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www.pneumoatual.com.br ISSN 1519-521X Dispnéia Autores Alberto Cukier 1 Frederico Fernandes 2 Publicação: Jul-2004 1 - Qual a definição de dispnéia? Dispnéia é definida como a sensação de desconforto respiratório gerado por diversos mecanismos fisiológicos, psíquicos, sociais e ambientais. É um dos sintomas mais freqüentes em pneumopatas. Gera grande limitação na qualidade de vida de milhões de doentes todos os anos e em muitos casos é um sintoma debilitante e refratário, mesmo com tratamento clinico máximo. 2 - Por que a dispnéia é considerada um sintoma complexo e multifatorial? A variedade de termos utilizados como descritores de dispnéia: falta de ar, cansaço, opressão torácica, fome de ar, fôlego curto, sufocamento, entre outros, e a multiplicidade de estímulos implicados em sua gênese fazem supor que existem vários tipos de dispnéia. Além disso, a percepção de dispnéia está relacionada com fatores psicossociais que influenciam sua intensidade e tolerabilidade, dificultando sua interpretação pelo profissional médico. 3 - Quais as causas mais comuns de dispnéia? A causa mais comum de dispnéia é a doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). Doenças pulmonares, cardiovasculares, neuromusculares e diversas outras condições estão relacionadas à dispnéia (tabela 1) Tabela 1. Causas de dispnéia Doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) Asma Fibrose pulmonar Tromboembolia pulmonar (TEP) Infarto agudo do miocárdio (IAM) Insuficiência cardíaca congestiva (ICC) Anemia Tireotoxicose Sepse Uso inadequado de suporte ventilatório Acidose Obesidade Gravidez Descondicionamento / exercício extenuante Altitude 4 - Que mecanismos fisiopatológicos estão associados à dispnéia? Diversas alterações fisiopatológicas estão implicadas na origem da dispnéia. Aumento da demanda respiratória (exercício extenuante, altitude, anemia, tireotoxicose, sepse) são causas de desconforto respiratório mesmo em indivíduos com o sistema cárdio-respiratório normal. Fraqueza e fadiga da musculatura respiratória ou a ineficiência mecânica secundária a hiperinsuflação pulmonar são outras causas freqüentes. O aumento da resistência das vias aéreas, nas doenças pulmonares obstrutivas, e a redução da complacência pulmonar, nas doenças intersticiais pulmonares ou na congestão pulmonar, demandam maior trabalho muscular para manter a 1 Professor Associado de Pneumologia da Faculdade de Medicina da USP. Presidente do XXXI Congresso Brasileiro de Pneumologia 2 Preceptor de Residência Médica da Disciplina de Pneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP www.pneumoatual.com.br ISSN 1519-521X respiração, causando desconforto. Alterações na pressão parcial de oxigênio (PaO2) e gás carbônico (PaC02) têm efeito direto na gênese da dispnéia, no entanto, ao contrário do senso comum, são menos importantes que alterações na mecânica respiratória. 5 - A sensação de dispnéia é igual em todas as condições que a originam? Estudos em língua inglesa analisaram os termos utilizados como descritores de dispnéia em pacientes com diversas doenças. Fatores fisiológicos e psíquicos influenciam na forma de relatar a sensação. Diferentes sensações de dispnéia parecem existir nas diversas condições que a originam (tabela 2). Tabela 2. Sensações descritas em diversas situações Sensação DPOC ICC Doençaintersticial Asma DNM Gravidez TEP Respiração rápida . X . . . . X Exalação incompleta . . . X . . . Respiração superficial . . . X X . . Aumento do esforço X . X X X . . Sufocação X X . . . . . Fome de ar X X . . . X . Opressão torácica . . . X . . . Respiração pesada . . . X . . . DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica; ICC: insuficiência cardíaca congestiva; DNM: doenças neuromusculares; TEP: tromboembolia pulmonar. 6 - Quais mecanismos mediam a percepção da dispnéia? A sensação de dispnéia não é gerada por um único receptor. Uma interação entre vários estímulos aferentes e ativação cortical é responsável pelo reconhecimento desse sintoma. No entanto, ainda não foi possível determinar a área do cérebro que integra os diversos estímulos em uma única resposta sensorial. A percepção de esforço respiratório, quimo e mecanorreceptores e o desacoplamento entre os estímulos aferentes e o esforço ventilatório são os mecanismos fisiológicos mais implicados em sua origem. 7 - Como age a percepção de esforço respiratório? A percepção da ativação voluntária da musculatura respiratória se origina no córtex motor e em receptores nos músculos e tendões da caixa torácica. Essas estruturas enviam estímulos ao córtex sensorial quanto maior a carga sobre a musculatura ou menor a força muscular. O córtex sensorial interpreta as informações como dificuldade respiratória. Esse mecanismo tem importância nas situações de fadiga ou fraqueza muscular (doença neuromuscular) e quando existe aumento da resistência ao fluxo aéreo (asma e DPOC). 8 - Qual o papel dos mecanorreceptores na gênese da dispnéia? Mecanorreceptores se localizam na face, via aérea superior, pulmão e parede torácica. Receptores na face e via aérea superior são sensíveis a fluxo aéreo e temperatura do ar. Eles são a razão pela qual a dispnéia pode ser aliviada por um ventilador ou janela aberta com ar frio. Receptores pulmonares respondem a distensão do interstício pulmonar, em situação de congestão ou aumento da pressão arterial pulmonar, e a inflamação ou irritantes na via aérea. O estímulo desses receptores deflagra dispnéia. Receptores na parede torácica medem a capacidade de distensão dos músculos. Quando é possível uma inspiração mais profunda, o desconforto respiratório é menor. 9 - Quimiorreceptores têm ação direta na origem da dispnéia? A hipóxia e a hipercapnia são, intuitivamente, implicados na origem da dispnéia. Estudos fisiológicos, no entanto, mostram que apesar de existir efeito direto dos quimiorreceptores na origem do desconforto respiratório, sua ação é pequena. As alterações nas pressões parciais dos gases sangüíneos (PaO2 e PaC02) e no pH plasmático detectadas por essas estruturas aumentam www.pneumoatual.com.br ISSN 1519-521X o "drive" respiratório, levando a maior trabalho muscular e a alterações na mecânica respiratória muito mais relevantes na gênese da dispnéia. 10 - O que é desacoplamento entre os estímulos aferentes e o esforço ventilatório? Um dos mecanismos mais implicados na gênese da dispnéia, o desacoplamento entre as aferências e o esforço ventilatório, é um distúrbio na relação entre a tensão ou força aplicada pela musculatura respiratória e o volume pulmonar resultante. Dispnéia surge quando a córtex manda um estímulo para gerar uma contração e o pulmão aumenta desproporcionalmente pouco o seu volume. A diferença entre o que o cérebro "espera" e a ventilação efetiva causa sensação de dispnéia. 11 - Quais os mecanismos de dispnéia nas doenças obstrutivas pulmonares? As doenças pulmonares que causam obstrução ao fluxo aéreo, asma e DPOC, causam dispnéia por mecanismos diversos. Na asma, a estimulação de receptores para irritantes nas vias aéreas e a percepção do esforço respiratório são os principais mecanismos implicados na dispnéia. Na DPOC, a hiperinsuflação pulmonar dinâmica, aliada à percepção do esforço respiratório, são os mecanismos principais responsáveis pelo desconforto. A hipóxia e a hipercapnia têm ação secundária. 12 - O que é hiperinsuflação pulmonar dinâmica? Hiperinsuflação pulmonar dinâmica é o aumento do volume residual e a capacidade residual funcional durante o exercício. É conseqüência da obstrução ao fluxo aéreo encontrada principalmente na doença pulmonar obstrutiva crônica. Nesses pacientes, conforme aumenta a demanda ventilatória, em situações de esforço, o tempo expiratório não é suficiente para a exalação de todo o ar inspirado. Com isso, aumenta o aprisionamento aéreo. As fibras musculares se estiram e o rendimento da contração diafragmática é mínimo. Situações extremas de hiperinsuflação dinâmica favorecem o surgimento de pressão expiratória final positiva(PEEP) intrínseco que impõe uma carga de tensão inicial ainda maior na musculatura respiratória e ocasiona alterações hemodinâmicas, tais como queda na pré-carga e no débito cardíaco. Estudos comprovam que esse mecanismo está presente em até 80% dos pacientes com DPOC, sendo uma causa de dispnéia com limitação crônica às atividades diárias e ao exercício. 13 - Quais os mecanismos de dispnéia nas doenças neuromusculares? Nas doenças neuromusculares, mesmo com as propriedades mecânicas do sistema respiratório normais, o estímulo neural necessário para ativar a musculatura é muito maior. Isso é interpretado como um esforço muscular desproporcional, o que leva a dispnéia. Conforme o acometimento da musculatura se acentua, o doente se torna hipercápnico e hipoxêmico, aumentando o desconforto respiratório. 14 - Quais os mecanismos de dispnéia nas doenças cardíacas? Um paciente cardiopata em edema agudo de pulmão tem alterações da complacência pulmonar, da relação ventilação perfusão e hipoxemia, que justificam o desconforto respiratório e caracterizam essa situação como uma emergência médica. No entanto, pacientes com insuficiência cardíaca queixam-se de dispnéia crônica mesmo durante períodos de estabilidade, sem alterações nos volumes pulmonares ou gases sangüíneos que justifiquem o sintoma. Postula- se que receptores no átrio direito e receptores localizados no interstício pulmonar sejam sensíveis ao aumento de pressão capilar pulmonar e deflagrem a sensação de dispnéia. www.pneumoatual.com.br ISSN 1519-521X 15 - Um doente em ventilação mecânica pode apresentar dispnéia? O suporte ventilatório artificial, quando bem aplicado, reduz o trabalho da musculatura respiratória. No entanto, muitos pacientes nessa situação têm dispnéia mesmo na ausência de alteração nos gases sangüíneos ou na mecânica respiratória. O ajuste do ventilador, muitas vezes, limita o fluxo ou o volume que o paciente recebe. Assim, se faz presente o fenômeno de desacoplamento das aferências, ou seja, a "expectativa" do córtex sensorial, baseada na informação do córtex motor, é maior que a alteração de volume pulmonar na inspiração. Esse é um dos motivos que levam o doente a "brigar" com o aparelho, intensificando o desconforto respiratório. 16 - Quais os achados relevantes na história e exame físico? Os objetivos na abordagem de um paciente com queixa de dispnéia são diagnosticar e corrigir a causa de base. Na maioria dos casos, doenças cardiopulmonares ou neuromusculares são a fonte do problema. Anamnese e exame físico cuidadosos são o primeiro passo (tabela 3). Tabela 3. Aspectos relevantes de história e exame físico no doente dispnéico Doença História Exame Físico Pulmonar Tabagismo Exposição ocupacional Asma Atopia Infecções respiratórias Tosse Sibilância Murmúrios diminuídos Baqueteamento digital Aumento da caixa torácica Cardíaca Hipertensão arterial Obesidade Diabetes Dislipidemia Coronariopatia Dispnéia paroxística noturna Ortopnéia Edema membros inferiores Estase jugular Sopro valvar Íctus deslocado Neuromuscular Fraqueza muscular progressiva Atrofia da musculaturaIncapacidade de realizar manobras deficitárias 17 - Como proceder a avaliação complementar de um paciente dispnéico? Muitas vezes são necessários exames complementares para o diagnóstico definitivo e classificação da gravidade da dispnéia. A espirometria e a mensuração dos volumes pulmonares são úteis para diferenciar o distúrbio ventilatório obstrutivo do restritivo, quantificar a hiperinsuflação, classificar a gravidade da obstrução e sua resposta ao broncodilatador. A medida da difusão é complementar a espirometria, sendo por vezes a única alteração presente. Um manômetro acoplado a uma válvula unidirecional e a um bucal pode medir com facilidade aa pressões inspiratória e expiratória máximas, sendo útil para diagnosticar fraqueza, fadiga ou insuficiência da musculatura respiratória. A medida da saturação de oxigênio é realizada facilmente com o uso de um oxímetro de pulso e diagnostica a necessidade de oferta de oxigênio ao doente. A mensuração do gás carbônico sanguíneo requer coleta de sangue arterial sendo útil na indicação de ventilação não invasiva para pacientes com hipoventilação. A radiografia de tórax pode mostrar evidência de doença pulmonar ou sinais indiretos de doença cardíaca. No entanto, uma radiografia normal não exclui nenhuma dessas causas. O ecocardiograma ajuda a avaliar a função cardíaca e diagnosticar e quantificar hipertensão pulmonar. Outros exames de imagem mais complexos, como cintilografia e tomografia computadorizada, podem ser indicados em situações específicas. 18 - O que são escalas de dispnéia? Existe grande dificuldade em quantificar a intensidade da dispnéia. O grau de desconforto geralmente não se correlaciona com a gravidade da doença. Numa tentativa de comparar os sintomas subjetivos de forma precisa foram criadas escalas de dispnéia. Sua principal aplicação se www.pneumoatual.com.br ISSN 1519-521X dá em protocolos de pesquisa clínica para facilitar a obtenção de dados do seguimento dos pacientes e quantificar a resposta a uma intervenção. Na prática, o profissional pode adaptar as escalas às suas necessidades. As escalas de dispnéia se dividem em dois grupos: • escalas pontuais (escala visual analógica, Borg); • escalas de avaliação do impacto da dispnéia nas atividades diárias (diagrama de custo de oxigênio, questionário do Medical Research Council - MRC e Índice de Mahler). 19 - Como funciona a escala visual analógica e a de Borg? São as escalas de dispnéia mais simples. Avaliam o grau de dispnéia em um momento pontual, seja no repouso ou durante esforço. A escala visual analógica consiste de uma linha de 10 cm, no início marca ausência de dispnéia e no final dispnéia extrema. O paciente marca um ponto na escala que correlaciona com o grau de dispnéia. O escore é obtido medindo do início ao ponto marcado. Escala visual analógica A Escala de Borg atribui um valor de 0 a 10 à sensação de dispnéia, sendo 0 ausência e 10 dispnéia máxima. 20 - O que é o diagrama de custo de oxigênio? O diagrama de custo de oxigênio é uma escala que quantifica a dispnéia de acordo com atividades de gasto calórico progressivo. Consiste de uma linha vertical de 10 cm. A pontuação é obtida medindo do início até o ponto marcado pelo paciente. 21 - O que é o questionário do Medical Research Council (MRC)? No questionário do MRC, apresentam-se cinco situações e o paciente responde a que mais se correlaciona com o nível de atividade que desencadeia dispnéia. Essa escala é de fácil aplicação, no entanto é criticada pala falta de limites precisos entre cada nível. As situações apresentadas são: 1. Dispnéia a exercícios intensos. 2. Dispnéia andando rápido no plano ou subindo aclives leves. www.pneumoatual.com.br ISSN 1519-521X 3. Andar mais lentamente que pessoas da mesma idade devido a dispnéia ou parar para respirar andando normalmente no plano. 4. Parar para respirar após caminhar 90 metros ou alguns minutos no plano. 5. Não sair de casa devido a dispnéia. Em recente documento publicado por Celli e colaboradores, considerando uma escore de avaliação prognóstica em DPOC (vide Boletim Expresso 93) esta escala foi graduada de 0 a 4, com a mesma graduação de intensidade de dispnéia, ficando assim: 1. Dispnéia a exercícios intensos 2. Dispnéia andando rápido no plano ou subindo aclives leves. 3. Andar mais lentamente que pessoas da mesma idade devido a dispnéia ou parar para respirar andando normalmente no plano. 4. Parar para respirar após caminhar 90 metros ou alguns minutos no plano. 5. Não sair de casa devido a dispnéia. 22 - O que é o índice de Mahler É um escore que determina o grau de dispnéia em um momento basal (Baseline Dypnea Index – BDI) e em avaliações subseqüentes (Transitional Dyspnea Index –TDI). Ambos são obtidos a partir de uma somatória de pontos em uma escala. O BDI varia de 0 a 12 e o TDI, de – 9 a + 9. Uma mudança maior ou igual a um ponto é considerada clinicamente significativa. BDI PontosLimitação funcional Pontos Magnitude da tarefa Pontos Magnitude do esforço 0 Sem Limitação 0 Tarefas extraordinárias 0 Esforço extraordinário 1 Limitação mínima 1 Grandes tarefas 1 Grande esforço 2 Limitação moderada 2 Tarefas moderadas 2 Esforço moderado 3 Limitação acentuada 3 Tarefas leves 3 Esforço leve 4 Limitação completa 4 Repouso 4 Repouso TDI Pontos Mudança na limitaçãofuncional Pontos Mudança na magnitude da tarefa Pontos Mudança na magnitude do esforço -3 Deterioração maior -3 Deterioração maior -3 Deterioração maior -2 Deterioraçãomoderada -2 Deterioração moderada -2 Deterioração moderada -1 Deterioração menor -1 Deterioração menor -1 Deterioração menor 0 Sem mudança 0 Sem mudança 0 Sem mudança +1 Melhora menor +1 Melhora menor +1 Melhora menor +2 Melhora moderada +2 Melhora moderada +2 Melhora moderada +3 Melhora Maior +3 Melhora Maior +3 Melhora Maior 23 - Existem formas de medir o impacto da dispnéia na qualidade de vida? Vários questionários de qualidade de vida podem ser utilizados como ferramenta para medir o impacto da dispnéia no bem estar global de cada doente. São úteis para aferir as limitações à qualidade de vida antes do tratamento e a resposta a cada intervenção terapêutica, principalmente em pesquisa clínica. 24 - Como quantificar dispnéia na prática? Na prática clínica cada profissional desenvolve uma maneira própria para quantificar a dispnéia de acordo com sua necessidade. Uma maneira muito comum e simples é correlacionar a dispnéia com as atividades diárias do doente. Questionando se existe dispnéia no repouso, ao escovar o cabelo, tomar banho, andar no plano ou subir escadas. É recomendado o uso regular de uma www.pneumoatual.com.br ISSN 1519-521X escala de dispnéia, mesmo que modificada, para quantificar adequadamente os resultados de um tratamento específico. 25 - Como tratar a dispnéia? A primeira medida no tratamento da dispnéia é diagnosticar e tratar a sua causa. Freqüentemente, mesmo o tratamento clínico máximo da doença de base é insuficiente para eliminar o sintoma. Nessa situação, é necessário identificar os candidatos a medidas farmacológicas suplementares, reabilitação, suplementação de oxigênio e até tratamento cirúrgico dirigido ao controle da dispnéia. A maioria dos estudos sobre tratamento específico da dispnéia se refere a DPOC, o uso nas outras condições é muitas vezes especulativo. 26 - Qual a ação dos broncodilatadores no tratamento da dispnéia? Broncodilatadores inalatórios são a principal medida terapêutica no alívio da dispnéia na DPOC e na asma. A redução da resistência do sistema respiratório alivia o trabalho muscular e melhora a sensação de desconforto. A diminuição da resistência com beta-2 agonistas, anticolinérgicos ou xantinas aumenta a tolerância ao exercício, promove a redução no aprisionamento aéreo e diminui a dispnéia basal. A opção inicial de tratamento é de um broncodilatador inalatório de longa duração (beta-2 agonista ou anticolinérgico). As xantinas são consideradas medicações de segunda linha. O uso de broncodilatadores no tratamento da dispnéia em outras doenças é questionável, no entanto, estudos mostram que beta-2 agonistas aliviam o desconforto em uma porcentagem de pacientes com outras doenças cardiopulmonares, justificando seu uso empírico. 27 - Que outras medicações são benéficas para o alívio da dispnéia? O uso de opióides pode diminuir a dispnéia, por isso eles podem ser utilizados em muitas situações de desconforto respiratório agudo. O uso no tratamento do doente crônico é controverso devido aos efeitos colaterais freqüentes: hipercapnia, constipação, náuseas e redução do nível de consciência. Ansiolíticos diminuem o estímulo hipóxico e hipercápnico e controlam a resposta emocional que pode potencializar a dispnéia. Os estudos clínicos controlados com placebo são controversos e seu uso deve ser limitado a pacientes com ansiedade grave ou ataques de pânico. Quando recebendo essas medicações, os doentes devem ser acompanhados cuidadosamente. Corticóides sistêmicos, na fase aguda dos quadros obstrutivos, diminuem a inflamação e o edema nas vias aéreas, aliviando a carga resistiva. 28 - Qual o papel da reabilitação no alívio da dispnéia? A reabilitação respiratória tem papel comprovado no tratamento e alívio da dispnéia no paciente com DPOC. O benefício é comprovado pela melhora dos escores nas escalas de dispnéia, melhora na qualidade de vida e redução sintomática objetiva. Ela consiste de treinamento da musculatura de membros inferiores, superiores, musculatura respiratória, alteração no padrão respiratório e terapia cognitiva. 29 - Quais as formas de reabilitação mais efetivas? O treinamento da musculatura dos membros inferiores é a manobra de reabilitação que mostra maior benefício na capacitação ao exercício. Melhorar o condicionamento habilita os pacientes a realizar suas atividades diárias. O treinamento de membros superiores e da musculatura respiratória tem base fisiológica consistente para alívio da dispnéia, no entanto, ensaios clínicos são controversos quanto ao benefício dessas manobras. A alteração do padrão respiratório, principalmente quanto ao ensino de técnicas de respiração diafragmática e expiração com lábios cerrados, podem melhorar o volume corrente e diminuir o volume residual. Terapia cognitiva é uma forma de modificar a resposta emocional ao sintoma, reduzindo a ansiedade e o estresse para permitir maior tolerância ao desconforto respiratório. Estudos mostram benefício em curto prazo, mas não foi observada uma resposta duradoura. www.pneumoatual.com.br ISSN 1519-521X A reabilitação pode educar o doente a poupar energia nas atividades diárias, ensinando medidas práticas tais como evitar guardar objetos em armários altos, tomar banho sentado, concentrar todas as atividades no mesmo andar evitando subir e descer escadas. A educação recupera a autonomia e melhora a qualidade de vida. 30 - Oxigênio melhora a dispnéia? A idéia de que a administração de oxigênio alivia a dispnéia é bastante arraigada. Entretanto, uma análise cuidadosa dos estudos clínicos disponíveis sugere que uma minoria dos pacientes realmente tem alívio sintomático quando usa oxigênio em repouso. Por outro lado, a suplementação de oxigênio a pacientes hipoxêmicos melhora a performance durante atividade física. 31 - O uso de suporte nutricional e anabolizantes tem papel no tratamento do doente dispnéico? A fraqueza e a fadiga da musculatura respiratória, assim como seu estiramento secundário à hiperinsuflação, diminuem a capacidade de gerar pressão negativa. Estratégias para melhorar a performance muscular podem diminuir o desconforto respiratório. Boa parte dos doentes respiratórios crônicos tem deficiência nutricional. O índice de massa corpórea abaixo de 20 kg/m2 é indicador de piora no prognóstico. O suporte nutricional previne a redução de massa corporal e a atrofia da musculatura respiratória. De forma semelhante, o uso de anabolizantes mostra aumento da massa muscular. Apesar disso, as duas intervenções não têm benefício comprovado em ensaios clínicos e seus usos devem se limitar a pacientes aderentes ao tratamento, quando as outras possibilidades terapêuticas se esgotarem. 32 - A cirurgia redutora de volume pulmonar controla a dispnéia? A cirurgia redutora de volume pulmonar é indicada em alguns pacientes com enfisema grave e hiperinsuflação. È usada na falência do tratamento convencional e da reabilitação em pacientes selecionados. Por reduzir a hiperinsuflação dinâmica, melhorar a performance da musculatura respiratória, aumentar do débito cardíaco e melhorar a relação ventilação-perfusão, essa intervenção aumenta a tolerância ao esforço e diminui a dispnéia em curto prazo no pós-operatório. Cerca de 92% dos doentes referem melhora da dispnéia nos primeiros seis meses após a cirurgia. Essa porcentagem diminui com o passar do tempo. Melhorias na técnica cirúrgica e nos critérios de seleção dos doentes são responsáveis por resultados cada vez mais favoráveis. 33 - Quais as formas de prevenira hiperinsuflação dinâmica? Os broncodilatadores, além de reduzir a resistência do sistema respiratório, atuam sobre o tônus brônquico aliviando a hiperinsuflação. Grande parte da melhora da dispnéia após a cirurgia de redução do volume pulmonar é atribuída à redução da hiperinsuflação dinâmica. O uso de pressão positiva contínua na via aérea (CPAP) contrabalança o efeito de PEEP intrínseca da hiperinsuflação dinâmica, aliviando a demanda da musculatura respiratória. A reabilitação pulmonar, com foco na alteração do padrão respiratório, diminui os efeitos da hiperinsuflação dinâmica quando ensina o paciente a realizar a expiração de forma mais efetiva. 34 - Como aliviar a dispnéia de um paciente submetido àventilação mecânica? Pacientes submetidos à ventilação mecânica podem apresentar desconforto respiratório mesmo com volume corrente e gases sangüíneos adequados. Um modo ventilatório que limita o fluxo ou o volume corrente pode ser muito desconfortável para um doente com sedação superficial. Altos fluxos inspiratórios, por estimulo de receptores na traquéia, parece determinar maior conforto ao doente. Nesses pacientes, o uso de ventilação assistida com pressão de suporte pode ser uma opção mais confortável do que a ventilação a volume. O nível de pressão acima da PEEP deve ser titulado para um volume corrente adequado. www.pneumoatual.com.br ISSN 1519-521X 35 - Leitura Recomendada Sweer L, Zwillich CW. Dyspnea in patient with chronic obstructive pulmonary disease. Clin. Chest Med. 1990;11:417-445. Manning HL, Schwartzstein RM. Pathophysiology of Dyspnea. N. Engl. J. Med. 1995;333:1547— 1553. ATS. Dyspnea. Am. J. Respir. Crit. Care Med. 1999;159:321–340. O’Donnel DE, Revill SM, Webb KA. Dynamic hyperinflation and exercise intolerance in chronic obstrucive pulmonary disease. Am. J. Respir. Crit. Care Med. 2001;164:770–777. Rochester CL. Exercise training in chronic obstructive pulmonary disease. J. Rehabil. Res. Rev. 2003;40:59-80.
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