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UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO 
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS 
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA 
 
 
 
 
 
AMANDA DA SILVA E SILVA 
 
 
 
 
 
 
ALCANCES E LIMITES DA ATUAÇÃO DO ESTAGIÁRIO EM PSICOLOGIA DO 
TRABALHO: RELATOS VIVENCIAIS DE ESTUDANTES EM SÃO LUÍS-MA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
São Luís 
2016 
 
AMANDA DA SILVA E SILVA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ALCANCES E LIMITES DA ATUAÇÃO DO ESTAGIÁRIO EM PSICOLOGIA DO 
TRABALHO: RELATOS VIVENCIAIS DE ESTUDANTES EM SÃO LUÍS ± MA 
Projeto de monografia apresentado à Universidade 
Federal do Maranhão como requisito para 
elaboração da monografia de conclusão do curso 
de Psicologia. 
 
Orientadora: Carla Vaz dos Santos Ribeiro 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
São Luís 
2016 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Silva, Amanda da Silva e 
 
Alcances e limites da atuação do estagiário em Psicologia do 
Trabalho: relatos vivenciais de estudantes em São Luís ± MA 
/Amanda da Silva e Silva. ± 2016. 
65f. 
 
Orientadora: Carla Vaz dos Santos Ribeiro. 
Monografia (Graduação) ± Curso de Psicologia, 
Universidade Federal do Maranhão, São Luís, 2016. 
 
1. Atuação do estagiário. 2. Estágio. 3. Psicologia do Trabalho. I. 
Ribeiro, Carla Vaz dos Santos. II. Título. 
 
 
AMANDA DA SILVA E SILVA 
 
 
 
ALCANCES E LIMITES DA ATUAÇÃO DO ESTAGIÁRIO EM PSICOLOGIA DO 
TRABALHO: RELATOS VIVENCIAIS DE ESTUDANTES EM SÃO LUÍS-MA 
 
Monografia apresentada ao Curso de Psicologia 
da Universidade Federal do Maranhão como 
requisito para obtenção do grau de Psicólogo. 
 
 
Aprovada em: / / 
 
 
 
 
 
BANCA EXAMINADORA 
 
 
 
 
__________________________________________________ 
Carla Vaz dos Santos Ribeiro (Orientadora) 
Doutora em Psicologia Social ± UFRJ 
Universidade Federal do Maranhão 
 
 
 
__________________________________________________ 
Francisca Pereira da Cruz Zubicueta 
Mestra em Saúde e Ambiente ± UFMA 
Universidade Federal do Maranhão 
 
 
 
__________________________________________________ 
 Yram de Olinda Neves Miranda 
Mestra em Ciências Empresariais 
Universidade Federal do Maranhão 
 
 
 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Acredito piamente que o ser humano é o produto das relações que 
vivencia durante a vida. Cada pessoa que conheço deixa um pouco de si comigo e 
um pouco de mim também vai. Por isso, não posso deixar de agradecer a todos que 
estiveram presente não só no período da monografia, mas também em toda a 
graduação. 
Primeiramente, agradeço aos colegas de trabalho que tive e que me 
proporcionaram conhecimentos não só teóricos, mas que me ensinaram e me 
ensinam diariamente valores pessoais. Como representantes desta classe, tenho 
como representação meu atual local de trabalho, agradecendo assim à Luciana, a 
Gardênia e em especial a Carol e a Dani, pessoas que me inseriram neste meu 
último estágio e que me possibilitam inúmeros conhecimentos, que lapidam meus 
erros e potencializam meus acertos. Ainda com o foco no estágio, agradeço também 
aos grupos de supervisão que tive. Sem a participação, escuta e intervenção de 
vocês talvez eu até mudasse meu tema. 
Retribuo também em forma de agradecimento toda a parceria que tive 
com meus colegas de turma, que estiveram sempre comigo durante todo o percurso: 
Tise, Yuri e Hamanda, e também à nossa Camile, que saiu no início do curso para 
alçar outros voos, mas que sempre esteve conosco. Com vocês vivi aperreios de 
trabalho, provas, grupo de estudo, compartilhamos xerox, o ônibus, os trocados. 
Obrigada pela participação e paciência de vocês! 
Pensando neste tempo todo, fui acolhida por mestres que ensinam para 
além dos conteúdos que ministram: ensinam a ética não só na profissão, mas 
também são exemplos como pessoas. Em especial, deixo minhas considerações de 
agradecimentos eternos ao Prof. Alex, com quem tive oportunidade de participar de 
um projeto de pesquisa que gerou um artigo publicado em revista; Profa. Cristianne, 
exemplo de teoria e prática, com uma fluidez e facilidade em ensinar, estando 
sempre disposta a ajudar; Prof. Francisco, um homem que me ensinou muito a 
pensar sobre a prática da profissão e me incitou a querer estar cada vez mais 
próxima a academia; Prof. Jadir, com um olhar diferenciado sobre o ser humano, 
que também me encantou; Profa. Conceição, alguém que esteve disposta a ouvir e 
a ensinar sobre sua prática; Profa. Nazaré, que elenca disciplina e conteúdo como 
poucos conseguem fazer com tamanha maestria; Prof. Ricardo, que me levou a 
 
SHQVDU� VREUH� D� FpOHEUH� IUDVH� ³7RGD� 3VLFRORJLD� p� VRFLDO´�� D� TXHP� GHYR� SURIXQGRV�
agradecimentos em um período que suas aulas foram determinantes para eu 
continuar na graduação; Profa. Valéria, aprendizados eternos sobre estar disposta a 
sustentar o que se acredita; Profa. Wania, a quem devo também grande apreço por 
me incitar a estudar bastante algo que se tem muita dificuldade. 
Nesta jornada, fui contemplada em ter três pessoas na minha banca que 
fizeram parte da minha história na graduação em momentos distintos: Profa. Yram, 
com quem tive contato na supervisão de estágio e me trouxe um olhar de alguém 
que teve experiências que eu quero ter. Tuas palavras foram extremamente 
importantes neste período de agonia; Profa. Francisca, alguém que esteve comigo 
em períodos de transição e que pude aprender muito a partir da contribuição dos 
materiais trazidos para a sala com minha prática; Profa. Carla, minha orientadora 
que foi escolhida a dedo há um ano e meio atrás! Aquela que me instigou a querer 
buscar e ter vivências mais próximas da área da Psicologia do Trabalho, hoje um 
âmbito que comungo uma paixão. Literalmente, três pessoas em três momentos do 
meu percurso acadêmico ± início, meio e fim. A vocês, minha eterna gratidão sobre 
esta escolha da profissão! 
Agradeço a minha irmã, Allana, que em cada conquista dela, apenas com 
minha observação, me incentiva a querer ser alguém melhor. Ao meu namorado, 
Lucas, que esteve comigo em períodos tão difíceis, em que muitas vezes quis jogar 
tudo para o alto, mas me ajudou até mesmo com a monografia. Aos meus pais, que 
são exemplo de força e lutas diárias. Distintos entre si, mas comungam de um bem 
maior: importância da educação. Obrigada por todo apoio de vocês não só na 
graduação, mas na vida, pelos meus 22 anos de história. 
E por último, mas não menos importante, a Deus. Com certeza, o maior 
responsável por tudo. Orações diárias, perturbações, agonias, choros, mas Ele 
sempre esteve comigo durante todo esse período. Diariamente, nunca foi fácil ± e 
nunca será fácil, mas é preciso ter fé naquilo que não se vê para acreditar que um 
dia deve ser vivido por vez e que entregando sua vida a Ele tudo é encaminhado. 
Posso dizer com toda a certeza: sintam-se responsáveis pelo meu sucesso! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
³3RU� YH]HV�� VHQWLPRV� TXH� DTXLOR� TXH�
fazemos não é senão uma gota de água 
no mar. Mas o mar seria menor se lhe 
IDOWDVVH�XPD�JRWD�´ 
(Madre Teresa de Calcutá) 
 
 
 
 
RESUMO 
 
 
O mundo do trabalho hoje está cada vez mais recebendo a participação de 
estudantes que buscam conhecer e aprender as técnicas e práticas da sua 
profissão. Os estagiários, como são denominados, incorporam-se à lógica das 
organizações e deparam-se com as semelhanças e diferenças da teoria e prática. 
Pensando sobre este contexto, o presente estudo tem por objetivo central analisar 
os alcances e limites do estagiário em Psicologia no contexto do trabalho em São 
Luís ± MA. Para isso, se propôs a levantar as dificuldades e desafios encontrados 
pelo estagiário em seu cotidiano laboral, bem como verificar os impactos positivos e 
negativos observados pelo estudante no exercício do estágio e se há senso crítico 
por parte dos alunos sobre as atividades realizadas em campo. Participaram da 
pesquisa cincoestudantes que estavam/estão atuando na área da Psciologia do 
Trabalho em diferentes frentes de serviço. Para contemplar os objetivos propostos, 
desenvolveu-se a pesquisa bibliográfica, com o intuito de levantar estudos sobre o 
tema e também foi adotada a pesquisa qualitativa, sendo a entrevista 
semiestruturada o instrumento aplicado e a análise dos dados foi realizada a partir 
da análise de conteúdo. Os resultados encontrados apontaram uma a) crescente 
desconfiguração do lugar de estagiário, equivalendo-se a uma mão-de-obra barata 
para a organização; b) realização de atividades similares ao profissional psicólogo já 
graduado e c) a grande exposição a uma pressão exacerbada para responder 
demandas da instituição, pressão essa que equipara-se a de um funcionário. Por 
fim, ressalta-se a importância do estágio para a formação acadêmica, pessoal e 
profissional, sendo esta, em muitos casos, a primeira oportunidade no mundo do 
trabalho para os estudantes. 
 
 
Palavras-chave: Estágio. Atuação do estagiário. Psicologia do Trabalho. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ABSTRACT 
 
 
The world of work today is increasingly receiving the participation of students who 
want to know and learn the techniques and practices of their profession. The 
trainees, as they are called, are incorporated into the logic of organizations and are 
faced with the similarities and differences of theory and practice. Thinking about this 
context, the present study has as its main goal to analyze the scope and limits of the 
trainee in Psychology in the work context in São Luis - MA. For this, it was proposed 
to raise the difficulties and challenges encountered by the trainee in his every day 
work, as well as check the positive and negative impacts observed by the student on 
WKH� SURJUDP�� DQG� REVHUYH� LI� WKHUH� LV� VWXGHQWV¶� FULWLFDO� WKLQNLQJ� DERXW� WKH� DFWLYLWLHV�
done in the field. The participants were five students who were / are working in the 
area of Labor Psychology in different work fronts. To accomplish the objectives, a 
bibliography study has been developed aiming to raise studies on the subject, and 
the qualitative research was also adopted, having the semi-structured interview as 
the applied instrument, and the data analysis was performed based on the content 
analysis. The findings showed a: a) an increasing misunderstanding about the 
trainee role, making the trainee a cheap hand labor for the organization; b) carrying 
out similar activities of a professional Psychologist who is already graduated and c) a 
large exposure to a heightened pressure to respond to demands of the institution, 
pressure which is equated to the one a graduated employee has do deal with. 
Finally, it emphasizes the importance of the trainee work experience for the 
academic, personal and professional life, and this, in many cases, is the first 
opportunity in the world of work for students. 
 
Keywords: Trainee experience. Trainee performance. Labor Psychology. 
 
 
 
 
LISTA DE ABREVIATURAS 
 
 
AC Teste de Atenção Concentrada 
BP Business Partners 
GAP Lacuna, quebra 
PALO Teste Palográfico 
QUATI Questionário de Avaliação Tipológica 
R1 Teste de Não Verbal de Inteligência 
RH Recursos Humanos 
R&S Recrutamento e Seleção 
SESMT Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do 
Trabalho 
T&D Treinamento e Desenvolvimento 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
1. INTRODUÇÃO .................................................................................................. 12 
2. O MUNDO DO TRABALHO E SUAS MUDANÇAS HISTÓRICAS .................. 17 
3. AS FASES/FACES DA PSICOLOGIA NO CONTEXTO DO TRABALHO ....... 21 
3.1 Psicologia Psicologia Industrial .................................................................... 22 
3.2 Psicologia Organizacional ............................................................................. 24 
3.3 Psicologia do Trabalho ................................................................................... 26 
4. O ESTÁGIO: ALCANCES E LIMITES ............................................................. 29 
4.1 O que é ser estagiário? .................................................................................. 29 
4.2 ³7HQKR� DV� PHVPDV� DWLYLGDGHV� H� VRIUR� DV� PHVPDV� FREUDQoDV� TXH� XP�
IXQFLRQiULR� HIHWLYDGR´�� DWXDomR� GR� HVWDJLiULR� versus atuação do 
psicólogo ......................................................................................................... 34 
4.3 ³'LDULDPHQWH��HX�PH�VLQWR�DGRHFHQGR´��D�TXDOLGDGH�GH�YLGD�LQYHUVDPHQWH�
proporcional ao processo do estágio ........................................................... 38 
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................. 43 
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 47 
APÊNDICES .............................................................................................................. 50 
APÊNDICE A ............................................................................................................. 51 
APÊNDICE B ............................................................................................................. 52 
ANEXOS ................................................................................................................... 53 
ANEXO A ................................................................................................................. 54 
ANEXO B ................................................................................................................. 58 
 
 
 
 
12 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
A área do estágio sempre foi instigante para mim. Afinal, é a porta de 
entrada do profissional no mundo do trabalho. Porém, o tema surgiu após estar em 
três espaços distintos da Psicologia do Trabalho, o que me fez questionar e refletir 
sobre as diferenças laborais existentes neste âmbito profissional. 
Em 2013, tive meu primeiro contato na área em uma consultoria. Exercia 
atividades voltadas exclusivamente para o recrutamento e seleção, desde a 
divulgação da vaga, triagem de currículos, contato telefônico com os candidatos, 
aplicação e correção de testes psicológicos e dinâmicas, condução de entrevistas 
em grupo e individuais, bem como produção supervisionada de laudos psicológicos. 
Além destas, orgulhava-me conseguir realizar também atividades que não eram 
específicas do estágio, porém, enquanto aprendizado, resolvi exercê-las e tomá-las 
como responsabilidade minha. Contudo, com o passar do tempo, aquelas atividades 
já não eram desafiadoras e instigantes para mim, nem para o meu processo de 
aprendizagem. Enxergava-me como uma ferramenta que exercia aquele mesmo 
trabalho todos os dias, mera operacionalização do que inicialmente foi apresentado 
para mim do que seria a profissão de psicólogo. 
Após experiência no campo social e hospitalar, retornei à Psicologia do 
Trabalho como estagiária, no ano de 2014, em uma empresa de médio porte, no 
ramo portuário ludovicense que possui outras filiais distribuídas pelo país. Instigou-
me o fato de ser apresentado no processo seletivo a proposta de vivência, 
acompanhamento e aplicação de treinamentos na empresa. Estando nos RH, 
acompanhei mais quatro psicólogos e percebi que ainda havia muitas outras 
atividades que a nossa classe poderia exercer na empresa. Contudo, neste estágio 
não tive a oportunidade de perpassar por outras atividades específicas, como o 
próprio recrutamento e seleção de pessoal, gestão de pessoal, gestão de clima 
organizacional e outros. Mesmo sem ter tido este contato, esta segunda experiência 
foi extremamente importante para que eu desmistificasse a primeira impressão da 
área: tecnista, operacional e positivista. 
Por fim, a minha última, e atual, experiência na atuação em Psicologiado 
Trabalho é no estágio obrigatório. Porém, com uma diferença: estou em uma 
consultoria que terceiriza seus serviços a outros e que encontra-se na dinâmica da 
contratante e nas suas instalações físicas, ofertando as atividades de recrutamento 
13 
 
e seleção, treinamento e desenvolvimento, admissão e demissão de pessoal, gestão 
de clima organizacional e gestão de departamento pessoal. Esta distinta 
possibilidade de atuação do psicólogo no contexto do trabalho me fez querer 
investigar o tema do estágio, pois, por trajetória própria, observo que temos muito 
campo de atuação, muitas atividades a serem desenvolvidas, mas me debruço 
sobre a possibilidade de pensar o que de fato os estagiários estão realizando 
diariamente na sua prática e o que é dito enquanto formalização da profissão do 
psicólogo. 
Por apresentar especial interesse na área da Psicologia no contexto do 
trabalho, poder associar as minhas vivências ao discurso de outros estudantes que 
também passa ou passaram pela experiência do estágio é algo enriquecedor. 
Portanto, pretendo neste estudo, levantar e analisar as dificuldades e desafios 
encontrados pelo estagiário em seu cotidiano de trabalho, bem como verificar os 
impactos positivos e negativos observados pelo estudante no exercício do estágio e 
se há senso crítico por parte dos estudantes sobre as atividades realizadas. 
Como universo da pesquisa, foi delimitado o número de cinco estagiários 
em Psicologia do Trabalho e, como pré-requisitos, precisariam obrigatoriamente ter 
vivência de, no mínimo, um ano na organização em questão e, caso não mais 
estivessem estagiando, seria aceito o afastamento da área de, no máximo, seis 
meses. Tive o interesse em buscar estagiários que atuassem em diferentes frentes 
de serviço com o intuito de tornar a pesquisa o mais rica possível. A ideia inicial era 
encontrar estagiários do setor público e privado e também estudantes que atuassem 
em consultorias, ou seja, RH interno e externo. Todavia, encontrei o meu primeiro 
embate no início da pesquisa: não foi encontrado nenhum estagiário no setor 
público, bem como nenhum estudante que estivesse atuando em uma única 
consultoria pelo período estipulado no universo da pesquisa. Ao me questionar 
sobre esses dados iniciais, debruço-me com a questão da falta de psicólogos no 
setor público que atuem na área do trabalho, dificultando este âmbito de ter 
estagiários e, sobre a consultoria, penso no cenário atual do país: em tempos de 
crise, a contratação de serviços externos está cada vez mais escassa. De acordo 
com site UOL (2016), uma pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e 
Estatística (IBGE) marcou que o desemprego ficou em 11,2% no trimestre encerrado 
em abril deste ano, sendo considerada a maior taxa já registrada pelo IBGE desde o 
início da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) contínua mensal, em 
14 
 
2012. Ao pesquisar sobre as consultorias, escutei relatos da demanda de trabalho 
ter diminuído bem mais que a metade, o que fez com que os estagiários passassem 
apenas o período do estágio obrigatório e, após esse período, eram liberados e já 
entraria novos estagiários. Acredito que estes desafios iniciais impulsionaram-me 
mais ainda a buscar e pesquisar sobre a área do estágio, o que não está em 
nenhum momento dissociada do contexto social e econômico em que vivemos. 
Mediante isto, mudei os planos quanto aos entrevistados. Continuei com 
cinco estudantes, mas todos de segmentos diferentes, porém do ramo privado. 
 
Tabela 1 ± Perfil dos entrevistados 
 ENTREVISTAS 
1 2 3 4 5 
SEXO Feminino Feminino Feminino Feminino Feminino 
IDADE 21 anos 26 anos 25 anos 22 anos 25 anos 
INSTITUIÇÃO 
DE ENSINO E 
PERÍODO 
UFMA/ 8º 
período 
UFMA/ graduada 
em 2016.1 
UFMA/ graduada 
em 2016.1 
CEUMA/ 8º 
período 
UFMA/ 10º 
período 
TEMPO 
TOTAL NA 
ÁREA DA 
PSICOLOGIA 
DO 
TRABALHO 
1,4 ano 
4,5 anos 
(esteve por 2,5 
anos na Empresa 
Júnior) 
2,1 anos 1,3 ano 1,6 ano 
RAMO DA 
EMPRESA Hospitalar Industrial 
Educação 
profissional 
Rede de 
supermercado 
Sistema de 
prestação de 
serviços 
TEMPO NA 
EMPRESA 1,4 ano 2 anos 2,1 anos 1,3 ano 1,6 ano 
RESUMO 
DAS 
ATIVIDADES 
DO ESTÁGIO 
R&S, T&D, 
Indicadores, 
Avaliação de 
Desempenho 
Atividades 
administrativas 
(planilhas, 
quantitativo de 
funcionários) 
processos 
demissionais, 
R&S, T&D. 
R&S, 
acompanhamento 
dos programas 
de função 
corporativa e 
programa de 
ambientação 
R&S R&S 
Fonte: autoria própria. 
 
O instrumento para a coleta de dados foi a entrevista semiestruturada, 
possuindo um roteiro definido (Apêndice B), podendo variar conforme as 
informações trazidas pelo sujeito. Pesquisas nesse formato possuem respostas mais 
abrangentes, possibilitando uma descoberta mais profunda e uma melhor interação 
entre o entrevistado e o entrevistador, favorecendo respostas de cunho espontâneo, 
o que é extremamente rico para a pesquisa (BONI; QUARESMA, 2005). Antes de 
cada entrevista foi realizado um contato telefônico prévio com todos os participantes, 
15 
 
no intuito de explicar os objetivos da pesquisa bem como a sua relevância para o 
estudo em questão. Após isso, foi perguntado sobre o interesse em contribuir para a 
evolução do trabalho. 
A coleta de dados foi realizada, na maior parte das entrevistas, no próprio 
campo de estágio, em uma hora vaga do estudante. Em casos de incompatibilidade 
de horários e sendo algumas mudanças de local a pedido dos entrevistados, escolhi 
um ambiente que não houvesse pertubações externas. As entrevistas ocorreram de 
forma individual, visando estabelecer um ambiente que o entrevistado se sentisse a 
vontade para responder as questões e utilizei um gravador de aúdio, atitude 
previamente autorizada por todos os participantes. Antes de inciar as entrevistas, foi 
explicado novamente os objetivos da pesquisa e entregue o Termo de 
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), para apreciação e autorização da 
utilização das informações coletadas (Apêndice A). 
Como forma de alcançar os objetivos propostos, desenvolveu-se a 
pesquisa bibliográfica buscando levantar estudos empreendidos que abordam a 
temática e realizou-se entrevistas como instrumento de estudo. Além disso, os 
dados coletados a partir dos relatos dos entrevistados foram analisados conforme os 
critérios da pesquisa qualitativa. Para Brasileiro (2013, p. 49), a pesquisa qualitativa 
[...] é aquela que se ocupa da interpretação dos fenômenos e da atribuição 
de significados no decorrer da pesquisa, não se detendo a técnicas 
estatísticas. Ela é descritiva e coleta os dados em fonte direta. Os 
processos e suas dinâmicas, as variáveis e as relações entre elas são 
dados para a construção de sentidos e os principais condutores da 
abordagem. Trabalha, basicamente, com dois tipos de dados: os verbais ± 
coletados durante a entrevista ou através de narrativa; e os visuais ± 
colhidos durante a observação. 
 
Ou seja, está mais relacionada para o levantamento de dados sobre as 
motivações de um grupo, em compreender e interpretar determinados 
comportamentos, a opinião e as expectativas dos indivíduos de uma população, 
elaborar compreensões mais profundas e detalhadas do problema estudado. É 
exploratória, portanto não tem o intuito de obter números como resultados. Para a 
apuração dos dados colhidos pela pesquisa qualitativa, escolhi a análise de 
FRQWH~GR� TXH�� VHJXQGR� %UDVLOHLUR� ������� S�� ����� ³>���@� WHP� REMHWLYR� GH� DQDOLVDU� R�
GRFXPHQWR� FRP� EDVH� HP� DERUGDJHQV� LQWHUSUHWDWLYDV´� A análise de conteúdo é 
definida por Bardin (2009, p. 42) como 
um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por 
procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das 
mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de 
16 
 
conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis 
inferidas) destas mensagens.Os dados qualitativos foram analisados, comparados e especificados 
conforme a análise de conteúdo proposto por Bardin (2009), em três fases: 
1. Pré-análise: fase de organização e sistematização das ideias. Essa etapa 
LQFOXLX�� D�� OHLWXUD� ³IOXWXDQWH´� GR� PDWHULDO�� E�� RUJDQL]DomR� GRV� GRFXPHQWRV� H�
formulação de hipóteses; direcionando para um início de classificação c) preparação 
do material para análise, organizando-o em determinada ordem, segundo objetivos. 
2. Exploração do material: fase de administração sistematicamente das 
decisões tomadas na fase de pré-análise. Essa etapa incluiu o processo de 
codificação dos dados: o recorte (escolha das unidades), a enumeração (escolha 
das regras de contagem) e a classificação (escolha de categoria). 
3. Tratamento dos resultados obtidos e interpretação: fase de inferência e 
interpretação, tornar os dados válidos e significativos. 
Ou seja, a análise de conteúdo é um método de pesquisa que descreve e 
interpreta o conteúdo dos textos e documentos, com o objetivo de ter uma outra 
interpretação às mensagens e analisar os significados do que foi dito em outro 
patamar, buscando para além do que foi dito. Este tipo de análise auxilia na 
inferência, compreensão e interpretação por parte do pesquisador, tendo em vista as 
mais diversificadas fontes de pesquisa. 
Com o intuito de pensarmos sobre o lugar do estágio, o presente estudo 
oferece, nos capítulos seguintes, uma reflexão sobre o mundo do trabalho e suas 
transformações históricas; a evolução teórico-prática através das fases/faces da 
Psicologia Industrial, Organizacional e do Trabalho; a análise e discussão sobre o 
estágio e suas questões teórico e práticas. Ao longo dos capítulos, foram incluídos 
trechos das entrevistas realizadas com os estudantes estagiários como forma de 
enriquecer o conteúdo teórico da pesquisa em questão. O presente estudo objetiva 
contribuir com a área da Psicologia no contexto do trabalho a partir da pesquisa 
sobre práticas do estudante estagiário atuante e do processo de ensino e 
aprendizagem das atividades realizadas no âmbito laboral, além de servir como 
base para possíveis estudos que surgirem nesta área. 
 
 
17 
 
2 O MUNDO DO TRABALHO E SUAS MUDANÇAS HISTÓRICAS 
 
Desde os primórdios, já se tem notícia sobre a ideia de trabalho. Porém, 
iremos perceber com Borges e Yamamoto (2014) que esta categoria obteve maior 
relevância nos dois últimos séculos. As ideias de trabalho na Antiguidade mais 
observadas na literatura são as que se voltam para os pensamentos grecoateniense 
e as práticas escravistas no Império Romano. Nesta época, os filósofos clássicos, 
como Aristóteles e Platão abordavam sobre a ociosidade e mostravam que o 
trabalho era algo degradante, inferior e desgastante, além de ser considerada uma 
atividade reduzida ao braçal e manual, e que a política seria um exercício superior à 
ideia de trabalho (BORGES; YAMAMOTO, 2014). 
Para Borges e Yamamoto (2014), de acordo com os ensinamentos 
religiosos, na bíblia judaica, o trabalho foi fruto do pecado originial, sendo 
caracterizado como algo ruim, punitivo, humilhante e que causa sofrimento àquele 
que o realiza, ideia esta que também é compartilhada pelo cristianismo. O próprio 
Adão por conta do pecado original, foi punido: precisou começar a trabalhar para 
adquirir o pão, castigo destinado à humanidade que descende dele (RIBEIRO; 
LEDA, 2004). Porém, com a Reforma Protestante, o trabalho passou a ser visto 
como forma de servir a Deus. Para Calvino, seria através do trabalho árduo que o 
homem buscaria a sua salvação e a partir dele que se teria êxito, sendo isto 
designado enquanto vontade de Deus (GOULART; FILHO; 2013). 
³3RU� PXLWR� WHPSR� R� VLJQLILFDGR� GH� WUDEDOKR� IRL� DVVRFLDGR� D fardo e 
sacrifício.´� �5,%(,52�� /('$�� ������ S�� ����� Com as mudanças na economia e na 
sociedade, essas diferenças entre atividades manuais e atividades da política se 
tornam obsoletas, visto que é com o surgimento do capitalismo que haverá uma 
mudança mais visível no que se compreende enquanto trabalho (BORGES; 
YAMAMOTO, 2014). Este pensamento é compartilhado entre Marx (1983), Goulart e 
Filho (2013), que anunciam sobre a essência do homem se fazer presente no 
trabalho, ou seja, se é o que se produz, e a cada produto é deixado um pouco de si. 
³/RJR�� R� WUDEDOKR� JDUDQWH� DR� KRPHP� QmR� Vy� VXD� GLJQLGDGH� FRPR� WDPEpP� VXD�
humanidade.´� �*28/$57��),/+2�� ������ S�� ���� Marx (1983, p. 257) caracteriza o 
trabalho como 
[...] a atividade de um número maior de trabalhadores, ao mesmo tempo, no 
mesmo lugar (ou, se se quiser, no mesmo campo de trabalho), para 
produzir a mesma espécie de mercadoria, sob o comando do mesmo 
18 
 
capitalista, constitui histórica e conceitualmente o ponto de partida da 
produção capitalista 
. 
Para Goulart e Filho (2013), a visão trazida pelo capitalismo sugere que a 
finalidade do trabalho é propiciar a expansão da riqueza e o máximo de lucro. Foi a 
partir da consolidação do capitalismo que no século XVIII e início do século XIX o 
homem se transformou em trabalhador e tornou-se livre para vender sua força de 
trabalho (GOULART; GUIMARÃES, 2010). 
Entretanto, na medida que o capital fixava o preço a ser pago, essa suposta 
liberdade revelava-se limitada, constituindo-se, fundamentalmente, pré-
requisito para a entrada no jogo de dominação capitalista e exploração de 
mão-de-obra. A consolidação do Capitalismo foi, portanto, um marco para a 
categoria trabalho, que a partir desse momento de exaltação máxima, 
passou a ser considerado a atividade social mais valorizada. (GOULART; 
GUIMARÃES, 2010, p. 17). 
 
Como base do capitalismo, o trabalho virou o próprio produto do 
trabalhador. Trazendo isso de uma outra maneira, 
[...] a situação socioeconômica tornou necessário ao indivíduo, desprovido 
de tudo, vender seu trabalho, e, ao capitalista, adquiri-lo, como meio de dar 
prosseguimento à produção de outras mercadorias, o que, sendo valor de 
troca, permite crescer seu capital. (BORGES; YAMAMOTO, 2014, p. 29). 
 
Nessa perspectiva, é defendida a ideia de que o trabalho constitui 
PHUFDGRULD�QXP�HVWUHLWR�YtQFXOR�FRP�R�FRQVXPR��/RJR��³R�WUDEDOKR�SDVVD�D�VHU�YLVWR�
como um provedor de salários, benefícios e assistência; garantia de estabilidade, 
provedor de contatos pessoais, mas também pobre de conteúdo, parcelado, 
monótono, mecanizado e repetitivo para a maior parte dos trabalhadores.´�
(GOULART; FILHO, 2013, p. 78). 
Com a Revolução Industrial a emoção é retirada do local de trabalho. A 
racionalização é a palavra mais repetida do mundo dos negócios. A 
programação e o controle são determinantes, tudo é calculado, preciso. O 
cronômetro entra na fábrica, apodera-se dela, regula-a, domina-a, 
ultrapassa os seus muros e vai ditar formas de convivência para uma nova 
sociedade. (RIBEIRO; LEDA, 2004, p. 77). 
 
Para Sampaio (2013b), o Taylorismo caracterizou-se por transformar o 
trabalhador mais facilmente substituível. O Taylorismo individualizou o processo de 
produção: ao transformar o trabalhador único responsável por remuneração e 
punição ligado à produtividade individual, Taylor restringe a participação do 
funcionário em todas as etapas do processo, o que caracteriza um maquinário, onde 
cada parte é importante para o andamento do processo. A partir disto, observamos 
uma inutilidade do intelectual do trabalhador, importando unicamente a sua 
produção. O Fordismo possui características similares ao Taylorismo, porém 
19 
 
intensifica o processo de alienação do trabalhador e provoca a fragmentação entre a 
execução do trabalho e o pensamento (BORGES; YAMAMOTO, 2014). 
Essas concepções de trabalho afloraram em momentos históricos 
específicos e ainda continuam e continuarão a surgir ao longo do tempo. Na década 
de 70, inicia-se a decadência do modelo de produção Taylorista/Fordista, o que afeta 
diretamente as relações de trabalho, alterandoas formas de integração do 
capitalismo industrial. Percebemos, então, uma instabilidade no mercado de 
trabalho, progressiva diminuição dos empregos formais e crescente precarização da 
atuação do trabalhador. O capitalismo flexível traz extrema incerteza e desconfiança 
por parte dos trabalhadores, entretanto, o trabalho não deixa de ser considerado 
essencial para a sociedade. 
Na década de 80, o trabalhador ganhou outra roupagem: precisaria ter 
qualificação para exercer a sua atividade, teria que ser participativo em vários 
momentos da produção e polivalente para conhecer todo o sistema. Para Ribeiro e 
Leda (2004), com as mudanças no contexto laboral, as estruturas do trabalho 
tornaram-se mais flexíveis, o que possibilitou, com o passar do tempo, a 
reestruturação do trabalho e da própria produção. O capitalismo flexível traz à tona 
instabilidade e incerteza para os trabalhadores, contudo o trabalho continua sendo 
de fundamental importância para a sociedade e sua manutenção. A partir desse 
período é vivenciado um progressivo desaparecimento dos empregos formais e, 
alinhado a isso, o aumento da precarização do trabalho. 
Observa-se que o significado do trabalho teve rápidas transformações na 
esfera econômica, social e tecnológica existente na história. Para Goulart e 
Guimarães (2010), o componente central da reforma do trabalho é a mudança da 
base manual para o componente intelectual, alteração esta que começou a pedir 
qualificação profissional dos trabalhadores. 
Essas novas e sofisticadas formas de controle tiram proveito da exacerbada 
competição do mercado e da ameaça permanente do desemprego, 
induzindo os trabalhadores à gratidão e fidelidade para com as 
organizações, pelo simples fato de terem um emprego. Dessa forma, o 
trabalhador se submete a jornadas extensas, a metas inatingíveis, a ritmos 
de produção intensificados permeados por uma sobrecarga de trabalho 
muitas vezes desumana. Frequentemente, o controle é incorporado pelo 
trabalhador, que, embebido na lógica da cultura da excelência, cobra a si 
próprio altos padrões de desempenho. (RIBEIRO, 2008, p. 7). 
 
Atualmente, segundo Goulart e Filho (2013), o trabalho está para além de 
sobrevivência, ou seja, assumiu uma forma de inserção social, destinando o devido 
20 
 
valor para os aspectos físicos e psíquicos do homem. Para Coutinho (2009), as 
mudanças no decorrer do tempo colocaram o trabalho contemporâneo a adotar 
caráter de sustento material e tomar forma de emprego ou trabalho assalariado. 
A partir das transformações que o trabalho vivenciou, pode-se afirmar que 
as relações de produção não deixarão de existir, isto porque o trabalho é próprio do 
homem. Verificando tal fato na contemporaneidade, e conforme nos explica Marx 
(1983), o trabalho assumiu características diferentes das anteriormente pensadas: 
homens que produzem os bens materiais, alguns indispensáveis à sua própria 
existência, porém, não se realizam como seres humanos na atividade que 
desenvolvem. No sistema capitalista o trabalhador produz bens que não lhe 
pertencem e cujo destino, depois de prontos, escapa ao seu controle. 
É inegável que o trabalho sempre esteve presente como meio de 
sobrevivência e acredito ser esta a consonância entre todas as épocas. Observo 
uma acentuada fragmentação do trabalho, tendo como principal agente afetado o 
próprio trabalhador. Insegurança e dificuldade na expansão de algo que deveria ser 
sustentável e durável, e é através desta ação que o ser humano tenta suprir suas 
necessidades, e se realiza pessoal e profissionalmente. Há uma relevante divisão do 
trabalho, tornando-o inseguro e instável. É nesse contexto que a Psicologia no 
mundo do trabalho se desenvolve e se expande, com peculiaridades em seu trajeto 
de consolidação. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
21 
 
3 AS FASES/FACES DA PSICOLOGIA NO CONTEXTO DO TRABALHO 
 
Com todas as mudanças que ocorreram na esfera do trabalho, a 
Psicologia, como âmbito de atuação desta área, também sofreu adaptações para 
responder às transformações. Por isso, é preciso estar em consonância com as 
mudanças históricas e socioeconômicas, o que implica em alterações nas relações 
entre homem-trabalho, emprego-empregador, organizações-sociedade. Em face 
disso, é essencial um olhar sobre a história da área da Psicologia no contexto do 
trabalho, possibilitando observar como houve sua estruturação ao longo do tempo. 
Portanto, para classificar a Psicologia no contexto do trabalho, campo 
macro do estudo, irei utilizar a divisão das faces feita por Sampaio (2013b): 
Psicologia Industrial, Psicologia Organizacional e Psicologia do Trabalho. A 
terminologia face destinada a cada subárea da Psicologia no contexto do trabalho 
tem o intuito de delimitar momentos históricos distintos. Freitas (2002) vai para além 
desta aplicação: utiliza o termo fase/face, percebendo uma coexistência entre o 
momento histórico e as caracterísitcas do desenvolvimento de cada subárea. 
Compreendemos que na atualidade as atividades desenvolvidas em cada 
uma destas fases/faces, na Industrial, na Organizacional e na do Trabalho, 
também coexistem na formação e na prática das psicólogas; no entanto, 
sendo elas geradas e consolidadas em momentos históricos-sociais 
distintos, utilizaremos também o termo fase, para reafirmar que mesmo 
coexistindo no momento atual de nossa história, os paradigmas construídos 
pelas teorias características de cada face vieram atender às demandas 
políticas, econômicas e sociais de suas respectivas fases. (FREITAS, 2002, 
p. 19). 
 
Portanto, neste trabalho irei utilizar a denominação fase/face de acordo 
com Freitas (2002), o que caracteriza o desenvolvimento de cada subárea e 
aplicarei a denominação de Psicologia no contexto do trabalho para a área que se 
ocupa do fenômeno do trabalho, ou seja, campo macro de estudo. No tocante a 
utilização da terminologia diferente do que é para Sampaio (2013b) no que se refere 
ao termo Psicologia do Trabalho tanto para a face quanto para o estudo como área 
da Psicologia, objetivo evitar a necessidade de explicar se estarei abordando a 
terceira face ou fase/face. Destaco que a expressão Psicologia no contexto do 
trabalho já realça a área imersa no seu próprio objeto de estudo, característica esta 
que se faz presente em todas as nomenclaturas utilizadas neste estudo, seja qual 
for o momento histórico. 
 
22 
 
3.1 Psicologia Industrial 
 
A Psicologia, no início do século XX buscava distanciamento da Filosofia 
e tentava tornar-se uma ciência humana autônoma. No contexto laboral, temos sua 
primeira fase/face no âmbito do trabalho, a Psicologia Industrial. Esta caracterizava-
se com pressupostos Tayloristas, ou da Administração Científica, e estava 
submetida aos interesses da indústria. Ou seja, os primeiros ensinamentos que 
nortearam a Psicologia no contexto do trabalho eram provenientes do campo da 
administração. A atuação do psicólogo estava atrelada às predileções da 
organização, em sua grande maioria, ferroviária, onde as atividades eram 
relacionadas à seleção e ao uso de testes psicológicos com a finalidade de 
maximizar o ajuste das pessoas aos cargos, orientação vocacional, análise de 
tarefas, treinamentos e avaliação de desempenho, além de estudos sobre as 
condições de trabalho desenvolvidos na Segunda Guerra Mundial (SAMPAIO, 
2013a; FREITAS, GUARESCHI, 2004). 
A Psicologia Industrial - a primeira fase/face da Psicologia no contexto do 
trabalho - entra no mundo do trabalho para atender às demandas criadas 
por um sistema de produção sob o controle de classes hegemônicas, as 
quais visam o acúmulo de capital. Sendo assim, não podemos apartar a 
criação deste campo de conhecimento científico das questões políticas e 
econômicas que permeavam e permeiam as relações de produção. 
(FREITAS; GUARESCHI, 2004, p. 77) 
 
Leão (2012) apresenta a Psicologia Industrial com o intuito de abordar o 
ser humano como uma máquina,e como tal, deveria atingir o melhor funcionamento 
possível. A prática do psicólogo era examinar, classificar e selecionar por meio de 
testes psicológicos indivíduos aptos para trabalhar nas fábricas. Dessa forma, a 
Psicologia Industrial contribuiu para adaptação dos trabalhadores às exigências da 
produção, objetivando alcançar dele a maior produtividade possível. 
Nesta fase/face, o profissional psicólogo era chamado de psicotécnico, ou 
seja, desenvolvedor de técnicas previamente existentes sem crivo ou ponderação 
com informações sobre o ambiente. O seu trabalho objetivava a avaliação e a 
seleção de empregados para as indústrias, ou seja, a Psicologia no contexto do 
trabalho desde o princípio buscou compreender o desempenho e a eficiência laboral 
(ZANELLI; BASTOS; RODRIGUES, 2014). 
A fase/face de composição do campo da Psicologia Industrial foi 
impactada fortemente pelo trabalho de Frederick Taylor. O modelo de organização 
23 
 
de trabalho proposto por Taylor tem como base alguns princípios gerais que, 
segundo Sampaio (2013b, p. 22), apresentam-se como a 
D�GLYLVmR�GR�³WUDEDOKR�HP�PLJDOKDV´� �SHTXeno conjunto de tarefas no nível 
operacional, a seleção científica do trabalhador (nível operacional), o 
operário executor, o supervisor controlador e o engenheiro ou administrador 
planejador da execução, tempos alocado para a execução da tarefas, o 
estudo dos tempos e movimentos em busca do melhor tempo e do menor 
número de movimentos ou gestos para a realização das tarefas, controle 
individual dos operários, remuneração e punição atrelados à produtividade 
individual (visto como mérito). 
 
Os estudos de Taylor com os de Munsterberg foram responsáveis, em 
1913, pela publicação do livro chamado Psychology and Industrial Efficiency 
(Psicologia e Eficiência Industrial), que tem como objetivo principal o estudo da 
³VHOHomR�H�R�XVR�GRV�WHVWHV�SVLFROyJLFRV�FRP�D�finalidade de maximizar o ajuste das 
pessoas ao cargo.´� �=$1(//,�� %$6726�� 52'5,*8(6�� ������ S�� ����� O livro é 
dividido em três preocupações centrais: ter o melhor homem possível para o 
trabalho; o melhor trabalho possível; o melhor efeito possível. Para além dessas 
preocupações, Zanelli, Bastos e Rodrigues (2014, p. 552) apresentam uma das 
TXHVW}HV�LQHUHQWHV�GD�3VLFRORJLD�QR�FRQWH[WR�GR�WUDEDOKR�PDLV�ODWHQWHV��TXH�VHULD�³D�
necessidade de que os trabalhadores atuem em cargos que se ajustem às suas 
habilidades emocionais e mentais, para que haja eficiência no trabalho, 
SURGXWLYLGDGH�GD�HPSUHVD�H�VDWLVIDomR�GR�WUDEDOKDGRU´�� 
A partir da década de 30, foi desenvolvido estudos para além dos 
interesses acima citados na indústria, sendo expandido o leque de pesquisa para 
temas como comunicação, motivação e comportamento de grupo, assuntos estes 
que começaram a ter relevância na prática do processo de trabalho. De acordo com 
Sampaio (2013a), a relação homem-máquina-trabalho se configura como elemento 
marcante desse período, consolidando o que foi chamado de engineering 
psychology, que tinha como objetivo a projeção de equipamentos adequados à 
capacidade e limitação humana, muito utilizado na projeção de armamento no 
período da Segunda Guerra Mundial. Este cenário foi palco para os estudos 
pioneiros em técnicas de treinamentos, classificação de pessoal e avaliação de 
desempenho voltados para área militar. Com o término da guerra, integra-se aos 
estudos citados anteriormente o trabalho sobre liderança, também como objeto de 
análise (SAMPAIO, 2013a). Para Freitas e Guareschi (2004), o período entre as 
guerras foi de fundamental importância para o desenvolvimento de estudos voltados 
24 
 
para grupos, bem como pesquisas sobre os fatores de coesão e eficácia das 
pequenas unidades de trabalho e a moral dos grupos isolados em atividade. 
Ainda que houvesse aplicabilidade da Psicologia Industrial no campo do 
trabalho, uma deficiência é identificada em relação a sua falta de envolvimento com 
o restante da organização. Com as crescentes dúvidas sobre a efetividade das 
ações da Psicologia e, consequentemente, declínio dos resultados das atividades 
dispostas, observou-se a necessidade de preencher estas lacunas. Desta forma, 
houve a necessidade de uma delimitação para a segunda fase/face da Psicologia no 
contexto do trabalho, a Psicologia Organizacional. Novos temas como o 
comportamento do consumidor, desenvolvimento organizacional e gerencial, plano 
de cargos e salários, dinâmica de grupo entre outros, se fizeram presentes nesse 
contexto (SAMPAIO, 2013a). Com o início da discussão sobre a estrutura das 
organizações começa a se constituir a Psicologia Organizacional, que não deixou de 
estudar os postos de trabalho e mecanismos de aumento de produção, apenas 
ampliou seu campo investigativo e interventivo. 
 
3.2 Psicologia Organizacional 
 
Mas, afinal, qual seria a diferença entre a primeira e a segunda fase/face? 
Alguns autores apresentam a ideia de que a Psicologia Industrial estaria única e 
exclusivamente atendendo à indústria, ao passo que a Psicologia Organizacional 
amplia esta visão para além dos muros da fábrica, atendendo a outras instituições e 
adentrando nas estruturas das organizações. Entretanto, Sampaio (2013a) não 
concorda com esta visão, já que acredita que a Psicologia OrganizacionDO�³>���@�QmR�
foi uma ruptura radical com a Psicologia da Indústria. Foi uma ampliação de seu 
objeto de estudo, uma vez que os psicólogos continuavam atrelados ao problema da 
produtividade das empresas.´��6$03$,2������D��S�������1mR�KRXYH��SRUWDQWR��XPD�
ruptura entre ambas as fases/faces ± Industrial e Organizacional ± apenas uma 
ampliação do seu objeto de estudo, já que a problemática central não deixou de ser 
a produtividade das organizações. 
Para Leão (2012, p. 296), a Psicologia Organizacional possui essas duas 
preocupações, que são 
de duas ordens: primeiro, os problemas tradicionais (recrutamento, testes, 
seleção, treino, análise de tarefas, incentivos, condições de trabalho) 
passam a ser tratados como inter-relacionados e ligados ao sistema social 
25 
 
da organização; segundo, essa psicologia se interessa por uma nova série 
de problemas da organização enquanto um sistema complexo. Tais 
problemas não são limitados ao comportamento individual, mas abrangem o 
comportamento de grupos, subsistemas e à organização global como 
reação a estímulos externos e internos. 
 
Ou seja, esta fase/face está para além da indústria: pode-se encontrá-la 
em todo o campo que forem consideradas relações de trabalho, seja ele qual for, e 
também soma-se às questões anteriormentes levantadas pelas seleções de pessoal, 
testes e até mesmo as condições de trabalho. Porém, tais atividades passam a ter 
uma outra ótica de observação, ligadas ao sistema da própria organização de 
trabalho, surgindo outros problemas, mas que abrangem toda a lógica 
organizacional, não mais apenas a individual (LEÃO, 2012). Para Sampaio (2013a) 
por conta da instrumentalização, houve uma supervalorização das teorias 
comportamentais, que maximizam a influência do ambiente no comportamento 
humano e minimizam as influências intrapsíquicas, reduzindo-as ao âmbito da 
satisfação, novo tema que surgiu dentro dos estudos de motivação. 
 Como o objeto de estudo passou por uma reformulação, as atividades 
provenientes desta fase/face também. Os treinamento nas organizações ganharam 
mais força com o intuito de gerar a evolução do setor de Recursos Humanos e não 
mais visando apenas o ajustamento do empregado à atividade (SAMPAIO, 2013a). 
Leão (2012) constata que os sistemas de recompensas e penalidades, esquemas de 
incentivos, aprendizagem, grupos de trabalho com suas próprias regras, motivação, 
relações de cooperação passaram a ser mais valorizados no ambiente 
organizacional. Com esta soma de atividades, percebe-se a inter-relação entre as 
fases/faces, ou seja, não há um abandono da Psicologia Industrial, mas sim um 
acréscimode ideias que constitui a Psicologia Organizacional. 
Mesmo com todo o aparato e mudança oferecida pela Psicologia 
Organizacional, as críticas ao sistema não foram poucas. Como conta Sampaio 
(2013a), o papel da Psicologia no contexto de trabalho é criticado, sendo 
posicionado apenas como persuasão para aumentar a produtividade, eficácia, 
desempenho e produtividade em pouco tempo. 
 
 
 
 
26 
 
3.3 Psicologia do Trabalho 
 
A terceira fase/face da Psicologia no contexto do trabalho, a Psicologia do 
Trabalho, considera a pedra angular do seu estudo a compreensão do trabalho 
humano em todos os seus significados e manifestações, o que aumenta o campo de 
visão do pesquisador da Psicologia no contexto do trabalho, pois este passa a 
compreender de forma mais profunda o homem que trabalha (SAMPAIO, 2013a). 
Para Zanelli, Bastos e Rodrigues (2014, p. 550), 
esta é a tarefa central ou a missão que caracteriza esse amplo espaço de 
ação da psicologia ± explorar, analisar, compreender como interagem as 
múltiplas dimensões que caracterizam a vida das pessoas, dos grupos e 
das organizações, em um mundo crescentemente complexo, construindo, a 
partir daí, estratégias e procedimentos que possam promover, preservar e 
restabelecer a qualidade de vida e o bem-estar das pessoas, sem abrir mão 
da produtividade da qual depende o atendimento das necessidades dos 
indivíduos e dos grupos sociais. 
 
Sendo assim, o enfoque é voltado para as questões mais humanistas, a 
atenção é direcionada para as relações entre a satisfação dos indivíduos com as 
suas atividades dentro das organizações, visando a promoção da humanização do 
trabalho. Com a leitura de Sampaio (2013a) infere-se que essa fase/face é diferente 
das demais, pois tem como principal preocupação a compreensão do trabalho 
humano, tem-VH�XP�ROKDU�VREUH�R�KRPHP�FRPR�³VXMHLWR�GHVHMRVR�H�VHXV�HVIRUoRV�VH�
voltam para a saúde e o bem-estar humano, independentemente do aumento ou não 
da lucratividade e produtividade das organizações produtivas.´��SAMPAIO, 2013a, p. 
47). Para Freitas e Guareschi (2004, p. 86), a Psicologia do Trabalho surgiu 
questionando a concepção de ser humano-trabalho. Não mais somente 
comprometida com o aumento da produtividade, mas também com as 
vivências e experiências estabelecidas pelo trabalhador na relação com o 
processo de trabalho, esta nova fase/face, amplia seus campos de 
intersecção com outras disciplinas 
 
 Sob essa perspectiva, deixa-se de se considerar a atividade laboral 
apenas como produção de bens materiais ou de serviços ligados a lucratividade. 
Leão (2012) coloca que novos estudos e questões vão surgindo, quanto a qualidade 
de vida dos funcionários, clima e cultura organizacional, comprometimento. 
A fase/face da Psicologia do trabalho iniciou seus estudos não mais se 
preocupando com a questão da produtividade, da eficiência, da 
normatização e do controle do comportamento humano como as duas 
anteriores, mas sim com o que é produzido nas relações ser humano-
trabalho, no contexto das políticas liberal e neoliberal. O sofrimento mental 
do trabalhador, a psicodinâmica do trabalho, as relações entre subjetividade 
e trabalho são temas hegemônicos desta subárea. (FREITAS, 
GUANESCHI, 2004, p. 84) 
27 
 
Chega-se, por fim, à terceira fase/face da Psicologia no contexto do 
trabalho ± a Psicologia do Trabalho, que surgiu da necessidade de uma Psicologia 
que não estivesse voltada somente para os benefícios trazidos para a organização, 
mas que olhasse também o trabalhador e as dificuldades que o mesmo encontra 
para satisfazer suas necessidades (SAMPAIO, 2013a). 
Assim, as várias fases/faces da Psicologia aplicada ao contexto do 
trabalho podem coexistir tanto nas concepções e práticas dos profissionais quanto 
nos processos de formação dos novos participantes da profissão e da área de 
atuação (COELHO-LIMA; COSTA; YAMAMOTO, 2011;). Zanelli, Bastos & Rodrigues 
(2014, p. 554) salientam que, todavia, ³as fases não significam momentos que se 
impõem e eliminam o anterior´. Além disso, a fase/face da Psicologia do Trabalho 
possui a importante contribuição de outros campos do saber, comparecendo a 
interdisciplinaridade neste momento. A partir disso, compreende-VH� TXH� ³WHRULDV��
conceitos e atividades constituídas em outros campos do saber são pertinentes à 
construção de uma visão mais ampla do homem que trabalha e do trabalho do 
KRPHP�´��6$03$,2������D��S�����. 
A partir da sistematização das fases/faces da Psicologia no contexto do 
trabalho, o psicólogo que atua nessa área, de modo geral, tende a se intitular 
psicólogo organizacional ou psicólogo do trabalho, mesmo sem uma clara 
diferenciação na prática; já o termo psicólogo industrial caiu em desuso. Na prática 
profissional, tem-se uma combinação de instrumentos, conceitos e práticas de 
maneira que acaba por haver a incorporação de todas as faces/fases em sentido 
genérico ± teorias e práticas em uso na atualidade pelos psicólogos que trabalham 
em organizações produtivas ± respaldando uma mesma atuação (SAMPAIO, 
2013a). 
Sampaio (2013a) apresenta que os psicólogos brasileiros se 
autodenominam psicólogos organizacionais ou do trabalho, porém sem crivo e 
conhecimento das diferenças teóricas e práticas. As confusões nas nomenclaturas 
estão ligadas tanto à indefinição das fases/faces em momentos históricos 
certamente delimitados quanto ao desconhecimento do que se prega enquanto 
exercício de cada subárea da Psicologia no contexto do trabalho. Refletindo sobre a 
imprecisão da própria identidade do psicólogo no ambiente laboral, penso que a 
imersão do estagiário nesta circunstância de dúvida auxilia na reprodução de 
práticas distorcidas, que, por inexperiência, considera-as como verdadeiras e 
28 
 
provenientes da área, o que deve ser considerado como algo preocupante para o 
futuro da profissão de psicólogo no contexto do trabalho. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
29 
 
4 O ESTÁGIO: ALCANCES E LIMITES 
 
³2�HVWiJLR�p�XP�DWR�HGXFDWLYR´��(VVD�p�D�IUDVH�TXH�LQLFLD�D�Lei 11.788 de 
25/09/2008 (Anexo B) que rege a atividade no Brasil. O estagiário é um estudante 
que se encontra em processo de formação profissional, preparação e lapidação para 
o mundo do trabalho. O período do estágio é determinante para que a organização 
forme seus futuros funcionários, inserindo-os na dinâmica e cultura da empresa. 
Talvez este seja o ponto chave para um bom aproveitamento desse período de 
aprendizagem por parte do estudante, da instituição de ensino e da própria empresa. 
O estágio é vantajoso para todas as partes envolvidas: para o estudante, 
é importante aprimorar técnicas, alargar o repertório de competências, desenvolver a 
responsabilidade e compromisso com sua carreira profissional, bem como por em 
prática o conhecimento fornecido em sala de aula, possibilitando o investimento em 
descobertas, refinar o que já se tem conhecimento e desenvolver uma visão mais 
realista do mundo profissional em termos do que lhe é exigido e o que essa 
oportunidade poderá lhe oferecer (ALMEIDA;CAIRES, 2000); para a empresa, que 
também recebe esse conhecimento que está sendo gerado nas instituições, o que 
movimenta e permite inovação dentro das estruturas da organização; para a 
instituição formadora, os estudantes trazem consigo o parâmetro entre teoria e 
prática, enriquecendo a discussão dentro da academia sobre as situações reais do 
mundo do trabalho, bem distinto do universo acadêmico. 
 
4.1 O que é ser estagiário? 
 
Pra mim, estagiário é ser um aprendiz. Quando a gente começa no curso a 
gente começa com uma visão, começa a ter a prática, o contato com 
pessoas que tu vai te formar e vai trabalhar depois, com essa gama de 
diferenças. Tu começa a aprender que, por mais que seja muito clichê a 
questão da teoria e da prática, mas é verdade, se não fosse considerado 
clichê não seria tão verdade. Então quando eu comecei a estagiareu vi que 
eu não conseguiria sair do curso da mesma maneira se eu não tivesse 
passado por esse estágio. (Entrevistada 3) 
 
Como forma de regulamentação, o estágio hoje é resguardado pela Lei Nº 
11.788/2008 (Anexo B) que teve sua última alteração no dia 25/09/2008. Esta lei 
contém seis capítulos, onde cada um trata de questões específicas do estágio. As 
novas configurações do ensino no Brasil podem ser compreendidas como uma das 
razões para a atualização da lei. De acordo com pesquisas da Associação Brasileira 
30 
 
de Estágio (ABRES), de 2002 a 2014, o número de alunos na educação superior 
passou de 3,5 para 7,8 milhões. Já o total de concluintes deu um salto de 114%, 
passando de 479.275 para 1.027.092. Mudando o contexto, a configuração da lei 
também foi alterada. 
 
Figura 1 ± Dados estatísticos do Ensino Médio e Superior 
 
Fonte: ABRES. 
 
Aliado ao mercado de trabalho cada vez mais competitivo, o número de 
faculdades e cursos superiores pelo Brasil aumenta proporcionalmente, o que 
acarreta um intenso fluxo de estudantes que almejam inserção no âmbito 
profissional. Este momento é considerado crucial para o desenvolvimento de 
habilidades, descoberta de afinidades com determinadas áreas, bem como o 
discernimento do futuro naquela profissão. As alterações de artigos e incisos na lei 
que regulamenta o estágio alerta e diferencia esta prática do trabalhador efetivo, 
sendo regidos por leis diferentes. Por conta disso, todos os envolvidos neste 
processo devem permanecer atentos para que o estagiário não seja considerado 
como um funcionário da organização. O estágio não deve ser confundido com 
emprego formal. Em virtude disso, estagiários devem estar atentos com as 
atividades que desenvolvem junto ao estabelecimento, pois a sua mão-de-obra não 
pode substituir a de um profissional. 
Hoje, a partir da Lei Nº 11.788/2008, o estágio caracteriza-se de duas 
formas, o a) obrigatório, definido como pré-requisito no projeto pedagógico do curso 
para a aprovação e obtenção do diploma (§1º do art. 2º da Lei Nº 11.788/2008) e o 
31 
 
b) não obrigatório, uma atividade opcional, acrescida à carga horária regular e 
obrigatória (§2º do art. 2º da Lei nº 11.788/2008). 
Como é de conhecimento, a lei regulamenta a atividade do estágio e, para 
isso, prevê a realização de um documento formal que estabeleça entre as partes 
envolvidas ± estagiário, concedente e instituição de ensino ± um acordo, bem como 
a apresentação das condições elencadas à proposta pedagógica do curso. Este 
documento previsto em lei é o Termo de Compromisso, que resguarda a tripartite 
envolvida. Conforme Cartilha Esclarecedora sobre a Lei do Estágio Nº 11.788/2008 
construída pelo Ministério do Trabalho e Emprego (2010, p. 28), este termo precisa 
ter 
a) dados de identificação das partes, inclusive cargo e função do supervisor 
do estágio da parte concedente e do orientador da instituição de ensino; b) 
as responsabilidades de cada uma das partes; c) objetivo do estágio; d) 
definição da área do estágio; e) plano de atividades com vigência; 
(parágrafo único do art. 7º da Lei nº 11.788/2008); f) jornada de atividades 
do estagiário; g) horário da realização das atividades de estágio; h) 
definição do intervalo na jornada diária se for o caso; i) vigência do Termo 
de Compromisso de Estágio; j) motivos de rescisão; l) concessão do 
recesso dentro do período de vigência do Termo de Compromisso de 
Estágio; m) valor da bolsa, nos termos do art. 12 da Lei nº 11.788/2008; n) 
valor do auxílio-transporte, nos termos do art. 12 da Lei nº 11.788/2008; o) 
concessão de benefícios, nos termos do § 1º do art. 12 da Lei nº 
11.788/2008; p) número da apólice e a companhia de seguros. 
 
As informações presentes no Termo de Compromisso são de grande 
importância para a fundamentação e respaldo das partes envolvidas no processo do 
estágio. Observo a utilização e efetividade do Termo de Compromisso na fala da 
Entrevistada 2, 
O meu supervisor estava sempre com a lei e quando tínhamos dúvida ele ia 
nela e via. Até mesmo porque tem algumas exceções e coisas que não 
estão previstas na lei. Eu usufrui de tudo que a lei me permitia: eu pude 
viajar sem comprometer a minha bolsa, eu pude faltar os dias que fossem 
necessários sem ser necessário uma reposição, um desgaste jamais do que 
eu fazia externamente. 
 
Contudo, a correta utilização das documentações necessárias para a 
legalização do estágio só foi observada nos relatos da Entrevistada 2. Infelizmente, 
a partir dos discursos das entrevistas abaixo ficou mais claro o que realmente é feito 
na prática quanto a aplicabilidade ± ou não ± da lei. 
 O estágio é atrelar aquilo que eu aprendi na teoria com a prática. Mas a 
gente sabe que na verdade nunca é de fato do jeito que a gente aprende, 
QmR� WHP�XPD� OLVWD� TXH� GL]� µID]� LVVR�� LVVR�H� LVVR� TXH� YDL� GDU� FHUWR¶� H� p� QD�
prática que se vai aprendendo a fazer e é justamente isso que o estágio 
proporciona. Sobre a lei, pouco tinha conhecimento no início. Horário era 
algo difícil de obedecer, principalmente para almoçar e voltar ao trabalho. 
Tinha que entregar as coisas. (Entrevista 3) 
32 
 
Então, eu tenho conhecimento da lei e a minha supervisora também mas, 
por exemplo, o que eu percebo muito, com relação a prova, que se tem 
direito a sair mais cedo ou até não ir no dia. Ai, a gente tem uma conversa. 
Ou seja: no dia que eu preciso não ir eu não vou naquele dia mas em outra 
circunstância eu trabalho dobrado outro dia. Nunca ficou acertado, assim, 
eu tenho essa liberdade mas de certa forma eu me cobro em repor esse 
horário. [...] pra evitar que eu passe por uma pressão desnecessária, eu 
vou. Eu sei que existe a lei do estágio, mas a maioria das vezes eu burlo a 
lei do estágio por saber dos meus prazos, das metas, por estar 
extremamente comprometida com o meu trabalho e ser responsável por 
aquilo e também por não querer sofrer pressão desnecessária. 
(Entrevistada 1) 
 
[...] o importante é saber que eu tenho um lugar, e que meu lugar é de 
estagiário, com responsabilidades, mas que eu tô resguardada com a lei e 
com os documentos que eu fiz para estar aqui, o que diferencia como era 
antes da lei. Porém, nem tudo é tão bonito quanto parece, principalmente o 
que se refere aos horários e direitos que o estagiário tem. Quando você tem 
algo pra entregar, você quer entregar aquilo dali e nem sempre consegue, 
tem que ficar a mais, dobrar o expediente. Escolhas... (Entrevistada 5) 
 
Por si só, os depoimentos já são extremamente preocupantes se 
vinculados à ótica da lei e do que o estágio se propõe a realizar. Porém, o agravante 
para a Entrevistada 5 é que ela trabalha como agente de integração na organização, 
ou seja, ela auxilia no processo de aperfeiçoamento do estágio, identificando as 
oportunidades, ajustando suas condições de realização, fazendo o 
acompanhamento administrativo, encaminhando negociação de seguros contra 
acidentes pessoais e cadastrando os estudantes (§1º do art. 5ºda Lei 
nº11.788/2008), selecionando os locais de estágio e organizando o cadastro dos 
concedentes das oportunidades de estágio (art. 6ºda Lei 11.788/2008). Como conta, 
D�(QWUHYLVWDGD���³[...] percebo a efetividade da lei do estágio, eu busco isso na minha 
atuação, enquadro os estagiários conforme o pedido das empresas, mas, quando é 
pra mim, acontece... bem, não acontece! [risos]´� Até mesmo a estagiária que mais 
apresenta pontos positivos na sua atuação também demonstrou estar inserida na 
lógica do estagiário alienado dos seus direitos e deveres. 
Não vou te mentir que eu não tenho quase nenhum conhecimento sobre a 
lei do estágio e não procurei também saber. E, no meu estágio, desde que 
eu entrei isso não é muito falado. O que eu sei são em relação a semana de 
provas que eles podem liberar, mas é bem difícil isso acontecer porque 
temos o trabalho pra fazer e se pedirmos isso poderemos ser mal vistos, 
como eu já vi com alguns colegas de trabalho.Como meu estágio também é 
não obrigatório, pensei que a lei pudesse ser mais rígida ao obrigatório. 
(Entrevistada 4) 
 
Infelizmente, em muitos momentos, a demanda parte da própria 
instituição em colocar o estagiário como um funcionário, exercendo a mesma 
33 
 
pressão, pedindo a presença no horário em que o estudante não precisaria estar, o 
que ultrapassa a carga horária determinada por lei. 
Houve momentos que eu fui chamada a comparecer dobrando o turno ou 
coisas do tipo por ser considerado atividades mais longas, mas que esse 
momento eu considerei como algo extremamente produtivo pra mim. Por 
exemplo, fechar uma atividade importante pros funcionários, um processo 
urgente que eu precisaria despachar ou um feedback para a diretoria, até 
mesmo um workshop que eu tinha que participar. Pra mim, são atividades 
válidas e que só somam para a minha atuação, mesmo que não sejam no 
meu horário de trabalho. Tem que ir... (Entrevistada 2) 
 
Confesso que tais palavras me deixaram bastante preocupada, não só 
como pesquisadora, mas também como profissional. O desconhecimento daquilo 
que se deve ter como regulamentação da prática cai num mundo abstrato e passa a 
ser distante do que se deve ser. Observo que esta pode ser uma grande questão 
para análise pois, se o estagiário tem sua visão limitada a esta experiência isolada 
sem avaliar e criticar sua atuação, ele irá se transformar em uma ferramenta 
operacional do sistema e de toda a lógica já instaurada, o que pode vir a deturpar a 
ideia inicial do estágio como formação e aplicação da teoria, levando isso para a 
discussão em sala de aula. De acordo com Almeida e Caires (2000, p. 225), 
à Universidade cabe a maior fatia de responsabilidade nesta indução 
progressiva no Mundo do Trabalho. Ao longo do estágio é esperado que o 
aluno adquira e aplique correctamente os conhecimentos que foi 
aprendendo ao longo do seu percurso académico e que estes sejam 
relevantes sob o ponto de vista profissional. [sic] 
 
 Para além dessas questões, debruço-me sob a preocupação do estagiário 
estar como um profissional na empresa que sofre a mesma pressão que 
funcionários efetivos e apenas em termos legais ± remuneração, leis de trabalho, 
horário ± diferente disso. Por mais que aprendizado seja algo importante e 
extremamente necessário para quem está iniciando sua carreira, colocar-se na 
situação de aceitar a pressão e demandas que não devem ser de responsabilidade 
de um estagiário é também sustentar a lógica de ser uma mão de obra barata e que 
se coloca à disposição para tudo, até mesmo de atividades que não estão no escopo 
da sua profissão. 
 
 
 
 
34 
 
4.2 ³7HQKR� DV� PHVPDV� DWLYLGDGHV� H� VRIUR� DV� PHVPDV� FREUDQoDV� TXH� XP�
IXQFLRQiULR�HIHWLYDGR´��DWXDomR�do estagiário versus atuação do psicólogo 
 
[...] a visão que eu tenho hoje do estagiário é como se fosse um efetivo, um 
funcionário, que trabalha em um tempo menor e que sofre a mesma 
cobrança, a mesma pressão, que precisa entregar nos mesmo prazos de 
alguém efetivo mas recebe bem menos e trabalha em um tempo menor, 
trabalha muito em um tempo bem menor. (Entrevistada 1) 
 
Em consonância a todo o crescimento e aprendizagem, ao passo que 
temos um lado positivo na expansão de conhecimento e prática por parte do 
estudante, temos um mercado de trabalho cada vez mais competitivo e seletivo, o 
que pode acarretar em sobrecarga de funções para o estagiário, sob a ótica do 
funcionário polivalente. 
Na bibliografia atual é possível observar diferentes facetas do setor de 
Recursos Humanos. Goulart (2013) identifica três modelos de setor: o de 
$GPLQLVWUDomR� GH� 3HVVRDO�� LGHQWLILFDGR� FRPR� ³KRPHP� HFRQ{PLFR´�� RQGH� VXDV�
atividades estão ligadas ao cumprimento de exigências legais e ao pagamento de 
salário e benefícios, sem articulação com a política da empresa; o de Administração 
de Recursos Humanos que tem como conceito principal a busca do homem pelo 
desenvolvimento de suas potencialidades, havendo relação com as políticas da 
empresa e tendo suas atividades como base de apoio ao gestor; e a Administração 
Estratégica de Recursos Humanos, na qual há a concepção do homem como fonte 
de competências e recursos estratégicos, com atividades desenvolvidas com foco no 
alcance dos objetivos estratégicos da empresa que possui, ainda, suas políticas 
formalizadas. 
 No contexto da atuação do psicólogo no mundo do trabalho, Leão 
(2012) sugere práticas ligadas às esferas da administração de pessoal e gestão de 
pessoas (análise de pessoal, recrutamento e seleção, plano de cargos e salários, 
desligamento, planejamento de recursos humanos); mudança organizacional 
(desenvolvimento organizacional, qualidade de vida no trabalho, programas de 
qualidade total); qualificação e desenvolvimento (treinamento, avaliação de 
desempenho, desenvolvimento de equipes, gerentes etc.); comportamento 
organizacional (grupo e liderança, motivação, satisfação cultura organizacional); 
condições de trabalho (segurança e saúde no trabalho, ergonomia, estresse, 
35 
 
assistência psicossocial) e relações de trabalho (padrões de gestão, organização do 
trabalho, regulação de conflitos). 
Quando questionadas sobre a proposta do estágio e o que efetivamente 
fazem/faziam, os estagiários tiveram discursos diferentes mas com dinâmicas e 
atividades laborais bem parecidas. 
A minha proposta de estágio foi pautada em ir pras dinâmicas de grupo, iria 
pro processo de formular parecer, aplicação e correção de testes, dar o 
feedback assistido pelo psicólogo. Então, basicamente era tudo na parte de 
R&S.no geral, hoje tô com R&S [...]. Da Psicologia, uso os testes AC, 
QUATI, PALO, R1, Ferramenta PROFILE, mas também tô com avaliação de 
desempenho, indicador, que é voltado para a parte do recrutamento, onde a 
gente tabela todo mês quantas pessoas foram avaliadas, quantos aptos e 
quantos inaptos, pra ajudar a ter noção das entradas e saídas do hospital, 
turnover e tudo isso. (Entrevistada 1) 
 
No edital tinha algumas funções: R&S, acompanhamento dos programas de 
função corporativa, acompanhamento do programa de ambientação e 
rotinas elaborativas. No momento da entrevista, o psicólogo repôs isso, 
apresentou o setor, como ele era estruturado, e que atividades ia 
desempenhar. Explicou que muitas atividades eram desempenhadas em 
conjunto com o departamento de pessoal, que são questões de admissão 
que precisa ter o controle compartilhado. E além disso os processos 
seletivos que é bem out going mesmo, bem letrado, os programas de 
estágio, educação corporativa e treinamentos continuados, programas de 
treinamentos fora, programa de pós graduação para os professores. 
(Entrevistada 2) 
 
Eles falaram na questão da aplicação dos testes psicológicos porque só 
quem poderia aplicar ou era o próprio psicólogo ou o estagiário, frisaram 
bastante isso, que iríamos trabalhar diretamente com essa atividade. Com o 
passar do tempo vi que o processo de R&S é mais que isso e é nele que eu 
estava inserida até dia desses. Eu triava os currículos por meio da vaga que 
estava em aberto, isso por meio de e-mail, indicações e os físicos; ligo pra 
pessoa, marco todo o processo, e aí ou eu ou o psicólogo encaminhamos o 
processo na parte de testagem. Hoje, eu cuido das entradas de 
documentações dos admitidos, já mudei de função no setor. Disseram que 
ia ser bom eu passar por vários lugares para aprender o todo... 
(Entrevistada 4) 
 
[...] a descrição da vaga era auxiliar no processo de recrutamento e seleção 
de estagiários, só isso. Mas aí, com o tempo, fui fazendo outras coisas, teve 
um pouco quase nada de treinamento do próprio setor e agora surgiu a 
demanda de palestras voltadas para o mercado de trabalho, que são 
palestras para os públicos iniciais, jovens, que nunca tiveram esse contato. 
E também [surgiu a atividade] para dar auxílio no processo seletivo de 
colaboradores, de fixos. Hoje eu não lido só com o que foi passado no 
começo... µ2N¶�que é 85%do que eu faço, mas também tenho essas outras 
demandas. (Entrevistada 5) 
 
Ora, visto as atividades posicionadas por Leão e Goulart anteriormente, 
qual seria então a diferença entre o Psicólogo e o estagiário inserido no mundo do 
trabalho? Fica claro, nas falas, que o estágio está sendo utilizado como uma mão de 
obra barata para a realização das mesmas atividades que um funcionário efetivo. 
36 
 
Ratifico, mais uma vez, do que é para ser esta atividade do estágio, que, de acordo 
com Rodrigues (2013, p. 1011), informa que o estágio é um momento 
de formação profissional do formando e não é uma atividade facultativa, 
sendo uma das condições para a obtenção da respectiva licença, devendo 
ocorrer pelo exercício direto in loco, ou pela presença participativa em 
ambientes próprios de atividades daquela área profissional. 
 
 Infelizmente, os profissionais formados que deveriam se contrapor a esta 
exploração encontram-se como agentes difusores da prática do estágio como algo 
mais em conta para a instituição. Para os Psicólogos, o agravante nisso tudo é que, 
de acordo com os princípios fundamentais elencados pelo Conselho Federal de 
Psicologia no Código de Ética Profissional do Psicólogo (2014, p. 7), 
VI. O psicólogo zelará para que o exercício profissional seja efetuado com 
dignidade, rejeitando situações em que a Psicologia esteja sendo aviltada. 
VII. O psicólogo considerará as relações de poder nos contextos em que 
atua e os impactos dessas relações sobre as suas atividades profissionais, 
posicionando-se de forma crítica em consonância com os demais princípios 
deste código. 
 
Ou seja, mesmo com o código de ética pedindo este controle das 
atividades e fomentando o diálogo entre organização e profissional para a boa 
conduta da profissão, isto não está sendo obedecido. Imersos na lógica produtiva de 
entregar as atividades, de ter menos custos para a empresa, de ser mais barato e, 
até mesmo, de ter um bom funcionário naquela atividade, é esquecido que este 
servidor é, na verdade, um estudante em formação e que este não deve ter as 
mesmas funções e sofrer as mesmas pressões que um profissional já formado. 
Sobre as atividades que mais comparecem, Sampaio (2013a) também 
elenca as atividades que um profissional da Psicologia pode exercer, como por 
exemplo as que mais comparecem são a seleção e colocação de pessoal, o 
planejamento de recursos humanos e o treinamento de pessoal (Anexo A). 
Analisando os relatos, a atividade frequente é o R&S, desde a triagem de currículos 
até a efetivação do candidato na empresa. Esta atividade por si só é inerente do 
Psicólogo quando utilizadas somente técnicas da área. Quando não, ainda temos 
enquanto saber científico uma discussão com outras áreas que também se 
apropriam do RH e acabam por colocar o seu olhar sobre essas atividades. 
Todavia, inerentes ou não do psicólogo, é fato de que se houver apenas 
repetição do que foi aprendido, uma hora é naturalizado até mesmo os vícios e os 
erros, colocando o seu labor diário em algo improdutivo. Esta conclusão posso 
chegar a partir de alguns relatos, como, por exemplo, da Entrevistada 4 que informa 
37 
 
que ³>���@�Wodas essas atividades eu fui ensinada a fazer, já tinha tudo do jeitinho que 
eu tinha pra fazer e aqui também você faz a mesma coisa durante todo o tempo, não 
tem muita coisa pra inovar nesse quesito. Já tem o procedimento, as ligações, o 
FRPR� ID]HU´�� DVVLP� como da Entrevistada 2 que menciona algo interno�� ³[...] me 
sentia mais uma controladora do sistema do que efetivamente uma estagiária em 
3VLFRORJLD´. Como consequência disso, se dá prioridade às atividades mandatórias e 
à operacionalização dos processos, não sendo possível a análise e a criação de 
novas demandas, uma vez que já não dispõem de efetivo suficiente para atender as 
exigências já existentes, reforçando ainda mais a identidade do setor como 
operacional e executor. 
Iema (1999) entende que esse padrão é muitas vezes reflexo da 
formação insuficiente, que não transmite ao aluno a amplitude dos conceitos e da 
atuação psicológica, favorecendo a atuação como meros reprodutores de técnicas e 
procedimentos. A formação acadêmica deve garantir a capacidade de problematizar, 
questionar em busca de uma solução, antes apenas de operacionalizar. Dessa 
maneira, sugere-se uma formação multidisciplinar, que se apoie na teoria científica 
para servir de embasamento para as práticas e não somente que seja alvo de 
repetição da técnica. 
Percebe-se que as práticas atribuídas à administração de recursos 
humanos possuem caráter técnico-operacional, ainda que se tenha consciência da 
necessidade de ir além deste perfil. O conhecimento técnico-operacional é de suma 
importância para o respaldo no desenvolvimento das atividades, pois enriquece as 
práticas dos profissionais e oferece credibilidade e suporte para uma atitude mais 
estratégica, envolvendo todos os subsistemas do setor. Contudo, Azevedo e Botomé 
(2001) complementam que o caráter técnico-operacional das atividades acarreta em 
um enfraquecimento no poder de atuação do setor de Recursos Humanos das 
organizações, indo na contramão das necessidades emergentes das mudanças do 
mercado de trabalho. 
Observando o cenário e resultados da pesquisa, também houve relato de 
desvios de funções, conforme Entrevistada 3: 
quando eu entrei, me passaram pro RH mas eu não ia ser estagiária de 
uma psicóloga e sim de uma administradora, já começa o erro por ai. Então, 
meu primeiro ano foi muito planilhar, organizar coisas, indicadores, controlar 
números internos e a parte da psicologia em si não me foi apresentada. O 
que me foi apresentado depois foi questão de clima organizacional, 
treinamentos, mas bem depois e quase no período de saída. De início foi 
38 
 
algo puramente administrativo e burocrático. A proposta inicial era que eu 
tivesse uma vivência no setor geral de atendimento dos funcionários e 
lideranças. A minha gestora já disse que eu ia lidar com as lideranças. Eu 
tinha que saber lidar com os superintendentes, com o gerente da linha e 
com ela, três pessoas diferentes. 
 
 O equívoco da atuação do estagiário em Psicologia no contexto do 
trabalho observado nas entrevistas perpassa por várias razões: a) as supervisões 
técnicas dos estágios, pelo menos inicialmente, não estavam sendo por psicólogos, 
dado que comparece em quatro das cinco entrevistas realizadas; b) as atividades 
iniciais não serem da área da Psicologia no contexto do trabalho, o que 
operacionaliza e descaracteriza o trabalho, não sendo conhecido na prática o que 
faz verdadeiramente um profissional da Psicologia por fora das paredes da 
faculdade e, como agravante, c) algumas dessas informações já são apresentadas 
na proposta do estágio, o que não é algo inerente de demandas emergenciais ou 
pontuais. É o que de fato acontece diariamente em um RH. 
Mediante tudo o que foi apresentado de funções diversificadas, 
responsabilidades exacerbadas, falta de supervisão, sentimento e vivência diária de 
cobrança, qual a diferença desses saberes para o papel de um profissional já 
formado em Psicologia no contexto do trabalho? Qual seria então a diferença entre 
funções? Algo a se pensar... 
 
4.3 ³'LDULDPHQWH��HX�PH�VLQWR�DGRHFHQGR���´��D�TXDOLGDGH�GH�YLGD�LQYHUVDPHQWH�
proporcional ao processo do estágio 
 
Uma vez que, invariavelmente, o trabalho faz parte da vida de todos, 
psicólogos ou estudantes de Psicologia, dotados de formação e com olhar 
diferenciado sobre os fenômenos, é capaz de contribuir expressivamente no 
contexto das organizações. A atuação do psicólogo do trabalho também tem por 
objetivo, segundo Sampaio (2013a), a promoção, a preservação e o 
restabelecimento do bem-estar e da qualidade de vida dos profissionais no contexto 
laboral. Porém, e quando isso não é algo palpável na prática? Com uma cobrança e 
demanda cada vez maior, o estágio se torna também fonte de adoecimento

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