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LINGUÍSTICA APLICADA AO ENSINO DO INGLÊS Aline Gomes Vidal A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Estimar a importância do pensamento crítico para a aquisição de segunda língua. Analisar a importância da motivação no processo de aquisição de segunda língua. Identificar os problemas atuais em relação à aquisição de segunda língua. Introdução A aquisição de um idioma estrangeiro não é mais opcional: atualmente, ela faz parte da Base Nacional Curricular Comum (BNCC) e tem sido alvo de muitos estudos. Especialmente na área de Linguística Aplicada, muitos pesquisadores têm desenvolvido trabalhos que visam refletir sobre as formas mais apropriadas de se ensinar uma língua estrangeira (LE) — o inglês, em particular. O professor de LE, hoje, enfrenta muitas dificuldades para desenvolver seu trabalho. Há muitas queixas quanto ao engajamento dos alunos em sala de aula, pois muitos estão ali contra a própria vontade e não veem, no momento, muita utilidade naquilo que estão aprendendo. Neste capítulo, você vai estudar duas questões que podem ajudar o professor de LE a pensar sua prática educacional e a tentar superar os obstáculos que encontra em seu cotidiano. Primeiramente, você enten- derá como o desenvolvimento do pensamento crítico é fundamental no processo de ensino e aprendizagem da língua inglesa, pois o uso da língua não pode ser visto de forma ingênua, é preciso ter um olhar questionador a seu respeito sempre. Em segundo lugar, falaremos sobre a importância da motivação no ensino de LE, procurando entender o porquê da falta de interesse dos alunos e buscando possíveis soluções para esse problema. Letramento crítico e o ensino de língua inglesa No Brasil, a ideia de letramento passou a fazer parte dos debates acadêmicos de maneira mais signifi cativa a partir dos anos 1980. Essa noção surgiu para problematizar a questão da aquisição da linguagem escrita para além da identifi cação do código linguístico. O ato de escrever passa a ser visto, então, como uma prática social, de modo que o contexto sociocultural em que o aluno está inserido deveria ser levado em consideração, a fi m de atribuir signifi cado ao processo de aprendizagem. Além disso, o desenvolvimento das novas tecnologias e sua inserção na vida cotidiana moderna trouxe novos desafios para a área da educação. Surgiram novas formas de interação, diferentes gêneros textuais e, com isso, novas formas de pensar o letramento. Um dos meios utilizados para essa reflexão é o debate em torno do conceito de multimodalidade. Sobre essa questão, Maia et al. (2016, p. 99-100) afirmam: Essa multimodalidade, conforme Rojo (2009), deve ser compreendida em três dimensões: os multiletramentos, que abriam espaço para a valorização dos letramentos das culturas locais, e não apenas dos letramentos das cultu- ras hegemônicas, que são universalmente priorizados pelas instituições; os letramentos multissemióticos, evidenciando-se a multiplicidade de signos presentes nos usos da linguagem desenvolvidos a partir da emergência dos gêneros digitais, como e-mail, mensagens de redes sociais, blogs, etc. O uso desses novos signos (as cores, as imagens, os sons, o design) instaura um hibridismo no que se refere às modalidades de linguagem que se articulam na construção de sentidos para os textos pelos participantes dos eventos de letramento. Uma terceira dimensão diz respeito aos letramentos críticos, que levam em conta a capacidade de situar o texto no mundo social, percebendo os “projetos políticos, histórias e desejos” (ROJO, 2009, p.108) sugeridos nos significados que o texto pode assumir. Essa capacidade está relacionada ao desenvolvimento de uma atitude ética que permite aos indivíduos serem capazes de escolher os discursos com os quais se identificam e aqueles dis- cursos a serem questionados. Dessa forma, passa-se a entender o letramento não como um processo neutro, mas como um processo que deve levar à construção crítica de sen- tidos. Isso porque o uso da linguagem nunca é ingênuo, existe sempre uma intencionalidade. Sendo assim, os autores afirmam que o ensino não pode se reduzir à tentativa de transmissão de um código. Aspectos descritos por Maia et al. (2016) como multimodalidades seriam relevantes, portanto, para a construção de uma aprendizagem significativa. As multimodalidades levariam em consideração aspectos que fazem parte A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança2 da constituição da identidade dos aprendizes, tais como elementos culturais, as formas de interação social, os contextos comunicativos, além de projetos e pensamentos ideológicos. Essas questões precisam de reflexão e contribuem para a formação do cidadão crítico; assim, o letramento não seria um aprendizado vazio, mas capacitaria o aluno a fazer uma leitura de mundo. Dessa forma, não haveria um letramento a ser desenvolvido, mas diferentes letramentos possíveis a partir das realidades que são encontradas nas salas de aula. O letramento crítico é um processo de aprendizagem que envolve a análise e a crítica dos conteúdos estudados. Inclui práticas de leitura de textos e do mundo de maneira consciente e reflexiva, questionando estruturas de poder e práticas sociais. Referimo-nos a um princípio que visa o desenvolvimento de práticas discursivas significativas. Quando colocamos os discursos dominantes como centrais, como “certos”, o que ocorre é a consolidação de preconceitos e a marginalização de qualquer maneira de pensar diferente dela. Assim, a ideia de letramento crítico é parti- cularmente interessante ao entendimento da educação como justiça social, pois permite a valorização de diferentes vivências, culturas, formas de pensamento, etc. e não se prende às amarras da transmissão de uma visão de mundo dominante. Como vemos, o estudo da língua e da linguagem pode levar a mudanças de ordem social. O professor que favorece o debate sobre diferentes perspectivas em torno de um mesmo assunto, por exemplo, é um professor que entende a importância do diálogo para o alcance de uma formação crítica. Valorizando as discussões e dando espaço às diferenças, ele estimula a construção de pensamentos e de sentidos. Dentro desse quadro, uma das propostas possíveis é a leitura de textos considerando a análise de seu contexto de produção, pois a leitura no contexto local tende a ser diferente de uma leitura em outras circunstâncias – esse seria um espaço privilegiado para a discussão a respeito dos discursos hegemônicos do mundo globalizado. É uma forma de problematização para além das habili- dades linguísticas, incluindo outras dimensões textuais, como a sociocultural e a discursiva. Trata-se de um processo de ressignificação que é importante para que o aluno tome consciência do que está lendo e seja capaz de reconhecer a diversidade presente nos discursos a que se expõe. É importante dizer que não necessariamente o professor colherá os frutos de seu trabalho no momento exato de realização das aulas. Muitas vezes, as nossas ações não surtem efeito imediato, mas não podemos pensar que o trabalho feito foi em vão, pois a conscientização e a construção do pensamento crítico é um processo, ou seja, precisa de tempo para amadurecer. 3A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança Em termos metodológicos, Maia et al. (2016) propõem que o professor precisa ter em mente que a construção do conhecimento de seus alunos se dará entre aquilo que eles já conhecem e o novo a que serão expostos em sala de aula. A partir disso, o trabalho de reflexão conduziria a uma etapa de transformação, ou seja, mudança de perspectiva, de visão do tema tratado. Em geral, quando de posse de um tema, os alunos são capazes de elaborar ideias a esse respeito. O papel do professor é o de mediador, aquele que ajuda o aluno a fazer a ponte entre o que ele sabee o que está procurando saber. Em sala de aula, os alunos precisam expandir suas perspectivas e chegar a novas conclusões, ampliando seu conhecimento do mundo e da linguagem. Quando falamos em um ensino que leva ao pensamento crítico, estamos dizendo que existe uma postura ética por parte do professor. Essa ética se desenvolve na medida em que o docente procura se posicionar criticamente diante dos padrões de comportamento e de visões de mundo. Segundo Tagata (2017, p. 380): Pensar de formas diferentes, pensar criticamente sobre o próprio pensamento, de forma a não legitimar apenas o que já sabemos: esse seria o propósito e até mesmo a natureza de toda atividade filosófica, de acordo com Foucault (2006). A meu ver, assim como o fazer filosófico, o ensino de línguas em geral e o de inglês, em particular, pode estimular o mesmo tipo de reflexão crítica sobre a língua no contexto global atual, particularmente no sentido de contribuir para uma investigação de seu papel na disseminação da ideologia neoliberal da globalização, e também para a formação de uma aliança anti-hegemônica, como defendido por Moita Lopes (2008). Vemos que o pesquisador supracitado dá um significado especial ao en- sino de inglês pelo fato de que se trata de uma língua que atua como meio de propagação de uma ideologia. Atualmente, é praticamente impossível não ter contato com a língua inglesa, seja por meio de filmes, séries, músicas, entrevistas ou outros produtos. Além do domínio cultural, os Estados Unidos também têm grande poderio político, econômico e militar. Essa questão não pode passar despercebida pelo professor de inglês e precisa ser problematizada, de modo que a sala de aula não se torne um espaço de solidificação e consolidação desse poder, mas de avaliação crítica dele. A aula de inglês, na visão de Tagata (2017), é um espaço de questionamento e de fazer político diante da realidade em que nos encontramos. A produção linguística nunca se dá apenas no nível do código: ela é, antes, uma produção discursiva, isto é, está inserida em um determinado contexto A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança4 comunicativo, sociointeracional. Trata-se, portanto, de uma prática social movida por motivações políticas e ideológicas. O princípio ético deveria, então, nortear o trabalho docente no sentido de que ele deve promover a construção de conhecimentos com base no respeito às diferenças entre povos e culturas, desconstruindo discursos que levam a um pensamento de valorização da desigualdade, de preconceitos, etc. A mudança social não ocorre apenas a partir de grandes movimentos coleti- vos. Nossas atitudes cotidianas, por menores que possam parecer, também são discursos construídos que podem tanto legitimar quanto refutar as estruturas de poder. A hegemonia de uma cultura sobre as outras é, geralmente, produzida de modo que possa parecer natural, quando, na verdade, é uma construção. Dessa forma, precisamos ter um olhar crítico sobre essas construções e refletir sobre como isso pode afetar a nossa prática pedagógica. Nesse sentido, o papel do professor de língua estrangeira consiste em estimular o aluno a refletir sobre a língua e a cultura que está aprendendo. Desse modo, o aluno deverá ser capaz de produzir novos significados e lei- turas de mundo, indo além do senso comum e tornando-se responsável pelas perspectivas que defende. Refletindo sobre a importância de se pensar o ensino de inglês a partir de uma abordagem crítica, Tagata (2017, p. 390) defende: a constituição de uma base teórico-político-epistemológica para o planejamento e a execução de práticas de letramento envolvendo o ensino e o aprendizado da língua inglesa, tanto em um micronível — por exemplo, na elaboração de planos e materiais destinados a promover uma conscientização da heterogenei- dade linguística e cultural de países de língua inglesa, e de novas estratégias de apropriação do inglês – quanto em um macronível — por exemplo, no desenvolvimento de atitudes éticas que contribuam para a preservação das diversidades linguística, cultural, epistemológica e ambiental do mundo. O autor defende, ainda, que essa base teórico-político-epistemológica deve estar presente desde a formação dos professores de língua inglesa. Assim, os cursos de formação devem proporcionar a esses futuros docentes um ambiente de aprendizagem que vise a promoção de uma autorreflexividade, isto é, o entendimento de que nenhum conhecimento é neutro ou absoluto, mas faz parte da relação que estabelecemos com o mundo. O conhecimento é uma construção, uma forma de ver as coisas e de entendê-las — ele passa, portanto, pela ótica da subjetividade. 5A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança No artigo “Tecnologia na educação: o caso da internet e do inglês como linguagens de inclusão”, disponível no link a seguir, Finardi, Prebianca e Momm (2013) discutem a relação entre os avanços tecnológicos e o ensino de inglês, salientando a importância do fazer pedagógico no processo de ensino e aprendizagem. https://goo.gl/icvDza O letramento crítico pode ser entendido, então, “como um conjunto de prá- ticas educacionais que enfatizam as relações entre linguagem, conhecimento, poder e subjetividades” (TAGATA, 2017, p. 392) e promove a problematização de nossa(s) leitura(s) do mundo, reconhecendo a parcialidade e as limitações que o entendimento humano implica. De fato, existem muitas possibilidades de trabalho para o professor de língua estrangeira. Uma abordagem baseada no princípio de letramento crítico leva em consideração não apenas a língua como sistema abstrato, mas também a inserção dos conteúdos linguísticos nas diferentes situações comunicativas. O aprendizado de línguas coloca o aluno em contato com outras culturas, mas ele faz isso a partir de uma determinada perspectiva. Por exemplo, um indivíduo que busca aulas de inglês porque deseja ingressar no curso de filosofia em uma universidade inglesa tem objetivos de aprendizagem bem diferentes daquele que pretende aprender o idioma porque deseja trabalhar com linguagem de programação de computadores. O ensino pensado a partir da noção de letramento crítico se mostrará especialmente sensível a essas diferenças. Para além do chamado conheci- mento proposicional, isto é, as regras e estruturas gramaticais, o ensino de línguas deve atentar para o conhecimento procedimental, “[...]que consiste no conhecimento de estratégias de negociação do sentido; ou o conhecimento de como negociar, ou de “como se virar” na língua inglesa.” (TAGATA, 2017, p. 398). Essa concepção é basicamente uma diferenciação entre os aspectos materiais e discursivos da língua e quebra a ideia de língua como algo homogêneo ou neutro, entendendo-a dentro das suas diferentes possi- bilidades de uso. A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança6 https://goo.gl/icvDza Dessa maneira, com a compreensão de que ensinar um idioma vai muito além de apresentar estruturas gramaticais (embora elas também sejam im- portantes), podemos dizer que o ensino de língua estrangeira, sob a ótica do letramento crítico, é potencialmente transformador, porque permite ao aluno construir leituras críticas a respeito do mundo em que vive. A motivação no processo de aquisição de segunda língua Um dos grandes problemas apontados por professores de língua inglesa, em especial na rede pública de ensino, é a falta de interesse ou motivação dos alunos. Isso se percebe na sala de aula quando os alunos se recusam a participar da proposta de aula, por exemplo, ou quando não se dedicam, não prestam atenção no enunciado do professor, não valorizam a disciplina, etc. São inúmeras as situações difíceis pelas quais passam os docentes na atual realidade brasileira. Por esse motivo, é importante pensarmos cada vez mais em estratégias que possam contribuir para reduzir essa desmotivação. Vale dizer que nem sempre esse tipo de problema ocorre por causa de alguma faltano trabalho do professor. A realidade das escolas brasileiras, hoje, é extremamente complexa. Existem problemas sociais, externos à atividade escolar, mas que afetam diretamente o seu cotidiano. São problemas pelos quais a escola não é responsável, mas com os quais ela acaba tendo que lidar. Assim, é preciso entender o aluno em sua integridade. Parece óbvio dizer que esse aluno não existe apenas na escola, mas, muitas vezes, acabamos esquecendo que ele está inserido em uma sociedade, em uma comunidade, em um ambiente familiar, etc. Essas instâncias podem apresentar problemas que afetam a vida dos estudantes e que fogem do alcance do professor e da escola. Justamente por nos esquecermos dessa integridade do aluno, acabamos achando que sua falta de interesse só pode vir de algum erro do nosso trabalho. No entanto, esse tipo de culpabilização é muito perigoso: a culpa pode levar o professor a um estado de desmotivação com a carreira docente e culminar em problemas mais graves, como depressão ou a Síndrome de Burnout. Atu- almente, no Brasil, existe um grande número de afastamento de professores e até de abandono da profissão por conta de problemas ligados à pressão emocional a que estão sujeitos. 7A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança A Síndrome de Burnout é, hoje, uma doença que afeta muitos profissionais, em especial os professores. Muitas vezes associada à depressão, essa síndrome é uma espécie de estresse crônico, uma condição em que o indivíduo se sente constantemente esgotado e pessimista em relação ao futuro. Trata-se de um problema muito sério, que necessita de cuidado e atenção, já que há casos mais graves em que essa síndrome culmina na aposentadoria por invalidez. Na reportagem da TV Futura intitulada “Professores são os mais vulneráveis à Síndrome de Burnout”, disponível no link a seguir, você poderá entender melhor como esse transtorno funciona e quais são seus sintomas. https://goo.gl/QwF7Y8 Por outro lado, isso não quer dizer que possamos descuidar da nossa prática pedagógica diária. Precisamos refletir sobre ela e procurar transformá-la. Para que o aluno se sinta motivado, é preciso que o professor também se sinta motivado, não é mesmo? Vamos pensar um pouco então sobre a motivação no contexto específico do ensino de língua estrangeira. Nesse contexto, uma definição possível de motivação pode ser a seguinte: Motivação é uma das duas características-chave do aprendiz que determina a razão e o sucesso da aprendizagem em língua estrangeira (a outra é a aptidão): a motivação fornece o ímpeto principal para embarcar na aprendizagem e, depois, a força diretriz que sustenta o longo e frequentemente tedioso processo de aprendizagem (DORNYEI apud BERNARDINO, 2009, p. 02). A motivação é condição para que o sujeito alcance seus objetivos, é o que faz com que essa pessoa se esforce, mobilize suas forças. Sabemos o que a motivação conduz, o que não sabemos ao certo é como ela pode ser desen- volvida. De fato, na sala de aula, o professor pode promover um espaço que seja propício ao engajamento, ou seja, ele é um colaborador, um facilitador do caminho a ser percorrido. Isso posto, podemos passar a atitudes do professor que potencialmente possam contribuir para que os alunos se sintam mais motivados e, consequen- temente, mais engajados no trabalho realizado em aula. Um primeiro passo é pensar em práticas que sejam significativas para os alunos, isto é, práticas que se baseiem em situações reais de comunicação, A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança8 https://goo.gl/QwF7Y8 independentemente da habilidade que esteja no foco do trabalho (reading, writing, listening ou speaking). A criação de situações artificiais ou até absurdas tendem a desmotivar quem está aprendendo. O segundo ponto a que devemos estar atentos é a valorização dos conhe- cimentos prévios dos alunos. Quando partimos de algo que eles já sabem, eles sentem que podem contribuir, sentem-se seguros para se lançar a novos conhecimentos, o que também é um fator bastante positivo para gerar um ambiente que favoreça a motivação. Por exemplo, a escolha de temas atuais que o professor já observou em alguma ocasião que seus alunos apreciam é uma boa ideia. A identificação dos aprendizes com o objeto de estudo é um assunto bastante estudado e defendido nas teorias da educação. Quando o aluno sente que o que se ensina tem a ver com o todo, com o mundo em que ele vive, a identificação se torna mais provável. Segundo Dewey (apud BERNARDINO, 2009, p. 04), “[...] se esse todo lhe pertence, ou se o seu próprio movimento o põe em contato com esse todo, aquela coisa ou aquela ação passa a interessá-la”. Em terceiro lugar, é importante que o professor sempre busque aprimorar sua proficiência no idioma: fazer cursos, ler notícias, ver filmes, conversar em inglês quando tiver oportunidade, entre outros. Isso contribui para a própria valorização profissional docente, pois, quando os alunos percebem que o professor não domina o que está lecionando, não é incomum que ele questione as habilidades do docente. Além disso, o próprio professor, quando se sente seguro em relação ao que ensina, tende a se sentir mais valorizado e motivado a desenvolver novas estratégias para suas aulas. Então, sua prática educacional acaba se tornando mais significativa — tanto para ele quanto para seus pupilos. Em quarto lugar, podemos mencionar a escolha de recursos educacionais adequados. Em outros tempos, pensávamos em uma sala de aula e a imagem que viria à mente seria apenas uma: carteiras viradas para frente, livros (ou cartilhas), lousa, giz e mesa do professor. Hoje em dia, podemos apropriar- -nos de outros inúmeros materiais que nos auxiliam a chegar às necessidades dos alunos. Além dos livros, existem recursos tecnológicos, por exemplo, que apelam para um interesse que, hoje, é quase natural em nossas vidas. As tecnologias da informação e comunicação (TICs) estão aí para ajudar, mas elas não fun- cionam sozinhas. A intervenção do professor é necessária para que haja um direcionamento da aprendizagem a partir desses recursos — de outra maneira, utilizaremos a tecnologia pela tecnologia e o ensino se tornará vazio. 9A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança Existem muitos recursos disponíveis para o trabalho com a língua inglesa em sala de aula. Com alunos pequenos, por exemplo, existem vídeos para alfabetizandos, jogos on-line que emitem sons (letras, números, palavras, etc.), aplicativos, entre outros. Com alunos maiores, há também um sem-número de jogos mais complexos, livros digitais, dicionários on-line, sites de notícias, editores de texto, sites de música, programas de gravação de áudio, etc. Para além da esfera tecnológica, também existem recursos que podem auxiliar a preparar aulas bem produtivas: teatro de fantoches, letras móveis, jogos de tabuleiro, RPG, etc. Vale lembrar que nenhum desses recursos se basta: nem os tecnológicos nem os físicos. Nesse momento, entra o professor, com seu papel de mediador do conhecimento que será produzido por seus alunos. Para que gerem práticas eficientes, é preciso que esses recursos sejam utilizados de forma problema- tizada, isto é, que façam sentido dentro do contexto escolar. Falando especificamente dos meios tecnológicos, sua relação com a língua inglesa é um caso especial. Na chamada world wide web, o inglês é a língua predominante que permite a comunicação entre as pessoas ao redor do mundo. Ele é, também, o idioma da linguagem computacional propriamente dita. O advento da internet mudou muitos aspectos interacionais e comunicacionais: hoje, o aluno pode buscar conhecimentos que, antes, dependeria de um professor ou de outro indivíduo para encontrar. O lado ruim disso tudo é que, sem nenhum direcionamento, essa procura pode cair em um vazio e não produzir efetivamente nada de positivo. Por outro lado, a internet permite uma maior autonomia na produçãode conhecimento, o que favorece o processo de aprendizagem. Sabemos que cada um aprende de um jeito, cada um tem sua história, sua trajetória, seus interesses. Enfim, se o professor sozinho não tem como dar conta de todas as necessidades de seus alunos, a ideia é que estes, quando têm acesso a uma educação para autonomia, possam correr atrás de seus interesses mais particulares. Ensino/aprendizagem de segunda língua: problemas atuais É importante destacar que a construção motivacional é algo complexo, envolve inúmeras variáveis. Apenas o trabalho do professor não garante que a resposta dos alunos será positiva. Voltando à questão da integridade do aluno, precisamos ter em mente que existem outros aspectos da vida dos estudantes, além da sala de aula, que contribuem para que ele se sinta mais motivado ou desmotivado. A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança10 Uma das questões que podemos colocar aqui é a realidade de salas de aula lotadas (com mais de 30 alunos, até mais de 40 em alguns lugares), o que dificulta, e muito, o desenvolvimento de projetos que poderiam levar em conta uma atenção mais individualizada do professor com as necessidades e dúvidas de cada aluno. Outro dos grandes problemas que vemos nas escolas, hoje, é o acesso à internet. Nem todas as escolas da rede pública de ensino possuem uma estru- tura de acesso a recursos tecnológicos e à rede de computadores. Quando isso ocorre, geralmente, o alcance se limita a uma sala onde ocorrem as “aulas de informática”, ou seja, a tecnologia fica relegada a apenas um espaço escolar, não se estende para outros ambientes. Trata-se de mais um desafio que o professor contemporâneo precisa enfrentar em seu cotidiano. Em suma, a internet democratiza o acesso à informação e as ferramentas tecnológicas têm um grande potencial pedagógico no contexto do ensino de língua inglesa. No dia a dia, o professor pode enfrentar muitas dificuldades, como o acesso a essas ferramentas, porém, quando esse acesso existe, é im- portante salientar a importância do papel mediador do docente para que o uso desses meios seja provido de sentido e, também, dê sentido à aprendizagem dos alunos. A falta de motivação é um problema que pode ocorrer tanto em escolas de idiomas quanto no ensino fundamental e médio. Entretanto, ela tende a ser mais grave quando o inglês é uma matéria escolar, o que e deve ao fato de que o aluno não pode fazer escolhas quanto à grade curricular e também em função do ambiente ser menos propício à valorização do idioma. O inglês, muitas vezes, é visto como uma disciplina “menor”, menos importante do que português e matemática, por exemplo. Por isso, é importante que o ambiente da sala de aula atribua significado ao ensino do idioma estrangeiro. Aquilo que faz parte da realidade do aluno, que não é um conteúdo abstrato sem relação nenhuma com a vida dele, tende a obter uma recepção melhor e, portanto, deve se aproveitado no planejamento de cada professor. Existe outro fator que pode dificultar a identificação do aluno com a língua que está aprendendo: as diferenças culturais. Segundo Bernardino (2009, p. 07), Ao estudar uma LE, o aluno precisa incorporar sons, estruturas gramaticais e modelos comportamentais característicos de outra cultura, de uma comunidade que não é a sua. É necessária uma identificação do aluno com o grupo que utiliza a língua a ser aprendida. 11A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança Isso mostra o quão complexa é a questão da motivação no ensino de LE. Muitos alunos já chegam na sala de aula com a crença de que não aprenderão a língua e pronto. Esse tipo de crença vai sendo construído ao longo de sua vida escolar em função das mais diversas influências e é muito difícil de ser desconstruído, mas é preciso que insistamos nessa desconstrução. Por esse motivo, é importante a função investigativa e questionadora do professor. A partir da identificação de temas e questões que são significati- vas para os estudantes, é possível que o docente encontre meandros para a ressignificação da aprendizagem da língua inglesa na vida de seus alunos, de modo que o ambiente criado favoreça a motivação. Como vimos, a motivação é um elemento complexo na vida do profissional da educação. Não existem respostas prontas para proporcionar o interesse dos estudantes. O que existe é observação, reflexão, atualização e prática. Integrando seus conhecimentos ao repertório dos alunos, o professor se torna um agente que contribui para que haja motivação no processo de ensino e aprendizagem de língua estrangeira. 1. A noção de letramento crítico é bastante presente em estudos pedagógicos. Como esse tópico pode ser visto do ponto de vista do ensino de línguas? a) A ideia de letramento crítico tem a ver com a construção de nossa leitura de mundo. Da mesma forma, a aquisição de uma língua estrangeira não pode ser vista de forma neutra — é preciso problematizá-la. b) Os textos escritos são universais e não tendenciosos, mas o advento das novas tecnologias fez com que as informações não pudessem mais ser confiáveis, por isso, o letramento crítico é importante. c) O letramento crítico passou a ser importante no ensino de línguas quando a leitura de textos na internet se tornou mais comum entre jovens e adolescentes, pois isso despertou a necessidade de problematizar nossa leitura de mundo. d) O letramento crítico ocorre na infância, quando a criança está aprendendo a ler e escrever. Daí a importância de levar esse conceito para a adolescência, quando o aluno poderá aprender uma língua estrangeira. e) O BNCC defende o ensino de da língua inglesa já na educação infantil, por isso é importante que ele esteja ligado ao processo de alfabetização e letramento crítico. A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança12 2. Tagata (2017) diferencia o conhecimento proposicional do conhecimento procedimental no ensino de línguas, destacando a importância de atentar para o último, em particular. Por que o conhecimento procedimental é tão importante? a) O conhecimento procedimental é importante porque ele vê a língua como algo homogêneo, e é a partir dessa concepção que conseguimos ter um desempenho melhor na aquisição de uma língua estrangeira. b) O conhecimento linguístico não é suficiente para aprender uma língua estrangeira; por isso, é importante aprender sobre as formas de construção de sentido na língua, isto é, como ela funciona em diferentes situações comunicativas. c) O conhecimento proposicional é mais importante do que o procedimental, mas não podemos negligenciá-lo, pois ele também é relevante para uma aprendizagem significativa. d) Por não pertencer a uma abordagem crítica do ensino de línguas, o conhecimento procedimental acabou tornando-se secundário, embora não tenha sido totalmente descartado. e) O conhecimento procedimental leva o aluno a entender que a materialidade linguística basta para a aprendizagem de uma língua estrangeira. 3. Do ponto de vista do conteúdo que leciona, de que maneira o professor de línguas pode manter uma postura ética em sala de aula? a) O professor tem uma prática ética quando expõe seu posicionamento político e o ensina a seus alunos. b) É importante que o professor esteja ciente da origem etimológica da palavra ética (que vem do grego ethos) para desenvolver uma postura mais próxima da realidade de seus alunos. c) Atuar de forma ética é deixar o questionamento para os alunos e não se posicionar diante dos conteúdos ensinados. d) Fazer questionamentos sobre o conteúdo lecionado, sob a perspectiva linguística e cultural, e estimular os alunos a refletir pode ser a base para um trabalho verdadeiramente ético. e) O professor deve tratar seus alunos de forma ética, ou seja, evitar temas polêmicos em sala de aula. 4. A motivação é importante para que os alunos sintam vontade de estudar inglês. Que fatorespodem influenciar a motivação dos estudantes para aprender uma LE? a) Os alunos se sentem devidamente motivados quando o professor prepara uma aula que contenha pelo menos três recursos didáticos diferentes. b) A motivação é algo inato, ou seja, quando o aluno deseja aprender, ele aprende. Por esse motivo, o professor deve voltar seu foco 13A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança aos alunos que previamente se mostram interessados em realizar as atividades propostas em sala de aula. c) Primeiramente, é preciso entender que o aluno é um sujeito íntegro e que a aula não é o único fator de sua motivação. Por outro lado, a identificação desse aluno com o objeto de estudo, por meio de uma abordagem que se aproxime de sua realidade, pode contribuir para que ele demonstre interesse. d) A motivação é fundamental para que o aluno demonstre interesse em estudar uma língua estrangeira. O professor é o responsável pelo despertar dessa motivação, pois é ele que entende a realidade do aluno. e) A motivação no ensino de línguas está diretamente ligada ao uso de recursos tecnológicos em sala de aula. Sem eles, os alunos se sentem desencorajados a participar das atividades que o professor propõe, pois elas se tornam chatas e entediantes. 5. Que relação podemos estabelecer entre tecnologia e motivação no ensino de línguas estrangeiras? a) Não podemos pensar o ensino de línguas sem o uso das novas tecnologias. A leitura de textos em papel se tornou obsoleta desde o advento da internet e, por isso, uma aprendizagem significativa precisa utilizar recursos inovadores. b) O uso das novas tecnologias na sala de aula pode contribuir para que haja interesse dos alunos, pois elas fazem parte de seu cotidiano. Entretanto, é preciso que o professor problematize esse uso para que a aprendizagem não se torne vazia. c) A internet, hoje, permite uma larga distribuição de informações e de conhecimentos, de modo que a atuação presencial do professor se tornou dispensável. d) O ambiente virtual tornou-se uma excelente alternativa às aulas presenciais, hoje vistas como algo ultrapassado e entediante. e) As tecnologias avançaram muito nos últimos tempos e mudaram as formas de comunicação. Por esse motivo, o ensino de línguas on-line se tornou a principal ferramenta do ensino de línguas. A motivação e a reflexão como possibilidades de mudança14 BERNARDINO, E. A. O pensamento deweyano, a motivação e o interesse do aluno no contexto de aprendizagem de língua estrangeira. Travessias, v. 3, n. 1, 2009. Disponí- vel em: <http://saber.unioeste.br/index.php/travessias/article/viewFile/3291/2598>. Acesso em: 22 jul. 2018. MAIA, A. A. et al. 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