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OS PRINCIPAIS PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL Princípio da Supremacia da Constituição Esse princípio deverá ser considerado como premissa para a interpretação constitucional, tendo em vista que não se admite nenhum tipo de interpretação que coloque em risco a supremacia formal e material do texto constitucional. Sobre esse importante princípio, núcleo essencial da interpretação constitucional, o Min. Celso de Mello assim se manifestou: “O princípio da supremacia da ordem constitucional – consectário da rigidez normativa que ostentam os preceitos de nossa Constituição – impõe ao Poder Judiciário, qualquer que seja a sede processual, que se recuse a aplicar leis ou atos estatais reputados em conflito com a Carta Federal. A superioridade normativa da Constituição traz, ínsita em sua noção conceitual, a ideia de um estatuto fundamental, de uma fundamental law, cujo incontrastável valor jurídico atua como pressuposto de validade de toda a ordem positiva instituída pelo Estado dentro dessa concepção, reveste-se de nulidade o ato emanado do Poder Público que vulnerar os preceitos inscritos na Constituição. Uma lei inconstitucional é uma lei nula, desprovida, consequentemente, no plano jurídico, de qualquer conteúdo eficacial.” Princípio da Unidade da Constituição Segundo esse princípio, a Constituição formaria um sistema equilibrado de regras e princípios, não colidentes entre si, e o intérprete deveria observar essa unidade constitucional na hora de interpretá-la. Nesse diapasão, pode-se dizer que a posição já assentada pela jurisprudência do STF é a de que não há hierarquia entre as normas constitucionais, competindo à Corte a defesa dessas normas, e não a fiscalização do poder constituinte originário. As disposições idealizadas pelo constituinte originário devem ser analisadas harmoniosamente, pois não há verdadeira antinomia entre as normas constitucionais, por isso devemos utilizar a expressão “aparente conflito” entre normas constitucionais, e não “verdadeiro conflito”. O intérprete deverá nas situações de litígio ora determinar a aplicação de um princípio, ora de outro, privilegiando um direito em detrimento de outro, mas jamais esvaziando o núcleo principal do direito fundamental que sofreu restrição. É um princípio de natureza abstrata e estático. Princípio da Concordância Prática (ou da Harmonização) A concordância prática ou princípio da harmonização deriva do princípio da unidade e recomenda ao intérprete que, ao se deparar com situações concretas de concorrência entre bens constitucionalmente protegidos, adote a solução para otimizar a realização de todos, mas sem negar completamente um direito ou um princípio. Ex.: prisões processuais x princípio da presunção da inocência; ou ainda, liberdade de informação x proteção à vida privada. É um princípio aplicável ao caso concreto e é dinâmico. Princípio do Efeito Integrador (ou da Eficácia Integradora) Esse princípio reforça a importância da integração política e social e conduz a decisões judiciais pluralisticamente integradoras. Não é utilizado em todos os casos de interpretação, mas concebe a Constituição como elemento inafastável de integração comunitária. Princípio da Justeza (ou da Conformidade Funcional) O Poder Judiciário não poderá interpretar a Constituição subvertendo o esquema organizatório-funcional nela estabelecido. Com isso, o significado das normas constitucionais não pode ser deturpado, sob pena de se colocar em risco o próprio Estado Democrático de Direito. Podemos citar como exemplo de inobservância do princípio da conformidade funcional, o entendimento dos Ministros Eros Grau e Gilmar Mendes sobre o art. 52, X, da Constituição, o qual, segundo eles, serviria apenas para dar publicidade às decisões do STF, que, no controle difuso ou concentrado, produziriam efeitos erga omnes. Princípio da Força Normativa da Constituição e da Máxima Efetividade das Normas Constitucionais Os dois princípios impõem que à norma constitucional, sujeita à atividade hermenêutica, deve ser atribuído o sentido que maior eficácia lhe conceda, sendo vedada a interpretação que lhe supra ou diminua a finalidade. São princípios que buscam o máximo de efeitos jurídicos que uma norma constitucional pode produzir, inclusive as normas de conteúdo programático. Em voto importante sobre a máxima efetividade da Constituição, o Min. Celso de Mello, em julgado sobre o direito à saúde, assim concluiu: Cabe assinalar, presente esse contexto – consoante já proclamou esta Suprema Corte – que o caráter programático das regras inscritas no texto da Carta Política não pode converter-se em promessa constitucional inconsequente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. E é nesse sentido que a sociedade espera que a sua Constituição seja interpretada, na busca pela exegese da norma que lhe confira mais efeitos práticos, ou seja, uma força concreta mais intensa. Com esses princípios iluminados, os direitos sociais (relacionados à saúde, à educação, à assistência, por exemplo) ganham ainda mais espaço e proteção jurídica no país. Princípio da Interpretação Conforme a Constituição A interpretação conforme a Constituição não é apenas um princípio de interpretação constitucional, mas também uma técnica de decisão em controle concentrado de constitucionalidade, na forma do art. 28, parágrafo único, da Lei no 9.868/99. Em nome da presunção de constitucionalidade das leis, se a norma em questionamento permitir plúrimas interpretações, umas incompatíveis e pelo menos uma compatível com a Constituição, o intérprete poderá afastar as contradições, mantendo a norma no sistema jurídico desde que interpretada em conformidade com a Constituição. André Ramos de Tavares faz lúcidas ponderações sobre a utilização do princípio quando destaca que não há permissão para a interpretação da Constituição a partir das leis em geral (de baixo para cima), tendo em vista que seria absolutamente vedada a interpretação dessa maneira, dada a supremacia constitucional. Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade Histórico O princípio da razoabilidade encontra guarida no direito norte-americano, principalmente na 5a e na 14a Emendas. A 5a Emenda faz parte do Bill of Rights norte americano, adicionado à Constituição Federal em 1789, que dispunha, no tocante ao nosso estudo, que nenhuma pessoa poderia ser privada de sua vida, liberdade ou propriedade sem o due process of law. Já a 14a Emenda foi inserida com o intuito de estender a garantia do due process of law aos ex-escravos, após a Civil War, e ao direito dos Estados federados, acrescentando, no entanto, o primado do tratamento igualitário pela lei, também para o direito federal. É importante destacar que a cláusula do due process of law (que deve ser entendida nos seus contornos processual e substantivo) deve ser aplicada como meio de interpretação jurisprudencial da Suprema Corte norte-americana, e passou de uma simples garantia processual, para o controle de mérito das decisões estatais. Em suma, a noção de razoabilidade guarda afinidade com a ideia de equilíbrio, moderação e harmonia. Busca aquilo que atende ao senso comum, aos valores vigentes em dado momento, em última análise, pretende alcançar a justiça. Carrega, portanto, forte elemento subjetivo e abstrato. O princípio da proporcionalidade, por sua vez, é posterior à razoabilidade norte-americana e foi desenvolvido a partir da década de 1950, pelo Tribunal Constitucional Alemão. A Corte o desenhou como um método de interpretaçãoe aplicação dos direitos fundamentais, empregado particularmente nos casos em que um ato estatal, destinado a promover a realização de um direito fundamental ou de um interesse coletivo, implica a restrição de um direito fundamental. É na Alemanha que o princípio da proporcionalidade ganha raízes mais profundas. De acordo com a doutrina alemã defendida por Robert Alexy, o princípio seria composto por três sub-regras: a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito. Adequada seria a medida capaz de fomentar e não obrigatoriamente atingir determinado fim; necessária, aquela que, quando comparada a outras tão eficazes quanto restringisse em menor escala o direito fundamental violado; e proporcional em sentido estrito à medida que promovesse a realização de um direito fundamental mais importante do que o que com ele colide. A partir disso, a proporcionalidade passou a ser utilizada por diversos países, entre eles Portugal, onde foi incorporada ao conceito de razoabilidade, proveniente do Direito anglo- saxão, através do qual se examina a compatibilidade entre os meios e os fins. No Direito lusitano, o princípio da proporcionalidade em sentido amplo, também conhecido como princípio da proibição de excesso, foi erigido à dignidade de princípio constitucional, consagrando-se, no art. 18, do Texto Magno de 1976, que assim dispõe: “A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos”. Na França o princípio da proporcionalidade é compreendido apenas no âmbito da jurisdição administrativa, manifestando-se, todavia, a partir do denominado pouvoir descritionnaire (poder discricionário) que é limitado pelo détournement du pouvoir (desvio de poder) e, na Suíça, ele é definido sumariamente apenas como a necessidade de se respeitar uma relação entre os meios empregados para tomar uma medida e atingir o fim procurado. Segundo Suzana de Toledo Barros, na Itália, a Corte Constitucional vem controlando de forma rigorosa se os limites aos direitos insculpidos na Constituição, estabelecidos pela lei, são razoáveis em face dos princípios consagrados na Carta. Segundo a autora, os juristas italianos já falam em idoneità, necessità e proporzionalità del provvedimento, sem, contudo, apresentar um estudo sistemático sobre o tema, que ainda se ressente da falta de unanimidade nas técnicas e terminologias utilizadas. Previsão na CRFB/88 É possível se verificar no art. 5°, LIV e LV, da Constituição brasileira, a previsão do princípio da razoabilidade do direito norte-americano é disposta expressamente. Com a cláusula do due process of law, entendida no seu duplo aspecto – material e processual – encontramos um decisivo obstáculo à edição de atos normativos revestidos de conteúdo arbitrário ou irrazoável e um importante fundamento para a ponderação dos conflitos de interesses. Com isso, podemos concluir que os dois princípios, apesar de não estarem positivados na Constituição, são extraídos implicitamente do devido processo legal substantivo.
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