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O DIREITO À MORTE DIGNA E AS DIRETIVAS ANTECIPADAS DA VONTADE

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O DIREITO À MORTE DIGNA E AS DIRETIVAS ANTECIPADAS DA VONTADE 
 
Lavínia Assis Bocchino 
1
 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
 A ideia de morrer parece, a princípio, ser algo que muito assusta as pessoas, contudo 
faz parte do ciclo natural da vida. A morte ganha ainda mais obste quando se trata de adiantá-
la, como ocorre nos casos da eutanásia ativa direta e do suicídio assistido. 
 O termo eutanásia abarca inúmeros sentidos que comportam aceitações sociais 
diferentes e alguns deles serão abordados aqui, como a eutanásia passiva (ortotanásia), 
eutanásia ativa direta e indireta ou de duplo efeito, a mistanásia, também chamada de 
eutanásia social, e a distanásia. 
 A discussão sobre a “morte digna” está intrinsecamente ligada à concepção, por vezes 
subjetiva, dos direitos constitucionais da “dignidade da pessoa”, da “liberdade” e do “direto à 
vida”. Neste sentido, será analisado o porquê certos procedimentos, como eutanásia ativa 
direta e o suicídio assistido, são criminalizados no Brasil, como também, o porquê de 
procedimentos, como a ortotanásia e a eutanásia ativa indireta vieram a ser aceitas pelo 
Conselho Federal de Medicina. Mesmo assim, o Brasil não tem uma regulamentação clara 
acerca dessas práticas. 
 Diante de uma doença incurável e terminal que vem causando muito sofrimento ao 
paciente, sem perspectiva de alcance de um bem-estar, não pode este antecipar sua morte, 
pois tais meios são penalizados no Brasil. Contudo, talvez, como será explicado neste 
trabalho, seja possível o paciente minimizar este quadro por meio das diretivas antecipadas da 
vontade, dispostas na Resolução 1995/2012 pelo Conselho Federal de Medicina. Estas 
oferecem a faculdade do paciente, nos casos de doença incurável e terminal que impeça a 
expressão da autonomia, escolher determinados tratamentos ou recusá-los, como por 
exemplo, recusar-se a procedimentos extraordinários, suspender o uso de meios artificiais que 
lhe prolonguem a vida, entre outros. Essas diretivas da vontade, também conhecidas como 
“testamento vital”, precisam ser devidamente regulamentadas no Brasil, para deixarem de ser 
meramente subjetivas. 
 
1
 Graduanda em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Monitora de Introdução ao 
Estudo do Direito I e II. 
 
 
 
2 EUTANÁSIA 
 
 A eutanásia vem do grego euthanatos, eu (bem ou bom), thanatos (morte), seria então, 
entendida como a “boa morte”, ou seja, uma morte sem sofrimento e dor. Em 1623, no século 
XVII, o termo foi utilizado e criado pela primeira vez pelo filósofo inglês Francis Bacon na 
sua obra historia vitae et mortis (história da vida e morte), acrescentando um novo requisito, 
só consideraria como eutanásia se houvesse o auxílio de um médico: 
 
[...] em meu julgamento, os médicos devem adquirir habilidades e prestar atenção 
em como o moribundo pode deixar a vida mais fácil e silenciosamente. A isso eu 
chamo a pesquisa sobre eutanásia externa (euthanasia exteriori) ou morte fácil do 
corpo (AS, 1963, p. 594-5). 
 
 Ao longo da história, segundo Maria de Fátima Freire de Sá e Diogo Luna Moureira 
(2015), constatou-se condutas de eutanásia, por exemplo, na época do império romano, 
quando os Césares voltavam o polegar para baixo, permitindo que os gladiadores derrotados 
fossem condenados à morte, livrando-os da desonra e da agonia que se encontravam; na era 
medieval, era entregue aos guerreiros feridos o punhal da misericórdia para que se 
suicidassem, assim, evitariam a dor prolongada antes de morrer, como também, cair em mãos 
inimigas. Neste último caso, Maria Helena Diniz (2001) entende que não se configura 
eutanásia, mas sim “induzimento ao suicídio”. 
 Roxana Cardoso Brasileiro Borges (2005) acredita que, originalmente, a eutanásia 
fosse apenas a morte sem sofrimento, na forma menos penosa, e não, necessariamente, teria o 
objetivo de provocar a morte. Mas que, hoje, no Brasil, só seria “eutanásia a morte 
provocada em doente com doença incurável, em estado terminal e que passa por 
sofrimentos, movida por compaixão ou piedade em relação ao doente. E constitui crime de 
homicídio, perante o atual Código Penal” (BORGES, 2005, p. 233 - 234, grifo nosso), ou 
seja, qualquer pessoa, inclusive, médico, que mate o enfermo por piedade será punido pela 
conduta “matar alguém”, art. 121, § 1º do Código Penal (homicídio simples). 
 Por outro lado, Leonard Michael Martin (1998) propõe que “se reserve a palavra 
eutanásia exclusivamente para denotar atos médicos que, motivados por compaixão, 
provocam precoce e diretamente a morte a fim de eliminar a dor” (MARTIN, 1998, p.183). 
Enquanto que, a morte promovida por alguém não-médico, por motivos de piedade, deveria 
mesmo ser considerada crime de homicídio por misericórdia ou auxílio ao suicídio. 
 
 
 No Código Penal brasileiro, não há literal menção quanto a eutanásia, enquadrando-a 
de forma indireta e pouco clara como crime de homicídio simples, sendo sua pena reduzida 
em razão da intenção “nobre” do autor da conduta, a piedade para com o sofrimento do 
doente: 
Art. 121. Matar alguém: 
§ 1º - Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou 
moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação 
da vítima, o juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço. (BRASIL.1940) 
 
 O ordenamento jurídico brasileiro de forma falha, incompleta e obscura criminaliza a 
eutanásia. Tendo em vista que, utiliza termos vagos, como “por motivo de relevante valor 
social ou moral”, deixando subentendido a intenção piedosa do agente. E, até mesmo o 
sentido do próprio parágrafo não expressa de forma clara como se configuraria a eutanásia, 
abarcando-a apenas na ação de matar, sem levar em consideração outras circunstâncias como, 
o consentimento ou não do doente, a existência de seu sofrimento, sua submissão a doença 
crônica ou fase terminal da doença, sem possibilidade de cura. 
 O sentido da palavra eutanásia ganha novos sentidos no decorrer dos tempos, como 
bem menciona Torío López citado por Gisele Mendes de Carvalho: 
 
A eutanásia, na atualidade, não se refere apenas aos casos de pacientes terminais que 
querem pôr fim aos seus sofrimentos através de uma morte rápida e indolor, mas 
abrange também hipóteses igualmente complexas, como as relacionadas à morte de 
recém-nascidos com malformações congênitas, de pacientes em estado vegetativo 
irreversível, embora não necessariamente terminais, e das vítimas de acidentes ou 
enfermidades cujos graves padecimentos impedem provocar-se si mesmas a própria 
morte (pacientes tetraplégicos e vítimas de doenças degenerativas, como esclerose 
lateral amiotrófica) (LÓPEZ, 1989/1990, p.219 apud CARVALHO, 2011, p.163) 
 
 Para Edison Tetsuzo Namba (2015) a eutanásia apresenta duas características sempre 
predominantes: “(A) morte provocada por sentimento de piedade, compaixão; (B) a pessoa 
visada é acometida de sofrimento e doença incurável” (NAMBA, 2015, p. 219). 
 Não obstante, as definições de quando se configura ou não a eutanásia distinguem-se 
quanto a provocação da morte por médico ou não-médicos, como já explicado acima, e 
quanto ser o doente portador de doença incurável, que não ameace diretamente a vida, ou 
estiver em estágio terminal. Neste último caso, para Leonard M. Martin (1998), deve-se levar 
em consideração a definição do significado de saúde: 
É perfeitamente compreensível que uma pessoa tetraplégica, consciente, lúcida e 
angustiada peça a morte para por fim ao seu sofrimento. Se a saúde significa 
ausência de doença e de enfermidades incapacitantes e se a autonomia significa que 
 
 
a pessoa tem liberdade de morrer quando e como quiser, faltando outros elementos é 
difícil encontrar argumentos para negar este pedido […] Quando, porém, se entende 
a saúde como bem-estar físico, mental, social e espiritual da pessoa,abri-se todo um 
leque de possibilidades para falar na saúde do doente crônico e para promover seu 
bem-estar. (MARTIN, 1998, p.184) 
 
 A Organização Mundial de Saúde (OMS) define saúde como “um estado de completo 
bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades”. 
Enquanto que, a medicina curativa, que busca a cura, somente compreende saúde, como a 
ausência de doenças (MARTIN, 1998). 
 Um caso famoso, na história, foi o do grande físico Stephen Hawking acometido aos 
21 anos da doença, incurável, Esclerose Lateral Amiotrófica, que causa a morte dos neurônios 
que possibilitam o controle dos músculos voluntários. Mesmo assim, o Hawking conseguiu 
viver até o 76 anos de idade e alcançar o bem-estar físico, mental, social e, inclusive, 
contribuiu para avanços nas áreas da física e astronomia, com a criação da teoria de que os 
buracos negros emitem radiação, entre outras. Como bem alude Maria Helena Diniz, ao citar 
Eugenio C. Calón, “[…]Indivíduos que, apesar de seus defeitos físicos, podem, como prova a 
história, contribuir magnificamente para a edificação permanente de nossa civilização” 
(CALÓN apud DINIZ, 2001, p. 314 ). 
 Neste sentido, Leonard M. Martin (1998) mantém-se apenas na defesa da eutanásia em 
caso de paciente terminal ao afirmar que “se a saúde significa ausência de doença e se o 
doente está com dores atrozes e numa situação onde não há mínima condições de efetuar uma 
cura, parece não ter sentido falar da saúde do paciente terminal e a eutanásia pode se 
apresentar como proposta razoável” (MARTIN, 1998, p.185, grifo nosso). O problema está 
quando, mesmo com um “leque de possibilidades” ao doente crônico, que não esteja em fase 
terminal, nenhuma delas consegue promover o bem-estar do paciente. 
 Desta forma, talvez seria, também, razoável pensar em eutanásia para doentes 
incuráveis que não estejam em fase terminal, para que estes pudessem morrer dignamente. 
Como por exemplo, no caso de Ramón Sampedro, marinheiro espanhol, que aos 25 anos de 
idade ficou tetraplégico devido a um acidente que ocorreu enquanto mergulhava. Durante 28 
anos permaneceu nesta condição, e como não conseguia cometer suicídio, pediu ao judiciário 
espanhol para que fosse permitido a outrem matá-lo, para que então, o seu sofrimento 
terminasse. Sampedro, lutou arduamente contra o ordenamento jurídico espanhol que 
criminaliza a eutanásia e o suicídio assistido, alegando ter o direito de dispor da sua vida. 
Contudo, a justiça espanhola não concedeu. Então, uma amiga de Sampedro, movida por 
 
 
tamanha piedade injetou-lhe uma substância letal, ocasionando sua morte, ela foi detida, mas 
não condenada por falta de provas, assumindo o “crime” apenas depois de sua prescrição. É 
importante ressaltar que, Ramón Sampedro acabou colocando em xeque a questão do que 
seria a dignidade humana. 
 
2. 1 Classificações da Eutanásia 
 
 A eutanásia se divide em eutanásia ativa e passiva, que se distinguem quanto ao ato. A 
eutanásia passiva, conhecida também, como ortotanásia, consiste em uma omissão que 
resultará na morte natural do paciente, como por exemplo, a suspensão de técnicas artificiais. 
Em sentido diverso, a eutanásia ativa ocorre por ato comisso, pode ser dividida em direta ou 
indireta. Quando direta antecipa a morte sem sofrimento, como por exemplo, uma injeção 
letal, enquanto que, de forma indireta, se liga ao princípio do duplo efeito, ou até mesmo, por 
alguns autores é chamada de eutanásia de duplo efeito, visa o alívio da dor (efeito primário), 
não tem a intenção de antecipar a morte, mas de forma secundária acaba acelerando o 
processo de morrer (efeito secundário), ocorre por exemplo, em aplicações não letais de 
analgésicos que aliviam a dor, mas provocam efeitos colaterais que encurtam a vida. 
 Ademais, Edison Tetsuzo Namba (2015) classifica a eutanásia, também, quanto “as 
consequências do ato e consentimento do paciente” em: 
Eutanásia voluntária atende-se a uma vontade expressa do doente, que seria um 
sinômino de suicídio assistido. 
Eutanásia involuntária, ocorre se o ato é realizado contra a vontade do enfermo. 
Na eutanásia não voluntária a morte é levada a cabo sem que se conheça a vontade 
do paciente. (NAMBA, 2015, p. 220) 
 
 De forma contrária à ideia da “boa morte” que traz a eutanásia, há a distanásia e a 
mistanásia (eutanásia social) que resultam em uma morte com bastante sofrimento, 
diferenciando entre si quanto ao momento que ocasionam a morte. 
 A distanásia recorre a utilização de meios inúteis, fúteis, desnecessários, pois não 
visam prolongar a vida ou sequer curam o enfermo, apenas aumentam o sofrimento deste, não 
permitindo que sua morte chegue. A futilidade ocorre diante de casos que são claramente 
irreversíveis, como é caso por exemplo, de manter um recém-nascido anencéfalo em 
ventilação artificial, mesmo sendo seu quadro vegetativo irreversível. Segundo Leonard M. 
Martin (1998): “Enquanto a eutanásia se preocupa prioritariamente com a qualidade de vida 
 
 
humana na sua fase final - eliminando o sofrimento -, a distanásia dedica a prolongar ao 
máximo a quantidade de vida humana, combatendo a morte como grande inimigo” 
(MARTIN, 1998, p. 172 - 173, grifo nosso). 
 Maria Helena Diniz (2001) destaca, inclusive, que não seria economicamente 
vantajoso manter gastos exorbitantes em tratamentos no viés da distanásia, principalmente, 
diante da realidade precária da saúde brasileira, em que o gastos em medidas inúteis poderiam 
ser revertidos para quem realmente tem chance de sobreviver. 
 A mistanásia, também conhecida como eutanásia social, termo que Leonard M. Martin 
considera equivocado, pois a mistanásia em nada se relaciona a ideia de “boa morte” presente 
na eutanásia, apesar de também antecipar a morte, nada tem de boa, ao contrário, suas 
consequências são graves e sofridas. Pontua Leonard M. Martin (1998) que a mistanásia 
ocorre quando: (1) houver erro médico por imperícia, negligência ou imprudência; (2) pela 
má prática do uso da medicina com a intenção de prejudicar o paciente ou tirar proveito dele; 
(3) ou por omissão de socorro estrutural, acontece, principalmente, em países sub 
desenvolvidos, em que os doentes e deficientes não chegam sequer a serem pacientes. 
 Outro termo que merece destaque é o suicídio assistido ou o auxílio ao suicídio. 
Segundo Maria Helena Diniz (2001) trata-se de “ hipótese em que a morte advém de ato 
praticado pelo próprio paciente, orientado ou auxiliado por terceiro ou por médico” (DINIZ, 
2001, p. 301). Na Holanda, este procedimento é institucionalizado e dá-se pela injeção no 
paciente de uma dose letal, mas é restrito aos casos em que a doença é incurável e quando os 
métodos paliativos são ineficazes em fazer cessar seu sofrimento, entre outros requisitos. 
 Conforme Roxana Cardoso B. Borges (2005) “O auxílio ao suicídio de pessoa que não 
se encontra em estado terminal e com fortes dores, da mesma forma, não se caracteriza como 
eutanásia, mas como o simples auxílio a suicídio, previsto no Código Penal. Trata-se de 
participação material” (BORGES, 2005, p. 234). O auxílio ao suicídio é conduta penalizada 
no ordenamento jurídico brasileiro, prevista no art. 122 do Código Penal “Induzir ou instigar 
alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça” (BRASIL.1940). 
 
2.1.1 Ortotanásia (eutanásia passiva) 
 
 A ortotanásia é classificada como eutanásia passiva, neste caso busca o alívio da dor 
do paciente incurável de uma forma omissa, conforme Maria de Fátima F. de Sá e Diogo L. 
Moureira (2015) “pode consistir tanto na não iniciação de um tratamento como na suspensão 
do mesmo” (SÁ, MOUREIRA, 2015, p. 87). Deste modo, diferente da eutanásia ativa direta, 
 
 
em que se antecipa a morte - por exemplo, injetando no paciente uma substância letal -, na 
ortotanásia a intenção é que a morte ocorra de forma natural, no seu devidotempo. 
 Leonard M. Martin (1998) acredita que a resistência que há em relação a eutanásia 
ativa direta é que nesta somente haverá a eliminação do sofrimento e da dor com a eliminação 
antecipada do portador da doença. Por isso, o autor defende a ortotanásia, como um 
procedimento de equilíbrio entre os extremos, pois mesmo que não cure o doente terminal, 
tem como escopo fundamental cuidar do mesmo, promovendo-lhe o bem-estar físico, mental 
e social, enquanto este não vem a falecer naturalmente: 
 
A medicina tecnocientífica tende a resolver o dilema caindo em um dos dois 
extremos. Ou escolha eutanásia - reconhecendo sua impotência e, neste caso, 
optando por abreviar o sofrimento, abreviando a vida, alegando que já que não pode 
mais curar a pessoa não há sentido em prolongar a agonia - ou escolhe a distanásia - 
ofendida o seu brio, optando por resistir à morte até as últimas consequências, 
mostrando uma obstinação terapêutica que vai além de qualquer esperança de 
beneficiar o doente ou promover seu bem-estar global. (MARTIN, 1998, p.188) 
 
 Pela proposta do Anteprojeto de Reforma para a Parte Especial do Código Penal, o 
ordenamento jurídico brasileiro tipificaria de forma específica a conduta da eutanásia, seria o 
art. 121, §3º, e excluiria a ilicitude da ortotanásia no art. 121, §4º, tornando-a atípica: 
Eutanásia 
§ 3o Se o autor do crime agiu por compaixão, a pedido da vítima, imputável e maior, 
para abreviar - lhe sofrimento físico insuportável, em razão de doença grave: 
Pena - Reclusão, de três a seis anos. 
Exclusão de ilicitude 
§ 4o Não constitui crime deixar de manter a vida de alguém por meio artificial, se 
previamente atestada por dois médicos, a morte como iminente e inevitável, e desde 
que haja consentimento do paciente, ou na sua impossibilidade, de ascendente, 
descendente, cônjuge, companheiro ou irmão. 
 
 Ademais, a Resolução 1.805/2006 do Conselho de Federal de Medicina dispôs e 
publicou acerca da ortotanásia: 
Na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar 
ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, 
garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao 
sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do 
paciente ou de seu representante legal. (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 
2006) 
 
 
 
 Contudo, esta proposta foi suspensa nos autos da Ação Civil Pública n° 
2007.34.00.014809-3, da 4ª Vara Federal, pelo Excelentíssimo Juiz Roberto Luis Luchi 
Demo. Conforme Gisele Mendes de Carvalho (2011), a resolução 1.931/2009 do Conselho 
Federal de Medicina, no Código de Ética Médica, em seu art. 41, parágrafo único, passa a 
aceitar a ortotanásia ao “admitir expressamente o direito de todo paciente aos cuidados 
paliativos” (CARVALHO, 2011, p.165): 
 
É vedado ao médico: 
[...] 
Art. 41 - Abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu 
representante legal. 
Parágrafo único - Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer 
todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou 
terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade 
expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal. 
(CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 2009) 
 
 Observa-se também, no caput deste artigo, a vedação expressa da eutanásia ativa 
direta, mesmo que a pedido do paciente ou do seu representante legal, veda ainda a prática da 
distanásia quando não admite “ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis”. Já no art. 36, §2º, 
admiti-se a eutanásia ativa indireta ou de duplo efeito: 
 
Art. 36 - Abandonar paciente sob seus cuidados. 
§ 2°- Salvo por motivo justo, comunicado ao paciente ou aos seus familiares, o 
médico não abandonará o paciente por ser este portador de moléstia crônica ou 
incurável e continuará a assisti-lo ainda que para cuidados paliativos. (CONSELHO 
FEDERAL DE MEDICINA, 2009) 
 
 
 Segundo Maria Helena Diniz (2001), a ortotanásia, eutanásia passiva ou 
paraeutanásia: 
 
Consiste no ato de suspender medicamentos ou medidas que aliviem a dor, ou 
deixar de usar meios artificiais para prolongar a vida de um paciente em coma 
irreversível, por ser intolerável o prolongamento de uma vida vegetativa sob o 
prisma físico, emocional e econômico, acatando solicitação do próprio enfermo ou 
de seus familiares. (DINIZ, 2001, p.310, grifo nosso) 
 
 Importante ressaltar que a ortotanásia pode consistir na suspensão de procedimentos 
extraordinários, mas jamais na suspensão dos ordinários (tratamentos médicos vitais), ou seja, 
que são imprescindíveis para a manutenção do bem-estar do paciente. Assim, segundo, Gisele 
Mendes de Carvalho (2011) a ortotanásia sempre será voluntária (com o consentimento do 
paciente ou seu representante legal) e direta (ter a intenção de aliviar a dor). Mas, se ocorrer 
 
 
de forma indireta, com a recusa do paciente em submeter-se aos procedimentos vitais, haverá 
a antecipação da morte do enfermo. 
 O art. 31 da Resolução 1.931/2009 do Conselho Federal de Medicina, no Código de 
Ética Médica, “parece” dar autonomia ao paciente, mas ao mesmo tempo estabelece uma 
exceção, limitando-a: 
 
É vedado ao médico: 
[...] 
Art. 31 - Desrespeitar o direito do paciente ou de seu representante legal de decidir 
livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou terapêuticas, salvo em caso 
de iminente risco de morte. (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 2009, 
grifo nosso) 
 
 Neste sentido, dispõe o paciente ou seu representante de optarem pela não execução de 
práticas diagnósticas ou terapêuticas, desde que o paciente não esteja em iminente risco de 
morrer. Entenda-se neste caso, “decidir livremente” sobre as práticas extraordinárias, pois as 
ordinárias são obrigatórias, independente da vontade do paciente. Assim sendo, tendo o 
paciente condição de sobrevida, em iminente risco de morrer, poderá o médico para reanimá-
lo utilizar de procedimento extraordinário, mesmo sem o consentimento do paciente. Tal 
situação gera uma questão um tanto polêmica, pois haverá a violação do direito do paciente de 
poder exercer sua autonomia de decidir aceitar ou recusar o procedimento extraordinário. 
Roxana C. B. Borges (2005) compreende que “o médico não está obrigado a prolongar o 
processo de morte do paciente, por meios artificiais, sem que este tenha requerido que o 
médico assim agisse. Além disso, o médico não é obrigado a prolongar a vida do paciente 
contra a vontade deste” (BORGES, 2005, p. 235). 
 Do ponto de vista de Gisele M. de Carvalho (2011) é totalmente inconstitucional o art. 
31 do Código de Ética Médica, pois “autoriza o médico a desrespeitar o direito do paciente ou 
de seu representante legal de decidir livremente sobre a execução de práticas diagnósticas ou 
terapêuticas em caso de iminente risco de morte” (CARVALHO, 2011, p. 170). 
 Por outro lado, Maria Helena Diniz (2001) mostra que neste quadro haverá o conflito 
de dois princípios da bioética, quais sejam a “beneficência”, que visa a medicina promover o 
bem ao paciente, e a “autonomia” do mesmo. Por exemplo, se o paciente ou o seu 
representante recusam terapia extraordinária de reanimação preferindo o procedimento da 
ortotanásia (deixar morrer, podendo o médico oferecer cuidados paliativos), exercerá sua 
autonomia. Porém, o médico pelo princípio da beneficência, reanima o paciente, que estava 
correndo risco iminente de morrer, desrespeitando seu direito de escolha. Esta manobra do 
 
 
médico dificilmente obterá sucesso e pode acabar tornando-se uma distanásia (promoção de 
procedimentos inúteis, que resultam em medicina fútil, pois não prolongam a vida e nem dão 
fim ao sofrimento do paciente). 
 
3 DIREITO À “MORTE DIGNA” E FUNDAMENTAÇÃO CONSTITUCIONAL 
 
 Os avanços tecnológicos damedicina, mesmo que nem sempre consigam curar, 
tentam proporcionar o bem estar do paciente e prolongar sua vida. No entanto, quando trata-se 
de doenças incuráveis, sem qualquer perspectiva de readaptação do paciente a sua nova 
realidade, os métodos artificiais utilizados podem acabar se tornando um empecilho à garantia 
de uma morte digna. Hoje, ainda que a preocupação com o bem estar seja maior do que com o 
tempo que se vive, é complexo impor à alguém a maneira que se viva, posto que, qualidade é 
um termo muito subjetivo. Por isso, quando não respeitada a vontade do paciente, seu direito 
de liberdade e de “dispor” de sua própria vida são feridos e, ao invés de lhe proporcionar 
qualidade, apenas torna mais lento e sofrido seu processo de morte, tornando o direito de 
“morrer dignamente” inalcançável. Como bem pontua Maria Helena Diniz (2001): 
 
A consciência jurídica atual, diante da indiferença de um mundo tecnicista e 
insensível, precisa ficar atenta à maior de todas as conquistas: o respeito absoluto e 
irrestrito pela dignidade humana, que passa a ser um compromisso inafastável e um 
dos desafios para o século XXI. (DINIZ, 2001, p.300) 
 
 Deste modo, é importante pensar o que realmente é dignidade humana, se o direito à 
vida significa que podemos dispor dela da forma como cada um bem entender, e se é 
adequado que o público intervenha na autonomia do particular em definir quando este pode 
pôr fim à sua vida mesmo diante de um quadro sem perspectiva de cura ou melhora. 
 Romeo Casabona aludido por Gisele M. Carvalho (2011) considera que “a vida é um 
valor relativo, e como tal só existe enquanto seja mantido um certo nível de “qualidade”, o 
que implica a capacidade do indivíduo de manter autoexperiência e relação ou comunicação 
com os demais, ou de assumir os próprios atos.” ( CASABONA apud CARVALHO, 2011, 
p.169) 
 A “qualidade de vida” está ligada, também, à disposição que a pessoa tem sobre os 
seus direitos consagrados no art. 5º da Constituição Federal, como a liberdade, a intimidade, a 
dignidade, entre outros: 
 
 
 
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude 
de lei; III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou 
degradante; […] IV - é inviolável a liberdade de consciência e de crença […] ; X - 
são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, 
assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua 
violação; […] XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou 
ameaça a direito. (BRASIL, 1998) 
 
 Segundo Roxana C. B Borges (2005) a Constituição Federal assegura o direito e não o 
dever à vida, ou seja, a pessoa não é obrigada a viver, tanto o é, que o suicídio não é 
criminalizado no Brasil, mas tem o direito de viver, por isso, a conduta “matar alguém” é 
tipificada no ordenamento jurídico brasileiro. Contudo, a questão fica muito complexa quando 
o doente incurável não consegue cometer suicídio para dar fim ao seu sofrimento, deste modo, 
precisando de outrem que lhe mate. A ortotanásia não é criminalizada, pois permite que a 
morte do paciente ocorra no seu tempo de forma natural. Todavia, quando trata-se de 
eutanásia ativa direta ou suicídio assistido são procedimentos penalizadas nos arts. 121, §1 e 
122 do Código Penal, respectivamente, uma vez que, elas antecipam a morte do paciente. 
Estas duas práticas têm o objetivo de dar fim ao sofrimento tanto do paciente, como também, 
dos seus amigos e familiares, e levam em consideração o consentimento do doente incurável. 
 Roxana C. B Borges (2005) ressalta que não se pode confundir o direito de morrer 
dignamente com o direito de morrer “este tem sido reivindicado como sinônimo de eutanásia 
e auxílio ao suicídio, que são intervenções que causam a morte. Não se trata de defender 
qualquer procedimento que cause a morte do paciente, mas de reconhecer sua liberdade e sua 
autodeterminação” (BORGES, 2005, p. 231). Por outro lado, é importante, perceber que o 
objetivo da eutanásia ativa direta e do suicídio assistido não é a morte, e sim dar fim ao 
sofrimento, sendo a morte uma consequência. Em contrapartida a posição de Roxana, 
segundo, Gisele M. de Carvalho (2011): 
 
Se considerarmos que a vida humana é uma realidade suscetível de valoração ao 
longo de sua existência, e que, portanto, não é suficiente a identificação do bem 
jurídico protegido nesses casos com a mera existência biológica, alcançaremos 
soluções para o problema da eutanásia que sejam compatíveis com a Constituição. 
(CARVALHO, 2011, p. 167) 
 
 Tendo em vista que, o direito à vida não é absoluto no ordenamento jurídico brasileiro, 
até porque algumas condutas que “violam” esse direito são isentas de pena no Código Penal 
brasileiro, por isto, abre-se espaço para a discussão sobre a possibilidade da eutanásia ativa e 
do suicídio assistido. Por exemplo, nos casos do “estado de necessidade” e da “legítima 
 
 
defesa”, presentes nos arts. 24 e 25, respectivamente, do Código Penal, mesmo que essas 
condutas se enquadrem no tipo penal “matar alguém” e na culpabilidade do agente, pois este 
teve a intenção (dolo) de matar, elas são condutas isentas de pena. Nestes casos, isso ocorre, 
porque o terceiro critério para criminalizar uma conduta não foi preenchido, a 
“antijuridicidade”, uma vez que, não é possível exigir que o agente agisse de outra maneira 
dentro das circunstâncias que a lei pontua. 
 Gisele M. de Carvalho (2011) acredita que “a participação de terceiros no suicídio, 
seja na forma de omissão de auxílio a quem abandona voluntariamente a própria vida, seja na 
forma de não continuação ou não iniciação de um tratamento médico vital, resulta 
perfeitamente de acordo com o texto constitucional” (CARVALHO, 2011, p. 171). 
 A eutanásia ativa e o suicídio assistido também são condutas que se enquadram no 
tipo penal “matar alguém” e na culpabilidade, pois o agente tem o dolo de matar. Ademais, 
são condutas, criminalizadas, pois o ordenamento jurídico as considera, também, 
antijurídicas. Porém, por vezes, a medicina e o Estado não conseguem promover o bem estar 
de quem está à mercê de doença incurável sem perspectiva de melhora na qualidade de vida, 
apenas limitada ao sofrimento prolongado na espera de sua morte e, ao desgate emocional e 
econômico dos seus familiares e amigos. Nesta situação, procedimentos como a eutanásia e o 
suicídio assistido, até então, parecem ser a única solução, mesmo que resultem na morte do 
paciente. 
 Corroborando a este viés, Maria de Fátima F. de Sá e Diogo L. Moureira (2015) 
afirmam: 
 
A antecipação da morte não só atenderia aos interesses do paciente de morrer com 
dignidade, como daria efetividade ao princípio da autodeterminação da pessoa em 
decidir sobre sua própria morte, a exercitar a sua liberdade. Os que se opõem a 
possibilidade do querer morrer sustentam, dentre outros argumentos, ser dever do 
Estado preservar, a todo custo, a vida humana, entendida esta como bem jurídico 
supremo. (SÁ, MOUREIRA, 2015, p.10) 
 
 
 Se a qualidade, termo relativo para cada indivíduo, é mais importante que a 
quantidade que se vive, então, deveria ser ético-jurídico que o paciente, ou seu representante 
legal, decida como irá dispor da sua vida. Ainda que, opte por antecipar sua morte, a fim de 
eliminar seu sofrimento, mesmo não estando em fase terminal, mas devido à sua doença 
incurável sem perspectiva de alcance ao bem-estar global. Por isso, em razão ao direito à 
liberdade, à dignidade da pessoa e à vida, consagrados na Constituição, deveria o Estado e a 
 
 
medicina ter o dever de garantirem uma “morte digna” ao paciente, desde que com o seu 
consentimento, e estando este devidamente informado sobre a situação de sua saúde. 
 
4 UMA SOLUÇÃO A SER PENSADA: DIRETIVAS ANTECIPADAS DA VONTADE 
 
 Para tentar resguardar a vontade do paciente tem-seutilizado os chamados 
“testamentos vitais” (living will). São documentos que não têm regulamentação no 
ordenamento jurídico brasileiro, mas pode ser admitida sua validade. Cuidam, nos casos em 
que a doença do paciente não lhe permite mais impor sua autonomia, de dizer os tratamentos 
a que este se recusaria, como também, àqueles que teria preferência. Desta forma, servem 
para limitar a intervenção médica. Conforme Maria de Fátima F. de Sá e Bruno T. de O. 
Naves (2018): 
 
Hoje, as diretivas antecipadas de vontade, conhecidas por testamentos vitais, têm a 
função de dar ao paciente o poder de recusar tratamentos e, também, de escolher, 
dentre aqueles possíveis, o tratamento que lhe convém, o que significa que estamos 
diante do exercício da autonomia privada do paciente. Acontece que esse 
instrumento serve para a manifestação de vontade para o futuro, em caso de estado 
de inconsciência. (SÁ, NAVES, 2018, p.400) 
 
 Estes “testamentos em vida” tiveram respaldo, no Brasil, a partir da resolução 
1.995/2012 do Conselho Federal de Medicina que “dispõe sobre as diretivas antecipadas da 
vontade dos pacientes”. Segundo o Conselho Federal de Medicina: 
 
Para o presidente do CFM, Roberto Luiz d’Avila, a diretiva antecipada de 
vontade é um avanço na relação médico-paciente. Segundo ele, esse 
procedimento está diretamente relacionado à possibilidade da ortotanásia (morte 
sem sofrimento), prática validada pelo CFM na Resolução 1.805/2006, cujo 
questionamento sobre sua legalidade foi julgado improcedente pela Justiça. A 
existência dessa possibilidade não configura eutanásia, palavra que define a 
abreviação da vida ou morte por vontade do próprio doente, pois é crime. 
“Com a diretiva antecipada de vontade, o médico atenderá ao desejo de seu 
paciente. Será respeitada sua vontade em situações com que o emprego de 
meios artificiais, desproporcionais, fúteis e inúteis, para o prolongamento da 
vida, não se justifica eticamente, no entanto, isso deve acontecer sempre 
dentro de um contexto de terminalidade da vida”, ressaltou. (CONSELHO 
FEDERAL DE MEDICINA, 2012) 
 
 É importante salientar que, nesta resolução, as diretivas de vontade do paciente 
prevalecerão sobre o parecer de qualquer terceiro não médico, conforme o art. 2, §3º, e o 
médico, por sua vez, deverá considerá-las, art. 2, caput. Porém, se houver alguma ilicitude 
presente no documento, como pedidos de eutanásia ativa direta ou suicídio assistido (condutas 
 
 
penalizadas pelo Código Penal), de acordo com o art. 2, §2º, “o médico deixará de levar em 
consideração as diretivas antecipadas de vontade do paciente ou representante que, em 
sua análise, estiverem em desacordo com os preceitos ditados pelo Código de Ética 
Médica” (CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, 2012). Se o paciente optar no seu 
testamento vital por eutanásia ativa indireta (de duplos efeito) ou ortotanásia (eutanásia 
passiva) caberá ao médico respeitar, pois são condutas isentas de pena e aceitas na medicina 
brasileira. Pontua Maria de Fátima F. de Sá e Bruno T. de O. Naves (2018): 
 
Como negócio jurídico, as diretivas estão subordinadas ao atendimento de requisitos 
nos planos de existência, validade e eficácia. Nesse ponto, acreditamos que a 
declaração de vontade deva ser feita por pessoa capaz, através de instrumento 
público ou escrito particular, com reconhecimento de firma e endosso testemunhal. 
[...] Tal manifestação de vontade pode ser revogada a qualquer tempo. (SÁ, 
NAVES, 2018, p.402) 
 
 Ademais, Maria Helena diniz (2001) disponibiliza um modelo nomeado “diretrizes 
antecipadas relativas a tratamentos de saúde outorga de procuração” (DINIZ, 2001, p. 206- 
210) na sua obra “O estado atual do biodireito”. Também, Júlio Moraes Oliveira (2013), no 
artigo “Direitos da Personalidade, Bioética e Biodireito: Uma Breve Introdução” apresenta 
um trecho do testamento vital de uma médica que foi publicado na Revista Veja em setembro 
de 2012
2
. 
 Ligado ao direito da autonomia do paciente está o “consentimento informado”, 
fundamental para que o paciente não faça escolhas contra si mesmo. Neste sentido, Maria 
Helena Diniz (2001) questiona: “Poder-se-ia exaltar esse poder decisório do doente, ante o 
fato de que a autonomia de sua vontade pode ser uma arma contra ele mesmo, porque a 
 
2
 Júlio M. Oliveira destaca que: “O assunto tomou tamanha proporção que foi tema de capa da Revista 
Veja, de 12 de setembro de 2012, intitulada “Eu decido meu fim”. A referida reportagem traz um 
trecho de um testamento vital de uma médica geriatra, Ana Claudia Arantes, de 44 anos, que 
testemunha regularmente o óbito de pacientes em sua rotina profissional. Nesse sentido, merece destaque 
o referido trecho: 
Eu, Ana Cláudia Arantes, diante de uma situação de doença grave em progressão e fora de 
possibilidade de reversão, apresento minhas diretrizes antecipadas de cuidados à vida. Se chegar a 
padecer de alguma enfermidade manifestamente incurável, que me cause sofrimento ou me torne incapaz 
para uma vida racional e autônoma, faço constar, com base no princípio da dignidade da pessoa 
humana e da autonomia da vontade, que aceito a terminalidade da vida e repudio qualquer intervenção 
extraordinária, inútil ou fútil. Ou seja, qualquer ação médica pela qual os benefícios sejam nulos ou 
demasiadamente pequenos e não superem os seus potenciais malefícios. As diretrizes incluem os devidos 
cuidados: admito ir para UTI somente se tiver alguma chance de sair em menos de uma semana; não 
aceito que me alimentem à força. Se não puder demonstrar vontade de comer, recuo qualquer 
procedimento de suporte à alimentação; não quero ser reanimada no caso de parada respiratória ou 
cardíaca.” (LOPES; CUMINALE apud OLIVEIRA, 2013, p. 14-28) 
 
 
decisão, em regra vale conforme o seu grau de esclarecimento ou informação?” (DINIZ, 
2001, p. 337) 
 O dever do médico de informar o paciente sobre o seu quadro de saúde tem base 
constitucional, no art. 5, XIV, “é assegurado a todos o acesso à informação...” (BRASIL, 
1988). Como também, no art. 22 do Código de Ética Médica brasileira, na resolução 
1931/2009 do Conselho Federal de Medicina, que veda o médico a “deixar de obter 
consentimento do paciente ou de seu representante legal após esclarecê-lo sobre o 
procedimento a ser realizado, salvo em caso de risco iminente de morte” (CONSELHO 
FEDERAL DE MEDICINA, 2009). Deste modo, esclarece Gisele M. de Carvalho (2011) que 
“ a obtenção do consentimento informado, na atualidade, consiste não só em um dever do 
facultativo, mas se transformou em um verdadeiro direito do usuário da assistência sanitária” 
(CARVALHO, 2011, p. 162) 
 Alertam Maria de Fátima F. de Sá e Diogo L. Moureira (2015) que mesmo tendo o 
paciente direito a obtenção da verdade, o médico precisa encontrar a melhor forma de 
informar ao paciente sobre a situação de sua saúde, para “não despejar, naquele encontro, 
palavras frias e calculistas, a fim de não alarmar ainda mais a pessoa que já se encontra 
fragilizada” (SÁ, MOUREIRA, 2015, p.77). 
 Alguns países já estão avançados quanto a estas questões, o Estados Unidos da 
América, por exemplo, tem desde 1991 regulado o The Patient Self-Determination Act - 
PSDA (Ato de Determinação do paciente). Esta lei diz que o médico tem o dever de informar 
ao paciente seu direito em escolher procedimentos, assim como, recusá-los, abrindo espaço 
para autodeterminação do paciente e sua participação nas decisões sobre sua própria saúde. 
Ademais, o hospital deve recomendar que o paciente faça advance directives(diretivas 
antecipadas) em caso de incapacidade futura que possa impedir sua autonomia. Segundo 
Maria de Fátima F. de Sá e Diogo L. Moureira (2015) as advance directives se 
consubstanciam de três formas: 
 
O living will ou “testamento em vida” pretende estabelecer os tratamentos médicos 
indesejados, caso o paciente incorra em estado de inconsciência ou esteja em estado 
terminal. São mais comuns às disposições sobre recusa de entubação e de 
ressuscitação (do not ressuscitate orders). 
Pelo durable power of attorney of health care, “poder duradouro do representante 
para cuidados com a saúde” - ou, simplesmente, mandato duradouro, estabelece-se 
um representante para decidir e para tornar as providências cabíveis pelo paciente. 
O advance core medical directive, “diretiva do centro médico avançado”, diz 
respeito a estado terminal. Por esse instrumento o paciente estabelece os 
procedimentos a que não quer se submeter e nomeia um representante. (SÁ, 
MOUREIRA, 2015, p.79). 
 
 
 
 Percebe-se que o PSDA é um documento bem mais completo e desenvolvido, além de 
que possui legislação própria, mas ainda, a legislação Federal do EUA não permite a 
eutanásia ativa direta e o suicídio assistido. Alguns poucos países como Holanda e Bélgica, 
desde 2002, e alguns estados do EUA, como Washington (2008), Vermont (2013), Montana 
(2009), Oregon (desde 1997) e Califórnia (2015), já permitem tais práticas. Colombia e 
Uruguai admitem o perdão judicial do “homicídio piedoso”. Quanto ao Brasil, e no geral, os 
outros países, se penaliza o auxílio ao suicídio e apenas atenua-se a pena do agente que 
pratica eutanásia ativa direita, devido a intenção “piedosa” deste. 
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
 O direito à dignidade da pessoa deve perdurar por toda sua vida, inclusive, até o fim 
dessa jornada, com a morte. Antecipar esse estágio ou até mesmo parar de lutar contra ele, a 
fim de cessar o sofrimento, proveniente de doença incurável, independente de ser terminal ou 
não, mas que lhe tira o gozo de viver e a perspectiva de readaptação, é um direito de cada um. 
 Neste viés, um conceito que vem se moldando ao longo da história é a “eutanásia”, 
que em suas origens carregava o sentido de uma “boa morte”, seria a maneira de deixar partir, 
sem dor, aquele que vive em sofrimento. Contudo, a ideia de antecipar a morte ou, até 
mesmo, de deixar morrer, causa muita repulsa diante da importância que recebe o conceito 
“vida”. Por isso, é necessário repensarmos, neste embate de “vida versus morte”, o que 
realmente seria “viver” com dignidade e liberdade, e as consequências que a perda desses 
direitos impactam. No Brasil, condutas como a eutanásia ativa direita e o suicídio assistido, 
que antecipam a morte, são penalizadas, por outro lado, condutas como a eutanásia passiva 
(ortotanásia) e a eutanásia de duplo efeito, que não retardam a morte, mas deixam-na ocorrer 
de forma mais natural, já vêm sendo aceitas pela medicina brasileira. 
 Uma solução para fazer jus ao direito de liberdade do paciente, limitando as 
intervenções médicas, veio com as “diretivas antecipadas da vontade”. Essa inovação vem 
permitindo que a pessoa se autodetermine em caso de doença superveniente, que a torne 
inconsciente e/ou a impeça de fazer escolhas. Desta forma, as diretivas da vontade, também 
chamadas de “testamentos vitais”, consistem em um documento para o futuro, em que o 
paciente define quais tratamentos terá que receber, como também, tornar claro aqueles que se 
recusa. Infelizmente, no Brasil, as diretivas da vontade não foram devidamente 
regulamentadas, tendo caráter, ainda, subjetivo. 
 
 
 
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graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos 
que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os 
sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a 
vontade do paciente ou de seu representante legal. . Disponível em: 
<http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2006/1805_2006.htm> Acesso em: 23 jun. 
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