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Universidade Federal de Pelotas – UFPEL Faculdade de Direito- Curso de Direito Hermenêutica Jurídica – Prof. Marcelo Apolinário PROVA 1ª “Se nada nos salva da morte, pelo menos que o amor nos salve da vida.” Pablo Neruda Nome: Fabiana Zandomenico (19300086) 1. São considerados casos difíceis aqueles que, devido a diversas razões e circunstâncias, não possuem uma solução prevista abstratamente no ordenamento jurídico. A solução de um hard case requer a construção artesanal da decisão, mediante uma argumentação elaborada e adequada, capaz de justificar e legitimar o papel criativo desempenhado pelo juiz na hipótese concreta. Sendo assim, identifique as situações geradoras de casos difíceis na atual conjuntura em que se encontra a teoria do direito. Identificadas as situações, explique e fundamente cada uma delas. (Valor 1,5) Resposta: Primeiramente, faz-se necessário mencionar que os hard cases são considerados complexos porque é necessário levar em conta um grande leque de fatores e, em decorrência disso, é preciso ir além do texto positivado. Os hard cases possuem alguns elementos que ensejam situações complexas para o hermeneuta, são eles: a) A ambiguidade da linguagem ou a falta de clareza das normas. Esta situação, ocorre quando uma norma apresenta duplo ou múltiplos significados, levando o leitor a realizar diferentes interpretações, dando margem a subjetivismos, ocasionando a incerteza na interpretação, isto é, a insegurança do julgador no momento de aplicar determinada regra. b) A existência de acordos morais na sociedade pode desenrolar situações complexas, possibilitando a ocorrência de diversos hard cases no sistema jurídico brasileiro. Ocorre no momento em que os indivíduos divergem moralmente de uma regra, por possuírem concepções diversas acerca do tema, assim recorrendo ao intérprete. Também, muitas vezes, as soluções encontradas a problemas presentes no cotidiano causam profunda estranheza aos costumes e à coletividade. Caberá então ao magistrado utilizar de sua criatividade para contornar as desavenças que emergiram. c) Por fim, a colisão de normas constitucionais ou de direitos fundamentais, ou seja, a existência de mais de uma norma aplicável ao mesmo caso. Como estas referidas normas encontram-se no mesmo patamar hierárquico, haja vista estarem previstas no texto constitucional, a sua convergência em um caso concreto enseja um hard case. Não há como se aplicar nestes casos métodos tradicionais de interpretação, levando o hermeneuta a recorrer a outros mecanismos, como o método de ponderação (proporcionalidade, razoabilidade e dignidade da pessoa humana). Por conseguinte, é possível atestar que o trabalho de aplicação do direito, no que envolve os hard cases, está permeado por inúmeras dificuldades, como a ausência de norma específica, a colisão de normas constitucionais ou direitos fundamentais, a complexidade dos “acordos” morais da sociedade e, por fim, a ambiguidade da linguagem e a falta de clareza das normas. Enfrentando estas barreiras, o hermeneuta será capaz de encontrar a solução mais adequada para o hard case em questão. 2. Quais as principais características do pós-positivismo. Explique cada uma delas. (Valor 1,0) Resposta: As teorias pós-positivistas surgiram em um contexto pós Segunda Guerra Mundial, como uma forma de lutar contra o saldo negativo deixado pela guerra. Nessas teorias, é possível observar a presença tanto da nova hermenêutica quanto da teoria dos direitos fundamentais. Abaixo, mencionaremos e explicaremos alguns de seus atributos. Podemos apontar como principais características do pós-positivismo jurídico: a) Ser uma doutrina, forma de pensamento, geral, isto é, aplicada a qualquer Estado ou sociedade. Diferente do Neoconstitucionalismo que se aplica somente ao Estado Democrático de Direito, o pós-positivismo se aplica a toda espécie de Estado e sociedade, não exigindo-se requisitos para o seu funcionamento; b) O sistema jurídico não é formado apenas por regras jurídicas, devendo ser utilizados princípios para a solução dos casos complexos, mediante ponderação. O pós-positivismo, diferentemente do positivismo ortodoxo, admite a utilização de valores e princípios para a interpretação do hermeneuta nos casos concretos, principalmente, dos hard cases; c) Inclusão da moral como um critério de correção e validade do sistema jurídico. No contexto do pós-positivismo, a aferição da validade do sistema jurídico passa a depender de critérios formais, como o procedimento e a fonte, bem como de critérios materiais, como a justiça, moral e outros valores; d) Aproximação do direito e realidade com o consequente abandono do formalismo. Apreende-se que o texto e a norma jurídica não são a mesma coisa, que o intérprete não é neutro, que o raciocínio não é objetivo e que a ideia de completude do ordenamento jurídico é uma ficção. Assim, o pós-positivismo entende a necessidade do Direito se relacionar com demais áreas do conhecimento, a fim de promover um desenvolvimento mais exitoso e atrelado à realidade. 3. Para Maximiliano (2002, p.7) interpretar é o “ato de explicar, esclarecer, dar o significado ao vocábulo, atitude ou gesto, produzir por outras palavras um pensamento exteriorizado; mostrar o sentido verdadeiro de uma expressão; extrair de frase, sentença ou norma, tudo o que na mesma se contém”. No âmbito da hermenêutica jurídica, como sabido, existem diferentes métodos interpretativos. Nesse sentido, considerando que você seja o magistrado responsável por decidir sobre a existência ou não de vínculo socioafetivo na relação entre Pedro (menor absolutamente incapaz) e Marcos, seu padrasto, que lhe cria há mais de sete anos, levando em consideração a inexistência de previsão legal sobre a paternidade socioafetiva, qual (ou quais) método (s) de interpretação jurídica você utilizaria para fundamentar a sua decisão? Justifique sua resposta. (Valor 1,0). Resposta: A socioafetividade abrange, em sua maioria, casos de homens que registram filhos biológicos de terceiros em seu nome. O nosso atual Código Civil estabelece que a relação de parentesco pode ser biológica ou de outra origem. O art. 1593. do Código Civil de 2002 disse: Art. 1593.: “O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou de outra origem” Para muitos juristas, essa “outra origem” é o que fundamenta legalmente a paternidade ou maternidade socioafetiva. Desta forma, é preciso encarar esta discussão com a consciência de que, apesar de não haver previsão específica sobre a paternidade socioafetiva na nossa legislação, no nosso próprio Código Civil, há margem que poderia promover a filiação por socioafetividade. É utilizando esta margem que o hermeneuta, através dos diversos métodos de interpretação, poderá chegar à devida solução. Indo para o caso, a primeira possibilidade seria utilizar o método de interpretação sistemático. Neste método, analisa-se o dispositivo à luz dos demais dispositivos constitucionais, conectando estes com princípios, regras e valores previstos na Constituição Federal de 1988, expressa ou implicitamente. Limonge França divide esta interpretação em dois tipos: o primeiro se refere a quando é feita em relação à própria lei que o dispositivo pertence. O segundo se refere a quando se processa com vistas para o sistema geral do direito positivo em vigor. No caso de Pedro e Marcos, caberia melhor o segundo tipo, já que importa atender à própria índole do direito nacional com relação às matérias semelhantes, às últimas tendências do costume, da jurisprudência e da doutrina. Tourinho Filho indica que o intérprete recorre a esta interpretação quando a dúvida não recai sobre o sentido de uma expressão ou de uma “fórmula” da lei, mas sim sobre a regulamentação do fato ou da relação sobre aquilo que se deve julgar. Além do método sistemático, caberia utilizar o método teleológico, também conhecido como finalístico, para se alcançar a verdadeira finalidade da norma,encontrar o real sentido que no fato concreto a norma buscou garantir. No caso da paternidade socioafetiva, não existem normas expressas sobre o caso, mas há normas acerca da garantia da criança crescer em um lar amoroso, como de ter alguém zelando pelo seu cuidado e há também o artigo 1593 do Código Civil de 2002. Partindo da finalidade presente nas normas existentes, apreende-se que existe um vínculo socioafetivo entre Pedro e Marcos, tendo o padrasto criado Pedro por mais de sete anos, provavelmente exercendo a figura paterna mesmo sem a presença de laços consanguíneos. Ademais, cabe ao caso uma interpretação histórica, haja vista que realizando um juízo histórico-político-sociológico da questão, compreendemos que se vive em um outro momento histórico daquele de formação do Código Civil e consequentemente das leis que abordam questões familiares e socioafetivas, de modo que, no atual momento histórico estão presentes novas conformações de famílias, com vínculos de afeto presente além dos sanguíneos, sendo necessário uma reinterpretação do conceito de família, bem como dos laços que vinculam esses entes. 4. O que significa dizer que a dignidade é parte do conteúdo dos direitos materialmente fundamentais, mas que não se confunde com qualquer deles? Afinal, a dignidade como princípio da República, previsto na Constituição em seu art. 1º, III, é um valor absoluto? Indique e descreva resumidamente dois (pelo menos) casos práticos (que sejam do seu conhecimento) que tiveram como base jurídica ou filosófica a dignidade e que porventura foram utilizados pela Suprema Corte para a resolução de problemas jurídicos considerados complicados. Ademais, pergunta-se se o uso indiscriminado da dignidade humana como fundamento para a resolução de grande parte dos conflitos humanos, não compromete a credibilidade do princípio na busca do ideário de justiça? Fundamente suas respostas. (Valor 1,5) Resposta: A dignidade é parte dos direitos materialmente fundamentais, mas não se confunde com qualquer direito fundamental, pois serve de parâmetro de ponderação em caso de concorrência, colisão, em conflito concreto dos direitos fundamentais. E, embora seja considerada um valor, ou princípio, a dignidade da pessoa humana não tem característica absoluta. A dignidade deve ter precedência na maior parte das situações quando ocorre a colisão entre Direitos Fundamentais ou valores constitucionais, bem como, em demais hard cases, mas em determinados contexto, aspectos especialmente relevantes da dignidade podem ser sacrificados em prol de outros valores sociais ou individuais. Segue dois casos práticos complexos que tiveram como base jurídica a dignidade da pessoa humana e foram analisados pelo Supremo Tribunal Federal: 1) Pesquisa com células-tronco embrionárias: Foi ajuizado no Supremo Tribunal Federal uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3510) com o propósito de impedir o prosseguimento desta linha de estudo científico à luz da proteção da vida. De acordo com a inicial, a utilização em pesquisas ou terapias de células-tronco embrionárias coletadas de embriões para fertilização in vitro — mas que seriam descartados depois — violava o direito à vida e o princípio da dignidade humana, respectivamente protegidos nos artigos 1º, inciso III, e 5º, caput, da Constituição Federal de 1988. No entendimento do Ministério Público, o início da vida humana ocorreria com a formação do zigoto - produto da fecundação do óvulo pelo espermatozóide. Assim, a Lei de Biossegurança seria inconstitucional por retirar o embrião da tutela constitucional, em desconsideração à vida humana ali existente. Contudo, o STF julgou constitucional a Lei de Biossegurança, declarando que a ciência médica e o texto constitucional não esclareceram com precisão quando ocorre o início da vida, ainda, este não seria um direito absoluto frente a dignidade da pessoa humana de dispor sobre a utilização do embrião, neste sentido a proteção legal da célula-tronco embrionária seria menor do que a proteção dispensada à vida intrauterina e à pessoa nascida. Ademais, apreendeu-se que a utilização de célula-tronco embrionária para a pesquisa e para o tratamento não apenas deixa de violar o direito à vida, mas assegura uma possibilidade de existência digna aos indivíduos que esperam por tratamento. 2) Interrupção de gravidez de feto anencéfalo: o respectivo caso trata-se da análise de uma ação proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde, em 2004, que solicitaram ao Supremo Tribunal Federal permissão para em caso de anencefalia ser interrompida a gravidez. Haja vista que o Código Penal Brasileiro nada aborda sobre esse tema. O debate no Supremo se deu em torno de ressaltar que o procedimento não se trata de um prática abortiva, como não obriga a interrupção da gravidez de anencéfalo quando esta não for desejada pela progenitora, apenas dando a mulher o direito de escolha pela interrupção ou não nestes casos. Neste sentido, o STF compreendeu que não se trata de um aborto, pois o crime de aborto pressupõe gravidez em curso e que o feto esteja vivo, bem como a morte desse necessita ser resultado direto ou imediato de manobras abortivas e a interrupção em decorrência da anencefalia não satisfaz esses elementos. Pois o feto anencefálico não tem vida extra-uterina, como também o seu cérebro não tem capacidade funcional, deste modo, não há vida no sentido técnico e nem jurídico. A decisão do Supremo ocorreu assim, no sentido de que a interrupção nesses casos não configura crime, mas sim um direito das mulheres que se encontram nessa situação e que desejem levar a gestação possam fazê-la, e as que não desejam, possam interrompê-la Por conseguinte, ambos os casos levados ao Supremo Tribunal Federal retomam o debate da dignidade da pessoa humana como um dos valores centrais da sociedade brasileira, e que devem ser analisados no momento de proferir determinadas decisões que resultam em consequências a toda a nação. Conduziu-se em consideração, no primeiro caso, que a dignidade das pessoas em tratamento com células tronco-embrionárias, o direito dos genitores de escolherem o destino do material genético que forneceram e direito do cientista de exercer sua liberdade de pesquisa devem ser salvaguardados frente aos embriões. E no segundo caso a dignidade da progenitora de optar por interromper ou não a gestação, como o direito da mãe, a não ter o seu corpo funcionalizado por uma gestação indesejada e inviável deve prevalecer.. Por fim, compreendemos que o uso da dignidade da pessoa humana enquanto valor para a resolução de casos díspares, não compromete a credibilidade do princípio na busca do ideário de justiça. Há de fato um uso indiscriminado e em determinadas vezes equivocado da dignidade para a resolução de conflitos, todavia, esse uso indistinto não compromete a fidedignidade do valor, somente sinaliza que não há uma efetividade deste na realidade social, de modo que corriqueiramente é elevado nos debates jurídicos e políticos. A dignidade da pessoa humana é um valor basilar da Constituição brasileira que deve sempre ser analisado no julgados, principalmente em casos complexos, de modo que o seu uso ou análise é inevitável para a garantia da justiça. 5. Por que, segundo Robert Alexy, os princípios são considerados mandados de otimização? Na atual conjuntura jurídica e política, os princípios devem ser considerados normas jurídicas? Fundamente sua resposta. (Valor 1,0) Resposta: Para o jurista Robert Alexy, os princípios são considerados mandados de otimização por ordenarem que algo seja realizado, proibido ou permitido na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes, isto é, normas que exigem que algo seja feito na medida mais ampla possível dentro de uma conjuntura fática e jurídica - ao contrário das regras que podem ser cumpridas ou não, no tudo ou nada. Ainda, para Alexy na atual conjuntura jurídica, os princípios sãoparte essencial das normas jurídicas. Primeiramente, é importante esclarecer o que é uma norma jurídica. Norma jurídica é um gênero, e regras e princípios espécies desse, ou seja, é o resultado interpretativo de uma regra ou princípio em determinado momento, através dos elementos fáticos envolvidos. No caso concreto, pode-se aplicar uma dessas espécies ou ambas. A norma jurídica, deste modo, será construída argumentativamente pelo intérprete através da interpretação da regra à luz de princípios, ou seja, a decisão se converte em norma. Frente a esta visão, acerca das normas jurídicas, compreende-se que os princípios são elementos essenciais que configuram e auxiliam a construção da norma, de modo que as regras devem ser consideradas uma espécie do gênero norma jurídica, não a norma em si, mas parte essencial da sua conformação. 6. Qual a diferença entre judicialização da política e ativismo judicial? Em sua opinião, o STF é uma “Corte” ativista? Fundamente sua resposta. (Valor 1,0) Resposta: Existem grandes diferenças entre a judicialização da política e o ativismo judicial. A judicialização da política já está estruturada pelo nosso modelo de Estado e Constituição e é uma característica do Estado Democrático de Direito, pois a política encontra-se dentro do direito e muitas questões que antes estavam no âmbito do parlamento foram inseridas na Constituição, isto é, judicializadas. No que tange a nossa Constituição (CF/88), ela regulamenta, dá status jurídico e força normativa, a quase todos os setores da vida, campos antes que estavam adstritos a política. Assim, ocorre uma constitucionalização da vida, importando diversos aspectos da política para o direito. O nosso modelo de Estado leva estes conflitos, do dia a dia, a desaguar no poder judiciário, o que resulta em um forte protagonismo deste poder. A CF/88 arquiteta a judicialização da política, como também a constitucionaliza, fazendo-a virar matéria jurídica. Já a segunda, o ativismo judicial, se refere a uma ativa interferência do poder judiciário em matérias que vão além das suas atribuições. Isto é, o poder judiciário ignora o ordenamento e atua ativamente na sociedade, no caso do STF pode ser observado quando os Ministros atuam proativamente e defendem causas de natureza moral e ética que estão além do direito. Portanto, o ativismo judicial está relacionado ao comportamento dos juízes, transbordando o direito para além da atuação puramente técnica e judicial. Sobre a atuação específica do Supremo Tribunal Federal é importante levantar várias coisas. Luis Felipe Salomão, ministro do STJ, em uma palestra realizada na XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, relembra uma fala do ex-ministro Celso de Mello, em que o mesmo faz um alerta sobre o que poderíamos considerar como ativismo judicial. O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal disse: “...a ação direta de inconstitucionalidade não pode ser utilizada com o objetivo de transformar o STF, indevidamente, em legislador positivo, eis que o poder de inovar o sistema normativo constitui função típica da instituição parlamentar”. A fala do ex-ministro sinaliza uma ala do STF que promove o ativismo judicial com cautela, contudo, outros ministros pensam diferentemente. O ativismo judicial do STF se dá, na maioria das vezes, em defesa de direitos fundamentais e no sentido da inovação legislativa. A Suprema Corte, investida de poderes pela Constituição Federal de 1988, diante de uma crise de representatividade entre o povo e seus legisladores e da omissão destes na deliberação sobre assuntos sensíveis e importantes à sociedade, vem assumindo um papel de protagonismo nacional. Não se trata necessariamente de prerrogativa, mas também de papel irrenunciável do STF, o de proteger e guardar a Constituição, certificando que os ideais, valores e princípios que a norteiam sejam concretizados na vida do cidadão e no convívio da sociedade. Portanto, é possível afirmar que sim, o STF pode ser considerado, no contexto atual, uma corte ativista. Visto que há interferência do Supremo em matérias que, teoricamente, vão além de suas contribuições, há defesa de direitos fundamentais que, por muitas vezes, são desprezados e há uma prática jurídica que naturalmente transita para uma atuação inovadora, que visa atingir, da melhor forma, a legislação brasileira. 7. Quais são e para que servem os princípios instrumentais de interpretação constitucional? (Valor: 0,5) Resposta: Os princípios instrumentais de interpretação jurídica são: a supremacia da Constituição; a presunção de constitucionalidade das leis e dos atos promulgados pelo poder público; a unidade da Constituição; a proporcionalidade ou razoabilidade; e a máxima efetividade. Inicialmente, é importante destacar que nenhum desses princípios encontra-se expresso no texto constitucional, mas são reconhecidos pela doutrina e pelas jurisprudências dos tribunais como princípios implícitos de interpretação constitucional. Os princípios instrumentais de interpretação constitucional constituem premissas metodológicas que devem anteceder o intérprete a solução concreta da situação posta. Assim, servem para nortear o hermeneuta. Este, deve procurar refletir, antes de aplicar o direito, acerca desses princípios instrumentais, que o auxiliam a analisar e interpretar o fato com a devida segurança constitucional. 8. Os direitos de terceira dimensão são atribuídos às formações sociais, que protegem os interesses de titularidade coletiva ou difusa. Sobre os direitos de terceira dimensão, analise as afirmativas a seguir: (Valor 0,5) I. Os direitos de terceira geração ou dimensão consubstanciam como titulares a coletividade, consagrando o princípio da solidariedade e incluindo direitos como o da paz, ao desenvolvimento e ao meio ambiente equilibrado. II. Compreendem as liberdades positivas, reais ou concretas, acentuam o princípio da igualdade. III. Os direitos fundamentais de terceira dimensão ligam-se a direitos transindividuais, como o direito ao meio ambiente equilibrado, e podem ser tutelados coletivamente. IV. A respeito dos direitos de terceira geração, tem-se, como exemplos: o direito à liberdade, à igualdade, à fraternidade, à habitação e à previdência social. V. Ligados ao valor da igualdade, os direitos fundamentais de terceira dimensão são os direitos sociais, econômicos e culturais. Estão corretas somente as afirmativas: a) I,II e III. b) I, II, IV e V. c) I e III. d) II e V. e) III e IV. Resposta: Letra C. 9. A decisão do Supremo Tribunal Federal na ADPF 854 que determinou a suspensão da execução das chamadas “emendas de relator” interferem na autonomia do Congresso Nacional? Fundamente a partir do voto paradigmático proferido pela Ministra Relatora em sede cautelar. (Valor 2,0) Resposta: Analisando a ADPF 854, resta mais do que claro que a decisão da Ministra Relatora não representa interferência à autonomia do Congresso Nacional. Primeiramente, é necessário contextualizar a situação envolvendo esta ADPF. De acordo com a Ministra, o Congresso Nacional institucionalizou uma duplicidade de regimes de execução das emendas parlamentares. O primeiro, refere-se ao regime transparente próprio às emendas individuais e de bancada. O segundo é o sistema anônimo de execução das despesas decorrentes de emendas do relator. As emendas individuais e de bancada vinculam o autor da emenda ao beneficiário da despesa, “tornando claras e verificáveis a origem e a destinação do dinheiro gasto”. As emendas do relator, operam com base da ocultação dos efetivos requerentes da despesa, por meio da utilização da rubrica orçamentária única (RP 9), na qual todas as despesas previstas são atribuídas à pessoa do relator-geral do orçamento, que atua como figura interposta entre “parlamentares incógnitos”, conforme denunciado pelo requerente, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). O relator-geral do orçamento é apenas o autor da programação orçamentária formalmente. Enquantoisso, deputados e senadores autorizados por meio de acordos informais detêm o poder para decidir a destinação final dos valores. Portanto, a simples existência das emendas do relator violam os postulados constitucionais da publicidade e impessoalidade no âmbito dos poderes públicos, já que a autoria material dessa categoria de execução orçamentária não corresponde àquela declarada na peça formal. As emendas dos relatores também transgridem o princípio da transparência. No Direito Financeiro, todas as informações relativas a gastos públicos e a questões orçamentárias, sejam de que natureza forem, precisam ser claras, públicas e disponibilizadas à quem quiser analisá-las. De acordo com uma nota emitida pelo Centro de Estudos das Sociedades de Advogados, “exigir observância à Constituição Federal e à Lei de Responsabilidade Fiscal não pode ser visto como interferência de um Poder em outro”. Ainda de acordo com a Ministra Rosa Weber, resta incontestável que as emendas do relator afastam-se dos princípios republicanos. Contudo, conforme noticiado, esta prática foi validada institucionalmente, mesmo promovendo o segredo injustificado sobre os atos pertinentes à arrecadação de receitas, efetuação de despesas e destinação de recursos financeiros. Justificando mais uma vez, sua suspensão. O Supremo Tribunal Federal passou por uma grande evolução jurisprudencial no sentido de reconhecer possível, no âmbito dos processos de controle concentrado de constitucionalidade, especialmente na ADPF, o controle de práticas institucionais e comportamentos, ativos ou omissivos, atribuídos aos Poderes Públicos, quando os atos impugnados, transcendendo interesses meramente individuais, ostentam os atributos da generalidade, abstração e impessoalidade, justificando a intervenção judicial para a tutela de direitos fundamentais ou de interesses políticos e jurídicos socialmente relevantes. A ministra Rosa Weber, para concluir o teor de sua decisão, fundamenta que a Suprema Corte possibilitou o uso da ADPF como um instrumento de controle objetivo de práticas institucionais que atentem os preceitos constitucionais fundamentais. A impugnação, neste caso, não se dirige contra ato específico ou omissão estatal determinada, mas sim contra práticas institucionalizadas e omissões sistêmicas atribuídas ao Poder Executivo e ao Poder Legislativo. Por conseguinte, a partir da leitura completa da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 854 e da brilhante argumentação da Ministra Rosa Weber, ratifica-se o teor final da decisão - que por sua vez, não apresenta nenhum indício de intervenção na autonomia do Congresso Nacional, apenas cumpre o que outras jurisprudências da Suprema Corte já sinalizavam, podendo, por fim, afirmar que as emendas do relator representavam “violação do princípio republicano em face de comportamentos institucionais incompatíveis com os princípios da publicidade e da impessoalidade dos atos da Administração Pública e com o regime de transparência no uso dos recursos financeiros do Estado”. .
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