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LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS Francisco Edviges Albuquerque & Josué Luz (Orgs.) Comitê Científico Alexandre Melo de Sousa (UFAC) João Henrique Suanno (UEG) Márcia Verônica Ramos de Macedo (UFAC ) Marcilene Araújo - Professora – ( UNIRG) Maria da Glória de Castro Azevedo - (UFT) Marilza Vanessa Rosa Suanno (UFG) Rosineide Magalhães de Sousa(UNB) Selmo Azevedo Apontes (UFAC) Severina Alves de Almeida (FACIT) Sinval Sousa Filho (UFG) Viviane Cristina Oliveira (UFT) Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Tuxped Serviços Editoriais (São Paulo - SP) ______________________________________________________________________ A345l Albuquerque, Francisco Edviges (org.). Literatura Nativa: contos e poesias / Organizadores: Francisco Edviges Albuquerque e Josué da Silva Luz; Prefácio de Daniel Munduruku.– 1. ed.– Campinas, SP : Pontes Editores, 2020. 174 p.; 20x28 cm. Inclui bibliografia. ISBN: 978-65-5637-067-5 1. Línguas Indígenas. 2. Literatura Brasileira. 3. Povos Indígenas. I. Título. II. Assunto. III. Albuquerque, Francisco Edviges. IV. Luz, Josué da Silva. ______________________________________________________________________ Bibliotecário Pedro Anizio Gomes CRB-8/8846 Índices para catálogo sistemático: 1. Grupos sociais: Povos indígenas. 306.089 2. Literatura Brasileira: poesia. B869.91 3. Literatura Brasileira: conto. B869.93 Copyright © 2020 - Dos organizadores representantes dos colaboradores Coordenação Editorial: Pontes Editores Editoração e Capa: Wagner Pires Revisão: Francisco Edviges Albuquerque e Josué Luz Conselho Editorial: Angela B. Kleiman (Unicamp – Campinas) Clarissa Menezes Jordão (UFPR – Curitiba) Edleise Mendes (UFBA – Salvador) Eliana Merlin Deganutti de Barros (UENP – Universidade Estadual do Norte do Paraná) Eni Puccinelli Orlandi (Unicamp – Campinas) Glaís Sales Cordeiro (Université de Genève - Suisse) José Carlos Paes de Almeida Filho (UnB – Brasília) Maria Luisa Ortiz Alvarez (UnB – Brasília) Rogério Tilio (UFRJ – Rio de Janeiro) Suzete Silva (UEL – Londrina) Vera Lúcia Menezes de Oliveira e Paiva (UFMG – Belo Horizonte) PONTES EDITORES Rua Francisco Otaviano, 789 - Jd. Chapadão Campinas - SP - 13070-056 Fone 19 3252.6011 ponteseditores@ponteseditores.com.br www.ponteseditores.com.br 2020 - Impresso no Brasil 5LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS SUMÁRIO PREFÁCIO ....................................................................................... 7 APRESENTAÇÃO ........................................................................... 9 AKROÁ GAMELLA ...................................................................... 11 SEGREDOS DO RIO GRANDE ............................................ 13 NARRATIVA DE BILIBEU.................................................... 15 APINAYÉ ....................................................................................... 17 A RAPOSA E O SABIÁ ......................................................... 19 A SUCURI ............................................................................... 20 O MACACO E A ONÇA......................................................... 21 A CANTIGA............................................................................ 22 O VEADO-MATEIRO E A ONÇA ......................................... 23 A TERRA FURADA ............................................................... 24 O GAROTO QUE SE APAIXONOU PELA PRÓPRIA IRMÃ ....... 25 TERRA FURADA ................................................................... 27 O MACACO E O JABUTI ..................................................... 28 O GAVIÃO BRANCO ........................................................... 29 O SOL E A LUA ...................................................................... 30 OS PERIQUITOS .................................................................... 32 O LAGARTO .......................................................................... 33 A MULHER E A ANTA .......................................................... 34 A COBRA ............................................................................... 35 A ONÇA E O MACACO ....................................................... 36 O JACARÉ .............................................................................. 37 O CASAMENTO DO INDÍGENA APINAYÉ COM A ESTRELA ... 38 O ESPÍRITO CEGO ................................................................ 40 O TEXWARE .......................................................................... 41 O MACACO QUE VIROU FOLHA ....................................... 42 A ALMA CHEIA DE FERIDAS ............................................. 43 GUARANI ...................................................................................... 45 HISTÓRIA DE PIRAGUI ...................................................... 47 A INDIA VOADORA.............................................................. 49 POR QUE IARA VIROU UMA SEREIA? ............................. 53 JAXY JATERE ........................................................................ 55 JAVAÉ ............................................................................................. 57 O MENINO ............................................................................. 59 A ONÇA, O VEADO E A CAPIVARA ................................... 61 O GUERREIRO SANAWÊ .................................................... 62 O HANATXIWE .................................................................... 63 KARAJÁ ......................................................................................... 65 O ARUANÃ ............................................................................ 67 O URUBU ............................................................................... 68 A RAPOSA E O SABIÁ ......................................................... 69 O URUBU E DO GAVIÃO ..................................................... 70 KARAJÁ-XAMBIOÁ .................................................................... 71 A LENDA DO AÇAÍ ............................................................... 73 HOMEM QUE VIROU BOTO ............................................... 74 O JABUTI E A ANTA ............................................................. 75 A ONÇA E O MUTUM........................................................... 76 A TARTARUGA E A GAIVOTA ............................................ 77 KRAHÔ .......................................................................................... 79 CUKÔJ MẼ CAPRÂN ............................................................ 81 A ONÇA E O MENINO .......................................................... 82 HITÔHKRERE ....................................................................... 83 A MULHER ESTRELA .......................................................... 88 O CASAMENTO DO SAPO COM O VEADO MATEIRO ... 90 6 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O JABUTI E A MUCURA ...................................................... 91 O VEADO MATEIRO ............................................................ 93 O GUERREIRO TYRKRẼ .................................................... 94 O SAPO ................................................................................... 96 AWXÊT PYRYRE .................................................................. 97 A ONÇA E DO MACACO .................................................... 98 O JABUTI, A ONÇA E A MUCURA.................................... 99 O PASSARINHO, A RAPOSA E O URUBU ....................... 101 TYRKRẼ E A ESPOSA ........................................................ 102 A COBRA .............................................................................. 103 O GUERREIRO ................................................................... 104 O RAPAZ E A SUCURI........................................................ 105 O MACACO E A GALINHA ................................................ 106 O MACACO, O JABUTI E A ONÇA ................................... 107 O MACACO E A GUARIBA ............................................... 109 O RAPAZ E A SUCURI ....................................................... 110 O SOL E LUA ...................................................................... 111 A ONÇA E O VEADO ......................................................... 113 XERENTE .................................................................................... 115 O MACACO.......................................................................... 117 A ONÇA E O VEADO .......................................................... 118 O HOMEM QUE FOI CAÇAR NO MATO ........................ 120 A MORTE ............................................................................. 121 O SOL .................................................................................... 122 A ORIGEM DO TAMANDUÁ-BANDEIRA DO BRASIL . 123 A ESTRELA O JOVEM SIPSA ........................................... 124 POESIAS ...................................................................................... 125 AKROÁ GAMELLA .................................................................... 127 A LAGOA FEIA .................................................................... 129 GUARANI .................................................................................... 131 AMAZÔNIA É MAIS QUE TUDO ...................................... 133 KARAJÁ ....................................................................................... 135 MÃE TERRA ........................................................................ 137 MENINA DA ALDEIA ......................................................... 138 FESTA NA ALDEIA ............................................................. 139 HETOHOKÃ ......................................................................... 140 KRAHÔ ........................................................................................ 141 AMOR ................................................................................... 143 MINHA CULTURA .............................................................. 144 POESIA POR AMOR ............................................................ 145 A NATUREZA ...................................................................... 146 ALDEIA CAPITÃO DE CAMPO ........................................ 147 O AMOR ............................................................................... 148 O QUATI ............................................................................... 149 ESTUDO ............................................................................... 150 GUARIBA ............................................................................. 151 MACACO ............................................................................. 152 ESTUDAR............................................................................. 153 KRAHÔ KANELA DO ARAGUAIA .......................................... 155 SER INDÍGENA ................................................................... 157 A LUTA ................................................................................. 159 ORGULHO DE SER INDÍGENA ........................................ 161 SER PERSISTENTE ............................................................. 162 A NATUREZA ...................................................................... 163 OS ANIMAIS ........................................................................ 164 ORGULHO DE SER INDÍGENA ........................................ 165 O DIREITO AO TERRITÓRIO ............................................ 167 A TERRA............................................................................... 168 XERENTE .................................................................................... 171 SER INDÍGENA ................................................................... 173 REFERÊNCIAS ............................................................................ 174 7LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS PREFÁCIO O mundo todo nasceu de diferentes versões de histórias contadas em noites ancestrais. Cada povo vai teimando em construir sua narrativa a fim de poder justificar seu modo de compreender o mundo. As histórias narradas nascem de histórias vividas ou inventadas. Com o passar do tempo já não se sabe se foram inventadas porque vividas ou se foram vividas porque inventadas. Não faz diferença. As histórias são vozes ressonantes que ecoam a partir do desejo de confessar mistérios; mistérios nascem do medo, da incom- preensão dos fenômenos, da necessidade de justificar a existência. Cada povo constrói sua versão da existência. Daí são tantas as narrativas de origem; tantas histórias de encontros e desencontros; tantas tragédias narradas; tantos mistérios nelas envoltos. A vida não é simples. As histórias servem para torna-la mais leve, mais doce, mais fácil. Servem para nos lembrar quem somos, de onde viemos e como deve ser nosso proceder no mundo. Elas dão base para nosso estar no mundo e tirar o máximo proveito da experiência de estar vivos. Sem histórias a vida fica rude, dura, difícil, cruel. Elas trazem à tona o simbólico e humano que há em cada pessoa. Penso que uma história narrada traz consigo o som da oralidade: o tom do narrador, os gestos que faz ao colocar palavras em seus personagens, os grunhidos e ono- matopeias sugeridas revelam a interação de quem narra com o acontecimento narrado. Quando se transforma a narrativa oral para a escrita perde-se esses detalhes. Ainda assim, o texto escrito pode reverberar no leitor a intencionalidade de quem escreve. Esta magia é que transforma o escrito em literatura: o leitor, transportado para o mundo imaginado pelo escritor, consegue sentir em seu peito e coração, os acontecimentos narrados. Nessa hora nascem os suspiros, as lágrimas, os soluços, o impacto e, consequentemente, o espanto da aprendizagem. As histórias aqui apresentadas podem nos ensinar muito da vida do seu narra- dor e de seu povo. Pode nos dizer como se ensina e como se aprende; como se relaciona com a natureza e como compreende os seres não humanos; podem nos remeter às origens ou podem nos forçar a fazer uma releitura dos dias atuais e de nossa (in)compreensão secular sobre a vida, a cultura e a espiritualidade dessa gente ancestral. É bom que assim seja. É bom que ela se revele aos leitores em conta-gotas, dropes, à granel. Cada uma dessas his- tórias vai apresentar detalhes que apenas olhares atentos vão conseguir redimensionar e 8 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS compreender em sua inteireza. As narrativas irão se apresentar de forma simples, mas sua compreensão nem sempre é fácil. Repito: é preciso mergulhar nas especificidades de cada narrador e seu per- tencimento à história narrada (hoje dir-se-ia “lugar de fala” do narrador). É o mínimo que se espera de quem lê. Por fim quero dizer que neste livro está presente uma diversidade de visões de mundo. Histórias narradas por um Karajá ou Krahô podem ter significações diferentes para um Guarani ou Javaé. Essa diversidade está inscrita no modo mesmo de como cada povo se organiza socialmente ou como “captura” o seu olhar (ou cosmovisão) do mundo. Daí ser um exercício de desprendimento por parte do leitor. Insisto: é preciso sair do pensar quadrado para garantir minimamente a experiência da conexão com o ser circular do outro. Não é fácil, mas também não é impossível. Desejo a todos e todas boa leitura, bom mergulho e boa experiência no univer- so dos povos retratados nessa importante obra que agora chega às suas mãos. Daniel Munduruku 9LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS APRESENTAÇÃO Primeiramente agradeço ao convite feito pelo Professor Francisco Edviges Al- buquerque,coordenador do laboratório de línguas indígenas as UFT, vice- coordenador do Programa de Pós-Graduação em Letras Ensino de Língua e Literatura-PPGL. Sou um escritor de literatura nativa onde comecei escrever em 1984, e foi uma época em que não se via livros publicados por escritores indígenas, onde o apoio era algo muito difícil, mas com o passar do tempo, as coisas foram mudando e começou o surgimen- to de vários escritores com livros publicados e isso é algo muito importante porque por meio da literatura nativa, as pessoas poderão entender melhor como é o pensamento de um povo de língua e cultura diferentes que, aliás, este livro contêm histórias de vários povos, com pensamentos diferentes e, por isso, a importância dele, que irá contribuir para que as pessoas entendam que a literatura nativa tem seu valor e reconhecimento mundial, por isso, este tão importante livro irá conscientizar as pessoas para entenderem a lei 11.645, uma vez que não adiante entender da lei se não entender o povo e a cultura, pois é preciso entender as diferenças de um povo, como se vive, como se pensa. Por isso, falar desse livro, inclusive onde tem trabalhos meus, também me or- gulha muito, porque sei que este livro poderá ajudar muito as pessoas que gostam de fazer antropologia e, através dele, ajudará muito em suas pesquisas. Às vezes, para muitos, ler um trabalho de um indígena é assustador, porque as pessoas sempre tiveram aquela visão de que o índio é um contador de história. Isso sim sempre fomos, mas hoje temos escolas nas aldeias e, por isso, começou uma nova era e, com isso, muitos contadores de histórias aprenderam ler, o que nada impedem deles escre- verem, por isso é preciso ver que a escrita é importante para nós como uma grande arma de defesa, onde podemos registrar nossas histórias, para que elas não morram. Por isso, a cada escritor de literatura nativa que faz parte desse livro ficará na história, porque tenho certeza de que o livro ficará nas mãos de muitas pessoas que irão ler e falarão um pouco de cada uma. Mas temos que estar preparados também, porque muitos irão criticar, é que muitos no Brasil não estão acostumados a ver um índio escritor e poderá dizer que você está perdendo a cultura, mas, é ao contrário, é uma forma de defesa, usando a escrita. E aos leitores que lerem esse livro, tenho certeza de que irá se orgulhar, porque 10 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS só de ler os textos para que eu fizesse essa apresentação, já fiquei emocionado e, assim, imagino que cada um irá ficar também. Por isso que sempre digo que nossa história tem muito a contribuir também. Portanto, é preciso parar de ter esse preconceito contra nossos povos indígenas, e a leitura desse livro irá contribuir bastante, sei que o preconceito é algo difícil de acabar, mas tenho certeza de que pode minimizar; é nisso que acredito, por meio da leitura, por isso, esse livro tem essa missão de ajudar a diminuir o preconceito. E ao mesmo tempo, quero dizer que é importante o livro chegar às escolas indígenas também, porque a leitura pode ajudar muitos outros jovens nas aldeias a desco- brirem seu talento para escrita, pois hoje vivemos uma época diferente e, como há escolas nas aldeias, é importante que surja mais escritores publicando livros. Aliás, nas aldeias sempre chegam livros enviados pelas secretarias de educação, mas são livros de histórias não indígenas e acredito que os livros que chegam às aldeias seriam melhor se fossem de autores indígenas, onde a criança poderá entender melhor e valorizar seu povo. Sei que existem muitos livros de autores famosos belíssimo, mas porque não o de um indígena? Por isso, acredito que com o passar do tempo, teremos mais indígenas de várias aldeias do Brasil publicando seus livros, tanto na poesia, no romance, no conto e outros gê- neros. Por isso temos que valorizar nossas escolas nas aldeias e ficar atento, descobrirmos nossos jovens talentos escritores e ajudar para que eles não percam seus dons maravi- lhosos de escrever. Portanto, sempre gosto de falar que quanto mais escritores indígenas surgirem, melhor será para nossas nações no Brasil. Olivio Jekupe Escritor de Literatura Nativa e Poeta 11LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS AKROÁ GAMELLA 13LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS Segredos do Rio Grande Eu cresci pescando com minha vó Lili. A gente saia de casa no máximo 5h da tarde e era difícil um dia que não chovia. Quando a gente chegava ela fazia logo o pesqueiro grande, armava uma bandinha de casa e cobria com um plástico que ela levava num cofo grande junto com a lamparina, as capas para nos protege da chuva e o lençol. Quando ela ouvia trovejar lá no fundo ela perguntava pra Inês, nossa companheira de pescaria: “tu já te ajeitou (?) aqui já tem uma incurijada”. Ai ela estendia o lençol e eu me deitava. Ela tinha um jeito de me botar perto dela. Se ela ficava cansada ou não pegava nada ela dizia: “João Piraí, eu quero peixe para mim e pra minhas companheiras comer; eu já peguei uma chuva danada e não levar o que comer amanhã vai ficar ruim. Olha, eu vou deixar um punhado de fumo pra ti aqui na estaca de pau; eu não deixo fosforo porque eu não fumo, apenas mas- co”. Sempre ela dizia isso. Depois dependia da ligeireza das mãos para encher o cofo. Mas a gente a gente só garrava peixe o suficiente para comer e ela ainda dizia: a gente não garra os miudinhos, agarra só os grandes, porque quando a gente voltar de novo os miudinhos já cresceram porque se a gente os grandes e os miúdos quando a gente voltar não tem mais” Quando eles não queriam dar peixe parecia um banhador, o bicho fazia xua- -xua-xua pra espantar o peixe, ai pronto podia esquecer que não garrava peixe mesmo. No Rio Grande tem também o pução da Sibirina e o pução da Mãe d’Água. E ai ela dizia que a Sibirina era a protetora dos peixes. E o pução da Mãe d’Água tem a Mãe d’Água que cuida deles lá. E só panhava peixe quem eles queriam quem eles não queriam não panhava. Um dia a gente foi pescar no rio grande. A ponta de mato atrás do Severo era grande, tinha umas mangueiras grandes. Antes do rio tinha um goiabal. Quando chegamos depois do goiabal se formou um tempo de chuva. Ela disse será hoje o dia? Inês, sua com- panheira, disse não vai chover. Minha vó disse que era pra gente esperar a chuva passar, mas decidimos seguir pro rio . e de certo choveu. Essa noite pegamos muito muito peixe. Quando nós voltamos já tava tarde da noite. Já era a segunda chuva,. No caminho a gente começou ouvir um choro de criança, mas tinha ao mesmo tempo uma voz grossa de adulto. Minha vó sentiu que era a voz de alguém que já tinha feito a passagem deste mundo. Bem na forquilha do caminho, debaixo de uma mangueira grande que tinha as raízes pra fora que atravessavam o caminho tinha uma mulher com um criança nos braços que chorava e a mulher batia nas costas dela e mandava ela calar a boca. 14 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS Nós paramos longe e ficamos observando. Ficamos lá um bom tempo, mas não tinha jeito a gente tinha que passar, então minha vó colocou o cofo no chão retirou uma bola de fumo do cabelo, ofereceu à mulher e pediu licença pra gene passar pra casa. Quem era, tirou as per- nas que estavam atravessando o caminho, virou as costas para o caminho e nós passamos. Eu vi muitas vezes, enquanto a gente tava na beira do rio Grande, eles soprar no ouvido da gente pra derrubar a gente dentro d agua. Minha vó conversava com Eles. Pedia peixe pra comer na roça ou na quebra do coco no dia seguinte e eles davam peixe. Aqui sempre teve esses segredos. Texto: Pj’cre Akroá Gamella 15LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS Narrativa de Bilibeu Bilibeu? – Bilibeu é um santo vivo e é por isso que todo ano a gente faz festa pra ele há muitas gerações. Os nossos mais velhos contam que a pequena imagem de Bilico foi encontrada no meio de um roçado, um dia depois do fogo, em uma moita de mato que o fogo não queimou.Só ficou aquela moita sem pegar fogo. Tempos depois começaram o festejo. Ele protege os animais da casa – galinha, patos, porcos e até boi. Se algum deles fica doente ou some a gente recorre a ele pra resolver o problema e não deixar faltar comida em casa. Mas ele também pode resolver problema nos seios das mulheres. A festa de Bilibeu é assim: três dias antes a gente vai ao mato cortar uma arvo- re que é trazida pro terreiro onde acontece a festa; esse mastro é enfeitado com murteiras e com frutas. No dia grande do Ritual, de manha bem cedo os homens jovens das aldeias se pintam com tisna de debaixo do forno de fazer farinha, tinta de jenipapo e tinta de urucum. Da casa de forno, já pintados, os cachorros seguem em direção ao mastro, sob o comando da onça seguida pelo maracajá e o cachorro mestre, onde recebem seus nomes dados por um ancião. Nomes como carrité, três nós, pomba pelada…fazem desse um momento de muitas risadas, depois é servida a comida dos cachorros sobre folhas de bananeiras. A partir desse momento inicia a parte mais puxada. Os bichos acompanhados por homens e mulheres passam a visitar as casas das aldeias onde foram prometidas caças a Bilibeu; ao chegar dão volta em torno da casa até o momento em que o dono pega a caça e joga pra cima, se for galinha ou pato ou solta no terreiro se for porco ou boi nesse instante começa uma luta entre os cachorros pra pegar e matá-la. A cabeça da caça (no caso de galinhas e patos) se torna um troféu que o cachorro carrega no pescoço ou na boca. Depois de morta a caça é entregue a onça que luta pra esca- par dos cachorros, subindo na árvore mais próxima que encontrar, mas sempre os caçadores conseguem tomar a caça. Enquanto acontece a caçada os cachorros aproveitam pra realizar lutas cor- porais que começa entre dois e pode terminar envolvendo muitos. Às vezes pode ter uma combinação de vários cachorros para derrubar um que se apresenta mais forte. Ao mesmo tempo o cachorro-mestre com sua corda com um nó em cada uma das pontas escolhe um cachorro pra ele pegar, segurando-o e passando a corda por entre as pernas enquanto se rolam no chão. Assim a gente corre até por volta de 16 horas quando retornamos para o corte 16 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS de cabeça do galo e, em seguida, o jantar preparado com as caças. Tudo o que foi caçado deve ser comido no mesmo dia. À noite as mulheres assumem o comando do ritual. A uma certa hora é anun- ciado que Bilibeu ficou doente, então começa os preparativos pra sentinela: ele é colocado na rede e em volta dele as pessoas começam a chorar e contar histórias, ao mesmo tempo começa procura por remédios que possam curar Bilico, mas ele só piora. Mulheres que estão amamentando são chamadas para dar a ele leite de peito; muitas dessas mulheres também foram curadas de alguma doença de peito e fizeram promessa a ele. A sentinela dura até por volta de meia noite quando é anunciada morte de Bilibeu depois de muitas tentativas de reanimação. O enterro é feito à luz de vela. Bilibeu é enterrado numa cova ao pé do mas- tro, que no dia seguinte é derrubado. Esse ritual tem que durar enquanto o povo Akroá Gamella existir porque ela é mesmo dos indígenas. Texto: 17LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS APINAYÉ 19LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS A Raposa e o Sabiá Uma vez a Raposa andava com muita fome, pois não havia comido nada. Andou por toda a floresta e não encontrou nada para comer. Mas de repente, viu um pássaro cha- mado Sabiá. Olhou para cima e disse: Bom dia, Sabiá! - O S abi á res ponde u: - Bom dia, Rabosa! - O que anda fazendo, Raposa? -A Raposa responde u: - Andei por toda a floresta e não encontrei nada para comer. - O Sabiá responde u: - Eu também não tenho na da para você comer, Raposa. -A Raposa mudou de assunto e disse: - Sabiá, você tem um filhote? - O Sabiá respondeu: - Sim, eu tenho. Por quê? - Eu quero que você me dê seu filhote para eu comê-lo. - O Sabiá res ponde: Eu não dou! -A Raposa disse: se você não der o seu filho, eu vou subir e matá-lo Coitadinho do Sabiá! Ouvindo o que a Raposa disse, logo começou a chorar, mas entregou seu filhote para Raposa comê-lo. O Sabiá não podia fazer nada para salvar o seu único filhote. De repente, a pareceu o pássaro Cancão, mas já era muito tarde. Viu o Sabiá chorando numa árvore. - O Cancão perguntou: Por que está chorando, Sabiá ? - O Sabiá respondeu: - A Raposa comeu meu único filho. O Cancão não pôde fazer nada, porque quando chegou já era muito tarde. Então o Cancão levou o Sabiá para morar com ele em sua casa. E, assim, foi a história do Sabiá e da Raposa. Texto: Emílio Dias Apinajé 20 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS A Sucuri A Sucuri está com muita fome e pode comer rato ou filhote de animal. Mas pri- meiro, a Sucuri atrai qualquer animal para pegar. Ela atrai suas presas com os olhos, para, em seguida, levar para boca e engolir. Então é dessa forma que a Sucuri consegue pegar os animais para se alimentar. Texto: Francisco Ribeiro da Costa Apinajé 21LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O Macaco e a Onça O Macaco muito esperto, um dia colheu alguns cipós e os foi puxando. Passou uma onça, que o viu e perguntou: - Aonde vai com esses cipós? - O Macaco respondeu: - Bem, já é quase noite, estou me preparando para dormir, por isso colhi esses cipós. - A Onça disse: - Mas, por que está levando esses cipós? - O Macaco respondeu: - Bem, estou procurando uma árvore grande. Quando a encontrar, vou me amar- rar nela, assim, durmo tranquilo. Amanhã eu me desamarro e vou embora. - A onça disse: - Então me amarre também. - O Macaco disse: - Bem, vamos procurar uma árvore que eu lhe amarro primeiro e depois procuro outra para mim. Saíram, procurando uma árvore e acharam um jatobá. A Onça pôs os braços em volta da árvore, o Macaco amarrou nas juntas, nas pernas e em todo o corpo. Depois perguntou: agora está bom? - A Onça experimentou, mas não pode desamarrar e disse: Estou bem presa agora. - O Macaco respondeu: - Bem, espere um momentinho. - Então saiu, pegou um forquilha, encostou na Onça e começou a empurrá-la com o pau. Doía muito. - Onça disse: Não faça isso, não! - Mas o Macaco continuou, até que a Onça contorcendo- se quebrou as cordas das juntas e se soltou. - O Macaco saiu correndo na mata. Por fim, a Onça se desamarrou e correu atrás do Macaco, mas não o pegou. Então a Onça ficou muito zangada. Texto: Maria Célia Dias de Souza Apinajé 22 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS A Cantiga Antigamente, há muitos e muitos anos, os nossos avós e bisavós tinham suas formas de rituais, entre elas, o hôhô. O hôhô é uma forma de ritual na lenda contada pelos nossos antepassados. Não desapareceu totalmente, ainda se faz. Não sabemos em que época, pois ninguém nunca mais mostrou para dizer que realmente existe. Na verdade ficamos sabendo alguns trechos narrados pelos mais velhos. Conforme veremos a seguir. Eram duas crianças que foram criadas por dos bichos do mato. Uma, por um Veado Campeiro e outra, por um a Ema. Como os espíritos das duas crianças saíram de seus corpos, elas se tornaram doentes, ficaram muito ruim. A mãe delas e os demais parentes dirigiram-se ao tio das crianças, pediram para que levasse imediatamente os espíritos aos corpos para que elas voltassem a sua forma normal. Disseram para o tio: vá e providencie essas duas crianças, traga - as de volta para que elas fiquem boas. Temos muito dó delas e não queremos que fiquem assim. - O Tio respondeu: sim, mas não tenham pressa, os bichos estão em festa e estou aprendendo o tipo de dançar. - Mas elas vão ficar boas, após as danças, eu estarei tomando elas, pois ficarão melhor. Porém, os dois animais que eram responsáveis pelas crianças continuaram com elas; e as crianças permaneceram entre os dois bichos, o Campeiro e a Ema. Chegou a vez de eles cantarem, cada um tinha as cantigas em nome dele, mas eram muito diferentes umas das outras. Cada um cantou a sua cantiga,primeiro o Campeiro, em seguida, a Ema. Assim, vinham às outras espécies de bichos, como as suas danças e as festas diferentes. Após ter- minar todas as formas de rituais, cada bicho trazia ofertas para o homem que participou de todas as formas rituais feitas pelos bichos. A Ema trazia ovos, como ofertas, Seriemas tra- ziam lagartixas, grilos e ovos. O Campeiro trazia frutos do mato. O homem, que participou de todas as festas e rituais, aprendeu alguns cânticos e os tipos de dança. Logo após o encerramento da festa dos bichos, o tio das duas crianças, que acompanhou todas as formas de rituais entre os bichos, fez os espíritos das duas crianças voltarem aos seus corpos, e as crianças voltaram às suas formas normais. Texto: Maria Célia Apinajé 23LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O Veado-mateiro e a Onça Antigamente a Onça se deitava no jirau e o Veado- mateiro, embaixo, no chão. Um dia o Veado- mateiro chegou primeiro, subiu e se deitou no jirau da Onça. Quando a Onça chegou, viu o Veado- mateiro deitado em seu jirau, deitou- se embaixo, no chão. Os dois ficaram esperando um ou outro falar. - Então o Veado-mateiro disse para Onça: talvez você já ouviu falar de mim. - Sou eu que como vocês, Onças. - A Onça respondeu: talvez você já ouviu falar sobre mim também. - Sou eu quem mato vocês, Veados - mateiros . - Mas a Onça estava falando sério. Assim os dois animais ficaram falando um com o outro, mas cada um com medo um do outro. Depois ficaram quietinhos, sem falar. Não dormiram, pois estavam um espe- rando o outro falar. O Veado-mateiro quebrou o jirau e caiu em cima da Onça. Os dois se espantaram e saíram correndo na mata. A Onça com medo fugiu numa direção e o Veado- -mateiro na outra, e sumiram na mata. Texto: Maria Célia Dias de Souza Apinajé 24 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS A Terra furada Conforme falavam os mais velhos, antigamente, a terra não era grossa, era bem fina. Um de nossos antepassados estavam caçando, viu rastos de tatu e foi seguindo. Che- gou a um buraco, ficou procurando, cavando com pau. Então a terra furou e ele caiu no buraco em cima de umas palmeiras de buriti. Olhou para baixo e viu porcos bravos com cabeças vermelhas. E pensou se tivesse caído no chão, os porcos teriam me comido, mas ficou sentado em cima das palmeiras de buriti. De noite a esposa esperou que ele voltasse para casa, mas ele não chegou. No dia seguinte, ela falou com o irmão do marido e mostrou o caminho que ele tomara; o irmão foi procurá-lo. Viu os rastos de tatu e o buraco onde o índio havia caído. Olhou para dentro e viu seu irmão no outro lado, sentado em cima do buriti. Chamou pelo irmão e ele respondeu. Assim, sabendo que estava vivo, o irmão voltou para aldeia e contou aos outros o que havia acontecido. Os índios fizeram uma corda bem forte e comprida, e voltou com os outros até o buraco. Jogaram a ponta da corda para ele. Ele segurou bem firme, puxaram para cima. O índio estava muito fraco de fome. Já havia três dias que ele havia caído no buraco. A esposa e irmãs lhe deram água e batatas. O irmão as viu e avisou-as: - não deem comida seca para ele pois assim vocês podem matá-lo! - Deem primeiro um caldo para ele beber e abrir um pouco a garganta. Depois podem dar batatas. Mas se derem comida seca o matarão. Então botaram as batatas numa cuia com água e deram para ele. Tomou e ficou forte. Depois o levaram para casa. Texto: Maria Célia Dias de Souza Apinajé 25LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O Garoto que se apaixonou pela própria irmã Há muitos anos, numa aldeia desconhecida, um garoto apaixonou- se pela sua própria irmã, pois a achou muito bonita. Por isso, reuniu todos os seus amigos da mesma tribo. Esses adolescentes programaram um plano de passeio. Escolheram, dentro da mesma aldeia, um jovem para chefiar a turma, mas o jo- vem disse o seguinte para sua turma: - Vamos sair para o deserto, para conhecer lugares, levaremos também nos- sas irmãs. Afinal, temos também muitas novidades e outras diversões para elas. E assim foi organizado, todo mundo achava que era melhor. Os adultos falavam em assuntos particulares, e as crianças ficaram separadas dos adultos. No dia seguinte, o chefe da turma saiu de casa em casa, avisando para que cada irmã levasse algum tipo de alimento, como massa de mandioca, batata- doce, amendoim e outros legumes. Partiram então para um lugar qualquer, chegaram à beira de um riacho, ali permaneceram acampados e fizeram seus barracos para morar dentro. Certo dia, saíram para matar alguns bichos silvestres para se alimentar e quando voltaram pararam perto do rancho, como se fossem um batalhão para atacar. Ameaçaram as irmãs, mas somente para fazer medo. Porém, teve um rapaz que era totalmente contra essa ameaça, por isso pediu aos amigos para que não fizessem isso. Mas por ter feito a defesa, foi criticado pelos ami- gos. Depois disso, cada um fez aquele tipo de capacete com penas de pássaro. Este é para proteger suas cabeças, a fim de que eles se defendessem de seus inimigos e foram à fonte para tomar banho. Lá tiraram novamente todos os capacetes da cabeça, mas aquele que foi cri- ticado não tirou o seu, por isso voltou com a marca na cabeça. Mas logo no dia seguinte, a turma toda retornou à aldeia. Em casa uma menina que também participou do passeio, chamou o irmão, aquele que foi criticado pelos amigos e falou: - Venha até mim, quero fazer uma surpresa para a mamãe, pois ela não sabe. - O rapaz imaginou que ela queria falar das ameaças no passeio, por isso não atendeu à irmã, mas ela insistiu tanto até que ele concordou. - Ao sentar no colo dela, logo ela olhou a marca na cabeça, onde era colocadoo 26 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS capacete. - Na mesma hora, lembrou do medo que teve por causa dos seus amigos, e empurrou o seu irmão. - Ele saiu chorando e se dirigiu para o chefe da turma. - E ele lhe falou: para de chorar, menino! - Então a mãe dos dois perguntou a menina o que ela havia feito com o me- nino. - A menina respondeu: - Nada. É por que eles ameaçaram nos atacar, quando nós estávamos arran- cha- dos à beira do riacho. Texto: Maria Célia Dias de Souza Apinajé 27LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS Terra Furada Uma vez, um indígena foi caçar na chapada, andou muito, mas não viu nada. Foi outra vez, andando, viu um tatu, entrando no buraco. O indígena pegou a enxada, come- çou a cavar. Quando ele estava cavando, de repente, a terra desabou e ele caiu dentro do buraco, mas não caiu no chão. Ficou dependurado no pé de buriti. Debaixo do buriti, havia muitos porcos diferentes. O porco sentiu o cheiro do indígena, ficou correndo debaixo do in- dígena que estava no buriti. O indígena ficou em silêncio, vendo o porco correr debaixo dele. Como o indígena demorou a chegar, a mulher dele estava desesperada. O cacique perguntou a ela o que es- tava acontecendo. - Ela respondeu que marido tinha ido caçar e até agora não havia chegado. - O cacique perguntou de novo, para que lado ele tinha ido. - Ela respondeu que o marido tinha ido para o lado da chapada. O cacique reuniu toda a comunidade e falou que havia um indígena perdido na chapada. A comunidade foi procurar o indígena que havia se perdido. Andaram muito, até que encontraram o rasto do indígena. O rasto dele seguia em direção ao buraco do tatu. O pajé falou para eles que o indígena não estava morto. Estava dependurado no pé de buriti. As mulheres começaram a trançar o algodão. Ao terminarem de trançar, corta- ram um galhinho de árvore, amarraram o galhinho na corda e colocaram no buraco. A corda saiu do outro lado do mundo. O indígena viu a corda, pegou, sentou no galhinho da árvore e puxou a corda; e os indígenas puxaram até que o indígena subiu. Ele falou que naquele buraco tinha muitos porcos de cabeça vermelha. Falou que se ele tivesse caído no chão o porco tinha comido. Texto: Percília Dias M. Apinajé/ Silivan Oliveira Apinajé 28 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O Macaco e o JabutiO Macaco não conhecia o Jabuti, mas na mata, havia uma fruta chamada najá. O Macaco todos os dias ia comer, de repente, encontrou o Jabuti em baixo do pé de najá, então se conheceram. - O Jabuti perguntou ao Macaco: - De que fruta você gosta? - O Macaco respondeu: - Da fruta chamada najá. - O Jabuti pediu um pouco de najá ao Macaco. - Ao terminar de comer, ele foi embora. Passadas duas semanas, o Macaco voltou para comer najá e encontrou nova- mente o Jabuti, que pediu mais najá. - O Jabuti falou: - Eu venho para você me dar mais najá. - O Macaco estava em cima de najá. - O Jabuti falou para o Macaco: - Ajuda-me a subir no pé de najá. - O Macaco perguntou: - Você quer mesmo subir? - O Jabuti respondeu: - Quero sim. Então o Macaco ajudou o Jabuti a subir no pé de najá, para ele comer encima. - Mas o Jabuti ficou no talo de najá. Passados três dias, apareceu uma Onça, que olhou para cima e viu o Jabuti. - A Onça falou para ele: - Eu quero te comer. - O jabuti respondeu: tudo bem, pode me comer. Mas fique bem em baixo de mim e você vai me aparar, para eu não cair e morrer, pois, a Onça acreditou nele, ficou bem embaixo. O Jabuti caiu em cima da testa da Onça e a matou. Então, foi assim que aconte- ceu a história do Macaco e do Jabuti. Texto: Rosana Dias Apinajé 29LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O Gavião Branco O gavião andava pelo mato, para caçar, mas não viu nada. Saiu para chapada, voou mais alto até que viu um veado no limpo. O gavião pensou e disse meus filhotes estão mortos de fome, pois já faz três dias que não pego nada. Então vou pegar este veado para levar um pedaço de carne para meus filhos comerem. O filhote de gavião branco caçava também com a mãe outro local, mas o pai voava mais alto ainda, até viu a mãe do gaviãozinho e disse: olha, a sua mãe está ali - vamos lá. Chegando perto disse para a mãe: eu já matei o veado para vocês. Dê este aí para o seu filho. O filho respondeu: você é meu pai. Texto: Jurandy Pereira Ribeiro Katàm 30 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O Sol e a Lua Desde que a terra existe, o Sol e a Lua moravam sozinhos. O Sol tinha a sua casa, e a Lua também. Cada um tinha a sua própria casa. Não havia plantas e nem animais silvestres. Não havia nada. Certo dia, o Sol fez os frutos que a gente come. Daí, a Lua viu e fez a mesma coisa. Mas ela fez os frutos que a gente não come. Então o Sol não a aceitou ter feito estes frutos. O Sol falou para ela que os nossos netos não iriam comer esses frutos. No outro dia, o Sol fez as plantas e outros tipos de madeira. Porém, a Lua viu, fez plantas com espinhos e outros tipos de madeira ruim. No dia seguinte, o Sol fez a cobra não venenosa. A Lua viu e resolveu fazer todos os tipos de cobras venenosas. O Sol saiu para caçar frutos para comer e encontrou um pé de buriti e os frutos do buriti estavam bem maduros. Então, o Sol comeu muito e foi embora. No outro dia, o sol fez cocô bem amarelinho. A lua viu as fezes do Sol e perguntou para ele: ixkràmgêêti o que você comeu que suas fezes estão amarelinhas? - Ele respondeu que havia comido todas aquelas flores amarelas. No outro dia, a Lua saiu para comer todos os tipos de flores amarelas. Mas não adiantou nada, no outro dia o sol saiu para comer o fruto de buriti. Então, a Lua foi atrás dele, encontrou-o e perguntou: Por que você me enganou? O Sol respondeu para ela: calma se veio comer, nós dois comeremos juntos. Mas a Lua não estava comendo bem, não gostou de comer o buriti, jogou fora e tirou outro. Mas quando a Lua jogou aquele caroço fora, bro- tou um pé de buriti, que ficou muito alto. O Sol perguntou para ela: porque fez isso? A Lua respondeu: quando os nossos netos forem catar no chão, vão ficar contentes. No dia seguinte, o Sol andando no mato, encontrou o Pica-pau e pediu o cocar dele. Então, o Pica-pau explicou para o Sol: cuidado se tu não pegares, o cocar vai cair no chão, pega fogo e todos nós morreremos. Daí, o Pica-pau tirou o cocar, jogou para o Sol e o cocar foi ficando igual ao fogo, mas o Sol pegou. Quando chegou à casa dele, logo a Lua viu o cocar e perguntou, imediatamente, para ele. Onde você pegou esse cocar? Leve-me lá para que eu possa pegar um. O Sol respondeu: tudo bem. Levou a Lua até lá, encontrou o Pica-pau, pediu o cocar. O Pica-pau falou para eles: vocês devem tomar muito cuidado, se cair no chão, vai pegar fogo e vamos queimar todo mundo. Jogou aquele cocar, mas a Lua ficou com medo. Não pegou, caiu no chão e logo pegou fogo tão rápido e os dois correram. O Sol entrou numa casa de maribondo, chamado de coração de boi; a Lua entrou na casa 31LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS de maribondo chamado de casca branca, que pegou fogo e queimou a barriga. De manhã seguinte saiu procurando o seu colega. Até encontrar novamente. Então, os dois saíram catando aquelas caças queimadas, chegaram à beira do rio, fizeram o fogo e assaram as caças. As caças do Sol eram gordas, as caças da Lua eram magras. Então, a Lua pediu um pedaço de carne do Sol o tempo todo. O Sol tirou um pedaço de carne e jogou para a companheira dele. A Lua gritou de dor. O Sol mandou-a mergulhar na água. Depois o Sol falou assim: seca, água. A água secou, e a Lua pegou a lama para passar em cima da queimadura. Porém, o Sol pediu para a água voltar. Ela voltou e o Sol falou para o Jabuti que riscasse em cima da queimadura. O Jabuti riscou em cima da queimadura e eles voltaram para casa, plantavam muitas sementes de cabaça. Nasceram os pés de cabaça. As cabaças amadureceram, eles tiraram todas as cabaças e levaram para o rio. Cada um deles jogava uma cabaça dentro do rio. As cabaças se transformaram em Seres Humanos. Todos os filhos do Sol eram bonitos e todos os filhos da Lua eram negros com os cabelos enroladas e aleijados. Assim, o Sol e a Lua fizeram seus filhos, subiram para o céu e todos os dias eles olhavam para seus filhos. Texto: Ivan Apinajé 32 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS Os Periquitos Era uma vez dois periquitinhos que moravam numa aldeia. Nesta aldeia exis- tiam muitas pessoas, mas todas foram mortas. Dois índios vieram de outro lugar e chega- ram ali. Eles estavam entrando em casa e não viram ninguém. Lá na frente eles encontraram dois periquitinhos na casa de uma moça. Eles pegaram os dois periquitos e levaram para casa. Dois rapazes solteiros pegaram dois periquitinhos e levaram para criar. Os rapazes foram pescar no riacho. E os dois periquitos saíram da casa e foram pilar arroz e cozinhar na panela. Os rapazes desconfiaram que tinha pessoas na casa que estavam fazendo comida para eles. Eles combinaram para caçar e voltaram do caminho e descobriram que os peri- quitos eram duas mulheres e se casaram e foram viver juntos. Texto: Maria Cipand Apinayé 33LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O Lagarto O lagarto gosta das mulheres, pois quando a mulher está gravida, o lagarto fica ouvindo todos os dias os tiros dos foguetes, ele vai perguntando para saber se é homem ou é mulher. Se for mulher, ele fica contente e se for homem, ele fica triste, porque ele fala assim: quando ele crescer só vai me perseguir com arco e flecha. Eu não gosto de homem. Eu só gosto de mulher, porque as mulheres vão pra roça e lá, elas fazem comida, almoçam e deixam o resto da comida, quando vão embora para casa, fica silêncio e o lagarto vai comer o resto da comida que ficou jogada no chão. Ele aproveita tudo. O urubu gosta mais dos homens. Quando a mulher está gravida ele fica de olho, quando ela ganha bebe, ele pergunta se é mulher ou é homem, se for mulher, ele fala assim, essa daí só vai ficar em casa, não caça, não anda no mato. A mulher quando ganha nenê, se for homem ele fica alegre e diz esse daí, quan- do ele crescer ele vai caçar no mato, porque ele atira numa caça e não mata, a caça vai embora baleada e morre muito longe. O urubu fica voando pelo ar, quando a caça fica com mau cheiro, o urubu sente o cheiro da caça e desce pelo ar para se alimentar com a caça que ohomem atirou. Texto: Josué Apinayé 34 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS A Mulher e a Anta Uma vez uma indígena se apaixonou pela anta e passou a namorar escondi- do no buritizal. A indígena inventava que ia buscar buriti, mas ao mesmo tempo ela ia se encontrar com a anta. Quando ela chegava ao buritizal, pegava o caroço de buriti e jogava no buriti para a anta ouvir e vir se encontrar com a indígena e amavam lá mesmo. Um dia a indígena ficou grávida e tudo foi descoberto. Os indígenas se reuniram e foram ao local para matar a anta. Chegando ao buritizal, começaram a jogar caroço e a anta veio, achando que era a mulher, mas não era. Eram os homens que vieram para matá-la e a anta veio só para morrer. Texto: Eva e Ivan Apinayé 35LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS A Cobra Certa vez uma família saiu para caçar na beira do lago, quando chegou lá sen- tou-se, arranchou-se no lugar, pegou peixe, e tinha muita caça. Matava assava e comia. Quando anoiteceu todos foram dormir. A cobra grande vinha e batia com o rabo no chão. Eles acordavam assustados, mas não tinham como sair. Esta cobra comia todo mundo. A cobra grande comia os caçadores. Quando os outros caçadores foram novamente viram um espirito atrás deles, mas o matador de espirito vinha com eles. Quando chegaram à beira do lago, fizeram um acampamento e esperaram a cobra. Quando anoiteceu, eles se deitaram e dormiram. Assim que a cobra percebeu que tinha gente novamente na beira do lago, ela saiu da agua, seguiu em direção do povo, fez volta batia com o rabo no chão e eles acordaram assustados, queriam correr, mas não tinha tempo. Mas o matador de espirito veio e matou a cobra e queimou. Texto: Eva e Ivan Apinayé 36 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS A Onça e o Macaco A onça e o macaco fizeram amizade e foram para casa do compadre. Lá na frente encontraram um bananal. A onça falou para o macaco comer ba- nana. Mas o macaco era muito esperto e enganou a onça. A onça comeu banana ver- de e macaco esperto comeu banana madura. A banana ficou amargosa para onça. Eles foram para a casa do compadre e chegando lá pela manhã bem cedo, o compadre do macaco foi ao curral para tirar o leite para eles beberem, mas o compadre desconfiou que a onça tinha comido um bezerro. O compadre foi falar para o afilhado que a onça comeu o bezerro. A onça estava dormindo muito e o compadre matou a onça, tirou o couro e fez um grande churras- co, tirou um pedaço da onça e deu para o afilhado comer com os filhos. Lá na frente, o macaco que levava um enorme pedaço de carne encontrou com os filhos e a onça mulher da onça morta, que pediu um pedaço daquela carne. O macaco deu a carne e ficou ali perto deles e depois falou para eles que estavam comendo a carne de seu pai. A onça fêmea correu atrás do macaco para mata-lo. Texto: José Eduardo Apinayé 37LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O Jacaré Era uma vez o jacaré e o índio. O jacaré disse: não era você que era pequenini- nho! Você me encontrou, tinha dó de mim, me pegou, levou ao rio e me soltou. É, me lembro de você. Eu já tinha me esquecido de você, falou o jacaré. E pediu para o índio montar nas costas dele para atravessarem o rio. Primeiro, o indígena não fez isso. Foi chegando perto do jacaré e falou eu não vou! Eu não vou! Você me come, repetiu novamente para o jacaré. Mesmo que o cacique fique com raiva de mim, fui até lá. Montei nas costas do jacaré e viajei sobre as águas com ele. Olá! Disse o jacaré, fala para mim que sou feio, que meu rosto é enrugado. - O indígena falou seu rosto é muito bonito. O jacaré foi nadando, perguntado e o índio respondendo. - Fala que meu casco é enrugado, que meu rabo é enrugado e que tenho de- feitos. Você não tem defeito, nadou mais, foi conversando com ele, foi mais perto da beira do rio, encontrou um cavalo bem velhinho e perguntou se vai para fren- te. O jacaré pe- diu que o cavalo o beijasse e ele respondeu que o jacaré era muito feio. Encontrou uma vaca e perguntou, e ela perguntou se ele ia comer o indígena. Lá na frente encontrou uma garça, que perguntou você vai comer esse indígena, depois encontrou uma cutia, que também perguntou. Mais na frente encontrou duas perdizes colhendo amendoim. A perdiz enxergou o indígena que o jacaré queria comê-lo, mas a perdiz matou o jacaré. Texto: Valdeci Apinayé 38 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O casamento do indígena Apinayé com a estrela Na aldeia tinha um indígena casado, mas um dia sua mulher morreu. O indígena ficou muito triste e sozinho durante muito tempo. Sempre ficava recuado dos outros indí- genas na aldeia. Todos os indígenas brincavam, dançavam, corriam com a tora, mas ele não. Não tinha nada na aldeia que o animava; ficava só pensando na sua esposa falecida. Toda noite, o indígena ia para o fundo da casa, forrava o chão com uma esteira e ficava deitado, sozinho, olhando para uma estrela muito bonita no céu, a mais brilhante do mundo. Numa certa noite, ele deitado, vendo aquela linda estrela, deixando de olhar apenas por alguns instantes, quando voltou a olhar, percebeu que aquela estrela tinha desaparecido tão de repente. Em poucos minutos, apareceu, ali a seu lado, uma linda mulher. Ele não perce- beu que era a estrela. Ela ficou ali por alguns minutos e num piscar de olhos, desapareceu. Na noite seguinte, o indígena resolveu descobrir quem era aquela linda mulher. Ela ralou jenipapo para passar na mulher para saber se era uma indígena de sua tribo. Na terceira noite, ela apareceu novamente. O indígena, muito esperto, já estava com a massa do jenipapo pronta, debaixo da esteira e as mãos todas meladas de tinta, quando ela se aproximou dele, os dois se deitaram juntinho, conversando e brincando. Durante a brinca- deira, ele aproveitou e passou o jenipapo na mulher estrela. No dia seguinte, aproveitando a chegada dos índios na aldeia, vindos da mata, correndo com a tora, o indígena foi ao pátio para verificar quem estava pintado, olhou um por um e ninguém estava pintado com sua pintura. Na ou- tra noite, quando a estrela veio, resolveu ficar com ele definitivamente. Eles entraram para casa e foram dormir. O tempo foi passando e ninguém sabia que o indígena viúvo estava casado com a estrela, pois ele a escondia dentro de uma enorme cabaça. Um dia, uma das irmãs do indígena desconfiou que ele estava diferente, espe- rou que o indígena saísse e foi ao quarto dele, abriu a cabaça e viu aquela linda mulher, correu e foi contar a sua mãe. Assim a estrela brilhante se apresentou para todos os indíge- nas e ficou morando junto com o indígena seu marido. Porém, aconteceu que os indígenas Apinayé não plan- tavam nada de cereais, como arroz, mandioca, milho e batata. Um dia, a estrela convidou o indígena seu marido para irem a um passeio nas ma- tas e foram até a cabeceira do rio. A estrela falou para o marido que iria ao céu e pediu 39LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS que ele desgalhasse uma vara que ao envergar desse açoite. Daí o indígenaescolheu uma vara de jatobá novo e desgalhou e falou que a vara estava pronta. Então a estrela subiu até a ponta da vara e pediu que ele a envergasse e assim ele fez. Ela pediu que ele soltasse a vara, e a vara deu um açoite muito veloz e a estrela subiu de volta ao céu. Quando foi à tardinha, ela voltou com vários alimentos, batata, bolo de massa de mandioca, milho, feijão, arroz e abóbora. A partir daí, ela ensinou os Apinayé a comerem todos os alimentos que até hoje os Apinayé comem, pois antigamente os índios não comiam esses alimentos. Os Api- nayé só se alimentavam de pau pubo, carne de caça seca no sol. Esses cereais já existiam na terra, mas os índios não sabiam como usar. Somente com a estrela é que foram saber que tinha um pé de milho no córrego, onde todos os índios iam tomar banho, mas ainda não conheciam o milho. Certo dia, a estrela foi tomar banho com o marido e falou para ele que aquela planta era o milho e assim, juntaram um pouco do milho e levaram paracasa e ela pilou no pilão, peneirou e fez bolo de massa de milho, moqueou e deixou esfriar. À tarde, quando os indígenas chegaram da mata correndo com a tora, ela tirou um pedaço de bolo e mandou uma criança ir ao pátio comendo o bolo, e um dos indígenas pediu um pouco para comer, gostou e falou para os outros indígenas que era muito bom. Assim a mulher estrela ensinou os Apinayé a comerem milho e depois todos os indígenas passaram a plantar suas próprias roças de cereais como milho, mandioca, batata e abóbora. Depois disso, ela retornou para o céu, para sempre . Texto: Valdeci Apinayé 40 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O Espírito Cego No passado um guerreiro mais velho fez assim. Saiu da aldeia para caçar e fle- chou um veado mateiro, mas antes tinha matado muitos macacos, no tempo das chuvas. Ele quis matar o veado, mas anoiteceu e ele procurou um local para dormir. O caçador viu um oco de pau muito grande e lá havia um espírito cego. Quando viu o indígena guerreiro, falou assim, o que foi meu netinho? E o indí- gena respondeu, não é nada, eu estava caçando e me perdi. O espírito pediu para o indígena entrar no oco. Quando passou um tempo, o espírito pediu que o indígena ficasse em pé para ele tocar o corpo do guerreiro, mas como o guerreiro era esperto, pegou o macaco e pediu que ele tocasse no corpo do macaco, e o espírito tocou o corpo do macaco e falou para o guerreiro: - Nossa! Você é muito pequeno, passando um tempo, ele pediu para o guer- reiro cortar seu próprio braço para que ele comesse, e comeu. Passando mais um tempo, ele pediu nova-mente o outro braço para comer. O indígena saiu do oco assustado e foi embora para a aldeia. Texto: Josué Dias Apinayé 41LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O Texware Uma vez dois cunhados saíram para caçar á noite. Andaram, andaram e não encontraraUma vez dois cunhados saíram para caçar à noite. Andaram, andaram e não en- contraram nada. Um cunhado falou para o outro, vamos passar o resto da noite aqui. De madrugada, fizeram fogo e o cunhado falou novamente, nós vamos passar a noite aqui, e de dia, talvez, nós mataremos caça. Ficaram ali e deitaram. Um dormiu muito, o outro acordou e viu o cunhado com a perna em cima do fogo e falou, você está com a perna queimando. Eu estou com muito sono e não senti nada. Demorou um pouco, o cunhado viu a perna novamente no fogo, porém não falou nada, ficou só observando até o fogo cortar o pé do cunhado. Depois do pé cortado, jogou-o próximo ao pé de pequi e falou, cunhado tem pequi caindo no pé. O cunhado se levantou foi ao pé de pequi, mas não encontrou pequi. Encontrou apenas a perna dele. Não falou nada para o cunhado. Voltou, fez a ponta da perna, e falou que aquilo era a arma dele. O cunhado que estava deitado, sem dormir, ouviu o outro falar. Agora se eu for para caçada e a outra pessoa passar por mim, eu mato. Isso era pra matar o cunhado. Ele foi embora, contou para sua mulher, que não acreditou e saiu à procura do outro cunhado, levando o filho, porém quando chegou onde ele estava, o cunhado foi em direção a mulher, matou ela e o filho. Texto: Joaquim Apinayé 42 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O Macaco que virou folha Era uma vez um macaco que virou folha. Antigamente o macaco era amigo da onça; e os dois sempre iam juntos beber água no ribeirão. Porém, havia apenas uma fonte. A onça se zangou e foi para outro lugar. Na beira do caminho, todos os bichos passavam para beber água. Como a onça se alimenta desses bichos, ficou lá, pegando os bichos e comendo. Porém, o macaco, que era esperto, virou folha e foi beber no ribeirão e, no caminho, a onça encontrou o amigo e perguntou: - Você é bicho? Sim, respondeu o macaco. - Mas eu sou feito de folha. - A onça falou, então pode ir embora. E o macaco foi embora beber água. Texto: Itamar Apinayé 43LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS A alma cheia de feridas Antigamente dois índios saíram para caçar, eram o sogro e o genro. Quando entraram na mata, encontraram filhotes de arara num buraco lá em cima da pedra, o sogro pediu para o genro subir e tirar os filhotes para ele. Fez uma escada e colocou para que ele subisse e tirasse os filhotes. Porém as araras já estavam grandes e o seu genro ficou com medo e não conseguiu tirar os filhotes para o sogro, dai ele pegou a escada e foi embora, deixando o genro lá em cima da pedra. Ele ficou dias e noites chamando o sogro, querendo beber, pedindo água, ele estava com o cabelo cheio de cocô de andorinhas. De repente a onça estava caçando e ouviu o grito do rapaz, foi até lá encontrar o rapaz. Ao chegar até o rapaz, a onça perguntou o que havia acontecido, o rapaz expli- cou que o sogro tinha pedido para ele tirar os filhotes de arara. Então a onça pediu ao rapaz para tirar os filhotes para ela comer. O rapaz tirou os filhotes, deu para a onça. Depois, a onça pediu para o rapaz ir até sua casa. O rapaz encorajou-se, desceu da árvore e foi, che- gando lá, a onça apresentou o rapaz para sua esposa. Todos os dias a onça ia caçar e trazia veado, catitu, outras caças e pedia para sua esposa dar comida para o rapaz, assim que ele tivesse fome. Na casa da onça tinha carne assada no jirau, era veado, catitu e outras caças. Porém, a mãe onça não gostava do rapaz, quando ele pedia comida, ela mostrava as unhas, os dentes, o rapaz ficava com medo, corria e subia numa árvore, esperando seu pai onça chegar. A onça chegava da caçada, via o rapaz na árvore e contou a onça o que a mãe havia feito. Ao chegar em casa, o pai onça obrigou a mãe onça a não fazer mais aquilo com o rapaz. Porém, ela não obedeceu, e fez tudo novamente. Dai o pai onça fez um arco e flecha para o rapaz matar a mãe onça, quando ela mostrasse os dentes e as unhas. Então, a mãe onça perguntou ao marido por que ele estava fazendo arco e flecha, ele respondeu que era para matar os pássaros e assar quando sentisse fome. Quando o pai onça saiu para caçar, o rapaz pediu comida, a mãe onça mostrou os dentes e as unhas; o rapaz flechou a onça e matou. Logo que matou a onça, o rapaz su- biu na árvore para esperar o pai onça. Quando voltou da caçada, encontrou o rapaz, que lhe contou tudo. Então, a onça falou para o rapaz que iria leva-lo de volta para sua aldeia. Ao saírem, chegando no meio do caminho, a onça falou para o rapaz que iriam separar e cada um seguiria seu caminho. A onça pediu para o rapaz responder com gritos. Porém, o rapaz 44 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS se perdeu e encontrou a alma cheia de feridas. A alma pegou o rapaz, amarrou-o e pôs junto com as caças que ela tinha no cofo, saiu com ele correndo no pescoço, porém o rapaz pediu que a alma abrisse o caminho mais largo, porque os galhos o arranhavam. Então a alma o obedeceu e colocou o cofo no chão e saiu abrindo caminho. O rapaz saiu do cofo e colocou no seu lugar uma pedra. Ela não percebeu e le- vou o cofo junto com a onça e a pedra. Chegando em casa, falou para seus filhos que tinha levado um filhote muito bonito para eles. Quando os filhotes tiraram todas as cascas, não encontraram o rapaz, e a alma voltou a procura do rapaz, que não mais o encontrou. Texto: Wanderlei Sotero Apinayé 45LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS GUARANI 47LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS História de piragui Olivio Jekupe e Maria Kerexu Eu sei que não sei escrever nem ler, mas quando eu era pequena, escutava muitas histórias da minha mãe e da minha avó, e hoje eu conto as mesmas histórias par os meus filhos e que espero que eles também contem pra seus filhos, e mesmo não sabendo ler nem escrever sempre sonhei em ser escritora, e como o meu marido é escritor, resolvi contar pra ele essa história pra ser publicado em livro. Certa vez, há muitos e muitos anos atrás, uma moça que estava grávida e com muita vontade de comer pirá, ( peixe) ficou esperando o seu marido chegar, pois ele tinha ido buscar lenha para acender tataypy. Logo que chegou ela foi falando que estava com muita vontadede comer pirá. - Tudo bem, eu vou pescar um pouco e vou trazer pirá para você. Ficou toda contente enquanto o marido foi pegar uma vara de pescar e algumas evoí. Em seguida foi para o yyakã- cabeceira do rio e ver se pescava um pouco para levar para sua mulher. Colocou a minhoca no pindá- anzol e ficou esperando o peixe ser fisgado. Só que o dia não estava bom para o índio pescador, pois já fazia horas que estava tentando e nada. Isto foi deixando o índio irritado, porque pelo jeito iria voltar para casa sem nenhum peixe. Mas mesmo irritado, continuou mais um pouco, pois quem sabe dava certo. Só que nada de peixe e aí ficou mais nervoso e só de raiva resolveu fazer algo, aí começou a okaá no rio. De repente, no momento em que fazia a necessidade apareceu uma piragui- sereia do mar por trás e bateu em seu evi- bumbum e disse: - Por que você está sujando o rio? Ele levou o maior susto e disse: - É que minha mulher está grávida e está com vontade de comer peixe e eu vim pescar para ela, só que já faz horas que estou aqui e não peguei nada e de raiva fiz isto. Em seguida a piragui fez uma proposta dizendo: - Se você quiser pescar bastante eu te ajudo, mas quando o seu filho nascer, você tem que dá-lo para mim. 48 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS O índio então aceitou e foi logo dizendo que sim. Em seguida começou a pescar outra vez e cada vez que jogava o pindá pescava um peixe. Quando viu que pescou bastante, resolveu ir embora para levar os piraretá. Ao chegar em sua casa, sua mulher ficou toda feliz e assou alguns...e comeu até não agüentar mais. Os dias foram passando e toda vez que sua mulher queria comer pirá, ia logo pescar e não teve mais dificuldades, pois pescava bastante e dos grandes. E certa noite ela sentiu que já estava na hora de dar a luz, aí avisouo seu marido. Então ele foi até a casa de uma índia parteira da aldeia para que ajudasse no parto. Na madrugada esta criança, que já estava prometida para a sereia, nasceu, com muita saúde e bem gordinha. O casal ficou todo feliz com o nascimento pois era o primeiro filho que eles tinham. Os dias foram passando e a piragui só esperando que trouxesse a criança , que agora era dela. De repente, o índio resolveu pescar e naquele momento ela apareceu e disse: - Cadê a criança? Você tem que me trazer. O índio se assustou com a pergunta, e pensou que era apenasuma brincadeira e que na verdade não era . Aí saiu correndo, porque não queria entregar seu filho de jeito nenhum. Mas para a piragui, isto não iria ficar assim, dizem que ela tem muito poder. - Se a criançanão for entregue viva, eu a levarei morta. Bastou o índio chegar em sua casa e escutou a triste notícia de sua mulher: - Nosso filho morreu de repente, não sei como. Estava bem e em questão de segundos fechou os olhos. O índio ficou triste e imaginou quem o matou. E aí contou a promessa que tinha feito para a piragui. E por causa dessa promessanão cumprida eles perderam uma criança. O acon- tecido foi contado para todos da aldeia e é falado até os dias de hoje e todas às vezes que uma índia fica grávida, ela não gosta que o marido fique indo pescar e quando vai, torce para que pegue pouco, pois se pegar demais, é que talvez seja a piragui que esteja ajudando e querendo a criança em troca. -Nossa, que historia, a partir de agora já sei que não podemos sujar os rios, porque do contrário, estamos agindo contra piragui. Kerexu Mirin- aldeia krukutu, povo guarani São Paulo. 49LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS A india voadora Kerexu Mirin, é uma índia guarani, nasceu na aldeia krukutu em 1996, e no dia do seu nascimento choveu muito e a parteira que fez o parto foi a Irondina, uma grande parteira e disse naquele dia: -Ela é muito bonita, e até parece que quer dizer algo. É que mesmo pequena, já tinha um olhar sorridente. O tempo foi passando e crescia com saúde e todos notavam que era muito in- teligente, pois com 2 anos de idade já falava na seu idioma materna que é o guarani falado na sua aldeia. E já com 2 anos e 4 meses ela também já aprendeu falar a língua dos Juruá kuery, os não indígenas, que é a língua portuguesa, e o interessante é que ninguém havia ensinado, aprendeu ouvindo o rádio velho que seu pai tinha. E também de ficar ouvindo o que os turistas falavam nas visitas na aldeia A aldeia onde Kerexu morava, era pequena, mas muito bonita, com uma popu- lação de uns 150 pessoas, e que tinha muitos pássaros e isso alegrava a pequena índia, e também o rio que desde pequena ela gosta de curtir igual uma poetiza. E Kerexu ia crescendo, e junto com esse crescimento, crescia algo nela muito interessante que era a vontade de voarem um helicóptero, é que quase todas as semanas, Kerexu não deixava de reparar os que passavam pela mata por cima da aldeia. E ela crescia com essa curiosidade de um dia conhecer um de perto e quem sabe voar nele. Mas isso era apenas um sonho de criança. As vezes, quando ia brincar com suas coleguinhas, sempre falava que um dia ia voar naquele pássaro gigante. Mas para as outras kunhague’i( crianças), era engraçado ouvir aquilo da Kerexu, e elas achavam que isso nunca poderia acontecer. Mas ninguém falava nada contra, apenas escutavam o que ouvia. E quando Kerexu já havia completado 6 anos e 8 meses, ela continuava sem- pre com o mesmo sonho, um desejo que não saia da cabeça dela, era uma criança mas a ideia ficava ali, sem ninguém pra tirar da cabeça dela, porque como iria poder realizar esse sonho? Era algo até difícil, mas toda criança pensa sem saber das dificuldades, e assim ela ia continuar sonhando, queria voar um dia de helicóptero, e mesmo não sabendo como isso poderia acontecer um dia. 50 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS -Pai? Disse ela com aquele sorriso lindo de índia, será que um dia vou realizar meu sonho? -Não sei não filha, mas uma coisa eu te digo, continue sonhando, porque tem sonhos que um dia pode acontecer, sei que isso é algo difícil pra eu fazer pra você, mas quem sonha um dia consegue, e se não conseguir, não se preocupe, porque outros sonhos poderão ser realizados.. eu quando tinha sua idade também sonhei de mais, mas nem tudo eu consegui, mas nem por isso fiquei revoltado, porque temos que ter muitos sonhos, uns a gente consegue realizar outros não. Ao ouvir tudo isso do seu pai, o coração dela ficou mais feliz e ficou mais con- fiante e aí acreditou que poderia realizar seu sonho, bastava esperar que um dia isso ia acontecer. E certo dia, seu pai foi pescar na represa que passa pela aldeia que aliás, tem muito pirá- peixe e que todos podem aproveitar, porque dinheiro é difícil. E nesse dia a Ke- rexu pegou uma varinha também, e foi junto com seu pai., e chegando no local, aí os dois sentaram e ficavam pescando, e o dia não tava pra peixe, pegava pouco, mas não faltou assunto, e aproveitavam e ficavam conversando, e como a Kerexu é uma kunhataim-moci- nha muito esperta sempre queria saber algo, e que na verdade isso era muito bom porque poderia fazer a crescer com muita sabedoria. Todas as vezes que passava um helicóptero pelo alto da aldeia, ela admirava, porque não entendi a como os jurua kuery conseguiram inventar esta máquina tão bonita e que consegue voar daquele jeito. Isso fazia com que a pequena índia ficasse alegre mesmo por essa invenção. Pois ela entendia que os pássaros tem a facilidade de voar, pois Nhan- deru- nosso Deus fez assim, mas uma máquina? Por isso é que seu desejo de voar era cada vez mais forte, e crescia o desejo cada vez que pensava nisso. -Mas um dia eu vou andar nesse pássaro gigante, pensava todos os dias, aliás até em sonhos ela vivia sonhando com a maquina, certo dia sonhou que estava voando com um e que ao acordar ficou triste por saber que era apenas um sonho. Mas certo dia as crianças da aldeia estava no campo de futebol, e nesse dia estava havendo uma festa indígena da aldeia, o cacique havia chamado as crianças e os jovens pra ensaiar as danças guaranie suas músicas, porque a noite ia ter um ritual sagrado que se faz todos os anos, ia ter o batismo guarani, ritual em que as crianças irão receber o nome guarani, é um dia muito importante. Estava um dia muito gostoso, com um belo sol, daqueles que deixa a gente feliz e sem sinal de chuva no dia. E ali naquele local o xa- moi-pajé começou a contar uma história para as crianças, algo que é comum nas aldeias, e que sempre foi assim, história oral, algo que sempre praticado nas aldeias, e que como antes não tinha escolas, mas nem por isso deixavam de saber das grandes histórias e sendo assim, as crianças sempre aprenderam ouvindo, e nas casas sagradas conhecida como opy, sempre tem alguém contando uma história. Hoje sabemos que existe escolas nas aldeias, mas nem por isso as histórias orais não deixaram de ser contada. 51LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS E de repente enquanto as crianças cantavam e dançavam, aparece no ar um helicóptero voando, passou pelo alto da aldeia e eles perceberam que estava havendo algo e por conhecidência era um empresário que sempre sonhou em conhecer uma aldeia, e que nunca tinha visitado uma comunidade indígena, e desde criança sonhava em fazer isso, mas nunca deu certo. Até que o empresário pediu para o piloto descer ao lado do campo, não sabia que poderia fazer isso, se ficariam bravo mas resolveu arriscar. E nisso o piloto deu duas voltas ao redor da aldeia, até que de repente o helicóptero desceu e ficou ao lado do campo. Alguns crianças ficaram com medo do barulho e começaram a chorar, mas os mais grandinhos não, ficaram alegre de ver a máquina gigante. A Kerexu ao ver aquela máquina gigante descendo ao lado do campo fez com que seu coração batesse mais forte, sorria que só ela sabia explicar, e pode acreditar que iria ver seu sonho acontecendo, porque ia estar perto. Nisso o piloto desceu e foi cumprimentar a todos. O cacique estava no local e foi atender o visitante, a Kerexu chegou mais perto e ficou junto do seu pai e escutando eles conversarem, nisso o visitante falou que sempre teve vontade de conhecer uma aldeia e perguntou se poderia? -Sim, é claro. Nisso o cacique falou que estavam ensaiando a dança guarani que é praticado todos os anos. -Que bom. O piloto desceu e ficou ao lado do helicóptero. Já o visitante aproveitou e ficou olhando o ensaio das crianças que iniciaram a dança. E o visitante se chamava Paulo, e de repente a Kerexu chegou mais perto e falou pra ele o seu nome e disse que tinha muita vontade de voar numa máquina dessas. O Paulo continuava olhando o ensaio mas atento na menina. -Eu me chamo Kerexu, tenho 7 anos de idade. E o Paulo viu que ela era muito corajosa e percebeu que sua vontade de voar no helicóptero era grande pois conversava e ficava olhando de longe, o pássaro gigante. Nisso seu pai falou pra ele. -Você poderia voar com ela, pois é o maior sonho dela. - Nossa, sério. -Sim. Os outros adultos que estavam ao lado, riam pois tinham medo de voar numa máquina daquela e nem pagando entrariam nela pra voar. -Claro, depois que eu for, antes poderemos dar uma volta sim. E realizar o so- 52 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS nho dela. Em seguida o Paulo viu que o ensaio já tinha terminado, aí o cacique falou: -Voce quer conhecer um pouco da aldeia? -Sim, quero. Aí o cacique foi dar uma volta pelo meio da aldeia, primeiro mostrou a casa de reza que chama Opy, lugar sagrado onde acontece ritual todas as noites. Em seguida mos- trou a escola e comentou que aqui tem escola e que é muito importante ter uma dentro da própria aldeia e que os professores são da própria aldeia. -Se um dia quiser vir participar numa das noites está convidado. -Que bom, posso vir sim, vai ser uma honra pra mim. Aí o tempo foi passando, e mais tarde o Paulo falou que já ia ter que ir embora. Em seguida o chegou o momento que a Kerexu mais queria, voar no helicóptero, o piloto entrou dentro e ligou, aquele barulho foi aumentando e o coração da pequena índia sonhadora aumentava e que deixava cada vez mais alegre. - Kerexu nós vamos entrar e voar por uns 10 minutos e depois te deixo aqui de novo na aldeia. -Sim. Aí o Paulo e ela entraram e logo começou a levantar voo, em seguida deu uma volta pelo meio da aldeia pra ela ver como era observar seu território de cima, em seguida seguiu caminho pela mata atlântica, pode ver a represa, o quanto é linda e obsevar a flo- resta, viu que tinha muitas regiões desmatada, que deixou ela muito triste, pois na aldeia culturalmente sempre aprende a amar a floresta. Aliás, não era só por aqui que se via des- truído, pois a mata atlântica já foi muito prejudicada em todo o Brasil, por isso a importân- cia de mostrar as crianças porque temos que amar e respeitar a natureza em geral, pra que não soframos no futuro.... Em seguida a pequena índia guarani realizou seu sonho, pode voar no helicóp- tero. Texto: Olivio Jekupe 53LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS Por que Iara virou uma sereia? Por que Iara virou uma sereia? Aqui vou contar uma história indígena, essa história quem contou foi a minha avó que já faleceu. O nome dela era Maria Conceição e me contou essa história numa tarde quando nós estávamos na beira de um rio, numa aldeia que fica em Boraceia, estávamos lá tomando banho quando minha avó perguntou se eu conhecia a história da Iara, e eu disse que sim, que eu conhecia, aí me perguntou se sabia porque a Iara tinha virado uma sereia? E então ela começou a contar essa história. Numa aldeia de guarani, existia uma indiazinha muito bonita, com cabelos lon- gos e pretos, ela chamava muita atenção para si, por ser tão linda, todos da aldeia gostavam dela, todos davam muita atenção a sua beleza, e Piragui tinha três irmãos, Werá ,Tupã,e Tukumbo. Os pais de Iara davam muito carinho e atenção a ela por ser tão bonita e também por ser a única menina dos irmãos, e isso deixava todos furiosos. Ela e seus irmãos sempre iam na opy(casa de reza), até que uma noite Iara foi a casa de reza, mas só que seus irmãos não foram , e Iara achou muito estranho, e foi mais cedo para casa, chegando em sua casa escutou seus irmãos conversando, e resolveu dar uma espiada, quando escuto o Werá falando assim: -Temos que dar um jeito na Iara. Nossos pais só gostam dela, eles não dão aten- ção para nós, a atenção é toda para ela. Em seguida disse o outro irmão, o Tupã: -É mesmo, devemos fazer alguma coisa. E ai que Tukumbo falou: -Temos que matar a Iara. Iara ficou assustada com aquela conversa e foi correndo até a cozinha e pegou a lança de seu pai, e foi direto em direção a seus irmãos atacando os pelas costas, assim ela derruba os três que estavam desprevinidos, em um de seus irmão ela dá um golpe mortal e com aquilo Iara se assusta, e sai correndo desesperada para o meio da mata. Depois de algumas horas seus pais chegam da opy, que se deparam com aquela cena horrível e um de seus filhos ainda consciente conta tudo o que aconteceu, e seu pai mesmo sem acreditar que Iara pudera fazer aquilo, pegou se arco e flecha e vai direto para a mata atrás de Iara, 54 LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS e foi para um rio onde ela ia sempre lavar seus lindos cabelos e longos e pretos. Chegando nesse rio seu pai vê Iara de costas lavando seus cabelos, quando ele aponta o arco e a flecha e acerta Iara pelas costas. O pai a filha e amarra uma corda com pedras e a joga no fundo do rio. Seu pai mesmo chorando muito disse essas palavras: -Agora que a mãe dágua te julgue pelo o que você fez! A mãe dagua fez seu julgamento, deixando Iara viver com uma condição, que a transformasse em uma piragui(sereia), uma parte mulher e uma parte peixe, para que assim pudesse ficar na beira do rio esperando suas vitimas, para encantar eles com sua beleza e sua bela voz, para que ela pudesse os levar para o fundo do rio para a mãe dagua. Texto: Fatima Kerexu guarani 55LITERATURA NATIVA: CONTOS E POESIAS Jaxy Jatere “...A figura do saci, outrora encontrada
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