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Morte e vida Severina resumo

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MORTE E VIDA SEVERINA 
 
Severino era um homem do Nordeste que vai em busca de uma vida melhor. Como há 
muitos Severinos, deram então de chamá-lo pelo nome Severino de Maria. Como há muitos 
Severinos com mães chamadas Maria, ele ficou sendo o da Maria do finado Zacarias. Mas isso 
ainda diz pouco sobre seu nome. 
Há muitos na freguesia, por causa de um coronel que se chamou Zacarias e que foi o 
mais antigo senhor da Sesmaria. São muitos Severinos iguais em tudo na vida, nascidos da 
mesma forma, e se são Severinos iguais em tudo na vida, vão parar no mesmo lugar, e tem a 
mesma morte severina. 
Podem morrer de alguma emboscada antes dos vinte, de fome, de fraqueza ou de 
doença. A morte severina ataca em qualquer idade, e até quem não nasceu. São Severinos iguais 
em tudo. Mas a terra está cada dia mais extinta, de quererem arrancar algum roçado da cinza. 
Mas, para que conheçam eles de melhor forma, é melhor seguir a história de Severino, o 
retirante. 
Em seu caminho, Severino encontra dois homens que estavam carregando um defunto 
embrulhado numa rede, gritando: Ó irmãos das almas, irmãos das almas, não fui eu que matei 
não. Era um defunto que há muitas horas viajava, chamado Severino lavrador - um pequeno 
proprietário assassinado pela voracidade do latifundiário. Vindo de onde a Caatinga é mais seca, 
de uma terra que não dá nem planta brava. Foi uma morte matada, numa emboscada, morto 
de bala de espingarda, e o motivo fora que queriam expandir um pouco suas terras. O lavrador 
tinha uma terra cobiçada, uns hectares de terra de pedra e areia lavada, onde plantava palha 
nos intervalos das pedras. Eram somente dez quadras, todas nos ombros da serra, nenhuma 
várzea. 
O retirante pergunta aos irmãos o que acontecerá contra a espingarda. Mas é difícil 
saber quem o matou, pois ali, sempre há uma bala voando desocupada. Em seguida, Severino 
pergunta aonde é que levam o corpo para ser enterrado e se por acaso não pode ajudar a levá-
lo. Os irmãos aceitam a sua ajuda, pois, assim, aquele que fez mais longo caminho pode voltar 
dali mesmo. Os dois estavam tão cansados que afirmam: “mais sorte tem o defunto, irmão das 
almas, pois já não fará na volta a caminhada”. O lavrador foi enterrado no cemitério de Torres, 
que hoje se diz Toritama. 
Severino tem medo se perder, porque seu guia - o rio Capibaribe, cortou com o verão. 
Antes de sair de casa, aprendeu a ladainha das vilas, por onde passará em sua longa descida. 
Aprendeu também, que há muitas vilas grandes e cidades; e, que há simples arruados e vilas 
pequeninas, todas formando um rosário - como se as contas fossem as vilas e a estrada a linha. 
Ele deve rezar tal rosário, saltando de conta em conta, passando de vila em vila, então percebe 
que não é fácil seguir essa ladainha. Entre uma conta e outra conta, entre uma e outra ave-
maria, há certas paragens brancas, de planta e bicho vazias e sem donos, onde é possível perder-
se. 
Severino credita que seguindo o rio, jamais se perderá, pois é o caminho mais certo de 
todos, o melhor guia. Mas como irá segui-lo, se a descida do rio foi interrompida? Severino vê 
que o Capibaribe, assim como os rios lá de cima, é tão pobre que nem sempre pode cumprir sua 
sina, e seca verão, como pernas que não caminham. Ele sente medo de não conseguir chegar ao 
seu destino. 
Nesta altura, o emigrante tem de saber, agora, qual a verdadeira via dentre todas que 
se multiplicam à sua frente. Mas ele não vê ninguém, nem almas mortas, nem vivas; tão- 
somente, ouve à distância o que parece uma cantoria, que pode ser novena de santo, algum 
mês-de-Maria, ou quem sabe até uma festa ou uma dança. 
Severino chega em uma casa, onde estão cantando excelências para um defunto 
também chamado Severino. Um homem, do lado de fora, vai parodiando as palavras dos 
cantadores. O cântico admoesta o finado, para que afirme aos demônios que o atalharem em 
sua passagem, que não leva nada além de fome, sede e privação, e que ainda deve até mesmo 
o pagamento do caixão. Além disso, também é hora de o corpo partir, é hora da “plantação” (do 
enterro). 
Severino procura vida e só encontra a morte. O pouco de vida que encontrou, foi de vida 
severina, aquela vida que é menos vivida que defendida, mais severa ainda com os retirantes. 
Cansado da viagem, ele pensa interrompê-la por uns instantes e procurar trabalho ali onde se 
encontra. Ao menos até o próximo inverno, onde as águas ao refazer sua rotina, possam o levar 
direto ao mar. Mas fica em dúvida se toda a água do Capibaribe não seria consumida pelas roças, 
pelos bichos, pelo sol. Mas isso, Severino verá com tempo que decida. 
Ele avista uma mulher na janela, que, se não é rica, parece remediada ou dona de sua 
vida, e vai até ela perguntar de trabalho. Ao dirigir-se a uma mulher, descobre que tudo que 
sabe fazer não serve ali. Ela pergunta, o que ele fazia em sua terra. Severino explica que foi 
sempre lavrador, e que mesmo na terra árida, até a calva da pedra é capaz de arar. O retirante 
conhece todas as roças – “o algodão, a mamona, a pita, o milho, o caroá”. A mulher lhe diz que 
tais roçados o banco já não quer financiar. Além da terra, Severino sabe tratar de gado e 
pastorear. Mas tal função também não é necessária. 
Severino também sabe cozinhar nas tachas de um bangüê, além de cuidar de moenda e 
purgar a casa. Entretanto, com a vinda das usinas, já não há engenhos. Na terra de Severino, 
ninguém aprendeu outro ofício, mas suportam o sol, comem quando há alimento; e, havendo 
ou não, sabem trabalhar. A mulher pergunta se ele sabe cantar excelências e rezar benditos. No 
entanto, mesmo tendo velado muitos defuntos, nunca aprendeu as rezas, e sabe somente 
acompanhar. 
 Severino então quer saber como é a que a mulher vive, com o que trabalha. Ela explica 
que ali, o único trabalho existente e lucrativo é o que ajuda na morte – “sou de toda a região 
rezadora titular”. Muitas pessoas de profissão similar, que lucram com a morte, como 
farmacêuticos, coveiros, doutores, viram “retirantes às avessas”, pois ao contrário, ao invés de 
descer ao mar, sobem do mar para lá. O lucro é certo nessas profissões, pois não faltam 
fregueses, uma vez que ali a morte também é coisa vulgar. 
Como não há como trabalhar, mais uma vez Severino retoma seu rumo. O retirante 
chega à zona da mata, que o faz pensar, outra vez, em interromper a viagem, e se fixar naquela 
terra branda e macia, tão diferente do solo do Sertão, e acredita que será fácil “amansar” aquela 
terra. Avista, então, uma vasta plantação de cana e um bueiro de usina, mas nenhuma pessoa. 
Por isso, chega a pensar que a vida ali deveria ser tão boa, que todos estavam de folga, ou que 
não é preciso trabalhar todas as horas do dia, os dias todos do mês e os meses todos da vida; e, 
que ninguém jamais envelhece aos trinta, nem deveria conhecer a morte em vida, a vida 
Severina. 
Então, Severino assiste ao enterro de um trabalhador de eito, e ouve o que dizem os 
amigos do morto que o levaram ao cemitério – “essa cova em que estás, com palmos medida … 
é a parte que te cabe neste latifúndio… é a terra que querias ver dividida”. E prosseguem 
afirmando que ali ficará para sempre, livre da chuva e do sol, trabalhando só para si – “serás 
semente, adubo, colheita”. Será vestido e abrigado pela terra, que lhe espera desde recém-
nascido. Severino se dá conta que ali as privações são as mesmas que ele conhece bem e que 
também a única parte que pode ser sua daquela terra é uma cova para sepultura, nada mais. 
Mas o retirante não esperava muita coisa do destino, apenas seguia para escapar da 
velhice que chegava mais cedo na sua terra. Não tinha grandes ambições. No entanto, não 
percebeu muita diferença entre o Agreste e a Caatinga, e entre a Caatinga a Mata. A diferença 
é que a terra na mata era mais macia, mas “quer na terra gorda quer na serra, de caliça, a vida 
arde sempre com a mesma chama mortiça”. Severinoresolve apressar os passos para chegar 
logo ao recife e findar sua viagem. 
Chegando ao recife Severino senta-se para descansar ao pé de um muro alto e caiado e 
ouve, sem ser notado, a conversa de dois coveiros. Cada um fala sobre a área do cemitério em 
que trabalha e como ali há muitos mortos e assim, muito serviço, e como nas outras áreas há 
menos enterros e ainda se ganha gorjeta. Existe as avenidas centrais, onde são enterrados os 
ricos – (usineiros, políticos, banqueiros, e dos industriais), que é comparada ao porto do mar, 
onde não há muito serviço, e no máximo um transatlântico chega ali cada dia. E existe o setor 
das urbanizações discretas, bairro dos funcionários; onde são enterrados os jornalistas, os 
escritores, os artistas, os bancários, lojistas, os de profissão liberal e etc. 
 Os dois ainda falam também da Casa Amarela, onde são enterradas as pessoas que 
migram do sertão, que só tendo o mar pela frente, sem ter onde trabalhar, se instalam e vivem 
na lama, comendo siri; mas depois que morrem são enterrados no seco. É a gente dos enterros 
gratuitos, subúrbio dos indigentes, comparada com uma parada de ônibus, com filas 
intermináveis. Os coveiros conjecturam que estes, antes fossem jogados nos rios, pois seria mais 
barato e acabaria no mar sem mais problemas. Severino entende que toda a gente que vai do 
Sertão até ali procurando morrer de velhice, vai na verdade é seguindo o próprio enterro, pois 
logo que chegam, são os cemitérios que os esperam. 
Nesse momento, aproxima-se de Severino seu José, mestre carpina, morador de um dos 
mocambos que havia entre o cais e a água do rio. Ficam ali falando sobre o rio, sobre a fome e 
sobre a vida. Profundamente desencantado com suas perspectivas na cidade, ele pensa em 
cometer suicídio. Seu José tenta convencer Severino que ainda vale a pena lutar pela vida, 
mesmo que seja vida Severina. Mas Severino não vê mais diferença entre vida e morte e lança 
a pergunta - "que diferença faria se em vez de continuar, tomasse melhor saída: a de saltar, 
numa noite, fora da ponte e da vida?”. Comprade José estava deitado na relva, entretido e 
conversando, até que é chamado. 
Da porta de onde havia saído o mestre carpina, surge uma mulher, que grita uma notícia. 
Um filho nascera, o filho de seu José! Aparecem e se aproximam da casa do homem, vizinhos, 
amigos e duas ciganas entoando cânticos e louvores ao menino que nasceu: “Todo o céu e a 
terra lhe cantam louvor. Foi por ele que a maré esta noite não baixou… E este rio de água cega, 
ou baça, de comer terra, que jamais espelha o céu, hoje enfeitou-se de estrela”. 
Severino fica de fora sem tomar parte em nada, os vizinhos chegam, cumprimentam os 
pais, dão presentes que sua pobreza permite, falam sobre o menino e ainda duas ciganas falam 
sobre o futuro dele. Quando os vizinhos oferecem seus presentes, é demonstrada uma realidade 
de penúria e miséria. Para a mãe, levaram caranguejos pescados nos mangues, e também leite 
materno de seus próprios filhos, pois todos são irmãos de leite, de lama, de ar. Levaram ainda, 
papel de jornal para servir de cobertor e água de Olinda, da bica do Rosário, canário da terra, 
bolacha d’água que só em Paudalho se fabrica e um boneco de barro de Severino de 
Tracunhaém. Também foi levado um pitu que o pintor Monteiro fabricava em Gravatá, abacaxi 
de Goiana, ostras chegadas apanhadas no cais da Aurora, tamarindos e jaca. Mangabas e cajus, 
peixe, siris apanhados no lamaçal, mangas compradas nos quintais ricos do Espinheiro e dos 
Aflitos e Goiamuns dados pela gente pobre da Avenida Sul e da Avenida Norte. 
O futuro do menino, previsto pelas duas ciganas, não cria muitas expectativas . A 
primeira cigana faz uma previsão comum a todos da região - “Cedo aprenderá a caçar: primeiro, 
com as galinhas, que é catando pelo chão tudo o que cheira a comida”. Mais tarde, ela continua, 
será um pescador de mangue coberto de lama ou fazendo iscas com os dedos para pescar 
camarões. A segunda cigana vê o menino sujo de graxa das máquinas da fábrica, emprego que 
o levará longe. O longe do qual fala é um mangue mais distante , “mocambo melhor nos mangues 
do Beberibe”. 
Os vizinhos, amigos e pessoas que vieram com presentes para o menino, falaram de sua 
formosura, como um menino que mesmo magro, tem o peso de homem, pálido e franz inho, 
guenzo como todos do mangue. Uma criança pequena, enclenque, mas que cria coisas com as 
próprias mãos. Belo como o coqueiro que vence a areia marinha, e como a palmatória na 
caatinga sem saliva, tão belo como um sim numa sala negativa; belo porque é uma porta 
abrindo-se em mais saídas… E belo também, porque o novo contagia todo o velho, e porque o 
sangue novo acaba com a anemia, onde a vida nova e sadia infecciona a miséria, como o oásis 
no deserto, e ventos de calmaria. 
Severino, que esteve de fora, volta agora para ouvir de Seu José a resposta da pergunta 
que havia feito: se não valia mais saltar para fora da vida. Este, diz que não sabe a resposta da 
pergunta feita, mas, melhor que palavras, o nascimento da criança podia ser uma resposta: a 
vida vale a pena ser defendida. O espetáculo do desabrochar que é a própria vida, fala por si só, 
mesmo quando é difícil como uma vida severina. Seu José dá a ele uma lição - uma lição de vida. 
Em Morte e vida severina, apesar da presença constante da morte, da desesperança e da 
ausência de perspectivas, a renovação que o nascimento de uma vida faz acontecer é suficiente 
para que Seu José dê a sua resposta.

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