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A n d e r s o n S i l v a A n d e r s o n S il v a e agora?e agora? e a go ra ? e agora? Existe cura gay? Não. Não se trata de mera enfermidade. pecado, o processo, Deus, muito menos o poder da redenção. Existe uma fórmula universal? Não, apenas um veredito bíblico a ser aplicado individualmente. As igrejas estão prontas? Não, porque há acepção de pecados. Mas já começaram a nascer igrejas para quem não gosta de igreja. Quem sou e de onde vim? CRIAÇÃO. Por que existe mal e sofrimento? QUEDA. Como mudar, onde está a solução? REDENÇÃO. Nest e livr o, vo cê le rá vi das, muit o ma is qu e teo rias. Pess oas q ue m udar am de se xo ci rurgi came nte e enco ntrar am J esus no c amin ho. H omo ssex uais que , até que enca raram o Cr iador do h omem e da mulh er – e vir am q ue E le nã o err ou. Mais que isso , voc ê enc ontra rá a Verd ade q ue re futa qualq uer a rgum ento : hom osse xuali dade é pe cado , mas é só mais um. O re médi o é o mes mo. J u l i a n a F e r r o n L u a n P a b l o Teólogo, conferencista, pastor da Igreja Vivo por Ti em Brasília (DF) e líder de frentes missionárias no Brasil e no mundo. Além de assinar vários capítulos, foi o organiza- dor do livro, convidando os demais autores a dividirem suas histórias. Para dar resposta a um - mentos da atualidade, você tem mãos uma obra fundamental. Homossexual por 12 anos, ex-líder LGBT e ex-feminis- ta. Teóloga e psicanalista, é escritora e missionária pela Comunhão Cristã (PR). Ex-transexual, iniciou a vida na 13 anos. Hoje é cabeleireiro e congrega na Assembleia de Deus Boa Semente, em Natal (RN). Ex-transexual. Missionário, palestrante sobre sexualidade e vida cristã e seminaris- ta na Primeira Mogi das Cruzes (SP). Faz parte do Ministério JUCT. R o b e r t D i e g o Homossexual até os 26 anos. Hoje é líder na Igreja Quadrangular de Nova Friburgo (RJ) e dirige o Ministério Aprisco. C l a u d i n h o N a s c i m e n t o A n d e r s o n S i l v a e agora? e agora? Anderson Silva Claudinho Nascimento Juliana Ferron Luan Pablo Robert Diego S. J. Campos, SP 2019 1a Edição Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (eDOC BRASIL, Belo Horizonte/MG) J58 Jesus sou gay. E agora? / Anderson Silva... [et al]. – São José dos Campos (SP): Doma, 2019. 112 p. : 14 x 21 cm 1. Homossexualidade I. Silva, Anderson. II. Nascimento, Claudinho. III. Ferron, Juliana. IV. Diego, Robert. V. Pablo, Luan CDD 612.6 Elaborado por Maurício Amormino Júnior – CRB6/2422 por Anderson Silva, Claudinho Nascimento, Juliana Ferron, Luan Pablo e Robert Diego Jesus sou gay. E agora? As referências bíblicas foram extraídas da Almeida Revista e Atualizada (ARA), salvo menção contrária. Todos os direitos reservados à Editora DOMA. É proibida a reprodução por quaisquer meios, salvo em breves citações, com indicação da fonte. Edição, preparação e revisão: Débora Mühlbeier Lorusso Transcrição e revisão: Chico Milk Capa: Je� erson dos Santos Dias Diagramação: Waldemar Suguihara Colaboração: Editora Megalópole Editora DOMA Avenida Nove de Julho, 765 • Sala 301 • Jardim Apollo 12243-000 • São José dos Campos, SP telefone: (12) 3600-5980 e-mail: contato@editoradoma.com • www.editoradoma.com “TODA CIDADE É UMA METÁFORA DA NOVA JERUSALÉM. A COMPLEXIDADE DE UMA CIDADE É UM LABORATÓRIO DE AMOR NO QUAL A IGREJA PRECISA SE ENGAJAR.” Samambaia Norte, Brasília (DF) CNPJ: 20.346.994/0001-00 CLAUDINHO NASCIMENTO Improváveis 12 14 Mais um produto do meio 16 Não tão rápido 18 Ele é o amor que sustenta 21 Claudinho vai casar 23 Não desista ANDERSON SILVA Não há cura, há processos 28 Teologia do processo 34 Jesus e os mercadores do templo 40 Defesa da fé frente ao mundo transmoderno 44 46 O mundo moderno quer transformar o amor em um deus JULIANA FERRON Cansei de ser gay 52 53 Enganoso discurso de um ser fragmentado 56 Quanto à minha orientação SUMÁRIO ROBERT DIEGO Individualismo: engano social 64 Experiência na transexualidade 68 72 Mudança radical Epidemia da transexualidade 78 Transexualidade e uma abordagem bíblica 86 Igreja e sua responsabilidade 94 LUAN PABLO Família é a base, Deus é o sustento 98 99 Infância 101 Desvio na sexualidade: desejo sexual precoce 103 Prostituição e drogas 105 Ilusões 106 Perdas e uma tentativa de recomeçar 109 De volta ao engano, frente a frente com a morte 111 Misericórdia e graça 7 P referi não ter a recomendação de um amigo para respaldar esta obra. Não se tratam de palavras, teorias ou opiniões – é nossa vida! O melhor prefácio são nossas próprias lágrimas, são todas as dores de um longo processo... Aqui, cada um dos autores conta um pouco de sua experiência particular de superação e rendição a Jesus. No meu caso, você verá um pastor que se rendeu em amor aos homossexuais e decidiu lavar os pés dos excluídos. Perdeu amigos, dizimistas, reputação. Foi difamado pela Igreja. Saiu em matérias de jornais diante do escândalo de pedir perdão aos homossexuais. Que intolerância! Que ausência de diálogo entre a fé e a dor daqueles que anseiam pela graça redentora de Jesus! Repito o que disse aos que me insultaram há alguns anos, na época em que iniciei minha imersão missional entre homossexuais: não tenho todas as respostas, continuamos num processo artesanal de evangelismo, discipulado e dependência de Deus. Mas, sem dúvida, minha teimosia continua a mesma. Mesmo que demorem mais 30 anos, serei testemunha de milagres. Creio num Deus de impossíveis! Estas páginas contarão nada menos que a história de alguns dos grandes milagres de Jesus. E não vamos parar por aqui. Anderson Silva PREFÁCIO 9 Antes de começar, um recado! Não desista. O mundo é mal, a herança de Adão é arrebatadora – mas todas as coisas se tornam possíveis à mesa com Jesus. Bem-vindo a um processo triunfante! CLAUDINHO NASCIMENTO Uma pessoa que espera é uma pessoa paciente. A palavra paciência signifi ca a disposição para permanecer onde estamos e viver plenamente a situação, na crença de que algo oculto se manifestará ali para nós. Henri Nouwen Um número grande demais de cristãos vive na casa do temor, e não na casa do amor. Brennan Manning Ontem? Homossexual e improvável. Hoje? Líder de célula e integrante do Ministério Eis-me Aqui, na Igreja Quadrangular de Nova Friburgo (RJ). Também lidera o Ministério Aprisco, que cuida de pessoas vindo ou voltando para Jesus. IMPROVÁVEIS CLAUDINHO NASCIMENTO 13 Em 4 de dezembro de 2016, eu tornava pública uma das decisões mais importantes de minha vida – uma que impactou todas as outras a partir de então. Foi o dia de meu batismo nas águas. A Palavra de Deus diz que todo aquele que crê e for batizado será salvo; mas é importante frisar que, antes do batismo, precisamos crer, acreditar nEle e em Seu poder inexplicável. E eu cri. Só Jesus Cristo podia mudar por completo meu cenário de impossibilidades. Sou conhecido em minha pequena cidade, Nova Friburgo (RJ), especialmente pelo tempo em que participei de grandes eventos, ao lado de artistas famosos no cenário musical, alguns idolatrados por milhares. Por isso muitas pessoas foram assistir o batismo por curiosidade. Desejavam ver o “ex-viadinho”, como meus grandes amigos das noites passaram a chamar-me, ou o “Claudinho”, apelido mais comum. Julgavam quanto tempo duraria essa “fase” de minha nova vida. Lembro dos detalhes daquela manhã fria e chuvosa de domingo, em que desci às águas diante de mais de 200 pessoas, reafirmando para Jesus meu compromisso de segui-Lo. Sabia do significado daquele ato e cria, de todo coração, que tudo se faria novo. Eu não apenas me tornava uma nova criatura, mas também deixava as coisas velhas para trás. Meu foco era somente Jesus! Quando as mãos de meu pastor e de meu líder me ajudaram a levantar, já podia sentir a nova essência. Em uma fração de segundos,eu me vi sendo curado de dentro para fora. Uma experiência difícil de traduzir em palavras, mas tão real quanto você e eu. Traumas e cicatrizes da vida já não eram mais importantes que o amor que inundava meu coração, não só dEle por mim, mas meu por Ele! A sensação de descer às águas e assumir diante dos homens que “tudo é possível ao que crê” é arrebatadora para homens improváveis – o foi para mim. Desceu Claudinho, abusado sexualmente e fisicamente na infância, cheio de marcas e traumas, acorrentado em vícios sexuais e preso a drogas ilícitas. Subiu Claudio Fernando, um novo homem, o improvável escolhido por Ele para quebrar paradigmas de religião e resgatar outros improváveis para a glória de Deus. 14 Todos festejavam e glorificavam o santo nome de Jesus Cristo, pois uma de suas ovelhas tinha sido achada! Aleluia! Glória a Deus! Não falei com minha mãe por décadas. Porém, naquele dia, no dia em que ressurgi das águas, eis que dona Vanize Cristina estava lá, com toda a minha família. Todos aos prantos. Assim que saí daquela piscina, minha mãe me deu um forte abraço. Meu tempo foi zerado. Ficamos ali, como se nada existisse ao redor, apenas filho e mãe – mãe de um improvável para a sociedade, mas nunca para ela ou para Deus. Minha Rainha, meu grande amor! As lágrimas ainda me tomam... pois falar assim de dona Vanize é quase inacreditável. Quantas vezes desejei sua morte! Quantos aniversários e Dia das Mães eu nem sequer liguei para ela! Só o próprio Amor, Jesus, poderia fazer a ovelha perdida e má transformar-se na pessoa que me tornei. Tenho centenas de amigos que não passaram pela metade dos abusos que passei e assumiram-se homossexuais. Não é uma regra viver o que eu vivi. Entretanto quero compartilhar brevemente minha história para que, de alguma forma, você entenda como cheguei àquelas águas, como cheguei até aqui, anos depois, prestes a casar com a mulher da minha vida. Meu desejo é que você seja tocado pelo Espírito Santo e sinta o mesmo Amor que transformou minha história. Mais um produto do meio A vida nunca me deu grandes motivos para sorrir. Se eu fechar meus olhos, ainda posso sentir suas peles tocando a minha, suas depravações penetrando minha ingenuidade. Fui abusado por pessoas próximas, familiares, aqueles em quem supostamente uma criança deve confiar. Estranhos também passaram a possuir não apenas meu corpo, mas minha alma, atrofiando o que era para ser uma identidade em formação. Além de sexual, o abuso também era físico. Minha referência sempre foi a violência, seja contra meu corpo, seja contra minhas emoções. 15 Nas lágrimas de dor por uma infância roubada, deparei-me com a natureza imoral de tantos! Chegou ao ponto de já não mais causar dor, como se estivesse sob anestésico. Até que, por fim, comecei a esperar a satisfação de cumprir aquele ato, que acreditei ser o certo. Talvez fosse aquele o padrão, talvez fosse para ser daquele jeito – realmente acreditei. Assim como centenas de milhares de jovens que sofrem com falta de paternidade e abusos, eu tinha certeza que minha vida não mudaria nunca. Cresci e tornei-me aquilo que o meio planejou para mim. Assim como Mogli, o menino-lobo, eu estava sendo formatado para ser diferente do que aquilo que Deus me criou para ser. Virei mais um entre milhares de produtos do meio, resultado de traumas e falta de referência, especialmente masculina. Sem referência de um homem em casa, minha alma voltou-se, então, à paixão por outros homens. Somado ao fato de ter sido abusado por homens, acreditei que aquele podia ser meu modelo de satisfação, meu futuro, meu destino, minha identidade. Rapidamente, tornei-me um jovem louco por pornografia gay. Descobri lugares que outros como eu também frequentavam. Em pouco tempo, experimentei o mundo alucinado das drogas e bebidas caras. Das festas e loucuras. Das experiências homossexuais. Minha selva se chamava sociedade – eu achava. Nela, todos devem lutar por seus direitos, todos devem ser livres para fazer e ser o que quiserem. Ah, e você também deve acreditar no sonho de construir uma grande e linda família, sendo quem você é – hétero ou homossexual. Mas quem, d e verdade, so mos? O que o passado e o meio determ inaram, ou podemos escolher ser o que Deus planejou desd e o início, mu ito antes das experiên cias de vida? 16 Vivemos um verdadeiro caos de sentimentos e desequilíbrios emocionais nessa geração tão fastfood. Tudo tem sido visto com tanta normalidade que, se for liberado o casamento entre animais e seres humanos, eu não me assustaria. Afinal, já assistimos um pouco disso em grandes filmes de Hollywood. Por quase 26 anos, vivi debaixo do peso de ser esse produto, esse resultado. Eu não era o protagonista – apesar de achar que estava no controle. Pelo contrário, achava que não havia outro destino a não ser a homossexualidade. Acreditava que havia nascido para ser assim, sem alternativa. Não tão rápido Sou tomado por lágrimas ao escrever sobre o momento em que minha corrida insana chamada “vida” se deparou com Deus. Estava em uma boate, na famosa Rua das Pedras, em Búzios (RJ). Devidamente entupido de substâncias ilícitas, uma onda invisível impulsionou meu interior a gritar por socorro, a clamar pela a existência de algo que nem sabia que existia. Não conhecia Jesus, não conhecia a doce e maravilhosa presença do Espírito Santo, muito menos acreditava em um Deus Pai. Não compreendia que um Pai pudesse fazer algo tão maravilhoso e sacrificial por mim, por você, por todos: entregar o único Filho. No exato momento em que clamei por ajuda, de forma sobrenatural e inexplicável, toda substância ilícita saiu do meu corpo. Como era possível? Saí de lá sem entender o que havia acontecido e já não tendo mais tanta certeza se queria aquilo tudo. Continuei o caminho com meus amigos, mas algo havia tocado meu interior de forma diferente e única. Veja o que a palavra de Deus relata sobre a ovelha perdida e a alegria do Pastor em encontrá-la: Então, lhes propôs Jesus esta parábola: Qual, dentre vós, é o homem que, possuindo cem ovelhas e perdendo uma delas, não deixa no 17 deserto as noventa e nove e vai em busca da que se perdeu, até encontrá-la? Achando-a, põe-na sobre os ombros, cheio de júbilo. E, indo para casa, reúne os amigos e vizinhos, dizendo-lhes: Alegrai-vos comigo, porque já achei a minha ovelha perdida. Lucas 15.3-6 Eu não sabia ainda, mas Ele já me esperava! Já tinha tudo reservado e preparado para nosso grande encontro! Só queria sentir aquela presença de novo, que eu chamava de “mística”, ou “fantasiosa”, ou de “múltiplas ondas”. Aquele era meu mundo, devido ao grande consumo de substâncias ilícitas; só assim para manter-me em pé e “feliz”, pelo menos enquanto durassem seus efeitos. Na busca incansável de sentir mais uma vez, encontrei-me orando, sem saber como, ou para quem. Na ausência de paternidade em minha história, confesso que foi difícil acreditar em um Pai que me ouvia em todo e qualquer lugar. Além disso, como acreditar em um Deus de provisão? No meu lar, eu carregava a responsabilidade de prover desde os seis anos de idade, quando comecei a vender latas e salgadinhos nas ruas de Nova Friburgo. Havia conflito dentro de mim. Não foi imediato nem tão rápido assim conhecer a Deus. Porém, da maneira que sabia, busquei sinais da existência dEle. Desde aquele dia, na boate, uma insatisfação intrigava-me. Eu não tinha o que precisava para ser completo e precisava descobrir o que faltava. Precisava descobri-Lo. Na busca por sinais dEle, recebi uma mensagem pelo Facebook. Era meu atual pastor, Deiverson – tenho certeza que o Brasil vai conhecer seu amor e sua paixão por vidas e por improváveis. Na publicação, algo que nunca esquecerei: “Continue a viver da maneira que você sabe que um cristão deve viver. Deus é o único a quem você precisa agradar”. Ele não era apenas um pastor de igreja, ou líder de uma religião. Deiversonera meu amigo de infância, da época do colégio, e não o via há mais de dez anos. Seu contato foi a minha resposta. E preciso dizer que sua recepção fez toda a diferença! Eu me sentia a ovelha que acabara de ser encontrada pelo seu pastor. 18 Contudo não foi rápido. Foi uma gestação árdua de nove longos meses entre idas aos cultos e, ao mesmo tempo, festivais eletrônicos pelo Brasil afora. Vivi duas vidas até o momento em que o Espírito Santo interveio. Estava em um banheiro, olhando para o espelho, quando ouvi: “Filho, essa não é a imagem que eu tenho pra você”. Larguei combos e amigos e saí pelas portas chorando. Nunca antes fui tão lúcido em toda minha vida. Eu sabia exatamente o que precisava transformar, o que precisava largar. Ele me tocou, e eu nunca mais fui o mesmo. No dia 17 de setembro de 2016, eu me encontrava na cozinha da casa da mãe de meu pastor, junto com ele, sua esposa e seu filho. Ali, orei e entreguei minha vida a Jesus, por completo. Eu suplicava! Dizia que precisava dEle e jamais O abandonaria. Tudo que eu necessitava era o Seu amor! Então afirmei estar disponível para Ele, para o Reino dEle, para colaborar com todos os Seus planos. Ele é o amor que sustenta Aprendi, durante a caminhada, que Jesus morreu por todos, mas voltará para os arrependidos. Quantas vezes caí! Alternei entre posicionar-me e cair diversas vezes. Entretanto levantava mais forte que as quedas. Afinal, elas eram fruto de meus próprios interesses carnais, porém quem me levantava e sustentava era o próprio Jesus, que é infinitamente mais forte. Ele é o amor que me sustentou, sustenta e sustentará para sempre. Há dias em que a carne grita de abstinência. Porém, como os grandes atletas, resolvi alimentar-me daquilo que faz ganhar as competições: a Palavra de Deus. Percebi que quanto mais comia da Bíblia e supria meu interior a partir de um relacionamento com meu amigo Espírito Santo, mais eu me tornava próximo dEle e parecido com Ele. E eu não queria brincar com o mal que matou meu melhor amigo – o pecado. Entenda que eu ainda vivo dias maus, que as lutas ainda vêm, mas hoje não estou sozinho. Essa é toda a diferença! Jesus 19 deixou o Espírito Santo para confortar e consolar cada um de nós nos dias tempestivos. Entretanto o que vemos é uma geração buscar primeiro todos os amigos da lista de contatos telefônicos ou das redes sociais para, só depois, falar com quem pode resolver a causa em primeira instância! Eu sou apaixonado por Jesus. Não negocio por nada nem ninguém o relacionamento que passei a ter com Ele. Foi isso que me fez renunciar a vida que levava e permanecer na luta diária por ser quem Ele me criou para ser – o que trouxe mais satisfação que qualquer outra experiência da vida. Mas se você não está pronto para renunciar algo em sua vida, você também não está preparado para viver o Amor, que Se entregou por amor. Ele é o próprio amor! Parece clichê, porém milhares de seres humanos acreditam que amor é um sentimento ou uma qualidade experimentada somente por alguns. O Amor foi pregado e crucificado em uma cruz, para que você e eu fôssemos livres da condenação que havia sobre nós. Ele se entregou, porque nos amou. Hoje, se você pode amar, é porque Ele amou você em primeiro lugar. Depois que me permiti ser tocado por esse amor, que é Jesus, tudo fez sentido. Traumas, deficiências socias e emocionais – nada e ninguém podiam impedir o que Ele já havia liberado sobre mim. Esse amor pode encontrar-lhe neste exato momento e mudar por completo o cenário atual – seja depressão, perda de um filho, quebra de um relacionamento, uma traição, ou uma prisão dentro de si mesmo, buscando respostas sem nem saber quais são as perguntas. Fale com Ele! Mas não só com Ele. Aprendi, na prática, que precisamos valorizar quem realmente está preocupado com nossa vida e pode impulsionar-nos para fora de nossa zona de conforto. Deus usa pessoas e precisamos da ajuda delas. Eu sei que muitas igrejas não estão verdadeiramente abertas às ovelhas perdidas, mas posso garantir que isso está mudando. Cada vez mais improváveis pregam sobre Jesus, trabalham para o Rei e pelo Reino, para a glória dEle, ajudando outros a encontrarem o verdadeiro caminho. 20 Outro dia, ouvi um pastor dizer: “Não querem prostitutas, ladrões, traficantes e homossexuais? Mandem para cá! Não é porque a nossa igreja – Lagoinha – pode tudo, porém aqui aceitamos todos!”. A realidade está mudando! Eu não creio no homem em si, mas creio no Deus que usa homens idôneos e de caráter para tornar cenários de impossibilidades em cenários de possibilidades. Eu sou uma das centenas de cartas vivas que provam o agir de Deus – um homossexual se permitiu ser transformado de dentro para fora, com o auxílio de pessoas comprometidas com o Senhor. Busque uma igreja, busque ajuda e, principalmente: já comece perdoando as falhas dos irmãos, porque eles falharão. Precisamos lembrar que, um dia, já perdoaram as nossas próprias falhas, lá na cruz. Já caminho com Ele há quase três anos. Aos poucos, para a glória de Deus, um a um de meus amigos, ovelhas perdidas, além de minha família, estão conhecendo a Jesus. Minha história tem revelado a eles o Amor. Só podemos liberar aquilo que recebemos, e eu não sei retratar de outra forma o meu Jesus a não ser como o próprio Amor. Deus tem me levado a outros países e outras culturas para testemunhar. Ele sempre me coloca em meio a grandes empresários, em lugares difíceis de pregar sobre Seu amor e Sua graça. Como falar de Jesus para alguém que dirige carros de R$ 500 mil? Deus me traz à memória a passagem de Tiago: Meus irmãos, não tenhais a fé em nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor da glória, em acepção de pessoas. Se, portanto, entrar na vossa sinagoga algum homem com anéis de ouro nos dedos, em trajos de luxo, e entrar também algum pobre andrajoso, e tratardes com deferência o que tem os trajos de luxo e lhe disserdes: Tu, assenta-te aqui em lugar de honra; e disserdes ao pobre: Tu, fica ali em pé ou assenta-te aqui abaixo do estrado dos meus pés, não fizestes distinção entre vós mesmos e não vos tornastes juízes tomados de perversos pensamentos? Tiago 2.1-4 21 É com essa palavra no coração que tenho sido impulsionado a grandes desafios. E tenho aceitado, crendo no poder do Amor. Creio no dever de falar e levar o evangelho a toda criatura, seja homossexual, morador de rua ou magnata. Ele me salvou e deseja que todos se salvem. Está disponível a todos e possui poder suficiente para mudar qualquer realidade, qualquer identidade. Claudinho vai casar Pouco tempo depois de meu batismo, chegou o evento de virada do ano na igreja. Eu nasci em 31 de dezembro de 1988, então aquela data carregava muitos significados. Cria que seria fantástica, inédita – afinal, em 27 anos, só lembrava das vezes em que passei a virada sofrendo algum tipo de abuso, ou alucinado em alguma pool party, ou festa na região dos lagos do Rio de Janeiro. Em 2016, tudo mudara. Poucos minutos após a meia noite, naquele culto, fiz duas orações: queria viajar para a Europa, especificamente Alemanha e Inglaterra – estava para completar 500 anos da Reforma Protestante, e eu desejava pisar nas terras que foram berço dessa ruptura –, além de desejar intensamente constituir minha própria família. Fiz essas orações com tanta fé em Cristo e em Seu poder! Eu ganhei a viagem e fui, em 2017. Quanto ao pedido por uma família, fui muito específico: não queria uma namorada, ou uma esposa, para provar que não era mais gay. Luto contra minha carne todos os dias e tenho vencido porque o verdadeiro Amor liberta, o verdadeiro Amor faz querer viver não segundo nossas vontades, mas sim a dEle. Jesus sabia que meu coração estava no lugar certo, que aquele pedido vinha de um coração transformado e em constante transformação. Veio à minha mente o versículo que diz: “Se permanecerdes em mim, e as minhas palavras permanecerem em vós, pedireis o que quiserdes,e vos será feito” (Jo 15.7). Se puder, abra agora sua Bíblia, leia esse trecho e tome posse da verdade de Deus! 22 Assim que terminei de orar, no início da primeira madrugada de 2017, tive uma visão. Eu vi uma menina alta, de cabelos cacheados e pura. Pouco tempo depois, conheci Isabelly. Eu participei de várias orgias, várias loucuras sexuais, mas chego aos 30 anos sem nunca ter tido relação sexual com uma mulher. Em 2019, enquanto escrevo estas palavras, faltam menos de três meses para o meu casamento com a futura senhora Isabelly Faria do Nascimento – ambos guardados um para o outro. Claro que ela realmente não viveu experiência alguma, mas reafirmo para cada um que lê este livro: é como se eu nunca tivesse feito nada! Esse é o tipo de transformação que Deus faz. Sinto um frio na barriga... Aquilo que tinha orado secretamente a Deus, Ele me deu! Sou imensamente grato, não por conseguir alguém para mostrar à sociedade, não por ter alguém com quem manter relações sexuais. Minha mente mudou! Sou grato por ter uma companheira para cumprir o propósito dEle! Deus não uniu duas pessoas improváveis, mas uniu propósitos estabelecidos nEle. Nós escolhemos um ao outro, mas o propósito sempre foi dEle! Isabelly e eu estamos noivos e preparando para casar no dia 30 de março de 2019, na charmosa cidade de Nova Friburgo, na Quadrangular Church. Tínhamos planos em mente, até que Deus mudou tudo. Faremos um grande culto aberto para centenas de amigos, familiares, colegas e várias ovelhas perdidas. Nosso dia não será só nosso, porque, antes de ser nosso, é dEle. Antes de Claudio Fernando ser de Isabelly Faria, Claudio Fernando é dEle. Vocês não fazem ideia de como estou uma pilha! Sonho acordado com o grande dia. Lágrimas escorrem pelo meu rosto neste exato momento. Não acredito que alguém possa amar-me tanto como minha noiva me ama! Não precisamos fingir ser um casal perfeito, pois não somos; mas decidimos amar e respeitar um ao outro, respaldados sempre na palavra de Deus. Só isso já causa inveja nas grandes produções cinematográficas. Não vou debater com esquerda ou direita ou quem pensa diferente. Não vou discutir com quem desacredita meu casamento ou vive relembrando meu passado. 23 Estou com um grande nó na garganta e olhos embaçados. Essa data jamais aconteceria aos olhos do mundo! Meu Deus, o ex-tudo-o-que-você-pode-imaginar entrará na igreja de terno e gravata parar receber sua futura esposa, adornada com um lindo vestido de noiva. Não consigo parar de chorar! Jesus, você é tudo! Não desista Difícil tem sido expressar praticamente 30 anos em algumas páginas. Quando recebi a mensagem do pastor Anderson sobre o livro, que conta com grandes colaboradores, derramei lágrimas de alegria. É um presente de Deus ter a oportunidade de expressar, mesmo que rapidamente, o que o Pai fez e faz por mim, esperando de alguma maneira tocar você, leitor. Não me incomoda que existam aqueles que acreditam em fundamentos científicos ou bases teológicas para a pluralidade do amor e a escolha da sexualidade. Hoje, o que incomoda é ver centenas de milhares de pessoas, de todas cores e idades, morrendo por depressão, cometendo suicídio ou vivendo a automutilação – porque faltou paternidade, faltou amor, faltou Deus. Essas raízes precisam encontrar a verdade. Somos chamados para ser luz no mundo e carregar a verdade de Deus aonde formos. De segunda em diante, precisamos ser a mesma igreja de domingo. Honrar princípios. Assim o Senhor Aliás, eu não tenho mais p roblema com meu pas sado, até por que não é para lá que eu vou – que m quiser, pode ficar co m ele. Vivo o presente, projetando o futuro em Cr isto. 24 agirá através de nós, e Sua glória resplandecerá por meio de nossas atitudes, desde as mais simples como amar o próximo. Isso fará mais diferença do que bons argumentos para debater contra os que defendem a homossexualidade. Não pretendo, ao contar minha história, dizer que sou mais forte ou melhor, porque não sou! Vivo errando e acertando em Cristo. Sou um grande aprendiz e um filho arrependido, grato por cada centésimo de milésimo de segundo que o Senhor me permite viver. Sou um grande apaixonado pelo dia chamado “hoje” e pelas oportunidades que surgem em cada despertar de nossos olhos, pela misericórdia de Deus. Minha esperança é que você tenha sentido o amor de Cristo e que minha história tenha ajudado de alguma forma, para a glória de Deus. Espero, em breve, estar falando também sobre paternidade – sonho com meu filho em meus braços, crescendo e caminhando nos caminhos do Senhor, indo em lugares que não fui e nunca pisarei. Eu não vou parar de sonhar! Deus tem muito mais para mim do que tudo que já perdi na vida. E para você também! Creia, lute, ca ia, levante – somente nã o desista. Jesus é o Senhor sobre a minha e sobre a sua sexualidade. Alguns não vão entender o Amor, que citei tantas vezes. Outros vão criticar e rir de sua troca de “gosto”, assim como muitos fizeram comigo. Mas lembre-se: quanto mais perto de Deus você está, menos essas coisas farão mal. Quanto mais próximo dEle, menores são todas as outras coisas. Quero desejar a todos uma ótima leitura. Que a doce e maravilhosa presença do Espírito Santo de Deus possa vir sobre a vida de cada leitor, assim como sobre cada dúvida acerca da sexualidade. Valorize-se sempre. Seja aquilo que Deus lhe chamou para ser, vá para onde Ele chamou para ir e faça o que Ele pediu para 25 fazer. Venha para Jesus doente fisicamente e espiritualmente, mas venha! Venha fumando seu bagulho, bebendo sua cerveja ou vendo seu filme pornô. Venha com seu par do mesmo gênero. Só venha! Você pode fazer mais uma coisa? Deixe-se ser tocado por esse Amor, e depois me conte. ANDERSON SILVA Teólogo, conferencista internacional e pastor sênior da Igreja Vivo por Ti em Brasília (DF). Também lidera frentes apostólicas e missionárias no Brasil e no mundo. Casado com Keila Silva, é pai de três fi lhos: Paulo, João e Tiago. Minha esperança é que a descrição do amor de Deus na minha vida vai lhe dar a liberdade e coragem para descobrir... o amor de Deus, na sua. Henri Nouwen Nosso afã de impressionar a Deus, nossa luta pelos méritos de estrelas douradas, nossa afobação por tentar consertar a nós mesmos ao mesmo tempo em que escondemos nossa mesquinharia e chafurdamos na culpa são repugnantes para Deus e uma negação aberta do evangelho da graça. Brennan Manning NÃO HÁ CURA, HÁ PROCESSOS ANDERSON SILVA 29 P reciso iniciar o capítulo com essa pergunta crucial – e a resposta é: não! Primeiro, porque não existem respostas instantâneas para questões homossexuais. Segundo, porque não se trata de mera enfermidade na alma do indivíduo para falar-se em cura, como se fosse apenas tomar um remédio, e pronto. A homossexualidade possui inúmeras variáveis. Quem estiver com pressa não entenderá o indivíduo, o poder do pecado, o processo, Deus, muito menos o poder da redenção. Estamos diante do que chamo de processo artesanal de discipulado, que é feito de detalhes e exige tempo. A homossexualidade, assim como qualquer outro pecado, é uma disfunção existencial. O pecado original quebra a essência e o propósito para os quais fomos criados. Entretanto a grande questão é que existem inúmeras implicações individuais para o dano que o pecado original causou. São incontáveis as diferentes possibilidades de impacto, seja qual for a área. Isso significa que não é igual em mim e em você – não necessariamente. Além das peculiaridades individuais, o pecado da homossexualidade ganhou contorno ainda mais nocivo com a força dos movimentos revolucionários progressistas. Não há como negar que o pensamento que cunhou expressões como “gênero” e condenou o que seria um “determinismo biológico” invadiu a sociedade e os meios de comunicação, até ser aceito por normal. A própria Igreja discute bastante qual a origem da homossexualidadee como lidar com uma questão tão urgente. Várias teorias são levantadas. Contudo, na prática, não importa onde nasce a homossexualidade do indivíduo, pois todos nós concordamos que todo pecado nasce no mesmo lugar: Portanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram. Romanos 5.12 Existe cura g ay? 30 Com isso em mente, precisamos vencer bloqueios sociais e religiosos que consideram a homossexualidade um pecado mais grave que qualquer outro. Lidamos com graça e facilidade com pecados sexuais da heterossexualidade. Discipulamos com facilidade um marido que trai, agride ou abandona a esposa. Porém, quando a questão envolve homossexualidade, criam-se muralhas que impedem acolhimento, diálogo, discipulado e, portanto, resultado. O primeiro passo para uma transformação efetiva virá com a mudança de mente e postura. A homossexualidade é apenas mais um pecado. É claro que não precisamos favorecer o homossexual como se fosse uma vítima indefesa. Por outro lado, não se deve superestimar tal pecado, acima de todos os outros praticados pelo restante do rebanho de Jesus Cristo. Recomendo uma tática infalível de discipulado congregacional para que os homossexuais tenham não apenas acesso, mas liberdade nas igrejas: olhe para a homossexualidade através dos pecados da heterossexualidade. O homem que mantém relação sexual com outro homem comete fornicação ou, se casado, adultério. Se os protagonistas fossem um homem e uma mulher, heterossexuais, não seriam exatamente os mesmos pecados: fornicação ou adultério? Assim, todos se enxergarão como iguais. Sem pedras nas mãos, sem favoritismos, sem acepções. Todos como filhos de Adão renascendo em Jesus. Porque, assim como, em Adão, todos morrem, assim também todos serão vivificados em Cristo. 1 Coríntios 15.22 No caminhar do discipulado, é possível descobrir gatilhos que pervertem ainda mais a natureza sexual de determinada pessoa. Por vezes, orfandade. Em outros casos, um histórico de abusos sexuais. Questões químicas, hormonais e ideológicas, também. Todas essas coisas, quando acionadas, levam o indivíduo a reforçar e aprofundar a homossexualidade. 31 Cada gatilho pode ser trabalhado interiormente, com tempo e ajuda do Espírito Santo. Porém quero enfatizar que o poder maior não está nos gatilhos, mas no evangelho. Precisamos de um reposicionamento perante o poder incontestável da cruz. É necessário colocar a mesa da graça, crendo que Jesus virá para sentar-se com aqueles que carecem de amor, poder e transformação. É imprescindível voltar a acreditar no amor de Jesus. Não um amor romântico, ideológico, assim como aquele caricaturado pelos progressistas; mas o amor que criou o mundo. Apenas nEle, no Criador, será possível uma redescoberta, um reinício, uma reconstrução existencial – um retorno à identidade projetada por Ele, que é o Amor em pessoa. Ele é mais que suficiente para iniciar o processo e levá-lo até o fim. Apenas ponha a mesa, Igreja. E você, homossexual, alimente-se dela. O amor é poderoso! O amor nunca falha. 1 Coríntios 13.8 Não creio que o amor humano seja suficiente para transformar. Justamente por ser falho em nós, pré-datamos a relação com outras pessoas, não as amando de verdade. Amamos apenas a conversão dos homossexuais e, ao mesmo tempo, a nossa própria reputação diante de críticos religiosos. Não confrontamos pecados pessoais e sociais da homossexualidade com as mesmas lágrimas que Jesus. Não desejamos salvar o mundo, mas somente a nós mesmos. Além disso, sim, existem acepções de pecado na Igreja! Não encaramos tal realidade com a devida seriedade cristocêntrica. Há muito de nós em nossos posicionamentos e bem pouco de Jesus. Já ouvi críticas severas contra homossexuais saindo da boca de pessoas que estavam em práticas iguais ou piores, só que no outro polo, o da heterossexualidade. Deixe-me ajudar: heterossexualidade não é sinônimo de salvação! Homossexualidade é pecado, e ponto. É bíblico. Entretanto você não está salvo por ser heterossexual! Existe um padrão de 32 santidade que confirma se alguém é salvo. Veja que santidade, em si mesma, não salva; mas é a confirmação de nossa salvação pela fé. Porém existem muitos heterossexuais que se dizem contra a ideologia de gênero e em favor da família, mas, dentro do seio familiar, nem exemplos de cristãos são. Não confunda as coisas! Lute contra o erro – mas, antes, seja a verdade. TEOLOGIA DO PROCESSO ANDERSON SILVA 35 S e Jesus e os apóstolos vivessem no século 21, talvez teríamos a mais alta e profunda teologia para lidar com as ideias progressistas atuais. Porém há um sofrimento no meio do povo de Deus, porque em muita coisa a Bíblia é clara e fornece vereditos, mas não explicou detalhadamente a teologia do processo, necessária para encarar a complexidade do acompanhamento de um homossexual. “Como, na prática, lidar com questões de homossexualidade, identidade e ideologias de gênero?”, você fez ou já ouviu essa pergunta. Poucas pessoas sabem responder. A maioria até expõe uma boa apologética – defesa da fé cristã –, argumentando eloquentemente. No entanto, na hora de enfrentar os problemas, em casa ou na igreja, não sabe como agir. Não sabe o que fazer no meio dos processos ou para onde ir. Além de que não aprendeu a chorar pela e com a cidade. Fomos condicionados a responder perguntas que nem estão sendo feitas. Muitos líderes respondem questões de mais de 30 anos, enquanto o jovem de hoje quer saber por qual motivo ele não pode ser cristão e fumar maconha, já que “a erva não passa de uma planta criada por Deus”. Os jovens querem saber por que não podem ser cristãos e manter um relacionamento aberto, já que Jesus “pregou o amor”. Quando não souber o que fazer, compre um c afé, sente-se no centro de sua cidade e peça a Jesu s que lhe dê ideias pion eiras, ideias q ue façam sentido ao m omento prese nte. Não conseguimos amar aquilo que não controlamos. O mundo enlouqueceu. Contudo a pior parte é que o cristão se amedrontou e ergueu os muros da congregação, perdendo ainda mais o contato com o mundo a ser redimido. A Igreja passou a 36 falar um outro idioma, não por ser separada para Deus, mas por ser fugitiva de um mundo que ela teme. O novo amedronta! Diante desse cenário, perdemos o poder de influência sobre a cidade. As próprias pessoas também nos rejeitam, porque, de uma hora para outra, decidimos doutrinar a vida de quem nem sequer nos importamos em saber o nome. Pastores, entendam: as pessoas aprenderam a pensar! Elas buscam respostas honestas para as perguntas confusas que fazem. “Uma Igreja Missional, por exemplo, é caracterizada por um grande respeito a pessoas que não creem. Em outras palavras: uma Igreja Missional entende o que significa não crer.” Tim Keller, em entrevista sobre características de uma Igreja Missional Muitos irmãos me perguntam qual o método de discipulado de um homossexual. É simples: respondo que ele não existe. A pessoa, em sua individualidade, sua história e sua subjetividade, torna-se seu próprio método. Todo o restante envolvido necessita de direção e instrução divinas, passo a passo, além do amor de um discipulador perseverante. Como eu disse, quem tem pressa não vê milagres. Se o resultado ocorrer apenas daqui a dez anos, você ainda estará por perto para testemunhar? Você fez parte, do início ao fim, do milagre que redefiniu a existência de alguém? Você encarou a teologia do processo como única e diferente para cada um e ajudou a torná-la real na prática? Agora torno as perguntas diretas ao homossexual: se demorar dez anos para enxergar resultado, você resistirá até o fim? Você está pronto para aceitar que o processo em você não necessariamente será igual ou durará o mesmo tempo que para outras pessoas? Irmãos, o religioso ama demais sua própria reputação para deixarque seja visto ao lado de pessoas que a religião não gosta. 37 Mas, graças a Deus, já se levantou um povo disposto a plantar igrejas para quem não gosta da Igreja e para quem a Igreja não gosta. Quando a Igr eja não se to rna uma resposta, ela passa a ser o silêncio de Deus e o que stionamento do mundo. Agora é hora de uma proposta. Se a Bíblia não oferece detalhes, pelo menos não explicitamente, do que tenho chamado de teologia do processo, que tal crer que a Bíblia é, simples e totalmente, a Palavra de Deus? Que tal crer que não são necessários acréscimos como sugerem os progressistas? Que tal acreditar que não é possível fazer recortes, adequações ou uma customização moderna para transformar o Leão de Judá num gatinho carinhoso? Se a Bíblia é totalmente a Palavra de Deus, ela por si só já é a teologia do processo. Ela toda, para todos. Em primeiro lugar, devemos parar de eleger os pacientes que receberão a medicina, como se só homossexuais fossem doentes, e não todos nós. Então não devemos considerar a homossexualidade um pecado acima dos outros, uma doença isolada que precisa de cura mística. A fonte da enfermidade existencial é a mesma – o pecado. Sendo assim, a medicina também é a mesma para todos! Como tratar? Amor para acolher, amor para discipular, amor para chorar junto, amor para administrar limitações e quedas. Amor! Como saber o que fazer? Olhe para a Palavra e procure princípios que valem para qualquer pecado, que ajudam a lidar com qualquer falha. Como identificar o próximo passo? Clame ao Espírito Santo por direção como clamaria em qualquer outra situação, em qualquer outro cenário – seja você o irmão homossexual, o irmão heterossexual, o irmão pastor, o irmão líder, o irmão intercessor. 38 Observe como somos despreparados: “Se um homossexual de fato se converteu, ele não pensará mais em homens!”, diz o amedrontado irmão religioso. Queridos, sou heterossexual, casado, apaixonado por minha esposa, pai de três filhos – e continuo gostando de mulher. Penso nelas, desejo-as. Minha natureza adâmica gostaria de relacionar-se com inúmeras, de vários tamanhos, cores e sabores. Qual a diferença? Amadureci! Jesus me ensinou como vencer Adão e o pecado! A graça de Deus nos ensina, no livro de Romanos, que a velha e a nova natureza coabitam, coexistem – vencerá a que for mais nutrida! Nutrida de quê? Da Palavra, que é a própria teologia do processo. De relacionamento com Jesus, que é o próprio Amor. De proximidade com o Espírito Santo, que convence, consola e instrui. De vida com Deus, que é o Criador e, portanto, sabe exatamente qual o padrão de identidade sexual para homem e mulher – afinal, foi ideia dEle. Enquanto aprendemos a amar a Jesus, aí é que vencemos as tentações do pecado; mas, é claro, isso não é do dia para a noite. No processo, o Espírito Santo nos ensina a exercer governo sobre todas as coisas, inclusive nossos impulsos afetivos e sexuais. Continuo atraído pela beleza do sexo feminino, com a diferença de que Jesus tirou o dolo desse desejo. Admiro a beleza sem ser libidinoso. Por que não ensinamos isso aos irmãos homossexuais? Por que a estratégia é usada só para heterossexuais? Colocamos um peso religioso sobre homossexuais que ninguém consegue carregar. Qual a consequência? No primeiro sentimento pecaminoso que os assalta, abandonam o processo sentindo-se culpados, indignos e inadequados. Sim, boa parte de nossos irmãos serão assombrados pelo poder do passado, do pecado e da natureza de Adão. Não negue nem ensine ninguém a negar isso! A saída – para a homossexualidade ou qualquer outro pecado – é aprender a não ser governado por essas influências. Pelo contrário, ser governado pelo amor de Jesus, no poder da Palavra e do Espírito Santo. Tudo isso em um processo que provavelmente durará, em intensidades diferentes, a vida toda. 39 Pois atam fardos pesados [e difíceis de carregar] e os põem sobre os ombros dos homens; entretanto, eles mesmos nem com o dedo querem movê-los. Mateus 23.4 JESUS E OS MERCADORES DO TEMPLO ANDERSON SILVA 41 J esus foi o porta-voz divino de justiça e equidade. Diante dEle, todos os homens são iguais em valor. Deus julgará todos os homens e condenará muitos ao fogo eterno, mas nem por isso negou dignidade, direitos e visibilidade a qualquer que seja. Ao ler nos evangelhos a indignação de Jesus dentro do Templo, quando virou as bancas dos mercadores, passa desapercebido o motivo: ...minha casa será chamada Casa de Oração para todos os povos. Isaias 56.7 Existiam vários pátios no Templo, que dividiam classes espirituais e sociais: homens, mulheres, sacerdotes etc. Na parte exterior, ficava o que se chamava de Pátio dos Gentios. Aquele que não fosse judeu – considerado pagão, gentio –, mesmo que convertido à fé judaica, não podia celebrar a fé dentro do Templo. Havia um lugar reservado a eles: o pátio externo. Quando Jesus se aproxima do Templo para adorar, percebe o mercado. Pior ainda, vê que tal mercado estava montado no pátio dedicado aos gentios, no local onde os gentios adoravam a Deus. Como eles adorariam em meio àquele comércio todo? Eles ficaram impedidos, perderam seu espaço. Ou seja, a ira de Jesus naquele momento também foi social: Não está escrito: A minha casa será chamada casa de oração para todas as nações [incluindo gentios]? Marcos 11.17 (Grifos do autor) O que podemos aprender? Pode existir aliança, pode existir santidade, pode existir um altar, pode existir uma liturgia, mas não às custas de uma exclusão, de uma dura acepção de pessoas. Antes de transformar alguém, Jesus não se envergonha dessa pessoa! Pelo contrário, garante seu espaço no Templo, sem barganha. Para que a Igreja possa impactar a vida de alguém, é necessário que haja afirmação de que tal pessoa é bem-vinda e está em um ambiente seguro, que não pretende lhe causar danos – não 42 apenas em palavras, mas em ação. A Igreja deve ser um lugar de segurança, de pertencimento, de valor, que ajuda a reorganizar a visão e o caráter. Nesse sentido, nossas igrejas são para todos? Com isso, não digo que não precisamos de critérios claros, bíblicos e doutrinários. O lema deve ser: não somos uma Igreja para toda prática, mas somos uma Igreja para todas as pessoas. Deve-se respeitar e manter a dignidade social, por meio da qual qualquer um pode frequentar nossas igrejas sem ser censurado. Precisamos amar sem prazo de validade, assim como é necessário preservar a honestidade. Amemos o que as pessoas são, até que se tornem o que Deus as criou para ser. DEFESA DA FÉ FRENTE AO MUNDO TRANSMODERNO ANDERSON SILVA 45 Como eu disse, o mundo transicionou, enlouqueceu, deu um salto irracional rumo ao “progresso”. Com isso, sugiram novas teologias, novas igrejas e novos líderes, que descontruíram o sagrado, aniquilaram absolutos bíblicos e transtornaram a verdade em nome de um amor não permitido pela própria Bíblia. Diante da realidade atual, também precisamos refletir sobre nossas responsabilidades. Não seria a nossa intolerância uma parte significativa do fundamento dos adventos modernos? Será que não amamos demais nossas fronteiras sem amar os que poderiam ser defendidos por elas? Nesse sentido, a Igreja inclusiva teria surgido por uma ação demoníaca, ou a partir da própria omissão da Igreja histórica? O mundo pas sou por trans ições sociais, teoló gicas e filosó ficas profundas – p odemos cham ar de transmodern idade. Precisa mos conceber nov as contextua lizações e abordagens , que plantarã o igrejas para quem nã o gosta da Ig reja. Uma Igreja M issional não s e ofende com o ceticismo atu al. Ela faz a perg unta certa: “Como podem os alcançá-los ?”. 46 O mundo moderno quer transformar o amor em um deus Deus é amor, mas o amor não é Deus. Não é possível compará-Lo com qualquer amor, porque seria incoerente – em nenhum momento, a Bíblia coloca Deus em conflito com Seus atributos perfeitos.Inclusive, quando Ele utiliza de um atributo, não anula nenhum outro. Com isso em mente, compreenda que Ele é amor, sem deixar de ser justo. Sendo assim, é importante ressaltar que aquilo que transforma o homem não é apenas o amor de Deus, mas a resposta que o homem dá a esse amor. Afinal, o amor dEle não entra em ação sem permissão humana, não há invasão por parte do Senhor. O que existe é cooperação, porque “de Deus somos cooperadores” (1 Co 3.9). Os progressistas subverteram até mesmo a Bíblia. Além de plantarem igrejas sem critérios doutrinários, lançaram versões bíblicas com recortes desastrosos. Entre elas, uma na qual Deus não é Pai, para não ofender o feminismo. A masculinidade é tão didática, ao mesmo tempo que a Bíblia é tão absoluta, que além de Deus ser Pai, revelou Seu filho ao mundo como um homem. Por que problematizar o que não era para ser pejorativo nem excludente? O homem foi criado primeiro, nem por isso Deus o ama mais que ama a mulher. Ao homem foi dada a função de governo do lar, mas isso não diminui a importância da função da mulher na família. Em valor, iguais; em funções, diferentes. E Deus não errou ao criar assim. Aliás, o problema da mulher moderna não é o machismo nem o homem. O problema é a mulher não se colocar sob a necessidade universal de redenção, sob o peso redentor da Palavra, que é o mesmo para todos. Sempre será melhor relativizar as Escrituras do que se reconhecer como réu diante de Deus. Sempre será mais fácil vitimizar-se e afirmar “nasci assim”, a “sociedade me fez desse jeito”, do que se reconhecer como um pecador arrependido, carente da misericórdia de um Deus irado contra o pecado e os pecadores – todos eles, homens e mulheres: 47 Por isso, quem crê no Filho tem a vida eterna; o que, todavia, se mantém rebelde contra o Filho não verá a vida, mas sobre ele permanece a ira de Deus. João 3.36 Deus não é a mor romântic o, Deus é amor doutrinal. Ele tem algo a dizer e a re alizar dentro de nós. Não somos m ais seres orig inais como foram J esus, Adão e Eva. Portanto o am or de Deus p recisa transformar q uem somos e m quem fomos c riados para se r. Nesses tempos de crise humana, nos quais a sexualidade se tornou identidade essencial, muito se fala do amor de Jesus, que Jesus ama todos os excluídos e marginalizados. Não se engane, é um tempo tenebroso! Querem colocar Deus como refém de pautas revolucionárias, tornar Jesus um patrono da subversão. Muitos líderes mundiais se ergueram com falácias de revoluções sociais patrocinadas por Jesus. Inclusive, há quem defenda o absurdo de que Cristo foi o primeiro feminista da história. Como pode um feminista ordenar 12 homens ao ministério e nenhuma mulher? Ou Jesus reforçou o “patriarcado opressor”, ou os progressistas de fato não entenderam nada do evangelho. Entenda algo: para que o evangelho faça uma obra profunda em seu coração, você não pode apenas ler a Bíblia, mas se permitir ser lido por ela. Ela precisa “ofender” você antes de transformar você – ou seja, não espere apenas flores e afagos para seu ego, porque Deus nunca será incoerente com a justiça. Para sempre, Ele condenará o pecado, e isso dói no pecador. A própria Palavra 48 de Deus prevê que o processo gerará tristeza no homem, uma que resultará em transformação: “pois fostes contristados segundo Deus (...). Porque a tristeza segundo Deus produz arrependimento para a salvação” (2 Co 7.9,10). Um líder progressista, defensor de movimentos sociais identitários e crítico ferrenho da Igreja histórica, afirma a plenos pulmões que, se Jesus se estivesse vivo, odiaria os líderes religiosos e seria patrocinador das causas de gays, lésbicas, transexuais e transgêneros. De fato, Jesus se identifica com os que sofrem. Porém uma coisa é sofrer com alguém, outra é condescender com o pecado. Vamos a um exemplo: Jesus ama o transexual. Se Ele fosse também patrocinador da causa transexual, de forma simplista, então seria justo dizer que o transexual foi criado para sofrer. Acompanhe o raciocínio: a disforia de gênero – termo utilizado para a pessoa que diz possuir a identidade certa no corpo errado – é um dos pilares da defesa transexual. A pessoa com disforia de gênero sofre ao lidar com fantasmas emocionais, familiares e sociais, porque sente-se inadequada. Agora, passemos à análise dAquele que criou a pessoa trans. Se Jesus, o Verbo, estava lá na criação de tudo e, ao lado de Deus Pai, amou o homem como obra-prima entre as criaturas, por qual motivo não o criou bem? Por que confinou certos indivíduos em corpos errados? Por que já não criou a transexualidade ou a própria homossexualidade como identidades sexuais próprias, também definidas biologicamente? Como conciliar que Jesus resolveu criar o transexual de um jeito errado e, depois, tornou-se patrocinador da causa trans? Seria por acaso que os próprios progressistas ferem o conceito de absolutos bíblicos? Ou, ao defender que tudo é relativo e móvel, estão na verdade tentando fugir dessas perguntas? Eles afirmam que Adão e Eva são míticos, folclóricos, não existiram de fato. Claro! O contrário não daria espaço para a argumentação progressista, haveria incoerência irreparável. Se Adão e Eva existiram, então há criação, queda e redenção. Nesse cenário, o homem não é mero acaso – pessoal, emocional, sexual, social, ideológico. Ele existe como um ser intencionalmente 49 criado por um Deus sábio, consciente, moral, santo e justo, que irá requerer justa prestação de contas de Sua própria criação. Ou seja, o homem não foi criado para existir para si mesmo, do seu jeito, mas para a glória de seu Criador, prestando adoração e rendição moral, tanto social como pessoal de sua vida. Não se trata de uma identidade móvel, mas previamente fixada, com um propósito eterno e imutável. O convite da serpente foi ao transexistencialismo: convidou o homem a existir como um acaso, e não mais como um ser moral, projetado para adorar Seu criador. É nesse sentido que reafirmo que a transexualidade é uma disfunção existencial, um pecado que impede o indivíduo de ser quem Deus diz que ele é. A mídia progressista não relata o alto índice de suicídio entre pessoas que fizeram transições sexuais cirúrgicas. Ao contrário do que prega a visão apaixonada da transexualidade, depois das intervenções, os trans continuam a viver sem plenitude. Isso acontece porque uma cirurgia jamais dará a identidade que somente Deus pode dar, jamais trará sentido à existência como pode trazer o próprio Criador. Volte ao início de tudo e ouça Deus fazer novamente a pergunta: “Adão, onde estás?”. Vá um pouco além e escute dEle um questionamento existencial: “Quem é você, qual o propósito de sua existência, qual o seu nome?”. Você responderia a tais perguntas baseado na ideia original do Criador, ou diria que é apenas vítima do acaso, da sociedade, do meio? Não há como amenizar esta sentença: transexualidade é uma afronta ao Criador. É o homem decidindo ser Deus para si mesmo, com o apoio ideológico de ciências e sociedade adoecidas. É a criatura afirmando a seu Criador que, na realidade, Ele não criou direito. Se Jesus é um Deus sábio, criador, bondoso, amoroso e presciente, como Ele criaria seres humanos com disfunções de caráter, sexo e identidade? “Não foi Deus quem nos fez assim”, argumentam alguns. Então podemos concordar que algo deu errado, algo distorceu. O quê? O pecado! Ele existe e foi responsável por destruir aquilo que Deus um dia chamou de belo. 50 A ideia original de Deus foi perfeita. E Ele criou você, simplesmente, para Ele! Viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom. Gênesis 1.31 Se meu ser h oje – ou seja, quem eu sou atualm ente – é cont rário à santidade dE le, não é corr eto afirmar que Deus am a essa versão do meu ser. Ele me am a como estou por saber quem verdad eiramente so u, mas não se contenta e m me deixar assim. Ele deseja levar-me à melhor ve rsão de mim mesmo: aque la que fui cria do para ser. JULIANA FERRON Homossexual por 12 anos, já foi líder do movimento LGBT e feminista. Missionária da Comunhão Cristã ABBA, de Curiti ba (PR), é escritora, palestrante e conselheira em Grupos de Apoio sobre sexualidade. Possui graduação em Marketi ng, Teologia Ministerial e Psicanálise, além de especialização em Teoria Psicanalíti ca. Pesquisa há anos o tema sexualidade. Ao longo dos anos, vim a perceber que a maior armadilha na nossa vida não é sucesso, popularidade, ou poder, mas autorrejeição. Sucesso, popularidade e poder podem realmente apresentar uma grande tentação, mas a sua qualidade sedutora, muitas vezes, vem da forma como eles são: parte de uma tentação muito maior de autorrejeição. Quando começamos a acreditar nas vozes que nos chamam inúteis e indignos de ser amados, então sucesso, popularidade e poder são facilmente percebidos como soluções atraentes. A verdadeira armadilha, no entanto, é a autorrejeição. Henri Nouwen CANSEI DE SER GAY JULIANA FERRON 53 Enganoso discurso de um ser fragmentado S ei bem quem eu sou. Sou um burguês preso num corpo proletário, sou um marquês preso num corpo ordinário, sou uma diva presa num corpo másculo, ou, no meu caso, sou um bofe preso num corpo menstruado. Isso sim é injustiça! Vivo um modo de vida totalmente irrelevante, cheio de adereços, seios e óvulos, desprovido de intimidade profunda comigo mesma. Ótimo viver assim – detecte a ironia. Esse tipo de vida, de um o primido preso em um corpo opress or, elimina a necessidad e de encarar questões mais profund as, questões de gente grande. Afina l, sou vítima. Meu corpo não estava em mim. Encontrar sustento para esse ser não era nada fácil. Não queira viver esse embate! Existe uma grande chance de você perder. “Como você pode dizer quem eu sou?”, protestei várias vezes ao mundo. A verdade é que nem eu mesma sabia. Passei anos indisponível para mim mesma. Gastei mais de uma década vivendo de sentimentos, e não de fatos. Aprisionei-me em uma identidade: “eu sou gay”. Depois de alguns anos, “eu sou trans”. Pelo menos isso me representa, tornou-me alguém, trouxe senso de pertencimento e existência. Sim, sacrifiquei 12 anos a cumprir um papel que me foi imposto. Tornei-me limitada e incapaz de violentar o aprisionamento que me foi ideologicamente sugerido. Alienei-me. Estive por dez anos homossexual e dois anos trans, do outro lado. Cada dia mais assustadoramente afastada de minha essência. Uma transcendência corporal que cavava cada vez mais fundo 54 um abismo de separação de minha verdadeira identidade pessoal. Aquela superficialidade afastava meus olhos do desconforto que era experimentar ser uma mulher. Corpo injusto! Sobravam muitas partes e faltavam outras. Apropriei-me de representação, performance e discurso. Vesti o figurino. Era o máximo do outro sexo que eu conseguiria ser – uma artista, uma cópia. Coçar o saco, cuspir no chão. Uma encenação inconsciente e desesperadora. Comprei a ideia de que podia ser o que quisesse, e o produto não foi entregue! O homem que me esforcei para ser, nunca chegou lá. Quem acreditou no gênero? Ou melhor, quem acreditou na serpente? Ela continua falando hoje. Seu plano é o mesmo: divisão, fragmentação, distorção. Eva acreditou, eu acreditei. Eu tinha certeza de que era um homem preso num corpo feminino. Entretanto nossas certezas não são a verdade. Submeter nossas certezas à luz interrogatória da Palavra de Deus, à custódia do Evangelho, é o que ilumina as sombras de nossas pretensas certezas. É isso que revela verdades surpreendentes. Minha identidade sexual foi estabelecida por uma preferência minha ou por uma providência divina? Em outras palavras, quem eu sou é determinado pelo que decido, ou pelo desígnio de Deus para minha natureza? Essa é a questão fundamental. Essa é a pergunta a ser feita. Sempre acreditei que minha preferência pessoal e minha autonomia eram prioridade – sobre tudo, inclusive Deus. Mesmo tendo o Senhor falado a respeito de quem eu sou, minha preferência individual, bem como minha orientação sexual, superaram Deus. Ledo engano, com prazo de validade. Meus desejos possuíam peso, mas a realidade estava impressa em meu corpo como revelação biológica da vontade de Deus. Vivemos, assim, um retrocesso, uma involução. A cada dia, desaprendemos quem somos e perdemos a capacidade de identificar-nos. Na despersonalização, temos o gozo de uma falsa identidade. Resgatamos o conto de fadas e, desesperadamente, 55 não queremos mais ver o mundo ou a nós mesmos sem essa lente fantasiosa. Satanás entendeu que o homem completo – espírito, alma e corpo –, assim como eram Adão e Eva, é a própria representação de Deus na Terra. O homem integral, inteiro, completo, reflete e manifesta o Criador. Deus tem um corpo: Cristo. Deus tem um espírito: Espírito Santo. Deus é uma alma também, da qual procedem intelecto e sabedoria eternos. Foi assim que Ele nos fez, unindo tudo o que Ele próprio é num único ser: ser humano. Diante disso, Satanás indagou: “Se o homem pleno é Deus na terra, então esse homem precisa ser fragmentado, dividido, desfalcado”. Em Gênesis 3, encontra-se a tática do engano, usada por Satanás para enganar Eva. Ela cai na armadilha e torna-se uma mulher fragmentada. Com a queda, perdemos o espírito que nos dava a consciência de sermos filhos de Deus. Ou seja, aos nossos olhos caídos, tornamo-nos homens naturais. Ora, o homem natural [corpo + alma – psuchikos, em grego] não aceita as coisas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente. 1 Coríntios 2.14 (Grifos da autora) Perdemos a conexão com Deus, que se dava por meio do espírito. Tornamo-nos parciais, divididos, incompletos. Hoje, temos a mesma oferta, o mesmo convite enganoso que acaba por fragmentar um homem que, uma vez quebrado, pode dividir-se mais uma vez. Um homem faltoso, um homem natural. Perceba a crua verdade: a serpente ainda convida o homem a ser um indivíduo na alma, outro no corpo. Ou seja, rachar o ser humano, antes que ele se complete com o Espírito. Na alma, está o intelecto, a razão, a percepção de quem se é: homem ou mulher. Na alma, está a percepção de que se é gente, humano, filho, amigo, irmão, gente. Já no corpo, está manifesta nossa herança genética, nossa anatomia, que confirmam aquilo que pensamos – na alma – a nosso próprio respeito. 56 É isso que Satanás quer: enganar. O desejo maligno é que o homem dividido e fragmentado acredite que, em sua essência, pode ser diferente na alma e no corpo, contrariando o propósito original do Criador. É desta forma que o diabo consegue matar a representação perfeita de Deus na Terra: fazendo que a criatura acredite na fragmentação, na divisão de seu ser. Então o homem não é mais à imagem de Deus – pelo menos acredita não ser. Eu acreditei, por dois anos, estar num corpo errado. Realmente acreditei na ideia de ser um homem no corpo de uma mulher. Nessa crença ilusória, apropriei-me do discurso revolucionário de liberdade, de ser o que eu sinto que nasci para ser. Na minha cabeça, isso era suficiente para mudar de sexo, passar de XX para XY, ter um pênis, gerar filhos e tudo mais que vem no pacote Walt Disney. Mas esse discurso cansa. Sustentar essa ideia contra uma natureza divina e perfeitamente planejada é exaustivo. Eu cansei. Quanto à minha orientação Identidade não se alcança por meio de cirurgias ou doses de hormônios, nem é algo que se cria. Identidade é recebida como herança, por meio da obra salvadora de Jesus, que reconecta o homem e a mulher ao que eles foram criados para ser. Um conjunto particular de tentações sexuais não d escreve a ide ntidade de uma pessoa. Nem você nem eu somos o que sentimos. A essência transcende o que se sente, o que se viveu, o que se aprendeu. Ela está lá,no interior, antes de qualquer experiência ou vontade. 57 Jesus morreu e ressuscitou para revelar essa essência novamente àquele que crê, fazendo-o tornar àquilo que foi projetado para ser e, portanto, pode realmente satisfazer. Fora do que fomos criados para ser não há como encontrar paz existencial. É preciso compreender que as tentações não são maiores que Jesus e Seu poder redentor. Nunca serão. Um dia, eu fiquei diante desta escolha: acreditar que minha identidade se baseava no que eu fazia, ou estava firmada no que Deus havia criado e no que Ele já havia feito em mim. A partir desse desassossego, conto minha vida de mentiras. Por 12 anos, estive indisponível para refletir sobre a profundidade dos problemas que vivia. A realidade rasa e poética da vida gay me deixava cada vez mais distante de mim mesma. Mais de uma década de fingimento. Não fingi gostar de pessoas do mesmo sexo, mas sempre me enganei sobre essa vida dar certo e trazer satisfação. Não dá, não traz. Sabe por que homossexuais fingem não serem capazes de entender os verdadeiros propósitos de Deus? Porque sabem que, no momento em que aceitarem a verdade, serão inquietados a viver em conformidade com ela. Queremos as bênçãos de Deus, desde que Ele não chegue perto demais. Pergunto: a homossexualidade não deveria ser meu lugar de contemplação e descanso? Contudo era o ambiente onde minha alma mais gritava por resolução, por respostas. Não soa incoerente? Sei que não é fácil compreender tudo isso, também demorei a encarar a verdade. Encontrei na homossexualidade o melhor território para minhas fugas, o melhor abrigo para minhas incertezas. Porém, paradoxalmente, ela tornou-se um campo de perguntas e decepções, e nunca de respostas – não além daquelas provenientes de um discurso alienado da prática, distante de minha tenebrosa inquietação interior. Negação, e não autoconhecimento. Ansiedade, e não alegria. Combate, e não paz. Dependência emocional, e não liberdade. Tirania, e não escolhas. Isso resumia viver na homossexualidade. É aceitar cercar-se de ausências, lacunas, apesar das buscas. É uma constante inquietação consigo mesmo. 58 Para suportar, adotei um discurso que, como disse antes, até é poético, mas completamente desconectado com o que o homossexual realmente sente e vive no dia a dia. Para sustentar uma vida assim, é necessário recorrer a doses anestésicas de engano – até acreditar. O amor recebido nunca bastou. O afeto nunca foi suficiente para preencher as faltas do coração. Ou seja, o impasse está estabelecido. Erguem-se, então, questionamentos. O amor que você tanto persegue é realmente amor? Se fosse, por que até hoje nenhum realmente o aquietou? Acredito que vale a pena investigar os motivadores desse desejo inconsequente de amor. Nem sempre a nascente do rio é pura, então investigar o desejo por trás de tudo pode levar a respostas nunca nem sequer questionadas. Afinal, quem nunca se enganou? Faz bem duvi dar dos própr ios desejos, porq ue somos ma rcados por faltas e c arências. Nem sempre nossos desej os são motiva dos por verdades . Como conhe cer nossas reais n ecessidades, se não sujeitarmos o s desejos à p rova? Quanto aos meus desejos, hoje assumo: os expus em resposta a falta de afeto de mãe, rejeição de pai, abuso sexual de tios, um combo de inutilidades que foram indispensáveis para minha carreira na homossexualidade, na falta de feminilidade. Talvez você esteja familiarizado com um histórico assim e busque respostas. Digo a você: elas estão lá, na sua própria história. Caminhe com Jesus pelo seu passado e deixe-O derramar de Seu poder redentor. Isso explicará a você mesmo quem você realmente é. Esse processo curará os enganos e exporá a verdade. 59 Não é fácil nem é instantâneo. Você precisará reconhecer que, muitas vezes, fracassou. Muitas vezes, acreditou na mentira. Não se resume em culpar quem lhe agrediu e atrapalhou sua consciência de identidade, mas em perdoar – com Ele, é possível libertar os agressores das cadeias da mágoa. Acima de tudo, esse processo exige pedir perdão por aceitar o papel de vítima, enquanto há um poderoso médico, um infalível conselheiro, um prumo perfeito, um Criador que não errou ao projetar a mim e a você. Não somos nossas feridas. Não somos nossas tentações. Mais que isso, não somos nossos próprios desejos! O desejo nos tira a capacid ade de analisar os pr opósitos. Viv er pelo governo dos desejos é viv er de fracasso. Nos so orgulho nã o permite admitir que e stamos perdi dos e, consequente mente, recalc ular a rota, reconfigurar os planos e o s sonhos. Contudo não ter coragem de colocar na mesa o fra casso é refor çá-lo. O pecado cansa, e chegou o dia em que cansei. Em meu livro “Cansei de ser gay”, resumi essa fadiga com as seguintes palavras: Cansei de ruídos pra me guiar Cansei de receber a liberdade proporcionada por alguém que vive suas próprias mazelas e carrega seu lixo diariamente Cansei de estar inadequada Cansei de imitar um agrupamento fundamentado numa ilusão Cansei de viver cega nas minhas razões 60 Cansei da incapacidade de me identificar Cansei da urgência do corpo Cansei de me proteger com gritos Cansei de não saber o que Deus achava de mim Cansei da escravidão da aprovação Cansei de me negar Cansei de fugir do confronto Cansei de defender o pano de fundo das ideias alheias Cansei de não dar espaço para Deus ser o que é Cansei de ser simbólica Cansei de fingir que não entendia o amor de Deus Cansei de me excluir da alegria Cansei de ser um homem sem pênis Cansei dos cabelos raspados Cansei de fugir da mudança Cansei de tentar descansar com mulheres... Em nome do amor, ou daquilo que chamamos de amor, cometemos crimes hediondos contra nós mesmos. Aprisionamo-nos, condicionamos e despersonalizamos quem fomos chamados para ser. Crimes inconscientes, mas celebrados pela sociedade. Logo a sentença chegará, e não sairemos impunes, mesmo debaixo de aplausos. Satanás entendeu que o homem inteiro é Deus na terra, e a junção de homem e mulher é o único portal capaz de reproduzir novas imagens e semelhanças de Deus. Primeiro, ele ataca nossa identidade, assim como fez com Eva, sugerindo que ela era outra coisa diferente do que Deus fizera. Quando nossa primeira mãe aceitou a proposta de comer da árvore do conhecimento do bem e do mal e ofereceu o fruto também a Adão, ambos foram expulsos da presença do Senhor, ou seja, sofreram a morte espiritual. Naquele momento, iniciou-se a profunda corrupção moral do homem, agora morto espiritualmente, fragmentado. Note que 61 a enganosa possibilidade de viver sem Deus convenceu Eva. Ela foi tomada pela frenética sensação de que uma única experiência seria maravilhosamente eterna, que o prazer da individualidade duraria para sempre – mas o resultado foi nada menos que morte, separação da Vida. Ou seja, o vazio existencial foi plantado! Em segundo lugar, Satanás ataca a ferramenta abençoada chamada sexo, que pode gerar outros seres à imagem e semelhança de Deus. Porém é imprescindível ressaltar que o propósito perfeito de Deus não é invalidado pelo pecado! Ele não é anulado ou deixa de existir, tanto que Deus permitiu que o prazer do sexo continuasse, mesmo após a queda. O propósito divino de multiplicar continua válido após o pecado original. A verdade sempre vencerá a mentira – a questão é o que acontece com quem decide acreditar na mentira. Quando aceitei Jesus, não deixei de ter desejos, mas deixei de ser governada por eles. A tirania cessou. Não era mais só corpo e alma, mas voltei à versão original, completa e perfeita, vivificada pelo Espírito que passou a habitar em mim. Ele me tirou de uma condição para colocar-me na posição de filha de Deus – isso sobressai, sobrepuja tudo o que se pode encontrar nesta vida. Nossa condição na Terra não altera de forma alguma a posição que podemos ter em Cristo Jesus. Recebê-Lo é ser emocionalmentesurpreendido pela desconcertante e imutável sensação de ser você mesmo, e não outra pessoa. Não dá para expressar dignamente em palavras esta informação: Juliana, você é uma mulher, aos seus quase 30 anos. Não, essa informação não era óbvia. Onde estão os pais, chamados a verbalizar afetivamente quem somos? Mais uma ferida que recebeu a cura pela verdade. Pareceu-me desafiador e absolutamente fantástico viver essa coisa de ser mulher. Com certeza, a melhor revelação depois de Cristo. A consciência de quem se é vem por meio dEle. Homossexualidade, seus prazeres são belos, mas não me completam. Seus momentos são deliciosos, mas não me sustentam. Suas mulheres são instigantes, mas não me governam mais. ROBERT DIEGO Ex-transexual. Atualmente, é missionário graduado pela MCM, formado em Teologia Livre pela Presbiteriana da Graça, seminarista na Primeira Igreja Bati sta de Mogi das Cruzes (SP) e estudante de Teologia pela Unicesumar de Maringá (PR). Lidera pré-adolescentes e faz parte do JUCT, Jovens Unidos em Cristo, projeto que auxilia o público jovem. Também palestra sobre sexualidade e vida cristã. Jesus vem não para o superespiritual, mas para o vacilante e o enfraquecido que sabe que não tem nada a oferecer, que não é orgulhoso demais para aceitar a esmola da graça admirável. Ao olharmos para cima, fi camos surpreendidos por encontrar os olhos de Jesus abertos em assombro, profundos em compreensão e genti s em compaixão. Brennan Manning À medida que viramos as páginas dos evangelhos, descobrimos que as pessoas que Jesus encontra ali são você e eu. A compreensão e a compaixão que oferece a elas, também as oferece a você e a mim. Brennan Manning INDIVIDUALISMO: ENGANO SOCIAL ROBERT DIEGO 65 N a atual sociedade, que está em constante transição, há uma supervalorização do individualismo. Podemos olhar para este momento como a diluição de tudo o que é institucional. Amar o próximo como a si mesmo, como disse Sigmund Freud, é um dos preceitos fundamentais da vida civilizada. Por outro lado, o sociólogo Zygmunt Bauman analisa que esse é exatamente o padrão contrário àquilo que a própria civilização promove: interesse próprio e busca da felicidade. Segundo Bauman, a modernidade é uma época em que a vida social passa a ter como centro a existência do individualismo, é a fase marcada por uma expansiva autonomia do homem em relação à vida social. É exatamente o que vivemos hoje: uma sociedade que cultua a liberdade individual como valor absoluto e hegemônico. Ainda utilizando pensamentos de sociólogos sobre o assunto, podemos citar Alain Ehrenberg, que assinalou um resultado desse culto: Há um estím ulo à busca d e prazer constante, o que, com freq uência, e paradoxalm ente, resulta em uma experiência d e insuficiênci a e fracasso. Cada vez mais, há um distanciamento do outro – pensa-se unicamente e exclusivamente em si. E esse individualismo também invadiu o campo da sexualidade humana. A corrida por satisfação pessoal fez com que o homem trocasse de parceiro e parceira na tentativa de preencher um vazio existencial. A característica consumista da sociedade piorou o cenário, tornando o sexo uma moeda de troca, beirando a total irresponsabilidade. Na Academia, vale a ideologia, e não estudos científicos: “meu corpo, minhas regras”. Ou seja, não se pode ter uma mente 66 saudável sem pensar na satisfação do corpo. O que importa é sentir o que se deseja sentir, custe o que custar. Sendo assim, há um rechaço por instituições como família, sociedade e religião, uma vez que elas são “opressoras” por definir limites. Basta pensar estar bem – sempre entre aqueles que pensam de forma igual, é claro. Quem pensa diferente é algoz, e o resto não interessa. A publicidade também se empenhou na destruição de costumes locais e comportamentos tradicionais. Desde os anos 50, vê-se uma máquina de uniformização capaz de produzir uma felicidade conformista, materialista e mercantil. A lógica tomou rádio, cinema, televisão e internet, que adquiriram um imenso poder de homogeneização de gostos e atitudes. A capacidade midiática de criar, em grande escala, fenômenos comportamentais e emoções similares expressa-se em best-sellers, hits, idolatria de stars, modas, sucesso do mês etc. Bauman dizia que mesmo os gestos cotidianos tendem a homogeneizar-se. Olhe ao redor e diga se não é isso que você enxerga. Juntando as peças, dá para entender como se chegou à atual perspectiva de sexualidade. Torna-se possível descolar ou separar “sexo” e “gênero” – o gênero vira o protagonista, para que o indivíduo possa identificar-se como quiser. É a procura pela total individualidade, independentemente do sexo biológico, além da exigência de que todos aceitem a monopolização do pensamento. Afinal, “eu tenho direito de ser quem eu quiser” e “ninguém tem o direito de questionar o que eu quero”. Nesse contexto, tudo passa a ser visto como construção social. Há um aparelhamento com a filosofia evolucionista, existencialista e naturalista. Nas salas de aula, temos um desafio: a ditadura de esquerda e seus pensamentos totalitários, que “valorizam” o indivíduo a tal ponto que o doutrinam. Todos devem pensar igual: sempre haverá um injustiçado socialmente e um culpado – obviamente, a classe “dominadora”. Você percebe o engano social por trás de tudo isso? Acredito, sim, que haja vítima em qualquer segmento. Pessoas abandonadas, violentadas, provenientes de famílias disfuncionais. Contudo é necessária uma cosmovisão cristã que olha para o 67 indivíduo total, na condição de ser caído e depravado por natureza. Ele não é apenas vítima. O pecado existe e está fincado na criação pós-queda, com diversas consequências devastadoras. Não é apenas a sociedade que agride o homem, mas o próprio homem que possui todos os males dentro de si. Calma. Há solução para esse engano social do individualismo. Há solução para o mal interno do homem, assim como há um meio de livrar-se de cadeias de mentiras socialmente aceitas. Talvez minha história ajude a clarear o cenário. EXPERIÊNCIA NA TRANSEXUALIDADE ROBERT DIEGO 69 Como olhar para a transexualidade em nossos dias? Como ter um olhar de compaixão e acolhimento, sem banalizar as Escrituras? Esse é um tema delicado e que precisa ser tratado com amor e graça. Acredito que dividir minha experiência na transexualidade irá inclinar os olhares para além da teoria. O que você lerá agora é um relato cru e real. Estive na transexualidade por 12 anos. Não foi fácil. Aliás, já era difícil muito antes, quando me via diferente de todas as crianças – é triste e injusto. Por que todo mundo é normal, e eu sou diferente? Esse questionamento é sério e não deve ser negado, mas tratado com atenção e cuidado, tanto em nossas igrejas como em toda a sociedade. Aos 11 anos, fui ao médico para começar a tratar uma ginecomastia – crescimento anormal das mamas em homens. Trata-se de uma situação clínica comum, mas que sempre me deixou envergonhado. Durante toda a infância, nunca soube o que era ficar sem camiseta. Sentia-me inseguro. A intensidade desse desajuste entre corpo e mente só aumentou. O sentimento de que eu era diferente dos outros meninos transformou-se em enormes conflitos emocionais e familiares. Na escola, o sofrimento foi intenso. Não conseguia falar de meus problemas com ninguém, sentia que não podia. Sei bem como sofrem crianças e adolescentes nessa situação – é humilhante. É por isso que acredito na necessidade de trabalhar pedagogicamente a violência tanto psicológica quanto física, além de punir quaisquer pessoas por preconceito, discriminação e humilhação vexatória. No âmbito cristão, precisamos de uma teologia clara, que leve ao que antecede a transexualidade, qual é a influência. Vaidade, inveja, cobiça, ganância, ciúme, idolatria – é inevitável que encontremos pecado na raiz. Não consigo ver a transex ualidade como
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