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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM AGRONEGÓCIO ESCOLA DE AGRONOMIA SETOR DE DESENVOLVIMENTO RURAL MARIANE RODRIGUES DA VITÓRIA DINÂMICA DE SERVIÇOS DE REGULAÇÃO HÍDRICA NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIBEIRÃO JOÃO LEITE, GOIÁS. GOIÂNIA – GO 2019 MARIANE RODRIGUES DA VITÓRIA DINÂMICA DE SERVIÇOS DE REGULAÇÃO HÍDRICA NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIBEIRÃO JOÃO LEITE, GOIÁS. Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Agronegócio da Universidade Federal de Goiás (UFG), como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Agronegócio. Área de Concentração: Sustentabilidade e Competitividade dos Sistemas Agroindustriais Linha de Pesquisa: Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional Orientador: Dr. Klaus de Oliveira Abdala GOIÂNIA – GO 2019 Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor, através do Programa de Geração Automática do Sistema de Bibliotecas da UFG. CDU 631/635 Vitoria, Mariane DINÂMICA DE SERVIÇOS DE REGULAÇÃO HÍDRICA NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIBEIRÃO JOÃO LEITE, GOIÁS. [manuscrito] / Mariane Vitoria. - 2019. CXXX, 130 f. Orientador: Prof. Dr. Klaus Abdala. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Goiás, Escola de Agronomia (EA), Programa de Pós-Graduação em Agronegócio, Goiânia, 2019. Bibliografia. Anexos. Apêndice. Inclui siglas, mapas, abreviaturas, símbolos, gráfico, tabelas, algoritmos, lista de figuras, lista de tabelas. 1. Serviços Ambientais . 2. Modelagem ambienta. 3. Bacia hidrográfica do Ribeirão João Leite. 4. Conservação do solo. 5. Valoração Ambiental.. I. Abdala, Klaus , orient. II. Título. Scanned by CamScanner DEDICATÓRIA Ao meu esposo, Gesse Allan. Ao meu filho, Davi. Aos meus pais, Maria e Humberto; A minha irmã, Cristiane. AGRADECIMENTOS A Deus, por me acompanhar nessa jornada e por me dar saúde para vencer os obstáculos; Ao professor Dr. Klaus de Oliveira Abdala, pela orientação e apoio na elaboração desse trabalho, pela confiança e oportunidades de aprendizado; Ao meu esposo, pelo apoio incondicional, pela compreensão e dedicada atenção, que ao longo dos anos de união, renderam muitas conquistas e as quais atribuo o mérito dessa realização. Aos meus pais, Maria do Socorro e Humberto Juliano, pelo empenho em minha criação em tempos difíceis com muito carinho, esforço, que me permitiram conquistar muitas vitórias. Aos colegas que conheci durante o período do mestrado, pelo aprendizado e pelo dia-a-dia tão prazeroso. Agradeço aos professores do Programa de Pós-Graduação em Agronegócio da Universidade Federal de Goiás pela formação a mim concedida. A secretária Lindinalva, por toda eficiência e presteza durante o período do mestrado. Por fim, a todos que passaram por mim durante esse momento, me auxiliando, compartilhando sentimentos, conhecimentos, valores, risos e que estarão eternamente guardados em minha memória. RESUMO Relações que tangem o meio ambiente e questões econômica nem sempre coexistem de forma conciliada. Nesse sentido diversos mecanismos foram introduzidos no Brasil, como o código florestal com o intuito de prescreve as APPs e a Reserva Legal, ambas como o objetivo de garantir a manutenção dos serviços ambientais, além do surgimento de projetos e programas que envolvem o Pagamento de Serviços Ambientais (PSA) com o objetivo de recompensar os provedores de serviços ambientais, como o Projeto Produtor de Águas (PPA) da Agência Nacional de Águas (ANA), que tem como objetivo a redução de processos erosivos em áreas agrícolas e a recuperação de mananciais. Tal programa parte de um modelo de tomada de decisão, que leva em consideração os diversos aspectos econômicos, sociais e ambientais na área de interesse, utilizando instrumentos de mercado para produzir estímulos positivos no comportamento dos agentes responsáveis pelas alterações das funções ecossistêmicas. Neste sentido, apesar dos esforços, ainda são escassos os estudos que quantifiquem os benefícios econômicos dos serviços ambientais, fundamental para que estes sejam incluídos nas tomadas de decisões. O objetivo do trabalho foi quantificar e valorar os serviços ambientais hidrológicos na bacia hidrográfica do Ribeirão João Leite Goiás, assim como em suas sub-bacias, através da modelagem ambiental. Foi utilizado o modelo SDR do pacote InVEST (Integrated Valuation of Environmental Services and Tradeoffs) a fim, de simular o fluxo de sedimentos em alguns cenários: cenário anterior, durante e posterior ao programa Produtor de Águas. Por fim, foi realizada uma valoração dos serviços ambientais, como forma de estimar os custos evitados com dragagem e recomposição do solo. Custos que foram comparados ao custo de oportunidade do programa. Em relação aos resultados apresentados pelo InVEST, foi possível ver uma redução na produção de sedimentos, principalmente perda de solo (USLE) e sedimentos exportados até as sub-bacias, principalmente no cenário II e futuro ao qual foram simulados com um manejo mais conservacionista, além das práticas propostas pelo programa Produtor de Águas. Assim, os resultados mostraram a importância de projetos como o Produtor de Águas, não só na melhoria das condições ambientais, mas principalmente, resultaria em benefícios econômicos, sociais. Pequenos produtores são uns dos principais beneficiários devido à melhoria das condições sociais e ambientais, embora não sejam os únicos, uma vez que os benefícios vão além dos limites da sub-bacia, como no abastecimento de água para a RGM. Por fim, a participação do agronegócio como financiador de projetos como o PPA, voltados para a restauração, proteção e conservação dos recursos naturais, conscientes do valor (não só monetário, como também do valor intangível dos recursos naturais, como água e solo) é de extrema importância. Esse valor pode ser mensurado quando se considera que o setor apresenta arcabouço de negociação com os diversos mercados, entre eles o internacional, o qual poderá se destacar como produtor dos serviços ecossistêmicos – e não só de commodities. Palavras-Chave: Serviços Ambientais, Modelagem ambiental, Bacia hidrográfica do Ribeirão João Leite, Conservação do solo, Valoração Ambiental. ABSTRACT Relations that touch the environment and economic issues do not always coexist in a reconciled way. In this sense, several mechanisms were introduced in Brazil, such as the forest code with the purpose of prescribing the APPs and the Legal Reserve, both as the objective of guaranteeing the maintenance of environmental services, in addition to the emergence of projects and programs involving the Payment of Services (PSA) with the objective of rewarding environmental service providers, such as the National Water Agency (ANA) Water Producer Project (PPA), which aims to reduce erosion processes in agricultural areas and to recover water sources . This program is part of a decision-making model that takes into account the various economic, social and environmental aspects in the area of interest, using market instruments to produce positive stimuli in the behavior of agents responsible for changes in ecosystem functions. In this sense, despite the efforts, studies that quantify the economic benefits of environmental services are still scarce, so that they are included in decision-making. The objective of this study was to quantify and evaluate the hydrological environmental services in the João LeiteGoiás river basin, as well as in its sub-basins, through environmental modeling. The SDR model of the InVEST (Integrated Valuation of Environmental Services and Tradeoffs) package was used in order to simulate the sediment flow in some scenarios: previous scenario, during and after the Water Producer program. Finally, a valuation of the environmental services was carried out, as a way of estimating the costs avoided with dredging and soil recomposition. Costs that were compared to the opportunity cost of the program. In relation to the results presented by InVEST, it was possible to see a reduction in sediment production, mainly soil loss (USLE) and sediments exported to the sub-basins, mainly in scenario II and future to which they were simulated with a more conservationist management, besides the practices proposed by the Water Producer program. Thus, the results showed the importance of projects such as the Water Producer, not only in improving environmental conditions, but mainly, would result in economic and social benefits. Small producers are one of the main beneficiaries due to the improvement in social and environmental conditions, although they are not the only ones, since the benefits go beyond the sub-basin's limits, such as in the water supply to the RGM. Finally, the participation of agribusiness as a funder of projects such as the PPA, aimed at the restoration, protection and conservation of natural resources, conscious of the value (not only of money but also of the intangible value of natural resources such as water and soil) is of extreme importance. This value can be measured when one considers that the sector presents a negotiation framework with the different markets, among them the international market, which can stand out as a producer of ecosystem services - not just commodities. Key words: Environmental Services, Hydrographic Basin of Ribeirão João Leite, Soil Conservation, Environmental Valuation. LISTA DE FIGURAS Figura 1: Impactos do manejo agrícola e do manejo paisagístico no fluxo de serviços e desserviços ecossistêmicos para os agroecossistemas. Fonte: EMBRAPA. ............................ 22 Figura 2: Uso do solo em cada região: tendências projetadas para estabelecimentos rurais. Fonte: MARGULIS (2011). ..................................................................................................... 23 Figura 3: Compõem o ciclo hidrológico: a evapotranspiração, a condensação, a precipitação, o escoamento e a infiltração. Fonte: Schiavetti (2012). ........................................................... 25 Figura 4: A bacia hidrográfica como unidade, sistema que compreende um volume de materiais, sólidos e líquidos. Fonte: Modificado de Dobson (1999). ...................................... 27 Figura 5: Classificação dos processos erosivos. Fonte: Jesus (2013). .................................... 30 Figura 6: Distribuição atual dos projetos do Programa Produtor de Águas no Brasil. Fonte: ANA – Agência Nacional de Águas. ....................................................................................... 37 Figura 7: Ações elegíveis PPA. Fonte: Adaptado SANEAGO (2015). .................................. 39 Figura 8: Ações prevista para o Programa Produtor de Água propriedade 02 (a) Terraços; Cerca para proteção de APP (b); zona ripária preservada (c). Fonte: EMATER (2017). ........ 42 Figura 9: Parceiros Programa Produtor de Águas João Leite. Fonte: EMATER (2017). ....... 43 Figura 10: Tela do software (InVEST), com módulos para avaliar distintos serviços ambientais de ecossistemas terrestres. ..................................................................................... 45 Figura 11: Localização da área de estudo, com destaque para a Bacia de contribuição. ........ 50 Figura 12: Delimitação Sub-bacias Ribeirão João Leite. Fonte: Adaptado Oliveira (2013). . 53 Figura 13: Tela do software (InVEST), após finalização de modelo (Run) SDR. .................. 54 Figura 14: Tela do software (ArcGIS), tabela de atributos com dados gerados pelo (InVEST), onde são disponibilizados os valores de sed retention, USLE, sed export. .............................. 55 Figura 15:Abordagem conceitual proposta por Borselli et al., (2008), utilizada no modelo de exportação de sedimentos. Fonte: SHARP et al., (2016) ......................................................... 56 Figura 16: Plataforma de conectividade entre operador e computador utilizada pelo software InVEST. .................................................................................................................................... 59 Figura 17: Representação esquemática dos dados empregados para a estimativa de perda de solo por erosão utilizando o programa Invest. Fonte: (THOMPSON e FIDALGO, 2013). .... 61 Figura 18: Modelo Digital de Elevação. ................................................................................. 62 Figura 19: Mapa Erosividade da Chuva. Fonte: Almeida (2015) ........................................... 63 Figura 20: Mapa do Brasil com as equações empregadas e suas respectivas regiões de abrangência para o cálculo da erosividade. Fonte: modificado de SILVA (2004). ................. 64 Figura 21: Mapa erosividade (Fator K) JL Fonte: Almeida (2015) ........................................ 66 Figura 22: Mapa Uso e Cobertura do Solo da área de estudo, em 2009. Fonte: MapBiomas (2018). ...................................................................................................................................... 68 Figura 23: Mapa Uso e Cobertura do Solo da área de estudo, em 2011. Fonte: MapBiomas (2018). ...................................................................................................................................... 69 Figura 24: Mapa Uso e de estudo, em 2017. Fonte: MapBiomas (2018). .............................. 70 Figura 25: Mapa Uso e Cobertura do Solo Cenário Futuro. ................................................... 73 Figura 26: Etapas para delineamento automático da bacia hidrográfica estudada com a ferramenta Hydrology do ArcGIS 10.2.2. ................................................................................ 74 Figura 27: Correção de erros do tipo “sink” por meio da execução da função “fill sinks”.Fonte: Alves Sobrinho, 2010. ........................................................................................ 75 Figura 28: Exemplo de execução da função “flow direction” e “flow accumulation”.Fonte: Adaptado de Alves Sobrinho (2010). ....................................................................................... 76 Figura 29: Delimitação bacia hidrográfica do Ribeirão João Leite. ....................................... 78 Figura 30: Perda potencial total de solo USLE 2009. ............................................................. 90 Figura 31: Perda potencial total de solo USLE 2011. ............................................................. 90 Figura 32: Perda potencial total de solo USLE cenário II. ..................................................... 90 Figura 33: Perda potencial total de solo USLE 2009. Fonte: autor (gerado no software InVEST). .................................................................................................................................. 92 Figura 34: Perda potencial total de solo USLE 2011. Fonte: autor (gerado no software InVEST). .................................................................................................................................. 92 Figura 35: Perda potencial total de solo USLE Cenário II. .................................................... 92 Figura 36: Sedimentos exportados 2009. Fonte: autor (gerado no software InVEST). .......... 94 Figura 37: Sedimentos exportados 2011. Fonte: autor (gerado no software InVEST). .......... 94 Figura 38: Sedimentos exportadoscenário II. Fonte: autor (gerado no software InVEST). .. 95 Figura 39: Sedimentos Exportados 2009. Fonte: autor (gerado no software InVEST). ......... 96 Figura 40: Sedimentos Exportados 2011. Fonte: autor (gerado no software InVEST). ......... 96 Figura 41: Sedimentos Exportados 2017. ............................................................................... 96 Figura 42: Sedimentos Retidos 2009. Fonte: autor (gerado no software InVEST). ............... 98 Figura 43: Sedimentos Retidos 2011. Fonte: autor (gerado no software InVEST). ............... 98 Figura 44: Sedimentos Retidos 2017. ..................................................................................... 98 Figura 45: Produção de sedimentos (ton/km²/ano) por sub-bacia cenário futuro/2020. ....... 100 Figura 46: Sedimentos exportados (ton/km²/ano) por sub-bacia cenário futuro/2020. ........ 101 Figura 47: Perda potencial total de solo. USLE cenário futuro. Fonte: autor (gerado no software InVEST). ................................................................................................................. 102 Figura 48: Sedimentos exportados cenário futuro. Fonte: autor (gerado no software InVEST). ................................................................................................................................................ 102 Figura 49: Sedimentos retidos cenário futuro. ...................................................................... 103 Figura 50: Passo a Passo programa produtor de água.Fonte: O autor. ................................. 126 Figura 51: Programa Produtor de água JL.Fonte: O autor. ................................................... 126 LISTA DE TABELAS Tabela 1: Definições de serviços ecossistêmicos. ................................................................... 18 Tabela 2: Categoria serviços ecossistêmicos. .......................................................................... 19 Tabela 3: Taxonomia geral do valor econômico do recurso ambiental. ................................. 33 Tabela 4: Conceituação métodos de valoração diretos/indiretos. ........................................... 34 Tabela 5: Participação dos municípios da bacia hidrográfica do Ribeirão João Leite, na oferta e comercialização do CEASA-GO em 2017. ........................................................................... 41 Tabela 6: Ferramentas de gestão de serviços ecossistêmicos (SE). ........................................ 44 Tabela 7: Sub-bacias delimitadas e área correspondentes. ...................................................... 52 Tabela 8: Relação de dados a serem inseridos no software InVEST para a predição, produção e retenção de sedimentos. ......................................................................................................... 60 Tabela 9: Valores de erodibilidade dos solos obtidos da literatura. ........................................ 67 Tabela 10: Valores de C para Classes de Uso e Ocupação do Solo. ....................................... 81 Tabela 11: Valores de P para práticas conservacionistas. ....................................................... 81 Tabela 12: Área correspondente ao uso do solo da Bacia do Ribeirão João Leite .................. 85 Tabela 13: Produção de Sedimentos, por microbacia hidrográfica Ribeirão João Leite, gerado por meio do software InVEST cenários analisados (ton/ km²/ ano) ........................................ 89 Tabela 14: Sedimento Exportados, por microbacia hidrográfica Ribeirão João Leite, gerado por meio do software InVEST cenários analisados (ton/ km²/ ano) ........................................ 93 Tabela 15: Sedimentos Retidos, por microbacia hidrográfica Ribeirão João Leite, gerado por meio do software InVEST cenários analisados (ton/ km²/ ano). .............................................. 97 Tabela 16: Estimativa custo de dragagem cenários analisados (custoDR,R$/ano). .............. 104 Tabela 17: Estimativa custo de recomposição do solo cenários analisados (custoRE,R$/ano). ................................................................................................................................................ 105 Tabela 18: Estimativa Custo de Oportunidade sub-bacias (R$/ha/ano). ............................... 106 Tabela 19: Rendimentos e Custos do Cenário Pós-Projeto em relação aos demais cenários. ................................................................................................................................................ 106 Tabela 20: Serviços ecossistêmicos esperados. .................................................................... 108 Tabela 21: Valores de C conforme literatura. ....................................................................... 127 LISTA DE SIGLAS ANA Agência Nacional de Água C Fator de uso e manejo do solo APA Área de Proteção Ambiental APP Áreas de Preservação Permanente DEM Modelo digital de elevação EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária EMATER Agência Goiana de Assistência Técnica, Extensão Rural e Pesquisa Agropecuária GO Estado do Goiás IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística InVEST Integrated Valuation of Ecosystem Services and Tradeoffs LULC Land Use/Land Cover MDE Modelo Digital de Elevação MEA Millenium Ecosystem Assessment P Fator de práticas conservacionistas PPA Programa Produtor de Água RGM Região Metropolitana SANEAGO Companhia de Saneamento do Estado de Goiás SEMARH Secretaria do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos do Estado de Goiás SDR Modelo de taxa de entrega de sedimentos SE Serviços Ecossistêmicos SIEG Sistema Estadual de Geoinformação de Goiás SIG Sistema de Informações Geográficas USLE Equação Universal de Perda de Solo UTM Universal Transverso de Mercator µm Micrometro SUMÁRIO LISTA DE FIGURAS .............................................................................................................. 21 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 14 2 OBJETIVOS ..................................................................................................................... 16 2.1 Objetivo Geral ........................................................................................................... 16 2.2 Objetivos Específicos ................................................................................................ 16 3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .................................................................................... 17 3.1 Serviços Ecossistêmicos ............................................................................................ 17 3.1.1 Bacia hidrográfica e o Serviço de Provisão Hidrológico ................................... 24 3.1.2 Bacia hidrográfica e o Serviço de Suporte do Solo ............................................ 29 3.2 Valoração de Serviços Ambientais ............................................................................ 32 3.3 Pagamento por Serviços Ambientais ......................................................................... 35 3.3.1 Programa Produtor de Águas ............................................................................. 37 3.3.2 Programa Produtor de Água Ribeirão João Leite ............................................... 40 3.4 Modelagem Ambiental .............................................................................................. 44 3.4.1 Integrated Valuation of Environmetal Services and Tradeoffs - InVEST ......... 45 3.4.2 Universal Soil Loss Equation (USLE) ............................................................... 48 4 METODOLOGIA .............................................................................................................49 4.1 Área de Estudo........................................................................................................... 49 4.2 Subdivisões Sub-Bacias ............................................................................................. 51 4.3 Submodelo de Exportação de Sedimentos (Sediment delivery model – SDR) ......... 54 4.3.1 Fatores de Calibração k e IC0 e SDRmáx .......................................................... 57 4.4 Parâmetros e Dados de Entrada Modelo - (Sediment delivery model – SDR) ........... 60 4.4.1 Modelo Digital de Elevação (MDE) ............................................................................ 61 4.3.2 Erosividade da Chuva (R) .................................................................................. 62 4.3.3 Índice de Erodibilidade (K) ................................................................................ 65 4.3.4 Uso e Cobertura do Solo .................................................................................... 67 4.3.5 Uso e Cobertura do Solo Cenário Futuro ........................................................... 71 4.4 Subdivisão Sub-Bacias - Watersheds ........................................................................ 74 4.4.1 Fill Sinks ............................................................................................................ 75 4.4.2 Flow Direction .................................................................................................... 75 4.4.3 Flow Accumulation ............................................................................................ 75 4.4.4 Stream Definition ............................................................................................... 76 4.4.5 Stream Segmentation .......................................................................................... 76 4.4.6 Catchment Grid Delineation ............................................................................... 76 4.4.7 Catchment Polygon Processing .......................................................................... 77 4.4.8 Drainage Line Processing ................................................................................... 77 4.4.9 Adjoint Catchment Processing ........................................................................... 77 4.4.10 Drainage Point Processing ................................................................................. 77 4.4.11 Batch Point Generation ...................................................................................... 77 4.4.12 Watershed Delineation ....................................................................................... 77 4.5 Fatores C e P – Tabela Biofísica ............................................................................... 79 4.6 Simulações de Cenários ............................................................................................. 81 4.7 Valoração Serviços Ambientais ................................................................................. 83 4.7.1 Custos Evitado .................................................................................................... 83 4.7.2 Custo de Recomposição ..................................................................................... 84 4.7.3 Pagamento por Serviços Ambientais .................................................................. 85 4.8 RESULTADOS E DISCUSSÃO............................................................................... 85 4.8.1 Estimativa de Fluxos Hidro - Sedimentológicos ................................................ 88 4.8.2 Produção de Sedimentos .................................................................................... 88 4.8.3 Sedimento Exportados ........................................................................................ 93 4.8.4 Sedimentos Retidos ............................................................................................ 97 4.8.5 Estimativa de Fluxos Hidro - Sedimentológico Cenário Futuro ........................ 99 4.9 Valoração de Serviços Ambientais .......................................................................... 103 4.9.1 Custo Evitado - Dragagem ............................................................................... 103 4.9.2 Custo Evitado – Recomposição do solo ........................................................... 104 4.9.3 Custo de Oportunidade ..................................................................................... 105 4.9.4 Análise dos Resultados ..................................................................................... 106 4.10 Serviços Ecossistêmicos Esperados ......................................................................... 108 4.11 CONCLUSÕES ....................................................................................................... 109 4.12 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 113 ANEXOS ................................................................................................................................ 125 14 1 INTRODUÇÃO A água é constituída como um dos elementos mais importantes para a humanidade, pois serve como fonte de subsistência. Mudanças no uso e ocupação do solo causam impactos que podem ir além da escala local, interferindo a exemplo no clima e no regime hídrico (Martins et al., 2009; Saad et al., 2010).). A bacia hidrográfica do Ribeirão João Leite, é um dos três principais mananciais de abastecimento de água da cidade de Goiânia, capital do estado de Goiás, esse corpo hídrico vem sendo degradado ao longo dos anos, principalmente devido ao inadequado uso do solo, ocupação desordenada e redução da cobertura vegetal (NASCIMENTO, 1998). Trata-se de um manancial de importância estratégica, responsável atualmente por cerca de 50% do suprimento de água para a RGM (BUMA, 2017). De acordo com a SEMARH (2007), a pecuária e a agricultura, aliadas ao uso de agrotóxicos e à falta de conservação de solos, são os principais problemas a serem resolvidos. A preservação de corpos hídricos, como a bacia hidrográfica do Ribeirão João Leite, está relacionada a uma complexa rede de interações denominada funções ecossistêmicas. Essas funções são fundamentais para a manutenção do bem-estar da sociedade, uma vez que são responsáveis pela criação de um conjunto de bens e utilidades às comunidades usuárias. Dentre estes bens, quando dotados de utilidades econômicas e sociais constituem os serviços ecossistêmicos, sendo classificados, então como: serviços de provisão, que são os produtos obtidos dos ecossistemas (alimentos, água, fibras, recursos genéticos); serviços de regulação, que são os benefícios obtidos pela regulação de processos ecossistêmicos (regulação do clima, regulação hídrica e controle de doenças), serviços de suporte, são aqueles que sustentam a funcionalidade dos ecossistemas (formação de solos, ciclos biogeoquímicos) e serviços culturais, que podem ser definidos como o aumento da área verde. Neste sentido, melhorar a qualidade da água e auxiliar na redução de sedimentos (dentre outros serviços ecossistêmicos), em bacias hidrográficas ocupadas e degradadas por atividades agrícolas – caso da bacia hidrográfica do Ribeirão João Leite, são importantes objetivos políticos, sobretudo por tais serviços produzirem bens públicos, uma vez que suas características de não rivalidade e não exclusividade, tendem a exauri-los pelos usuários privados e, portanto, devem ser controlados por instrumentos de regulação do Estado (CALLAN & THOMAS, 2013). 15 Assim, várias ações e projetos têm sido implantados no Brasil e no mundo, a fim de corrigir tal cenário de degradação ambiental através de políticas públicas agroambientais. Exemplo disto é o Programa Produtor de Águas (PPA) da Agência Nacional de Águas (ANA),que tem como objetivo a redução de processos erosivos em áreas agrícolas e a recuperação de mananciais. Tal programa parte de um modelo de tomada de decisão, que leva em consideração os diversos aspectos econômicos, sociais e ambientais na área de interesse, utilizando instrumentos de mercado para produzir estímulos positivos no comportamento dos agentes responsáveis pelas alterações das funções ecossistêmicas. Um desses instrumentos que tem se destacado na gestão de recursos hídricos é denominado Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). O programa Produtor de Águas parte do princípio do provedor pagador, no qual, o agente responsável pelo aprimoramento do serviço em questão recebe uma compensação da sociedade pela continuidade de provisão deste serviço. No caso, após a seleção das propriedades rurais, nelas são executados projetos que visam identificar as áreas que estão degradadas e os ajustes estruturais necessários a sua recuperação. Uma vez, verificada a realização dos ajustes o dono da terra recebe um determinado valor representativo de compensação e estímulo à realização do mesmo, nos moldes do PSA. Além da recuperação da área degradada, tal ação traz como vantagem direta ao agente executor do ajuste a compensação financeira, que pode ser parcial ou total, pelos investimentos necessários, uma vez que o mesmo ainda percebe os benefícios privados do ajuste como a melhora da qualidade do solo é, consequentemente, o aumento na produção de água, dentre outros serviços ambientais de utilidade ao próprio produtor. Essas vantagens beneficiam ainda indiretamente a população em geral, como o caso da Região Metropolitana de Goiânia (RMG), a qual faz uso da água de abastecimento da bacia hidrográfica do Ribeirão João Leite. Apesar dos benefícios diretos e indiretos evidenciados ao agente executor e à sociedade, a alocação de recursos públicos a um agente privado é permeada de críticas, sobretudo em relação à eficiência e efetividade de tal instrumento e, nesse sentido, emerge a necessidade de analises ambientais que subsidiem a intervenção política mais eficiente no problema abordado, a fim de que seja verificado o grau de degradação do sistema e seus condicionantes (RODRIGUES, 2010). Portanto, tendo em vista a importância estratégica que o reservatório apresenta, mostra-se pertinente o auxílio da modelagem a fim de verificar, sua qualidade ambiental, assim como prever quais seriam seus pontos de maior degradação Desta forma, o presente trabalho objetiva a avaliação da provisão de serviços ecossistêmicos na bacia hidrográfica do Ribeirão João Leite, no tocante ao projeto produtor de 16 águas, utilizando ferramentas de geoprocessamento e o modelo hidrossedimentológico InVEST. 2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo Geral O trabalho traz como objetivo analisar a produção de sedimentos em cenários de uso e ocupação do solo por meio da adoção de práticas conservacionistas na bacia hidrográfica do Ribeirão João Leite – GO – frente aos estímulos promovidos pelo programa produtor de águas. 2.2 Objetivos Específicos Modelar a dinâmica de produção, exportação e retenção de sedimentos na bacia do Ribeirão João Leite; Identificar os impactos nos serviços ecossistêmicos, considerando a mudança do uso e o manejo do solo nesta bacia; Gerar estimativas financeiras dos serviços ambientais para cada cenário de uso e cobertura do solo; 17 3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 3.1 Serviços Ecossistêmicos A percepção da utilidade da natureza na manutenção da humanidade já era relatada desde 1864, por George Marsh, crítico da ideologia de que os recursos naturais são infinitos. Marsh demonstrava, por exemplo, que práticas depredatórias – como o desmatamento – geram perda de fertilidade do solo e reduzem a disponibilidade hídrica (MOONEY e EHRLICH, 1997; ROSA, 2014). Com o desenvolvimento da ecologia, estudos sobre as funções dos ecossistemas foram aprofundados entre as décadas de 1960 e 1970, especialmente sobre o ciclo do carbono, da água e de nutrientes (ROSA, 2014). Com o passar do tempo, o conceito de funções ecossistêmicas, por sua vez, foi associado à serviços ecossistêmicos, na medida em que esses trazem implícita a ideia de valor humano, sendo que uma função é capaz de produzir diferentes serviços ecossistêmicos quando estes apresentam potencial de serem utilizados para atender necessidades humanas (HUETING et al., 1998), gerando, portanto, bem estar ao indivíduo e/ou à sociedade. As funções e os serviços ecossistêmicos nem sempre apresentam uma relação biunívoca, sendo que um único serviço ecossistêmico pode ser o produto de duas ou mais funções ou uma única função pode gerar mais de um serviço ecossistêmico (COSTANZA et al., 1997; DE GROOT et al., 2002). A disseminação do conceito serviços ecossistêmicos tornou-se evidente principalmente no meio acadêmico, após a Avaliação Ecossistêmica do Milênio, em 2015 (ou Millenium Ecosystem Assessment- MEA,2005) (HASSAN et al., 2005). O MEA, por sua vez, foi a maior avaliação já realizada sobre a saúde dos ecossistemas. Teve como objetivo analisar as consequências sobre as alterações nos ecossistemas, bem como os resultados dessas alterações para o bem-estar humano; ali, pois, foram lançadas as bases científicas para a promoção dos serviços ecossistêmicos de modo a incentivar seu reconhecimento e estimular ações de preservação e incremento (BARBOSA, 2015). As discussões decorrentes da MEA permitiram maior clareza na definição do que seriam os serviços ecossistêmicos e qual sua real importância para os diversos agentes. O MEA contribuiu para uma compreensão mais ampla da grande escala de impactos antrópicos no seu ambiente, além de suas consequências econômicas e sociais atuais e futuras (BRONDÍZIO et al., 2010). Demonstrou, ainda, que aproximadamente 60% dos serviços ecossistêmicos que garantem o bem-estar humano estão degradados como resultado da contínua exploração e destruição do capital natural (TOSTO, 2015). Por fim, o Millennium Ecosystem 18 Assessment define serviços ecossistêmicos como “os benefícios que os agentes obtêm dos ecossistemas”. Diversos pesquisadores, desde então, adotaram a definição proposta pelo MEA; cite-se, dentre eles: Farley (2012); Bulte et al., (2008), Kosoy et al., (2008). Jack et al., (2008), Redford; Adams (2009), Corbera et al., (2009), Wendland et al., (2010), Corbera (2010), Costanza (2010), Shapiro (2010). É possível encontrar ainda, na literatura da área, diversas definições para o termo serviços ecossistêmicos (Tabela 1). Tabela 1: Definições de serviços ecossistêmicos. Definições de serviços ecossistêmicos Referências Benefícios para população humana decorrentes, direta ou indiretamente, das funções ecossistêmicas. Costanza et al., 1997 As condições e os processos através dos quais os ecossistemas naturais, e as espécies que o compõem, sustentam e beneficiam a vida humana. Daily, 1997 A capacidade dos processos naturais e seus componentes de fornecer produtos e serviços que satisfaçam as necessidades humanas, direta ou indiretamente. De Groot et al., 2002 Um conjunto de funções ecossistêmicas útil para os homens Kremen, 2005 Os benefícios que as pessoas obtêm dos ecossistemas MEA, 2005 Os componentes da natureza diretamente aproveitados, consumidos ou utilizados em função do bem-estar humano. Boyd and Banzhaf, 2007 Os aspectos dos ecossistemas utilizados, ativa ou passivamente, em prol do bem-estar humano. Fisher et al., 2009 Um grupo de bens e serviços gerados pelos ecossistemas que são importantes para o bem- estar humano. Nelson et al., 2009 Benefícios que os homens reconhecem como obtidos a partir dos ecossistemas, que suportam, direta ou indiretamente, sua sobrevivência e qualidade de vida. Harrington et al., 2010 Um termo coletivopara bens e serviços produzidos pelos ecossistemas, que beneficiam a espécie humana. Jenkins et al., 2010 Fonte: Munk (2015). Fisher et al., (2009) argumentam que, apesar das diferentes definições acerca do conceito serviços ecossistêmicos, de forma geral o conceito busca o entendimento da contribuição dos ecossistemas para o bem-estar da sociedade. Para Azevedo (2017), o pressuposto fundamental para a compreensão do conceito é identificar/estabelecer os serviços oferecidos, definir os benefícios obtidos a partir desses serviços e quem são os beneficiários, visto que sem beneficiário não há serviço. 19 No Brasil, o conceito “serviços ecossistêmicos” foi introduzido pela Lei N°13.798 de 2009 e regulamentada pelo Decreto N° 55.947, de 2010, o qual dispõe sobre a Política Estadual de Mudanças Climáticas. Em seu artigo 4°, a lei define os serviços ecossistêmicos como “os benefícios que as pessoas obtêm dos ecossistemas” (MUNK, 2015; AZEVEDO 2017). Uma discussão frequentemente abordada em relação a esse conceito é sua relação com o conceito de serviços ambientais. Os termos serviços ambientais e/ou serviços ecossistêmicos têm sido empregados como sinônimos na discussão a respeito do reconhecimento da contribuição ambiental à sociedade (BULTE et al., 2008; BARBOSA, 2015). Apesar de o termo serviço ecossistêmico ser muitas vezes utilizado como sinônimo do termo “serviço ambiental”, o Projeto de Lei sobre a Política Nacional de Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA, PL 792/2007) traz a diferenciação entre eles: serviços ecossistêmicos são definidos como “benefícios relevantes para a sociedade gerados pelos ecossistemas” e serviços ambientais são “aqueles que podem favorecer a manutenção, a recuperação ou o melhoramento desses benefícios” (MUNK, 2015; AZEVEDO, 2017). A título de exemplo, pode-se citar a manutenção e recuperação de matas ciliares (serviço ambiental); consequentemente, com a manutenção das matas, pode-se ter uma redução de processos erosivos, além de uma maior provisão de água, os quais beneficiam a sociedade por tornar tais recursos produtivos mais e melhor disponíveis (serviço ecossistêmico). Munk (2015) apresenta bem as classificações acerca dos serviços ecossistêmicos; segundo a pesquisadora, existem quatro sistemas de classificação de serviços ecossistêmicos realizados em nível internacional (tabela 2). O primeiro deles é o estabelecido pela MEA (Avaliação Ecossistêmica do Milênio) os outros dois são os estabelecidos pelo TEEB (The Economics of Ecosystems and Biodiversity) e pelo CICES (The Common International Classification of Ecosystem Services). Por fim, o quarto foi elaborado por De Groot et al., (2002). Tabela 2: Categoria serviços ecossistêmicos. Classificação De GROOT MEA TEEB CICES Categorias empregadas Produção Provisão Provisão Provisão Regulação Regulação Regulação Regulação e Manutenção Informação Culturais Culturais e Amenidades Culturais Habitat Suporte Habitat ---- Fonte: adaptado de Munk (2015). De acordo com a taxonomia da Avaliação do Milênio, os serviços ecossistêmicos também podem ser classificados em quatro categorias bem compreensíveis (MUNK, 2015; 20 THOMAZIELLO, 2016; AZEVEDO, 2017; MACEDO, 2017), a saber: suporte, provisão, regulação e cultural. Os serviços de suporte são aqueles que contribuem para a produção de outros serviços ecossistêmicos, como a ciclagem de nutrientes, a formação do solo e a dispersão de sementes. Os serviços de provisão são os produtos obtidos dos ecossistemas, como alimentos, água, fibras, recursos genéticos, informação e energia. Os serviços de regulação são os benefícios obtidos pela regulação de processos ecossistêmicos, como a regulação do clima, a regulação hídrica e o controle de doenças. Por fim, os serviços culturais são amenidades e questões culturais e religiosas (MEA, 2005). Já na classificação proposta pelo CICES (estrutura ligada ao Sistema de Contabilidade Econômico Ambiental da ONU), as categorias foram definidas em três grupos distintos: serviços de provisão, serviços de regulação e manutenção e serviços culturais. TEEB, assim como o MEA, optou por lançar mão de quatro categorias: serviços de provisão, serviços de regulação, serviços de habitat e serviços culturais e amenidades. Observe-se que o autor não considera os serviços de suporte como a categorização do MEA. Por outro lado, adiciona a categoria serviços de habitat, ressaltando a importância dos ecossistemas em prover habitat para as espécies e promover a proteção do pool genético (MUNK, 2015). Por fim, De Groot et al., (2002) elabora, uma categorização dos serviços ecossistêmicos baseada em suas funções, divididas em quatro grupos, a fim de que pudessem ser comparadas entre si: função de regulação (ex. regulação do clima); de habitat (ex. refúgios e estuários); de produção (ex. alimentos) e de informação (ex. aspectos culturais). Fisher et al., (2009) destaca que a classificação, assim como a definição dos serviços ecossistêmicos, deve ser adotada de acordo com o contexto. Desta forma, o presente trabalho fará uso da classificação proposta pelo MEA, sendo essa a categorização apresentada pela ANA, em seu material de apoio acerca da temática Pagamento por Serviços Ambientais. Segundo TEEB, (2010) e Munik, (2015), a incorporação de avaliações acerca dos serviços ecossistêmicos na tomada de decisão pode reduzir custos futuros, melhorar a qualidade de vida da população e dos ecossistemas, garantir a perpetuação dos meios de subsistência e auxiliar no combate à pobreza, ao revelar a distribuição de recursos e serviços essenciais e escassos. A análise dos serviços ecossistêmicos também pode auxiliar na identificação daqueles que arcam com o custo e aqueles que auferem benefícios. Sendo assim, os planos de desenvolvimento e estudos de impacto ambiental deveriam incluí-los Balvanera et al., (2012), em seu estado da arte acerca dos serviços ecossistêmicos na America Latina, afirma que essa temática foi introduzida no Brasil no contexto do desmatamento ocasionado pela expansão da agricultura na Amazônia. Desta forma, como o 21 cenário analisado neste trabalho compreende o panorama agropecuário, é imprescindível elencar a relação entre atividades agropecuárias e os serviços ecossistêmicos. A demanda por atividades agropecuárias mais sustentáveis cresce em todas as regiões do planeta. O embate é centrado entre aqueles que mantêm práticas convencionais e os que buscam iniciativas e mudanças concretas, com o objetivo de reduzir as externalidades negativas provocadas nas diversas cadeias produtivas que envolvem o agronegócio (FERRAZ, 2003; PALUDO; COSTABEBER, 2012). Atualmente, as mudanças no uso da terra atingiram escalas planetárias: pelo menos 75% da superfície da terra (sem gelo) já foi convertida, principalmente, em pastagens e/ou agricultura (ELLIS E RAMANKUTTY, 2008). Foley et al., (2005) afirmam que as ameaças envolvidas na conversão da terra são consideráveis, uma vez que a biodiversidade gera condições, funções e serviços ecossistêmicos essenciais à agricultura (como a reciclagem de nutrientes, o controle de pragas, a polinização e a regulação dos fluxos de água). Power (2010) afirma que os ecossistemas agrícolas, por sua vez, fornecem alimento, forragem, bioenergia, produtos farmacêuticos e outras benesses aos seres humanos, além de colaborar para o bem-estar geral da sociedade. Segundo o autor, apesar da dependência de serviços ecossistêmicos (incluindo polinização, controle biológico de pragas, manutenção da estrutura e fertilidade do solo, ciclagem de nutrientes e serviços hidrológicos), esses sistemas têm atuado em antagonismo (figura 1), gerando desserviços devido ao manejo inadequado promovido pelas ações antrópicas nos agroecossitemas. Ao contrário do que muitos acreditam, dependendo das práticas de manejo, atividades agropecuáriastambém podem ser responsáveis pela perda de habitat de vida selvagem, pelo escoamento de nutrientes, pela sedimentação de cursos de água, pelas emissões de gases do efeito estufa e pelo envenenamento por pesticidas de seres humanos e espécies não-alvo. Mostra-se altamente recomendada, portanto, a análise das compensações dos desserviços pelos benefícios advindos da preservação dos ecossistemas, bem como sua avaliação em termos de escala espacial, temporal e de reversibilidade. 22 Figura 1: Impactos do manejo agrícola e do manejo paisagístico no fluxo de serviços e desserviços ecossistêmicos para os agroecossistemas. Fonte: EMBRAPA. Portanto, entender como esses sistemas funcionam e interagem entre si é de vital importância para o agronegócio, que utiliza do capital natural como base para seu sistema de produção e depende dos serviços ecossistêmicos. Destarte, a perda desse capital tem consequências diretas nas atividades agropecuárias, como o aumento dos custos de produção ou a quebra de safras (PARRON et al.,2015). SPVS (2016) ressalta que é perceptível a dependência entre cadeias de suprimentos agrícolas e serviços ecossistêmicos em toda a cadeia de valor. Vários são os indicadores ligados à sustentabilidade que podem pôr em risco o crescimento das atividades agropecuárias no Brasil: desde a gestão do uso do solo e questões hídricas até mudanças climáticas. Uma vez, quando se fala em mudanças climáticas, logo se pensa mais na questão da temperatura do que no regime hídrico, contudo o ciclo hidrológico bem como sua interação como o meio e de extrema importância, cita - se a exemplo a formação da chuva que é um serviço ecossistêmico (MACHADO, 2010). Dadas as projeções das variações climáticas, vários são os impactos econômicos, sociais e ambientais esperados. Os impactos (figura 02) permeiam desde a extinção de algumas culturas 23 até a disponibilidade de água nas principais bacias hidrográficas brasileiras, além de uma mudança em relação ao uso do solo (MOTTA, 2011). Assim, o planejamento de políticas ambientais envolve a interdependência de muitos segmentos da sociedade, abrangendo agências governamentais, indústria privada, comunidade científica, ambientalista e setores econômicos, como o agronegócio. Figura 2: Uso do solo em cada região: tendências projetadas para estabelecimentos rurais. Fonte: MARGULIS (2011). A agricultura é a principal atividade que modifica paisagens, habitats e funções ecossistêmicas em grande escala. Historicamente, a expansão e intensificação das atividades agrícolas impactaram a biodiversidade nativa, a disponibilidade e qualidade da água e a resiliência de sistemas ecológicos (FÓRUM MUNDIAL DA ÁGUA, 2018). Assim, mecanismos de gestão para integrar práticas rentáveis de produção agrícola de pequena e larga escala com funções ecossistêmicas relacionadas à água a melhor gestão de bacias hidrográficas, 24 uso e ocupação do solo são extremamente necessários no atual cenário de escassez de recursos naturais (CNA, 2018), portanto, a gestão adequada dos recursos naturais no setor representa oportunidades eficazes para reduzir esses riscos. A expansão econômica, independentemente da cadeia de produção, deve encontrar um ponto de equilíbrio efetivo, não podendo se distanciar daquilo que hoje se convencionou chamar de “desenvolvimento sustentável” (TAMARINDO, 2014). É preciso reconhecer que a questão da preservação do meio ambiente vai muito além de um discurso ambiental: tem a ver com a manutenção dos ecossistemas e, consequentemente, com os benefícios que são providos a nós. Sem conscientização ativa da sociedade, do governo e das pessoas, individualmente, em reconhecer sua relação de dependência à natureza em longo prazo o preço a ser pago pelas consequências da degradação da mesma pode ser bem alto. Bacia hidrográfica e o Serviço de Provisão Hidrológico A água é constituída como um dos elementos mais importantes para a humanidade, pois serve como fonte de subsistência, contribui para o bem-estar humano, tanto de forma direta como indireta. De acordo com Andrade (2009) é classificada como um serviços de provisão, os serviços de provisão incluem os produtos obtidos dos ecossistemas, tais como alimentos, madeira para combustível e outros materiais que servem como fonte de energia, recursos genéticos, produtos bioquímicos, medicinais, e água. Sua sustentabilidade não deve ser medida apenas em termos de fluxos, isto é, quantidade de produtos obtidos em determinado período. Deve-se proceder a uma análise que considere a qualidade e o estado do estoque do capital natural que serve como base para sua geração, atentando para restrições quanto à sustentabilidade ecológica. Ou seja, observar os limites de sua demanda pela capacidade de suporte do ambiente natural (física, química e biologicamente), de maneira que a intervenção antrópica não comprometa irreversivelmente a integridade e o funcionamento apropriado dos processos naturais (ANDRADE, 2009). Desta forma, gerenciar esse recurso e de extrema importância, porque este é escasso. Escassez, por sua vez, significa que a sociedade tem esse recurso limitado e, portanto, não pode produzir todos os bens e serviços que as pessoas desejam ter (CALLAN & THOMAS, 2013). Um importante objetivo e entender a relação critica entre as atividades econômicas e os recursos hídricos e usar esse conhecimento para tomar decisões melhores e mais inteligentes. 25 É claro que sempre haverá trade-offs 1exatamente o que a teoria econômica prevê. Além disso, a sociedade necessita compreender que não se pode esperar por uma água plenamente pura ou em abundância para os diversos tipos de consumo, mas também não se pode continuar o desenvolvimento econômico sem a devida preocupação com o futuro (CALLAN & THOMAS, 2013). Alterações relativas à disponibilidade hídrica superficial e subterrânea tem implicações importantes sobre a qualidade de vida, sobre a economia e os ecossistemas (MARCOVITCH, 2010). Assim, a água vem se tornando um recurso geopolítico estratégico em função das utilidades vitais, motivo atribuído ao aumento da degradação ambiental em paralelo com a sua crescente demanda para os diversos usos (JARDIM, 2011). Elemento importante na disponibilidade hídrica está relacionado ao ciclo hidrológico, caracterizado como um fenômeno natural de circulação fechada da água entre a superfície terrestre e a atmosfera, dirigido pelo Sol, pela gravidade e pela rotação terrestre (SCHIAVETTI, 2012). Compõem o ciclo hidrológico: a evapotranspiração, a condensação, a precipitação, o escoamento e a infiltração (figura 03). Figura 3: Compõem o ciclo hidrológico: a evapotranspiração, a condensação, a precipitação, o escoamento e a infiltração. Fonte: Schiavetti (2012). De acordo com Miller Jr (2008), a água doce representa apenas 2,6% da água existente no planeta, sendo o restante (97,4%) referente aos oceanos e lagos salinos. Dos 2,6% de água doce, apenas 0,014% é a água doce acessível. 1 Tradeoff: uma situação de escolha conflitante, isto é, quando uma ação econômica que visa à resolução de determinado problema acarreta outros. 26 O Brasil concentra cerca de 12% das reservas de água do planeta (Senra, 2001), sendo que mais de 73% deste total encontra-se na bacia Amazônica, que é habitada por menos de 5% da população brasileira (LIMA, 1999). A Região Centro-Oeste em particular é a segunda mais rica em disponibilidade de recursos hídricos, com 15%, sendo que o estado de Goiás é contemplado com cerca de 5% de toda a água doce disponível para uso no Brasil (ALMEIDA, 2006). Dentro do escopo da análise do ciclo hidrológico na superfície terrestre, apresenta-se como elemento fundamental o estudo da bacia hidrográfica, entendida como uma área de terra drenada por um determinadocurso d’água (VALENTE, 2005). Trata-se de uma delimitação no espaço geográfico pelo divisor de água, representado pela linha que une pontos de cotas mais elevadas, fazendo com que a água da chuva, ao atingir a superfície do solo, tenha seu destino dirigido no sentido de um ou outro córrego ou rio (VALENTE, 2005). Segundo a ANA (2016), “bacia hidrográfica é uma área de captação natural da água de precipitação que converge os escoamentos para um único ponto de saída; este ponto de saída é denominado exutório”. Assim, a precipitação que cai sobre a bacia hidrográfica atinge as vertentes e infiltra-se no solo até que atinja sua saturação, gerando, assim, o escoamento superficial (figura 04) das vertentes para os cursos d’água (rede de drenagem) – que transportam a água até o seu exutório ou seção de saída (SCHIAVETTI, 2012). 27 Figura 4: A bacia hidrográfica como unidade, sistema que compreende um volume de materiais, sólidos e líquidos. Fonte: Modificado de Dobson (1999). Já infiltração é o processo de passagem da água de superfície para o interior do solo. A água penetra por gravidade no solo até atingir as zonas saturadas, as quais constituem o reservatório de água subterrânea, também denominados de lençóis aquíferos ou simplesmente aquíferos (PIRES, 2009). Os afloramentos destes em superfície resultam em nascentes, originando assim os cursos d’água. As maiores taxas de recarga ocorrem nas regiões planas e bem arborizadas (NOGUEIRA, 2017). Pinto et al., (2004) afirma que os fatores que influenciam o armazenamento da água subterrânea são: a declividade, o tipo de solo e o uso da terra; por conseguinte, atuam no abastecimento do lençol freático para que possibilite a existência de rios e córregos perenes durante a estiagem. Carneiro (2010) afirma que devido à falta de planejamento do uso e ocupação do solo urbano e rural, observa-se, comumente, uma série de problemas relacionados à urbanização e 28 ocupação desses solos que direta ou indiretamente causam problemas ao gerenciamento de bacias hidrográficas (e, por tabela, interferem na disponibilidade e na qualidade da água). De acordo com o relatório de conjuntura dos recursos hídricos no Brasil, da ANA (2015), a irrigação é a atividade responsável por 72% do consumo de água no Brasil. Em Goiás, a atividade agrícola utiliza cerca de 84% de toda a água consumida, seguida por abastecimento humano, 9%, e indústria, com 7% (ALMEIDA, 2006). Mesmo com a reconhecida importância ecológica, econômica e social, esse recurso tem se tornado cada vez mais escasso nos últimos anos. Parte desse problema se deve à falta de planejamento e gestão das bacias hidrográficas, materializando-se no uso indiscriminado dos recursos hídricos, no desmatamento de nascentes e na poluição dos rios e lagos (TUNDISI, 2005). Conforme previsões do relatório do Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC, 2014), a provisão de água apresenta alto risco de diminuição em mais da metade do percentual atual até o ano de 2100, com pouquíssimas possibilidades de ações mitigadoras. Essa diminuição é motivada, principalmente, pelas alterações nas condições climáticas relacionadas aos longos períodos de estiagem e ao desperdício da água (MONTALVÃO, 2016). Neste sentido, dada a importância da água, que gera condições para a sobrevivência e conservação dos organismos, bem como para o crescimento e desenvolvimento de diferentes habitats na Terra, estudos sobre a variação hídrica devem ser prioritários na investigação da cadeia de alterações e impactos da mudança climática sobre os diversos setores. Com o objetivo de analisar a disponibilidade e qualidade hídrica, assim como os fatores que podem influenciar no meio são de extrema importância. Se tornando uma importante fonte de dados para a realidade local, principalmente dos pontos de vista econômico, social e ambiental. Cite-se, a exemplo, o trabalho em questão ao qual analisamos a produção de sedimentos na bacia hidrográfica do Ribeirão João Leite, ressaltando que os esforços para a preservação são compartilhados por diversos beneficiários direta e indiretamente. 29 Bacia hidrográfica e o Serviço de Suporte do Solo O solo pode ser classificado como um serviço ecossistêmico de suporte, que são aqueles necessários para a produção de todos os outros serviços ecossistêmicos. Sendo incluso nessa categoria a formação de solo, ciclagem de nutrientes (MEA, 2005). Já o controle de erosão e sedimentação e classificado como serviços ecossistêmicos de regulação (ALARSA,2018). O solo é responsável por diversos processos ambientais, que vão desde a ciclagem e o armazenamento de nutrientes necessários ao desenvolvimento das plantas, até a reserva de água para o abastecimento do lençol freático e de aquíferos (EMBRAPA, 2017). Porém, ao longo do tempo esse rico material vem sendo degradado, levando à perda de nutrientes e da biodiversidade. Conforme dados da FAO, devido à erosão, a cada ano se perdem cerca de 20 bilhões de toneladas de solos no mundo, o que equivale a mais de três toneladas de solo por pessoa (EMBRAPA, 2017). Segundo Hernani et al., (2002) as perdas anuais de solo em áreas de pastagens e lavouras estão na ordem de 822,7 milhões de toneladas, o que resultaria em uma perda total para as propriedades rurais de aproximadamente US$ 2,93 bilhões por ano, gerando um prejuízo aproximado de US$ 4,24 bilhões por ano à economia do país. As altas taxas de erosão no Brasil devem-se, principalmente, aos eventos de desmatamento de encostas/margens de rios, às queimadas e ao uso inadequado de maquinários e implementos agrícolas, além da falta de utilização de práticas conservacionistas na agricultura. Práticas que, ao longo do tempo, constituem um dos maiores desafios da agricultura, uma vez que a perda de solo afeta a qualidade e o volume das água devido à sedimentação e ao assoreamento (ANA, 2013). O termo erosão, proveniente do latim erodere, pode ser definido como “um conjunto de processos pelos quais os materiais terrosos e rochosos da crosta terrestre são desagregados, desgastados ou dissolvidos e transportados pela ação dos agentes erosivos” (IPT, 1986; (CRUVINEL, 2016; DINIZ, 2017). Processos erosivos, por sua vez, não acontecem de forma constante em todos os solos, pois os atributos biológicos, físicos e químicos que interferem no processo são particularidades de cada solo (CRUVINEL, 2016). Algumas forças ativas são predominantes na formação de processos erosivos; entre elas podemos citar: intensidade da chuva, declividade, comprimento de rampa do terreno e permeabilidade. Portanto, a erosão é um processo complexo que envolve vários fatores, de forma e magnitudes variáveis, conforme o local onde ocorre (RETZLAF, 2008; VALLE JUNIOR, 2008; CARVALHO et al., 2009, CRUVINEL, 2016). 30 Trata-se, pois, de um processo que ocorre por intermédio de diversos agentes, que podem ser naturais (clima, relevo, geologia e vegetação) ou podem ocorrer por ações antrópicas, políticas, econômicas, sociais, tecnológicos e institucionais (MONEGATI, 1991, SHIFERAW, 2011). Em relação à classificação (figura 05), processos erosivos podem ser classificados em erosão hídrica (pluvial, fluvial, de subsuperfície e marinha), eólica e glacial (JESUS, 2013). Em regiões com clima tropical, como o Brasil, onde os totais pluviométricos são bem mais elevados do que em outras regiões do mundo, os processos erosivos causados pela água da chuva (fator climático) têm abrangência em quase toda a superfície terrestre (AZEVEDO, 2017). Além disso, em muitas dessas áreas, as chuvas concentram-se em certas estações do ano, o que agrava ainda mais a erosão (GUERRA et al., 1999). Jesus (2013) cita que a erosão hídrica, talvez, não seja o tipo de erosão mais comum, mas, com certeza, é um dos mais (senão o mais) impactante. Figura 5: Classificaçãodos processos erosivos. Fonte: Jesus (2013). Nesse sentido, o aumento progressivo das erosões às margens de recursos hídricos pode causar impactos negativos na qualidade de água de uma região. Quanto aos impactos, tem-se o assoreamento de riachos, rios, e reservatórios, o aumento da concentração de nutrientes ou 31 elementos tóxicos nas água (vindos por meio dos sedimentos transportados ou mesmo diluídos na água de escoamento) e a deterioração da agricultura. Por conseguinte, isso resultará na diminuição da qualidade da água – seja para consumo humano/animal, para a irrigação ou mesmo para o uso na geração de energia elétrica –, além do aumento da escassez em períodos de estiagem. (KHWLIE et al., 2002; CHAVES et al., 2012; FROTA & NAPPO, 2012 e CRUVINEL, 2016). Os sedimentos, por sua vez, são componentes naturais integrantes dos cursos hídricos, mesmo quando em estado de equilíbrio e livre de interferências antrópicas, uma vez que estão associados intimamente aos fenômenos erosivos que ocorrem de forma natural (OLIVEIRA, 2013). Referem-se a um material orgânico ou mineral que, originado da erosão por seus diversos agentes (escoamento superficial, impacto da chuva entre outros) em porções continentais da bacia hidrográfica, atingem os cursos hídricos e neles são transportados em suspensão ao longo do fluxo hídrico, podendo ser depositados ao longo do leito do curso a depender das características sedimentológicas e da dinâmica hídrica (OLIVEIRA, 2013). Todavia, a depender da quantidade e da qualidade dos sedimentos aportados na bacia, haverá a possibilidade de manifestação de diversos fenômenos prejudiciais à sua qualidade (SANTOS, 2010). Keller (1996) afirma que produção de sedimento está relacionada ao tamanho da bacia, o que significa que a produção de sedimentos por unidade de área é inversamente proporcional ao tamanho da bacia2. Por fim, em estudos sobre produção de sedimentos em reservatórios é muito importante o conhecimento sobre descarga sólida. Sendo necessário para análises de degradação de uma bacia, verificação da qualidade d’água para abastecimento, estudos de assoreamento de rios e reservatórios, estudos de assoreamento na posição de obras fluviais, bem como para diversas outras pesquisas ambientais (CARVALHO, 2000). Sendo um importante mecanismo na tomada de decisões quanto ao planejamento de atividades da bacia, pois a quantidade de sedimento está diretamente ligada ao uso da terra. O manejo de solo altera as condições de infiltração de água no solo (VERSTRAETEN et al., 2006), justificando a necessidade de implementação de práticas conservacionistas que visem ao controle de erosão, por meio do aumento da cobertura do solo, da infiltração e do controle do escoamento superficial. 2 Vale sublinhar, aqui, que o sedimento tende a se depositar ou se armazenar em porções da bacia antes de alcançar os cursos hídricos. 32 3.2 Valoração de Serviços Ambientais Conforme Romero (2000), valoração ambiental pode ser definida como um conjunto de técnicas e métodos que permitem medir as expectativas de benefícios e custos derivados de algumas ações, tais como: a) uso de um ativo ambiental; b) realização de melhora ambiental; c) geração de um dano ambiental. Fonseca et al., (2013), afirma que, valorar economicamente um recurso ambiental consiste em determinar quanto melhor, ou pior, estará o bem-estar da sociedade devido às mudanças na quantidade de bens e serviços ambientais (seja na apropriação por uso ou não). A importância da valoração ambiental está no fato de criar um valor de referência que indique uma sinalização de mercado, possibilitando, assim, o uso "racional" e sustentável dos recursos ambientais. Determinar o valor econômico de um recurso ambiental é estimar o valor monetário deste em relação aos outros bens e serviços disponíveis na economia (FURIO, 2006). Existem diversos desafios a serem vencidos quando se fala de valoração ambiental, como a erradicação do desconhecimento da “consciência verde” e o reconhecimento da importância da gestão dos recursos naturais (tanto pela sociedade quanto pelo mercado). O mercado, por sua vez, usufrui dos recursos naturais, porém, na grande maioria das vezes, não reconhece ou valoriza sua importância (FERREIRA, 2004). O valor de um bem ou serviço ambiental pode ser entendido como uma expressão monetária dos benefícios obtidos através de sua provisão – do ponto de vista pessoal de cada indivíduo. Tais benefícios poderão ser advindos do uso direto ou do uso indireto dos bens e serviços (PEARCE & TURNER, 1990). Motta (1998) ressalta que o valor econômico dos recursos ambientais (VERA) pode ser expresso da seguinte forma (tabela 03): VUD = Valor de Uso Direto; VUI = Valor de Uso Indireto VO = Valor de Opção; VE = Valor de Existência; Equação 1 𝑉𝐸𝑅𝐴 = 𝑉𝑈𝐷 + 𝑉𝑈𝐼 + 𝑉𝑂 + 𝑉𝐸 33 Tabela 3: Taxonomia geral do valor econômico do recurso ambiental. Valor Econômico do Recurso Ambiental Valor de Uso Valor de Não-Uso Valor de Uso Direto - (VUD) Valor de Uso Indireto - (VUI) Valor de Opção - (VO) Valor de Existência - (VE) Referente ao valor que os indivíduos atribuem a um recurso ambiental de que se utilizam diretamente. Aquele que os indivíduos atribuem a um recurso ambiental quando o benefício do seu uso deriva de funções ecossistêmicas. Valor referente ao que o indivíduo atribui em usos diretos e indiretos de recursos, que podem ter sua preservação ameaçada em futuro próximo. O valor de existência está dissociado de uso (embora represente consumo ambiental). Fonte: Adaptado Manual para Valoração Econômica de Recursos Ambientais (1998). É importante ressaltar que um tipo de uso pode excluir outro tipo de uso do recurso ambiental; por exemplo: a decisão da utilização de uma área para fins agrícolas ao invés da conservação da cobertura vegetal ou da área de floresta. Assim, o primeiro passo na determinação do VERA é identificar os conflitos de uso. O segundo passo é a determinação destes valores (MOTTA, 1998). Assim, cada método de valoração apresenta limitações na cobertura de valores, a qual estará quase sempre associada ao grau de sofisticação metodológica, à base de dados exigidos, às hipóteses sobre comportamento do indivíduo consumidor e aos efeitos do consumo ambiental nos diversos setores da economia (ROMERO, 2000). Ou seja: cada método é adotado levando-se em conta o objetivo da valoração e depende das hipóteses assumidas, da disponibilidade de dados e do conhecimento da dinâmica ecológica do objeto que está sendo valorado. A maioria dos ativos ambientais não tem substitutos e a inexistência de um indicador de “preços” para esses serviços distorce a percepção dos agentes econômicos, induzindo os mercados a falhar na sua alocação eficiente evidenciando uma “divergência entre os custos privados e sociais.” (MARQUES E COMUNE, 2003). Desta forma, num cuidado em tentar estimar “preços” para os recursos ambientais, a fim de fornecer subsídios técnicos para sua exploração racional, insere-se os métodos (ou técnicas) de valoração econômica ambiental, divididos em métodos diretos e indiretos (tabela 4) (MARQUES & COMUNE, 2003; MERICO, 1996). Maia et al., (2004) explica que os métodos diretos são aqueles que procuram captar as preferências das pessoas utilizando-se de mercados de bens complementares ou hipotéticos para obter a disposição a pagar (DAP) dos indivíduos pelo bem ou serviço ambiental. Já os métodos 34 indiretos procuram obter o valor do recurso por meio de uma função de produção, relacionando o impacto das alterações ambientais a produtos com preços no mercado. Tabela 4: Conceituação métodos de valoração diretos/indiretos. Método Métodos Diretos Método devaloração contingente (MVC) É aquele em que as pessoas têm diferentes graus de preferência ou gostos por diferentes bens ou serviços. A operacionalização do MVC acontece a partir da aplicação de questionários que objetivam saber das pessoas os valores que estão dispostas a pagar ou aceitar como compensação (PEARCE, 1993). A grande vantagem do MVC, em relação a qualquer outro método de valoração, é que ele pode ser aplicado em um espectro de bens ambientais mais amplos. A grande crítica, entretanto, é a sua limitação em captar valores ambientais que indivíduos não entendem ou mesmo desconhecem. Método de preços hedônicos (MPH) É um dos métodos de valoração econômicos mais antigos e um dos mais utilizados. O método de preços hedônicos estabelece uma relação entre os tributos de um produto e seu preço de mercado. Pode ser aplicado a qualquer tipo de mercadoria, embora seu uso seja mais frequente em preços de propriedades (DaMotta 1998). Método dos custos de viagem (MCV) O Método dos custos de viagem estabelece uma função relacionando a taxa de visitação às variáveis de custo de viagem, tempo, taxa de entrada, característica socioeconômicas do visitante e outras variáveis que possam explicar a visita ao patrimônio natural. Os dados são obtidos por meio de questionários aplicados a uma amostra da população no local de visitação. A aplicação deste método geralmente é restrita à valoração de características peculiares aos locais (geralmente lugares de recreação) e à valoração do tempo (PEARCE, 1993). DaMotta (1998) afirma, também, que além de ser uma das mais antigas metodologias de valoração econômica, o MCV é bastante utilizado para a valoração de patrimônios naturais de visitação pública. O valor do recurso ambiental é determinado pelos gastos dos visitantes para se deslocar ao patrimônio, incluindo transporte, tempo de viagem, taxa de entrada e outros gastos complementares. Método Métodos Indiretos Método de produtividade marginal (MPM) O método de produtividade marginal é um método que trata a qualidade ambiental como um fator de produção. Assim, “mudanças na qualidade ambiental levam a mudanças na produtividade e custos de produção, os quais levam, por sua vez, a mudanças nos preços e níveis de produção, que podem ser observados e mensurados” (HUFSCHMIDT et al., 1983). Conforme DaMotta (1998), sua função é mensurar o impacto no sistema produtivo. Assim, é fornecida uma variação marginal na provisão do bem ou serviço ambiental, e, a partir desta variação, estimado o valor econômico de uso do recurso ambiental. Método de mercado de bens substitutos (MBS) A metodologia de mercado de bens substitutos parte do princípio de que a perda de qualidade ou escassez do bem ou serviço ambiental aumenta a procura por substitutos na tentativa de manter o mesmo nível de bem-estar da população (DAMOTTA, 1998). Com base em mercados de bens substitutos podemos generalizar quatro métodos que são normalmente de fácil aplicação: Custos Evitados, Custos de Controle, Custo de Reposição e Custos de Oportunidade. Método de custos evitados (MCE) O Método de custos evitados traz a ideia subjacente de que gastos em produtos substitutos ou complementares para alguma característica ambiental podem ser utilizados como aproximações para mensurar monetariamente a “percepção dos indivíduos” das mudanças nessa característica ambiental (PEARCE, 1993). Os custos evitados são muito utilizados em estudos de mortalidade e morbidade humana. O método estima o valor de um recurso ambiental pelos gastos com atividades defensivas substitutas ou complementares, que podem ser consideradas uma aproximação monetária sobre as mudanças destes atributos ambientais (DAMOTTA, 1998). Método de custos de controle (MCC) Custos de controle são os gastos necessários para evitar a variação do bem ambiental e garantir a qualidade dos benefícios gerados à população. Cite-se como exemplos o tratamento de esgoto para evitar a poluição dos rios e um sistema de controle de emissão de poluentes de uma indústria para evitar a contaminação da atmosfera (DAMOTTA, 1998). De acordo com Carvalho (2005), a técnica de custo de controle provê uma informação direta do valor social de se reduzir as emissões por duas razões. 35 Método custo de reposição (MCR) Método custo de reposição é aquele que apresenta uma das ideias intuitivas mais básicas quando se pensa em prejuízo: reparação por um dano provocado (PEARCE, 1993). Assim, o MCR se baseia no custo de reposição ou restauração de um bem danificado e entende esse custo como uma medida do seu benefício. No custo de reposição, a estimativa dos benefícios gerados por um recurso ambiental será dada pelos gastos necessários para reposição ou reparação após o mesmo ser danificado (PEARCE, 1993). Fonte: PEARCE, 1993, DAMOTTA, 1998 e CARVALHO, 2005. 3.3 Pagamento por Serviços Ambientais Segundo Peixoto (2011), os serviços prestados pelos ecossistemas são essenciais não só para a sobrevivência humana, mas, também, para a redução da pobreza. A espécie humana é parte dos ecossistemas, com os quais interage, mas também é fundamentalmente dependente do fluxo de serviços ambientais. Conceitualmente, Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) são transações econômicas voluntárias, em decorrência de atividades que promovam ou incentivem a preservação e a conservação dos serviços providos pelos ecossistemas (os chamados serviços ecossistêmicos) (BARBOSA, 2015). Wunder (2005) apresenta a definição – mundialmente reconhecida – de pagamentos por serviços ambientais, tais como: 1. uma transação voluntária, na qual 2. um serviço ambiental bem definido 3. está sendo “comprado” por um (no mínimo) comprador do serviço 4. de um (no mínimo) provedor do serviço ambiental 5. se, e somente se, o provedor do serviço assegura a prestação do serviço (condicionalidade). Barbosa (2015) ressalta que, conforme propõe a economia neoclássica, esta definição apresenta elementos que permitem a constituição de mercados para os serviços ambientais. Têm-se a indicação de agentes que ofertam e outros que demandam um determinado serviço ambiental. Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), pode ser classificado como método de custos evitados (MCE), que por sua vez, é um método de valoração indireta, ao qual estima o valor do bem, serviço ou ativo ambiental levando em consideração comportamentos defensivos que possam minimizar ou evitar os efeitos deletérios da degradação ambiental (CASTRO, 2017). Segundo, Maia (2002) “o valor de um recurso ambiental através dos gastos com 36 atividades defensivas substitutas ou complementares, podem ser consideradas uma aproximação monetária sobre as mudanças destes atributos ambientais”. Neste contexto, a utilização de preços de mercado garante uma medida mais objetiva do valor econômico do recurso ambiental. Um exemplo concreto e a estimativa de valores a serem pagos a produtores rurais em esquemas de pagamentos por serviços ambientais (PSA). No Brasil, a discussão acerca do PSA teve foco a partir do lançamento do Programa Proambiente, no ano de 2000, que constituiu uma experiência inicial do PSA no país. Entretanto, tal experiência trouxe à tona uma gama de desafios a serem superados (ANA, 2016). Posteriormente, a partir de 2001, a Agência Nacional das Águas (ANA) desenvolveu o Programa Produtor de Águas, a primeira iniciativa de PSA Hídrico no Brasil. De acordo com a ANA, o esquema de PSA considera que aqueles que se beneficiam de algum serviço ambiental devem, em algum momento, realizar pagamentos para o proprietário ou gestor da área em questão. Ou seja: o beneficiário oferece uma contrapartida visando o fluxo contínuo e a melhoria do serviço demandado (ANA, 2016). O pagamento, por sua vez, pode ser visto como uma fonte adicional de renda, sendo uma forma de ressarcir