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57 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO Unidade II 5 DO GOVERNO DE CAFÉ FILHO (1954‑55) AO GOVERNO DE JÂNIO QUADROS (1961) 5.1 O governo de Café Filho Com o suicídio de Getúlio Vargas, quem assumiu o governo foi o seu vice, Café Filho, que governou de 1954 a 1955. Nesse período, dois ministros ocuparam o Ministério da Fazenda: Eugênio Gudin, um economista liberal, e José Maria Whitaker, representante da cafeicultura paulista. O novo presidente prometia assumir os compromissos firmados pelo seu antecessor, Getúlio Vargas, garantindo não ter pretensões políticas, mas a pressão que Café Filho sofreu fez com que ele permitisse a entrada de inimigos políticos de Vargas no poder. Em novembro de 1955, Café Filho se afastou do governo em função de graves problemas cardíacos. Quem assumiu a presidência foi Carlos Luz, presidente da Câmara. 5.1.1 A gestão de Gudin Eugênio Gudin, com grande prestígio na comunidade financeira internacional, foi o escolhido para ser o ministro da Fazenda logo após o suicídio de Vargas e a subida de Café Filho ao poder. Ele fez uma política econômica muito diferente da de Vargas, era inclinado a atitudes conservadoras e antigetulistas, era crítico das propostas desenvolvimentistas e defendia uma ortodoxia na economia. Além disso, tinha como prioridade políticas anti‑inflacionárias baseadas no controle da emissão monetária e do crédito. Para Gudin, a inflação era resultado da monetização dos déficits públicos e do excesso de crédito, assim, passou a cortar gastos públicos, especialmente investimentos, e executou uma forte restrição creditícia e monetária. Como resultado dessa política restritiva, houve uma forte crise bancária, aumento de falências e pedidos de concordatas. Com o colapso dos preços do café, que representava 60% das exportações brasileiras, o País passou a enfrentar uma forte crise cambial. Contudo, o ministro acreditava na vocação agrícola do País, o que resultou numa forte expectativa por parte dos cafeicultores – expectativa essa que foi frustrada, em função da baixa elasticidade da demanda do produto no mercado mundial. O ministro procurou ajuda nos Estados Unidos, mas o governo do presidente Einsenhower não tinha o Brasil como prioridade, e não houve alternativa: Gudin procurou ajuda nos bancos privados. Assim, com a ajuda obtida, de US$ 200 milhões de dólares a serem pagos em cinco anos, à taxa de 2,5% ao ano, a situação se aliviou por um tempo. 58 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II Entretanto, a principal ação do ministro foi a instrução 113 da Sumoc, de 27 de janeiro de 1955, que permitia às empresas estrangeiras instaladas no Brasil importar máquinas e equipamentos sem cobertura cambial, isso foi feito a fim de complementar e atualizar a tecnologia nas indústrias brasileiras. Essa foi a forma encontrada pelo ministro para driblar os obstáculos à livre entrada de capitais estrangeiros: A existência de taxas cambiais múltiplas beneficiava duplamente os capitais externos: ao importar bens de capital sem a necessidade de primeiro internalizar as divisas à taxa de mercado livre, para depois recomprar as licenças de importação por um valor mais alto nos leilões de câmbio, o capital estrangeiro estaria recebendo um subsídio equivalente ao diferencial entre o custo das divisas na categoria relevante e a taxa do mercado livre. Esse subsídio não era concedido às empresas nacionais, que já enfrentavam, normalmente, em condições de inferioridade a concorrência com as empresas estrangeiras e quase sempre importavam máquinas e equipamentos de segunda mão (REGO; MARQUES, 2014, p. 76). Em relação às contas do governo, o ministro da Fazenda pretendia implementar um forte programa de austeridade fiscal e corte de despesas públicas, mas enfrentou forte oposição do Congresso à elevação da carga tributária. Com total falta de apoio, tanto do Congresso como dos cafeicultores, o ministro Gudin acabou sendo substituído por José Maria Whitaker, que enfrentou uma forte crise no setor bancário brasileiro. 5.1.2 A gestão Whitaker José Maria Whitaker era um forte crítico do regime de taxas múltiplas de câmbio estabelecido pela Instrução 70 da Sumoc. Além disso, ele defendia os interesses dos cafeicultores e tinha como principal meta a eliminação do confisco cambial. O novo ministro queria recuperar a participação das exportações brasileiras no mercado mundial, para isso propunha‑se acabar com a política intervencionista, pois acreditava que a queda dos preços no mercado internacional beneficiaria o Brasil por meio da eliminação de produtores menos eficientes. Nesse período a liquidez da economia foi restabelecida pela ação do Banco do Brasil. O novo ministro sugeriu uma grande reforma cambial, buscando unificar as dez taxas distintas, sendo cinco de importação, quatro de exportação e a do mercado livre, pela qual se efetuavam as transações financeiras, mas essa proposta não contou com o apoio político e se chocava particularmente com as propostas de Juscelino Kubitschek. Whitaker entendia que deveria haver uma ampla reforma na política cambial do País, assim o ministro concedeu ao BNDE, cujo superintendente era, na época, Roberto Campos, total autonomia. A política do BNDE passou a ser a instituição de um mercado livre de câmbio, apesar dos efeitos inflacionários que uma desvalorização poderia ocasionar. Campos e Whitaker defendiam também um mercado livre para o café. 59 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO Em setembro de 1955, ficou pronta a Instrução da Sumoc, que reformularia o sistema cambial brasileiro. Ela promovia: • a unificação cambial por meio de um regime de taxas flutuantes; • a criação de um mecanismo diferenciado para o café, por dois anos. O FMI (Fundo Monetário Internacional) aprovou o projeto, mas o mesmo não acontecia com o Congresso e os cafeicultores, que viam esse governo apenas como de transição. Whitaker acabou sendo exonerado, sem conseguir implementar sua reforma cambial. A pasta da fazenda foi então ocupada por Mário Câmara, que tentou fazer uma política monetária contracionista, elevando a taxa de redesconto para os mesmos níveis aplicados durante a gestão de Gudin. Contudo, restando apenas três meses para o fim do governo de Café Filho, não foi possível fazer qualquer mudança muito significativa na política econômica do País. Tabela 14 – Alguns dados do período 1954 1955 PIB 7,8% PIB 8,8% Agricultura 7,9% Agricultura 7,7% Indústria 9,3% Indústria 11,7% Serviços 9,8% Serviços 9,2% Fonte: Abr.eu (1990, p. 163). 5.2 O governo de Juscelino Kubitschek (1956‑60) O período do governo de JK foi emblemático para o Brasil, tanto pela democracia como pela promessa de modernização do País por meio do Plano de Metas, que garantia, por intermédio de seu lema “Cinquenta anos em cinco”, uma profunda modificação do Brasil. Eram os chamados “Anos Dourados”. O mundo vinha se modificando desde o final da Segunda Guerra, havia um grande avanço de novas tecnologias e o Brasil não queria ficar à margem dessa evolução. O parque industrial brasileiro estava se diversificando e contava com o apoio do novo governo. Contudo, esse período, como veremos no decorrer de nossa discussão, enfrentou grandes desafios, como o de uma inflação crescente, endividamento externo, problemas com o FMI e ameaça de desaceleração do crescimento. Então vamos estudar esse período tão rico para a formação econômica do Brasil. 60 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II 5.2.1 A eleição de JK Juscelino Kubitschek, mineiro da cidade de Diamantina, foi eleito presidente da República em 1955; foi o 20º presidente do Brasil. Foi candidato por uma coligação entre o PSD (PartidoSocial Democrata) e o PTB (Partido Trabalhista Brasileiro). Enfrentou forte oposição da UDN (União Democrática Nacional) e dos militares. O novo governo era hostilizado pela UDN, para quem JK e seu vice, João Goulart, representavam a continuação política de Vargas. Como vimos, Café Filho, que havia assumido a presidência após o suicídio de Vargas, teve um ataque cardíaco, o que deu a oportunidade de o general Teixeira Lott instaurar uma espécie de “golpe preventivo”, garantindo uma posse tranquila de JK. As eleições foram disputadas por Juscelino Kubitschek, Adhemar de Barros e Plínio Salgado. As eleições não se deram de forma tranquila, havia rumores de que o presidente Carlos Luz, que havia assumido a cadeira desde o afastamento de Café Filho, se juntara à UDN e pretendia dar um golpe ocupando a cadeira de forma definitiva. O ministro da Guerra, o general Lott, alegando a segurança do processo eleitoral, mobilizou as tropas militares, que ocuparam prédios públicos, rádios e jornais. Alguns historiadores defendem a ideia de que o golpe dos militares comandados pelo general Lott adiou por dez anos o golpe das forças conservadoras. Observação O golpe militar no Brasil ocorreu em 1964 e durou 21 anos. O presidente em exercício, Carlos Luz, não deixou o cargo tranquilamente, sendo deposto. O presidente do Senado, Nereu Ramos, foi empossado interinamente e garantiu a transmissão do cargo ao eleito democraticamente Juscelino Kubitschek e seu vice João Goulart. O governo de JK foi caracterizado por uma estabilidade política. A aliança entre o PSD (dominante no Congresso) e o PTB garantiu à presidência uma base parlamentar de sustentação e apoio político, o que explica a aprovação de programas e projetos governamentais. O PSD era mais conservador e defendia os interesses dos cafeicultores e da burguesia industrial, já o PTB reunia lideranças sindicais e trabalhadores urbanos. Os anos 1950 representaram profundas modificações na sociedade e na economia brasileiras. Essas mudanças se fizeram sentir na música, na arquitetura, nas artes plásticas, no cinema, na grande novidade que era a televisão e também no novo papel da mulher nessa sociedade, que se modernizava muito rapidamente. Os meios de comunicação de massa eram uma novidade muito bem‑vinda. As rádios passaram a atingir uma população cada vez maior, além de uma revolução na publicidade, que vendiam uma gama enorme de produtos, tanto nas rádios, como nos recém‑inaugurados canais de televisão. 61 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO No cinema, popularizaram‑se as comédias brasileiras, que recebiam o nome de “chanchadas”, produzidas por um empresa chamada Atlântida, além do sucesso do teatro de revista, com suas vedetes, que encantavam o País. As mulheres da década de 1950 lentamente começaram a perceber que a elas estava reservado um novo papel social. Com a modernização do comércio e a inserção dos eletrodomésticos nos lares brasileiros, muitas esposas encontraram tempo para exercer trabalhos fora do lar. Mas essas mudanças ainda eram tênues, principalmente no papel que as mulheres tinham dentro dos lares. As diferenças entre mulheres e homens ainda eram nítidas. O trabalho feminino, mesmo que cada vez mais comum, ainda era cercado de preconceitos. A paisagem urbana se modificava com a construção de grandes edifícios, largas avenidas e o surgimento de novos materiais de construção, deixando as casas e prédios com aspectos mais modernos. Você já pensou como era o dia a dia de nossas avós? Então vamos lá: se sua avó vivesse em algum centro urbano brasileiro, provavelmente o cotidiano dela era algo parecido como isso: ao acordar, em geral muito cedo, ela ia à padaria, que nem sempre era perto da sua casa, lá ela comprava o pão e o leite. Ao chegar em casa, acendia o fogão a carvão, fervia o leite (sim, o leite tinha que ser fervido) e servia o café para os membros da família, que normalmente eram muitos, já que não havia métodos contraceptivos eficientes. Quando os membros da família saíam de casa em direção aos seus afazeres diários, nossa avó iniciava a labuta doméstica: lavava a roupas e fraldas (sem máquina de lavar, sem sabão em pó e não existia fralda descartável), limpava a casa (sem eletrodomésticos), fazia o almoço (sem batedeira, liquidificador, micro‑ondas ou até mesmo geladeira). Além disso, vovó tinha que sair diariamente para fazer compras com a sacola debaixo do braço, ia à quitanda, à mercearia, à granja, ao açougue, à peixaria etc. Nossas avós tinham que fazer compras diariamente, uma vez que não havia como armazenar alimentos, pois eram muito raras as casas que contavam com geladeira. As tardes eram reservadas a costuras, consertos e remendos de roupas, à limpeza da cozinha, ao cuidado com as crianças etc. À noite, havia o jantar para servir, a louça para lavar. A única diversão provavelmente era um rádio, no qual as mulheres acompanhavam as novelas. Observe que não era nada fácil a vida de uma dona de casa na década de 1950. Se a nossa avó vivesse no interior ou na zona rural, a coisa era ainda pior. O fogão era a lenha, não havia água encanada, assim, as roupas deveriam ser lavadas no rio. Não havia comércio por perto, o pão, a farinha e a maioria dos alimentos eram feitos em casa. Os animais eram criados e abatidos em casa. Não havia escolas e nem hospitais por perto e muitas vezes não havia nem um rádio para servir como fonte de informação e diversão. Com a vinda dos automóveis, a popularização dos eletrodomésticos e, finalmente (no final da década de 1950), a pílula anticoncepcional, a vida das famílias se modificou muito. Arrumar e limpar a casa, assim como o cozinhar, ficou mais fácil. A sobra de tempo mudou o papel da mulher na sociedade, ela passou a ter disponibilidade para o trabalho fora, o que contribuirá com o orçamento doméstico, estimulando a indústria de bens de consumo. 62 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II Com um número menor de filhos, passou a haver menos custos para a família. Com a presença de eletrodomésticos, como a geladeira, as compras não precisavam mais ser diárias. Isso significa que, aos poucos, a configuração do comércio nos bairros começava a se modernizar, fazendo surgir os primeiros supermercados. A popularização dos automóveis tornou a locomoção mais ágil e isso também significou ganho de tempo, tanto para o homem como para as mulheres; era um novo mundo que se descortinava. Entretanto, é lógico que essas mudanças demandaram um certo tempo para se concretizarem. Muitas famílias demoraram muito tempo para aceitar essas mudanças. O Brasil ainda era um país semirrural e a presença das mulheres no mercado de trabalho era vista com extrema desconfiança. A sociedade ainda achava que o papel único feminino era cuidar do marido, dos filhos e da casa. Havia apenas algumas profissões que eram consideradas adequadas, como professora primária, secretária, médica pediatra e, se a família fosse mais pobre, balconista, lavadeira, doméstica; naturalmente, tudo isso limitava muito a inserção da mulher no mercado de trabalho. Contudo, apesar de lentas, essas mudanças eram inevitáveis, e aos poucos a sociedade brasileira foi se modificando. Nas décadas de 1950 e 1960, essas modificações ficaram restritas aos grandes centros urbanos, como São Paulo e Rio de Janeiro, mas entre as décadas de 1970 e 1980, esse panorama mudou e cada vez mais as mulheres de todo o País passam a se tornar elementos fundamentais para a constituição do orçamento familiar. Os chamados anos dourados remetiam a um espírito otimista que consagrou o governo Kubitschek e que significava todo um conjunto de mudanças sociais e culturais que ocorreram dentro de um debate sobre a reconstrução nacional. O grande símbolo dessa modernidade se concretizaria na construção de Brasília, a nova capital,que seria a marca mais clara do governo de JK. Figura 10 – Propaganda de eletrodomésticos na década de 1950 63 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO Saiba mais Assista ao filme: OS ANOS JK – uma trajetória política. Dir. Silvio Tendler. Brasil: Terra Filmes, 1980. 110 minutos. 5.2.2 O programa de obras públicas e a construção de Brasília O maior projeto do governo de JK foi a construção de uma nova capital federal, que recebeu o nome de Brasília. Em 1956, foi promulgada a Lei nº 2.874, que autorizava o Executivo Federal a iniciar as obras da nova capital do Brasil. Desde 1891, a Constituição Federal já falava em transferência da capital, inclusive em 1894, foi nomeada uma comissão (Missão Cruls) que visitou e demarcou a área do futuro Distrito Federal no Planalto Central. O Rio de Janeiro, cidade que se tornou capital da colônia em 1763, era uma cidade com graves problemas. Além das constantes e graves epidemias, era uma cidade que nascera em função do porto, assim, era desorganizada e vulnerável a invasões. No período que vai da colônia até o estabelecimento da República, a cidade assistiu a várias revoltas. Em 19 de setembro de 1956, foi fundada a Companhia da Nova Capital (Novacap), que permitiu finalmente a construção da nova capital. O responsável pelo projeto arquitetônico foi Oscar Niemeyer e o projeto urbanístico ficou a cargo de Lúcio Costa. As obras duraram três anos e dez meses: iniciaram‑se no final de 1956 e a capital foi inaugurada em 21 de abril de 1960. Os trabalhadores que participaram das obras provinham, em sua maioria, do Nordeste brasileiro, e ficaram conhecidos como “candangos”. Dentro do Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, JK comandava a realização da construção de Brasília. O presidente tinha pressa, o seu objetivo era terminar a construção da capital antes do fim do seu mandato. O Plano Piloto de Lúcio Costa possui a forma de um avião com duas asas (sul e norte) e eixos laterais (leste e oeste) integrados pelas superquadras habitacionais, compostas por blocos que contêm ruas laterais com comércio, escolas, parques etc. A Esplanada dos Ministérios fica no corpo do “avião”. As áreas onde se localizam as embaixadas e a Universidade de Brasília (UNB) são voltadas para um imenso lago artificial. 64 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II Figura 11 – Imagem da construção do Congresso Nacional, em Brasília, projetado por Oscar Niemeyer, em meados da década de 1950 Na prática, o novo Distrito Federal representava uma mudança estratégica do poder para uma região que não era ocupada pelas lideranças, principalmente de São Paulo, Minas Gerais e do Rio de Janeiro. Seria o fim da polarização do Sudeste. Em função de seu arrojado projeto arquitetônico, a nova capital brasileira tornou‑se um ícone de modernidade e de progresso e foi considerada Patrimônio Cultural da Humanidade. Uma grande dificuldade era a resistência de vários funcionários públicos à transferência do Rio de Janeiro para Brasília, considerada distante, um verdadeiro fim de mundo. A mudança da nova capital federal e a construção de uma cidade inteira não foi unanimidade: a UDN criticou veementemente a mudança do Distrito Federal para o Planalto Central, alegando que a construção de uma nova capital seria extremamente custosa. E, de fato, o aumento do endividamento do governo e a consequente inflação não demoraram a chegar, corroborando as críticas dos oposicionistas. 5.2.3 O Plano de Metas Com o Plano de Metas, iniciou‑se um período de planificação da economia brasileira. O modelo de planificação estatal já havia sido experimentado em locais como a antiga URSS, mas o New Deal, adotado pelos EUA para solucionar a Grande Depressão, também pode ser considerado planejamento em cima de premissas keynesianas. O Plano de Metas pode ser considerado o auge do processo de desenvolvimento e modernização do País, que buscava promover uma industrialização integrada. O BNDE identificava a existência de uma demanda reprimida por bens de consumo duráveis, mas, para constituir esse setor, seria necessário investir em bens intermediários. O Plano continha 31 metas e teve como principal objetivo o desenvolvimento do Brasil a partir do processo de industrialização e do aprofundamento do PSI. 65 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO Lembrete PSI é uma sigla para designar processo de substituição de importações. A demanda por bens de consumo duráveis era resultado da concentração de renda do período anterior, que elevara os padrões de consumo das classes sociais mais altas, mas também de uma crescente classe média. O Plano foi esboçado por JK e pelo BNDE, visando superar esses gargalos estruturais. O Plano foi elaborado a partir de estudos que haviam se iniciado mais de dez anos antes, na década de 1940, por diversas comissões, que indicavam a necessidade de eliminar pontos de estrangulamento da economia brasileira. Um exemplo dessas comissões foi a criação do Grupo Executivo da Indústria Automobilística (Geia). Os principais instrumentos de ação do governo para realizar as metas foram: • investimentos das empresas estatais; • crédito a juros baixos praticado pelo Banco do Brasil; • carência longa praticada pelo Banco do Brasil; • política de reserva de mercado, que tinha por base a lei do similar nacional e era obtida por meio de instrumentos tarifários e cambiais (o câmbio múltiplo do governo de Getúlio Vargas não havia sido abolido); • concessão de avais para obter empréstimos externos. Observação A 31ª primeira meta, chamada de meta síntese, referia‑se à construção de Brasília e à transferência da capital para o Planalto Central. O Plano priorizava os investimentos nos setores de transporte e energia, indústria de base e bens de consumo duráveis e não duráveis. Destacou‑se, na época, a indústria automobilística e de eletrodomésticos. O lema do Plano era “cinquenta anos em cinco”. Para JK, o País só diminuiria a desigualdade social gerando riquezas por meio da industrialização. Para tanto, era necessário recorrer ao capital estrangeiro e a uma maior intervenção do Estado na economia por intermédio da manutenção do PSI. 66 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II Lembrete Desde a década de 1930, o Brasil adotara o modelo de desenvolvimento por substituição de importações, ou seja, produzir internamente em vez de importar, protegendo, assim, a indústria nacional. O Brasil vinha passando por esse modelo de substituição de importações desde a década de 1930, mas não era algo planejado, o que levava, como vimos, a constantes desajustes no balanço de pagamentos do País. O Plano de Metas, ao contrário, pretendia planejar esse modelo de forma a reduzir os desequilíbrios. Dos setores que se beneficiaram do Plano, podemos citar a indústria automobilística, com a vinda das montadoras, como a Volkswagen (que analisaremos com mais detalhes adiante) e o setor energético. Por exemplo: o governo construiu as usinas hidrelétricas de Paulo Afonso, no Rio São Francisco, e as barragens de Furnas, em Minas Gerais, e Três Marias, também no Rio São Francisco. A seguir veremos as 31 metas na íntegra. Os setores do plano e as metas correspondentes são os seguintes: I – Setor de energia (43,4% do investimento inicialmente planejado): Meta 1 – Energia elétrica – elevação da potência instalada de 3.000.000 KW para 5.000.000 KW até 1960 e ataque de obras que possibilitarão o aumento para 8.000.000 KW em 1965; Meta 2 – Energia nuclear – instalação de uma central atômica pioneira de 10.000 KW e expansão da metalurgia dos minerais atômicos; Meta 3 – Carvão mineral – aumento da produção de carvão de 2.000.000 para 3.000.000 de toneladas/ano,de 1955 a 1960 com ampliação da utilização “in loco” para fins termelétricos dos rejeitos e tipos inferiores; Meta 4 – Petróleo (produção) – aumento da produção de petróleo de 6.800 barris em fins de 1955 para 100.000 barris de média de produção diária em fins de 1960; Meta 5 – petróleo (refinação) – aumento da capacidade de refinação de 130.000 barris diários em 1955 para 330.000 barris diários em fins de 1960; II – Setor transportes (29,6% do investimento planejado): Meta 6 – Ferrovias (reaparelhamento) – com investimentos de US$ 239 milhões e Cr$ 39,8 bilhões; 67 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO Meta 7 – Ferrovias (construção) – construção de 2.100 km de novas ferrovias, 280 km de variantes a 320 km de alargamento de bitola; Meta 8 – Rodovias (pavimentação) – pavimentação asfáltica de 5.000 km de rodovias até 1960; Meta 9 – Rodovias (construção) – construção de 12.000 km de rodovias de 1ª Classe até 1960; Meta 10 – Portos e dragagem – reaparelhamento e ampliação de portos e aquisição de uma frota de dragagem com investimento de US$ 32,5 milhões e Cr$ 5,9 bilhões; Meta 11 – Marinha Mercante – ampliação da frota de cabotagem e longo curso de 300.000 toneladas e da frota de petroleiros de 330.000 toneladas (deadweight) dwt; Meta 12 – Transporte aeroviário – renovação da frota aérea comercial com a compra de 42 aviões; III – Setor alimentação (3,2% do investimento planejado): Meta 13 – Produção agrícola (trigo) – aumento da produção de trigo de 700.00 para 1.500.000 toneladas; Meta 14 – Armazéns e silos – construção de armazéns e silos para uma capacidade estática de 742.000 toneladas; Meta 15 – Armazéns frigoríficos – construção e aparelhagem de armazéns frigoríficos para uma capacidade estática de 45.000 toneladas; Meta 16 – Matadouros industriais – construção de matadouros com capacidade de abate diário de 3.550 bovinos e 1.300 suínos; Meta 17 – Mecanização da agricultura – aumento do número de tratores em uso na agricultura de 45.000 para 72.000 unidades; Meta 18 – Fertilizantes – aumento da produção de adubos químicos de 18.000 toneladas para 120.000 toneladas de conteúdo de nitrogênio e anidrido fosfórico; IV – Setor indústrias de base (20,4% do investimento planejado): Meta 19 – Siderurgia – aumento da capacidade de produção de aço em lingotes de 1.000.000 para 2.000.000 toneladas por ano em 1960 e para 3.500.000 toneladas em 1965; Meta 20 – Alumínio – meta revista: aumento da capacidade nacional de produção de alumínio para 25.000 toneladas em 1960. Em 1960 a produção de alumínio foi 16.573 toneladas; 68 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II Meta 21 – Metais não‑ferrosos – expansão da produção e refino de metais não‑ferrosos (cobre, chumbo, estanho, níquel etc.); Meta 22 – Cimento – aumento da capacidade de produção de cimento de 2.700.000 para 5.000.000 toneladas anuais, em 1960; Meta 23 – Álcalis – aumento da capacidade de produção de álcalis de 20.000 em 1955 para 152.000 toneladas anuais, em 1960 (produção de soda cáustica); Meta 24 – Celulose e papel – aumento da produção de celulose de 90.000 para 200.000 toneladas e de papel de jornal de 40.000 para 130.000 toneladas, entre 1955 e 1960; Meta 25 – Borracha – aumento da produção de borracha de 22.000 para 65.000 toneladas, com início da fabricação da borracha sintética; Meta 26 – Exportação de minério – aumento da exportação de minério de ferro de 2.500.000 para 8.000.000 toneladas e preparação para exportação de 30.000.000 toneladas do próximo quinquênio; Meta 27 – Indústria de automóvel – implantação da indústria para produzir 170.000 veículos nacionalizados em 1960; Meta 28 – Construção naval – implantação da indústria de construção naval; Meta 29 – Indústria mecânica e de material elétrico pesado – implantação e expansão da indústria mecânica e de material elétrico pesado; V – Educação (3,4% do investimento planejado): Meta 30 – Pessoal técnico – intensificação da formação de pessoal técnico e orientação da Educação para o Desenvolvimento; Meta Síntese – Brasília: A nova capital foi construída rapidamente e as despesas com a construção da cidade forma em torno de 300 bilhões de cruzeiros, o que significava 2,3% do PNB. Adaptado de: Notas..., [s.d.]. Brasília foi colocada apenas no final do Plano como uma meta que resumia todas as outras. A cidade, com seu arrojado projeto, teve o poder de resumir a modernidade pretendida pelo plano. 69 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO 5.2.4 Análise do resultado do Plano de Metas Energia O Plano destinou ao setor de energia elétrica 43,4% dos investimentos. Foram construídas obras de grande porte como a Usina de Furnas, que passou a fornecer grande parte da energia da região Sudeste. Segundo dados, a potência instalada no País chegou a 4.777 MW em 1960 e, em 1965, atingiu 7.411 MW – isto é, 89% do previsto. Em julho de 1960, o governo assinou a Lei nº 3.782, criando o Ministério das Minas e Energia. Outra importante empresa criada foi a Petrobras, que havia sido fundada em 1954. A empresa teria como funções refinar petróleo vindo de fora e estabelecer um programa de prospecção, a fim de ampliar a produção nacional de petróleo, que atingiu, na área de produção, 76% da meta e, na de refinação, 125% do objetivo proposto. Transportes O investimento nessa área foi de 29,6% e o Plano visava ao reequipamento do sistema ferroviário, à ampliação de rodovias e à melhoria dos portos. O reequipamento das ferrovias atingiu 76% dos objetivos, mas, das metas iniciais para a construção de novas estradas de ferro, só foram alcançados 20%. O serviço de pavimentação atingiu 100% do previsto e a abertura de novas rodovias ultrapassou 150% da meta inicial. Rodovias importantes foram construídas na época, como a Régis Bittencourt, que liga São Paulo ao Sul do País, e a Belém‑Brasília. O aumento dos portos foi em torno de 57%. A indústria automobilística foi uma das metas mais importantes do Plano de Metas. Já havia pequenas fábricas de automóveis e autopeças no Brasil antes do plano. Nessa época, a empresa nacional mais importante na área automobilística era a Fábrica Nacional de Motores (FNM); instalada no País desde 1942, ela começou a produzir tratores e caminhões. O governo atraiu o investimento de grandes montadoras. Foi no governo JK que entraram no País grandes montadoras de automóveis, como Ford, Volkswagen, Willys e GM (General Motors). Estas indústrias instalaram suas filiais na região Sudeste do Brasil, principalmente nas cidades de São Paulo e no ABC (Santo André, São Bernardo e São Caetano). Alimentação A intenção do Plano era diminuir a dependência das importações de trigo, mas, dessa meta, somente 24% foram cumpridos. O governo alcançou sucesso maior na construção de armazéns, matadouros, frigoríficos etc. do que alcançaram as metas pretendidas. Também tiveram excelente desempenho a mecanização e a produção de fertilizantes, que atingiram 250% da produção inicialmente planejada. 70 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II Indústria de base Foi um item de grande sucesso do plano. A siderurgia, por exemplo, atingiu 100%, a produção de alumínio, 80%, a de níquel, 70%, a de cimento, 90%, e a de minérios de ferro, 94% das metas. Foi também implantada a indústria de borracha sintética e natural, que atingiu 100% do previsto, e a de material elétrico, que também alcançou plenamente a meta. Educação O setor de educação foi o que menos importância teve na elaboração e execução do Plano de Metas: contou com apenas 3,4% dos investimentos inicialmente previstos e atingiu apenas uma área – a formação técnica – e nada falava de Ensino Básico ou Superior. O governoalegava que a educação técnica é que forneceria as bases do desenvolvimento do País e que a elite já tinha acesso a essa educação mais aprimorada. Assim, a população menos favorecida é que precisava de educação especializada, embora aqui haja uma grave contradição: ao não investir no Ensino Básico, a população mais carente não teria como chegar ao ensino técnico‑administrativo do País, o que exigia uma formação especializada. 5.2.5 Os pontos positivos do Plano de Metas Como podemos observar, o cumprimento das metas foi bastante satisfatório e em alguns setores chegou a ser superado. Em função desse sucesso do Plano, de fato, o País apresentou, nesse período, importantes índices que apontavam para o desenvolvimento com mudanças estruturais. A economia que anteriormente ainda se calcava na exportação de café foi transferida definitivamente para a indústria nacional. O PIB cresceu 7%, em média, no período, e a renda per capita dobrou com relação à década anterior. O Programa de Metas foi muito bem‑sucedido principalmente no desempenho da indústria. A produção industrial cresceu 80% entre 1955 e 1961, com aumento significativo da produção de aço, que cresceu 100%, energia elétrica, que aumentou 380%, e indústria mecânica, que expandiu‑se 125%. De 1957 a 1961, o PIB cresceu a uma taxa anual de 7%, correspondendo a uma taxa per capita, ou seja, por habitante, de quase 4%. Se considerarmos toda a década de 1950, o crescimento do PIB brasileiro per capita foi aproximadamente três vezes maior do que o do resto da América Latina. De 1955 a 1959, os lucros industriais aumentavam 76% e a produtividade, 35%. A presidência de Juscelino é lembrada até os dias de hoje como um período de grandes realizações. Os brasileiros ainda sentem saudosismo desse período, marcado por uma grande alavancagem da indústria brasileira. Muitos brasileiros ainda sentem como maior exemplo de modernidade a construção de Brasília. 71 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO Ao longo do Plano de Metas, podemos verificar alguns resultados de crescimento setoriais (GREMAUD, 2002): • Materiais de transporte: crescimento de 711%; • Materiais elétricos e comunicações: crescimento de 417%; • Têxtil: crescimento de 54%; • Alimentos: crescimento de 54%; • Bebidas: crescimento de 15%. Na tabela a seguir, podemos observar as taxas de crescimento do PIB, indústria, agricultura e serviços de 1955 a 1961: Tabela 15 Ano PIB Indústria Agricultura Serviços 1955 8,8 11,1 7,7 9,2 1956 2,9 5,5 ‑2,4 0 1957 7,7 5,4 9,3 10,5 1958 10,8 16,8 2 10,6 1959 9,8 12,9 5,3 10,7 1960 9,4 10,6 4,9 9,1 1961 8,6 11,1 7,6 8,1 Fonte: Gremaud (2002, p. 380). 5.2.6 Os pontos negativos do Plano de Metas Apesar do sucesso, o Plano apresentava problemas, como o aprofundamento da dependência externa, tanto de tecnologia como de bens estratégicos. Com a vinda das multinacionais ao País, muitos empregos foram criados e isso sem dúvida é um aspecto positivo, mas, ao mesmo tempo, a entrada de capital externo quase sem controle deixou nossa nação mais dependente desse capital. A agricultura não teve o desempenho esperado para o período, apesar do investimento na modernização do setor, com a instalação de indústria de tratores e fertilizantes. O Plano foi acusado também de aumentar a concentração de renda do País, principalmente em função do abandono de investimentos na agricultura. Em termos de modificações sociais e de distribuição de renda, as classes proletárias tiveram participação bastante inferior em relação às classes médias: o salário mínimo elevou‑se apenas 15%. 72 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II A divida externa alcançou o patamar de 3,8 bilhões de dólares, e isso era agravado pelas remessas de lucros das multinacionais aos seus países de origem. A aposta na indústria automobilística levou o governo a investir pouco nas estradas de ferro. Se há automóveis, é necessário que haja a abertura de estradas. Assim, o modelo de escoamento da produção passou a ser o rodoviário, que além de mais custoso, sofreria um grande baque 20 anos mais tarde, com o primeiro e o segundo Choques do Petróleo. Para financiar projeto tão ambicioso, o governo JK teve que recorrer à emissão monetária e isso obviamente acelerou a inflação. O período foi marcado pela constante deterioração do saldo em transações correntes. Nesse período, a dívida externa do Brasil cresceu de forma substanciosa. De fato, o Plano de Metas aprofundou o PSI com todas as contradições inerentes a esse modelo. Vejamos alguns indicadores econômicos do período, como inflação, variação da base monetária, variação do salário mínimo real, saldo em transações correntes e dívida externa: Tabela 16 Ano Inflação (%) Variação da base monetária (%) Variação do salário mínimo real (%) Saldo em transações correntes em US$ milhões Dívida externa total em US$ milhões 1955 23 15,8 ‑9,5 2 1.445 1956 21 19,3 ‑1,3 57 1.580 1957 16,1 35,1 ‑9,6 ‑264 1.517 1958 14,8 18 14,5 ‑248 2.044 1959 39,2 38,7 ‑12,7 ‑311 2.234 1960 29,5 40,2 19,4 ‑478 2.372 1961 33,2 60,4 ‑14,7 ‑222 2.835 Fonte: Gremaud (2002, p. 381). 5.2.7 Outros indicadores econômicos do período 5.2.7.1 A política cambial Segundo Abreu (1990), no início da década de 1950, a política cambial era o principal instrumento de política econômica. As manipulações da taxa de câmbio e as tarifas de importação e exportação eram as principais estratégias do governo, mas durante o passar da década, foram realizadas profundas mudanças na política cambial nacional. Em 1957, foi realizada uma importante reforma na política cambial. A ideia era simplificar o antigo sistema de taxas múltiplas, utilizadas desde a Era Vargas, e introduzir um sistema de proteção específica 73 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO por produtos da mesma categoria. Com a reforma, sobraram apenas duas categorias de câmbio: a geral e a especial. A categoria geral cobria a importação de matérias‑primas, equipamentos e bens genéricos que não contassem com suficiente suprimento interno. A categoria especial era formada de importados, bens de consumo restrito e bens cujo suprimento fosse satisfatório pelo mercado interno. Para operar esse novo sistema, foi criado o Conselho de Política Aduaneira (CPA), com o objetivo de enquadrar os produtos em uma das duas categorias previstas. A ideia principal dessa reforma foi acelerar a substituição de bens de capital, diminuindo a ênfase dada aos bens de consumo. Essa reorientação era adequada à nova fase do PSI. 5.2.7.2 Política monetária A política econômica desse período era gerenciada pela Sumoc, pelo Banco do Brasil e pelo Tesouro. A Sumoc era o órgão controlador do sistema, e era responsável pela política cambial, por fixar os juros de redesconto e o percentual de depósitos compulsórios dos bancos, fiscalizar o registro de capitais estrangeiros e os bancos comerciais. O Banco do Brasil era o órgão executor da política traçada pela Sumoc. Ele operava a carteira de redesconto e a caixa de mobilização bancária, a carteira de câmbio e a carteira de comércio exterior. Além disso, era responsável pelo serviço de compensação de cheques e era depositário das reservas voluntárias dos bancos comerciais. Exercia também a função de banco do governo. O Tesouro Nacional era o órgão autorizado a emitir papel‑moeda e amortizá‑lo por meio da caixa de amortização, mas não tinha poderes de colocá‑lo em circulação, essa atribuição pertencia à carteira de redescontos, que estava submetida ao Banco do Brasil. Assim, o Banco do Brasil exercia duas funções: a de banco comercial e a de autoridade monetária. As atribuições desse banco permitiam que ele crescesse constantemente, o único órgão que controlava o Banco doBrasil era a Sumoc. 5.2.7.3 O papel do setor público O Plano de Metas colocava nas mãos do setor público a tarefa de aumentar e criar infraestrutura necessária à expansão industrial do Brasil. Ao Estado foi dada a prerrogativa de prover os insumos básicos e a criação de infraestrutura de fundamental importância para a industrialização. Ao longo do Plano, houve um aumento bastante significativo das funções do Estado, que passou a controlar o setor de transportes tanto rodoviário como ferroviário, além do setor marítimo. Na área de energia, o governo passou a controlar a Petrobras e manteve o controle sobre as siderúrgicas. 74 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II Essa intervenção crescente do Estado não encontrou, na época, resistência do setor privado. A participação do governo no gasto total cresceu de 19%, em 1952, para 23,7%, em 1961. Esses gastos vinham das seguintes fontes: • Auxílio, subvenções e coberturas dos déficits das empresas públicas de transportes. • Despesas com pessoal. • Investimento em infraestrutura em áreas nas quais o setor privado não podia ser estimulado em função do controle de preços. 5.2.7.4 Capital estrangeiro O crescimento industrial que ocorreu nesse período baseava‑se nas empresas estatais, privadas e privadas nacionais. A visão nacionalista que tivera sido alimentada por Getúlio Vargas era, nesse momento da histórica econômica do Brasil, abandonada, pois sendo o lema do novo governo “Cinquenta anos em cinco”, havia pressa, e, portanto, necessidade de abrir‑se para o capital estrangeiro. Em função dos baixos preços dos fatores de produção brasileiros, o País tornou‑se um espaço privilegiado para a atuação de empresas multinacionais, que passaram a dominar amplamente a produção industrial. Vejamos, na citação a seguir, os motivos da predominância de multinacionais no Brasil: O predomínio das EMN foi consequência direta das características da industrialização no capitalismo monopolista. Dadas as escalas de produção e a intensidade de capital necessárias, foi inevitável a supremacia do capital externo, que dominou amplamente os setores industriais mais dinâmicos da nossa economia. Ao capital privado nacional coube o papel subordinado de fornecedor de insumos e componentes, como no caso da relação complementar entre o setor de autopeças e a indústria automobilística (REGO, 2014, p. 88). A participação das multinacionais na economia brasileira nesse período a tornou mais aberta e internacionalizada. 5.2.7.5 Desenvolvimento e dependência externa Como vimos anteriormente, o governo brasileiro realizava investimentos no setor industrial a partir da emissão monetária e da abertura da economia ao capital estrangeiro. Essa abertura significou, em última instância, um grande aumento da presença de multinacionais, que passaram a ter a primazia sobre setores fundamentais da economia, como transporte e geração de energia elétrica, ao mesmo tempo em que houve um desestímulo à entrada de capital privado na economia. 75 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO Essa participação das multinacionais não só atingia o setor automobilístico, mas também a indústria farmacêutica, química, de cigarros, mecânica etc. O problema era não só o controle de setores considerados estratégicos, mas a remessa de lucros (muitas vezes superiores aos investimentos por elas realizados) para seus países de origem de forma desordenada. Esse tipo de procedimento era ilegal porque os mecanismos de controle eram precários e facilmente burláveis aqui no Brasil. As consequências não tardaram, pois a criação de mercados barateou o fornecimento de matérias‑primas e impulsionou os investimentos do Estado, expandindo a economia. No final do governo JK, os problemas mostravam novos impasses na economia, com o aumento da inflação, provocado pelas emissões de papel‑moeda para financiar os investimentos estatais e de créditos. Os organismos internacionais exigiram de Juscelino um controle inflacionário. No entanto, o presidente negou‑se a fazer uma política de contenção financeira, pois isso implicaria a redução dos salários e a diminuição dos créditos estatais às importações de mercadorias essenciais, como a gasolina. 5.2.8 O final do governo de JK A administração de JK foi marcada por um cunho desenvolvimentista, o Plano de Metas, apoiado pelo slogan “Cinquenta anos em cinco”, foi o resumo dos objetivos do governo. Como vimos o governo investiu em vários setores da indústria e infraestrutura do Brasil, e pela primeira vez o PIB industrial do País superou o agrícola. O País, assim, deixou de ser uma economia primário‑exportadora e passou a se modernizar. Como resultado, a produção industrial aumentou 80%. Brasília era considerada a meta síntese do Plano de Metas, era a realização de um projeto antigo que pretendia tirar a capital do Rio de Janeiro e transferi‑la para o Planalto Central do País. Da maneira como o Distrito Federal foi constituido, com uma arquitetura extremamente moderna e arrojada, espelhava a modernidade pretendida pelo governo de JK. O Brasil, assim, passou a contar com a construção de hidrelétricas e novas e importantes rodovias, rompendo, por exemplo, com o isolamento geográfico do Centro‑Oeste e do Norte do Brasil. Mas, como vimos, todos esses esforços deixariam como herança um enorme endividamento tanto externo como interno e uma inflação crescente. Além disso, os projetos econômicos levaram a uma lacuna cada vez maior entre as classes trabalhadoras e as classes mais favorecidas. É fato que há um importante crescimento da Classe Média e isso, em última instância, significa desenvolvimento. Porém, ao privilegiar a vida urbana, o governo aprofundou as desiguldades sociais nacionais. Com a modernização do parque industrial e a construção da nova Capital Federal, iniciou‑se um importante êxodo rural, que sobrecarregaria os centros urbanos, que não tinham condições de receber essa população de forma adequada. As favelas se multiplicaram nas periferias e morros das grandes cidades, levando a um grande problema social, para o qual não havia nenhuma solução imediata. De fato, é inegavel que o governo de JK modernizou e trouxe riqueza para o Brasil, mas isso não significava que os problemas sociais haviam sido extintos; ao contrário, novas questões, tanto 76 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II econômicas quanto sociais, surgiram a partir do Plano de Metas, e o governo não deixou soluções a curto prazo para essas dificuldades. Em termos políticos, o governo de Juscelino Kubitschek foi marcado por uma democracia estável, a aliança entre o PSD e o PTB garantiu ao Executivo Federal uma excelente base de governabilidade e esse apoio político foi o que garantiu, no final das contas, a execução de tantos projetos elaborados por JK. Levando em conta os problemas e as vitórias do governo, a modernização acabou pesando na balança, e JK terminou seu governo absolutamente consagrado pelo povo. Na sucessão presidencial de 1960, a UDN lançou Jânio Quadros como candidato, o PTB, com o apoio do PSB, lançou o marechal Henrique Teixeira Lott, já o PSP lançou Adhemar de Barros. Quem venceu o pleito foi Jânio Quadros, que obteve uma votação muito expressiva. O vice‑presidente, que naquela época também era eleito, foi o candidato a vice do PTB, João Goulart, formando uma chapa no mínimo improvável, mas isso nós veremos no próximo item. Em 1961, JK, apesar de ter sido eleito senador pelo estado de Goiás, foi cassado pelo golpe militar de 1964 e acabou tendo seus direitos políticos cassados, sob a acusação de corrupção. Em junho de 1964, o ex‑presidente foi exilado. Então viajou aos Estados Unidos, depois à França, e só retornou ao País em 1967. Na sua volta, associou‑se com Carlos Lacerda e João Goulartpara criar uma aliança política que foi denominada “Frente Ampla”, que tinha como objetivo se opor à Ditadura Militar. O ex‑presidente pretendia voltar à vida política em outubro de 1975, mas não obteve sucesso. JK publicou um livro com o título Meu Caminho para Brasília, e se tornou membro da Academia Mineira de Letras. JK faleceu em 1976, em um acidente de automóvel na Via Dutra, perto da cidade de Rezende, no estado do Rio de Janeiro, em circunstâncias que nunca foram completamente esclarecidas. Figura 12 77 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO 5.3 O governo de Jânio Quadros (janeiro de 1961 a agosto de 1961) O futuro presidente do Brasil, Jânio da Silva Quadros, nasceu em 25 de janeiro de 1917, em Campo Grande, no estado de Mato Grosso. Teve uma vida política agitada, começando por se candidatar a vereador nas eleições de 1947 pelo PDC (Partido Democrata Cristão), sem, contudo, conseguir se eleger. Entretanto, a sorte estava ao lado de Jânio, pois com a suspensão do registro do Partido Comunista Brasileiro (PCB), muitas cadeiras ficaram vazias na Câmara Municipal de São Paulo, e ele acabou sendo chamado para preencher um desses lugares em 1948. Em 1950, foi eleito deputado estadual, tendo como bandeira política a moralização do serviço público. Finalmente, o futuro presidente se candidatou à prefeitura pelo do PDC em coligação com o Partido Socialista Brasileiro (PSB), vencendo por larga margem em 1936. Em 1954, candidatou‑se a governador do estado de São Paulo e venceu as eleições. O governo de JK, ao implantar o Plano de Metas, acabou favorecendo muito o estado de São Paulo tanto no que se refere à presença cada vez maior de indústrias como ao aumento da receita tributária do Estado. No dia 20 de abril de 1959, foi fundado o Movimento Popular Jânio Quadros (MPJQ), que apoiava eleição do governador à presidência da República. Ele venceu as eleições de 3 de outubro de 1960. No mesmo pleito, João Goulart foi eleito vice‑presidente. Jânio Quadros venceu as eleições com grande número de votos contra seu adversário nas eleições presidenciais, o general Henrique Lott. Durante a sua campanha, Jânio utilizou uma música que empolgou a população: ”[...] varre, varre, vassourinha, varre, varre a bandalheira [...]”, prometendo varrer a corrupção do País, equilibrar as finanças públicas e diminuir a inflação. O governo do novo presidente contou como o apoio político da elite brasileira, mas, na política internacional, apesar de se declarar contra o socialismo, manteve contato com países do bloco comunista. Observação No período da eleição de Jânio Quadros, votava‑se separadamente para presidência e para vice‑presidência, assim, os dois candidatos poderiam ser de partidos diferentes. Jânio Quadros e João Goulart foram empossados em 31 de janeiro de 1961 e, no seu discurso de posse, o recém‑eleito presidente fez graves acusações à gestão anterior em cadeia nacional de rádio, acusando JK de ineficiência administrativa e responsabilidade pelos altos índices de inflação e pela dívida externa de dois bilhões de dólares. O governo de Jânio durou apenas sete meses. No início do seu governo, Jânio Quadros impôs uma imagem de moralidade, colocando em prática medidas bastante bizarras, como: proibição dos biquínis nas praias brasileiras, veto à transmissão pela 78 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II televisão de concursos de miss, que eram grande sucesso na época, proibição das rinhas de galo e do uso de lança‑perfume nos bailes de carnaval e regulamentação do jogo de carteado. Economia O governo de Jânio Quadros foi bastante conservador em questões econômicas. Para tentar conter a inflação, o governo seguiu a cartilha proposta pelo FMI de duras medidas. Assim, desvalorizou a moeda nacional para favorecer as exportações e limitar as importações, não permitiu aumentos salariais e diminuiu a concessão de crédito para conter a inflação. Todavia, apesar dos esforços do governo, a inflação permaneceu alta. Política Jânio Quadros procurou centralizar os poderes no Executivo e tentou diminuir o poder do Congresso Nacional, mas não foi bem‑sucedido nessa tentativa de aumentar seus poderes. Em função do seu fracasso de obter mais poder, no dia 13 de março de 1961, o presidente foi às rádios e às emissoras de televisão anunciar uma reforma cambial que pretendia atender aos interesses do setor exportador e dos credores internacionais, mas obviamente isso acabaria punindo os grupos nacionais que haviam contraído financiamento externo durante a vigência da taxa anterior. Jânio Quadros pretendia manter uma política externa de contato e entendimento com todas as nações, independentemente de sua orientação política e ideológica. Assim, fez algo surpreendente ao estabelecer relações com as nações do bloco socialista. Em maio de 1961, o presidente recebeu no Palácio do Planalto, em Brasília, a primeira missão comercial da República Popular da China enviada ao Brasil e em julho recebeu a missão soviética. Também entrou em contato com o líder socialista Che Guevara e o condecorou com a Ordem do Cruzeiro do Sul, ocasião que aproveitou para pedir as libertações de 20 padres espanhóis presos em Cuba. A repercussão desse contato com o bloco socialista foi a pior possível e os problemas já começaram tendo como consequência imediata, entre os militares, ameaças de insoburdinação e, inclusive, de devolução de suas condecorações em sinal de protesto. Já entre os congressistas, começaram a surgir violentos protestos contra a condecoração de Guevara. Observação Ernesto Guevara de la Serna, mais conhecido como Che Guevara, foi um médico argentino que se tornou guerrilheiro e liderou a Revolução Cubana (1953‑1959), que reorganizou o Estado cubano em moldes socialistas. Foi presidente do Banco Nacional de Cuba e ministro da Indústria. Guevara acreditava que a América do Sul e a África deveriam partir para a via socialista, e assim organizou grupos de guerrilha no Congo e na Bolívia. Foi capturado em solo boliviano e executado em 9 de outubro de 1967. 79 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO Figura 13 – Momento da condecoração de Che Guevara por Jânio Quadros Saiba mais Assista ao filme: DIÁRIOS de motocicleta. Dir. Walter Salles. Argentina; EUA; Chile; Peru; Brasil, Reino Unido; Alemanha; França: Filmfour, 2004. 126 minutos. 5.3.1 A economia do governo Jânio Quadros No início da década de 1960, a economia brasileira ainda mantinha sua trajetória de crescimento, e Jânio Quadros se beneficiou desse crescimento, mas em 1962, os dados sobre o nível de investimento e o crescimento industrial já apontavam para a recessão que se iniciaria em 1963. Segundo Celso Furtado (apud REGO, 2014), a economia brasileira, nos anos 1960, já apresentava sintomas de esgotamento do PSI e caminhava para a crise e a estagnação. Esse processo era reforçado pela influência das classes conservadoras, que ainda queriam que o País se mantivesse primário‑exportador. Os preços agrícolas eram altos e o nível de vida da população brasileira, baixo. E se a demanda por bens industriais era baixa devido ao baixo poder de compra da população, seria absolutamente necessário que houvesse profundas mudanças na estrutura econômica brasileira, o que o governo de Jânio não fez. Câmbio Jânio Quadros adotou uma visão conservadora na formulação de sua política econômica. Em março de 1961, o governou implantou uma reforma na política cambial, por meio da instrução 204 da Superintendência de Moeda e do Crédito. Essa reforma referia‑se à desvalorização da taxa de câmbio e à unificação do mercado cambial, que foi transformado em câmbio livre. 80 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on -2 4/ 08 /1 5 Unidade II Inflação O presidente culpava o governo anterior pela escalada inflacionária e havia uma clara relação entre a nova política cambial e uma política anti‑inflacionária do governo. Dívida externa Em maio de 1961, o governo obteve sucesso nas negociações com os credores norte‑americanos e europeus, conseguindo novos empréstimos e reescalonamento da dívida externa. Propostas na área econômica Jânio enviou ao Congresso projetos de lei antitruste e propôs a lei de limitação de remessa de lucros pelas multinacionais, mas nenhum desses projetos foi posto em votação. O presidente não tinha apoio algum do Congresso Nacional. 5.3.2 A crise política do governo de Jânio Quadros A crise política do governo de Jânio Quadros iniciou‑se com a condecoração de Che Guevara e teve consequências bastante preocupantes: o udenista Carlos Lacerda, inimigo declarado do governo, fez uma grave acusação em 24 de agosto de 1961, em rede nacional: clamou que o presidente planejava um golpe e acusou‑o de se aproximar dos comunistas. Jânio Quadros renunciou no dia seguinte a essas acusações, afirmando em carta enviada ao Congresso Nacional que “forças terríveis” o haviam levado a optar pela renúncia. O Congresso aceitou sua saída e a presidência foi ocupada interinamente pelo presidente da Câmara, Ranieri Mazilli, até o retorno do vice‑presidente, João Goulart, que estava na China em visita oficial. O presidente tinha perdido o apoio de toda a sua base aliada, inclusive da UDN. A proclamada renúncia do presidente foi rapidamente aceita pelo Congresso Nacional. Muitos acreditam que o anúncio da saída do presidente foi uma tentativa de obter mais força para governar, pois é possível que Jânio Quadros acreditasse que o Congresso e a população considerassem seu vice, Jango, uma pessoa perigosa, devido a suas ideias muito próximas do socialismo. A ideia de Jânio era que o Congresso se recusaria a aceitar Jango como presidente, e, assim, não aceitasse sua saída do governo, lhe dando, ao contrário, mais poder. Mas o tiro saiu pela culatra quando o Congresso se apressou em aceitar sua renúncia. A posse de João Goulart, que estava em visita oficial à China (havia sido enviado ao País comunista pelo próprio presidente), foi algo inesperado após a renúncia de Jânio Quadros. No próprio dia 25 de agosto, ocorreram as primeiras manifestações populares. No dia 27 de agosto de 1961, Jânio Quadros foi para Londres, provavelmente decepcionado pelo fato de sua manobra política ter fracassado. O Congresso aprovou o Ato Adicional, promulgado em 3 de setembro, garantindo o mandato de Goulart até 31 de janeiro de 1966 em regime parlamentarista. Goulart foi finalmente empossado no dia 7 de setembro. 81 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO Acreditava‑se, na época, que o Congresso não daria posse ao vice de Jânio, João Goulart, que era considerado “perigoso” por acreditar em ideologias socialistas. Jango, como era conhecido, encontrava‑se em missão governamental na China, que, não esqueçamos, já era um país socialista, quando houve a bombástica notícia da renúncia do presidente. Historiadores acreditam até que o envio de Jango à China foi uma manobra política do presidente Jânio Quadros. Veja a seguir a carta de renúncia de Jânio Quadros: Fui vencido pela reação e assim deixo o Governo. Nestes sete meses, cumpri meu dever. Tenho‑o cumprido, dia e noite, trabalhando infatigavelmente, sem prevenções nem rancores. Mas, baldaram‑se os meus esforços para conduzir esta Nação pelo caminho de sua verdadeira libertação política e econômica, o único que possibilitaria o progresso efetivo e a justiça social, a que tem direito o seu generoso povo. Desejei um Brasil para os brasileiros, afrontando, nesse sonho, a corrupção, a mentira e a covardia que subordinam os interesses gerais aos apetites e às ambições de grupos ou indivíduos, inclusive, do exterior. Forças terríveis levantam‑se contra mim, e me intrigam ou infamam, até com a desculpa da colaboração. Se permanecesse, não manteria a confiança e a tranquilidade, ora quebradas, e indispensáveis ao exercício da minha autoridade. Creio mesmo, que não manteria a própria paz pública. Encerro, assim, com o pensamento voltado para a nossa gente, para os estudantes e para os operários, para a grande família do País, esta página de minha vida e da vida nacional. A mim, não falta a coragem da renúncia. Saio com um agradecimento, e um apelo. O agradecimento é aos companheiros que, comigo, lutaram e me sustentaram, dentro e fora do Governo e, de forma especial, às Forças Armadas, cuja conduta exemplar, em todos os instantes, proclamo nesta oportunidade. O apelo é no sentido da ordem, do congraçamento, do respeito e da estima de cada um dos meus patrícios para todos; de todos para cada um. Somente, assim, seremos dignos deste País, e do Mundo. Somente, assim, seremos dignos da nossa herança e da nossa predestinação cristã. Retorno, agora, a meu trabalho de advogado e professor. Trabalhemos todos. Há muitas formas de servir nossa pátria (QUADROS, 2010). 82 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II A sociedade brasileira atravessou, a partir da renúncia do presidente Jânio Quadros, um período de grande instabilidade econômica e política, que resultou na interrupção da democracia e na instalação de uma ditadura militar, a partir de março de 1964, que duraria 21 anos. Jânio Quadros retornou de Londres e tentou disputar o governo paulista pelo PTN (Partido Trabalhista Nacional), mas não conseguiu se eleger. Acabou tendo seus direitos políticos cassados em 1964 pelo regime militar. Ele voltou ao cenário da política brasileira apenas em 1985, como o fim da Ditadura Militar, concorreu à prefeitura da cidade de São Paulo, foi eleito e empossado em 1986. O ex‑presidente faleceu em 1992 em função de problemas de saúde (DICIONÁRIO..., 2001). 5.4 Do governo João Goulart (1961‑63) ao golpe de 1964 5.4.1 O governo de João Goulart (1961‑63) João Goulart, conhecido como Jango, nasceu em São Borja, no Rio Grande do Sul, em 1919. A partir de 1946, ao ser lançado por Getúlio Vargas como deputado estadual, entrou definitivamente para a vida política e, em 1951, elegeu‑se senador da república, cargo do qual licenciou‑se para assumir a Secretaria do Interior e Justiça. Em 1953, assumiu a presidência do diretório nacional do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Em 1953, durante a última gestão de Vargas, foi nomeado para o Ministério do Trabalho. Sua grande preocupação foi o salário mínimo: pretendia dobrá‑lo. Ganhou apoio popular, porém também angariou profunda antipatia dos empresários. Goulart fez um governo de caráter bastante populista. Entre suas ações estavam: financiamento de habitações, criação de um instituto que cuidava da aposentadoria dos trabalhadores das indústrias e idealização do 1º Congresso Brasileiro de Previdência Social. Em função de sua política, que era acusada pelos setores mais conservadores da sociedade de populista, acabou exonerado. Posteriormente, foi empossado como vice‑presidente de JK em 1956, obtendo mais votos que o próprio presidente. Jango tinha grande força entre os sindicatos e o presidente foi obrigado a depender de seu vice para resolver questões trabalhistas. Jango se elegeria novamente como vice‑presidente em 1961, dessa vez de Jânio Quadros. Quando da ocasião da renúncia do presidente, estava em uma missão na China. Lembrete A ideia de Jânio Quadros era uma recusa pelo Congresso e pela população brasileira de sua renúncia, devido ao medo de que Jango, que tinha fama de socialista, assumisse a presidência. No entanto, a expectativa de Jânio foi frustrada e sua renúncia foi prontamente aceita. 83 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DOBRASIL CONTEMPORÂNEO Em 1º de setembro de 1961, Jango desembarcou em Porto Alegre e foi recebido com enorme aprovação popular, apoiado pela campanha liderada por Leonel Brizola, governador do Rio Grande do Sul, que se mobilizou e criou a Campanha da Legalidade. Logo a seguir, em 2 de setembro, o Congresso aprovou a Emenda Constitucional que inaugurou o sistema de governo parlamentarista no Brasil. Essa foi uma manobra política que visava limitar os poderes do Executivo, fazendo com que o governo ficasse nas mãos do Congresso e não do presidente. Quando finalmente assumiu o cargo, Jango, sabendo das limitações impostas pelo novo regime parlamentarista, procurou obter mais poderes, ampliando a sua base política. Tancredo Neves, do PSD de Minas Gerais, tornou‑se primeiro‑ministro, mas só ficou no cargo até julho de 1962, quando Brochado da Rocha, também do PSD, assumiu o cargo, que também deixou rapidamente em setembro. João Goulart apresentou um projeto ao Congresso que autorizava a realização de um plebiscito: pela consulta popular o governo saberia se o povo estava aceitando o parlamentarismo no Brasil. Com uma votação expressiva a favor do presidencialismo, o presidente obteve permissão para constituir imediatamente um conselho de ministros, sem necessitar de autorização prévia do Congresso, o que significava, em última instância, a restauração informal do presidencialismo. 5.4.2 A economia do período Jango (1961 a março de 1964) Se compararmos esse período com o governo de JK, podemos observar uma forte reversão da situação econômica. Esse período, principalmente a partir de 1963, caracterizou‑se por uma grande crise econômica. Houve uma queda nos investimentos e a taxa de crescimento da renda brasileira também caiu muito. Veja a tabela a seguir: Tabela 17 Ano PIB Indústria Taxa de Inflação (IGP) 1961 8,6 11,1 33,2 1962 6,6 8,1 49,4 1963 0,6 ‑0,2 72,8 1964 3,4 5,0 91,8 1965 2,4 ‑4,7 65,7 Fonte: Gremaud (2002, p. 385). O novo governo recebera uma herança econômica muito complicada. Havia uma grave crise financeira, levando Jango a procurar convencer os credores norte‑americanos, assim como o próprio FMI, de que as intenções do governo eram sanear as contas públicas. O presidente viajou em abril de 1962 para a capital dos EUA a fim de buscar recursos financeiros e discutir os temas que vinham dificultando as relações entre os dois países. Porém, não conseguiu recursos do exterior. 84 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II A situação no Brasil era muito grave, a inflação era crescente e havia uma forte insatisfação popular. Foi adotado um programa de emergência que visava combater a inflação e antecipar um plebiscito que teria como propósito decidir a continuidade ou não do regime parlamentarista. Uma das causas dessa crise foi a herança inflacionária e as dívidas, tanto internas como externas, deixadas pelo Plano de Metas. O governo tentou reequilibrar a economia com a elevação da taxa de poupança por meio de uma reforma fiscal e contenção do déficit de custeio das empresas públicas. Para as políticas monetárias, bancária e financeira pública, o governo estabeleceu controles quantitativos do crédito, a menção à criação de um Banco Central e do Banco Rural e a reforma da legislação bancária. O programa defendia também a adoção de política cambial baseada em taxa única fixada no que se chamava nível realista. O ponto de maior atrito foi a reforma agrária proposta pelo presidente Jango com mudança do princípio constitucional que determinava que a indenização de terras desapropriadas fosse feita em dinheiro. Enquanto isso, as relações com os EUA se deterioravam, com o exame feito pelo Congresso de alterações da legislação relativa à remessa de lucros de capital estrangeiro e também com a decisão do governo federal de cancelar as concessões de lavra de minério de ferro da empresa norte‑americana Hanna Corporation e de apoiar a desapropriação dos bens da Companhia Telefônica Nacional, subsidiária da empresa americana International Telephone and Telegraph. O governo começou a ter graves problemas no gerenciamento da economia do País. O déficit público aumentou substancialmente em função do aumento das despesas públicas, eram muito grandes os gastos com as empresas de transportes e houve também uma expansão da oferta monetária, criando uma pressão inflacionária. No final de 1962, a instabilidade política refletiu‑se na economia, a expansão dos meios de pagamento manteve‑se em 4% ao mês até dezembro, quando chegou a 13%, o PIB reduziu‑se para 6,6%, a inflação mensal chegou à ordem de 5 a 7% e o custo de vida aumentou quase 50%. 5.5 A Cepal e suas principais diretrizes Na tentativa de solucionar as crises econômicas pelas quais passava o Brasil, o governo de Jango tentou pôr em prática uma política econômica baseada no Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico, que foi elaborado e executado por San Tiago Dantas, ministro da Fazenda, e Celso Furtado, ministro do Planejamento. O Plano visava a uma série de reformas institucionais que iriam atuar sobre os graves problemas estruturais do País. Previa‑se o controle do déficit público, manutenção da política desenvolvimentista com reformas de base (bancária, fiscal, urbana, eleitoral, agrária e educacional) e medidas de caráter nacionalista que aumentariam o intervencionismo do Estado. San Tiago Dantas foi a Washington em março de 1963 com os objetivos de obter financiamento ao Plano Trienal, discutir um plano de ajuda do governo norte‑americano ao Brasil e renegociar as dívidas brasileiras. 85 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO O receituário do plano partia de ideias advindas da corrente cepalina (Cepal), que analisaremos a seguir. 6 A TEORIA DO DESENVOLVIMENTO NA AMÉRICA LATINA A chamada Teoria do Desenvolvimento da Cepal surgiu na América Latina. Economistas, sociólogos e outros teóricos formularam a tese de que a economia dos países latino‑americanos era periférica e de que sua relação com os países desenvolvidos, chamados pelos cepalinos de centrais, era injusta. Eles então concluíram que o modo de produção capitalista que o mundo, como um todo, havia adotado criava profundas lacunas econômicas e políticas entre os diversos países. Essa condição desfavorável para periferia, mas muito favorável para o centro, gerava uma relação que partia do pressuposto de que a economia da periferia só se expandiria a partir do bom desempenho das economias centrais. Essa condição desfavorável resultou na composição de teorias que compunham uma literatura cuja principal característica era a compreensão do desenvolvimento dos países, mas principalmente o desejo de encontrar um meio de resolver os problemas das nações periféricas da América Latina, que deveria se modernizar, mas usando pressupostos próprios e não apoiados nas teorias que alavancaram as economias europeias e norte‑americanas, como a busca da máxima produtividade, investimento e geração de poupança. A Cepal foi fundada logo após o término da Segunda Guerra Mundial em um clima de Guerra‑Fria, que teve como ponto de inflexão a criação do Plano Marshall. Os países latino‑americanos não contavam com os recursos desse plano e pleiteavam uma maior ajuda dos países desenvolvidos. Lembrete O Plano Marshall foi criado durante a reunião de Bretton Woods, nos EUA, em 1944, e tinha como objetivo ajudar as economias destruídas após a Segunda Guerra. Os recursos viriam por intermédio de um banco criado na ocasião e que recebeu o nome de Banco Mundial. Na realidade, podemos considerar o Plano Marshall como uma estratégia estadunidense de angariar aliados. 6.1 A tese de Raul Prebisch Raul Prebisch (1901‑86), um dos mais importantes teóricos da Cepal, havia sido presidente do Banco Central da Argentina. O autor das mais importantes teorias de desenvolvimentopara a América Latina elaborou uma teoria que partia do princípio de que a Teoria das Vantagens Comparativas, de David Ricardo, que era usada como paradigma de organização das trocas internacionais, não se aplicava ao caso da América Latina. Segundo os princípios da Cepal, elaborados por Prebisch, a única alternativa de desenvolvimento da América Latina e dos países periféricos como um todo era a industrialização. 86 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II Observação A Teoria das Vantagens Absolutas, de Adam Smith, foi criticada pela Teoria das Vantagens Comparativas, elaborada por David Ricardo, autor clássico. Segundo ele, sua teoria produzia uma visão estática da divisão de trabalho internacional, pois acreditava que o comércio internacional não deveria se apoiar em quem produz melhor, mas sim naqueles que produzem a custos menores – dando, assim, a oportunidade a todos os países de participar do comércio internacional. Segundo Raul Prebisch, se a América Latina partisse dos pressupostos ricardianos, produziria somente matérias‑primas para exportação, e importaria produtos manufaturados, mais caros – o que geraria poucos lucros para os países periféricos e lucros extraordinários para os países centrais. Havia uma defesa, por parte dos países mais desenvolvidos, de que a partir do momento em que houvesse importação de tecnologia, esta seria inexoravelmente absorvida pelos periféricos. Assim, não haveria necessidade de os países mais pobres da América Latina se industrializarem, eles obteriam recursos por meio das suas exportações. Para Prebisch, essa teoria não se justificava, pois produtos primários agregam muito menos valor e, portanto, são muito mais baratos que produtos industrializados, produzindo lucros muito menores aos primário‑exportadores. A deterioração dos termos de troca pode ser explicada pela Teoria do Ciclo. Na fase ascendente, os preços e a renda sobem nos países desenvolvidos, o que eleva a demanda internacional de alimentos e matérias‑primas. Consequentemente, com os preços favoráveis, os países periféricos aumentam sua oferta. Já na fase descendente, quando os preços começam a cair, os países subdesenvolvidos não conseguem reduzir de imediato sua oferta, pois não dá para “desplantar”, ou seja, o que foi plantado terá que ser colhido, e isso demanda tempo. Nessa fase, embora a demanda externa se retraia e os preços diminuam, a oferta agrícola tende a ter uma queda menos do que proporcional, por sua rigidez. Produtos industrializados tendem a se ajustar com muito mais rapidez às fases descendentes, pois as fábricas podem simplesmente produzir menos. Além disso, nas economias desenvolvidas, a rigidez dos salários é maior, o que evita maiores reduções da demanda de produtos industriais dentro do próprio país. Uma maneira de amortizar as perdas é repassá‑las aos países periféricos, que são dependentes das tecnologias e dos produtos industrializados das economias centrais, o que quer dizer que as economias mais pobres não possuem a opção de rejeitar preços mais altos e acabam consumindo os bens a preços muitas vezes caríssimos. Ainda segundo o economista, os países centrais teriam como obrigação ajudar os países periféricos a combater esse período de depressão. Na fase descendente, eles deveriam aumentar seus empréstimos para a periferia poder continuar importando seus produtos, sobretudo bens de capital. Isso é possível porque na fase de depressão, os recursos financeiros ficariam ociosos nos países centrais. 87 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 FORMAÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL CONTEMPORÂNEO 6.2 Estratégias de desenvolvimento para a América Latina Prebisch apoiava que a industrialização aconteceria por meio da substituição de importações e de nosso PSI, com: • Compressão do consumo supérfluo, principalmente de produtos importados, por meio de tarifas elevadas e de restrições às importações; • Incentivo ao ingresso de capitais externos, principalmente na forma de empréstimos de governo a governo, principalmente para implementação de infraestrutura básica; • Realização de reforma agrária para aumentar a oferta de alimentos e matérias‑primas, bem como a demanda de produtos industriais, mediante a expansão de mercado interno; • Maior participação do estado na captação de recursos e na implantação de infraestrutura como energia, transportes e comunicação (COUTO, 2007). A teoria de Prebisch foi alvo de inúmeras críticas por parte dos donos de fatores de produção e industriais, países centrais e grandes latifundiários, que exerciam seu poder nos países latino‑americanos. Eles viam na teoria da Cepal uma destruição do seu modo de obter lucros enormes com imensas facilidades. Os grupos socialistas também criticavam a Cepal, pois consideravam que ela era favorável aos princípios capitalistas. Todavia, apesar das muitas críticas recebidas, os princípios cepalinos foram adotados no Brasil durante o governo de Getúlio Vargas, o Estado Novo (1937‑45), quando foram fundadas a CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) e a Companhia Vale do rio Doce (para a extração de minérios), que contou com a ajuda norte‑americana – tanto financeira como tecnológica – para a sua implantação. Os princípios cepalinos foram também adotados durante a era JK, na qual os projetos de industrialização foram adotados como meio de desenvolvimento do Brasil, a partir de uma ajuda constante de capital advindo dos EUA. Durante a década de 1950, com o aquecimento da economia mundial e a adoção do modelo de substituição de importações cada vez mais presente no Brasil, houve a oportunidade para a instalação de multinacionais no País, porém, dentro da lógica do PSI, as importações ficavam restritas. O PSI, no entanto, se estende além do Plano de Metas, durante o governo de João Goulart. O plano de desenvolvimento que foi batizado com o nome de Plano Trienal foi apoiado, em sua elaboração, nas teorias da Cepal, já que seu grande elaborador, Celso Furtado, era um forte adepto dessa corrente. De fato, esse modelo de substituição de importações como promotor de desenvolvimento foi adotado no Brasil até 1990, quando, então, Fernando Collor de Mello o abandonou e fez a abertura do mercado brasileiro para o exterior. 88 Re vi sã o: G io va nn a - Di ag ra m aç ão : J ef fe rs on - 2 4/ 08 /1 5 Unidade II Apesar do sucesso de seu pensamento em vários países latino‑americanos, as ideias de Raul Prebisch foram se modificando com o passar dos anos. A seguir faremos uma pequena análise dessas mudanças, sempre baseados em Couto (2007): 1ª etapa: formação do pensamento (1943‑49) É nessa primeira fase que surge o conceito de centro e periferia. A teoria é que países centrais europeus e norte‑americanos são industrializados e se beneficiam nas relações internacionais dessa posição, enquanto os países periféricos da América do Sul, África e Ásia não se beneficiam do contato comercial e econômico com o exterior. Não há um ciclo nos países centrais diferente das periferias. Para ele, o movimento é único, porém dividido em fases diferentes e separadas. O principal conceito estava baseado na teoria dos ciclos econômicos: trata‑se de uma série de desequilíbrios que alternam de forma circular os momentos de aumento e diminuição da renda. Esse processo se dá tanto internamente como no mercado externo. Nessa fase, Prebisch criticava posturas liberais, que defendiam que o mercado se autorregula, e previa uma intervenção estatal. Há uma preocupação constante nessa fase com o comércio internacional, que se refletiria no desempenho do balanço de pagamentos das nações. 2ª etapa: sistema centro‑periferia e a industrialização da América Latina (1949‑1959). Época em que surge a Cepal Nessa fase, o conceito de centro‑periferia é mais atuante na elaboração das teses do autor. É aqui que aparece com mais força o conceito de
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