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AULA 11 - A FILOSOFIA DO DIREITO NA IDADE MÉDIO

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1 
 
NADER, Paulo. Filosofia do Direito. 25 ed. Rio de Janeiro: Forense LTDA, 2018 
A FILOSOFIA DO DIREITO NA IDADE MÉDIA 
SUMÁRIO: O cristianismo. São Paulo. Santo Agostinho. Santo Isidoro de 
Sevilha. O pensamento jurídico de Santo Tomás de Aquino. O voluntarismo de 
John Duns Escoto e Guilherme de Ockham. 
O CRISTIANISMO 
No plano do pensamento a época medieval foi dominada pelo cristianismo, doutrina surgida 
no início de nossa era com Jesus de Nazaré que, em seus três anos de apostolado, pregou a 
fraternidade entre os homens e condenou a hipocrisia e a cobiça. 
As ideias que semeou foram desenvolvidas, mais tarde, por seus sucessores, principalmente 
por Paulo de Tarso, que exaltou o poder da fé e negou valor à lei terrena para a salvação dos 
homens. 
No último quartel do século IV, após cinquenta anos de perseguição oficial aos cristãos, o 
governo romano, com a promulgação de vários decretos, reconheceu o cristianismo como a única 
religião legal do império. 
O triunfo não se deu por contingência, mas devido a um conjunto de motivos que favoreceu a 
expansão da doutrina junto às camadas sociais. A nova religião, que colhera subsídios em outras 
seitas e se apresentava como a mais universal, franqueou o seu culto às mulheres, diferentemente 
do mitraísmo, seu rival, além de atender aos pobres e aos humildes.
1
 
Embora se encontrem alusões à justiça nas palavras do grande fundador, em sua formulação 
original o cristianismo não se ocupou com a ideia do Direito nem da organização da sociedade, de 
vez que, apoiado no Novo Testamento, surgiu para atuar no âmbito da consciência humana, 
infundindo-lhe princípios morais. 
Não se buscavam, com a nova religião, reformas políticas ou sociais, tanto que a Igreja não 
chegou sequer a condenar a escravidão, não obstante recomendasse tratamento humano para a casta 
inferior. Cristo já havia anunciado também: “Meu reino não é deste mundo.” 
Com o pensamento voltado mais para o reino de Deus, os primeiros adeptos do cristianismo 
não se preocupavam com o Estado e seu Direito, mas o encontro com este, todavia, seria forçoso, 
pois os membros daquela religião fatalmente teriam de estruturar a sociedade cristã e a Igreja, tarefa 
que os levaria, obrigatoriamente, à criação de regras de convivência. Conforme análise de Guido 
Fassò,
2
 a indiferença inicial dos cristãos para com o Estado e o Direito foi substituída pelo conflito 
da Igreja e sua ideia de Direito em face do Estado e seu ordenamento jurídico concreto. 
Durante toda a Idade Média, os indivíduos se viam diante de dois fortes poderes: o Estado, a 
quem deveriam se entregar como parte de um todo, e a Igreja, a cuja autoridade deveriam se 
submeter espiritualmente. 
A Filosofia do Direito, como as demais emanações do espírito, foi dominada pelo pensamento 
religioso dos cristãos, que divulgavam a sua crença na origem divina do Direito. A Igreja seria 
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2 
 
superior ao Estado, pois enquanto este ordenava interesses mundanos, aquela se ocupava da vida 
eterna. 
A concepção religiosa do Direito perdurou até o início do século XVII, quando Hugo Grócio 
proclamou a existência de um Direito Natural independente de Deus.
3
 
SÃO PAULO APÓSTOLO 
A Filosofia do Direito medieval, que girou fundamentalmente em torno do cristianismo, foi 
influenciada pela doutrina de Paulo de Tarso, que muitos séculos antes, em Epístola aos Romanos, 
admitira a existência do Direito Natural, inscrito nos corações humanos. Esse Direito estaria para os 
gentios assim como a lei mosaica para os judeus. Segundo o apóstolo, embora os gentios 
ignorassem a lei escrita, poderiam observá-la seguindo os impulsos da natureza. Para o apóstolo, a 
noção de justiça não se achava aprisionada na lei positiva, pois homem justo não se fazia pela 
observância da lei, mas pela fé na orientação do Redentor. 
São Paulo, que em sua formação intelectual inspirara-se na filosofia helênica, sobretudo pela 
doutrina estoica, interpretou extensivamente as palavras do evangelho ao revelar as verdades ali 
implícitas. Ao mesmo tempo em que valorizava o poder da fé e do amor, o apóstolo situava a lei em 
plano inferior, pois esta representava a carne, ou seja, o pecado, a morte, tudo aquilo que o fundador 
do cristianismo procurara redimir. A lei positiva deveria ser superada pela fé e pelo amor. As 
reflexões sobre a lei encontram-se principalmente na Epístola aos Romanos, onde foi abordada em 
quatro dimensões: lei divina ou eterna, lei da razão ou natural, lei positiva e lei do pecado. 
As decisões divinas não seriam motivadas e a justiça de Deus não se fundaria em essências ou 
em valores, porque seria exclusivamente a expressão da vontade do Criador. Sendo a vontade de 
Deus a fonte da justiça, podemos inferir duas conclusões: a) emanada de um Ser perfeito, a justiça 
divina seria perfeita; b) não se baseando em dados axiológicos, a justiça seria o próprio Deus em si. 
Relativamente ao plano político, pensava que a autoridade dos governantes originasse de Deus e, 
em consequência, os que se opunham ao poder temporal resistiam, em realidade, à vontade divina. 
Quanto às instituições sociais, Paulo de Tarso concebeu o matrimônio como remédio da 
concupiscência e a virgindade como estado perfeito, que permitia plena dedicação a Deus. Não 
apenas reconheceu a escravidão como parte da organização social como ainda concitou os escravos 
à obediência e os amos, à equidade. 
SANTO AGOSTINHO 
Ao longo da Idade Média o pensamento cristão foi dominado, sucessivamente, pela patrística e 
a escolástica. A primeira formou-se nos primórdios do cristianismo e perdurou até Carlos Magno, 
no ano 800. Seu principal nome foi Santo Agostinho (354-430), nascido em Tagaste, norte da 
África, autor de uma doutrina considerada o elo de transição entre a filosofia grega e a medieval. 
Agostinho seguiu inicialmente a seita maniqueísta, que proclamava a existência de uma luta 
constante entre o princípio do bem e o do mal, porém, ao estabelecer contato com Santo Ambrósio, 
em Milão, e com os escritos de Plotino, abandonou o materialismo e converteu-se à religião cristã, 
ordenando-se sacerdote e, quatro anos após, sagrando-se Bispo de Hipona, antiga cidade da 
Numídia, onde veio a falecer. 
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Em As Confissões, hino de louvor a Deus e autorretrato espiritual, Agostinho considera que a 
verdadeira justiça interior não adota o costume como parâmetro, mas a lei divina, que seria a fonte 
legítima do costume. Fundado na lei retíssima de Deus onipotente, o costume se formaria de acordo 
com os países e tempos. Essa lei seria universal e imutável, não obstante a variação de latitudes e 
épocas.
4
 O texto agostiniano sugere uma contradição, pois ao mesmo tempo em que preconiza a 
mutabilidade do costume em razão do tempo e lugar, retrata a lei-fonte como imutável. Na realidade 
a contradição estaria apenas na aparência, pois a lei divina, consubstanciando-se em princípio, pode 
oferecer um leque de modelos que se diversificam de acordo com a policromia social. 
As reflexões sobre o Direito e o Estado acham-se fundamentalmente na obra De Civitate Dei, 
onde Agostinho revela que a sociedade humana, antes do pecado original, passara por uma fase de 
esplendor com o pleno acatamento do Direito Natural, quando todos os homens eram iguais, puros, 
imortais e viviam como irmãos. Era a Cidade de Deus. Com a queda do homem surgiu a Cidade 
Terrena e com ela a miséria, a morte, a paixão. Em decorrência da nova condição humana, em um 
processo de adaptação foram criados o Estado, o Direito e suas instituições. O papel do Estado seria 
o de prover a paz. Agostinho subordinava o Estado à Igrejae pensava que a lei terrena fosse 
condicionada pela lex aeterna, e quando houvesse conflito entre ambas seria forçoso que esta 
prevalecesse, porque hierarquicamente superior. A Cidade de Deus, que já existia parcialmente na 
terra, um dia substituiria inteiramente a Cidade Terrena, com o retorno dos homens àquela idade 
áurea primitiva. 
Na doutrina de Santo Agostinho, Deus seria o princípio de todas as coisas. O Direito Positivo 
se fundamentaria, em último grau, na lei eterna, que é a lei de Deus. A exemplo de Ulpiano e de 
Cícero, concebeu a justiça como virtude: “Justitia et virtus est quae sua cuique distribuit.”
5
 Ao 
analisar a definição de Cipião sobre a república, Agostinho entrelaça aquela exposição com suas 
ideias, referindo-se à justiça como elemento essencial ao Direito: “Onde não há verdadeira justiça 
não pode existir verdadeiro Direito.” Criticando a opinião daqueles que afirmam ser Direito o que é 
útil ao mais forte, concluiu declarando que não pode haver povo sem justiça, e como a república é 
a coisa do povo, “segue-se que onde não há justiça não há república”.
6
 
Em seu estudo sobre as leis, o filósofo buscou inspiração em fontes estoicas e ainda em São 
Paulo. A lex aeterna, todavia, foi concebida diferentemente dos estoicos. Enquanto para estes ela 
seria a própria ordem do universo, para Agostinho consistia na determinação divina para a 
conservação da ordem natural e o consequente impedimento de sua violação: “Ratio vel voluntas 
Dei, ordinem naturalem servari iubens, et perturbari vetans.”
7
 A prescrição emanava-se da razão ou 
vontade divina sem qualquer embaraço, porque razão e vontade seriam homogêneas, de vez que 
tudo em Deus seria perfeição. A lei eterna seria universal e imutável, além de inacessível 
diretamente ao conhecimento humano, exceto por intermédio da lei natural, que seria o seu reflexo. 
A lei natural, a exemplo do pensamento pauliano, estaria inscrita no coração dos homens. A 
consciência humana apenas revelaria as regras impressas nos corações. A lei 
humana ou terrenaseria a própria lei eterna adaptada pelo legislador à realidade concreta. Ela seria 
uma tarefa da lei eterna por intermédio da lei natural. A causa final da lei humana seria a ordem, 
definida como “a disposição de coisas iguais e desiguais, dando-se a cada uma o lugar que lhe 
corresponde”.
8
 
 
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SANTO ISIDORO DE SEVILHA 
Em sua obra Etimologias, de caráter enciclopédico, Santo Isidoro (570-636), considerado o 
último nome de relevo da Patrística, projetou a sua vasta cultura abordando as diversas áreas do 
saber, no período de transição para a Escolástica. A obra recebeu o subtítulo de Origens, devido ao 
fato de que Isidoro, preliminarmente ao estudo de cada tema, examinava o sentido inicial das 
palavras. A sua época não foi propícia ao desenvolvimento das ciências, em face da queda do 
império romano do Ocidente. Com a divisão política do território romano, o intercâmbio cultural foi 
prejudicado, registrando-se, ainda, o desaparecimento de obras importantes de filósofos gregos e 
cristãos. Foram os mosteiros, por suas bibliotecas, que salvaram a produção cultural do passado e, 
em seu recesso, importantes obras de recompilação do pensamento antigo foram elaboradas, 
destacando-se as de Boécio, Casiodoro e, principalmente, as de Santo Isidoro, Bispo de Sevilha. 
Os estudos jurídicos de Etimologias, segundo Luño Peña, influenciaram obras de Direito, 
inclusive o Decreto de Graciano e, por seu conteúdo romanista, contribuíram para a recepção do 
Direito Romano na Idade Média espanhola.
9
 O talento e aguda percepção do fenômeno jurídico se 
patenteiam no texto em que aponta os predicados da lei: “A lei há de ser honesta, justa, possível, 
adequada à natureza e aos costumes, conveniente no tempo, necessária, proveitosa e clara, sem 
obscuridade que provoque dúvida e estatuída para utilidade comum dos cidadãos e não para 
benefício particular.”
10
 
Esse elenco de qualidades revela aspectos éticos, sociológicos e filosóficos indissociáveis da 
lei. Também não escapou ao filósofo a dimensão técnica dos comandos jurídicos, ao referir-se à 
clareza e ausência de obscuridade no texto legal. Não obstante a afinidade de Santo Tomás com o 
pensamento isidoriano, criticou a sua definição de lei por multiplicar, superfluamente, as suas 
condições, quando antes atribuíra apenas estas: “Lei será tudo o que estiver de acordo com a razão; 
que, ao menos, concorde com a religião, convenha à disciplina, aproveite à salvação.”
11
 Guido 
Fassò censurou, também, a definição, reputando as determinações como “imprecisas e ecléticas, 
heterogêneas e carentes de originalidade e importância”.
12
 Contravenha ao sistema filosófico de 
Isidoro de Sevilha ou careça de originalidade, o certo é que a definição não apenas enumera as 
qualidades da lei, como sintetiza verdades eternas do Direito. 
Relativamente ao Direito, considerado como a harmonia na sociedade, distinguiu seis 
classes: Direito Público, o aplicável aos magistrados e sacerdotes; Direito Quiritário, próprio dos 
cidadãos romanos; Direito Natural, comum a todas as nações, justo, fundado no instinto humano e 
inerente à razão dos homens; Direito Civil ou Positivo, o particular de cada povo e destinado à 
regência interna e que considera Deus e os homens; Direito das Gentes, caracteriza-se por reunir 
normas sobre a guerra, paz, diplomacia, entre outras espécies. 
O PENSAMENTO JURÍDICO DE SANTO TOMÁS DE AQUINO 
Foi com a doutrina de Santo Tomás de Aquino (1225-1274) que a escolástica conciliou a 
filosofia aristotélica com os dogmas religiosos. A época em que o Doutor Angélico viveu e 
elaborou a sua prodigiosa obra foi marcada por novas inclinações no pensamento filosófico, com a 
doutrina agostiniana perdendo o seu poder de influência para a de Aristóteles. De grande 
significado para a transição foi a atividade intelectual de Alberto Magno (1193-1280), filósofo e 
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teólogo alemão, mestre de Tomás de Aquino, em Paris, e dotado de cultura enciclopédica que lhe 
valeu o título de “Doctor Universalis”. Estudioso e admirador de Aristóteles, promoveu o que se 
chamou de recepção aristotélica, induzindo a escolástica para o retorno ao notável filósofo grego. O 
caminho para Tomás de Aquino estava aberto. 
Com um forte poder de síntese o Doutor Angélico escreveu sobre as mais diversificadas 
questões teológicas e filosóficas, onde se acham expostas também as suas reflexões sobre Direito e 
Política. A doutrina básica encontra-se na monumental obra Summa Theologica, que, dividida em 
três partes, reúne 631 questões desenvolvidas em 2.652 artigos. No âmbito da Teologia estabeleceu 
a harmonia entre a razão e a fé, negando validade à teoria da dupla verdade, pois não era possível 
que algo fosse verdadeiro na Teologia e falso na Filosofia, ou verdadeiro nesta e falso naquela. 
Enquanto na Filosofia o conhecimento advém da razão, na Teologia provém da fé e da revelação. A 
Filosofia deveria subordinar-se à revelação, que é critério de verdade. 
Sob a influência de Agostinho, distinguiuquatro espécies de lei: a eterna, a natural, a divina e 
a humana. A lex aeterna era a própria razão divina no governo do universo, e como Deus nada 
concebia temporariamente, a lei seria eterna, daí o seu nome. Como toda lei era um ordenamento 
que colimava um fim, este, na lei eterna, seria o próprio Deus. Citando Agostinho, para quem “as 
coisas de Deus ninguém as conhece senão o Espírito de Deus”, declarou que alguns homens, os 
bem-aventurados, teriam o poder de ver Deus em essência, conhecendo, assim, a lei eterna. Da 
mesma forma que se conhece o sol pela irradiação, sem se conhecê-lo pela substância, assim 
também toda criatura racional conhece alguma irradiação da lex aeterna. Examinando a questão se 
toda lei deriva da eterna, após citar Agostinho, que respondera negativamente a indagação sob o 
fundamento de que a lei escrita permite conduta proibida pela Providência, revelou ser 
indispensável que todas as leis humanas derivem da eterna. A lei humana, todavia, teria natureza de 
lei apenas quando se conformasse à reta razão e, quando se afastasse, lei não seria, mas violência. 
A lei natural, na filosofia tomista, é a participação da criatura racional na lei eterna. É um 
reflexo parcial da razão divina, que permite aos homens conhecer princípios da lei eterna. O 
preceito básico do Direito Natural é o que manda observar o bem e evitar a prática do mal. Ao bem 
corresponderiam as inclinações naturais da criatura humana. Estariam de acordo com a lei natural: 
a) a conservação da vida; b) a união dos seres para a formação da prole; c) a busca da verdade; d) a 
participação na vida social. O Direito Natural se manifestaria por preceitos fundamentais, que 
seriam imutáveis, e por secundários que, derivando dos fundamentais, são passíveis de alteração. 
De dois modos se pode apurar se algo é de Direito Natural: a) se corresponder a uma inclinação 
humana; b) se o contrário não for estabelecido pela natureza. Por esta segunda hipótese, disse o 
Aquinense, andar nu seria um direito natural “por não ter a natureza dado o vestuário”, e direito 
natural seria também a “propriedade comum de todas as coisas e a liberdade una para todos”.
13
 
A lex divina, reunião de preceitos oriundos de Deus e orientadores da conduta terrena, 
constante nas Sagradas Escrituras, Velho e Novo Testamento, seria a complementação aos preceitos 
gerais e abstratos da lei natural. 
A lex humana foi definida como “ordenamento da razão visando o bem comum, promulgado 
pelo chefe da comunidade”. Embora tenha indicado genericamente o bem comum como a causa 
final, em outra passagem de sua obra especifica a paz dos homens como o fim da lei humana. Para 
que se obtenha a disciplina no meio social, pensava o filósofo, é imperioso que se estabeleça um 
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mecanismo que coíba o mal pela força e pelo medo. A lei não seria necessária para os jovens 
inclinados para a virtude por dom divino, pois lhes bastava a disciplina paterna, mas seria para 
aqueles que possuem tendência para os vícios. Em relação aos primeiros a advertência paterna seria 
suficiente, para os demais seria indispensável a coação. 
Analisando a conveniência de a lei ser abrangente e tudo regular, impedindo o arbítrio dos 
juízes, concordou com a proposição sob tríplice fundamento: a) porque seria mais simples localizar 
poucos homens importantes que fizessem leis sábias do que encontrar muitos homens que 
julgassem sabiamente; b) o fato de o legislador refletir sobre muitas hipóteses favoreceria mais o 
acerto no critério do que a situação do magistrado, que apenas examina um caso; c) a condição do 
legislador seria a de imparcialidade, pois estabelece normas para o futuro, enquanto os juízes 
decidem sobre fatos concretos e muitas vezes movidos por paixão. 
Para Tomás de Aquino somente seria lei o preceito substancialmente justo e justo seria sempre 
que acorde com a razão. Como esta se apoia na natureza, toda lei criada pelos homens teria natureza 
de lei se em consonância com a lei natural. Em resumo, a lei seria justa se não contrariasse a 
natureza. As leis injustas, que não seriam leis, mas uma corrupção, não se impunham no plano da 
consciência e deveriam ser cumpridas apenas em situação excepcional, como nas hipóteses de 
escândalo ou perturbação. Todavia, as leis que contrariam a lei divina não devem ser observadas, 
porque “importa obedecer antes a Deus do que aos homens”. 
Foi pequena a contribuição de Tomás de Aquino à teoria da justiça, pois acompanhou quase 
integralmente a doutrina aristotélica, não superada até hoje. A sua definição de justiça é um 
decalque à de Ulpiano, com breve correção: “Hábito pelo qual, com perpétua e constante vontade, 
se dá a cada um o que é seu.” O Estagirita havia classificado a justiça em distributiva e corretiva, 
subdividida esta em comutativa e judicial. O Aquinense suprimiu esta última e desconsiderou a 
corretiva, porquanto não apresentaria mais do que uma espécie. Acrescentou à classificação, como 
seu principal subsídio à teoria, a denominada justiça geral ou legal. A distributiva – est ordo totius 
ad partes – presidiria a repartição, pela coletividade, de honras e encargos aos indivíduos, 
observando-se o critério de proporcionalidade em função, respectivamente, da virtude e da 
capacidade. A comutativa – est ordo partis ad partem – seria a justiça entre os particulares que, 
envolvendo os indivíduos, implicava a igualdade estrita entre o quinhão entregue e o recebido. A 
geral – est ordo partium ad totum – se consubstanciaria na participação dos indivíduos na obra do 
bem comum. Denominava-se também legal por se expressar em lei. Como propriedades essenciais 
da justiça, Santo Tomás indicou a alteridade e o dever. 
A presença do outro estaria implícita no valor do justo, que pressupõe sempre uma relação de 
pessoas, isto é, alteridade. Aristóteles já distinguira essa propriedade, ao afirmar sobre o ato de 
justiça que “duas são as pessoas para quem ele é de fato justo...”
14
 Na fórmula da justiça, como nota 
essencial, assinalou também a exigência de um dever, pois ser justo é prestar o devido a alguém. 
O VOLUNTARISMO DE JOHN DUNS ESCOTO E GUILHERME DE OCKHAM 
Após Santo Tomás de Aquino e antes do longo recesso por que passou a Filosofia durante os 
séculos XIV e XV, surgiram as obras dos franciscanos Duns Escoto e Guilherme de Ockham, 
marcadas pelo nominalismo e concepção voluntarista e que assinalam a transição entre uma fase 
áurea e uma de estagnação do pensamento filosófico. 
15
 Influenciado pelas doutrinas de Santo 
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7 
 
Agostinho e de Santo Anselmo, John Duns Escoto (1270-1308), filósofo e teólogo escocês, 
considerado gênio precoce da Filosofia, fundou a nova Escola Franciscana e assumiu a postura 
antitomista da antiga Escola, representada por Guilherme de Mare e John Peckam. 
Santo Agostinho concebera a lex aeterna fundada tanto na voluntas Dei quanto na ratio, 
enquanto o Doutor Angélico, a exemplo de Alberto Magno, a situou como emanação da razão 
divina ou humana. Duns Escoto sustentou a tese voluntarista, indicando a vontade divina como a 
primeira causa, não fundada em qualquer outra, nem na razão. A condição para que uma lei fosse 
reta ou legítima seria a sua concordância com a vontade do Criador. 
Enquanto Tomás de Aquino aprovava os preceitos do Decálogo por considerá-los bons em si 
mesmo e não necessariamente por sua fonte, Duns Escoto, realçando a importância da vontade 
divina, afirmara que esta não era obrigada a seguir aqueles preceitos, pois seriam verdades apenas 
devido à vontade divina. Esta poderia tanto dispensar o cumprimento do Decálogo como modificá-
lo. A vontade divina, porém, nãoseria arbitrária, pois teria por limite o princípio da não 
contradição. 
Escoto reconheceu como Direito Natural os dois primeiros mandamentos do Decálogo. 
Relativamente ao problema dos universais, em que se discutia se as ideias gerais, como verdade, 
justiça, humanidade, correspondiam a objetos do mundo exterior e seriam coisas em si mesmo, 
Duns Escoto se alinhou entre os nominalistas, que negavam realidade aos universais, considerando-
os apenas nomina. Somente o individual possuiria substancialidade e o singular não poderia ser 
deduzido do geral. 
Discípulo de Duns Escoto, o filósofo e teólogo inglês, Guilherme de Ockham (aprox. 1290-
1350), impregnou de radicalismo alguns pontos da doutrina de seu mestre. Pensava que os assuntos 
teológicos se situavam apenas no plano da fé, de vez que as suas proposições não podiam ser 
provadas. Assim, a existência de Deus ou a imortalidade da alma não seriam objetos de análise 
científica. Essa ideia se achava ligada à sua teoria do conhecimento, pois adotou a linha empirista, 
entendendo que o verdadeiro saber só poderia ser alcançado mediante a experiência. Ainda no plano 
epistemológico defendeu o nominalismo, afirmando que nenhum universal é coisa exterior ou 
substância extramental.
16
 Em seu exacerbado voluntarismo concebeu a moralidade como obediência 
à vontade divina, pensando que moral seria o ato em concordância com o mandamento de Deus e 
imoral o que o contrariava. O Direito Natural estaria contido, explícita ou implicitamente, nas 
Sagradas Escrituras. Ele não distinguiu o Direito Natural da lei divina, afirmando que todo Direito, 
enquanto procede de Deus, pode ser chamado por Direito divino. A lei positiva também estaria 
sujeita às Sagradas Escrituras e quando contrariasse a lei divina não seria lei, não devendo ser 
seguida. 
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