempenho de novas atividades, sejam elas econômicas ou não. Considerando as características do terreno, do minério e da jazida, Silvestre (2007) enumera três tipos de processo de lavra: a céu aberto, a subterrânea e a mista. De maneira geral, as lavras a céu aberto promovem maiores riscos de compromisso ambiental uma vez que há uma maior exploração do corpo mineralizado, produzindo, logo, grande volume de estéril, vibrações, poeira em suspensão e riscos de poluição das águas, na insuficiência de técnicas de manejo da 18 poluição mais efetivas (SILVA, 2007). Além disso, quando as atividades minerárias desenvolvidas a céu aberto não são submetidas a um plano de lavra apropriado, considerando um projeto de recuperação ambiental, propiciam o aparecimento de processos erosivos (CPRM, 2002). Já com relação à lavra subterrânea, os impactos sobre o meio ambiente são, comumente, menores, uma vez que a atividade é realizada em profundidade, impossibilitando a abertura das cavas produzidas na mineração a céu aberto (SILVESTRE, 2007). Ademais, segundo Penna (2009), a atividade minerária, de modo geral, utiliza volumes elevados de água durante a pesquisa mineral (durante as amostragens e trabalhos com sondas rotativas), na lavra (tais como bombeamento de água de minas subterrâneas, desmonte hidráulico), no beneficiamento (moagem, britagem, lixiviação e flotação, dentre outros), no transporte por mineroduto e na infra-estrutura (como, por exemplo, laboratórios e pessoal); havendo casos em que se faz necessário rebaixar o lençol freático para o desenvolvimento da lavra. Dessa forma, para se reduzir os impactos ambientais da mineração, faz-se necessário aumentar as exigências ambientais e a fiscalização, obrigando à mudanças no comportamento das mineradoras. De acordo com Sánchez (1994 apud FARIAS, 2002), sob a visão da empresa, há uma propensão em analisar os impactos desencadeados pela atividade minerária apenas através das formas de poluição, que são alvo de regulamentação do poder público, responsável por determinar os padrões ambientais associados à poluição do ar, das águas, além dos ruídos e vibrações. Entretanto, na concepção deste autor, é essencial que o empreendedor esteja ciente das expectativas, desejos e preocupações da comunidade, do governo (nas três esferas), do corpo técnico e dos empregados da empresa, com relação ao seu empreendimento, isto é, de todas as partes envolvidas e não somente daqueles referentes aos acionistas principais. É importante salientar que a atividade minerária deve obedecer à legislação ambiental e ao Código de Mineração, havendo a necessidade de um reconhecimento profundo dos instrumentos atuais e de sua reavaliação de modo que sejam capazes de conduzir verdadeiramente ao desenvolvimento sustentável. 19 2.1.3 Legislação A legislação pode ser entendida como um conjunto de normas jurídicas destinadas a corrigir e amparar as atividades humanas, criando direitos e deveres para os cidadãos. Desta forma, “o setor mineral brasileiro foi construído sob uma visão estratégica de desenvolvimento nacional, tendo por base uma política e uma legislação fomentadoras” (BARRETO, 2001, p.6). Segundo Wolff (2000), foram as necessidades socioeconômicas que estavam surgindo, as já existentes e as que ainda poderiam surgir dentro das sociedades, que tornaram possível a percepção de que a natureza e os recursos naturais eram merecedores de um respeito universal e efetivo, e que isso era a condição indispensável para a prática do desenvolvimento sustentável de maneira jurídica, através do direito ambiental interno e internacional. Silva, Vidal e Pereira (2001) afirmam que o primeiro dispositivo legal do Brasil, relacionado à minimização de impactos negativos decorrentes de atividades minerárias, foi a Lei nº 6.938, de 31/08/1981, que além de dispor sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, instituiu a Licença Prévia (LP), a Licença de Instalação (LI) e a Licença de Operação (LO) através do Decreto Federal nº 88.351/1983. Por sua vez, a Resolução do CONAMA nº 01/1986, estabeleceu as responsabilidades, definições, os critérios básicos e as diretrizes gerais para o uso e a implementação da Avaliação de Impactos Ambientais (AIA) como instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente (BRASIL, 1986). Além disso, o artigo 225, §2º, da Constituição Federal de 1988, estabelece a obrigatoriedade da recuperação de áreas degradadas pela mineração: “aquele que explorar recursos minerais fica obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma da lei” (BRASIL, 1988, Art. 225). Ainda segundo Silva, Vidale Pereira (2001), em 1989, foi definido através do Decreto Federal nº 97.632, artigo 1º, que todos os empreendimentos destinados à exploração de recursos minerais teriam seus projetos submetidos à aprovação dos órgãos federais, estaduais e municipais competentes e que deveriam executar o Estudo de Impacto Ambiental (EIA), o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), bem como o Plano de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD). Por sua vez, os empreendimentos já existentes teriam que regularizar sua situação por meio de um PRAD. 20 Deve-se ressaltar que no Brasil existe uma vasta legislação ambiental a ser considerada, principalmente quando se observa que uma exploração minerária sem fiscalização eficiente e um rígido controle por parte dos órgãos públicos suscita passivos ambientais, os quais correspondem a um dos principais problemas do setor minerário. 2.1.3.1 Legislação ambiental Segundo Farias (2002), a legislação ambiental brasileira é extensa, avançada e conflitante, criando dificuldades à sua aplicação, sendo necessária uma compatibilização, pois a sua aplicabilidade deixa muito a desejar. O Quadro 1 destaca as 17 leis ambientais relacionadas à proteção do patrimônio cultural, da fauna, dos recursos hídricos e florestais, que, na concepção de Machado (2015), podem garantir a preservação do patrimônio ambiental do país. Quadro 1 - Descrição das 17 leis ambientais mais importantes com relação à proteção do patrimônio cultural, fauna, recursos hídricos e florestais (continua) Lei Trata-se Lei Patrimônio Cultural – decreto-lei nº 25 de 30/11/1937 Lei que organiza a Proteção do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, incluindo como patrimônio nacional os bens de valor etnográfico, arqueológico, os monumentos naturais, além dos sítios e paisagens de valor notável pela natureza ou a partir de uma intervenção humana. Lei da Fauna Silvestre – nº 5.197 de 03/01/1967 A lei classifica como crime o uso, perseguição, apanha de animais silvestres, caça profissional, comércio de espécies da fauna silvestre e produtos derivados de sua caça, além de proibir a introdução de espécie exótica (importada) e a caça amadorística sem autorização do Ibama. Criminaliza também a exportação de peles e couros de anfíbios e répteis em bruto. Lei das Atividades Nucleares – nº 6.453 de 17/10/1977 Dispõe sobre a responsabilidade civil por danos nucleares e a responsabilidade criminal por atos relacionados com as atividades nucleares. Lei do Parcelamento do Solo Urbano – nº 6.766 de 19/12/1979 Objetiva a criação de um espaço pertinente a habitação humana e regulamenta o parcelamento do solo, preconizando o ambiente urbano sustentável, atentando sempre para a valorização da vida humana, aliando o crescimento urbano à preservação ambiental. Lei do Zoneamento Industrial nas Áreas Críticas de Poluição – nº 6.803 de 02/07/1980 Atribui aos estados e municípios o poder de estabelecer limites e padrões ambientais para a instalação e licenciamento das indústrias, exigindo o Estudo de Impacto Ambiental. 21 Quadro 1 - Descrição das 17 leis ambientais mais importantes com relação à proteção do patrimônio cultural, fauna, recursos hídricos e florestais (continua) Lei Trata-se Lei da Política Nacional do Meio Ambiente – nº 6.938 de 17/01/1981 É a lei ambiental mais importante e define que o poluidor é obrigado a indenizar danos ambientais que causar, independentemente da culpa. O Ministério Público pode propor ações de responsabilidade civil por danos ao meio ambiente, impondo ao poluidor a obrigação de recuperar e/ou indenizar prejuízos causados. Esta lei criou a obrigatoriedade dos estudos e respectivos relatórios de Impacto Ambiental (EIA-RIMA). Lei da Área de Proteção Ambiental – nº 6.902 de 27/04/1981 Lei que criou as “Estações Ecológicas”, áreas representativas de ecossistemas brasileiros, sendo que 90% delas devem permanecer intocadas e 10% podem sofrer alterações para fins científicos. Foram criadas também as “Áreas de Proteção Ambiental” ou APAS, áreas que podem conter propriedades privadas e onde o poder público limita as atividades econômicas para fins de proteção ambiental. Lei da Ação Civil Pública – nº 7.347 de 24/07/1985 Lei de interesses difusos, trata da ação civil pública de responsabilidades por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor e ao patrimônio artístico, turístico ou paisagístico. Lei do Gerenciamento Costeiro – nº 7.661 de 16/05/1988 Define as diretrizes para criar o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro, e define zona costeira como espaço geográfico da interação do ar, do mar e da terra, incluindo os recursos naturais e abrangendo uma faixa marítima e outra terrestre. Permite aos estados e municípios costeiros instituírem seus próprios planos de gerenciamento costeiro, desde que prevaleçam as normas mais restritivas. Lei da criação do IBAMA – nº 7.735 de 22/02/1989 Criou o IBAMA, incorporando a Secretaria Especial do Meio Ambiente e as agências federais na área de pesca, desenvolvimento florestal e borracha. Ao IBAMA compete executar a política nacional do meio ambiente, atuando para conservar, fiscalizar, controlar e fomentar o uso racional dos recursos naturais. Lei dos Agrotóxicos – nº 7.802 de 10/07/1989 A lei regulamenta desde a pesquisa e fabricação dos agrotóxicos até sua comercialização, aplicação, controle, fiscalização e também o destino da embalagem. Lei da Exploração Mineral – nº 7.805 de 18/07/1989 Esta lei regulamenta as atividades garimpeiras. Para estas atividades é obrigatória a licença ambiental prévia, que deve ser concedida pelo órgão ambiental competente. Lei da Política Agrícola – nº 8.171 de 17/01/1991 Coloca a proteção do meio ambiente entre seus objetivos e como um de seus instrumentos. Define que o poder público deve disciplinar e fiscalizar o uso racional do solo, da água, da fauna e da flora; realizar zoneamentos agroecológicos para ordenar a ocupação de diversas atividades produtivas, desenvolver programas de educação ambiental, fomentar a produção de mudas de espécies nativas, entre outros. Lei da Engenharia Genética – nº 8.974 de 05/01/1995 Esta lei estabelece normas para aplicação da engenharia genética, desde o cultivo, manipulação e transporte de organismos modificados (OGM), até sua comercialização, consumo e liberação no meio ambiente. 22 Quadro 1 - Descrição das 17 leis ambientais mais importantes com relação à proteção do patrimônio cultural, fauna, recursos hídricos e florestais (conclusão) Lei Trata-se Lei de Recursos Hídricos – nº 9.433 de 08/01/1997 Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e cria o Sistema Nacional de Recursos Hídricos. Define a água como recurso natural limitado, dotado de valor econômico, que pode ter usos múltiplos (consumo humano, produção de energia, transporte, lançamento de esgotos). A lei prevê também a criação do Sistema Nacional de Informação sobre Recursos Hídricos para a coleta, tratamento, armazenamento e recuperação de informações sobre recursos hídricos e fatores intervenientes em sua gestão. Lei de Crimes Ambientais – nº 9.605 de 12/02/1998 Reordena a legislação ambiental brasileira no que se refere às infrações e punições. A pessoa jurídica, autora ou coautora da infração ambiental, pode ser penalizada, chegando à liquidação da empresa, se ela tiver sido criada ou usada para facilitar ou ocultar um crime ambiental. Novo Código Florestal – nº 12.651 de 25/05/2012 Determina a proteção de florestas nativas e define como áreas de preservação permanente (onde a conservação da vegetação é obrigatória) uma faixa de 30 a 500 metros nas margens dos rios, de lagos e de reservatórios, além de topos de morro, encostas com declividade superior a 45 graus e locais acima de1.800 metros de altitude. Fonte: Adaptado de MACHADO, 2015. Ressalta-se que a atividade minerária no país deve ser desenvolvida em cumprimento ao disposto no Código de Mineração (Lei n° 227/1967) e legislação correlativa, obedecendo-se às leis descritas no Quadro 1, quando pertinentes. Dessa forma minerar sem autorização é um crime ambiental, havendo ainda a necessidade de autorização do Instituto Estadual de Florestas (IEF) para retirada de cobertura vegetal e da Agência Nacional das Águas (ANA)/Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM) para outorga de água. Destaca-se, ainda, a necessidade de aplicação da Lei de Interesses Difusos (Lei nº 7.347/1985), ou seja, de interesse comum a todos, que trata da ação civil pública de responsabilidades por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor e ao patrimônio artístico, turístico ou paisagístico (BRASIL, 1985). O direito ambiental, segundo Wolff (2000), tem como objetivo, por sua finalidade aparente e característica de preservação da natureza, fazer exclusivamente a proteção do homem, que em consequência, possui um direito à conservação da natureza, em complemento aos outros direitos garantidos aos cidadãos. Deste modo, todas as leis citadas no Quadro 1 objetivam atender os anseios socioeconômicos de cada indivíduo, com o intuito de garantir uma qualidade de vida melhor e manter a 23 integridade do meio ambiente, para que possa também satisfazer as necessidades das futuras gerações. 2.1.3.2 Código de Mineração Segundo Barreto (2001), o Código de Mineração foi publicado transversalmente pelo Decreto de Lei n° 227, de 1967, e atualizado pela Lei n° 9.314, de 1996 sendo o marco regulatório infraconstitucional mais importante para o setor da mineração no Brasil. O Código de Mineração retrata conceitos como pesquisa mineral e de lavra, os direitos do minerador e do proprietário do solo, as sanções e nulidades, as servidões, a área livre, o direito de prioridade, as empresas legalmente habilitadas à mineração, a disponibilidade de áreas, o reconhecimento geológico, o grupamento mineiro, a cessão de títulos minerários, o consórcio de mineração, entre outros assuntos (BRASIL, 1967). Além disso, o Código de Mineração aborda cinco formas para o aproveitamento de substâncias minerais, determinados de acordo com a sua relevância econômica, espécie de jazimento e a soberania concedente do direito, as quais podem ocorrer através de monopolização, quando, em virtude de lei especial, depender de execução direta ou indireta do Governo Federal; de concessão de lavra, quando depender de portaria de concessão do Ministro de Estado de Minas e Energia; de autorização de pesquisa, quando depender de expedição de alvará de autorização do Diretor-Geral do DNPM; de permissão de lavra garimpeira, quando depender de portaria de permissão do Diretor-Geral do DNPM e do licenciamento, quando depender de licença expedida em obediência aos regulamentos administrativos locais e de registro da licença no DNPM (BRASIL, 1967). Faz-se importante destacar que para a obtenção da outorga de lavra, o Código de Mineração exige uma pesquisa detalhada da jazida, com relatório aprovado pelo DNPM, e uma adequação da área de lavra com relação à condução técnica e econômica dos trabalhos de extração e beneficiamento, respeitando-se os limites da área de pesquisa. Assim, como destacado por Amado (2011), não haverá autorização para a lavra caso esta seja considerada nociva ao bem público ou, de acordo com o juízo do Governo, comprometa interesses que ultrapassem a utilidade da exploração industrial. 24 Um dos obstáculos para a regulamentação da atividade minerária está na demarcação dos limites de responsabilidade entre as três esferas do poder legislativo (União, Estado e Município), pois para cada tipo de atividade deve ser observado a qual dessas esferas compete legislar, e a quem cabe essa responsabilidade (FARIAS, 2002). Assim, ainda de acordo com Farias (2002), é notável a falta de associação intergovernamental e, também, de um acordo com a população para se elaborar uma política minerária no país a fim de instituir parâmetros e critérios para o desenvolvimento sustentável desta atividade. Atualmente, está em tramitação no Poder Executivo o “Novo Código de Mineração”, Projeto de Lei n° 37/2011, que visa, além de regulamentar a atividade minerária, estabelecer diretrizes para a desativação, fechamento de minas e com relação aos passivos ambientais desencadeados por esta atividade (BRASIL, 2014). Faz-se importante destacar que todas as decisões relacionadas ao uso sustentável dos recursos naturais não podem ser tomadas sem que haja uma avaliação econômica dos mesmos, uma vez que há alternativas para o desenvolvimento da região onde ocorre a exploração minerária, podendo, muitas vezes, optar-se pela preservação destes recursos, não permitindo sua extração através dos instrumentos de lei. 2.1.4 A sustentabilidade em atividades minerárias A elucidação para o desenvolvimento sustentável na perspectiva ambiental é que “este envolve a maximização dos benefícios líquidos do desenvolvimento econômico, sujeito à manutenção dos serviços e da qualidade dos recursos naturais ao longo do tempo” (PEARCE; TURNER, 1991 apud HADDAD, 2006, p.13). Para a ocorrência dessa manutenção faz-se necessária a aceitação de algumas regras gerais, tais como a utilização dos recursos renováveis com taxas iguais ou menores que a taxa natural, permitindo que estes se regenerem; a melhoria da eficiência no uso dos recursos não-renováveis, passível ao grau de substituição entre o progresso tecnológico e estes recursos; e a manutenção dos fluxos de resíduos no meio ambiente sempre no nível igual ou abaixo de sua capacidade de assimilação (PEARCE; TURNER, 1991 apud HADDAD, 2006). 25 Assim, Alcoforado (2013) afirma que para a subsistência da própria humanidade o desenvolvimento sustentável passou a ser uma imposição que se defronta com duas notáveis ameaças: a primeira corresponde ao sistema capitalista mundial, de natureza econômica que, simbolizado pela crise geral, tende a conduzir a economia mundial à depressão. A outra ameaça é de natureza ambiental, sendo representada pelo esgotamento dos recursos naturais do planeta, pelo aumento populacional, pela falta de água, pelo crescimento desenfreado dos municípios e pela desastrosa alteração climática global observada no decorrer do século XXI. Neste sentido, Assis, Barbosa e Mota (2011) relatam que para a construção do desenvolvimento sustentável o fator fundamental é o uso dos recursos naturais, mas desde que a sociedade se conscientize que os mesmos só estarão disponíveis para esta e as futuras gerações, se forem aproveitados de maneira racional e em conformidade com o tempo que levam para serem gerados e repostos. Contudo, quase sempre o cumprimento desse tempo não se adapta às necessidades ligadas ao crescimento populacional, criando situações ameaçadoras às espécies e aos recursos materiais do planeta. Para Barreto (2001), houve uma acentuada preocupação mundial com as questões ambientais após o fim da Segunda Guerra Mundial, mais exatamente a partir da década de 1950, consolidando-se verdadeiramente no final da década de 1960. Porém, foi apenas em 1972, durante a Conferência de Estocolmo, realizada na Suécia, que ocorreu a primeira conscientização acerca da relevância do meio ambiente para a sobrevivência da espécie humana, destacando-se a necessidade de uma melhor utilização dos recursos naturais e do estado de destruição em que estes se encontravam. Os últimos 45 anos foram relevantes no que diz respeito ao aumento da procura pelos recursos naturais do planeta, decorrente do aumento da população mundial e do elevado padrão de vida dos países ricos e emergentes (ALCOFORADO, 2013). Neste contexto, a mineração, tal como uma atividadeeconômica, deve, além de buscar a otimização do emprego dos recursos minerais, analisando os aspectos econômicos e técnicos, contribuir para o desenvolvimento de um modelo econômico adequado para a acumulação de capital e tecnologia, garantindo, concomitantemente, a salubridade ambiental, de tal forma que, depois da desativação do empreendimento e fechamento de mina, o uso das áreas explotadas permita a integração contínua de valores socioeconômicos às comunidades locais e, por conseguinte, à toda a sociedade (BARRETO, 2001). 26 Desta forma, Scliar (2004) afirma que para se alcançar a sustentabilidade e para que as necessidades das empresas sejam amplamente atendidas, deverão ser atingidas as esferas sociais, culturais, institucionais, ecológicas, econômicas, políticas, territoriais, tecnológicas, globais e sistêmicas, as quais permitirão a gestão do território e o gerenciamento socioambiental dos empreendimentos mineradores. A busca por um desenvolvimento sustentável em atividades minerárias torna-se ainda mais relevante quando são considerados os minérios compostos por elementos potencialmente causadores de impactos ambientais, visto que muitas vezes, além da recuperação ambiental ser inviável, estes oferecem riscos à saúde humana, como é o caso do arsênio. 2.2 A química do arsênio A palavra arsênio é derivada do latim, arsenicum e corresponde à um elemento químico de símbolo “As” muitas vezes identificado como semimetal ou metaloide, visto que possui características químicas e físicas que pertencem tanto aos metais quanto aos não metais (QUINÁGLIA, 2012). Este elemento é encontrado na coluna 15 da tabela periódica (próximo ao nitrogênio, ao fósforo, ao antimônio e ao bismuto) e possui massa atômica 75 u, apresentando-se, nas condições ambiente, no estado sólido. Seu número atômico é 33 e seus 33 elétrons estão distribuídos nas camadas K, L, M e N, em número de 2, 8, 18 e 5, respectivamente, já a estrutura eletrônica dos orbitais apresenta-se como 1s2, 2s2, 2p6,3s2, 3p6, 3d10, 4s2, 4p3. Assim, nesta configuração, o arsênio adquire uma estrutura cristalina trigonal de modo que cada átomo compartilha os elétrons de valência 4p com outros três átomos de As vizinhos (HENKE; HUTCHINSON, 2009 apud FRANCO, 2014). Segundo Lira (2015), o arsênio exibe três estados alotrópicos que são cinza ou metálico, amarelo e preto. O cinza metálico apresenta-se no formato “α” configuração mais estável em situações normais, possuindo estrutura romboédrica e sendo também um ótimo condutor de calor, mas um péssimo condutor de eletricidade. O arsênio amarelo, também denominado trissulfeto de arsênio, tem formato “γ”, adquirido quando o vapor de arsênio se resfria muito 27 rápido, possuindo característica volátil e sendo mais reagente que o arsênio metálico, além disso, produz fosforescência em temperatura ambiente. Pode-se também encontrar uma terceira forma alotrópica de arsênio, o preto no formato “ß”, de configuração hexagonal, com características intermediárias entre as outras duas formas alotrópicas retratadas, sendo obtido pela decomposição térmica da arsina ou esfriamento lento do vapor de arsênio (QUIMLAB, 2015). O arsênio reage com o enxofre e também, agressivamente, com o cloro, se combinando com a maior parte dos metais para formar o arsenieto (composto de arsênio e cobalto) quando aquecido. Não reage com o ácido clorídrico em ausência de oxigênio, porém reage com o ácido nítrico aquecido, em estado diluído ou concentrado, e com outros oxidantes como o ácido perclórico e o peróxido. Apesar de muitos de seus compostos serem solúveis, o arsênio é insolúvel em água (LIRA, 2015). Segundo Rodrigues e Malafaia (2008), o elemento As pode ser frequentemente identificado em minérios de ouro (Au), manganês (Mn), cobalto (Co), prata (Ag), chumbo (Pb), níquel (Ni), antimônio (Sb) e cobre (Cu), havendo mais de 200 espécies minerais dos quais o elemento principal é o arsênio; entretanto, o mineral mais usual é a arsenopirita (FeAsS). Para Franco (2014), os compostos de arsênio podem ser encontrados tanto na forma de moléculas orgânicas, em que este elemento se encontra ligado ao carbono, como na forma de moléculas inorgânicas nas quais o As está ligado a outros elementos como ferro (Fe), oxigênio (O) e enxofre (S). Os compostos orgânicos do As, representados na Figura 2, são desenvolvidos através de atividade biológica, normalmente em águas superficiais expressivamente impactadas devido à poluição industrial. 28 Figura 2 - Alguns compostos de arsênio comuns na natureza Fonte: HENKE; HUTCHINSON, 2009 apud FRANCO, 2014, p.14. O efeito tóxico das espécies de arsênio depende, principalmente, de sua forma química. O arsênio presente em águas naturais pode ocorrer na forma As (III arsenito), As (V arseniato), íon monometilarsônico e íon dimetilarsínico. As águas subterrâneas contêm arsênio na forma de arsenito e arseniato, já as águas do mar, lagoas, lagos, e onde houver possibilidade de biometilação, arsenito e arseniato podem ser encontrados junto com monometilarsônico e dimetilarsínico. As formas do As (III) e As (V) são as espécies mais tóxicas, enquanto arsenobetaína e arsenocolina são relativamente não tóxicas (BARRA, 2000). Como os efeitos toxicológicos/fisiológicos e a biodisponibilidade do arsênio estão vinculados à sua forma química, a compreensão da transformação e da especiação no meio ambiente torna- se importante uma vez que o mesmo afeta a água e o solo. Assim, a contaminação por arsênio constitui um problema ambiental em muitas regiões do mundo visto que, a intoxicação por este elemento acarreta, nos casos menos graves, o surgimento de feridas na pele que não cicatrizam, já quando atinge um estado mais crítico da contaminação podem ocorrer danos aos órgãos vitais, gangrena e câncer. 29 2.2.2 Ocorrência do arsênio no ambiente De acordo com Gonçalves (2011), o arsênio é um elemento que pode, comumente, ser encontrado na atmosfera, hidrosfera, litosfera e biosfera. Ainda de acordo com este autor, a mobilização do arsênio no meio ambiente ocorre por meio da combinação de episódios ambientais, incluindo processos naturais como emissões vulcânicas, meteorização das rochas e atividades biológicas e também por processos antropogênicos através do uso de combustíveis fósseis, pesticidas, herbicidas e atividades de mineração. Segundo Correia (2008), a presença de arsênio na atmosfera está relacionada às altas temperaturas ocorridas na Terra, em função das erupções vulcânicas; combustão devido à queima de florestas e atividades industriais, associadas com a combustão de materiais e minerais que possuem arsênio; podendo também ser liberado para atmosfera através da dissipação do solo (especialmente na forma de arsina). Desta forma, percebe-se que o arsênio pode ser encontrado na água, no solo e no ar sendo, portanto, um elemento químico comum; assim, as formas de contaminação por este elemento podem ocorrer através da água potável, de irrigação, na cadeia de alimentação e nos solos, podendo ter uma origem antrópica ou natural. 2.2.2.1 Ocorrência natural de arsênio Para Gonçalves (2011) o As pode contaminar um aquífero devido à paragênese mineral presente em determinados tipos de rochas, ambiente geoquímico, regime hidrológico, controle topográfico e hidrogeológico. O tempo de permanência das águas no aquífero em função da condicionante topográfica e hidrogeológica por menor que seja, aliada à uma maior taxa de renovação das águas subterrâneas, promovem uma quantidade maior de arsênio a ser transportada pelos fluxos de águas superficiais, subsuperficiais e subterrâneos. Existe na crosta terrestre uma quantidade de arsênio de 1,5 a 3 mg/kg, sendo este considerado o vigésimo elemento relativamente mais abundante na natureza e no corpo humano,o décimo segundo (MANDAL; SUZUKI, 2002 apud CORREIA, 2008). Apesar de ser encontrado em um grande número de minerais, a ocorrência mais comum, cerca de 60%, pertence à classe dos 30 arseniatos; 20% à de sulfuretos e sais de enxofre e os restantes 20% incluem arsenietos, arsenitos e, eventualmente, arsênio elementar e óxidos (CORREIA, 2008). Desse modo, Pataca, Bortoleto e Bueno (2005) relatam que as fontes naturais de contaminação por arsênio no Brasil estão voltadas especialmente para as rochas que alojam os depósitos auríferos sulfetados. Segundo Gardenal (2002), na região abrangida pelo Quadrilátero Ferrífero, por exemplo, o arsênio ocorre especialmente em minerais como a arsenopirita e pirita, que estão associados às mineralizações de ouro. De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde - OMS (2001 apud CORREIA, 2008), em rochas ígneas os teores de arsênio são, geralmente, baixos, não havendo diferença significativa entre os diferentes litotipos desta classe, os quais oscilam entre <1 a 15 mg de As/kg, exibindo em média 2mg de As/kg. Nas rochas sedimentares, os teores de arsênio, são levemente superiores à média da crosta da Terra, apesar destes teores estarem relacionados aos principais minerais constituintes destes litotipos. Ainda segundo a OMS (1981 apud CORREIA, 2008), locais de depósitos de sedimentos de textura mais argilosa podem, normalmente, ter quantidades mais altas de arsênio do que as rochas arenosas, reproduzindo a proporção de matéria orgânica, argilas e sulfuretos em sua composição. Teores consideravelmente mais elevados, de até 900 mg de As/kg, podem ser verificados em rochas sedimentares argilosas, ao passo que nas rochas sedimentares arenosas os teores estão mais próximos das rochas ígneas (<1 - 20mg de As/kg). Já nas rochas metamórficas os teores de arsênio correspondem aos registros das suas antecessoras, ou seja, as rochas sedimentares ou ígneas, apresentando uma composição média de cerca de 5 mg/kg ou inferior (KINNIBURGH; SMEDLEY, 2005 apud CORREIA, 2008). Assim, de forma geral, o As pode ser encontrado no solo de forma natural e por fatores antropogênicos, entretanto, quando em concentrações elevadas, este elemento pode se tornar perigoso e tóxico. 31 2.2.2.2 Ocorrência antropogênica do arsênio As ações antrópicas também podem ser fontes de arsênio, podendo ser destacadas as atividades agrícolas através da utilização de herbicidas, pesticidas, desfolhantes, inseticida e esterilização de solos; a preservação de madeiras; a queima de carvão rico em As e aos rejeitos decorrentes da mineração e das atividades de apuração dos metais não ferrosos, tanto no estado gasoso como sólido (BORBA, 2002). Desse modo, segundo Borba, Figueiredo e Cavalcanti (2004) as fontes antropogênicas de As são provenientes de sedimentos contaminados, das pilhas de rejeito (principais fontes de liberação do elemento no meio ambiente) e solos. Apesar de alguns estudos como de Mechi e Sanches (2010) sugerirem que as emissões naturais de arsênio para o ar são um pouco mais elevadas do que as emissões industriais, outras pesquisas, como a de Correia (2008), apontam que as emissões antrópicas superam em grande escala as emissões naturais, uma vez que a quantidade de particulados liberados de forma natural é inferior àquela de origem antrópica, já que para esta última existem vários meios para a contaminação, tais como a mineração e a agricultura, dentre outras. Assim, destaca-se que o arsênio pode ser largamente diagnosticado no meio industrial, principalmente nas indústrias de ouro, prata, cobre, cobalto e zinco, podendo levar à contaminação das águas disponíveis para o consumo humano. 2.2.3 O arsênio e a saúde humana Segundo Monteiro, Barrio e Moreira (2014) o organismo humano tem uma capacidade individual de metabolizar os compostos de arsênio que reage de maneira diferente de indivíduo para indivíduo. Desta forma, seus efeitos biológicos não dependem apenas da quantidade ingerida, mas da sua capacidade de detoxificação (retirada das substâncias potencialmente tóxicas de dentro do organismo) e da metabolização. Neste sentido, Gonçalves (2011) afirma que o arsênio, durante muitos anos, foi diagnosticado como sendo um dos piores venenos, carregando consigo uma história que teria sido marcada por homicídios e suicídios, passando desde então a ser objeto de estudos, tradição e lendas 32 fantasiosas. O aspecto inofensivo, o sabor adocicado, a insipidez, a facilidade de ser obtido e misturado a outros alimentos, são as principais características que ajudaram a torná-lo popular. Ao ingerir o arsênio, o indivíduo não apresenta sintomas de intoxicação, a qual assemelha-se a uma doença, além disso, sua presença na composição do líquido utilizado no processo de embalsamamento torna impossível o diagnóstico de envenenamento por este elemento (GONÇALVES, 2011). Durante a Idade Média, acreditava-se que o arsênio em pequenas doses teria uma ação tonificante, que provocava aumento do vigor e do peso, sendo ainda utilizado no tratamento de dermatoses, psoríase, acne, leishmaniose, prurido e sífilis, epilepsia, malária e asma (GONÇALVES, 2011). Segundo Azevedo (2007), o arsênio apresenta altos níveis de toxicidade uma vez que compostos de arsênio podem ser facilmente absorvidos, tanto oralmente quanto por inalação, sendo a extensão da absorção dependente da solubilidade do composto. Quando presente no solo, o arsênio forma complexos insolúveis com óxidos de ferro, alumínio e magnésio e, nesta estrutura, o metal apresenta pouca mobilidade. No entanto, o arsênio pode ser liberado da fase sólida sob condições redutoras, resultando em formas de arsênio com mobilidade, as quais podem ser lixiviadas para a água subterrânea ou escoar para águas as superficiais (CETESB, 2014). Assim, o arsênio pode estar presente em proporção extremamente pequena em todos os alimentos, com concentrações mais relevantes sendo comumente observadas em frutos do mar, carnes e grãos, com valores mais baixos verificados em vegetais, derivados do leite e frutas (CETESB, 2014). A forma de ocorrência do arsênio (orgânica e inorgânica), aliada ao seu estado de oxidação, que pode ser – 3, 0, + 3 ou + 5, influenciam na toxicidade deste elemento. Faz-se importante ressaltar que os compostos inorgânicos são mais tóxicos do que os compostos orgânicos (BARRA, 2000). 33 Ainda segundo Barra (2000), o grau de toxicidade dos compostos de arsênio pode ser apresentado em ordem decrescente: arsina > arsenito > arseniato > ácidos alquil-arsênicos > compostos de arsônio > arsênio elementar. Ademais, o arsênio trivalente (arsenito) é 60 vezes mais tóxico do que a forma oxidada pentavalente (arseniato). Neste contexto, Martin (2008) afirma que, [...] a dose letal aguda de arsênio inorgânico para humanos foi estimada em cerca de 0,6 mg/kg/dia: isso significa que para um adulto de 70 kg, uma dose tóxica é de 42 mg ou 0,042 gramas. Para uma criança de 10 kg, isso seria equivalente a uns 6 mg ou 0,006 gramas. A título de comparação, 1 grama de arsênio é suficiente para matar 7 pessoas adultas. A exposição a altos níveis de arsênio inorgânico – mais de 100 ppm de arsênio no alimento e na água – também pode ser fatal. (MARTIN, 2008, p. 2). O arsênio pode causar intoxicação podendo ocorrer toxicidade, crônica ou aguda, decorrente de exposições a longo ou curto prazo, respectivamente, tendo como consequência diversas patologias. 2.2.3.1 Efeitos e riscos à saúde Conforme Gonçalves e Lena (2013), a presença de elementos tóxicos no ambiente é um forte indício para considerá-los como fonte de risco à saúde, que pode ser fortalecido pela biodisponibilidade (indica a extensão de absorção e a velocidade de um princípio ativo em uma forma de dosagem), pela quantidade total do elemento e por sua toxicidade.
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