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Direito Penal - criminologia

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| CRIMINOLOGIA
CRIMINOLOGIA 
CONCEITOS INICIAIS
CRIMINOLOGIA
	“Estudo e a explicação da infração legal; os meios formais e informais de que a sociedade se utiliza para lidar com o crime e com os atos desviantes; a natureza das posturas com que as vítimas desses crimes são atendidas pela sociedade; e, por derradeiro, o enfoque sobre o autor desses fatos desviantes”. 
(Sérgio Salomão Shecaira) 
	A criminologia torna a estudar a vítima, bem como o crime, o criminoso e o controle social dentro de um olhar mais amplo. 
CRIMINALIZAÇÃO
	É o resultado de processos de definição e seleção que escolhem determinados indivíduos aos quais se atribui o status de criminoso. 
· CRIMINALIZAÇÃO PRIMÁRIA
	Na criminalização primária teremos a tipificação do delito, dentro de uma instância legislativa. 
· CRIMINALIZAÇÃO SECUNDÁRIA
	Está relacionada a atuação dos agentes públicos diante dos tipos incriminadores. Exemplo: atuação da polícia e do Ministério Público como principais agentes.
	O fator decisivo é a atuação dos agentes do Estado. No momento em que a polícia escolhe investigar alguém ou aborda uma pessoa na rua para averiguar se está a cometer algum delito, esta atuação não é neutra. Assim, teremos uma atuação de maneira “X” quando se está diante de determinados sujeitos, como a população negra, por exemplo, que será mais perseguida pelos agentes do Estado, e teremos um tratamento “Y” para outra camada da população, em tratamento mais respeitoso ao longo do processo penal. 
· CRIMINALIZAÇÃO TERCIÁRIA
	A criminalização terciária se dará dentro do próprio sistema penal. Exemplo: temos a criminalização primária do tráfico, a abordagem de um indivíduo na rua (normalmente homem com capacidade econômica ativa e negro), o oferecimento da denúncia e sentença penal condenatória. Após isso, o ingresso no sistema prisional.
	No ingresso junto ao sistema prisional, o processo de criminalização não se encerra, pois ali está se ratificando determinado estereótipo. 
	Dessa forma, o sujeito não só passa a se compreender como indivíduo estigmatizado, enquanto indivíduo criminoso, mas também a sociedade vem a definitivamente, considerá-lo como indivíduo criminoso. 
	CRIMINALIZAÇÃO PRIMÁRIA
	CRIMINALIZAÇÃO SECUNDÁRIA
	CRIMINALIZAÇÃO TERCIÁRIA
	TIPIFICAÇÃO DO DELITO
(INSTÂNCIA LEGISLATIVA).
	ATUAÇÃO DOS AGENTES PÚBLICOS DIANTE DOS TIPOS INCRIMINADORES. Ex.: polícia e Ministério Público.
	DENTRO DO PRÓPRIO SISTEMA PENAL. Ex.: sujeito compreendido como indivíduo estigmatizado por si mesmo e pela sociedade.
APROFUNDANDO: durante o estudo da Constituição Federal, aprendemos que não há penas perpétuas em nossa legislação. No entanto, esse efeito estigmatizante da criminalização terciária sofrido pelo sujeito que cumpre pena é perpetuo, pois sempre será visto como sujeito criminoso, ainda que tenha concluído o cumprimento da reprimenda penal. Dessa forma, nunca será entendido como um sujeito socializado ou ressocializado, visto que nunca foi compreendido de tal forma, pois ainda que retorne ao convívio social, continuará estigmatizado.
	CIFRAS OCULTAS/ZONAS ESCURAS/”DARK NUMBER”/”CIFRE NOIR”
 Estamos nos referindo a quantidade de crimes que sequer chegam ao conhecimento do Estado. Exemplo: estupro.
	CIFRAS CINZAS
Nestes crimes, até pode ser que o Estado tome conhecimento do delito, mas não poderá atuar. Havendo um conhecimento espontâneo, por parte do Estado, dos delitos de ação penal pública condicionada à representação, a ação penal ainda está condicionada à manifestação da vítima do seu interesse na persecução criminal.
	CIFRAS AMARELAS
“Quando o crime é praticado pelo Estado contra a sociedade, por exemplo, no crime de abuso de autoridade, se a vítima não toma as providências por receio de futuras represálias, em criminologia, esse fato é conhecido como cifra amarela” (PEREIRA, 2015).
	CIFRAS DOURADAS
Fatos que chegaram ao conhecimento do Estado, mas que não conseguiram, efetivamente, gerar uma persecução criminal que tenha êxito ao final da aplicação da pena, pois se operou a extinção da punibilidade antes da conclusão do processo.
	CIFRAS VERDES
São os casos em que o Estado não consegue identificar os responsáveis por crimes ambientais (não chegou ao conhecimento/não conseguiu identificar responsáveis a ponto de formalizar processo criminal).
SELETIVIDADE PENAL
	Quando falamos em seletividade penal, partimos da constatação de que o Direito Penal não é neutro. A aplicação das normas penais leva em conta quem é o sujeito que está praticando o delito e quem é a vítima que está sofrendo. A depender desses sujeitos, a ação do Estado se modifica não apenas no âmbito de atuação dos agentes. O Estado não atua de forma neutra, de forma que primeiro seleciona quem pretende punir, para depois criminalizar a prática da conduta que habitualmente é desempenhada por esse sujeito. Ex: crime de vadiagem após a abolição da escravatura que punia pessoas negras, tendo em vista que muitos encontravam-se sem nenhuma ocupação ou fonte de renda, tentando sobreviver a partir de modelos informais. 
	Parando para analisar a tipificação do aborto, Barroso em sua sustentação oral junto ao STF no caso de aborto de anencéfalo trouxe um argumento bastante interessante: no Brasil, o aborto só é uma conduta criminosa porque os homens não engravidam.
	A tipificação do aborto também possui um destinatário, é uma norma direcionada. Ainda dentro dessa tipificação, vamos encontrar além da seletividade penal de gênero, a seletividade penal racial, pois uma mulher que possua boa condição econômica e queira abortar, irá em uma clínica particular onde dificilmente o Estado tomará conhecimento (cifra oculta). Por outro lado, se tivermos diante de uma mulher pobre que não possua condições de ir a uma clínica privada e toma determinado remédio abortivo, fatalmente terá uma hemorragia que desencadeará sua ida a um hospital público com a sua tentativa de aborto reportada às autoridades públicas.
	A seletividade penal é a negação da neutralidade dos tipos incriminadores, das normas penais, da atuação dos agentes penais, da própria execução penal e daquilo que utilizamos como ressocialização para designar.
(!): existem pessoas que nunca serão consideradas ressocializadas, simplesmente porque já são negadas pela sociedade como indivíduos que fazem parte do nosso ciclo tomador de decisões. Já outras pessoas, ainda que cumpram penas e venham, eventualmente responder a processo criminal, nunca serão entendidas como indivíduos que tenham ficado de fora da tomada de decisões e que por serem respeitadas socialmente, são visibilizadas, o que acontece em grande parte nos delitos de direito penal econômico.
CRIMINOLOGIA, DOGMÁTICA E POLÍTICA CRIMINAL
	Entre a criminologia, a dogmática e a política criminal temos três âmbitos autônomos que não se confundem, mas guardam entre si uma unidade teleológica-funcional. 
	A criminologia irá se debruçar sobretudo sobre as causas/origem do crime. A dogmática irá se atentar para a decidibilidade de conflitos. Por último, a política criminal irá se atentar para formas de controle e combate, diminuição da violência. 
	Quando a criminologia olhar para um fato de furto, por exemplo, irá questionar o motivo de tal ilícito ter sido praticado; a dogmática vai se voltar para a solução do conflito (no caso do furto, pena de 1 a 4 anos); e a política criminal possui um olhar voltado para o futuro.
	CRIMINOLOGIA
	DOGMÁTICA
	POLÍTICA CRIMINAL
	causas/origem do crime
	decidibilidade de conflitos
	controle e combate, diminuição da violência
CIÊNCIA TOTAL DO DIREITO PENAL
	Fran Von Liszt pensava em um direito penal que agregasse dentro uma só ciência: dogmática, a política criminal e criminologia, mas quando indagado sobre qual prevaleceria diante de eventual conflito, afirmara que seria a dogmática. A partir disso, muitas críticas foram feitas ao autor alemão por Jorge Figueiredo Dias, Luiz Flávio Gomes e Antônio Garcia-Pablos de Molina. 
CRIMINOLOGIA É CIÊNCIA?
	Para Sérgio Salomão Shecaira, a maior parte dos autores define a criminologiacomo uma ciência. Não há como negar que a grande maioria vê um método próprio, um objeto e função atribuíveis a criminologia. Por outro lado, existe uma parcela da doutrina afirmando que a criminologia é extraída do senso comum onde os seus argumentos não guardariam qualquer cientificidade. 
	A criminologia é uma ciência diferenciada, não trabalhando com conclusões e pretensões inabaláveis, não engessando seu conteúdo, mesmo porque os crimes e os enunciados destes, vão mudando com a história, os processos criminais vão se alterando, bem como a forma de se pensar, de se trabalhar consequências jurídicas. Dessa forma, a criminologia vai caminhando e se alterando também. 
· CRIMINOLOGIA: SABER X PRÁXIS
	Dentro de uma primeira linha, há a definição da criminologia como saber. Dentro de uma segunda linha, temos a definição da criminologia como prática. Em um terceiro viés, mais atual, há o reconhecimento da criminologia como bifronte, sendo tanto saber quanto prática. 
	A criminologia enquanto saber é sustentada por Carl Schmitt. Já Gustav Radbruch que fazia oposição ao pensamento de Schmitt trabalha o jurista com a sua condição de político, operando politicamente. Atualmente a criminologia possui natureza bifronte.
Obs.: o Direito Penal, basicamente estuda o crime e suas consequências. Os tipos incriminadores terão o preceito primário que define a conduta e o preceito secundário que é a pena. Trabalha-se com subsunção, com o suporte fático, a incidência de uma norma jurídica, entre outras. O método jurídico-dogmático trabalha com o encaixe da conduta com o tipo incriminador dentro de uma lógica dedutiva, pois sempre partimos da premissa geral e abstrata para a partir da norma identificar situações menores.
BREVE HISTÓRICO
	A divisão didática das fases de vingança tuteladas pelo Direito Penal é um pensamento retirado por Bitencourt na obra de Magalhães de Noronha que coloca que o estudo do delito na humanidade poderia ser resumido em três grandes blocos: vingança divina, vingança privada e vingança pública.
	É claro que não é tão simples, uma vez que o sentimento religioso/espiritual acaba perpassando por todas essas fases. Ainda hoje, na pós-modernidade, esse sentimento religioso, de maneira bem residual, interfere de forma determinante na elaboração de tipos incriminadores. Existem tipos incriminadores que serão sugeridos a partir de uma bandeira religiosa, ainda há influência e na origem do Brasil, por ser uma colônia portuguesa, ainda temos uma relação muito grande entre crime e pecado, que está presente em nossos tipos penais. Como exemplo, temos o adultério, que foi crime até 2005, e o aborto, ainda é prática criminosa, tendo grande interferência religiosa no Congresso. 
Pensando na história da humanidade, é difícil categorizar as épocas de cada tipo de vingança, seja a privada, divina ou pública, tendo em vista que o pensamento religioso perpassou todos os momentos e não temos, propriamente, uma sucessão. Os paradigmas vão se misturando ao longo da história, onde o que percebemos é a modificação das espécies que são desempenhadas a partir do argumento do cometimento de crime e da imposição de uma medida punitiva. 
“Nas sociedades primitivas, os fenômenos naturais maléficos eram recebidos como manifestações divinas (“totem”) revoltadas com a prática de atos que exigiam reparação. Nessa fase, punia-se o infrator para desagravar a divindade, punia-se com rigor, antes, com notória crueldade, pois o castigo deve estar em relação com a grandeza do Deus ofendido. Pode-se destacar como legislação típica dessa fase o Código de Manu, embora legislações com essas características tenham sido adotadas no Egito, na China, em Israel (Pentateuco) e na Babilônia”. 
Nas sociedades primitivas teremos o tratamento da pena como manifestação da vingança divina, então, o homem é muito pequeno diante da divindade, as penas precisam ser muito rigorosas, para que se retratem, diante da divindade, a tutela dos conflitos basicamente desempenhada em nome destas divindades.
“Evolui-se, posteriormente, para a vingança privada, que poderia envolver desde o indivíduo isoladamente até o seu grupo social, com sangrentas batalhas, causando, muitas vezes, a completa eliminação de grupos”. (BITENCOURT) 
Aqui teremos a vingança de homem contra homem, em situações mais complexas de tribos contra tribos. Paulatinamente caminha-se do paradigma da vingança divina para a vingança privada, sendo que a religião perpassa todas elas, inclusive a vingança privada. 
“Com a evolução social, para evitar a dizimação das tribos, surge a Lei de Talião, determinando a reação proporcional ao mal praticado: olho por olho, dente por dente. Este é o maior exemplo de tratamento igualitário entre o infrator e vítima, representando, de certa forma, a primeira tentativa de humanização da sanção criminal. A Lei de Talião foi adotada no Código de Hamurabi (Babilônia), no Êxodo (hebreus) e na Lei das XII Tábuas pelos romanos”. (BITENCOURT).
Já marca um grande avanço quando comparado as normas cruéis do Código de Manu, pois se tentava estabelecer uma proporcionalidade entre delito e pena, é considerado uma grande humanização ao período mais primitivo que as sanções eram completamente desproporcionais à infração praticada. É interessante que não se consegue perceber a humanização e proporcionalidade do código de Hamurabi, se não se entende o avanço dentro do contexto da época. Lógico que hoje, caso um sujeito mate o filho de outrem e se entender como proporcional que aquele que teve o filho morto possa, como sanção proporcional, matar o filho do outro, isso não seria visto como elemento de humanização ou proporcionalidade, sendo vista hoje como desproporcional, mas para a época foi um avanço humanitário. Até porque, já havia uma segurança maior quanto aos limites da intervenção punitiva, o limite seria dado conforme a gravidade do delito, sendo o primeiro marco de humanização, que acaba influenciando outros códigos. 
“Mas, com a melhor organização social, o Estado afastou a vindita privada, assumindo o poder-dever de manter a ordem e a segurança social, surgindo a vingança pública em seus primórdios, manteve a absoluta identidade entre poder divino e poder político. A primeira finalidade reconhecida desta fase era garantir a segurança do soberano, por meio da aplicação da sanção penal ainda pela crueldade e desumanidade, característica do direito criminal da época. Mantinha-se, ainda, forte influência do aspecto religioso com o qual o Estado justificava a proteção do soberano” (Bitencourt). 
Então, se pensamos, por exemplo, nas monarquias absolutistas, existe uma interferência religiosa muito grande, mas Estado e Igreja não são mais a mesma coisa, pois, nos primórdios existia uma absoluta identidade entre poder divino e político. Quando o Estado chama para si o poder punitivo, rompe-se um pouco dessa ótica, então deixa de haver a identidade absoluta, passando a ter uma ruptura, mas ainda com uma influência religiosa muito grande. 
Antes de começarmos a falar da Grécia antiga, que dentro do olhar de Magalhães de Noronha que tenta ser passado por Bitencourt, temos no Direito Penal uma sucessão de óticas acerca do exercício da vingança. 
Temos em um primeiro momento, a vingança divina, depois a vingança privada, sendo que esta poderia se dar tanto de homem contra homem ou em situações mais complexas, de tribo contra tribo; e antes do período moderno, vamos chegando na vingança pública, pois o Direito Romano exerce papel importante nessa transição. Assim, o controle punitivo vai se apresentar didaticamente dentro dessas fases. 
“Na Grécia Antiga, em seus primórdios, o crime e a pena a se inspirar no sentimento religioso. Ao lado da vingança pública, os gregos mantiveram por longo tempo a vingança divina e formas de vingança que ainda não mereciam ser denominadas pelo Direito Penal”. (BITENCOURT). 
Ainda se trabalhava muito com a vingança divina e outras vinganças, muito distante do que vemos como o direito penal hoje.
“Na Roma Antiga, a pena também manteve seu caráterreligioso e foi, igualmente, palco das diversas formas de vingança. Mas logo os romanos partiram para a separação entre direito e religião. De qualquer sorte, em nenhumas destas fases de vingança houve a liberação total do caráter místico ou religioso da sanção penal, tampouco se conheceu a responsabilidade penal individual, que somente a partir das conquistas do Iluminismo passou a integrar os mandamentos mais caros do direito penal”. (BITENCOURT) 
Isso porque aqui a responsabilidade poderia atingir toda a família, por mais que já tivéssemos um começo de titularização do poder punitivo pelo Estado, esta ainda não era exclusiva, além disso, quando era exercida, não era pensada a partir da ótica pessoal, havia um reflexo que ia transcender a figura do sujeito criminoso. 
“O direito Romano oferece um ciclo jurídico completo, constituindo até hoje a maior fonte originária de inúmeros institutos jurídicos. Roma é tida como síntese da sociedade antiga, representando um elo entre o mundo antigo e o novo, na primitiva organização jurídica da Roma monárquica prevaleceu o Direito Consuetudinário, que era rígido e formalista. Depois, a Lei das XII Tábuas (sec. V a, C,) foi o primeiro código romano escrito”. (BITENCOURT). 
Primeiro temos o pensamento jurídico romano como consuetudinário e posteriormente a formação da tradição romano-germânica escrita. A lei das XII Tábuas é um marco por ser a primeira norma escrita romana. 
“Ainda nos primeiros tempos da realeza surge a distinção entre os crimes públicos e privados, punidos pelos ius publicum e ius civile, respectivamente. Crimes públicos, eram a traição ou conspiração política contra o Estado (perduelo), além do assassinato (parricidium), enquanto os demais eram crimes privados – delicia – por constituírem ofensas aos indivíduos, tais como furto, dano, injúria, etc.” (BITENCOURT). 
Aqui, o direito romano diferenciava os crimes públicos dos privados, onde os públicos eram punidos pelo Estado, que tinha titularidade exclusiva do poder punitivo, dentro de uma ótica aproximada da vingança pública, mas os delitos privados eram punidos a partir da figura do pater familias, que ia exercer esse controle.
ESCOLA CLÁSSICA E ESCOLA POSITIVA
	A escola clássica que tem como grandes expoentes Carrara, Beccaria e Bentham, fundamenta a ideia do crime no livre arbítrio. Nesse período há o surgimento dos códigos e primeiras sistematizações legislativas relacionadas às matérias, bem como a presença de uma preocupação muito grande na metafísica no sentido de se elaborar conceitos básicos, princípios e outros elementos relacionados ao crime.
- De que forma o crime vai ser explicado?
	Será explicado como fruto da escolha humana, fruto do livre arbítrio, sendo a pena fundamentada na retribuição onde o criminoso causa um mal para a sociedade e o Estado retribui o mal que ele causou, ocasionando-lhe um mal proporcional por intermédio da pena.
	É importante anotar que o pensamento de Beccaria não era retributivista. Na obra de Beccaria, sobre em “dos delitos e das penas”, há uma forte influência de olhar prevencionista para a pena.
	A fundamentação da responsabilidade penal se dá pela culpabilidade. Essa ideia com relação ao crime e a pena vai ser absolutamente rompida na escola positiva.
- O que os teóricos da escola positiva vão dizer?
	Os principais expoentes da escola positiva são Lombroso (o grande nome da escola e do século XIX para o direito penal e a criminologia), Ferri e Garofalo. 
	Há forte influência do pensamento evolucionista, da ideia de Darwin e da evolução das espécies que acabam sendo um componente decisivo para a explicação do crime e do criminoso, no sentido que da mesma forma que as espécies evoluem, também podem regredir ou degenerar. Assim, a explicação do fenômeno criminoso era dada a partir da evolução desses dois processos: evolução e degeneração. A figura do criminoso, portanto, não teria evoluído com um cidadão normal, comum. Esse era o pensamento de Lombroso ao analisar as diferentes tipologias de criminosos, dentre elas, a figura mais conhecida: criminoso nato.
- Dentro desse período, na escola positiva do século XIX, o que iremos ter?
	Não se pensava no estudo do crime como um estudo científico e para que o crime passasse a ser pensado de maneira científica, o indivíduo deveria transpor os métodos utilizados para as ciências e então, também, para o estudo do crime e do criminoso. 
	A escola positiva vai utilizar métodos experimentais típicos de pesquisas científicas para a explicação do crime. O crime passa a ser explorado da seguinte forma: o crime não era fruto de uma escolha humana, mas de um determinismo, condição inerente a determinados sujeitos. Se não há uma escolha, não há que se falar em culpa. Dessa forma, será aplicada uma medida de segurança porque o indivíduo é perigoso. 
	É dentro dessa lógica que surge o pensamento prevencionista, ou seja, não se aplicará uma sanção para punir o indivíduo, mas sim uma medida de segurança com a finalidade de prevenir futuros delitos e resguardar a sociedade do perigo que este indivíduo criminoso apresenta para ela.
	O método utilizado é tipicamente experimental, científico, utilizado pelas ciências naturais do período. É por isso que muitos autores irão situar o nascimento da criminologia na escola positiva, pois a partir desse momento passa a ser pensada enquanto ciência, ainda que se aprimorando de métodos científicos típicos das ciências naturais. 
	Quando pensamos na escola clássica, alguns autores sugerem que se a criminologia surgiu nesse período, se trataria de uma fase pré-científica, conectada ao pensamento clássico. Entretanto, o surgimento efetivo da criminologia se daria na escola positiva com o surgimento das escolas biológicas da criminologia que terão no pensamento de Lombroso um dos seus principais marcos paradigmáticos e teóricos.
OBJETO DA CRIMINOLOGIA
CRIME
	A dogmática trabalha o crime enquanto fato típico + ilícito + culpável. Porém, o crime pode ser pensado a partir de diversas perspectivas e não apenas a partir da dogmática. Quando pensamos em conceito de crime, podemos identificar, dentre outros, um conceito:
i) legal: o conceito legal está definido na Lei de Introdução ao Código Penal;
Decreto-Lei 3.914/41, Art. 1º. Considera-se crime a infração penal a que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.
ii) formal: crime é a conduta que irá se subsumir a redação de um tipo incriminador;
iii) material: crime é a conduta que viola um bem jurídico;
iv) analítico: crime é fato típico, ilícito e culpável. Também é conhecido como conceito estratificado;
v) criminológico: a explicação vai variar de acordo com cada teoria criminológica. Ex: segundo a perspectiva etiológica, o crime estará relacionado à essência de determinados comportamentos e, portanto, à essência de determinadas pessoas. Essa perspectiva caminha por um conceito universalista de crime. Entretanto, se nos adaptamos às teorias do conflito, abandonaremos qualquer perspectiva universalista. 
	O crime, portanto, não será um objeto exclusivo da dogmática penal. Para a criminologia, no entanto, como o crime deve ser encarado como um fenômeno comunitário e problema social, tal conceituação é insuficiente. Ademais, conforme pensamento de Shecaira, “que fatores levam os homens, vivendo em sociedade a promover um fato humano corriqueiro a condição de crime?”. 
- Quando pensamos em delito enquanto objeto da criminologia, de que maneira ele será introduzido?
	Inicialmente, a explicação que a criminologia nos dará para a origem do delito é: a incidência de determinado fato na população (1. Incidência massiva de determinada conduta na população) que gerará uma aflição com relação ao fato praticado (2. Incidência aflitiva do fato praticado). O fato praticado persiste no tempo e no espaço (3. Persistência espaço-temporaldo fato), até porque não haveria sentido na criminalização de uma conduta absolutamente pontual que não venha a persistir de modo a justificar uma repressão por parte do Estado. Por fim, existe o inequívoco consenso de que esta conduta deve ser reprimida (4. Inequívoco consenso). 
	Esse é o pensamento tradicional da criminologia que posteriormente será objeto de críticas por parte de teorias mais modernas. Tradicionalmente temos na existência do crime a ideia de que estamos diante de uma conduta não desejada pela comunidade de uma maneira geral e, justamente por não ser desejada, por ser algo que viola um consenso social, deve ser rechaçada. 
CRIMINOSO
O CAUSALISMO vai trabalhar o criminoso como um sujeito possuidor de livre arbítrio e fundamentar a pena na retribuição do mal causado, ou seja, o criminoso causa um mal para a sociedade e o Estado retribui lhe adequando um mal proporcional ao delito. Já o prazo da pena, segundo o causalismo, seria determinado pelo grau de lesividade da conduta que iria fundamentar a retribuição do mal que o sujeito causou. Então, o tempo de duração da privação de liberdade seria proporcional ao mal causado pelo agente.
Já o POSITIVISMO nega o livre arbítrio e fundamenta o crime a partir de um viés determinista (o sujeito nasce criminoso ou estará por alguma razão determinado a praticar o delito), de maneira que a medida de segurança será trabalhada para a prevenção de novas condutas lesivas e se dará por prazo indeterminado, já que não se quer retribuir o mal, mas sim prevenir o perigo. Assim, a medida de segurança vai se impor enquanto houver o perigo.
	O Código Penal Brasileiro ainda é fortemente influenciado por esse olhar do século XIX, já que na redação do Código – não que ainda seja esse o entendimento dos nossos tribunais – a medida de segurança tem prazo de duração indeterminado. Veja que a redação do CP ainda é construída dentro dessa influência marcante do pensamento da escola positiva.
APROFUNDANDO: Não faz sentido impor a medida de segurança por mais tempo do que aquele indicado pela pena abstrata do delito, já que o Brasil trabalha com índices elevadíssimos de reincidência. Quando um determinado sujeito cumpre pena privativa de liberdade e retorna ao convívio social, via de regra, se pensarmos de maneira realista, ele reincidirá na prática criminosa e, nem por isso, ele deixará de ser posto em liberdade. O mesmo raciocínio, de alguma maneira, acaba sendo transportado para a medida de segurança já que nunca teremos uma garantia de que o sujeito não tornará a praticar um fato lesivo e, nem por isso, teremos uma justificativa legítima a ponto de justificar e fundamentar uma segregação eterna da privação de liberdade. 
No CORRECIONALISMO temos a identificação de que o crime está relacionado à condição humana ou a fatores ambientais ligados ao homem, mas dentro da ideia de que é necessário haver uma postura pedagógica e piedosa do Estado. A máxima do pensamento correcionalista é que não há criminosos incorrigíveis, mas criminosos não corrigidos. Há aqui uma influência do pensamento evolucionista e da ideia determinista, mas não determinista em um sentido absoluto, já que o pensamento correcionalista acreditará na possibilidade de modificação dessa situação e de correção do indivíduo criminoso.
VÍTIMA
	A vitimização primária se dá quando a vítima sofre o crime. Ex: quando uma mulher sofre uma agressão doméstica.
	A vitimização secundária ocorre no momento em que as vítimas buscam as instâncias formais de controle, mas são, por alguma razão, tratadas com desprezo pelos representantes do Estado. Também por essa razão, a vitimização secundária é chamada de sobrevitimização. Ex: “em briga de marido e mulher ninguém mete a mulher. Não faremos a ocorrência. Volte para o seu lar”. 
	Quando pensamos na sobrevitimização não podemos focar apenas na ação do Estado por intermédio das autoridades policiais, apesar de esta ser obviamente mais evidente em razão da sua localização em “área de trincheira”. A sobrevitimização não se esgota na atuação da autoridade policial, pois podemos ter a sua presença pelos mais diversos representantes do Estado e das instâncias formais de controle, como, por exemplo, membros do Ministério Público e do Poder Judiciário quando negam a prestação devida à vítima de determinado crime. 
APROFUNDANDO: uma situação em que isso foi analisado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos foi no caso Simone André Diniz, quando houve a identificação por parte da Comissão que existe um racismo estrutural no Brasil. Nesse caso, Simone foi vítima de racismo porque identificou em um anúncio de jornal a informação “precisa-se de empregada de cor branca” e ao candidatar-se à vaga e ser questionada quanto a sua cor, foi dispensada em razão de ser negra. Ato contínuo, quando Simone reporta às autoridades a prática de racismo, o entendimento que se teve é que não estaria configurada tal prática, pois a anunciante queria empregadas de cor branca, dado que estava traumatizada com empregadas negras que teriam tratado mal o seu filho. Por conta disso, o caso foi arquivado no tratamento do crime de racismo. O fato passou pela Delegacia, Ministério Público e, por fim, pelo juiz, que admitiu o arquivamento. Assim, identifica-se todo um sistema estruturalmente racista feito para que as normas penais não funcionem neste caso. Passaram-se décadas, mas ainda existe uma resistência muito grande na efetiva utilização desses tipos penais.
Se trouxermos a matéria para os dias atuais, enfrentaremos o mesmo problema nas delegacias especializadas à mulher no que diz respeito ao tratamento dado às mulheres transexuais e travestis que a depender do lugar/Estado, não terão o tratamento devido.
	A vitimização terciária se dá quando a violência institucionalizada se projeta para o exercício de um controle social contra a própria vítima, ou seja, a vítima passa a ser compreendida como culpada pela própria sociedade. Ex: houve um caso de grande repercussão no Nordeste que acabou sendo repercutido nacionalmente, no qual duas mulheres foram a um show e logo após, entraram no ônibus da banda, oportunidade na qual sofreram violência sexual. A partir do momento em que o fato caiu no conhecimento público, a sociedade começou a julgar o comportamento das vítimas efetuando questionamentos “foram estupradas, tudo bem, mas por que foram para o ônibus da banda?” “Por que resolveram transar naquela situação?”. 
	Assim, o comportamento da vítima passa a ser questionado e julgado, chegando ao ponto em que a própria vítima internaliza a noção de que foi culpada pelo delito que sofreu, ou seja, ocorre a autovitimização.
CONTROLE SOCIAL
	É o conjunto de mecanismos e sanções sociais que pretendem submeter o indivíduo aos modelos e normas comunitários. Portanto, é um gênero que vai abranger todos os instrumentos que tentarão moldar o comportamento humano para um determinado padrão (hegemônico, normativo). 
	O controle social enquanto gênero abrange os controles informais e formais:
	Controle informal
	Controle formal
	Desempenhado pela sociedade civil: família, escola, profissão, opinião pública, grupos de pressão, clubes de serviço, igreja etc. são instituições informais de controle que irão moldar o comportamento humano. Desde o nascimento a pessoa passa a ter o seu corpo controlado pelas instâncias informais de controle.
	Vai ser desempenhado pela atuação do aparelho político do Estado. Nesse controle teremos uma análise muito interessante de Freud quando ele analisa o mal-estar na civilização. O ser humano, em um primeiro momento, não consegue se desconectar do mundo. Sendo assim, entende a si próprio e ao mundo enquanto uma coisa só. A partir do momento em que lhe é negado determinado pedido ou que seus desejos passam a sofrer uma limitação, ele começa a perceber que é um indivíduo, que não é possuidor de tudo e que seus instintos não são todos contemplados dentro das normas sociais.
	Essa padronização que a sociedade civilizatória produz enquanto impacto vai gerar um constante sentimentode mal-estar, sendo, talvez, um processo de desumanização do homem, pois ele de alguma maneira tenta afastar o indivíduo dos seus desejos e instintos.
	Quando falamos em instâncias informais de controle, estaremos diante disso. Quando um bebê “nasce” (sentido social), já possui um nome, que por sua vez tem um gênero, cor, jeito de falar e vestir. Assim, há uma imposição cultural contra ela; com expectativas sociais diante dela, dado que terá aos poucos que se adaptar e tentar correspondê-las.
	O simples fato de ser homem ou mulher está diretamente relacionado a esse projeto informal de controle desempenhado. Em um primeiro momento informal e, a depender da situação, também alcançado pelo controle formal punitivo do Estado. 
“TROCANDO EM MIÚDOS”: SOMOS CONTROLADOS O TEMPO INTEIRO.
TEORIAS DA PENA
A. TEORIA ABSOLUTA
	As teorias absolutas são as primeiras a explicar a pena e aqui, quando falamos em pena, devemos pensar especialmente na pena privativa de liberdade. Dentro das teorias absolutas vamos encontrar, sobretudo, o pensamento de Kant e Hegel.
	Kant trabalha a pena privativa de liberdade dentro de uma perspectiva moral. A imposição da pena é um imperativo categórico, ou seja, se determinado indivíduo praticou um crime infringindo uma norma, deve ser punido, ainda que a sociedade esteja para ser dizimada. 
	Hegel, por outro lado, vai tentar explicar a pena dentro de uma perspectiva alinhada às teorias absolutas, trazendo uma justificativa jurídica. Dessa forma, Hegel irá dizer que o crime seria a negação do direito e a pena seria a negação do crime. 
	Tanto Kant quanto Hegel trabalham a pena como um fim em si. A grande crítica que se faz às teorias absolutas é a de que elas explicam a pena privativa de liberdade quase que com um pensamento de fé, pois não se conseguirá provar ou empiricamente demonstrar que aquela validação da norma ou que aquela imposição de pena efetivamente restabeleceu a ordem violada e o estado das coisas. 
	Outra crítica feita às teorias absolutas se alinha no sentido de que elas não irão agregar à pena privativa de liberdade nenhum tipo de utilidade social. Então, quando a pena é explicada enquanto um fim em si mesma, ainda se aproxima da ideia de castigo e de vingança, mesmo que seja institucionalizada.
	O pensamento das teorias absolutistas vai ter como antecedente teórico a Teoria da Expiação, muito bem trabalhada no Direito Canônico. Para a tal teoria, a punição deverá existir para permitir que o indivíduo apenado expie a sua culpa; aplaque a sua culpa; minimize a sua culpa em virtude do mal causado. Dentro dessa lógica, temos nas teorias absolutas um pensamento de retribuição por meio da pena. Assim, a pena retribui o mal causado pelo agente, seja por imperativo categórico ou moral, seja pela via jurídica. 
B. TEORIAS RELATIVAS
	Todas irão fundamentar a pena privativa de liberdade na ideia de prevenção. Então, aqui estaremos diante de teorias de caráter prevencionista que tentarão aliar a pena privativa de liberdade a algum tipo de fim ou utilidade social. Subdividem-se em teorias de prevenção geral e teorias de prevenção especial.
	As Teorias de Prevenção Geral irão se voltar para a sociedade. Já as Teorias de Prevenção Especial voltam-se para o próprio indivíduo que sofre a pena (o criminoso apenado).
b.1.) Teoria da Prevenção Geral Positiva
	Trazem a ideia de que a previsão em si do crime e da sua respectiva pena (a simples previsão legal) já funcionará como elemento de aprendizado para a sociedade que irá conhecer os comandos proibitivos do Estado e, uma vez ciente do que pode ou não ser feito em sociedade, não irá delinquir.
	Veja que aqui teremos a pena de um indivíduo fundamentada no impacto que essa reprimenda irá produzir em toda coletividade. No momento em que um indivíduo é preso, a coletividade entenderá que aquela conduta não será admitida pelo Estado e uma vez conhecedora das normas proibitivas, a sociedade não irá delinquir, já que há na imposição da pena a reafirmação da norma violada e a criação de expectativas sociais de conduta.
	O pensamento da prevenção geral positiva é um pensamento que se alinha muito ao que é proposto pelo autor alemão Jakobs.
DPE-SP (2019): A teoria da prevenção geral positiva, na sua versão eticizada, parte do falso pressuposto de que todo delito afeta valores ético-sociais comuns à coletividade, desconsiderando o fato de que nas sociedades modernas multiculturais não há um sistema de valores único, o que enseja uma ditadura ética.
b.2.) Teoria da Prevenção Geral Negativa
	Essa teoria terá como grande expoente Feuerbach que irá trabalhar a Teoria da Coação Psicológica.
	Feuerbach explica a imposição da pena privativa de liberdade sob o argumento de que a partir do momento em que o indivíduo criminoso sofre a pena, a sociedade inteira será psicologicamente coagida a não repetir aquela mesma prática. Assim, trabalha com a temorização ou intimidação.
- Como se desdobram as Teorias Relativas de Prevenção Especial?
	Desdobram-se em Teoria Positiva e Negativa.
a) Teoria da Prevenção Especial Negativa (Von Liszt)
	Segundo essa teoria, o fundamento da imposição de pena vai ser justificado a partir do próprio indivíduo apenado. Há uma influência do pensamento iluminista. 
	O fundamento da pena é a neutralização. Pune-se o indivíduo criminoso para neutralizá-lo; para que enquanto estiver sofrendo pena, ele não esteja apresentando riscos para a sociedade. 
b) Teoria da Prevenção Especial Positiva
	Surge aqui o discurso da ressocialização. Pune-se o indivíduo criminoso para ressocializá-lo e reintegrá-lo à sociedade.
RESUMO:
 	Observem que todas essas teorias legitimam a privação de liberdade e a imposição de pena, já que estão tentando buscar uma justificativa que torne aceitável a intervenção e o controle social desempenhado pelo Estado na imposição de uma pena privativa de liberdade.
 C. TEORIAS MISTAS
	As teorias mistas analisam a impossibilidade de se motivar a pena privativa de liberdade em um único fundamento. Segundo essas teorias, não adianta centralizar toda a explicativa somente na ideia de retribuição, prevenção ou na máxima de que só se estará neutralizando ou ressocializando o indivíduo apenado.
	Estaremos, portanto, diante de teorias que vão buscar agregar mais de uma função que estaria associada a pena privativa de liberdade. Logo, mais de uma justificativa serviria para legitimação da pena privativa de liberdade.
	A perspectiva mista é encontrada no artigo 59 do Código Penal ao afirmar que o juiz, na dosimetria da pena, deverá encontrar uma pena que seja suficiente para a retribuição e para a prevenção.
· Teoria dialética unificadora 
É proposta por Claus Roxin dentro de uma perspectiva funcionalista teleológica, pois ele legitima, explica e fundamenta a existência do Direito Penal a partir das funções que desempenha na proteção de bens jurídicos. Assim, a função do Direito Penal é a proteção de bens jurídicos e qualquer intervenção penal só vai se legitimar se o Direito Penal cumprir fielmente esta função.
Roxin critica os pensamentos mistos até então trabalhados no sentido de afirmar que promovem uma sobreposição de funções, um mero somatório de funções, sem imprimir um diálogo entre as diferentes funções desempenhadas pela pena privativa de liberdade. 
A função de limitar o poder punitivo do Estado é o denominador comum entre todas as funções que Roxin irá agregar para legitimar a intervenção penal pela pena privativa de liberdade. Roxin rechaça por completo qualquer associação entre pena privativa de liberdade e retribuição. 
- Quais são as funções preventivas adotadas por Roxin?
	Pena cominada pelo Legislativo
	Pena executada
	Pena aplicada pelo juiz
	A pena estará cumprindo uma função de prevenção exclusivamente geral, pois estará ali enquanto uma norma geral e abstrata voltada a todos os destinatários do ordenamento jurídico. Todos nós somos, por exemplo, destinatários das normas previstas no Código Penal e aquelas penas abstratamente previstas pelo legislador estão ali para prevenir que não venhamos a praticardelitos.
	De maneira diametralmente oposta, quando um determinado indivíduo está sofrendo a reprimenda privativa de liberdade, cumprindo efetivamente a pena imposta, aquilo que era uma prevenção geral se transforma em uma prevenção especial, pois aqui se estará atento ao indivíduo que cumpre a pena e não mais para a sociedade que pode ou não vir a delinquir.
	Quando o juiz está aplicando efetivamente a pena, condenando o indivíduo, estará atento aos elementos de prevenção geral e especial.
	Para Roxin, cada uma dessas funções preventivas estará cumprindo a ideia de limitação da intervenção penal do Estado. Assim, a pena cominada será limitada na ideia de proporcionalidade. A pena aplicada, por sua vez, será limitada na ideia de culpabilidade e, por fim, a pena executada, na ideia de humanidade, na qual nem tudo poderá ser imposto em nome da prevenção.
D. TEORIA AGNÓSTICA
	É uma teoria que, em certa medida, funciona como teoria deslegitimadora. Quando analisamos o pensamento de Zaffaroni, observamos que para explicar a pena e as funções que ela cumpre na sociedade, é preciso atentar para a realidade dos fatos. Dentro dessas funções não declaradas é preciso estar atento para a seletividade do sistema, para os abusos praticados pelo Estado de polícia no exercício do controle repressivo e a todas as distorções na aplicação das normas jurídicas, pois do contrário estaremos montando uma teoria inútil e absolutamente desconectada da realidade. 
	Analisando a pena como ela é, Zaffaroni afirma que fundamentá-la na ideia de retribuição não é um discurso racional, tendo em vista que estaremos diante de vingança e isto não se justifica no plano da racionalidade. Outrossim, fundamentar a pena na ideia de prevenção também não é demonstrada, pois não há como provar que a pena vai prevenir futuros delitos. 
	Para Zaffaroni, a prevenção especial positiva (ideia de ressocialização) é uma contradição em termos. Excluir nunca vai ser um caminho para incluir, haja vista que quando o Estado exclui alguém da sociedade, a finalidade estatal não é incluir alguém e sim excluir. Logo, seria contraditório falar em prender para ressocializar. 
	A ressocialização também se configura como uma contradição em termos sob o aspecto do sujeito que normalmente compõe o sistema carcerário. A palavra ressocialização contém, em si, um pressuposto: que o indivíduo, em algum momento, tenha sido socializado. E estar na sociedade não significa fazer parte dela efetivamente, pois ao observar o perfil da massa carcerária, identificamos pessoas que nunca estiveram no centro tomador de decisões dessa comunidade. São pessoas que sempre estiveram à margem, sendo, portanto, sujeitos marginais antes mesmo do cometimento do delito. Assim, segundo Zaffaroni, como falar em ressocialização se tais pessoas nunca estiveram efetivamente integradas e socializadas? 
	Pelas razões expostas, Zaffaroni demonstra a necessidade de se pensar a pena a partir da análise da realidade, de como os fatos efetivamente se apresentam no seio social. O autor irá dizer que não há nada que justifique no campo do racional a pena privativa de liberdade. A pena privativa de liberdade não tem nenhum fundamento cognoscível no campo da razão. A pena é vingança, é irracionalidade. Prender alguém, privar, enjaular uma pessoa humana, é algo que só se justifica no campo da irracionalidade.
	Portanto, a Teoria Agnóstica parte da ideia de que não há nada no campo racional que fundamente/legitime a pena privativa de liberdade. É um ato de violência praticado pelo Estado, mas considerando que em termos fáticos nós precisaremos conviver com tal ato provocado por um Estado de polícia, o nosso cuidado deverá ser limitar ao máximo a intervenção penal, buscando sempre a descarcerização ou, quando der, a própria descriminalização. 
	Conclui-se diante do exposto que a linha de pensamento sustentada na Teoria Agnóstica defende que se sabemos que não há nada racional que justifique a intervenção estatal, teremos que buscar descriminalizar as condutas que possam ser devidamente regulamentadas por outros campos do Direito. Quando isso não for possível e for necessária a aplicação do Direito Penal, devemos tratar tais condutas, quando possível, fora do cárcere, a partir de outras consequências jurídicas menos lesivas e gravosas do que a pena privativa de liberdade, uma vez que a imposição da prisão é um ato de violência desempenhado pelo Estado. 
	Observe que a Teoria Agnóstica não deslegitima por completo a intervenção penal, já que ela admite, em último caso, a imposição da pena privativa de liberdade dentro de uma perspectiva minimalista.
MODELOS TEÓRICOS
TEORIAS BIOANTROPOLÓGICAS
	Ao falar das teorias bioantropológicas, nos referimos às teorias do século XIX de Lombroso, Ferri e Garofalo e aos pensamentos da Escola Positiva.
- Criminologia Etiológica ou Tradicional de Lombroso
	CONCEITOS CHAVES
	Criminoso e criminalidade como realidades ontológicas preexistentes ao sistema de justiça criminal;
	Comportamento social como convencional (regra);
	Comportamento desviante, não convencional (exceção).
	Quando se fala de criminologia etiológica, se fala da criminologia tradicional, sendo este um conceito que se opõe a ideia da nova criminologia. 
“Etio” é relativo à essência e “lógico” no sentido do saber
Então, aqui, a explicação do crime e das suas causas estão relacionadas à essência de determinadas condutas. Se está relacionada à essência de determinadas condutas e pessoas, estamos falando do crime e do criminoso como realidades ontológicas preexistentes.
	Temos ainda a ideia de que o comportamento social é convencional, o que significa dizer que esses teóricos vão compreender que a maior parte da sociedade é normal, não delinque e age conforme o que se espera dentro de um padrão civilizatório normativo. Assim, o comportamento desviante é exceção.
	Essa é uma grande característica das Teorias Bioantropológicas que pensam o criminoso como uma exceção na sociedade. A maior parte das pessoas, as “pessoas normais”, cumprem as normas. O sujeito criminoso seria um sujeito anormal, fora do compasso evolutivo comum, sendo um degenerado.
Cesare Lombroso (Itália, 1835-1909)
	O pensamento lombrosiano traz muita influência não apenas na Itália, mas em muitos países da Europa, chegando inclusive ao Brasil que influencia as ideias de Nina Rodrigues. 
	Existe um livro de Nina Rodrigues denominado “As raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil” em que são classificadas espécies de negros, trabalhando a probabilidade de delinquência relacionada a cada uma dessas espécies que estariam causando riscos à sociedade brasileira dentro de uma perspectiva extremamente racista.
	O pensamento de Lombroso é racista, pois as características do criminoso nato estarão relacionadas a características fenotípicas. O simples fato de se trazer a figura do criminoso nato já traz uma perspectiva racista, mas se examinamos substancialmente a teoria, isso se torna ainda mais evidente, tendo em vista que se analisa até mesmo o formato do nariz do indivíduo que seria o criminoso nato. 
	No Brasil, esse pensamento também irá ganhar um largo alcance com a introdução da figura do manicômio como outra forma de repressão e de controle exercido pelas instâncias formais de ação.
	Em Lombroso teremos um psiquiatra, cirurgião, higienista, criminologista, antropólogo e cientista italiano. 
ATENÇÃO: Quando estivermos falando do pensamento higienista, estaremos nos referindo ao pensamento das escolas bioantropológicas da criminologia. NÃO ESQUEÇA!
	
É interessante que quando pensamos no movimento higienista, lembramos da expectativa da sociedade do século XIX de corresponder a um padrão estético traçado dentro da expectativa de la belle epoque francesa. As coisas precisariam corresponder a um padrão estético pensado, elaborado, racializado e qualquer coisa que destoasse daquilo precisaria ser “limpado” das ruas. Estaremos ali, sobretudo na América, diante de um continente que havia recentemente abolido a escravidão, com diversas pessoasnegras nas ruas, sem condições de sobrevivência dentro de outro regime econômico que deixava de ser o regime de exportação de cana de açúcar (Bahia, por exemplo). A partir de então, aquelas pessoas que estavam nas ruas começam a ser encarceradas em prisões ou em manicômios judiciários, sob uma nova justificativa: o pensamento higienista.
	No pensamento de Lombroso temos o desenvolvimento da chamada Antropologia Criminal e da Escola Positiva de Direito Penal. O método trabalhado por Lombroso era o método empírico, no qual ele analisa o tamanho do crânio, nariz, órgãos sexuais, braços, mãos, lábios, presença ou não de tatuagens. Os fatores examinados pelo autor eram: composição física (fisionomia, sensibilidade, agilidade, sexualidade, peso e idade, anomalias cranianas, composição biológica, hereditariedade, reação etílica) e psicológica (senso moral, inteligência, vaidade, preguiça e astúcia). Dentro dessa lógica, o criminoso, por exemplo, seria revelado diante da presença de tatuagens, já que isto revelaria um gozo com a dor. 
	Lombroso desenvolve diferentes tipologias de criminosos, dentre as quais se destaca o criminoso nato que padeceria de um atavismo, o que significa dizer que ser criminoso era uma condição atávica, inerente a determinados sujeitos.
- Quais seriam as características do criminoso nato? Influência biológica, estigmas, instinto criminoso, selvagem da sociedade que dentro das perspectivas das teorias da degeneração seria um sujeito que “involuiu”, um degenerado, cabeça pequena, frente fugidia, sobrancelhas salientes, orelhas malformadas, braços compridos, face enorme, tatuado, impulsivo, mentiroso e falador de gírias (as gírias eram identificadas a partir de um padrão normativo dominante, isto é, a partir da fala dominante).
	Esse pensamento vai ser bastante explorado no Brasil quando se examina a cor da pele do indivíduo criminoso e a fala, ou seja, a forma como essas pessoas se comunicava. Se a comunicação não se dava dentro da comunicação tradicional, o indivíduo era compreendido como um selvagem, um criminoso nato. Os indígenas também estavam inseridos, para Nina Rodrigues, dentro dessa perspectiva. Nina, inclusive, chega a colocar que o processo de catequização até aceleraria o processo de degeneração para indígenas já que eles estariam aptos a se adaptar a cultura civilizada dentro da lógica dos padrões de la belle epoque que eram perseguidos pela sociedade da época. 
A principal obra de Lombroso é “O Homem Delinquente” de 1876.
APROFUNDANDO: LOMBROSO E O RACISMO
“Os estudos de Afrânio Peixoto no Brasil reforçaram os preconceitos das teorias europeias, italianas e francesas. No Brasil, reforçadas com o racismo (aqui relacionada a ideia de cor e da questão dos indígenas, mas sobretudo sobre cor), pela não aceitação da miscigenação (a miscigenação também estaria relacionada à degeneração). Observaremos um recorte extremamente racista, onde a população negra, constituída predominantemente de pessoas pobres serão, principalmente, vitimadas pela visão determinista da criminologia positivista para qual a descendência, a herança genética ou o meio ambiente contribuíam de forma determinante para formação das mentes criminosas”.
Isso é interessante porque como se tratava de um pensamento científico determinista, não era necessário que o indivíduo delinquisse para que fosse tratado como criminoso, porque se existe certeza a partir de características fenotípicas e antropomórficas de que aquele indivíduo é um sujeito criminoso, não é preciso esperar que ele venha a delinquir.
Lembre-se que os fundamentos para a imposição da medida de segurança dentro dessa perspectiva era prevencionista e não retributivista, ou seja, seria perfeitamente possível a antecipação da intervenção penal no sentido de aplicar medida de segurança ainda que não houvesse efetivamente o cometimento de um delito. 
Um dado interessante sobre Lombroso é a sua relação com o espiritismo. Vejamos: “estou muito envergonhando e desgostoso por haver combatido com tanta persistência a possibilidade dos fatos chamados espiríticos; mas os fatos existem e eu deles me orgulho de ser escravo” – Lombroso conheceu e participou de sessões mediúnicas com a italiana Eusápia Paladino, vindo a considerar como autênticas as produções dos fenômenos e manifestações espíritas em 1891.
Lombroso tentou escrever uma obra a respeito do tema, onde tentaria rever seu pensamento em algumas partes, minimizando o caráter determinista, mas acaba falecendo antes de esgotar essa última obra que relacionaria o espiritismo com a pessoa humana.
Outro trabalho decisivo de Lombroso para o pensamento higienista do século XIX está voltado para a análise do comportamento da mulher, pormenorizado na obra “A mulher delinquente, a mulher prostituta e a mulher normal” de 1893.
Na criminologia positiva, nos estudos de Lombroso e Ferrero vamos encontrar a definição das prostitutas como criminosas potenciais; ou nos estudos da escola positivista francesa, encontramos a teoria da degeneração reconhecendo o ambiente, a moralidade como elementos que reforçaram os estereótipos que perseguiam as prostitutas como criminosas, justificando inúmeras perseguições e preconceitos, tornando-as vulneráveis aos tratamentos mais degradantes destinados às mulheres (BORGES et al).
Lombroso quando examina a figura das prostitutas, o faz a partir da teoria da degeneração. A prostituta era uma degenerada moral e por desafiar os padrões morais da época, o tratamento imprimido a elas era um tratamento extremamente degradante. 
A mulher normal, do ponto de vista de Lombroso e Ferrero, é um ser inferior, dado ao instinto e não a inteligência, próxima dos selvagens, malvada por índole. A mulher criminosa é ainda mais inferior, aproxima-se da figura dos delinquentes (criminoso nato) que se aproxima do monstro, pelos traços físicos de regressão das espécies. 
A teoria do criminoso nato é utilizada também para fundamentar, dentro de uma perspectiva biopsicológica, uma diferença naturalista entre homens e mulheres a partir de critérios estritamente biológicos, na época considerados como critérios verdadeiros.
	Dentro desse sentido, analisando o perfil das mulheres, seriam dadas a instintos e práticas possivelmente passionais e criminosas. Então, se partiria da ideia da anormalidade na construção da figura feminina. Teremos, portanto, no pensamento de Lombroso, um pensamento extremamente racista e misógino.
TEORIAS BIOANTROPOLÓGICAS E A NÃO SUPERAÇÃO DO PENSAMENTO ETIOLÓGICO
	Um dos grandes exemplos que temos hoje de aproximação com o pensamento etiológico está na recente relação que se tem dado a explicação do fenômeno criminoso e as contribuições da neurociência para o Direito Criminal.
	Calhau chama atenção para uma pesquisa sobre a qual é interessante fazermos uma abordagem breve. É que, na década de 80, um pesquisador norte-americano chamado Benjamin Libet começou a realizar pesquisas que colocariam em xeque a ideia de livre-arbítrio, ou seja, a ideia da vontade humana, refletindo sobre o seguinte: será que a nossa ideia de vontade, de domínio, de decisão é uma mera ilusão humana? O que de fato geraria a conduta humana?
	Nesse sentido, Libet fez o seguinte experimento: indivíduos são conectados com eletrodos e orientados a apertarem botões que estarão em suas mãos direita e esquerda. No experimento existe o registro específico do momento em que eles apertam os botões. Assim, percebe-se que antes mesmo que começassem a apertar os botões, os eletrodos já indicavam com um breve lapso de antecedência qual seria o botão apertado. Os participantes eram instruídos a deixar a vontade aparecer sozinha, sem planejar ou se concentrar, sendo que o exato momento em que faziam o movimento era anotado. Utilizando-se de um ponteiro que dava uma volta completa a cada 2, 5, 6 segundos, o relógio usado no teste foi projetado especialmente para permitir que os próprios voluntários percebessem mudanças de menos de um segundo.
	Libet ainda orientou que os participantes reportassem o momento exato em que tomavama decisão de se mexer. Assim, os próprios pesquisados começaram a perceber que antes de fazerem a comunicação, os eletrodos já indicavam qual lado haviam decidido apertar, ou seja, não conseguiram enganar o experimento.
	Ademais, os próprios sujeitos experimentados sairiam dali convencidos de que a ideia de tomada de decisão era uma simples ilusão e que na verdade nossas escolhas são guiadas pelo nosso inconsciente, vindo somente depois a nossa consciência se dar conta disso.
	A partir desse experimento começou-se a questionar o livre arbítrio no Direito Penal, eis que a Escola Clássica fundamentou toda a responsabilidade penal nessa ideia. Posteriormente a Escola Clássica deu lugar à Escola Positiva que negou completamente o livre arbítrio, passando a trabalhar com a ideia determinista. No atual paradigma, a partir da Escola Moderna Alemã, da Terceira Escola Italiana, por mais que ainda identifiquemos traços de influência da Escola Positiva, atualmente o sistema penal não vai mais trabalhar com a ideia de determinismo.
	O Direito Penal Moderno vai diferenciar os sujeitos imputáveis dos sujeitos inimputáveis. Dentro de uma perspectiva dialética, a Escola Moderna Alemã e a Terceira Escola Italiana mesclam contribuições da Escola Clássica e da Escola Positiva, uma vez que os sujeitos imputáveis ainda são compreendidos como sujeitos livres. Assim, modernamente, voltamos a falar do livre arbítrio. Já os inimputáveis não são livres; isso não quer dizer que tais pessoas são, sob a ótica do determinismo, sujeitos criminosos ou perigosos.
Art. 26, CP: É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
Parágrafo único. A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
EM RESUMO: o sujeito inimputável não é inteiramente livre. Contudo, somente temos a aplicação da pena quanto aos imputáveis. Sendo assim, continuamos modernamente a associar a aplicação da pena à ideia de livre arbítrio, cuja ideia é trazida da Escola Clássica.
	O experimento de Benjamin Libet vai colocar em dúvida justamente essa liberdade, questionando se de fato existe ou se seria uma ilusão. 
	Hoje, alguns autores sustentam que seríamos programados e que todas as ações humanas seriam produtos do inconsciente, não havendo controle algum sobre nossos atos.
	Se seguirmos essa perspectiva, o Direito Penal cai por terra, uma vez que não poderíamos mais fundamentar a imposição de uma pena na ideia de liberdade. Por outro lado, tem permanecido de forma mais crítica que o pensamento de Libet não faz ruir o sistema penal, uma vez que aqui teremos a negação do livre arbítrio, ou seja, da mesma forma que não somos inteiramente determinados, também não somos inteiramente livres. A única coisa que o pensamento de Libet vem nos demonstrar é que, segundo Paulo Buzato, da mesma forma que não somos completamente determinados, também não somos inteiramente livres.
	Assim, a ideia de liberdade continua a fundamentar a responsabilidade dos imputáveis para o Direito Penal, mas sabemos que não é dotada de plenitude, eis que vem sendo um conceito socialmente construído no campo da ação comunicativa.
	Essas contribuições neurocientíficas, a depender da compreensão que a elas se dê, assim como o impacto que projetam para a compreensão do Direito Penal e de seus fundamentos, podem colocar em risco a ideia de liberdade para quem parte de uma perspectiva de negação total da liberdade e, portanto, promove um retorno ao pensamento neolombrosiano. 
TEORIAS SOCIOLÓGICAS
	As teorias sociológicas são assim chamadas porque vão dizer que a criminalidade não está relacionada a fatores internos (endógenos), mas a fatores externos (exógenos). A criminalidade está relacionada à sociedade. O crime está compreendido como um fenômeno social.
	TEORIAS DO CONSENSO (teoria integrativa ou funcionalista)
	TEORIAS DO CONFLITO (teoria argumentativa ou explicativa)
	A sociedade se forma a partir de um consenso, possuindo de uma maneira geral uma base uniforme e de valores. Assim, a sociedade se conecta porque todas as pessoas vão partilhar dos mesmos valores, existindo um denominador comum: interesses e valores que integram toda a coletividade.
	Vão negar que nosso modelo de sociedade se edifica em uma mesma base valorativa, ou seja, entende que não se constrói na conciliação de interesses. O que teríamos é um conflito de interesses. Dentro desse seio social de conflitos temos os que possuem uma posição dominante e hegemônica. Não há consenso, mas sim dominantes versus dominados. O que existem são fatores que permitirão que os sujeitos dominantes façam valer seus valores que irão se projetar enquanto valores hegemônicos perante os indivíduos dominados.
- TEORIAS SOCIOLÓGICAS DO CONSENSO
	Para as teorias do consenso, a finalidade da sociedade é quando há um consenso social. A criminalidade existiria justamente quando esse consenso deixasse de existir. Sendo assim, o criminoso não age conforme o consenso social, ao contrário, o ameaça, quebrando-o.
	As escolas sociológicas terão grande contribuição dos EUA na explicação do fenômeno da criminalidade. 
a) Escola de Chicago e a Ecologia Criminal
	Temos como expoentes desta escola, Ernest Burgess e a teoria das zonas concêntricas, que exploravam a relação entre espaço urbano e criminalidade. O modelo ecológico buscava um equilíbrio entre a comunidade humana e o ambiente natural, trabalhando a partir do método de observação participante.
	A antiga Escola de Chicago trabalhava a ideia de ecologia criminal que busca um equilíbrio entre a sociedade e o indivíduo. Essa teoria relaciona o crime com o crescimento desordenado das cidades, no sentido de que temos, por exemplo, um centro urbano de comércio (zona 1), ao lado do qual se desenvolvem habitações mais populares (zona 2) e um pouco mais distante se começa a ter zonas urbanas um pouco mais estruturadas e planejadas (zona 3), mais distante uma zona ainda mais ordenada e planejada (zona 4) e um pouco mais distante, longe dos grandes centros comerciais, uma zona mais luxuosa (zona 5).
	Na primeira zona temos um centro de comércio, sendo que as habitações que se desenvolvem no entorno consistem em zonas mais pobres e é dentro dessa faixa (zona 1 e zona 2) que temos uma concentração da criminalidade, pois seriam nessas regiões que teríamos um crescimento mais desordenado, menos programado.
	Na medida em que nos distanciamos dos centros comerciais, vamos ter áreas urbanas mais planejadas e programadas, zonas populacionais com maior capacidade econômica, até se chegar às áreas de alto luxo, nas quais haveria um menor índice de criminalidade. 
	A grande preocupação da Escola de Chicago era relacionar o crescimento desordenado das cidades e a pobreza nesse crescimento à ocorrência de crimes. Assim, quanto mais pobre fosse a zona social, mais elevado seria o índice de criminalidade.
	 Uma das razões explicadas dentro dessa busca pelo equilíbrio entre o ambiente urbano e a sociedade (o homem) era o fato de que esse crescimento desordenado minimizava o poder de controle das esferas informais. Assim, teríamos um controle praticamente impossível de se fazer impor, ou seja, nem a família, nem a igreja ou outras instituições informais conseguiriam controlar o homem de forma efetiva.
	Observe que, se temos um decréscimo dessas funções informais de controle, passamos a ter aumento da instância formal de controle exercida pelo Estado contra essa população mais pobre, no que podemos observar uma nítida relação entre pobreza e criminalidade. Aqui temos o desenvolvimento da teoria das zonas concêntricas que consiste na ilustração visualizada acima. Veja que na teoria das zonas concêntricas a cidadese expande a partir de seu centro, estruturando-se em formas concêntricas. Quanto mais distantes da zona comercial e das áreas residenciais mais pobres, menor o número de incidências criminais.
	Essa teoria vai ser muito criticada por ainda trabalhar dentro de uma perspectiva extremamente preconceituosa, sendo que o pensamento mais moderno vai tecer fortes críticas à Escola de Chicago por ser uma teoria sociológica extremamente classista que projeta a ideia de criminalidade vinculada a uma ideia de pobreza. Ademais, referido pensamento, se conectado também com razões raciais, se revelará não somente classista, mas também racista. 
b) Teoria da Associação Diferencial
	Tem como expoente Edwin Sutherland, cuja grande preocupação era de que considerando que a Escola de Chicago explicou a criminalidade da população pobre, a criminalidade que parte da população mais rica, de pessoas que sempre viveram em zonas urbanas extremamente ordenadas, também precisa ser explicada (sonegação, lavagem de dinheiro etc.).
- Como explicar a prática criminosa de pessoas que estavam inseridas em regiões consideradas de risco de criminalidade praticamente nulo? Como explicar a criminalidade de colarinho branco?
	Sutherland traz a ideia de que as pessoas se associam de maneira diferente, trazendo a noção de que o crime é algo que se aprende. Dessa forma, se o indivíduo vive em uma relação social ainda que afastado, mas foi educado para a prática criminosa dentro desse meio, irá escolher a qual padrão aderir, fazendo uma análise do custo-benefício em praticar ou não conduta ilícita. Ao entender que compensa, irá se associar àquela forma de agir.
	Sendo assim, a Teoria da Associação Diferencial surge da tentativa de explicação da criminalidade econômica – “white collar crime” – e entende o crime não como uma disfunção dos menos favorecidos, mas como algo que se aprende na vida em sociedade. 
	A forma como a experiência será interpretada depende da relação íntima do indivíduo com seus familiares e as pessoas do seu meio. Uma pessoa se converte em delinquente quando as definições favoráveis superam as definições desfavoráveis à prática criminosa. 
	Imaginemos, por exemplo, um sonegador de tributos no Brasil explicado à luz da teoria de Sutherland: o sonegador vai pensar se sonega ou não, fazendo uma análise dos elementos favoráveis e desfavoráveis, pensando que se sonegar pode ser que venha a sofrer a um processo criminal e, caso condenado, ao pagar integralmente sua dívida tributária, a punibilidade será extinta. Isso significa que irá conseguir investir os valores para tentar conseguir uma quantia que valha o risco que se está correndo. Sendo assim, acaba decidindo sonegar, pois já observou em seu meio social que é uma prática que compensa.
c) Teoria da Anomia
	Como expoentes temos Emile Durkheim e Robert Merton. A anomia descreve uma sociedade em que falta coesão e ordem, normas. Diante disso, temos ausência de valores, de uma identidade social. O indivíduo se identifica com seus próprios interesses, mais do que com os interesses do crime. O crime seria uma forma individual de adaptação no quadro de uma sociedade agônica em face de meios escassos. 
	A ideia central desenvolvida pelos expoentes da teoria da anomia é de que em uma determinada sociedade em que haja bens escassos, uma situação de caos, o indivíduo não vai encontrar um corpo normativo uniforme com o qual se identifique, passando a seguir suas próprias normas. No momento em que o faz, estará delinquindo.
	A delinquência é explicada a partir da ausência de normas, de maneira que o próprio indivíduo para sobreviver, passa a seguir suas próprias normas. 
d) Teoria da Subcultura Delinquente
	Seu principal expoente é Albert Cohen. Temos a subcultura sendo uma cultura associada a determinado grupo social ou um subgrupo. Analisa bairros étnicos americanos em Nova Iorque ou chineses em Hong Kong. A sociedade é entendida como um mosaico de grupos. A criminologia não pode trabalhar com uma única ideia de ordem social.
O autor se debruça no sentido de compreender, sobretudo, a delinquência juvenil.
	Quando pensamos em consenso, não podemos pensar a sociedade como um todo padronizado. Teremos subgrupos dentro dessa sociedade e eles podem ter suas próprias linhas culturais. Nesse sentido, quando um determinado indivíduo está delinquindo, não necessariamente está se opondo a uma norma, mas se opondo a uma norma majoritária, porém segundo a norma do subgrupo ao qual está inserido.
	Daí a necessidade de compreendermos que dentro de uma mesma sociedade temos um mosaico de grupos. Temos diversos subgrupos. Aquilo que pode ser entendido como delinquência, poderá estar representando o cumprimento de uma norma relacionada a determinado subgrupo social.
	O autor explica a delinquência juvenil. Ao participar da gangue, o jovem passa a aceitar os valores daquele grupo mais do que os valores dominantes. A lógica é de que ao delinquir, o indivíduo não estará se opondo a uma norma, mas somente cumprindo norma relacionada ao seu subgrupo social.
	O crime teria respaldo em um sistema de normas e valores distintos, o sistema das subculturas sociais. O crime tem, portanto, respaldo normativo. 
Essa ideia é bem interessante. Se pensarmos, por exemplo, em um determinado subgrupo social que utilize como uma das bases de expressão o grafite ou até mesmo pichação de muros, temos determinado grupo social que se identifica com uma forma de agir, que adere valorativamente a essa forma de agir. Um jovem, quando exerce esse tipo de comportamento não estará necessariamente violando uma norma. Estará cumprindo uma norma que é aceita dentro do grupo no qual se insere. Ele passa a aderir as normas do subgrupo de uma maneira superior à adesão das normas dominantes.
- TEORIAS DO CONFLITO SOCIAL
As teorias do conflito partem de uma lógica diametralmente oposta. O que conecta
indivíduos dentro de um mesmo seio social não é o consenso entre eles, mas a capacidade de certos indivíduos exercerem domínio, coerção, força contra os outros. Entendem que a ordem social está fundada na coerção, na força e na dominação. O fato de se estar seguindo as normas atinentes a uma sociedade capitalista não deriva do fato de aderir-se ao pensamento capitalista como ideologia daquela pessoa. Deriva simplesmente do fato de existir alguém com capacidade de domínio sobre a pessoa. Se esta resolver chegar em um shopping e assaltar as lojas para que se possa valer do interesse patrimonial, mas sem que se submeta às normas disciplinadas pela lógica capitalista, irá sofrer penalidade, justamente porque existe dentro dessa ordem social quem possa se valer da força, dominação contra aquela conduta.
a) Teoria do Labelling Approach (ou interacionismo simbólico/etiquetamento ou teoria da rotulação/reação social)
	“Label” significa etiquetas. Então, a teoria do labelling approach é a de colocar etiquetas, rotular. Tem como expoentes Erving Goffman e Howard Becker.
	A teoria do etiquetamento é responsável por produzir uma mudança do enfoque de estudo. Em um primeiro momento de toda a criminologia, o enfoque do estudo está lançado sobre o crime. A Escola Clássica criminológica, a criminologia pré-científica, vai focar seu estudo na figura do crime (o que é crime, qual conceito, quais são os elementos essenciais constitutivos do crime). Temos um esforço da doutrina penal em conceituar qual seria o comportamento criminoso.
	Depois, quando passamos no século XIX a desenvolver, a partir do experimentalismo, uma nova forma de se pensar o crime e suas causas, deixa-se de enfocar o crime e passa-se a enfocar o sujeito criminoso. O pensamento de Lombroso, as escolas bioantropológicas, vão focar no indivíduo criminoso.
Quando analisamos esse pensamento mais moderno e as teorias críticas, elas já focam o processo de criminalização. Deixa-se de buscar explicações ontológicas para origem do crime. A origem do crime passa a ser explicada relacionada ao próprio processo de criminalização.
A origem do furto mais remota está no processo de criminalização dofurto. Se não fosse criminalizado o furto, subtrair coisa móvel alheia poderia ser pecado, moralmente incorreto, mas crime não seria.
No caso Carolina Dieckmann, quando houve invasão do dispositivo informático para cópia de arquivos que ela tinha salvado em pastas no computador, neste caso específico, até temos uma tipificação criminal adequada, pois as fotos acabaram sendo publicadas e ela foi vítima de extorsão para que pagasse em troca da não publicação das fotos. Vamos imaginar, hipoteticamente, que o indivíduo tivesse apenas copiado as fotos. Não poderíamos falar de furto, porque não houve subtração. Não houve crime de dano, pois não houve destruição das fotos. Não poderíamos falar de crime contra a honra, porque não teria havido a publicação das imagens. Ou seja, não haveria tipo penal. A partir do momento que a conduta passa a ser criminalizada, aí sim é que nós podemos ter a origem de um delito. A origem do crime a partir da teoria do etiquetamento deixa de ser explicada a partir de uma perspectiva ontológica. Nenhuma conduta nasce em si mesma enquanto criminosa. As condutas simplesmente existem. Em dado momento no tempo e espaço, dentro de determinado contexto histórico, as condutas são alvo de criminalização. Uma vez as condutas sendo alvo de criminalização, aquele que realiza as condutas praticará, efetivamente, um crime. Perceba a diferença na compreensão da origem do fenômeno criminoso. Ela estará no labelling approach, no processo de rotulação, no processo de etiquetamento. 
De onde vem o Interacionismo simbólico? Que interação é essa trabalhada por Goffman e Becker? De onde vem a interação social, que também dá nome a essa linha de pensamento?
A ideia é que o processo de etiquetamento de condutas é um processo que não se faz de maneira neutra. No momento que se tipifica determinada conduta criminosa, já se sabe exatamente qual ou quais grupos sociais serão afetados a partir daquela criminalização. Se nós analisarmos o Código Penal Republicano Brasileiro de 1890 e a criminalização da capoeira, sabemos exatamente quais seriam os sujeitos alcançados por meio desses tipos penais.
A mesma coisa acontece quando pensamos no crime de aborto. Não se pode pensar o crime de aborto como uma norma geral e abstrata, não no sentido criminológico, não no sentido da criminologia mais moderna que analisa esse processo de criminalização. O aborto, em grande parte de suas modalidades, tem como alvo principal as mulheres. Se analisarmos ainda no Código do Império, no Código de 1830 a figura da vadiagem, o andar pelas ruas sem ter ocupação lícita que se garante sustento, ali também estamos diante de um tipo penal que não é neutro. Existe um direcionamento, sobretudo se considerarmos o gradual processo de abolição da escravatura antes mesmo da abolição formalizada, em que temos grande parte da população sem nenhum tipo de ocupação, passando a ser encarcerada sob a prática do crime de vadiagem.
A partir do momento que se rotula condutas, que se etiqueta enquanto criminosas determinadas condutas, esse processo não é neutro. Justamente por isso estará, de alguma forma, lá na frente, rotulando pessoas. Quando se elenca quais são as práticas consideradas criminosas dentro de determinado estado, se estará, em última análise, rotulando pessoas. Essas pessoas, que já são vistas pelo Estado e pela sociedade enquanto criminosas, passam a incorporar esse estigma e agir como tal. É uma linha de pensamento desenvolvida a partir da teoria do etiquetamento, compreendendo de que forma interagem o criminoso e a sociedade a partir do momento em que a etiqueta, o rótulo, o estigma é colocado.
Vamos analisar primeiro a obra “Outsiders” de Howard Becker. Até onde podemos considerar o desvio social como ato ou ação do indivíduo? É a grande reflexão do livro. Até que ponto podemos dizer que o furto é produto da conduta daquele sujeito que furtou? A origem desse desvio realmente está na conduta do indivíduo? Becker explica o seguinte: “quando uma regra é imposta, a pessoa que presumivelmente a infringiu pode ser vista como um tipo especial, alguém de quem não se espera viver de acordo com as regras estipuladas pelo grupo. Essa pessoa é encarada como um outsider”.
Dentro de um determinado grupo social, quem é o outsider?
É aquele que já é visto como alguém que, muito provavelmente, vai infringir as regras. Já é visto em si como um sujeito que não estará no cumprimento dessas regras. Vamos pensar na relação entre as ideias de Becker e a definição que Zaffaroni traz para o conceito de sujeito marginal. O indivíduo marginal sempre esteve à margem da sociedade. Cometendo ou não um delito, a sociedade (pessoas que possuem aptidão para tomada de decisão no círculo social) já espera dele que ele vá delinquir. Já é olhado como criminoso. O Estado já olha para ele como criminoso.
Se analisarmos isso dentro de uma perspectiva crítica, veja a quantidade de páginas que
o Ministério Público usa para denunciar um indivíduo que seja pobre, negro e de periferia. Veja a quantidade de páginas que o juiz se ocupa para sentenciar, para fins de condenação, um indivíduo que foi acusado de tráfico e que é pobre, negro e de periferia.
O esforço é mínimo. Às vezes nos deparamos com denúncias de uma ou duas páginas, com sentenças sucintas. Isso porque existe implicitamente a ideia de que aquele indivíduo já é criminoso. A presunção e o estigma que se projeta contra aquele indivíduo já é o estigma de indivíduo criminoso, independentemente de ter delinquido ou não. Tanto é assim que nem se precisa argumentar tanto para denunciar ou condenar, diferentemente quando se quer condenar, prender preventivamente, denunciar criminoso de colarinho branco. Aí é necessário argumentos, porque a presunção de inocência é materializada de modo distinto para esses sujeitos. 
Dentro do nosso padrão hegemônico, dentro dos interesses que dominam a representação das nossas normas sociais, analisando aqui a sociedade capitalista de uma maneira geral, essas pessoas pobres são outsiders. Já se espera desses indivíduos que descumpram a norma. Eles já são olhados como tal. Quanto mais são olhados como tal, mais difícil é se inserir no meio social. Uma vez outsider, dificilmente esse indivíduo deixa de ser olhado como alienígena, como estrangeiro no meio social.
Segundo Becker, “outsider” como ponto de vista – diferentes grupos com diferentes
noções de “desviar” podem rotular ou identificar uma ação ou ato com desvio social. Dependerá do grupo social a que os atores sociais estão ligados: classe econômica, cultural, política, entre outros.
Quando pensamos na figura do outsider, se se pensa a partir das normas dominantes, dos padrões sociais dominantes que estão permeando o discurso oficial de tomada de decisões, temos o outsider como sujeito desprovido de capacidade econômica. Mas a noção de outsider pode ser pensada nos mais variados grupos sociais, independentemente de capacidade econômica.
Isso significa dizer que, em determinado grupo social, se já temos um indivíduo
estigmatizado, olhado como estrangeiro, alienígena, ele também será visto como outsider. Pode ser que um político de colarinho branco chegue a determinada comunidade e já seja visto como alguém que é corrupto, que está ali somente para ludibriar as pessoas e retirar delas votos, dinheiro e confiança. Ou seja, ali estamos diante de alguém que também vai ser visto, presumidamente, como sujeito que não partilha dos mesmos valores, das mesmas condutas daquele meio social. A noção de desviante, outsider, varia conforme seja a normativa social de cada grupo.
Os detentores de poder político e econômico são os criadores das regras impostas,
muitas vezes, a pessoas que não pertencem àquele grupo e àquela lógica, que não concordam com essas normas. Por mais que o conceito de outsider seja um conceito que possa vir a ser aplicado nos mais variados meios sociais, basta que se esteja diante de alguém que seja visto como um sujeito incapaz de aderir àquelas normas, por mais que seja esse um conceito que se possa trabalhar nos mais

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