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História Econômica Geral 8. Grande Depressão Prof. Marcelo Soares Bandeira de Mello F. Estrutura da aula � 1. Introdução: Grande Depressão � 2. Causas da crise � 3. Consequências da Crise dos anos 1930 1. Introdução: Grande Depressão � Também conhecida como Crise dos anos 1930 e Crise de 1929 � A crise de 1929 se arrastou por quase toda a década de 1930 � Consistiu numa queda generalizada da produção e do emprego em quase todo o mundo industrializado � Algumas exceções: URSS e Japão � A crise foi mais grave nos EUA e na Europa 1. Introdução: Grande Depressão � De acordo com Eric Hobsbawm (1994, p. 105): � “Sem ele [o colapso econômico], com certeza não teria havido Hitler. Quase certamente não teria havido Roosevelt. É muito improvável que o sistema soviético tivesse sido encarado como um sério rival econômico e uma alternativa possível ao capitalismo mundial. � As consequências da crise econômica no mundo não europeu ou não ocidental [...] foram patentemente impressionantes. Em suma, o mundo da segunda metade do século XX é incompreensível se não entendermos o impacto do colapso econômico” 1. Introdução: Grande Depressão � Pequenas crises, periódicas, são (ou eram) comuns na história do capitalismo � Aconteciam entre cada 7 ou 11 anos � Ondas e ciclos tinham sido aceitos por homens de negócios e economistas mais ou menos como os fazendeiros aceitam o clima � Só os socialistas, como Marx, acreditavam que o ciclo revelava contradições internas do sistema econômico e que o colocavam em risco (Hobsbawm, 1994, p. 106) � A Crise de 1929 foi completamente distinta das crises anteriores 1. Introdução: Grande Depressão � O símbolo maior da crise foi a quebra da Bolsa de Nova York � Em 29 de outubro de 1929 (Hobsbawm, 1994, p. 110) � Mas a crise financeira foi apenas um fator secundário � Crises na indústria, na agricultura e no sistema bancário foram mais determinantes 1. Introdução: Grande Depressão Fonte: GAZIER, 2013 1. Introdução: Grande Depressão Fonte: MADDISON, 2008 1. Introdução: Grande Depressão � Indústria (1929 = 100) � Em 1932, nos Estados Unidos é de 54 � Em 1932, é de 58 na Alemanha, de 77 na França e de 83 no Reino Unido � No Japão é de 98 e na URSS é de 183 � Índice da produção de automóveis (1929 = 100) � Em 1932 é de 26 na Alemanha, 26 nos Estados Unidos e 23 no Canadá 1. Introdução: Grande Depressão 1. Introdução: Grande Depressão � Preços. Entre 1929 e 1932, os preços baixaram: � 17% no Japão � 18,6% nos Estados Unidos � 12% na França (a baixa se prolongaria até 1935, chegando a 29%) � 21% na Itália e na Alemanha � 14% na Grã-Bretanha e apenas 2% na Áustria 1. Introdução: Grande Depressão Fonte: GAZIER, 2013 1. Introdução: Grande Depressão � Desemprego � Uma taxa global que ultrapasse 15% é enorme � Mundo onde a população rural continua considerável e não registra desemprego � A proteção social era quase sempre inexistente 1. Introdução: Grande Depressão � No pior período da Depressão (1932-3) � 22% a 23% da força de trabalho britânica e belga � 24% da sueca � 27% da americana � 29% da austríaca, 31% da norueguesa, 32% da dinamarquesa � 44% da alemã não tinha emprego (Hobsbawm, 1994, p. 112) 1. Introdução: Grande Depressão � “Depois da guerra”, escreveu um editorialista no Times de Londres: � “o desemprego tem sido o mais insidioso, o mais corrosivo mal de nossa geração, � é a doença social específica da civilização ocidental em nosso tempo” � (Hobsbawm, 1994, p. 114) 2. Causas da crise � Causas: I. Endividamento e crises bancárias � Uma das inovações dos “anos loucos” (roaring 1920s; roaring = barulhento, estrondoso) foi, nos Estados Unidos, o crédito ao consumo � Em 1927, 15% das vendas aos consumidores se fazem a crédito � 85% dos móveis, 80% dos fonógrafos, 75% das máquinas de lavar � Em 1930, a queda do consumo pessoal é de 6%, sendo de 20% para os bens duráveis; ela atingirá 50% entre 1929 e 1933 2. Causas da crise � Causas: I. Endividamento e crises bancárias � Os salários reais cresciam pouco. Os lucros cresceram desproporcionalmente � A demanda da massa não podia acompanhar a produtividade em rápido crescimento � Inovações do sistema industrial, simbolizada por Henry Ford (fordismo) � Em vários setores predominavam grandes empresas, “monopolistas” � O consumo crescia muito, em parte por aumento do endividamento � O resultado foi superprodução e especulação (Hobsbawm, 1994, p. 121-125) 2. Causas da crise � Causas: I. Endividamento e crises bancárias � Havia 29 mil bancos nos Estados Unidos em 1921 � Apenas 12 mil em março de 1933 � Roosevelt fechou temporariamente todos os bancos (bank holiday), em 1933 2. Causas da crise � Causas: II. Nações pobres e endividadas � Maciças dívida de longo prazo (Alemanha, Itália, Inglaterra) � A ampliação das superfícies cultivadas coexiste com importantes progressos técnicos � É o caso do trigo e do açúcar, cuja produção cresce muito entre 1926 e 1930, enquanto os preços baixam � Fala-se numa verdadeira depressão agrícola durante os anos 1920 � Países agrícolas, assim como os europeus em geral, com dificuldade de ampliar importações 2. Causas da crise � Causas: II. Nações pobres e endividadas � Durante a década de 1920, o desemprego na maior parte da Europa Ocidental permaneceu assombroso � Mesmo nos anos de boom da década de 1920 (1924-9) o desemprego ficou em média entre: � 10% e 12% na Grã-Bretanha, Alemanha e Suécia � 17% a 18% na Dinamarca e na Noruega � Só os EUA, com desemprego de 4%, eram economia a pleno vapor (Hobsbawm, 1994, p. 110) 2. Causas da crise � Causas: III. Ciclos viciosos � Reações em cadeia, “efeito dominó”. No plano internacional � Desmantelamento da conjuntura industrial induz uma retração das trocas internacionais e uma fraca demanda por matérias-primas � Os países produtores dessas matérias-primas reduzem suas compras de bens manufaturados � Os países são atacados por produtos cada vez mais baratos e só conseguem se proteger através de barreiras alfandegárias e desvalorizações 2. Causas da crise � Depressão dos preços agrícolas � O preço do chá e do trigo caiu dois terços, o da seda bruta três quartos � Países exportadores de bens primários sem condições de comercializar � Argentina, Austrália, países balcânicos, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Egito, Equador, Finlândia, Hungria, Índia, Malásia britânica, México, Índias holandesas (atual Indonésia), Nova Zelândia, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela � Ao longo das décadas seguintes, se industrializavam ou retornavam para subsistência � Tornou a Depressão global no sentido literal (Hobsbawm, 1994, p. 111) Preço de importação do café nos EUA (centavos de US$ por libra peso) 0 5 10 15 20 25 1 9 2 5 1 9 2 6 1 9 2 7 1 9 2 8 1 9 2 9 1 9 3 0 1 9 3 1 1 9 3 2 1 9 3 3 1 9 3 4 1 9 3 5 1 9 3 6 1 9 3 7 1 9 3 8 1 9 3 9 1 9 4 0 1 9 4 1 1 9 4 2 1 9 4 3 1 9 4 4 1 9 4 5 Fonte: Gremaud et al, 2007 2. Causas da crise � Causas: III. Ciclos viciosos � Reações em cadeia, “efeito dominó”. Nos planos nacionais � As demissões restringem o mercado � O desemprego acentua as dificuldades e ocasiona mais demissões e mais baixa no consumo � O pessimismo ajuda a limitar as compras ao mínimo necessário e a adiar qualquer investimento 3. Consequências da Crise dos anos 1930 � Consequências: I. Guerra, crise, guerra � A crise de 1929 abre caminho para os preparativos da II Guerra � As iniciativas militares começam em 1934 com o avanço japonês na China � Continuam em 1935 com o domínio da Itália fascista sobre a Etiópia � Guerra Civil na Espanha em 1936 � A chegada ao poder de Mussolini data de junho de 1921 3. Consequências da Crise dos anos 1930 � Consequências: I. Guerra, crise, guerra � Primeira grande vitória do Partido Nacional Socialista de Hitler data de setembro de 1930 � Eleições para deputados do Reichstag� Os nazistas passam de 12 a 107 deputados � O número de desempregados estava muito alto e o sistema de seguro-desemprego estava muito deficitário. � A tentativa de restrição orçamentária e o revanchismo também contribuíram com a chegada de Hitler ao poder (1933-1945) 3. Consequências da Crise dos anos 1930 � Consequências: II. Políticas para superação da crise � As economias militares (Alemanha, Itália, Japão) � Industrialização submetida ao mundo militar � Busca por auto-suficiência � Expansionismo � Controle rigoroso das importações e das exportações 3. Consequências da Crise dos anos 1930 � Consequências: II. Políticas para superação da crise � Reino Unido � A previdência social desenvolve o sistema de pensão e aposentadorias criado em 1925 � Há um “piso” na retração do consumo � Medidas de estímulo à construção de moradias entre 1930 e 1935 3. Consequências da Crise dos anos 1930 � Consequências: II. Políticas para superação da crise � EUA. New Deal, o “novo acordo” (redistribuição das cartas do jogo econômico e social). Governo Roosevelt (1933-1945) realiza intensa atividade reformista � Reformas bancárias aumentando o controle federal (garantias aos depositantes e empréstimos em última instância) � Criação da Civil Work Administration e da Federal Emergency Administration. Órgãos para empregos públicos (4 milhões) e de fundos de ajuda (20 milhões de beneficiários em 1934) � Tennessee Valley Authority. Desenvolveu fertilizantes, barragens hidroelétricas e atraiu indústrias 3. Consequências da Crise dos anos 1930 � Consequências: II. Políticas para superação da crise � França. Frentes Populares (1936-1938) � Estímulo ao poder de compra e intervencionismo moderado � Algumas nacionalizações � Aumentos gerais de salários (10 a 15%) � Redução da semana de trabalho de 48 para 40 horas, sem diminuição de salário � Instabilidade política e início da Segunda Guerra impediam a continuidade do governo 3. Consequências da Crise dos anos 1930 � Consequências: II. Políticas para superação da crise � Suécia. Social-democratas � Chegam ao poder em 1933. Tem sido o principal partido do país desde então � Estímulo a aparato industrial de alto rendimento � Sindicalismo potente e reconhecido � Política orçamentária explicitamente anticíclica a partir de 1937 Fonte: Souza; Medeiros. Top Income Shares and Inequality in Brazil, 2015 3. Consequências da Crise dos anos 1930 � Duplo movimento, segundo Karl Polanyi (1944, p. 44): � “Extensão da organização de mercado em respeito às mercadorias genuínas acompanhada pela restrição em respeito às fictícias. Enquanto de um lado mercados espalharam-se por toda a superfície do planeta e o montante de bens envolvidos cresceu em proporções inacreditáveis, de outro lado, uma rede de medidas e políticas foi integrada em instituições poderosas designadas para limitar a ação do mercado em relação ao trabalho, terra [natureza] e dinheiro” 3. Consequências da Crise dos anos 1930 � “A Grande Depressão destruiu o liberalismo econômico por meio século. Em 1931-2, a Grã- Bretanha, o Canadá, toda a Escandinávia e os EUA abandonaram o padrão ouro, sempre encarado como a base de trocas internacionais estáveis, e em 1936 haviam-se juntado a eles os fiéis apaixonados pelos lingotes, os belgas e holandeses, e finalmente até mesmo os franceses. � E quase simbolicamente, a Grã-Bretanha em 1931 abandonou o Livre-Comércio, que fora tão fundamental para a identidade econômica britânica desde a década de 1840” (Hobsbawm, 1994, p. 115) 3. Consequências da Crise dos anos 1930 � Ecoando os Planos Quinquenais da URSS � “Plano” e “Planejamento” tornaram-se palavras da moda na política � Os partidos social-democratas adotaram “planos” (Hobsbawm, 1994, p. 116) � No Brasil, Plano Quinquenal de JK, Plano de Metas, de João Goulart � I e II Plano Nacional de Desenvolvimento, no Regime Militar 3. Consequências da Crise dos anos 1930 � Em suma, não haviam estruturas e instituições adequadas para o enfrentamento de uma crise tão grave � Tais instituições foram organizadas a partir das experiências da I e da II Guerra Mundial � E da Crise dos anos 1930 � Estado de bem-estar social, políticas monetária e fiscal intervencionistas � Políticas sociais e de proteção da renda, dos salários e do emprego 3. Consequências da Crise dos anos 1930 � Consequências para o Brasil � 1. Decadência do setor cafeeiro � 2. Revolução de 1930 � Tem início a Era Vargas � Também, tem início a industrialização por substituição de importações � Deslocamento do centro dinâmico: exportações eram o elemento essencial na determinação do crescimento (motor da economia); o mercado interno (consumo e investimento) começa a se tornar esse motor