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Aula 10 - A África e os impactos do tráfico negreiro transatlântico

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História da África Pré-colonização
Aula 10: A África e os impactos do trá�co negreiro
transatlântico
Apresentação
Prezado(a) estudante, parabéns por sua persistência, tenacidade, perseverança! Essas são algumas das características
necessárias para a formação de um historiador. Em nossa jornada passamos pelo Egito Antigo, por reinos africanos
importantes como os de Mali, Songhai, Congo e Angola; conhecemos algumas características do islamismo e sua
in�uência na transformação de várias sociedades africanas. E, talvez o mais importante: discutimos alguns conceitos
acerca do eurocentrismo quando estuda-se ou fala-se sobre a África.
Pedimos a sua atenção para um dos pontos mais sensíveis na História da África: o trá�co de negros no Atlântico. Você já
estudou a escravidão no mundo árabe, assim como na própria África. Porém, não há nada na história da humanidade que
se compare em termos de números, de tamanho de área geográ�ca, de durabilidade e de brutalidade como o trá�co
negreiro. É isso que veremos agora!
Objetivo
Identi�car os tipos de escravidão ocorridas na África antes do trá�co negreiro para as Américas;
Caracterizar aspectos gerais da África meridional.
Interesses envolvidos no trá�co negreiro transatlântico
Como já visto, o trá�co que envolveu a África e as Américas foi um fenômeno dolorosamente singular. O que os europeus
chamavam de “trá�co africano” era mais circunscrito à África Ocidental do que à Oriental e logo veremos o porquê disso.
No Brasil do século XIX surgiu uma frase de per�l escravocrata: “A África civiliza.” Essa apologia da escravidão não começou
com o plantio do café, mas durante o século XVI.
Saiba mais
Pode-se dizer que a escravidão não civilizou, mas enriqueceu, construiu, destruiu, criou e paralisou tanto as economias e
sociedades africanas como as americanas. Por outro lado, sem qualquer maniqueísmo, enriqueceu e desenvolveu a Europa, ao
ponto de ter in�uenciado o acúmulo de capitais ingleses para a Revolução Industrial.
Vamos, porém, concentrarmo-nos no início.
O que era a Europa, o que fez os europeus de maneira gradativa, vacilante, com idas e vindas, começarem a substituir os
árabes no trá�co negreiro? Apesar das estimativas sobre o trá�co para os países árabes apontarem para cerca de 6.900.000
africanos desterrados para os califados islâmicos, outras estimativas — com um pouco mais de precisão — apontam para
cerca de 22.000.000 de africanos que vieram para as Américas ao longo de 300 anos.
 O pioneirismo português
 Clique no botão acima.
A expansão marítima europeia, que teve o pioneirismo português, foi feita pelo “Périplo Africano”, já apresentado em
aula anterior. Sua marca eram as “roeduras” pelo litoral, sem busca de interiorização, que não era vista como
necessária, nem Portugal tinha homens e capitais para que tal meta fosse atingida.
Porém, obter e manter são coisas distintas. Assim, os portugueses enfrentaram grandes desa�os com os vizinhos
para manter seus entrepostos comerciais africanos, como os que foram fundados em Elmina e Mombaça (lado
ocidental) e Sofala (lado oriental) em uma travessia que levou três quartos de um século. E muitas vezes perderam
territórios.
A atração que a África exerceu sobre os portugueses deveu-se ao ouro que era levado para os países árabes. As
histórias do Reino do Mali, por exemplo, eram lendárias. Depois é que os portugueses perceberam o potencial
econômico da exploração da mão de obra africana na condição de escravos, que já era comum entre muçulmanos,
inclusive os de origem africana.
Cabe destacar mais uma vez que, ao contrário do que se ouve ultimamente como um discurso para legitimar a
escravidão no Brasil, não havia entre os africanos a ideia de escravizar um “africano”. Esse conceito, paradoxalmente,
só era percebido quando os africanos de diversas etnias chegavam às Américas. Em suma, a África teria um papel na
fase do capitalismo comercial: o fornecimento de escravos e ouro.
Os portugueses instalaram feitorias na Senegâmbia, na África Ocidental, com o apoio de chefes locais para que dali
obtivesse mão de obra destinada às ilhas do Atlântico, como Canárias e Madeira, que começavam a implantar o
cultivo da cana-de-açúcar e precisavam de mão de obra. Por sua vez, Portugal tinha um problema crônico: demogra�a
muito reduzida na população masculina.
Além da introdução em ilhas do Atlântico, Portugal começa a levar escravos negros para a Europa, sucedido pela
França e, em menor número, pela Inglaterra, porque a posse de escravos negros signi�cava status. A predominância
das atividades dos escravos era em afazeres domésticos.
Para que na Europa não houvesse grande resistência ao modo de produção escravista em tempos modernos, com o
apoio da Igreja Católica os governos e seus representantes a�rmavam que a escravidão era uma forma de salvar o
africano, pois ele teria contato com a verdadeira fé.
Sua permanência na África era sinônimo de condenação da alma africana ao inferno — termo esse completamente
desconhecido nas culturas africanas. Era considerada uma prática humanitária tirar homens, mulheres e crianças da
África, pois assim seriam batizados com nomes cristãos e teriam uma remota possibilidade de suas almas serem
salvas.
A sorte da África modi�cou-se de forma brusca quando os europeus conquistaram o território ao qual deram o nome
de América. De acordo com a lógica de formação de colônias, que tinham como �nalidade última gerar riquezas para a
metrópole, os europeus instalaram sistemas de plantation, como a cana-de-açúcar no Brasil ou a produção em larga
escala de algodão e tabaco no sul das 13 colônias britânicas na América do Norte.
O mesmo aconteceu na América Espanhola, que, além da plantation, precisava de substitutos para os ameríndios, que
morriam devido a doenças ou péssimas condições de vida nas minas de prata e ouro. Eis o negro aparecendo como
opção, em todas essas situações, como mão de obra no Novo Mundo.
A hegemonia portuguesa tem vida curta, pois, um pouco antes da União Ibérica (1580-1640), Portugal começa a
contrair dívidas, não conseguindo sustentar com segurança as feitorias que havia instalado e municiar de artefatos os
chefes africanos aliados. Assim, era uma grande di�culdade, pois parte dos metais e tecidos, por exemplo, não era de
origem lusitana, vinham de outros países que tinham manufaturas mais avançadas. Coube a esses países impulsionar
o deslocamento dos portugueses no lucrativo trá�co negreiro.
Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online
Na segunda metade do século XVI,
tanto França quanto Inglaterra
começam a lançar seus navios em
direção à costa africana para saquear
navios portugueses e tomar algumas
de suas feitorias.
 Feitoria de São Jorge da Mina ou Feitoria da Mina, em Gana, um dos maiores
entrepostos de escravos da África. Fonte: Wikipédia – Damien Halleux Radermecker
(2020).
Veja como França, Inglaterra e Holanda se comportaram nesse cenário.
Clique nos botões para ver as informações.
Inicialmente, a França foi bem-sucedida ao estabelecer uma troca com o Senegal. Enquanto este fornecia escravos, ouro,
óleo de palma ou de dendê e mar�m os franceses lhes davam armas de fogo e pólvora (o que os portugueses evitavam,
depois de serem alvos de alguns massacres, como o que você já viu na aula anterior).
França 
Quanto à Inglaterra, além da ação de corsários começou a ter o Estado por dando incentivos às Companhias de Comércio
das Índias Ocidentais e Orientais, o que foi um mecanismo adotado por vários países, como a Holanda. Essas
companhias eram o braço mercantil do Estado absolutista de capitalismo comercial emergente. A área de atuação inglesa
concentrou-se na costa ocidental até o Golfo de Benin.
Inglaterra 
A citada Holanda tinha um fator que lhe era favorável no século XVII: era a marinha mercante mais poderosa da Europa. A
União Ibérica impulsionou os holandeses a criarem também a sua própria Companhia das Índias. Assim, eles invadiram o
litoral açucareiro do Brasil da mesma forma que atacaram Angola, fontede braços para os trabalhos nos canaviais. Essas
invasões foram motivadas pela decadência lusitana e porque Portugal estava sob o domínio da Espanha, inimiga dos
�amengos.
Holanda 
O poderio naval holandês permitiu-lhe acesso à costa oriental africana, até então marcada por forte presença islâmica e uma
ainda tímida participação portuguesa. Os holandeses criavam bases para que pudessem consolidar-se na região do oceano
Índico. Uma dessas bases era na atual África do Sul, onde deixaram um contingente de colonos holandeses e alemães (boers),
que acabaram por escravizar os “sãs” (Aula 9) e até cometeram práticas violentas de extermínio em uma espécie de “cópia
antecipada” do apartheid que ainda surgiria séculos depois.
Não há como falar do trá�co negreiro pelo Atlântico e do que resultou na África sem fazer a triangulação entre esse continente,
a Europa e a América. No intervalo entre os anos de 1540 e 1600, presume-se que cerca de 274.000 negros foram levados para
as Américas. No século XVIII, um total de seis milhões. Isso foi consequência do aumento do modelo de plantation instalado
nas Américas. No caso do século XVIII, a descoberta do ouro no Brasil aumentou muito a demanda.
É necessário atentar sempre para um fato (pode parecer repetitivo, mas é fundamental que você internalize isso): os europeus,
com raros casos, não tinham interesse (e nem precisavam) na interiorização no continente africano em decorrência de alguns
fatores, entre eles o calor, as doenças como a da mosca tsé-tsé, a malária e também porque não precisavam, por conta das
feitorias.
Sobre a instalação de feitorias e portos no litoral, iniciada pelos portugueses, as demais nações também o �zeram. Acra,
Calabar, Porto Novo, Elmina são alguns exemplos disso. Com a decadência de Portugal e de muitas rivalidades entre as
potências europeias, essas feitorias não eram �xas, passavam de mão em mão de acordo com o país com maior poder na
Europa.
 Rotas do tráfico no Atlântico . Fonte: Wikipédia – SémhurWorld (2020).
Após ganhar guerras contra duas importantes potências navais, Espanha e Holanda, a Inglaterra começou a explorar — e muito
— o trá�co negreiro. Sua presença torna-se constante a partir do século XVIII e parte dos ganhos obtidos com esse infame
comércio foi para a Revolução Industrial.
Os países que seguiam os ingleses eram Holanda e França. Com ampla distância, os ibéricos vinham depois. Há uma exceção
a ser comentada. No �nal do século XVIII, outro grupo começa a participar do trá�co com muito volume, que aumentou no
século XIX até 1850: homens que viviam no Brasil, especialmente no Sudeste, ligados inicialmente ao comércio interno,
passaram a trocar fumo, cachaça e açúcar por escravos.
Comentário
Quando pensamos no trá�co negreiro feito pelos europeus vem à mente a imagem de um negro na praia sendo alcançado por
brancos que, munidos de uma rede conseguem capturá-lo e o colocam em uma pequena embarcação cujo destino era o navio
negreiro ou “tumbeiro” ancorado na costa. Certo? Por favor, por mais que isso tenha acontecido, não era o mais comum na
conquista de braços negros para as Américas.
Havia um sistema de fornecimento e troca. Quem fornecia? Soberanos de Estados africanos mais poderosos e centralizados,
como Daomé e Ashanti.
Você acabou de estudar a organização dos europeus no comércio de escravos e como a América estava inserida nisso. Porém,
o mais importante por conta de sua disciplina: e a África? Algo mudou? Permaneceu? Quais os impactos do trá�co negreiro?
Trá�co negreiro e mudanças políticas, econômicas, geográ�cas e
sociais
Curiosamente, sob o impacto da presença de cristãos em maior número do que em séculos anteriores, o islamismo cresceu no
continente, consolidando sua força principalmente no norte africano. Isso signi�ca dizer que o trá�co para os países árabes
aumentou rumo ao leste.
A escravidão por linhagem — sistema que existia desde os tempos
antigos, que criou o jonya (cativo), determinava que o escravo
pertencia ao Estado, sob a supervisão da família governante —
acabou por modi�car-se com a presença europeia. Esse escravo de
linhagem tinha alguns direitos que eram peculiares: parte do
excedente do que produzisse era para uso próprio, assim como
também uma grande liberdade de ir e vir dentro da comunidade.
Mesmo com todos os problemas de desterritorialização e a tentativa de desumanizá-lo, o jonya tinha possibilidade de
ascensão social, como a ocupação de cargos para controlar palácio, haréns ou participar da guarda real. Assim, é verdadeiro
a�rmar que a presença islâmica trouxe cada vez mais para o africano negro a condição de mercadoria e a presença europeia
aprofunda e enraíza tal condição.
Além do escravo de linhagem perder posições e ser considerado ainda mais mercadoria do que antes, outro ponto muito
importante é a questão da terra. A terra não era mercadoria e nem símbolo de poder, e sim, como você já viu, signi�cava posse
de pessoas, de dependentes, de agregados livres ou não. As leis do direito islâmico mudam esse per�l e a tornam propriedade
privada no Sudão Ocidental, marcado por grande in�uência muçulmana.
Saiba mais
Isso foi aprofundado pelos europeus vindos do sistema feudal. O controle agora não é somente sobre pessoas, mas sobre
territórios. É necessário um poder mais centralizado, no estilo dos califados islâmicos ou das monarquias absolutistas europeias.
Centralização maior de poder. Escravo com menor possibilidade de ir e vir e rotulado como mercadoria. Terra passa a ser
uma mercadoria. O que viria depois?
Como as lideranças dos Estados mais centralizados é que faziam as trocas com os europeus era necessário ter algo para
trocar. O que dar para os europeus em troca de cavalos, armas, pólvora (que serviam para retroalimentar o mercado de
escravos, pois eram instrumentos para dominar e aprisionar pessoas), tecidos �nos e metais? Ouro, artefatos de ferro ou cobre,
joias com pedras preciosas, mar�m, cerâmica e, claro, escravos.
Portanto, as necessidades de produção artesanal e de mineração criou uma divisão, uma clivagem muito grande entre a cidade
e o campo.
 A economia
 Clique no botão acima.
Enquanto nas cidades havia as manufaturas, rotas e transações comerciais, caravanas e presença de estrangeiros, o
campo servia para a subsistência e para a seleção de alguns produtos a serem levados para as Américas, como o
amendoim ou animais considerados exóticos.
A mineração iria tornar-se uma atividade mais aprofundada e ainda mais forte a exploração dos mineiros. Surgem
atividades que, se antes eram naturais, agora passam a ter a �nalidade de atender às demandas externas, como a
criação de embarcações �uviais para a captura de homens e mulheres do interior, de per�l nômade ou pertencentes a
um clã mais fraco para o combate.
A mineração mais intensiva trouxe uma novidade: a moeda feita de ouro. Não que jamais tivesse ocorrido uma
economia monetária, pois basta lembrar das conchas que serviram como moeda na África Oriental. A inovação é ver o
ouro como algo de valor em si, não como matéria-prima para artefatos ou trocas comerciais do Saara até o Egito.
Surge, assim, uma economia mais diversi�cada para atender aos interesses dos tra�cantes: mineração na bacia do
Zambeze, vidro no Magreb, metalurgia em Songhai, tecidos de rá�a no Congo, amendoim e óleo de palma no Egito.
A agricultura gradativamente desloca seu foco para a subsistência para atender ao mercado. O campo esvaziou-se
com a escravidão. A falta de mão de obra fez com que os senhores de terras começassem a explorar mais
intensamente aqueles que não se tornaram cativos nas Américas. Essa exploração trouxe algo novo para a sociedade
africana: a multiplicação de rebeliões de trabalhadores rurais e de pequenos proprietários.
Você viu nos estudos anteriores o comércio interno do norte ao sul, do leste ao oeste. Pois o monopólio dos europeus na costa
e as trocas para o trá�co transatlântico �zeram com que esse comércio minguasse, diminuísse. A relação entre a costa e o
interior �cou restrita aomercado externo.
Comentário
Para piorar a integração, assim como no caso do campo, multiplicaram-se as guerras internas, estimuladas ou não pelos
europeus, muitas vezes um povo europeu “apadrinhando” uma etnia contra outra, que era parceira de seu concorrente na Europa.
Essas guerras mudaram muito a con�guração das fronteiras e aumentou as migrações, o que mudou o per�l demográ�co
africano quanto às localizações em seu espaço cerca de três séculos anteriores à Conferência de Berlim, do �nal do século XIX.
As regiões mais ao interior, ou que eram formadas por clãs em um sistema semelhante ao de federação, tiveram uma
con�guração mais centralizada. Seja porque precisavam combater etnias vizinhas ou porque os estrangeiros, por meio das
Companhias de Comércio, a estimulou.
Não é justo pensar que houve passividade dos africanos quanto ao que acontecia. Um exemplo eram os saques aos navios
europeus ou a destruição de feitorias ou de prisões que guardavam escravos até a chegada dos navios negreiros — o que
poderia levar meses.
Exemplo
Outro exemplo é o suicídio de africanos, pois eles identi�cavam três aspectos funestos quando eram transportados da prisão para
os navios negreiros em pequenas embarcações. A primeira, é que em muitas religiões africanas o mar era visto como território
dos mortos. Ir para o mar seria ir para o desconhecido, ir para o mundo dos mortos estando ainda vivo.
Outro ponto, ligado a esse, é que muitas culturas acreditavam que, após a morte, havia mudança na cor da pele. Enquanto
vivos, eram pretos. Depois de mortos, tornavam-se brancos. Dessa forma, os europeus assustavam os negros como se fossem
entidades do além.
Por último e muito importante: para quase todos os africanos subsaarianos o ato de deixar sua terra signi�cava abandonar
seus antepassados. Era a perda da identidade. Mal comparando, era como Simba sem ligação com Mufasa, como nos ensinou
O Rei Leão. Perda da identidade, da ligação cultural. Sair de sua terra era a morte em vida.
Esses três pontos, separados ou interligados, explicam a
quantidade de negros que lançavam-se ao mar para morrer
antes da entrada no navio negreiro. Se o mar é o lugar dos
mortos, juntar-se a eles era mais lógico do que sair de sua
terra. (Na verdade, já havia saído, pois os escravos que
partiam de portos como Cabinda não eram daquela região,
mas pegar o navio era sair para nunca mais voltar.)
 Quadro de Johann Moritz Rugendas (1802-1858) retratando o interior de um navio
negreiro. Fonte: Wikipédia – Johann Moritz Rugendas (2020).
Atenção
Para os europeus, o trá�co foi a salvação econômica. Após uma crise recessiva causada por taxas protecionistas e guerras
internas nos séculos XVI e XVII, o comércio infame permitiu o desenvolvimento das grandes fazendas monocultoras de algodão,
milho, tabaco e, especialmente, cana-de-açúcar.
Atenção! Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online
Além disso, da mesma forma que as cidades africanas começaram a ter ofícios para os europeus, o inverso também é
verdadeiro. Novas oportunidades surgiram para trocas com os líderes dos reinos africanos envolvidos com o trá�co.
Voltemos à África. Ainda sobre os efeitos do trá�co no continente, um dos mais perturbadores foi a queda da taxa de
natalidade causada pela perda de mulheres e homens. Essa situação só vai atingir alguma normalidade no século passado.
Outro ponto é a mudança das comunidades africanas que participavam ativamente do trá�co. Elas se tornaram mais
militarizadas do que antes. Em alguns casos, a guarda militar tinha mais poder do que o soberano no cotidiano. A militarização
foi empregada porque a escravidão foi marcada por violência, coerção e força.
Terceiro ponto relacionado à economia local: a conexão com o modo de produção escravista acabou por empobrecer a
agricultura e o desenvolvimento de novas tecnologias em várias regiões da África, tornando-as bastante precárias. A perda de
mão de obra e a produção voltada exclusivamente para exportação serviram como entraves para o desenvolvimento de alguns
reinos africanos. Essa estagnação durou mais de três de séculos.
Por �m, ainda ligado à economia, o trá�co negreiro mudou o eixo das
relações da costa oriental africana em relação à costa ocidental. A região
compreendida entre o Senegal e o Congo foi fundamental para a evolução
do comércio, que voltou-se para as Américas, em especial para a região que
mais teve a presença de mão de obra cativa africana: o Brasil.
O esvaziamento demográ�co, é necessário destacar, não aconteceu em toda a África, mas naquelas sociedades em que o
poder era mais descentralizado ou a cultura era seminômade. Regiões como Congo ou Angola não tiveram seu número de
habitantes drasticamente reduzido.
A sangria do trá�co começa a estancar somente em meados do século XIX. A Inglaterra foi, por motivos diversos, uma das
maiores protagonistas contra o trá�co e seu papel de maior potência na época teve grande peso.
Porém, outras agressões foram cometidas contra o continente africano, especialmente quando missionários, aventureiros,
novas companhias de comércio e estudiosos antecederam os Estados Nacionais naquilo que �cou conhecido como Partilha da
África, mas isso é assunto para outra disciplina.
Esperamos que você tenha aproveitado esta disciplina e, principalmente, que possa estudar, analisar, conversar, pesquisar e/ou
lecionar sobre a África — sem a reprodução de estereótipos. Aqui acaba somente essa jornada. Novos desa�os virão e você
está apto para superá-los.
Atividade
1. Os europeus participaram tardiamente, quando comparados aos árabes, do comércio de escravos. Quais os motivos �zeram
com os europeus se interessarem pelo trá�co negreiro?
2. Cite três mudanças ocorridas com a intensi�cação do trá�co transatlântico no continente africano.
3. E por que líderes africanos participaram desse comércio atlântico? O que ganhavam? Podem ser considerados como traidores
de sua raça?
NotasReferências
SANTOS, Y. L. História da África e do Brasil afrodescendente. Rio de Janeiro: Pallas, 2017.
SILVA, A. C. Um rio chamado Atlântico: a África no Brasil e o Brasil na África. Rio de Janeiro: Nova Fronteira/UFRJ, 2003.
ROCHA, M. C.; BARBOSA, M. S. Síntese da coleção História Geral da África: século XVI ao século XX. Coordenação de Valter
Roberto Silvério. Brasília: Unesco/MEC/UFSCar, 2013. Disponível em: http://www.alex.pro.br/africa_sintese_2.pdf. Acesso em:
20 out. 2020.
Próxima aula
Explore mais
VISENTINI, P. F.; RIBEIRO, L. D. T.; PEREIRA, A. D. História da África e dos africanos. Petrópolis: Vozes, 2014.
Assista o �lme Amistad e perceba as nuances do escravismo no grande debate jurídico que o �lme exibe.
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