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A Primeira Guerra Mundial e o declínio da Europa Paz. 19522956. a óleo de Cand.00 Em 1952, a Organização das Nações Unidas (ONU) pediu a cada país que doasse uma obra de arte para expor em sua sede, na cidade de Nova York. O governo brasileiro encomendou ao artista plástico Candido Portinari a criaçào de uma obra que representasse o pais. Portinari produziu dois imensos painéis. de 14 metros de altura por 10 metros de largura. finalizados em 1956. Uma dessas obras recebeu o titulo de Guerra. e a outra. de Paz. Por sua beleza e importância, ficaram expostas permanentemente em lugar de destaque no edifício da ONU. Os painéis sugerem uma reflexão acerca dos sentimentos coletivos causados pelas duas Guerras Mundiais do século XX. Este capitulo vai apresentar a primeira delas. interpretações da Grande Guerra Como explicar a Grande Guerra? O que fez os países europeus deflagrarem um con- tlito que os levaria à ruina? Uma das explicações mais conhecidas, em 1916, é a do líder bolchevique russo Vladimir linin, que afirmava que a formação de grandes empresas monopolistas era o fundamento do imperialismo — a fase superior do capitalismo. O re- sultado, no entanto, era o surgimento de rivalidades entre os países capitalistas avançados. Na interpretação de Lénin, tratava-se de uma guerra entre nações imperialistas que disputavam as riquezas naturais das colónias na África e na Ásia. Essa explicação permitiu que, mais tarde, muitos historiadores reiterassem o caráter imperialista da guerra, ressaltando, em particular, as disputas entre Inglaterra e Alemanha pela re- distribuição das colónias africanas e asiáticas, como também do mercado mundial. Vários outros aspectos devem, no entanto, ser considerados. Por exemplo, a guerra se concentrou em território europeu e as batalhas em regiões coloniais ocorreram como consequência do que acontecia nesse continente. É necessário considerar também que, às vésperas da Grande Guerra, os conflitos pro- vocados por disputas coloniais não se apresentavam como insolúveis ou inegociáveis. Em outras palavras, para compreender o conflito, é necessário começar pela aná- lise da conjuntura política dos países europeus naquela época. Desde fins do século XIX, uma série de rivalidades politicas no continente eram alimentadas pelo clima de exacerbação nacionalista e pelo avanço do militarismo, sobretudo na Inglaterra, na Alemanha, na França e na Rússia. A Inglaterra foi o primeiro pais a se industrializar, dispondo de vasto mercado consumidor. Além de ser fornecedor de produtos industrializados para suas colónias, delas recebia boa parte das matérias-primas de que necessitava. Porém, no início do sé- culo XX, sem a reno- , tumpals&ter vação das máquinas e dos equipamentos de seu parque industrial, os ingleses sofriam a competição de outros países que também se industrializaram, como a forte concorrência das modernas indús- trias alemãs. Postal de propaganda alemâ de 1914. Soldados da ATemanha e da Áustria espancam os da Grà- -Bretanha. França e Rússia, enquanto o resto do mundo Observa. A investiu grandes sistetna educocional bast'\ntc tuuitas ingleses e aletnàes, A Rússia, coni fone presença de entre os gigantes c tinho res estrangeiros. Cenário tenso de c Na Vet. houvesse i" por investido. No inicio do século XX. tnuitas rivalidades tensOes entre os europeus. I lavia. por exetuplo. forte rivalidade entre c Coto guer• ra franco•prussiana (1870' 1871), os franceses os regióes da Alsácia•l.orena. ricas eni carvào, O episódio feriu gravenw•nte o orgulho francês, tornando questio de honra recuperar esses territórios. Com a ascensio da Aletnanh" à categoria de grande potênci" Oil'itali"ta, ten• soes aumentaralii ainda gnais. o que gerou desequilíbrio politico c econótnico no continente europeu. A partir da unificaç,io política, 1871, os "leniàes viveratn uni período de forte crescignento industrial, Paro proteger o coniércio exterior, Alemanha investiu em utna marinha tuercante e de guerra, tornando-se para os ingleses urn novo concorrente nio apenas industrial, tornbégn gnarititno. outras palavras, a Inglaterra era ameaçada em sua posiçào solitária de potência eco• nótnica no continente europeu. Esse crescitnento econótnico da Aletnanha provocou acentuada cotnpetiçáo com a Inglaterra e a França, ou seja, desequilibrou conjuntura política europeia, A tensio aunw•ntou quando os alenúes estabeleceratn utna aliança diplonút ica e mili- tar com o Itnpério Austro•l lúngaro, mas esses nio eratn os únicos focos de atrito no continente. O Itupério Austro.llúngaro, aliás, era Otn mosaico de nacionalidades que aspiravatn à autonotnia, Minorias étnicas cotuo tchecos. eslovacos, bósnios, sérvios, croatas e rognenos — que viviam sob o domínio da monarquia dos I labsburgos, lutavam por autonotnia, Os sérvios, por exemplo, identificavanvse coto os interesses nacionais e culturais dos russos, criando diferenças e antagonislnos cotn os austríacos. A Rússia, por sua vez, nutria grande ressentitnento em relaçào ao Itnpério Ototna. no pela derrota sofrida na Guerra da Critneia, etn 1856, sentimento que era recíproco. A exemplo dos impérios Russo e Austro-I lúngaro, o 'lilrco Ototnano tatnbérn abriga• va povos de várias línguas e religióes. Todo esse clima de cornpetiçào e rivalidade entre os países foi intensificado corn a expansio das ideologias nacionalistas. Em resumo, as rivalidades políticas e o cres- cimento dos nacionalismos na Europa tiveram peso decisivo na eclosào da chamada Grande Guerra. uplomacia de Bismarck e o colapso do equilíbrio europeu A partir de 1880, na Europa, diversos grupos organizados — em sintonia com a burguesia e os proprietários rurais — defendiam ideias fortemente nacionalistas. Esses movimentos ocorriam na Inglaterra, França, Alemanha e Itália, também nos impérios Russo e Turco Otomano, bem como em diversos lugares onde não se forma- ram Estados, como entre os sérvios. Recorrendo a discursos ufanistas e emocionais, essas organizações acreditavam que podiam mobilizar a população, desenvolvendo um sentimento de superioridade nacional. Assim, reforçando o patriotismo, as ideologias nacionalistas exaltavam as qualida- des do Estado-nação e a ideia de superioridade em relação aos demais povos. Ingleses e franceses, por exemplo, ressaltavam uma suposta capacidade civilizadora do mundo. Os alemães, por sua vez, sonhavam com uma "Grande Alemanha", apoiada no pangermanis- mo — ideologia que defendia a anexação dos povos germânicos espalhados pela Europa central, como holandeses, dinamarqueses (de língua alemã), austríacos, entre outros. Os russos acentuavam a importância da unificação dos povos eslavos, a exemplo de sérvios, eslovacos, poloneses, tchecos e vários outros. Era o pan-eslavismo russo, com o objetivo de unir os povos eslavos da Europa oriental e do Império Austro-Hún- garo. Mas havia também o pan-eslavismo sérvio, cuja missão era agrupar os eslavos do sul da Europa, a exemplo dos eslovacos, croatas, búlgaros, entre outros. Nas últimas décadas do século XIX, em meio a essas rivalidades, a paz foi garanti- da, em grande parte, pelo sistema diplomático alemão, criado pelo chanceler Otto von Bismarck. O objetivo era estabelecer uma ordem internacional favorável ao Império Alemão. Para tanto, Bismarck evitou confrontos com a Inglaterra e com a França. No primeiro caso, ele queria manter a neutralidade inglesa na Europa continental. NO segundo, as dificuldades eram maiores, pois os franceses alimentavam grande ressen- timento com a derrota na guerra franco-prussiana de 1870, o que exigia esforço do chanceler alemão para impedir o revanchismo francês. Além disso, a Alemanha formou um bloco de países aliados na Europa central, ao reaproximar-se do Império Austro-Húngaro e ao atrair o apoio da Itália. Bismarck também tentou se aproximar da Rússia, mas fracassou devido ao expan- sionismo russo nos territórios eslavos sob domínio austríaco — a Áustria era aliadada Alemanha. As relações entre alemães e russos se agravaram quando o chanceler tentou uma aproximação com o Império Otomano — antigo rival da Rússia. Bismarck conduziu a política externa alemã empenhado em construir um sistema em que uma possível revanche francesa fosse improvável. Após a unificação, o mo- mento era de consolidar a nova Alemanha e deter as ambições de quaisquer nações no continente europeu. O sistema de Bismarck ficou mais claro em 1879, quando a Alemanha firmou um pacto com a Áustria contra quaisquer agressões vindas do leste ou do oeste, ao qual a Itália aderiu em 1882. Assim, o Império Alemão, o Império Austro-Húngaro e a Itália formaram a Tríplice Aliança. Para não provocar ingleses e franceses, Bismarck renunciou a maiores ambiçócs coloniais na Conferência de Berlim, encerrada em 1885, e ainda atuou em prol do equilíbrio entre russos e turcos nos Bálcás. O sistema de Bismarck entrou em colapso, principalmente, pela política do impera- dor alemão Guilherme II, sobretudo após a renúncia do chanceler, em 1890. Negando a política de Bismarck, Guilherme II lançou a Alemanha em uma política de expansáo territorial ( Weltpolitik). A EUROPA DIVIDIDA 1914 Em 1894, França e Rússia firmas ram um acordo ("Entente") — uma Paises da Triplico Aliança e sous abados Países da Tríplice Entonte e seus abados Itália adere à querra. alia•so a Tripbco Entonte Países invadidos pot kustria-Hungna opas da Nemanha e Países neutros G. Adas tust«que mordial. J]. Atlas bászo. Sio Paulo: Ática. 1993: ísou. Syat.a. Paulo: Sarau 2009.) A paz armada Em uma fábrica de munições inglesa, operários enchem os cartuchos com estilhaços. veo aliança confirmada dois anos depois — que colocava a Alemanha entre duas potenciais frentes de batalha. Inglaterra e França também se apro- ximaram, ao superar as rivalidades na corrida colonial. Em 1907, esse entendimento deu origem á Tríplice Entente, acordo que incluía a Rússia, a França e a Inglaterra. Desse modo, a Grande Guerra teve origem na tensa conjuntura po- lítica que marcou a Europa desde o final do século XIX. A disputa pela hegemonia política tornou-se questão central entre as potências do continente, agravada pelas ideologias nacionalistas e pelo mi- litarismo. A Europa dividiu-se em dois blocos rivais, a Tríplice Aliança e a Tríplice Entente. Com a formação desses blocos, qualquer guerra envolveria um amplo conjunto de naçóes. Na primeira década do século XX, os países europeus passaram a investir cada vez mais nas Forças Armadas, o que se tornou uma maneira de mobilizar a população com ideais de civismo e patriotismo. Com isso, a indústria bélica passou a ser um setor bastante rentável para os empresários e gerador de muitos empregos. Mas é um engano supor que a Grande Guerra ocorreu principal. mente devido aos interesses dos produtores de armamentos. No iní- cio do século XX, a Europa vivia em paz, embora fosse uma paz armada. Às vésperas da guerra, 19 mi- lhóes de soldados estavam prontos para as batalhas na Europa. Quan- do o conflito começou, os próprios governantes ficaram surpresos com o entusiasmo que tomou con- ta das populaçóes, embriagadas por sentimentos patrióticos. 591 Gravura do suplemento ilustrado do periódico francês Le Petit Journal, que reconstitui o assassinato do príncipe austríaco rande Guerra: 1914-1918 O pretexto para a deflagração da guerra foi o assassinato do príncipe herdeiro do Império Austro-Húngaro, Francisco Ferdinando, e de sua esposa, na cidade de Sarajevcx capital da Bósnia, conw•tido por um nacionalista sérvio do grupo Mio Negra. em 28 de junho de 1914. Francisco Ferdinando, ao assumir o trono, pretendia transformar a monarquia dual (Áustria e Hungria) em monarquia tríplice, reconhecendo as popula- çóes eslavas como terceiro parceiro do império. Essa ideia contrariava os interesses dos sérvios, que tinham a pretensio de formar a Grande Sérvia independente. Mas em decorrência do assassinato do sucessor do trono, a monarquia austro-hún- gara fez uma série de exigências ao governo sérvio, incluindo o direito de dirigir e reali- zar as investigações sobre o crime dentro do próprio território da Sérvia. Se as condições fossem aceitas, a Sérvia estaria renunciando à sua soberania; se fossem recusadas, seria o motivo para a declaração de guerra. Como não foi atendida, a Áustria declarou guerra aos sérvios, em 28 de julho de 1914, dando inicio ao conflito. Não se tratou de um ato in- tempestivo. A guerra foi declarada um més após o assassinato de Francisco Ferdinando. Francisco Ferdinando (18631914). +1 ASSASSINAT DE L'ARCHIDUC HÉRITIER D'AUTRICHE ET DE DUCHESSE SA FEMME A SARAJEVO A Rússia logo se posicionou em defesa dos sérvios e mobilizou suas tropas. Alegando solidariedade aos aus- tríacos, a Alemanha declarou guerra à Rússia — em I C de agosto — e dois dias depois fez o mesmo contra a França. Assim, colocou em açáo o ambicioso Plano Schlieffen: derrotar rapidamente a França antes que a Rússia pudesse mobilizar suas tropas. Desse modo, os alemães evitariam lutar em duas frentes de batalha. Para alcançar o território francês, os exércitos alemães invadiram a Bélgica — pais que alegava neutralidade no conflito. A Inglaterra, por sua vez, visando manter o equi- líbrio na Europa e alegando a quebra da neutralidade belga, declarou guerra contra a Alemanha, honrando a Tríplice Entente. A Itália era integrante da Tríplice Aliança, mas seu compromisso era o de entrar na guerra apenas no caso de a Alemanha ser atacada. Além disso, o país alimen- tava rivalidades com a Áustria. Assim, a Itália só par- ticipou do conflito a partir de 1915, quando mudou de lado, seduzida por promessas britânicas de con- cessões territoriais da Alemanha na África. A guerra generalizou-se quando o Império Otomano declarou guerra aos russos, seus antigos inimigos, e aliou-se aos germânicos. Cada país beligerante contou com o apoio, por ve- zes entusiasmado, de suas sociedades. O nacionalismo exacerbado e as crenças de que o conflito era inevitável e seria curto mobilizaram amplos setores sociais. As trincheiras Soldados franceses. com máscaras contra gases. olham por sobre a trincheira antes de um ataque. As potências da 'l'ríplice Aliança tiveram de cotnbater em duas frentes: a ocidental e a oriental, No pritneiro caso, atacaram a França; no segundo, itnpediram o avanço dos russos. Inicialmente, na frente ocidental, as tropas alemãs avançaram até as proximidades de Paris, mas logo houve a reaçào do exército francês, apoiado pelos britânicos. Na pri- meira batalha de Marne, em setembro de 1914, os alemães recuaram. Logo se percebeu que o conflito náo seria curto nem rápido. No final daquele ano, uma realidade se impôs na frente ocidental: a guerra de trincheiras. Elas fo- ram cavadas ao longo de centenas de quilómetros, cortando o território europeu de norte a sul. Desse modo, os exércitos alemães e franceses não conse- guiam avançar, e assim permaneceram durante mais de três anos. Por mais que usassem o poder de fogo da ar- tilharia, nenhum dos lados conseguia ultrapas- sar as trincheiras inimigas, o que representou um dos maiores horrores da guerra. Sob sol e chuva, o bombardeio da artilharia era incessante. Milha- res de soldados passavam meses atirando contra os inimigos, enfiados na terra, junto com ratazanas e piolhos. A água e a comida eram racionadas. Muitas vezes sob ataque, eles não podiam retirar os cadáveres dos colegas e conviviam com os corpos em putrefaçáo. Para desespero dos soldados ingleses e franceses, o exército alemão passou a usar lança-chamas e armas químicas, como o gás mostarda, que provocavam graves quei• maduras. Os ingleses, por sua vez, inventaram o tanque de guerra. O aviáo foi usado pela primeira vez como arma bélica, mas o grande trunfo alemão foi o submarino. AO afundar navios mercantes, sobretudo os carregados com alimentos, causavam grande dano à população civil. A segunda grande ofensiva alemâ ocorreu na regiãodo Reno, em 1916. Embo- ra dispusessem de ampla superioridade militar, os alemães esbarraram na tenaz resistência francesa em Verdun. Comandados pelo general Pétain, que sempre di- zia "não passarão" em relação aos alemães, para manter o moral da tropa em alta, os franceses conseguiram deter o avanço germânico. Assim, Verdun tornou-se um símbolo de fracasso alemão, a ponto de ser incorporado ao vocabulário militar como sinónimo de derrota. Na frente oriental, os russos foram barrados pelas forças alemãs e austríacas. Ainda em 1915, com o recuo do exército do czar, a Rússia perdeu seus domínios na Polónia e na Lituánia, além dos fortes que protegiam os limites de seu império. Enquanto isso' os austríacos derrotavam os sérvios. Mas o impasse permaneceu nas duas frentes. O conflito era em terra, mas também acontecia no mar. Em 1915, Inglaterra e França declararam o bloqueio naval à Alemanha, impedindo que os alemães recebessem mercadorias por mar. Esse bloqueio tornou a situação crítica. No ano seguinte, a Alemanha revidou com seus submarinos, afundando qualquer navio que estivesse em águas britânicas. Praticamente um terço da frota inglesa foi afundada. Soldados alemàes descansam em uma trincheira em período de calmaria. Mudança de rumos A vitória tendia para o lado alemão, mas os acontecimentos começaram a mudar com a entrada dos Estados Unidos no conflito, em abril de 1917. Embora vendessem armas e ali- mentos à Inglaterra e à França, os norte-americanos se mantiveram neutros por três anos. A imprensa, no entanto, divulgou campanha contra a Alemanha em diversas ocasiões. Havia afinidade política e cultural dos Estados Unidos com a Inglaterra, além dos interesses económicos em curso. Mesmo assim, o governo norte-americano entrou na guerra apenas quando a situação pareceu desfavorável aos seus aliados. Meses depois ocorreu nova reviravolta na guerra, beneficiando a Alemanha. Em ou- tubro de 1917, eclodiu uma revolução na Rússia. O novo governo, de orientação socialista — acatando a vontade da população —, retirou o país da guerra em dezembro daquele ano. O custo dessa decisão, no entanto, foi grande: o governo russo teve de ceder vários territórios para a Alemanha. Com a saída da Rússia do conflito, o exército alemão se livrou da frente leste que combatia na guerra e pôde concentrar suas forças na frente ocidental. Mas a participação dos Estados Unidos no conflito favoreceu a Inglaterra e a Fran- ça. O conflito tornou-se mundial. A Itália, desde 1915, entrara no conflito ao lado de ingleses e franceses. Com esses países também estavam Japão, Portugal, Roménia, Grécia, China, Brasil, entre outros. A Alemanha e a Áustria, além do apoio do Impé- rio Otomano, tiveram a Bulgária como aliada. Ao longo de 1917, as sociedades europeias envolvidas no conflito estavam cansa- das, e os soldados, exaustos pelos esforços de três anos em lutas incessantes. O blo- queio naval franco-inglés e a guerra submarina alemã levaram a fome aos países. O custo de vida disparou, os salários não aumentaram e as mercadorias sumiram das prateleiras. Começaram os protestos nas cidades e os motins entre os militares. Um amplo movimento pacifista surgiu exigindo o fim da guerra. No verão de 1918, ocorreu a últilna grande ofensiva aleniá contra a re. sultando em fracasso. A partir de junho, alernáes e austríacos passaranj a sucessivas derrotas. Nesse ano, cerca de Inil hojnens atacaram c derrotara'/) Iro. pas da Alemanha, da Áustria e da Bulgária alojadas na Sérvia. O fato desestabilizou o Império Austro-Húngaro, levando à instauração da República, Embora o exército alemão tentasse uma contraofensiva para alcançar Pari", aca. bou rechaçado, sem ter condiçóes de lutara Enquanto na Alcgnanha a co. nhecia a fome, Inglaterra e França recebiarn ajuda material e niilitar dos Uni, dos. Diante da derrota iminente, o novo governo alejnáo assinou o arnii%tício, condições, em II de novenlbro de 1918. Nesse contexto, o governo não pertencia luais ao irnperador Guilherjne II, que então, a República de Weimar. A uerra acabou, o mundo mudou Ainda durante a guerra, no início de 1918, o presidente norte-americano Woodrow Wilson apresentou um plano — "os 14 pontos de Wilson" — para terminar o conflito mundial. Entre esses pontos estavam: abolição da diplomacia secreta, tornando-a de conhecimento público; liberdade de navegação e fim das barreiras económicas entre as nações; limitação dos arsenais armamentísticos; redefinição dos limites territoriais italianos; reformulação das práticas colonialistas, levando em consideração os interesses dos povos colonizados; independência da Bélgica e da Polônia; restauração da Sérvia, Montenegro e Romênia; devolução da Alsácia- -Lorena à França; autonomia dos povos submetidos ao Império Turco Otomano; ajuda à Rússia; e, por fim, criação da Liga das Nações. A proposta era baseada na justiça entre os povos, sem vencidos nem vencedores. Embora atendesse a diversos interesses, os governos da França e da Inglaterra, com seguidas vitórias militares sobre os alemães, não apoiaram esse plano. Interessava aos vitoriosos condenar pesadamente a Alemanha, como de fato foi feito. Em 19 de janeiro de 1919, diplomatas de diversos países — entre vencedores e vencidos — encontraram-se na Conferência de Paris, com o objetivo de chegar a um acordo que resultasse no desarmamento alemão e na reparação das perdas materiais, O resultado foi o Tratado de Versalhes, conhecido entre os alemães como Ditado de Versalhes, por ser impositivo e humilhante. As imposições foram fundamentadas na "cláusula de culpa de guerra", estabelecida pelas potências vitoriosas. De acordo com esse tratado, a Alemanha cedeu à França a Alsácia-Lorena e as mi- nas de carvão da bacia do Sarre. Cedeu também parte de seu território para a Bélgica' a Dinamarca, a Lituânia e a Polônia. Uma faixa de terra em território alemão permit iu à Polónia uma saída para o mar — o "corredor polonês", mas à custa da separação da Alemanha de sua província oriental, a Pomerânia. Todas as colónias alemãs foram transferidas para domínio francês e inglês. Soldados norte-americanos na França comemoram o Sm da guerra, em novembro B?.lppço final Além das perdas territoriais, a Alemanha devia pagar aos vencedores pesadas inde- nizaçóes e teve todos os seus investimentos no exterior confiscados. O país perdeu dois quintos de suas minas de carvão, dois terços das minas de ferro e um sexto das terras cultiváveis. As imposições do Tratado incluíam também a redução do exército alemão ao máximo de 100 mil homens e a proibição de produzir canhões, aviões militares e artilharia antiaérea. Os submarinos e os navios mercantes e de guerra foram entregues à Inglaterra, à França e à Bélgica, bem como um oitavo de todo o gado bovino. Mas não só a Alemanha pagou a conta da guerra. A "cláusula de culpa" atingiu também o Império Austro-Húngaro. Pelo Tratado de Saint-Germain, assinado em setembro de 1919, o Império deixou de existir. De seu desmembramento surgiram a Áustria, a Hungria, a Tche- coslováquia e a lugoslávia. Pelo mesmo tratado, a Polónia recuperou sua independência. O Império Otomano também desmoronou: perdeu sua parte asiática, dando ori- gem a Iraque, Síria, Libano, Palestina e Transjordánia. Os territórios turcos na região balcânica foram entregues à Grécia. A região dos estreitos (de Bósforo e de Dardane- 10s) foi considerada neutra e navegável por todos os países. O antigo Império Otoma- no ficou reduzido à Turquia, com sede em Constantinopla (atual Istambul). Com o objetivo de garantir a paz e resolver os con- flitos entre os países por meio de negociações e arbitra- mentos, foi fundada a Sociedade ou Liga das Nações, com sede em Genebra. A iniciativa foi do presidente norte-americano Woodrow Wilson, mas os Estados Unidos não aderiram quando essa sociedade foi fun- dada, em abril de 1919. O Congresso norte-americano ratificou o Tratado de Versalhes, mas não aprovou a entrada do país na Liga, optando peloisolamento in- ternacional. A Sociedade conseguiu evitar conflitos armados, auxiliar refugiados, dentre outras situações de con- flito. Mas não teve como evitar guerras expansionis- tas não declaradas, como a invasão da Manchúria pelo Japão, em 1931, ou a tomada da Abissínia pela Itália, em 1935. As consequências da Grande Guerra foram trágicas para as sociedades europeias. Calcula-se que o número de alemães mortos teria ultrapassado 1 milhão, enquanto a França teria perdido cerca de I milhão e 500 mil homens, a maioria jovens com menos de 25 anos de idade. Cerca de IO milhões de pessoas morreram no conflito, entre mili- tares e civis. Milhões de mulheres tornaram-se viúvas, com filhos para criar. Os países europeus envolvidos no conflito, sobretudo a Alemanha, saíram da guerra arruinados. A partir de então, os países da Europa conheceram certo declínio económico. A In- glaterra, apesar de seu extenso e rico império colonial, perdeu um pouco da posição de grande potência mundial. Já os Estados Unidos, que se industrializavam a passos lar- gos desde fins do século XIX, aceleraram sua ascensão económica. Entrando na guerra somente em 1917, lucraram muito com o conflito, vendendo mercadorias e fornecen_ do empréstimos para os países envolvidos, principalmente os da Tríplice Entente. Outra importante consequência da guerra em boa parte da Europa foi o desgaste dos ideais liberais como caminho para a prosperidade das naçóes. A democracia libe- ral passou a sofrer fortes críticas e, a partir da década de 1920, ganharam prestígio as ideologias autoritárias de direita e de esquerda. Como resultado, as décadas seguintes seriam marcadas pelo confronto aberto entre partidos nacionalistas radicais e partidos comunistas vinculados à orientação soviética. Depois da Primeira Guerra Mundial, as democracias liberais ficaram desa- creditadas e, em alguns casos, condenadas, como na Itália e na Alemanha. Mas esse é um assunto para os próximos capítulos. ARRUtA LJ. Adas Estúro bá%C. Pauh kca. 19» CADNV.eiSOCkLAtsas Sv»u. Pú Suva. 2009.) (Fonte: BERSTJN. ser•w Berre (dgeçào). hstóru XX 1900-1945. o anoa'. Pub'. França Reino Unido Itália Estados Unidos Alemanha Áustna•Hungria A EUROPA Após A PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL 1921 _ OLAC\AC A/V/CO ntPt.,'0UCAS SOCIALIS ALANTICO A.B.A'? n»u.'tA pais PERDAS MILITARES DOS PAÍSES BELIGERANTES População masculina ativa 13.350 14.570 12.130 32.320 20.430 16.230 (em milhares) Mortos e desaparecidos Em % da população Número ativa 1.400 744 750 68 2.000 1.543 10,5 5,1 6,2 0.2 9,8 9.5 O Brasil e a Grande Guerra Protesto contra torpedeamento de navios brasileiros, em abril de 1917. O Brasil sofreu as consequências pela Grande Guerra europeia, embora o presidente Hermes da Fonseca tenha declarado a neutralidade do Brasil no conflito. Adotou, entre outras rnedidas, a proibição de que navios de guerra entrassem nos portos brasileiros e a convocação de brasileiros para lutar na Europa. Com a declaração de neutralidade, a Alemanha não poderia atacar navios mercantes brasileiros que levavam café para Inglaterra e França. Apesar disso, as exportações brasileiras de café caíram sensivelmente quando a Alemanha impôs o bloqueio marítimo a esses dois países. Os cafeicultores brasileiros sofreram grandes prejuízos. O governo também foi prejudicado com a queda na arrecadação, já que o principal imposto incidia sobre as exportações. Como alternativa para reduzir o prejuízo, o governo aumentou os impostos pagos pela população. Também devido à guerra, o Brasil ficou impossibilitado de importar produtos industrializados da Europa. Então, o governo passou a apoiar indústrias que produzissem bens para substituir as importações. Os benefícios incluíam tarifas protecionistas e subsídios. Assim, a produção industrial brasileira aumentou nos setores têxtil, de papel, de borracha, de cimento e de máquinas elétricas. Apesar da neutralidade brasileira, em fevereiro de 1917, o comando de guerra alemão decidiu aumentar o bloqueio naval à Inglaterra e passou a atacar inclusive os navios de países neutros. Mesmo com o protesto do governo brasileiro, um submarino alemão torpedeou o cargueiro Paraná, carregado com 4,5 toneladas de café, em 5 de abril desse ano. Depois que o navio afundou, o submarino ainda disparou tiros de canhão contra os marinheiros sobreviventes. Nesse contexto, no dia 11 de abril, o Brasil, acompanhando os Estados Unidos, rompeu relações diplomáticas com a Alemanha. Em maio, dois outros navios brasileiros foram atacados, mas o governo manteve a postura de neutralidade. Porém, nas ruas surgiram movimentos de protesto, exigindo uma reação do governo. Então, o presidente Wenceslau Brás suspendeu a neutralidade do Brasil na guerra, autorizando que navios dos países que combatiam a Alemanha atracassem em portos brasileiros. Em 26 de outubro de 1917, o governo brasileiro declarou guerra à Alemanha. A iniciativa mais importante foi a criação da Divisão Naval em Operações de Guerra (DNOG), formada por dois cruzadores leves e quatro contratorpedeiros, com o total de 1.502 homens, com a missão de patrulhar o circuito entre São Vicente, Dacar (no Senegal, África) e o estreito de Gibraltar. A pequena frota partiu em 16 de julho de 1918 para Dacar, mas a missão foi prejudicada por problemas mecânicos nos navios e pela gripe espanhola. De Dacar, a frota foi para Gibraltar, mas quando chegou a guerra já tinha acabado.