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Eutanásia: Direito de Dispor da Própria Vida

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EUTANÁSIA
Introdução:
A prática da eutanásia é proibida na maioria dos países, porém, é um tema muito controverso e por conseqüência amplamente discutido. Tais discussões não se restringem ao campo do direito, vão muito mais além, abrangendo perspectivas no âmbito da medicina, da religião, da filosofia e da moral. Ao longo deste trabalho pretende-se analisar esta questão tão controversa e polêmica, o “direito” de dispor da própria vida, para tanto, procurou-se direcionar a questão da eutanásia no caminho de uma exegese condizente com seu real significado, com o escopo de que seja possível convergir ética e legalidade.Propor uma discussão acerca deste último ponto, tendo como base os referenciais teóricos da bioética da proteção e o conceito de compaixão laica, é o escopo do presente ensaio.
1. Conceito de Eutanásia:
A eutanásia (do grego eu – bom e tánatos – morte) é considerada como uma forma de eliminação da vida de outrem, sendo ela praticada por piedade, com intenção de reduzir o sofrimento de quem está à beira da morte. Pode-se, inclusive, dizer que a eutanásia é praticada por um relevante valor moral – evitar o prolongamento do sofrimento de terceiro. É considerada, assim, uma morte boa, tranquila, libertadora do sofrimento do paciente.
Nesse diapasão, considerando as palavras de Evandro Corrêa de Menezes (1977, p 51 apud Ariosto Licurzi, 1934, p. 47 e 48), a morte libertadora é: “a morte benéfica, quando um enfermo ou traumatizado grave, seguramente incurável, pede que se lhe abrevie com uma morte calma, indolor, a agonia dolorosa, insuportável e rebelde a todo sedativo físico e espiritual”.
Destacam-se como elementos da eutanásia a enfermidade incurável, o sofrimento insuportável, a piedade e a morte provocada por terceiro ou o auxilio de terceiro para a interrupção da vida.
Também oportuno salientar que a eutanásia se divide em duas espécies: ativa e passiva, sendo que esta segunda não é vedada no nosso país, pois não se trata de uma ação para dar fim à vida do paciente, mas unicamente se deixa de usar artifícios para sua sobrevivência.
2. Evolução Histórica:
Na Bíblia encontramos configurada a eutanásia, no Livro dos Reis (I, 31, 3 a 7), na passagem em que Saul, lançando-se sobre sua própria espada para não cair prisioneiro, vem a ferir-se e, por isso, pede a seu escravo que acabe com sua vida.
Entre os povos primitivos era admitido o direito de matar doentes e velhos, mediante rituais desumanos. O povo espartano, por exemplo, arremessava idosos e recém-nascidos deformados do alto do Monte Taijeto. Em Atenas, o Senado ordenava a eliminação de anciãos doentes, ministrando-lhes veneno (conium maculatum) em banquetes especiais houve até mesmo quem afirmasse que os guardas judeus tinham o hábito de oferecer aos crucificados o vinho da morte ou vinho Moriam, contendo substância causadora de una sono profundo e prolongado, para que não mais sentissem as terríveis dores e caíssem em letargia, passando insensivelmente à morte. Os brâmanes eliminavam recém-nascidos defeituosos e velhos enfermos, por considerá-los imprestáveis aos interesses comunitários. Na Índia lançavam no Ganges os incuráveis os incuráveis, mas antes lhes vedavam a boca e as narinas com lama sagrada. Na Birmânia enterravam-se, com vida, idosos e doentes graves. Na Antiguidade romana, Cícero afirmava (De Legibus,III, 8, 19) que era dever do pai matar filho disforme, e César, ao colocar seu polegar para baixo, autorizava a eutanásia, concedendo ao gladiador uni modo de escapar da desonra e da morte com grande agonia. Os povos nômades das regiões rurais da América do Sul, para evitar que ancião, ou enfermo, sofresse ataque de animais, matavam-no. Os celtas matavam crianças disformes, velhos inválidos e doentes incuráveis. 
No Japão, outrora, o filho primogênito tinha o ônus de abandonar pais idosos e doentes na Colina da Morte, onde acabavam falecendo. Na era medieval, entregava-se ao soldado mortalmente ferido o punhal de misericórdia para que, com ele, se suicidasse, evitando um prolongado sofrimento ou que viesse a cair em poder do inimigo, mas, nesse caso, não vislumbramos eutanásia ativa alguma, mas sim induzimento ao suicídio. O povo esquimó ainda tem o costume de deixar doentes e idosos sobre o gelo, abandonando-os à sua sorte, até que a morte chegue.
Deveras, o termo eutanásia foi empregado pela primeira vez, em 1623, por Francis Bacon, na sua obra Historia vitae et mortis, no sentido de sua morte.
Mais contestadas são as práticas de países desenvolvidos que eliminaram certos doentes, mentais ou não, já no século XX, antes ou depois da II Guerra Mundial, casos que ultrapassam histórica e geograficamente a política nazista de exterminação dos indesejáveis. A opinião pública, que só conheceu esse fenômeno nos últimos decênios do século, julga severamente tais diretrizes pouco conformes aos direitos humanos - de modo que se a prática continuar será sem apoio legal e ocultamente.
3. Classificação da Eutanásia
As formas de cessação e prolongamento da vida de terceiro são classificadas em três: eutanásia ativa, eutanásia passiva (ortotanásia) e distanásia.
3.1. Eutanásia Ativa
A eutanásia ativa é aquela em que há uma ação para o fim da vida do paciente, sendo por aplicação de medicamentos ou injeções letais ou, ainda, com o efetivo auxílio para que o paciente interrompa a sua vida.
3.2. Eutanásia Passiva – Ortotanásia 
A ortotanásia (“orto” – correto, tempo certo) é a eutanásia passiva. Nela, haverá uma omissão, consiste na retirada de mecanismos que prolongam a vida do paciente. Assim, a omissão se dará no momento em que, após a retirada dos meios mecânicos necessários para a continuidade da vida do enfermo, o médico apenas regulará os aspectos naturais que permitirão a continuidade de sua vida, como, por exemplo, com a retirada de aparelhos respiratórios o paciente apenas respirará enquanto seu organismo sustentá-lo.
Entretanto a omissão não se estende ao tratamento para amenizar a dor, sem interferir no desenrolar natural da doença que culminará com a morte natural do paciente.
3.3. Distanásia
A distanásia é o prolongamento do sofrimento do paciente, através da continuidade de um tratamento que não terá efeito resolutivo para a doença, apenas manterá o paciente dependente de artifícios para sobreviver. Daí surge a ideia de vida vegetativa.
4. Os Aspectos Jurídicos da Eutanásia:
No Brasil a eutanásia poderia ser embasada por dispositivos legais do Código Penal Brasileiro. Estaria tal conduta capitulada no Artigo 121, se a prática eutanásica não tivesse a anuência da vítima, ou ainda, no artigo 122, onde ocorre o induzimento, a instigação ou o auxilio ao suicídio.
Se a prática da eutanásia fosse tipificada pelo artigo 121, o agente poderia obter uma pena de reclusão de 12 a 30 anos, pois desta forma, poderia ser qualificado, adentrando no § 2º, III do Código Penal Brasileiro, se, por exemplo, houvesse emprego de veneno, ou ainda, se a prática fosse por motivo egoístico, ou seja, livrar-se logo do moribundo para evitar de cuidá-lo, haveria também a qualificadora prevista no § 2º, III, por motivo torpe.
Não obstante, se a prática da eutanásia fosse realizada diante de um clamor da vítima que encontra-se em estado terminal, estaríamos diante da conduta criminosa tipificada no artigo 122 do Código Penal Brasileiro. Tomemos como exemplo o caso dramático do espanhol Ramon Sampedro, que foi auxiliado por Ramona Maneiro, trata-se claramente de auxílio ao suicídio e não homicídio.
Outro ponto importante é a questão da ortotanásia, pois quando apenas ocorrer o desligamento de aparelhos que prolongam apenas de forma paliativa a vida de um moribundo, não estamos diante de qualquer crime, pois trata-se apenas de deixar a vida seguir seu curso natural, trata-se então de fato atípico a prática da ortotanásia.
Por fim, cabe a análise quanto à aplicabilidade do parágrafo 1º do artigo 121, trata-se do homicídio privilegiado, causa de diminuição de pena, uma vez que permite ao magistrado o abatimento de um sexto a um terço da pena. “Seo agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço”.
Em uma hipótese em que o pai ao ver o sofrimento de seu filho que encontra-se em estado terminal de uma severa patologia, sem qualquer meio para lhe proporcionar um tratamento digno, e ainda, diante da inoperância do estado, que deveria mas não prove de forma eficaz a saúde pública, acaba por praticar a eutanásia em seu filho, poderia esse gozar desta causa de diminuição de pena.
A eutanásia não seria um homicídio humanitário ou caritativo?
Sua legalização seria inadmissível em razão da: inutilidade, por já haver regulamentação nos Códigos de Ética Médica: nocividade, por decorrer de intromissão do Poder Público na vida privada; e incongruência, pois, uma vez que se pune o aborto e não se admite pena de morte, como se poderia tornar lícita a eutanásia? E como se poderiam estabelecer limites de eticidade nas fronteiras entre a vida e a morte se não há domínio sobre elas?
5. Argumentos à Favor da Eutanásia:
Em defesa do morrer com dignidade, há quem sustente a necessidade de admitir-se legalmente, em certos casos específicos, a eutanásia ativa, também designada benemortásia ou sanidicídio, que, no nosso entender, não passa de um homicídio, em que, por piedade, há deliberação de antecipar a morte de doente irreversível ou terminal, a pedido seu ou de seus familiares, ante o fato da incurabilidade de sua moléstia, da insuportabilidade de seu sofrimento e da inutilidade de seu tratamento, empregando-se, em regra, recursos farmacológicos, por ser a prática indolor de supressão da vida. Por exemplo. o Dr. Hans Henning Atrott e o Dr. Hackenthal, médicos alemães, adeptos da eutanásia, que admitem a aplicação de medicamentos letais, sendo que o último aceitou aplicar uma dose de cianureto em uma enferma incurável de câncer de pele que, após treze operações, ficou completamente desfigurada'. Por isso diz Lecha Mazzo que a eutanásia é a "morte dulcificada, desejada e provocada tão depressa quanto seja perdida toda a esperança cientifica". 
Platão, em seus Diálogos, lembra a respeito a afirmação de Sócrates de que "o que vale não é o viver, mas o viver bem". O princípio da qualidade de vida é usado para defender a eutanásia, por considerar que uma vida sem qualidade não vale a pena ser vivida. O processo de secularização conduziu dessacralização da vida, delegando o governo da vida à autodeterminação do ser humano, responsabilizando-o pela qualidade da vida, ou seja, pela busca de condições de uma vida mais digna. desfraldando a bandeira de que só vale viver uma vida dc qualidade, justificando, assim, a eutanásia. Conseqiientemente. poder-se-ia falar do direito de antecipar a morte diante de uma agonia extremamente cruel e prolongada? Uma vida sofrida, seguida de dores insuportáveis, não estaria ferindo a dignidade humana e não justificaria o entender de que o direito à vida deixaria de ser o valor primordial tutelado constitucionalmente? Juridicamente haveria alguma diferença entre o ato de dar ao doente uma dose única e fatal de narcótico e o de ministrar-lhe doses gradativamente elevadas, que conduzem à morte, por serem imprescindíveis para aliviar seu sofrimento? Teria valor o pedido de um enfermo para que seja poupado do sofrimento com a morte se bastaria, como observa Hélio Gomes, um alívio transitório ou uma noite mais tranquila para que aquela vontade desapareça?
A associação inglesa Exit busca a garantia do direito a uma morte digna e a defesa da eutanásia.
O Código Penal uruguaio prevê como causa de impunidade o homicídio piedoso, desde que o agente tenha sido levado por compaixão, mediante reiteradas súplicas da vítima. Esse Código, no art. 37, e o da Colômbia, no art. 365, concedem o benefício do perdão judicial em caso de eutanásia ativa, se realizada com a anuência expressa do paciente terminal.
Nos Estados Unidos, vários Estados incorporam a eutanásia em seus Códigos, aceitando-a.
Na Holanda, a eutanásia hoje está regulamentada por lei, mas era, como vimos, tolerada pela justiça se feita a pedido do paciente em estado terminal, atestado por dois médicos, sob diretrizes específicas estabelecidas, desde 1984, pela Comissão Governamental Holandesa para Eutanásia, disciplinada pela Royal Dutch Medical Association (RDMA) e pelo Ministério da Justiça.
A Lei Funeral (Burial Act) de 1993 impediu que médicos que praticassem eutanásia ou suicídio assistido fossem processados, e exigiu, por usa vez, critérios para a realização da eutanásia e a notificação do procedimento que são: solicitação para morrer, decorrente de decisão voluntária e consciente do paciente devidamente informado; consideração de seu pedido por pessoa que tenha conhecimento de sua condição; manutenção do desejo de morrer por um lapso considerável de tempo; irresignação do doente com seu sofrimento físico ou mental inaceitável ou insuportável; concordância obrigatória para implantação da medida letal por outro médico, consultado para esse fim; proibição de emissão de atestado de óbito por morte natural, pois o médico, em caso de eutanásia, deverá informar o fato à autoridade médica local, preenchendo um extenso questionário; relato da morte feito pela autoridade médica local ao promotor do distrito e competência do promotor distrital para decidir se haverá ou não acusação contra o médico. Sem o consenso do paciente e sem o preenchimento das condições acima arroladas, a eutanásia não passaria de uma dissimulação, de um homicídio como em qualquer outro país, tipificado no art. 293 do Código Penal holandês: “A person who takes the life of another person at that other person’se express and earnest request is liable to a termo of imprisonment of not more ths twelve years or a fine of the ffth category. A conduta médica conforme a esses critérios passou a ser ética, indicando que a sociedade holandesa caminhava a passos largos para a regularização da eutanásia, pois o Parlamento holandês em 2002 aprovou lei que legaliza não só a eutanásia como também o suicídio assistido.
A eutanásia, na Holanda, apenas poderá ser praticada se o paciente não tiver menor chance e cura e estiver submetido a insuportável sofrimento. O pedido deve vir do próprio paciente e tanto ele quanto seu médico devem estar convencidos de que não há outra alternativa confirmada por parecer de outro médico e por uma comissão de especialistas.
6. Argumentos Contra a Eutanásia:
Perguntamos se se permitisse a eutanásia voluntária, não se estaria abrindo uma porta para a involuntária. E, além disso, não haveria possibilidade de um diagnóstico errôneo ou, até mesmo, de abuso por parte de médico ou familiares?
O Código Penal brasileiro apenas possibilita a redução da pena de 1/6 a 1/3 se o homicídio for cometido por relevante valor social ou moral (art. 121,§1º ). Os Códigos Penais da Alemanha (art. 216), da Suiça (art. 114) e da Itália (art. 579) entendem, em disposições especiais, que a eutanásia é um homicídio atenuado em atenção ao motivo piedoso, mas não chegam a admitir a absolvição, nem o perdão judicial.
Lícito seria ao médico, em caso de comprovada necessidade e quando sua consciência não lhe oferece qualquer outra alternativa, antecipar a morte do paciente terminal, diante da insistência deste, para que possa morrer sem sofrer dores intoleráveis, em virtude de doença incurável, com anuência de sua família, em nome de uma morte digna. A relação médico-paciente não ficaria seriamente abalada pela terrível suspeita: a próxima injeção seria para curá-lo ou para matá-lo.
A eutanásia é um grande tabu na prática médica. Deveras, como poderia ter o médico a missão de abreviar os dias de seu paciente. Não seria ele um cúmplice da morte. Seria possível a um profissional da saúde atenuar sofrimento, retirando a vida, em caso em que se reconhece a irreversibilidade do quadro em paciente terminal. Poderia o médico, com permissão do paciente ou de seus familiares, antecipara morte, ante a atrocidade do sofrimento e a inevitabilidade do falecimento.
O jornal China Daily, de Pequim, em 21 de dezembro de 1988, noticiou que o Ministério da Saúde decidiu não interferir nos hospitais dispostos a realizar a eutanásia em pacientes terminais, porque, com ela, ter-se-ia o fim do sofrimento desses doentes e o alivio mental e físico para os parentes.
O médico não pode proceder à eutanásia, nem deve medir esforços para suavizar a dor de seu paciente.
Concordamos com Villanova e Morales em que o único objetivo da medicina é fazer o bem em prol da vida. O Código de Ética Médica do Brasil, no art. 66, veda ao médico a utilização, em qualquer caso, de meios destinados a abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu responsável legal. Isso deve ser assim ante o juramento de Hipócrates: “a ninguém darei, para agradar, remédio mortal, nem conselho para induzir a perdição”. Logo, a eutanásia ou morte piedosa não envolve o direito de matar, sendo sempre um homicídio, mesmo que o paciente esteja condenado à morte próxima em prolongado sofrimento. Observa Daniel Serrão: “O sofrimento, por sua vez, muitas vezes se constrói sobre a própria dor física e, por ser uma elaboração do homem num momento de fragilização de sua vida, mas de perfeita consciência, não pode ser tratado com morfina. Para encontrar a solução da dor causada pelo sofrimento, é condição indispensável ter acesso ao espaço do outro: aproximar-se da intimidade do enfermo, conhecer sua história de vida.
Esse locus é intimo, profundo: para entender a razão da angústia do paciente, é preciso criar empatia com quem sofre, relacionar-se com sua dor, criar laços de confiança e carinho. Tal conduta afasta a hipótese da eutanásia”. “Uma das áreas em destaque hoje a medicina é justamente a dos tratamentos paliativos, exercidos (...) por médicos, por assistentes sociais, psicólogos, enfermeiros. Muitos pacientes sofrem porque não conseguem resolver problemas em sua vida: nesses casos, o contato humano entre quem dá a assistência e quem a recebe é salutar. Outra questão justificativa para o pedido de eutanásia é o esgotamento do projeto de vida pessoal, quando o indivíduo está convencido de sua inutilidade como ser humano, acreditando que a morte seja a única saída (...). Nessas situações, o tratamento paliativo também é muito eficaz, pois resgata a auto-estima do doente, fazendo-o compreender que a vida não depende somente do funcionamento perfeito do órgão do corpo (...). Pesquisadores vêm procurando descobrir quais são as ondas cerebrais responsáveis pelo estado de bem-estar. Mas já se sabe que o bom humor e o amor contribuem inegavelmente para o avanço da reconstrução pessoal do paciente. Daí as palavras de Napoleão Teixeira, que foram aplaudidas por Afrânio Peixoto, Almeida Jr., Flamínio Fávero, Hélio Gomes e outros: “A ninguém é dado promover ou antecipar a morte de outrem. Ao médico, com mais forte razão, muito menos, pois deve curar algumas vezes, aliviar quase sempre.
A incurabilidade, a insuportabilidade da dor e a inutilidade do tratamento não justificam a eutanásia porque: a) a incurabilidade é prognóstico e como tal falível é, e, além disso, a qualquer momento pode surgir um novo e eficaz meio terapêutico ou uma técnica de cura. No passado a lepra, a tuberculose e a sífilis eram incuráveis. Hoje, com o progresso da ciência, sua cura é possível. A esse respeito conta-nos Estácio de Lima que, a muitos quilômetros de Paris, estando a filha de um médico acometida da incurável difteria, após todos os recursos possíveis para salvá-la, diante de asfixia progressiva e cianose, que indicava sua morte próxima, seu próprio pai injetou-lhe, diante do sofrimento atroz, uma forte dose de ópio. No dia seguinte, recebeu a notícia de que Roux havia descoberto o soro antidiftérico; b) a medicina já possui poderosos meios para vencer a dor física ou neurológica; e c) o conceito de inutilidade de tratamento é muito ambíguo. Não se pode aceitar a licitude do direito de matar piedosamente, pois a vida humana é um bem tutelado constitucionalmente. O homem não tem direito de consentir em sua morte; não tem direito de matar-se, nem de exigir que outrem o mate, por não ser dono de sua própria vida. Não se pode negar a paciente portador de mal incurável a prestação de cuidados médicos vitais, sem os quais ele morreria, nem renunciar a cuidados ordinários disponíveis, ainda que sejam parcialmente eficazes, nem deixar de tratar doente comatoso mesmo se não houver alguma possibilidade de recuperação.
Maggione assevera, acertadamente, que: “A consciência ético-jurídica não admite que um terceiro se levante como juiz do direito de outrem à vida e se torne cúmplice ou auxiliador de sua morte”. Ao que completa Genival V. de França. “Ao defender-se, intransigentemente, a vida humana e se punir, incondicionalmente, qualquer forma de homicídio piedoso, cria-se um novo direito: o direito de defender a pessoa humana de si mesma. O direito sobre a vida não é um direito de propriedade. Há apenas uma probalidade de disposição. Dispõe-se de uma prerrogativa não absoluta sobre a vida”.
7. Análise de caso, filme Mar Adentro sob a perspectiva do Código Penal Brasileiro:
Mar adentro é um filme espanhol, dirigido por, Alejandro Amenábar, filme este que recebeu o Oscar em 2005 na categoria de melhor filme estrangeiro.
Trata-se da história real de Ramón Sampedro, interpretado pelo ator Javier Bardem, um jovem marinheiro espanhol, que aos vinte anos de idade já havia viajado por todo o mundo.
Ramón era um homem totalmente saudável e inteligente que em decorrência de um mergulho realizado em águas muito rasas, tornou-se paraplégico, perdendo todos os movimentos do pescoço para baixo, tornou-se um símbolo da luta pela morte.
Farto de estar há 29 anos preso numa cama, queria morrer, queria que o ajudassem a morrer. Rámon perdeu a batalha contra os tribunais espanhóis para ter o direito de dispor da própria vida, uma vez que precisava de auxilio para tal, em razão de não ter qualquer movimento do pescoço para baixo.
Inconformado com a decisão, não desistiu de seu propósito e conseguiu convencer sua amiga, Ramona Maneiro a lhe ajudar a praticar o suicídio. Ramona, por sua vez, lhe alcançou uma dose de cianureto, restando a Ramón, apenas sorver através de um canudo o veneno. Tal fato foi gravado por Ramón.
Ramona não sofreu qualquer condenação, uma vez que o codex penal espanhol estabelece o prazo prescricional de 5 anos para o caso em tela, uma vez, que o auxilio ao suicídio ocorreu em 1998 e só confessou o crime ao final de 2004.
Ante a justiça da Republica Federativa do Brasil, este caso teria outro desdobramento, Ramona poderia ser julgada e possivelmente condenada pela conduta delitiva capitulada no Art. 122 do Código Penal Brasileiro (Auxílio em suicídio), cominando uma pena de reclusão de até 6 anos, neste caso, ao observarmos o prazo prescricional descrito na norma não incriminadora do art. 109, ou seja, prescrição antes do trânsito em julgado, temos a prescrição regulada em 12 anos para os crimes se o máximo da pena for superior a 4 anos e inferior a 8.
8. Compaixão Laica e Bioética da Proteção:
O economista e filósofo indiano Amartya Kumar Sen propõe, como ideário de justiça, a igualdade de capacidades — as quais se referem à liberdade efetiva que um indivíduo tem de escolher diferentes tipos de vida, entre as alternativas possíveis, o que torna factível a opção por realizar distintos grupos de funcionamentos, aquilo que logra fazer um vivente35 — entre os membros de uma dada sociedade. Tal igualdade representa uma resposta cogente — dada especialmente a John Rawls —, sendo capaz de articular, de maneira complexa, os princípios morais de justiça e autonomia.
A definição de Sen pressupõe algo óbvio, mas não menos importante de se explicitar, pois a igualdade de capacidades só faz sentido para os viventes. Ora, um vivente tem duas dimensões inextirpáveis — nascer e morrer —, como lembram os médicos-filósofos Empédocles de Agrigento e Alcmeão de Crótona:�Ai, pobre e infeliz raça dos mortais, de que discórdias e lamentos vós nascestes!�
Alcmeão atribui a morte dos homens ao fato de não serem capazes de unir o início ao fim — um dito sagaz se lhe atribuirmos um sentido vago, sem buscar imputar-lhe um caráter de precisão38.
Neste sentido, pode-se conceber que há uma igualdade radical — em termos de suas mais profundas e íntimas raízes — entre tudo o que vive: nasce-se e morre-se, não existindo vida que não tenha �passado� por um vir-a-ser e que, necessariamente, não acabe por se esvair em um deixar-de-ser — quiçá como na �fórmula� de Anaximandro de Mileto, para o qual do apeiron (apeiron = ilimitado) tudo emerge e a ele tudo torna37. A partir de tal constatação, torna-se possível situar no mesmo plano — ou plano de imanência — todos os viventes, espaço-temporalmente limitados.
A despeito desta óbvia condição que perpassa todos os vivos, há um terceiro matiz de igualdade, o qual pode ser pensado em relação aos seres sencientes, incluído o homem: a possibilidade de sofrer. O padecimento relaciona-se à fragilidade própria da vida — um simples suspiro da eternidade —, efêmera e precária, vulnerável e corruptível. Deste modo, compreende-se que existir é (ou pode ser) sofrer. Tal é a constatação que ressoa na própria estruturação da vida humana, enquanto horizonte que perpassa as mais díspares culturas39. Ademais, o padecimento se atrela inextricavelmente à situação presente — afinal, só é possível vivenciar o agora: o passado só se faz desde que �(re)atualizado� no presente; quanto ao futuro, só passa a ser ao manifestar-se como atual — e, nisto, a espécie humana é solidária aos demais seres sencientes, os quais, até onde se saiba, não conhecem o que passou ou o que esta por vir, situando-se em um eterno presente — o qual, pode muito bem ser preenchido, em seus dias e noites, pela dor e pelo martírio.
Reconhecer que a vida tem como pressupostos, necessários, o nascimento e o passamento, acrescentando-se a isto, na experiência humana de existir, a contingência do sofrimento, é o primeiro passo para a delimitação da compaixão em termos seculares. Mas, é mister compreender que a igualdade expressa nos termos acima colocados pode ser concebida, à semelhança do descrito para as tradições sagradas, como manifestação de uma identidade profunda, a qual torna interligados — e interdependentes — os partícipes do imenso palco da existência, isto é, suas respectivas condições de viventes: Considerar que a felicidade e a infelicidade fazem parte da não-permanência vai despertar em nós, ao mesmo tempo, uma qualidade de compaixão e uma qualidade de presença junto aos sofrimentos do outro [...].
Deste modo, a compaixão se estabelece na compreensão de uma inquestionável situação de igualdade que é pertinente à vida — ou seja, nascer, sofrer (em relação aos seres sencientes) e morrer. Tal com-preensão permite ao sujeito se colocar, em exato pé de igualdade, em relação ao outro, o qual pode ser acolhido, compassivamente, em um movimento de deslocamento do �eu� em direção ao �outro� (não a superação das distinções entre ambos, mas, sim, um deslocamento de dupla direção), a partir de uma deferência irrestrita à inserção deste último no mundo41. De fato, ser compassivo não significa adotar um posicionamento paternalista — ou seja, decidir, autoritariamente, acerca do que é melhor para outrem —, fundamentado em um mero sentimento de pena ou comiseração, mas, sim, desenvolver e praticar um amplo respeito à existência, na medida em que se acolhe, incondicionalmente, aquele que sofre, ativamente, em seu âmago:
Enquanto o espaço perdurar 
E enquanto os seres sencientes permanecerem, 
Possa eu também permanecer 
Para libertar do sofrimento todos os seres sencientes.
Com base nestas conjecturas, uma �fórmula� geral para a compaixão laica poderia ser assim expressa:
(1) todos os seres vivos são finitos e perecíveis, estando inscritos no tempo, subservientes, então, aos ditames do nascimento e da morte;
(2) dentre os vivos, há aqueles capazes de padecer, os sencientes, os quais agem para evitar (ou minimizar) seus respectivos sofrimentos;
(3) o reconhecimento de (1) e (2) impõe que se aceite a igualdade radical e irrestrita que perpassa todos os seres;
(4) a atitude diante de um igual que sofre só pode ser de amparo, na medida em que, em última análise, nestes momentos cruciais, a compreensão de (3) torna inconsistente que o eu se veja como completamente independente (e apartado) do outro que sofre;
(5) amparar tal vivente em martírio — havendo distinção, mas não separação, entre aquele que �recebe� e aquele que é �recebido� — é acolher a igualdade radical imanente à condição de vivente;
(6) acolher/proteger o outro, em tal circunstância, só pode ser obtido sem julgamento, ou seja, a partir da recepção incondicional de sua situação-no-mundo (a despeito dos sofrimentos, desejos e decisões autônomas, em relação à sua própria existência);
(7) o acolhimento/proteção assim expresso é um genuíno ato de compaixão.
Toda a argumentação, apresentada nos sete passos acima, tem como horizonte a proteção do outro, a partir do entendimento de que o ethos, a �morada�, só se atualiza nas relações entre as pessoas. Assim, agir por compaixão laica é, na verdade, proteger o outro — especialmente em situações de desamparo, nas quais sua autonomia esteja muito limitada —, dando-lhe condições para exercer um mínimo de autodeterminação em relação às (graves) decisões a serem tomadas. Esta é, precisamente, uma das proposições da bioética da proteção, que pode ser vista como o ato primordial e que, devidamente pensado, pode servir como referencial teórico-prático, pois pretende resgatar aquele que é, provavelmente, o significado originário da palavra grega ethos, que tem justamente o sentido de amparo, guarita e abrigo�; em suma, de proteção.
Vale ressaltar que esta proteção pode ser aplicada:
(1) às relações interpessoais — médicos-pacientes, por exemplo;
(2) às relações entre Estado e cidadãos — como aquelas que se estabelecem em saúde pública entre formuladores e gestores de políticas sanitárias e a população destinatária de tais políticas — no que a bioética da proteção pode ser aproximada da concepção de hospitalidade incondicional defendida por Jacques Derrida em suas últimas obras; e
(3) às relações entre o homem, os demais seres vivos e o planeta — como seria o caso de políticas ambientais que visassem proteger o óikos (�casa comum�) indispensável à sua sobrevivência contra catástrofes.
Inscrevem-se, no primeiro caso, os aspectos relativos ao debate moral sobre o fim da vida, no contexto da bioética da proteção e da compaixão laica.
 
9. Posicionamento do Grupo:
O direito à vida é uma garantia constitucional assegurada pelo artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil:
“Todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito a vida, à liberdade, à igualdade, á segurança e a propriedade privada, nos termos seguintes”. 
Nesta senda, nem mesmo o Estado poderia violar este bem jurídico relevante que é a vida, nem mesmo através de emenda à Constituição, uma vez que, de acordo com o artigo 60, § 4º, IV da Carta Constitucional, o artigo 5º é cláusula pétrea, imutável, não objeto de processo legislativo de emenda à constituição.
Todavia, ao detentor deste direito, não há qualquer óbice em querer dispor deste, uma vez que esta garantia constitucional limita o poder do Estado face o individuo, e não limita o individuo de sua própria vontade.
De fato, o direito à vida é indisponível, mas em face ao arbítrio estatal, não é indisponível face ao interesse daquele que já não encontra dignidade em sua existência. Na história de Ramom Sampedro, retratada no filme “Mar adentro”, a personagem central, já não via qualquer possibilidade de retomar a sua dignidade, que segundo ela, havia ficado no fundo do mar, quando do acidente que lhe deixou paraplégico.
Tratar do tema eutanásia é ainda muito cediço,é como navegar por águas desconhecidas, pois analisamos, concordamos ou não com a eutanásia, sem estarmos “despedidos” de nossa dignidade, discutimos o assunto sem saber de fato a proporção da situação de quem não consegue movimentar-se do pescoço para baixo, ou mesmo aquele que encontra-se acometido de uma patologia severa e dolorosa.
O primeiro passo para uma análise eficaz acerca do tema, é nos desvincularmos de qualquer dogma religioso quanto a eutanásia, não trata-se pois, esta observação, em seguir no descrédito religioso, mas apenas no que se refere ao tema eutanásia.
Por fim, apesar de não haver subsídios para que a Eutanásia passe a ser um direito do Homem, respaldado no princípio constitucional da Dignidade da Pessoa Humana, o enfrentamento da matéria e uma possível normatização merece acolhida, tendo em vista que não será imposta, mas, sim, possibilitada a quem tiver interesse, uma faculdade, contribuindo assim, para a aplicabilidade da Constituição Federal, que deve ser vista a partir de um novo paradigma, qual seja o da vida como bem individual e por cada um possível de disponibilidade.
Referências:
BATISTA, Rodrigo Siqueira Batista; SCHRAM, Fermim Roland. A Bioética da Proteção e a Compaixão Laica: O Debate Moral Sobre a Eutanásia. Rio de Janeiro: IFRJ, 2005.
DINIZ, Maria Helena. O Estado Atual do Biodireito. 4ª ed. ver. e atual. conforme a Lei n. 11.105/2005. São Paulo: Saraiva, 2007.
http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=12102, Acesso em: 26 out. 2013
http://www.oabsp.org.br/palavra_presidente/2005/81/. Acesso em: 26 out. 2013
http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11733. Acesso em: 26 out.2103.
LEPARGMEUR, Hubert. Fundamentos da Bioética. 2ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2004.
Material disponível do Moodle da Facitec. Acesso em: 26 out. 2013.

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