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Apostila 6 - Produção de texto - conto e crônica Capa_Humanas cad6_ al_pr.indd

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Prévia do material em texto

ENSINO 
MÉDIO
PRODUÇÃO 
DE TEXTO 6
Capa_Humanas cad6_ al_pr.indd 14 06/12/16 16:18
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O Discurso Narrativo II
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O Discurso Narrativo II
PRODUÇÃO
DE TEXTO
Emiliana Abade
 O DISCURSO NARRATIVO II
1 Conto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4
 Curiosidade e ficção . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .4
 Fases da estrutura da narrativa . . . . . . . . . . . . . . . . . . .5
2 Crônica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
 Definindo a crônica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .16
2137807 (PR)
Comentário:
A legenda da imagem oferece uma chave de 
leitura da tela de Salvador Dalí, servindo de in-
trodução às reflexões do módulo sobre a narra-
tiva ficcional e o conto fantástico. As perguntas 
são todas abertas e aceitam diversas respostas 
a partir do repertório dos alunos. O importante 
é perceberem que estamos cercados tanto de 
realismo como de fantasia.
Faça-os notar que, muitas vezes, a arte (ou a 
ficção, ou a fantasia) é a melhor forma de revelar 
e contestar a realidade.
MÓDULO
O Discurso Narrativo II
A tentação de Santo Antão (1946), de Salvador Dalí.
Nesta obra, Salvador Dalí retrata o eremita Santo An-
tão (ou Antônio) no deserto, despido e tentando se pro-
teger apenas com uma cruz. Como num sonho, a situação 
e as figuras são inusitadas: um cavalo gigante que parece 
atacar; elefantes de patas alongadas e finas, carregando os 
símbolos da tentação, como o poder (representado pelos 
animais), o sexo (a nudez das figuras humanas) e a riqueza 
(as construções arquitetônicas douradas).
A tela mistura medo e desejo, religiosidade e erotismo, 
realidade e sonho, clássico e espiritualidade, compondo a 
narrativa com elementos do mundo real em situações fan-
tásticas. O fantástico geralmente é entendido como uma 
violação das leis naturais e o surgimento do impossível, mas 
muitos artistas consideram o evento fantástico como parte 
da natureza, um efeito do contato direto com a realidade.
REFLETINDO SOBRE A IMAGEM
1 Você se lembra de um sonho com situações 
absurdas? O que tinha de real e de fantasioso 
nele?
2 Você gostou da tela de Salvador Dalí? Você pre-
fere pinturas mais realistas ou fantasiosas? Dê 
sua opinião e justifique.
3 Por que será que muitos artistas optam por rea-
lizar suas obras de maneiras tão inusitadas?
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www.sesieducacao.com.br
Objetivos:
c Relacionar a estrutura 
do texto narrativo 
com os aspectos 
composicionais do 
gênero conto.
c Produzir contos 
com estrutura 
composicional 
adequada – com 
enredo, situação de 
equilíbrio, conflito, 
clímax e desfecho 
– e considerando o 
contexto enunciativo 
– tempo, narrador, 
discurso narrativo e 
espaço.
4 O Discurso Narrativo II
CAPÍTULO
1 Conto
 CURIOSIDADE E FICÇÃO
O que será que existe nas narrativas, que fascina o leitor ou o espectador?
As crianças ouvem a mesma história e nunca se cansam. Os adultos, muitas vezes, só deixam 
de lado um romance quando a história termina…
Talvez a causa seja a curiosidade, capaz de manter as indagações: E depois? Por quê? Será que 
ele(a) vai conseguir?
Livros e fi lmes com boas histórias proporcionam, e sempre proporcionarão, momentos ines-
quecíveis, cativantes, porque a curiosidade e a fi cção são eternas…
Leia fragmentos do conto: “Noite de almirante”, de Machado de Assis.
Deolindo Venta-Grande saiu do arsenal de marinha […].
— Ah! Venta-Grande! Que noite de almirante vai você passar! Ceia, viola e os braços de 
Genoveva. […]
Começara a paixão três meses antes de sair a corveta. Chamava-se Genoveva, caboclinha 
de vinte anos, esperta, olho negro e atrevido.
[…] Deolindo seguiu em viagem de instrução. Eram oito ou dez meses de ausência. Como 
fi ança recíproca, entenderam dever fazer um juramento de fi delidade. […]
Lá vai ele agora, pela rua de Bragança, Prainha e Saúde, até ao princípio de Gamboa, onde 
mora Genoveva […]. Foi à custa de muita economia que comprou em Trieste um par de brin-
cos, que leva agora no bolso […]. Nisto chegou à Gamboa, e deu com a casa fechada. A velha 
Inácia veio abrir-lhe a porta. […]. Deolindo, impaciente, perguntou por Genoveva.
— Não me fale nessa maluca. […]
— Mas que foi, que foi?
A velha disse-lhe que descansasse, que não era nada. […] Genoveva andava com a cabeça 
virada…
— Mas virada, por quê?
— Está com um mascate, José Diogo. […]
— Onde mora ela?
— Na praia Formosa, uma rótula pintada de novo. […]
Não contou com o acaso que pegou de 
Genoveva e fê-la sentar à janela, cosendo. 
[…]
— Que é isso, exclamou espantada. 
Quando chegou? Entre, seu Deolindo. 
[…]
— Sei de tudo, disse ele.
— […] Disseram-lhe que eu gostava 
muito de um moço? Disseram a verdade.
Deolindo chegou a ter ímpeto; ela fê-
-lo parar só com a ação dos olhos. […]
— Quando jurei, era verdade, mas 
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O Discurso Narrativo II
veio este moço e eu comecei a gostar dele…
— A que horas volta José Diogo? […]
— Não volta. E por que é que você quer saber? Que mal lhe fez ele? […]
Deolindo declarou que queria matá-lo. Genoveva olhou para ele com desprezo, sorriu de 
leve. […] E ele que tanto enchia a boca de fi delidade, tinha-se lembrado dela por onde andou?
A resposta dele foi meter a mão no bolso e tirar o pacote que trazia. […]
— Sim, senhor, muito bonitos os brincos, fazendo uma grande mesura de agradecimento. 
[…]
Ele pela sua parte começou a crer que, assim como perdeu, estando ausente, assim o 
outro, ausente, podia também perdê-la. […] e o demônio da esperança mordia o coração do 
pobre diabo e ele voltou a sentar-se, para dizer duas ou três anedotas. Genoveva escutava 
com atenção, interrompidos por uma mulher da vizinhança, que ali veio. […]
Deolindo seguiu, praia afora, cabisbaixo, lento, não já o rapaz impetuoso da tarde, mas 
com um ar velho e triste. Genoveva entrou logo, alegre e barulhenta. […]
— Sabe o que ele me disse agora? Que vai matar-se.
— Jesus!
— Qual o quê! Não se mata, não. Deolindo é assim mesmo, diz as coisas, mas não faz. […]
A verdade é que o marinheiro não se matou. No dia seguinte, alguns dos companheiros 
cumprimentaram-lhe pela noite de almirante, pediram-lhe notícias de Genoveva. Ele respon-
dia a tudo com um sorriso de pessoa que viveu uma grande noite. Parece que teve vergonha 
da realidade e preferiu mentir.
SALES, Herberto (org). Antologia de contos brasileiros. São Paulo: Ediouro, 2005.
 FASES DA ESTRUTURA DA NARRATIVA
Vamos, a partir da leitura do conto, recordar as fases da estrutura da narrativa.
O texto lido é iniciado com a chegada de Deolindo, após uma longa viagem. Ele é surpreendido 
pela infi delidade de Genoveva; logo, houve uma transformação da situação anterior, e a transfor-
mação é a principal característica de uma estrutura narrativa.
Antes da viagem, Deolindo e Genoveva fi zeram um juramento (contrato) de fi delidade. Os dois 
queriam e deviam cumprir o contrato, portanto a manipulação foi recíproca.
Ambos adquiriram um querer e um saber para a manutenção do juramento, entretanto Deo-
lindo manteve o contrato e Genoveva rompeu o juramento. Por conseguinte a competência foi 
igual para os dois, mas a performance foi desigual e oposta.
Deolindo perdeu e Genoveva ganhou.
A sanção, porém, foi positiva para Genoveva e negativa para Deolindo.
Poderia ser diferente, se Deolindo cumprisse uma de suas ameaças: estrangular Genoveva, 
matar José Diogo ou suicidar-se.
Se Deolindo foi capaz de cumprir o contrato de fi delidade, foi incapaz de cumprir as ameaças: 
“Deolindo é assim mesmo, diz as coisas, mas não faz”.
O conceito de conto e sua estrutura narrativa
Conto é um texto curto que narra um acontecimento de interesse humano e pertence ao gê-
nero das narrativasfi ccionais.
Apresenta-se condensado, isto é, com:
 poucas personagens, nem sempre nomeadas;
 poucas ações;
 tempo e espaço reduzidos.
O escritor Edgard Allan Poe defi ne o conto como uma peça fi ccional curta, coesa, tendo como 
tema um único incidente. Esse incidente conduz ao efeito.
Existe uma diferença muito importante entre narrativa e história, segundo E. M. Forster, ro-
6 O Discurso Narrativo II
mancista britânico. Para conhecê-la, leia, primeiramente, cada exemplo a seguir, acompanhado 
de um comentário.
O filho saiu de casa e sumiu. A mãe foi morar no interior de Minas.
Nesse exemplo, existe apenas sequência de tempo. Ao lê-lo, o leitor pode se perguntar: e de-
pois que o filho sumiu? Trata-se de uma narrativa.
O filho saiu de casa e sumiu. A mãe, de tristeza, foi morar no interior de Minas.
Nesse exemplo, aparece a causalidade — a causa da mudança da mãe foi a tristeza pela per-
da do filho. O leitor pode perguntar: por que a mãe foi morar no interior de Minas? Trata-se de 
uma história.
No conto, a causalidade é necessária.
A sequência de ações que mantém uma relação de causa e consequência constitui o enredo.
Ao iniciar o conto, o narrador apresenta uma situação de equilíbrio.
Essa situação inicial, geralmente, é modificada por um conflito.
O conflito é a tensão existente entre dois polos opostos, sem duração definida, isto é, ele dura 
enquanto durar a indefinição.
Do conflito, vão sendo geradas outras situações, outras ações encadeadas por causa e conse-
quência.
A resolução do conflito constitui o desfecho.
Para entender melhor a estrutura do conto, retomemos o fragmento de “Noite de almirante”, 
de Machado de Assis. Nele, a situação de equilíbrio acontece com o juramento de fidelidade entre 
Genoveva e Deolindo.
O conflito aparece quando Deolindo descobre que Genoveva tem outro namorado.
Outras ações vão sendo geradas a partir desse conflito:
 Deolindo dirige-se à casa de Genoveva;
 Deolindo encontra Genoveva;
 Genoveva confirma que quebrou o juramento;
 Deolindo tem ímpeto de matá-la (nesse momento, acontece o clímax, isto é, o momento de maior 
tensão da história: será que ele vai matá-la ou não?).
O desfecho acontece com a resolução do conflito — com o olhar, Genoveva desfaz o clima de 
tensão entre os dois.
Em “Noite de almirante”, Deolindo ainda faz mais duas ameaças, desacreditadas por Genove-
va: matar José Diogo e suicidar-se.
O desfecho traz novo equilíbrio, diferente do equilíbrio inicial apresentado em “Noite de almi-
rante”: Genoveva ficou com José Diogo e Deolindo ficou só.
Quanto ao tempo cronológico, este é curto — inicia-se com a chegada de Deolindo, tem con-
tinuidade com a ida dele à casa da velha Inácia e, depois, à casa de Genoveva, e prossegue até a 
manhã seguinte, ao encontrar seus amigos, caracterizando, portanto, horas e não dias ou meses.
São poucas as personagens no conto: Deolindo, Genoveva, José Diogo (triângulo amoroso), 
velha Inácia, amigos de Deolindo, amiga de Genoveva.
Com relação ao espaço em que se passam as ações do conto, são mencionados a rua da Bra-
gança, Prainha e Saúde, Gamboa, caminho da casa da velha Inácia e a praia Formosa, local da 
casa de Genoveva.
O narrador não é personagem do conto. Ele é observador, por isso escreve em terceira pessoa, 
como mostram os exemplos: “Deolindo Venta-Grande saiu”; “A velha Inácia veio abrir-lhe a porta”; 
Deolindo “seguiu praia afora, cabisbaixo”; “A verdade é que o marinheiro não se matou”.
Quanto ao modo de narrar, em “Noite de almirante” temos:
 discurso direto
— Sei de tudo.
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— Disseram-lhe que eu gostava muito de um moço? Disseram a verdade.
— Quando jurei, era verdade.
No diálogo entre Deolindo e Genoveva, o narrador reproduz, na íntegra, as falas das persona-
gens. Geralmente essa fala é introduzida por um travessão.
 discurso indireto
A velha disse que descansasse, que não era nada… Genoveva andava com a cabeça virada.
No discurso indireto, o narrador exprime indiretamente a fala das personagens. Os verbos di-
cendi ou verbos de dizer (dizer, responder, perguntar, pedir, ordenar, mandar e outros) aparecem 
na 3a pessoa, seguidos do conectivo “que” (dicendi afi rmativo) ou “se” (dicendi interrogativo) para 
introduzirem a fala na voz do narrador.
 discurso indireto livre
Ele pela sua parte começou a crer que, assim como perdeu, estando ausente, assim o ou-
tro, ausente, podia também perdê-la.
O discurso indireto livre é uma espécie de monólogo interior da personagem, mas expresso 
pelo narrador, em que este interrompe a narrativa para inserir refl exões daquela.
O discurso indireto livre aparece sem verbos dicendi e sem pontuação capaz de marcar as falas 
da personagem.
Leia o conto “Uma galinha”, de Clarice Lispector, que usaremos também para exemplifi car a 
estrutura narrativa do conto.
Era uma galinha de domingo. Ainda viva porque não passava de nove horas da manhã.
Parecia calma. Desde sábado encolhera-se num canto da cozinha. Não olhava para nin-
guém, ninguém olhava para ela. Mesmo quando a escolheram, apalpando sua intimidade 
com indiferença, não souberam dizer se era gorda ou magra. Nunca se adivinharia nela um 
anseio.
Foi pois uma surpresa quando a viram abrir as asas de curto voo, inchar o peito e, em 
dois ou três lances, alcançar a murada do terraço. Um instante ainda vacilou — o tempo da 
cozinheira dar um grito — e em breve estava no terraço do vizinho, de onde, em outro voo 
desajeitado, alcançou um telhado. Lá fi cou em adorno deslocado, hesitando ora num, ora 
noutro pé. A família foi chamada com urgência e consternada viu o almoço junto de uma 
chaminé. O dono da casa, lembrando-se da dupla necessidade de fazer esporadicamente al-
gum esporte e de almoçar, vestiu radiante um calção de banho e resolveu seguir o itinerário 
8 O Discurso Narrativo II
da galinha: em pulos cautelosos alcançou o telhado onde esta, hesitante e trêmula, escolhia 
com urgência outro rumo. A perseguição tornou-se mais intensa. De telhado a telhado foi 
percorrido mais de um quarteirão da rua. Pouco afeita a uma luta mais selvagem pela vida, a 
galinha tinha que decidir por si mesma os caminhos a tomar, sem nenhum auxílio de sua raça. 
O rapaz, porém, era um caçador adormecido. E por mais ínfima que fosse a presa o grito de 
conquista havia soado.
Sozinha no mundo, sem pai nem mãe, ela corria, arfava, muda, concentrada. Às vezes, na 
fuga, pairava ofegante num beiral de telhado e enquanto o rapaz galgava outros com dificul-
dade tinha tempo de se refazer por um momento. E então parecia tão livre.
Estúpida, tímida e livre. Não vitoriosa como seria um galo em fuga. Que é que havia nas 
suas vísceras que fazia dela um ser? A galinha é um ser. É verdade que não se pode ria contar 
com ela para nada. Nem ela própria contava consigo, como o galo crê na sua crista. Sua única 
vantagem é que havia tantas galinhas que morrendo uma surgiria no mesmo instante outra 
tão igual como se fora a mesma.
Afinal, numa das vezes em que parou para gozar sua fuga, o rapaz alcançou-a. Entre gri-
tos e penas, ela foi presa. Em seguida carregada em triunfo por uma asa através das telhas 
e pousada no chão da cozinha com certa violência. Ainda tonta, sacudiu-se um pouco, em 
cacarejos roucos e indecisos.
Foi então que aconteceu. De pura afobação a galinha pôs um ovo. Surpreendida, exausta. 
Talvez fosse prematuro. Mas logo depois, nascida que fora para a maternidade, pare cia uma 
velha mãe habituada. Sentou-se sobre o ovo e assim ficou, respirando, abotoando e desabo-
toando os olhos. Seu coração, tão pequeno num prato, solevava e abaixava as penas, enchen-
do de tepidez aquilo que nunca passaria de um ovo. Só a menina estava perto e assistiu a tudo 
estarrecida. Mal porém conseguiu desvencilhar-se do acontecimento, despregou-se do chão 
e saiu aos gritos:
— Mamãe, mamãe, não mate mais a galinha, ela pôs um ovo! Ela quer o nosso bem!
Todos correram de novo à cozinha e rodearam mudos a jovem parturiente. Esquentandoseu filho, esta não era nem suave nem arisca, nem alegre, nem triste, não era nada, era uma 
galinha. O que não sugeria nenhum sentimento especial. O pai, a mãe e a filha olhavam já há 
algum tempo, sem propriamente um pensamento qualquer. Nunca ninguém acariciou uma 
cabeça de galinha. O pai afinal decidiu-se com certa brusquidão:
— Se você mandar matar esta galinha nunca mais comerei galinha na minha vida!
— Eu também! jurou a menina com ardor.
A mãe, cansada, deu de ombros.
Inconsciente da vida que lhe fora entregue, a galinha passou a morar com a família. A 
menina, de volta do colégio, jogava a pasta longe sem interromper a corrida para a cozinha. 
O pai de vez em quando ainda se lembrava: “E dizer que a obriguei a correr naquele estado!” 
A galinha tornara-se a rainha da casa. Todos, menos ela, o sabiam. Continuou entre a cozinha 
e o terraço dos fundos, usando suas duas capacidades: a de apatia e a do sobressalto.
Mas quando todos estavam quietos na casa e pareciam tê-la esquecido, enchia-se de uma 
pequena coragem, resquícios da grande fuga — e circulava pelo ladrilho, o corpo avançando 
atrás da cabeça, pausado como num campo, embora a pequena cabeça a traísse: mexendo-se 
rápida e vibrátil, com o velho susto de sua espécie já mecanizado.
Uma vez ou outra, sempre mais raramente, lembrava de novo a galinha que se recortara 
contra o ar à beira do telhado, prestes a anunciar. Nesses momentos enchia os pulmões com 
o ar impuro da cozinha e, se fosse dado às fêmeas cantar, ela não cantaria mas ficaria muito 
mais contente. Embora nem nesses instantes a expressão de sua vazia cabeça se alterasse. Na 
fuga, no descanso, quando deu à luz ou bicando milho — era uma cabeça de galinha, a mesma 
que fora desenhada no começo dos séculos.
Até que um dia mataram-na, comeram-na e passaram-se anos.
LISPECTOR, Clarice. In: MORICONI, Ítalo (org.). Os cem melhores contos 
brasileiros do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
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O Discurso Narrativo II
O título do conto, “Uma galinha”, é conciso, bem como a estrutura desse gênero.
O conto possui poucas personagens: a galinha, a cozinheira, a mãe, o pai, a fi lha e um rapaz.
O tempo é curto — as situações mais importantes acontecem no período de um dia. Os dias 
seguintes aparecem no conto para mostrar que a morte da galinha, inevitavelmente, chegaria.
O narrador é observador, não faz parte das personagens, por isso aparece em 3a pessoa: “Era 
uma galinha de domingo.”; “A família foi chamada com urgência…”.
Discurso narrativo: predomina o discurso direto: “— Mamãe, mamãe, não mate mais a gali-
nha, ela pôs um ovo! Ela quer o nosso bem!”.
Espaço: as ações ocorrem na casa onde vive a família.
Estrutura narrativa
Equilíbrio inicial: a galinha estava viva e parecia calma.
Confl ito: a galinha alça voo, planejando sua fuga.
Clímax: a galinha põe um ovo e, por isso, permanece viva.
Desfecho: mataram a galinha, comeram-na e passaram-se anos.
Fases da estrutura narrativa
Manipulação: a intuição ou o acaso fi zeram com que a galinha tentasse fugir.
Competência: ela não sabia voar, somente abria as asas para curtos voos.
Performance: a galinha é capturada e põe um ovo de pura afobação.
Sanção: positiva e lhe garante a vida, pelo menos, por algum tempo.
ATIVIDADES
Leia um trecho do conto “O peru de Natal”, de Mário de Andra-
de, para responder às questões de 1 a 3.
O nosso primeiro Natal de família, depois da morte de 
meu pai, acontecida cinco meses antes, foi de consequên-
cias decisivas para a felicidade familiar. Nós sempre fôra-
mos familiarmente felizes, nesse sentido muito abstrato 
da felicidade: gente honesta, sem crimes, lar sem brigas 
internas nem graves difi culdades econômicas. Mas, de-
vido principalmente à natureza cinzenta de meu pai, ser 
desprovido de qualquer lirismo, duma exemplaridade in-
capaz, acolchoado no medíocre, sempre nos faltara aque-
le aproveitamento da vida, aquele gosto pelas felicidades 
materiais, um vinho bom, uma estação de águas, aquisi-
ção de geladeira, coisas assim. Meu pai fora de um bom 
errado, quase dramático, o puro-sangue dos desmancha-
-prazeres.
Morreu meu pai, sentimos muito etc. Quando chegamos 
nas proximidades do Natal, eu já estava que não podia 
mais pra afastar aquela memória obstruente do morto, 
que parecia ter sistematizado pra sempre a obrigação de 
uma lembrança dolorosa em cada gesto mínimo da famí-
lia. Uma vez que eu sugerira à mamãe a ideia dela vir ver 
uma fi ta no cinema, o que resultou foram lágrimas. Onde 
se viu ir ao cinema, de luto pesado! A dor já estava sendo 
cultivada pelas aparências, e eu, que sempre gostara ape-
nas regularmente de meu pai, mais por instinto de fi lho 
que por espontaneidade de amor, me via a ponto de abor-
recer o bom do morto.
Foi decerto por isto que me nasceu, esta sim, espontanea-
mente, a ideia de fazer uma das minhas chamadas “loucu-
ras”. Essa fora, aliás, e desde muito cedo, a minha esplên-
dida conquista contra o ambiente familiar. Desde cedinho, 
desde os tempos de ginásio, em que arranjava regularmen-
te uma reprovação todos os anos; desde o beijo às escondi-
das, numa prima, aos dez anos, descoberto por Tia Velha, 
uma detestável de tia […]. Pois foi o que me salvou, essa 
fama. Fiz tudo o que a vida me apresentou e o meu ser 
exigia para realizar com integridade. E me deixaram fazer 
tudo, porque eu era doido, coitado. Resultou disso uma 
existência sem complexos, de que não posso me queixar 
em nada.
Era costume sempre, na família, a ceia de Natal. Ceia reles, 
já se imagina: ceia tipo meu pai, castanhas, fi gos, passas, 
depois da missa do galo. Empanturrados de amêndoas e 
nozes (quanto discutimos os três manos por causa dos 
quebra-nozes…), empanturrados de castanhas e monoto-
nias, a gente se abraçava e ia pra cama. Foi lembrando isso 
que arrebentei com uma das minhas “loucuras”:
— Bom, no Natal, quero comer peru.
ANDRADE, Mário de. Contos novos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2011.
 1 Classifi que o narrador do conto, retirando do texto um trecho 
que comprove sua resposta.
10 O Discurso Narrativo II
 2 Releia o trecho do conto.
Fiz tudo o que a vida me apresentou e o meu ser exigia para 
realizar com integridade. E me deixaram fazer tudo, porque 
eu era doido, coitado. Resultou disso uma existência sem 
complexos, de que não posso me queixar em nada.
Nesse parágrafo verifi ca-se a presença do discurso indireto li-
vre, que consiste na expressão da personagem sem o uso do 
travessão ou dos verbos dicendi. Retire do texto um exemplo 
desse tipo de discurso.
 3 O(s) motivo(s) que leva(m) o narrador do conto a querer fazer 
uma loucura, ou seja, a querer comer peru no Natal é (são):
a) o pedido feito pela mãe para que a levasse ao cinema a fi m 
de que a dor do luto fosse minimizada e a característica da 
ousadia, que lhe era própria.
b) a ausência do pai que fora, em vida, um desmancha-prazeres 
e o próprio jeito de ser do narrador, indivíduo não adepto 
à monotonia.
c) uma maneira de reconquistar o ambiente familiar e a con-
fi ança de Tia Velha, perdidos por motivos passados.
d) desejo de ascensão social e vontade de experimentar o sabor 
do peru, já que anteriormente a família era muito pobre.
e) experimentar felicidades materiais e surpreender os fami-
liares com presentes na ocasião do Natal.
 4 (Insper-SP)
Ele se encontrava sobre a estreita marquise do 18o andar. 
Tinha pulado ali a fi m de limpar pelo lado externo as vi-
draças das salas vazias do conjunto 1801/5, a serem ocu-
padas em breve por uma fi rma de engenharia. Ele era 
um empregado recém-contratado da Panamericana —
Serviços Gerais. O fato de haver se sentado à beira da marquise, 
com as pernas balançando no espaço, se devera simplesmente 
a uma pausa para fumar a metade de cigarro que trouxera no 
bolso. Ele não queria dispensar este prazer, misturando-o com 
o trabalho.
Quando viu o ajuntamento de pessoas lá embaixo, apontando 
mais ou menos em sua direção, não lhe passou pela cabeça que 
pudesse ser ele o centrodas atenções. Não estava habituado a 
ser este centro e olhou para baixo e para cima e até para trás, a 
janela às suas costas.
Talvez pudesse haver um princípio de incêndio ou algum an-
daime em perigo ou alguém prestes a pular.
Não havia nada identifi cável à vista e ele, através de operações 
bastante lógicas, chegou à conclusão de que o único suicida em 
potencial era ele próprio. Não que já houvesse se cristalizado 
em sua mente, algum dia, tal desejo, embora como todo mun-
do, de vez em quando… E digamos que a pouca importância 
que dava a si próprio não permitia que afl orasse seriamente 
em seu campo de decisões a possibilidade de um gesto tão 
grandiloquente. E que o instinto cego de sobrevivência levava 
uma vantagem de uns quarenta por cento sobre seu instinto de 
morte, tanto é que ele viera levando a vida até aquele preciso 
momento sob as mais adversas condições.
In: MORICONI, Ítalo (org.). Os cem melhores contos 
brasileiros do século. Rio de Janeiro: Objetiva, 2000.
Esse texto é abertura do conto “Um discurso sobre o método”, 
de Sérgio Sant’Anna. A partir da análise dos elementos narrati-
vos, julgue (V ou F) para as afi rmações que tratam do confl ito 
da personagem principal.
( ) Por rotineiramente se considerar relegado a um segundo 
plano, o protagonista procurou encontrar, perto de si, 
algum perigo que explicasse o que chamava a atenção do 
agrupamento de pessoas.
( ) Ao notar a multidão que apontava em sua direção, o ho-
mem sentado sobre a marquise do prédio passou a refl etir 
acerca das condições adversas de vida do ser humano.
( ) O protagonista admite que o suicídio é uma atitude nobre 
que ele, um trabalhador humilde e insignifi cante, seria 
incapaz de pensar algum dia.
 5 +Enem [H15] Leia o seguinte texto.
[…]
Ali na rua Oriente a ralé quando muito andava de bonde. De 
automóvel ou carro só mesmo em dia de enterro. De enterro ou 
de casamento. Por isso mesmo o sonho de Gaetaninho era de 
realização muito difícil. Um sonho.
O Beppino por exemplo. O Beppino naquela tarde atravessara 
de carro a cidade. Mas como? Atrás da tia Peronetta que se 
mudava para o Araçá. Assim também não era vantagem.
[…]
Gaetaninho enfi ou a cabeça embaixo do travesseiro.
Que beleza, rapaz! Na frente quatro cavalos pretos empena-
chados levavam a tia Filomena para o cemitério. […]
Gaetaninho ia berrar, mas a tia Filomena com a mania de can-
tar o “Ahi, Mari!” todas as manhãs o acordou. […]
Tia Filomena teve um ataque de nervos quando soube do so-
3. O narrador, vendo-se livre da natureza cinzenta do pai, permite-se fazer uma loucura no Natal que se aproxima: trocar a reles ceia de outrora 
pelo peru de Natal. Alternativa b.
V
F
F
O narrador é personagem, pois usa a 1a pessoa do discurso para narrar os 
fatos. “O nosso primeiro Natal de família, depois da morte de meu pai…”; “Fiz 
tudo o que a vida me apresentou…” são exemplos de trechos que comprovam 
a resposta.
“E me deixaram fazer tudo, porque eu era doido, coitado”. A expressão destacada 
revela o que pensavam as pessoas a respeito do narrador. Não há travessão ou 
verbos dicendi para indicar a reprodução de uma fala, fi cando caracterizada, 
assim, a presença do discurso indireto livre.
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O Discurso Narrativo II
PARA PRATICARCOMPLEMENTARES
Leia o trecho fi nal do conto “A causa secreta”, de Machado de 
Assis, para responder às questões 6 e 7.
Fortunato saiu, foi deitar-se no sofá da saleta contígua, e 
adormeceu logo. Vinte minutos depois acordou, quis dormir 
outra vez, cochilou alguns minutos, até que se levantou e vol-
tou à sala. Caminhava nas pontas dos pés para não acordar 
a parenta, que dormia perto. Chegando à porta, estacou as-
sombrado.
Garcia tinha-se chegado ao cadáver, levantara o lenço e con-
templara por alguns instantes as feições defuntas. Depois, 
como se a morte espiritualizasse tudo, inclinou-se e beijou-a na 
testa. Foi nesse momento que Fortunato chegou à porta. Esta-
cou assombrado; não podia ser o beijo da amizade, podia ser 
o epílogo de um livro adúltero. Não tinha ciúmes, note-se; a 
natureza compô-lo de maneira que lhe não deu ciúmes nem 
inveja, mas dera-lhe vaidade, que não é menos cativa ao res-
sentimento. Olhou assombrado, mordendo os beiços.
Entretanto, Garcia inclinou-se ainda para beijar outra vez o 
cadáver; mas então não pôde mais. O beijo rebentou em solu-
ços, e os olhos não puderam conter as lágrimas, que vieram em 
borbotões, lágrimas de amor calado, e irremediável desespero. 
Fortunato, à porta, onde fi cara, saboreou tranquilo essa explo-
são de dor moral que foi longa, muito longa, deliciosamente 
longa.
Contos escolhidos, 1994.
 6 (F. Cultura Inglesa-SP) O narrador relata que Fortunato, ao chegar à 
porta, estacou assombrado. Isso ocorreu porque este:
a) pensou que Garcia descobrira a relação adúltera e por isso 
chorava ao corpo morto.
b) encontrou a sua mulher morta, provavelmente por Garcia, 
que a tinha beijado.
c) confi rmou que a relação entre a sua mulher e Garcia era 
uma amizade sincera.
d) fl agrou a sua mulher morta sendo beijada por Garcia, indício 
de que fora traído.
e) reconheceu que seu amor pela mulher era muito mais ver-
dadeiro do que pensara.
 7 (F. Cultura Inglesa-SP) A última frase do texto — “[…] saboreou 
tranquilo essa explosão de dor moral que foi longa, muito longa, 
deliciosamente longa” — revela, por meio de:
a) hipérbole, a crítica do narrador ao comportamento de For-
tunato.
b) gradação, a satisfação de Fortunato ante a situação viven-
ciada.
c) contradição, o pesar que expressa Fortunato com a morte 
da mulher.
d) eufemismo, a avaliação pejorativa do narrador para a atitude 
de Garcia.
nho de Gaetaninho. Tão forte que ele sentiu remorsos. E para 
sossego da família alarmada com o agouro tratou logo de subs-
tituir a tia por outra pessoa numa nova versão de seu sonho. 
[…] Seu Rubino, que uma vez lhe deu um cocre danado de 
doído.
[…]
O Nino veio correndo com a bolinha de meia. Chegou bem 
perto. Com o tronco arqueado, as pernas dobradas, os braços 
estendidos, as mãos abertas, Gaetaninho fi cou pronto para a 
defesa.
— Passa pro Beppino!
Beppino deu dois passos e meteu o pé na bola. Com todo o 
muque. Ela cobriu o guardião sardento e foi parar no meio da 
rua.
— Vá dar tiro no inferno!
— Cala a boca, palestrino!
— Traga a bola!
Gaetaninho saiu correndo. Antes de alcançar a bola um bonde 
o pegou.
Pegou e matou. No bonde vinha o pai do Gaetaninho.
A gurizada assustada espalhou a notícia na noite.
— Sabe o Gaetaninho?
[…]
Às dezesseis horas do dia seguinte, saiu um enterro da rua do 
Oriente, e Gaetaninho não ia na boleia de nenhum dos carros 
do acompanhamento. Ia no da frente, dentro de um caixão fe-
chado com fl ores pobres por cima. […]
Quem na boleia de um dos carros do cortejo mirim exibia so-
berbo terno vermelho que feria a vista da gente era o Beppino.
MACHADO, Alcântara. “Gaetaninho”.
In: MORICONI, Ítalo (org.). 
Os cem melhores contos brasileiros do século.
Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
“Gaetaninho” foi escrito por Alcântara Machado e faz parte da 
coletânea de contos Brás, Bexiga e Barra Funda do autor. As-
sinale a alternativa que contenha, respectivamente, uma pas-
sagem do conto que mostre que as personagens pertencem a 
uma camada social baixa e outra que sugira que se tratam de 
imigrantes italianos.
a) “De automóvel ou carro só mesmo em dia de enterro.” / 
“dentro de um caixão fechado com fl ores pobres por cima.”
b) “No bonde vinha o pai do Gaetaninho” / “Seu Rubino, que 
uma vez lhe deu um cocre danado de doído.”
c) “O Beppino naquela tarde atravessara de carro a cidade.” / 
“Tia Filomena teve um ataque de nervos quando soube do 
sonho de Gaetaninho.”
d) “Gaetaninho enfi ou a cabeça embaixo do travesseiro” / “tia 
Filomena com a mania de cantar o “Ahi, Mari!” todas as 
manhãs…”
e) “Ali na rua Oriente a ralé quando muito andava de bonde.” 
/ “— Cala a boca, palestrino!”
5. Ralé signifi ca plebe ou camada social de indivíduos desclassifi cados. QuandoBeppino se dirige a Gaetaninho usando o termo palestrino, 
o autor mostra que o menino era torcedor do Palestra Itália, time fundado por imigrantes italianos na cidade de São Paulo. Alternativa e.
12 O Discurso Narrativo II
e) paradoxo, a ambiguidade dos sentimentos de Fortunato 
com a situação.
 8 (Fuvest-SP, adaptada) No conto “A hora e vez de Augusto Matraga”, 
de Guimarães Rosa, o protagonista é um homem rude e cruel, que 
sofre violenta surra de capangas inimigos e é abandonado como 
morto, num brejo. Recolhido por um casal de matutos, Matra-
ga passa por um lento e doloroso processo de recuperação, em 
meio ao qual recebe a visita de um padre, com quem estabelece 
o seguinte diálogo:
— Mas, será que Deus vai ter pena de mim, com tanta ruin-
dade que fi z, e tendo nas costas tanto pecado mortal? — Tem, 
meu fi lho. Deus mede a espora pela rédea, e não tira o estribo 
do pé de arrependido nenhum… […] Sua vida foi entortada no 
verde, mas não fi que triste, de modo nenhum, porque a triste-
za é aboio de chamar demônio, e o reino do céu, que é o que 
vale, ninguém tira de sua algibeira, desde que você esteja com a 
graça de Deus, que ele não regateia a nenhum coração contrito.
a) A transformação de uma situação é a principal característica 
de uma estrutura narrativa. O texto apresenta elementos 
que comprovem a transformação da personagem Augusto 
Matraga? Justifi que.
b) A linguagem fi gurada, amplamente empregada pelo padre, 
é adequada ao seu interlocutor? Justifi que sua resposta.
TAREFA PROPOSTA
Leia o texto para responder às questões 1 e 2.
Conto de verão no 2: “Bandeira branca”
Ele: tirolês. Ela: odalisca. Eram de culturas muito diferen-
tes, não podia dar certo. Mas tinham só quatro anos e se 
entenderam. […] ficaram sentados no chão, fazendo um 
montinho de confete, serpentina e poeira […].
Encontraram-se de novo no baile infantil do clube, no 
ano seguinte. Ele com o mesmo tirolês, […] ela de egíp-
cia. […] Passaram o tempo todo de mãos dadas. Só no 
terceiro Carnaval se falaram.
— Como é teu nome?
— Janice. E o teu?
— Píndaro.
[…]
— Que nome!
Ele de legionário romano, ela de índia americana.
Só no sétimo baile (pirata, chinesa) desvendaram o mis-
tério de só se encontrarem no Carnaval […]. Ela morava 
no interior, vinha visitar uma tia […].
[…] quase no fim do baile, na hora do “Bandeira branca”, 
ele veio e a puxou pelo braço, e os dois foram para o meio 
do salão, abraçados. E, quando se despediram, ela o bei-
jou na face […].
No baile do ano em que fizeram 13 anos, pela primeira 
vez as fantasias dos dois combinaram. Toureiro e baila-
rina espanhola. Formavam um casal! Beijaram-se muito 
[…]. Até na boca. […]
No ano seguinte, ela não apareceu no baile. Ele ficou o 
tempo todo à procura, um havaiano desconsolado. […]
Mas, no ano seguinte, […] lá estava ela! Quinze anos. 
Uma moça. Peitos, tudo. Uma fantasia indefinida.
[…]
Estava diferente. […] Contou que faltara no ano anterior 
porque a avó morrera, logo no Carnaval.
[…] quando a banda começou a tocar “Bandeira branca” 
e ele se dirigiu para a saída, tonto e amargurado, sentiu 
que alguém o pegava pela mão, virou-se e era ela. Era ela, 
meu Deus, puxando-o para o salão. Ela enlaçando-o com 
os dois braços para dançarem assim […]. Ela encostando 
a cabeça no seu ombro.
Encontraram-se de novo 15 anos depois. Aliás, neste 
Carnaval. Por acaso, num aeroporto. Ela desembarcando 
[…] para visitar a mãe. Ele embarcando para encontrar os 
filhos no Rio. […]
[…] ele pensando: digo ou não digo que aquele foi o mo-
mento mais feliz da minha vida, “Bandeira branca”, a cabe-
ça dela no meu ombro […]. E ela pensando: como é mesmo 
o nome dele? Péricles. Será Péricles? Ele: digo ou não digo 
[…]. Ela: Petrarco. Pôncio. Ptolomeu…
VERISSIMO, Luis Fernando. In: MORICONI, Ítalo (org.). 
Os cem melhores contos brasileiros do século. 
Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
 1 Analise cada etapa da estrutura narrativa do conto.
Equilíbrio inicial:
Confl ito:
Clímax:
Desfecho:
 2 Analise as fases da estrutura narrativa sob a perspectiva da per-
sonagem masculina.
Manipulação:
Competência:
Performance:
Sanção:
As respostas encontram-se no portal, em Resoluções e Gabaritos.
“Bandeira branca”: marchinha de carnaval.
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O Discurso Narrativo II
 3 Identifi que e explique o tipo de discurso presente nos trechos 
transcritos.
a) — A vida é um buraco, meus amigos, murmurou Ale-
xandre. De volta da feira, dei uma topada, esfolei o dedo 
grande, rebentei a correia desta infeliz e andei légua e 
meia com um pé calçado e outro no chão. Estava aqui 
pensando no meu tempo de rico. Dinheiro no baú, roupa 
fi na e um quarto cheio de sapatos de toda a versidade.
RAMOS, Graciliano. “História de uma bota”. In: Alexandre 
e outros heróis. Rio de Janeiro: Record, 2005.
b) Dona Quinota não se importava com a aspereza do 
ano inteiro. Com ela era ali no duro — trabalho, tra-
balho e mais trabalho. O ordenado das empregadas, na 
verdade, era uma pouca-vergonha que a polícia devia 
pôr um paradeiro. Não punha. Vivia metida com a 
maldita da política. Falta duma boa revolução!… Ah, 
se ela fosse homem!… Enquanto a revolução não vinha 
para botar tudo nos eixos, obrigando-a a endireitar as 
empregadas, fazia de criada — cozinhava, varria, co-
sia. Encerava a casa também, aos sábados, depois que 
disseram pelo rádio ser higiénico e muito econômico.
REBELO, Marques. “Uma senhora”. In: MORICONI, Ítalo (org.). Os cem 
melhores contos brasileiros do século. 
Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
Leia o texto a seguir e responda às questões 4 e 5.
— Canudos pretos! exclamou ele.
Eram as calças pretas que eu acabava de vestir. Exclamou e riu, 
um risinho em que o espanto vinha mesclado de escárnio, o 
que ofendeu grandemente o meu melindre de homem moder-
no. Porque, note V. Exª, ainda que o nosso tempo nos pareça 
digno de crítica, e até de execração, não gostamos de que um 
antigo venha mofar dele às nossas barbas. Não respondi ao 
ateniense; franzi um pouco o sobrolho e continuei a abotoar os 
suspensórios.
Ele perguntou-me então por que motivo usava uma cor tão 
feia…
— Feia, mas séria, disse-lhe. Olha, entretanto, a graça do cor-
te, vê como cai sobre o sapato, que é de verniz, embora preto, 
e trabalhado com muita perfeição.
E vendo que ele abanava a cabeça:
— Meu caro, disse-lhe, tu podes certamente exigir que o Júpiter 
Olímpico seja o emblema eterno da majestade: é o domínio da 
arte ideal, desinteressada, superior aos tempos que passam e aos 
homens que os acompanham. Mas a arte de vestir é outra coisa. 
Isto que parece absurdo ou desgracioso é perfeitamente racional 
e belo, — belo à nossa maneira, que não andamos a ouvir na rua 
os rapsodas recitando os seus versos, nem os oradores os seus dis-
cursos, nem os fi lósofos as suas fi losofi as. Tu mesmo, se te acostu-
mares a ver-nos, acabarás por gostar de nós, porque…
— Desgraçado! bradou ele atirando-se a mim.
Antes de entender a causa do grito e do gesto, fi quei sem pin-
ga de sangue. A causa era uma ilusão. Como eu passasse a 
gravata à volta do pescoço e tratasse de dar o laço, Alcibíades 
supôs que ia enforcar-me, segundo confessou depois. E, na 
verdade, estava pálido, trêmulo, em suores frios. Agora quem 
se riu fui eu. Ri-me, e expliquei-lhe o uso da gravata, e notei 
que era branca, não preta, posto usássemos também gravatas 
pretas. Só depois de tudo isso explicado é que ele consentiu 
em restituir-ma. Atei-a enfi m, depois vesti o colete.
— Por Afrodita! exclamou ele. És a coisa mais singular que jamais 
vi na vida e na morte. Estás todo cor da noite — uma noite com 
três estrelas apenas — continuou apontando para os botões do 
peito. O mundo deve andar imensamente melancólico, se esco-
lheu para uso uma cor tão morta e tão triste. Nós éramos mais 
alegres; vivíamos…
ASSIS, Machado de. “Uma visita de Alcibíades 
(Carta do desembargador X… ao chefe de polícia da Corte.)”. 
In: Papéis avulsos. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
 4 (U. E. Londrina-PR)Com base no texto, considere as afi rmativas 
a seguir.
 I. O trecho “uma noite com três estrelas apenas” assinala a 
ideia de que somente três botões brilhantes do colete con-
trastavam com a melancolia evocada pela cor preta do tra-
je.
 II. A passagem assinala o choque cultural entre fi guras repre-
sentantes de momentos históricos distintos. Diante do nar-
rador, o homem da antiguidade assombra-se com a moda 
oitocentista.
 III. Ao reconhecer a supremacia da arte grega, cujo símbolo é o 
Júpiter Olímpico, o narrador admite a falta de requinte dos 
vestuários modernos.
 IV. Ironicamente, a escolha da cor preta para o vestuário de 
uma noite de gala evoca, no conto, a ideia de luto pela extin-
ção dos valores da antiguidade clássica.
Assinale a alternativa correta.
a) Somente as afi rmativas I e II são corretas.
b) Somente as afi rmativas I e IV são corretas.
c) Somente as afi rmativas III e IV são corretas.
d) Somente as afi rmativas I, II e III são corretas.
e) Somente as afi rmativas II, III e IV são corretas.
 5 (U. E. Londrina-PR, adaptada) Com base no trecho citado, con-
sidere as afi rmativas a seguir.
 I. No segundo parágrafo, os termos “melindre”, “mofar” e “so-
brolho” signifi cam, respectivamente, “escrúpulo”, “zombar” 
e “sobrancelha”.
 II. No último parágrafo, o trecho “És a coisa mais singular que 
jamais vi na vida e na morte” constitui uma reelaboração 
criativa do ditado popular: “Eu vou morrer e ainda não vou 
ver tudo”.
 III. A recorrência do sinal de travessão, a indicar a mudança de 
interlocutores na narrativa, assinala que, embora seja um 
conto, “Uma visita de Alcibíades” estrutura-se como uma 
14 O Discurso Narrativo II
peça teatral.
Assinale a alternativa correta.
a) Somente as afi rmativas I e II são corretas.
b) Somente a afi rmativas I é correta.
c) Somente as afi rmativas II e III são corretas.
d) Somente a afi rmativa II é correta.
e) Somente a afi rmativa III é correta.
Texto para as questões 6 e 7.
Dois velhinhos
Dois pobres inválidos, bem velhinhos, esquecidos numa 
cela de asilo.
Ao lado da janela, retorcendo os aleijões* e esticando a ca-
beça, apenas um podia olhar lá fora.
Junto à porta, no fundo da cama, o outro espiava a parede 
úmida, o crucifi xo negro, as moscas no fi o de luz. Com in-
veja, perguntava o que acontecia. Deslumbrado, anunciava 
o primeiro:
— Um cachorro ergue a perninha no poste.
Mais tarde:
— Uma menina de vestido branco pulando corda.
Ou ainda:
— Agora é um enterro de luxo.
Sem nada ver, o amigo remordia-se no seu canto. 
O mais velho acabou morrendo, para alegria do segundo, 
instalado afi nal debaixo da janela.
Não dormiu, antegozando a manhã. Bem desconfi ava que o 
outro não revelava tudo.
Cochilou um instante — era dia. Sentou-se na cama, com 
dores espichou o pescoço: entre os muros em ruína, ali no 
beco, um monte de lixo.
TREVISAN, Dalton. Mistérios de Curitiba. Rio de Janeiro: 
Editora Record, 1979, p. 110.
 6 (ESCS-DF, adaptada) A respeito do conto de Dalton Trevisan, é 
correto afi rmar que: 
a) é, predominantemente, narrado em discurso indireto livre.
b) sua estrutura rompe com os padrões característicos desse 
gênero.
c) trata-se de uma narrativa tradicional com abundantes tre-
chos descritivos.
d) a narrativa é apresentada de forma irônica pelo narrador.
 7 (ESCS-DF) Tendo em vista a linguagem e a estrutura da narrativa, 
assinale a opção correta, a respeito do conto de Dalton Trevisan.
a) A modalidade de linguagem que predomina no conto é a 
informal, dada a presença abundante de gírias.
b) A expressividade do conto tem base no contraste entre a 
visão restrita de um personagem e a aparente visão ampla 
do outro.
c) A perspectiva do narrador do conto identifi ca-se irrestrita-
mente com a visão do velhinho que faleceu, cuja cama se 
encontrava próxima à janela.
d) A estrutura dos diálogos é calcada na expressividade do 
discurso indireto.
 8 +Enem [H23] Leia o seguinte texto.
A lebre e a tartaruga
Humilhada depois da competição, a lebre correu — dessa 
vez, sim, bem depressa — tentando escapar da zombaria de 
todos os bichos do bosque. Ninguém tentou segui-la para 
que explicasse a razão da derrota, e muito menos para con-
solá-la.
A plateia estava feliz; todos sentiam-se vingados da petulância 
da lebre e gritavam vivas à tartaruga, que incansavelmente, e 
com muita paciência, manteve o passo para derrotar a conven-
cida. Carregaram o quelônio nos ombros e desfi laram com ele 
durante horas, até que caíram exaustos no capim, com um sor-
riso de íntima satisfação.
Enquanto isso, a lebre se esgueirou com as orelhas abaixa-
das até a toca da doninha. Ali, entre brindes e gargalhadas, 
repartiram com o coiote o prêmio que haviam recebido por 
apostar na tartaruga.
David Hernández Labastida. Não era uma vez…
O texto é uma releitura da fábula A lebre e a tartaruga. Assinale 
a alternativa que mostra que essa versão da história pode ser 
classifi cada como conto de esperteza e que, portanto, dialoga 
com outras narrativas orais do imaginário brasileiro.
a) A lebre aprendeu, em meio a uma grande humilhação, que 
não deve se gabar dos demais. Assim, sai cabisbaixa em 
direção à toca da doninha para receber seu apoio moral.
b) A lebre aprendeu que o excesso de confiança é um obs-
táculo para alcançar objetivos, reconhecendo a esperteza 
da tartaruga que saiu vencedora da competição.
c) Os animais da fl oresta sentiram-se vingados “da petulância 
da lebre e gritaram vivas à esperteza da tartaruga, que incan-
savelmente, e com muita paciência, manteve o passo para 
derrotar a convencida”.
d) A lebre finge apenas o sentimento de humilhação, pois, 
na verdade, perdeu de propósito a competição para poder 
ganhar o dinheiro das apostas junto com a doninha e o 
coiote, entre brindes e gargalhadas.
e) A lebre, num gesto de esperteza, correu para escapar da 
zombaria dos bichos do bosque. Preferiu não dar explicações 
sobre a derrota, que lhe parecia extremamente humilhante.
PARA PRATICARCONSTRUINDO O TEXTO
 1 Leia um trecho do poema “Caso do vestido”, de Carlos Drum-
mond de Andrade.
Caso do vestido
Nossa mãe, o que é aquele
vestido, naquele prego?
*Aleijões: deformidades
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O Discurso Narrativo II
Minhas fi lhas, é o vestido
de uma dona que passou.
Passou quando, nossa mãe?
Era nossa conhecida?
Minhas fi lhas, boca presa.
Vosso pai evém chegando.
Nossa mãe, dizei depressa
que vestido é esse vestido.
Minhas fi lhas, mas o corpo
fi cou frio e não o veste.
O vestido, nesse prego,
está morto, sossegado.
Nossa mãe, esse vestido
tanta renda, esse segredo!
Minhas fi lhas, escutai
palavras de minha boca.
Era uma dona de longe, 
vosso pai enamorou-se.
E fi cou tão transtornado,
se perdeu tanto de nós, 
se afastou de toda vida,
se fechou, se devorou,
chorou no prato de carne,
bebeu, brigou, me bateu,
me deixou com vosso berço,
foi para a dona de longe,
mas a dona não ligou.
Em vão o pai implorou.
Carlos Drummond de Andrade
Com base na leitura, observamos que o equilíbrio inicial da 
vida da família foi quebrado pela presença de uma mulher, 
dona do vestido que ali se encontra. O marido rompe o relacio-
namento para ir atrás dessa mulher.
Escreva um conto sobre a história do poema “Caso do vesti-
do”. Caracterize as personagens, descreva a casa, o vestido, os 
lugares que frequentam. Imagine diálogos entre o marido e a 
mulher. A partir do envolvimento do marido com a mulher do 
vestido, narre como se desenvolveu o confl ito e qual foi o desfe-
cho. Se quiser, você pode começar a narrativa pela sanção ou pela 
perfomance, usando o recurso do flash-back para esclarecer as 
causas da sanção negativa ou positiva.
Para que seu conto fi que bem escrito, siga as orientações:
 dê atenção à estrutura do conto, observando as fases que o 
constituem;
 como o poema sugere o desfecho, o confl ito poderá ser de-
senvolvido de uma forma muito interessante;
 procure escrever de maneira clara e coesa.
Lembre-se de dar um título ao seu trabalho.
 2 (U. F. São Carlos-SP,adaptada) Narre um conto que contenha novo 
desfecho para a personagem de Jorge Amado, Gabriela.
Gabriela rodopiava em frente ao espelho, admi-
rando-se. Era bom ser bonita: os homens enlouque-
ciam, murmuravam-lhe frases com voz machucada. 
Gostava de ouvir, se era um moço a dizer.
[…]
Era ruim ser casada, gostava não…
Jorge Amado (1912-2001)
A personagem vive um grande confl ito: a liberdade e o cárcere 
que o casamento representa para ela. Com base nesse confl ito, 
dê continuidade à história, dando atenção à estrutura do gê-
nero conto.
RE
PR
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ÇÃ
O
VÁ EM FRENTE
Assista
A desigualdade, as injustiças e as exigências do mundo em que vivemos acabam infl uenciando as pessoas que, por sua vez, atingem 
níveis elevados de estresse ou, até mesmo, a depressão. Algumas chegam a explodir. O fi lme Relatos selvagens, de Damián Szifrón (Ar-
gentina, Espanha, 2014) retrata, em seis histórias, justamente a reação dessas personagens, vulneráveis diante de uma realidade que, 
subitamente, se altera e se torna imprevisível.
Leia
Os cem melhores contos brasileiros do século, organização de Ítalo Moriconi (Rio de Janeiro: Objetiva, 2001). 
O livro reúne narrativas extraordinárias de alguns dos principais nomes de nossa literatura. Os contos dessa antologia traduzem as 
mudanças do país e as inquietações de várias gerações de brasileiros, em cem anos de produção literária. Vários contos foram usados 
na produção deste capítulo, vale a pena a leitura!
Objetivos:
c Compreender os tipos 
textuais que constroem 
o gênero crônica.
c Identificar as 
características do 
gênero crônica, 
por meio do 
reconhecimento do 
assunto, da linguagem, 
das personagens e do 
narrador do texto.
c Produzir crônicas a 
partir da transposição 
entre gêneros textuais, 
por meio da adequação 
de suas estruturas 
composicionais.
16 O Discurso Narrativo II
CAPÍTULO
2 Crônica
 DEFININDO A CRÔNICA
Leia fragmentos de algumas crônicas de grandes escritores. A partir deles, e refl etindo sobre as 
ideias que os constituem, fi cará mais fácil identifi car um gênero textual cujas características levam 
os teóricos da literatura a classifi car como crônica.
Os trovões de antigamente
[…]
Sim, nossa casa era muito bonita, verde, com uma tamareira junto à varanda, mas eu in-
vejava os que moravam do outro lado da rua, onde as casas dão fundo para o rio. Como a casa 
das Martins, como a casa dos Leão, que depois foi dos Medeiros, depois de nossa tia, casa 
com varanda fresquinha dando para o rio.
Quando começavam as chuvas, a gente ia toda manhã lá no quintal deles para ver até onde 
chegara a enchente. […] Mais de uma vez, no meio da noite, o volume do rio cresceu tanto 
que a família defronte teve medo.
Então, vinham todos dormir em nossa casa. Isso para nós era uma festa, aquela faina de 
arrumar camas na sala, aquela intimidade improvisada e alegre. […] como se fazia café e se 
tomava café tarde da noite! E às vezes o rio atravessava a rua, entrava pelo nosso porão, e 
me lembro que nós, os meninos, torcíamos para ele subir mais e mais. […] Às vezes chegava 
alguém a cavalo, dizia que lá para cima tinha caído chuva muita, anunciava água nas cabecei-
ras, então dormíamos sonhando que a enchente ia outra vez crescer, queríamos sempre que 
aquela fosse a maior de todas as enchentes.
Rubem Braga
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O trecho lido possui traços descritivos, o que o faz tornar-se quase cinematográfi co.
O leitor, mesmo que não queira, “visita” o local: casa verde, com tamareira na varanda; varanda 
fresquinha (sinestesia: visão e tato)… Encontram-se aqui características da descrição.
Além disso, a linguagem empregada é muito coloquial, mas não isenta de poesia: “Como a casa das 
Martins, que depois foi dos Medeiros, depois de nossa tia…”; “lá para cima tinha caído chuva muita”.
As ações registradas são solidárias — oferta da casa para os vizinhos dormirem, camas na sala, 
intimidade improvisada, muito café — e esse clima era tão marcante que continuava nos sonhos 
dos meninos. Essas são características da narração.
Logo, o fragmento da crônica que você leu pode ser caracterizado como um texto narrativo-
-descritivo.
A sensibilidade do cronista está presente na percepção das coisas que a maioria das pessoas não 
enxerga; por meio dela, ele consegue transmitir ações e sensações incríveis, experimentadas pelo lei-
tor em algum momento da vida (quem não se lembra de reunião com amigos em noites de chuva?); 
daí o fascínio e a beleza encontrados na leitura desse tipo de texto, que traz consigo a experiência 
do dia a dia.
A crônica não tem as mesmas características essenciais identifi cadas no conto, porque ela lida 
com o cotidiano, com fatos corriqueiros, apreendidos subjetivamente pelo cronista. Por isso, o que 
se busca em seu desfecho é apenas levar o leitor a refl etir sobre o assunto apresentado.
O cronista possui ainda o domínio dos signifi cados das palavras para expressar, com perfeição 
e brevidade, as nuanças de fatos que muitos presenciam, mas nem sempre registram, nem sempre 
generalizam.
Garagem
Acordar é uma pequena tragédia. Seja cutucado pela luz, seja estapeado pelo despertador, sempre 
abro os olhos com um profundo sentimento de injustiça: por que já?! Por que eu?! Tende piedade, Se-
nhor, dai-me mais cinco minutinhos — e abençoai, se tiverdes tempo, o inventor da “função soneca”.
Quando eu era adolescente, pensava que o problema fosse a escola. Afi nal, quem quer sair 
da cama às 6 h da madrugada pra estudar adjuntos adnominais e alcalino-terrosos? (Melhor 
fi car adjunto do travesseiro, como que embalado por alcaloides-celestiais.)
[…]
Agora, virando de um lado pro outro na cama, dividido entre a preguiça e a culpa, ten-
to amaldiçoar alguma tarefa enfadonha que supostamente me aguarda na primeira esquina 
depois da escova de dentes, mas não encontro nada horroroso por lá. Hoje é quinta, dia de 
começar a crônica. Gosto de escrever a crônica.
[…]
Antônio Prata. In: Folha de S.Paulo, 21 set. 2014.
No texto lido, escrito em primeira pessoa, o cronista desabafa sobre o fato de ter de acordar 
cedo, “por que já?! Por que eu?! Tende piedade, Senhor, dai-me mais cinco minutinhos”.
No início, apresentando o tema, o cronista consegue manter o interesse do leitor, exatamente 
porque, na realidade, os fatos enumerados são vividos, também pelo leitor, em seu dia a dia que, 
“cutucado pela luz” ou “estapeado pelo despertador”, precisa acordar cedo.
No segundo parágrafo, o cronista relembra a época em que o motivo que o tirava cedo da cama 
era a escola (“pra estudar adjuntos adnominais e alcalino-terrosos”), para, no parágrafo seguinte, 
questionar-se sobre o motivo de tamanho tédio, já que atualmente faz apenas aquilo de que gosta 
(“Gosto de escrever a crônica”).
Ao tratar de assunto corriqueiro, o autor emprega uma linguagem simples, coloquial: “função 
soneca”, “pra estudar”; “virando de um lado pro outro na cama”.
Lendo a crônica, o leitor certamente concordará com os fatos relatados, vividos por ele diaria-
mente, mas nem sempre percebidos em suas pequenas sutilezas. O texto apresenta humor, mas 
não deixa de ser refl exivo, na medida em que leva o leitor a pensar sobre a maneira como encara 
esse fato cotidiano.
18 O Discurso Narrativo II
A falta que ela me faz
Como bom patrão, resolvi, num momento de insensatez, dar um mês de férias à emprega-
da. No princípio achei até bom ficar completamente sozinho dentro de casa o dia inteiro. […]
Aos poucos, porém, passei a desejar ardentemente essa volta. O apartamento, ao fim 
de alguns dias, ganhava um aspecto lúgubre de navio abandonado. A geladeira começou a 
fazer gelo por todos os lados — só não tinha água gelada, pois não me lembrara de encher 
as garrafas […].
A um canto do quarto um monte de roupas crescia. […]
Eu poderia enfrentar tudo […] até que um dia, comecei a sentir no ar um vago mau cheiro. 
Intrigado, olhei as solas dos sapatos, saí farejando o ar aqui e ali e acabei sendo conduzidoà 
cozinha, onde ultimamente já não ousava entrar.
[…]
Na panela, a carne assada que a empregada gentilmente deixara preparada para mim, se descom-
punha num asqueroso caldo putrefato, onde pequenas formas brancas se agitavam.
Mudei-me no mesmo dia para um hotel.
Fernando Sabino
O cronista, escrevendo em primeira pessoa, reflete sobre um fato corriqueiro urbano — 
férias para a empregada. As impressões transcritas são do ponto de vista masculino, do ho-
mem que não sabe absolutamente nada sobre o serviço doméstico. Os fatos são colocados 
com humor, característica de um tipo de crônica: geladeira que faz gelo por todo lado, mas 
não possui água gelada; roupa suja acumulada… e a insensibilidade dele em não perceber a 
carne assada que, estragada, conseguiu movê-lo para… um hotel.
Na crônica, aparece a linguagem coloquial: “monte”; “farejando aqui e ali”…
E ainda que a crônica seja humorística, na conclusão, existe uma reflexão a ser feita: as limita-
ções encontradas por muitos homens, quando se encontram sozinhos e precisam resolver questões 
domésticas, e o valor a ser atribuído ao trabalho da empregada doméstica que quase sempre é 
percebido apenas quando elas se ausentam.
Eu sei, mas não devia
Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia. A gente se acostuma a morar em apar-
tamento de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E porque não tem 
vistas, logo se acostuma a não olhar mais para fora, a não abrir as cortinas. E à medida que 
se acostuma, esquece o sol, o ar, a amplidão.
A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado, porque está na hora. A to-
mar café correndo, a ler o jornal no ônibus, porque não pode perder tempo […].
A gente se acostuma a coisas demais para não sofrer. […] A gente se acostuma para 
poupar a vida […]
Marina Colasanti
“Eu sei, mas não devia” é típica crônica reflexiva. Deixa pressuposta a enumeração de espaços 
e atitudes que poderiam ser fascinantes — apartamento de frente, com sol, ar e amplidão; co-
mer, degustando, e não sobressaltado. Tudo isso, porém, é lentamente esquecido e não desfrutado 
pelas pessoas. E mesmo quando essas pessoas têm a percepção desse cotidiano ruim, a realidade 
em que estão inseridas não permite que transformem a sua existência em algo mais prazeroso.
Desse modo, acostumam-se à pequenez, ao limitado, ao desconforto, à pressa, buscando 
poupar a vida, sem perceber que é a vida que se esvazia e se gasta, no percurso…
Ponte aérea
Os jornais não deram destaque, nenhum deles contou a história do servo-croata que pas-
sou horas detido no aeroporto do Galeão. Ele visitara o Corcovado, se esborrachara nas esca-
das que dão acesso ao Cristo, teve de colocar grampos metálicos na cabeça do fêmur, meses 
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depois tentou voltar para casa.
Ao passar pelo detector de metais, o servo-croata apitou por todos os poros. Sem falar 
português, foi levado para uma sala, despido e pesquisado. Convocaram uns cães que fareja-
ram o cara de alto a baixo. Mais sofreria, se um policial, que fi zera um curso não sei onde, não 
entendesse o que ele tentava explicar.
CONY, Carlos Heitor.
In: Folha de S.Paulo,
5 abr. 2011.
A crônica de Cony é simples. Conta uma cena vivenciada no aeroporto do Galeão e não regis-
trada por nenhum jornal, somente pelo cronista. O fato, rotineiro em um aeroporto, revela carac-
terística marcante da crônica — a não percepção de circunstâncias corriqueiras que acontecem à 
maioria das pessoas.
Para o registro do acontecimento, o cronista emprega linguagem bem coloquial: “esborracha-
ra”; “apitou por todos os poros”; “cães farejaram o cara de alto a baixo”…
Qualquer leitor, ao ler a crônica, irá se lembrar de cena semelhante já vista, como simples es-
pectador ou na situação do servo-croata.
Bomba, em inglês
Relatório de uma instituição internacional que mede a proficiência (habilidade) em 
inglês testou dois milhões de pessoas de 16 a 30 anos em 44 países. O Brasil pegou um 
opaco 31o lugar. É mais uma derrota para as nossas cores em educação. Isto num país em 
que, ao sair à rua, ligar a TV, o cidadão é assolado pela língua inglesa.
Nenhuma loja brasileira faz mais liquidação — oferece sales ou 50% off . Ninguém faz en-
tregas — faz delivery. Ponta de estoque é outlet. Um resort promete all inclusive […].
Aliás, nada supera as legendas dos filmes em DVD. O rapaz pergunta à moça “Are 
you in love?” (Está apaixonada?). E a legenda: “Você está no amor?”. Mais hilariante 
mesmo é o personagem que se descabela e grita “I can’t help myself!” (Não consigo 
evitar!), enquanto a legenda diz: “Não posso ajudar a mim mesmo!”
Pensando bem, o 31o lugar está muito bom.
CASTRO, Ruy.
In: Folha de S.Paulo, 6 abr. 2011.
A partir do título: “Bomba, em inglês” (linguagem informal com signifi cado de reprovação), o 
cronista refl ete, com leveza, sobre o desempenho medíocre do país em exame de profi ciência em 
inglês. Inclui ainda humor, ao enumerar, com ironia, situações em que os brasileiros substituem 
a língua portuguesa pela inglesa, no dia a dia, além da confusão encontrada nas legendas, em 
português, dos diálogos, em inglês.
Agora veja se, após a leitura de várias crônicas, algumas características fi caram evidentes para 
você reconhecer esse gênero textual.
 Quem apresenta os acontecimentos ou as refl exões é o narrador, pois o cronista é a fi gura de 
“carne e osso”, aquele que escreveu o texto, o seu autor.
 O assunto é sempre o resultado da perspicácia do cronista: eventos do cotidiano, fatos do noti-
ciário; incidentes domésticos; situações inusitadas etc.
 A crônica possui linguagem própria; nasceu a partir de textos que eram publicados em jornais 
ou em revistas; normalmente é um texto breve.
 O desfecho costuma apresentar refl exões sobre o assunto abordado.
 As personagens são levemente caracterizadas, com traços genéricos, geralmente sem nomes pró-
prios: a moça, a velha, o deputado, a mulher, a dona de casa, seu Chiquinho, dona Nina etc.
 Muitas vezes, o cronista conversa com o leitor. 1
 OBSERVAÇÃO
 1 As crônicas podem ser escritas em 
primeira ou em terceira pessoa e 
são classifi cadas como textos:
 descritivos,
 narrativos,
 narrativo-descritivos,
 de humor,
 refl exivos,
 metalinguísticos,
 poéticos e ainda outros.
20 O Discurso Narrativo II
ATIVIDADES
Leia o trecho da crônica a seguir e responda às questões de 1 
e 2.
Depois entrou em casa: entrou e parece que não gostou 
ou não entendeu. Foi perguntando onde é que ficava o 
elevador. E sabendo que não havia elevador, indagou 
como é que se ia para cima. Nós explicamos que não 
havia lá em cima. Ele ficou completamente perplexo e 
quis saber onde é que o povo morava. E não acreditou 
direito quando lhe afi rmamos que não havia mais povo, só 
nós. Calou-se, percorreu o resto da casa e as dependên-
cias, se aprovou, não disse. Mas, à porta da sala de jantar, 
inesperadamente, deu com o quintal. Perguntou se era o 
Russell. Perguntou se tinha escorrega, se tinha gangorra. 
Perguntou onde é que estavam “os outros meninos”. Cla-
ro que achava singular e até meio suspeito aquela porção 
de terra e árvores sem ninguém dentro.
Todas essas observações, fê-las ainda do degrau da 
sala. Afinal, estirou tentativamente a ponta do pé, ta-
teou o chão, resolveu explorar aquela floresta virgem. 
Sacudia os galhos baixos das fruteiras, arrancava fo-
lhas que mastigava um pouco, depois cuspia. Rodeou 
o poço, devagarinho, sem saber o que havia por trás 
daquele muro redondo e branco, coberto de madeira. 
Enfim, chegou debaixo da goiabeira grande, onde se 
via uma goiaba madura, enorme. Declarou então que 
queria comer aquela pera. Lembrei-me do Padre Car-
dim — não era o Padre Cardim? — que definia goiabas 
como “espécie de peros, pequenos no tamanho” —, 
onde se vê que os clássicos e as crianças acabam sem-
pre se encontrando. Decerto porque uns e outros vão 
apanhar a verdade nas suas fontes naturais.
QUEIROZ, Rachel. Conversa de menino. São Paulo: Global, 2004.(Me-
lhores Crônicas.)
 1 A crônica de Rachel de Queiroz classifi ca-se, predominantemen-
te, como:
a) descritiva.
b) narrativa.
c) de humor.
d) metalinguística.
e) poética.
 2 (U. E. Londrina-PR) Com base no texto, julgue (V ou F) as afi r-
mativas a seguir.
( ) Em “Mas, à porta da sala de jantar, inesperadamente, deu 
com o quintal”, há uma expressão informal que revela o 
modo de o narrador adulto se distanciar da perspectiva 
do menino.
( ) Em “Todas essas observações, fê-las ainda do degrau da 
sala”, há o emprego de linguagem formal exemplifi cada 
pelo uso da ênclise.
( ) Em “Enfi m, chegou debaixo da goiabeira grande, onde 
se via uma goiaba madura, enorme”, as perspectivas do 
narrador adulto e do menino aproximam-se por meio do 
uso do pronome “se”.
( ) Em “Decerto porque uns e outros vão apanhar a verdade 
nas suas fontes naturais”, há a formulação de uma refl exão 
do narrador adulto motivada por observações do compor-
tamento geral de crianças.
 3 (UEAL) Leia um trecho da crônica “A carta”, de Rubem Braga.
Existe, no jornal em que trabalho, como existe em muitos 
jornais, um redator essencialmente agrícola. É um homem 
encarregado de explicar diariamente aos seus leitores qual 
o melhor meio de plantar batatas. Recebe do interior mis-
teriosos embrulhinhos registrados, contendo lagartas, pe-
dacinhos de raízes e punhados de terra, para opinar sobre 
esses objetos. E opina. É um of ício heroico, remediar a dis-
tância a dor de barriga de um porco ou matar os insetos que 
atacam um pé de abacate situado a novecentos e cinquenta 
quilômetros da redação do jornal.
Na sua correspondência de hoje, o meu colega recebeu uma 
carta que o deixou profundamente triste. Passou-a à minha 
mesa, dizendo que eu devo respondê-la. Na sua opinião, 
eu sou um literato, e a carta é de literata. Veio de Lençóis. 
Quem a assina […] é uma senhorita que, estando profun-
damente sem ter o que fazer, diverte-se escrevendo cartas 
anônimas a todos os jornalistas. […]
Creio que mora em alguma fazenda, onde se entrega à 
contemplação da natureza e à leitura de bons livros. Ela 
mandou dizer ao meu colega agrícola […] que está procu-
rando se consolar, no campo, das mágoas que a cidade lhe 
causou. E pede conselhos minuciosos a respeito.
Apud FRANCHETTI, Paulo Elias Allane e PECORA, 
Antônio Alcir Bernardez. Rubem Braga — 
Literatura comentada. São Paulo: Abril, 1980. 
Levando-se em consideração esse trecho, depreende-se que as 
crônicas, em geral:
a) expressam-se por meio de linguagem formal e rebuscada 
que visa se distanciar do coloquial.
b) têm semelhanças com a notícia, texto em que o repórter 
também deve ser impessoal ao relatar os fatos.
c) optam por expressões poéticas, não admitindo observações 
irônicas ou cômicas por parte do narrador.
d) são textos que, por sua extensão, se tornam inadequados 
para a publicação em jornais e revistas.
e) apresentam narrador em primeira pessoa o qual se atém a 
eventos do cotidiano para elaborar o texto.
Na crônica predomina a narração. 
Os verbos no passado mostram as 
mudanças operadas pela ação da 
personagem.
Alternativa b.
F
F
V
V
3. A questão é sobre a defi nição do gênero crônica, em que o narrador é o próprio 
cronista, portanto, geralmente, narra em primeira pessoa eventos do cotidiano.
Alternativa e.
2. Na primeira afi rmação, não há expressão informal e, se houvesse, aproximaria o 
adulto da criança ao invés de distanciá-los. O pronome “se” de que trata a terceira 
afi rmação não é responsável por aproximar as pers-
pectivas do adulto e da criança.
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 4 (Fuvest-SP, adaptada) Leia o excerto.
Ninguém mais vive, reparou? Vivencia. “Estou vivenciando 
um momento dif ícil”, diz Maricotinha. Fico penalizado, mas 
fi caria mais se Maricotinha estivesse passando por ou viven-
do aquele momento dif ícil. Há uma diferença, diz o dicioná-
rio. Viver é ter vida, existir. Vivenciar também é viver, mas 
implica uma espécie de refl exão ou de sentir. Não é o caso de 
Maricotinha. O que ela quer dizer é viver, passar por. Mas 
disse vivenciar porque é assim que, ultimamente, os pe-
dantes a ensinaram a falar.
Adaptado de Ruy Castro. In: Folha de S.Paulo, 27 jun. 2012. 
Preencha a lacuna da frase, empregando o verbo viver ou o 
verbo vivenciar, de acordo com a preferência do autor do texto. 
Justifi que sua escolha.
a) Quem já viveu a perda de um parente conhece 
a dor que estou sentindo.
b) No trecho “os pedantes a ensinaram a falar”, a pa-
lavra “pedante”, considerada no contexto, pode ser
substituída por pretensioso .
 5 +Enem [H18] Leia o texto a seguir.
O seguro morreu de chato
Toda longa caminhada começa com um primeiro post 
usando o aplicativo da Nike.
Passarinho que come pedra andou usando tóxico.
De grão em grão, a galinha tem uma alimentação super rica 
em fi bras.
Em briga de marido e mulher, se chama a polícia.
Se Maomé não vai à montanha, é porque ela está sendo 
bombardeada.
Quem conta seus males, espanta.
O pior cego é o Andrea Bocelli.
Os cães ladram, a caravana para pra postar foto de cachorro 
no Instagram.
Quem não arrisca, não morre de atropelamento.
Casa de Ferrero, espeto de Lindt.
O Santos, em casa, não faz milagre.
A fé move montanhas de dinheiro.
Nunca diga nunca, a não ser em ditados.
A pressa é inimiga da perfeição e deseja a ela vida longa pra 
que ela veja cada dia mais sua vitória.
Água mole em pedra dura tanto bate até que cansa.
Quem espera sempre cansa.
Quem não tem net, caça com gato.
A justiça tarda, mas antes tarde do que nunca diga nunca 
diga dessa água não beberei.
Antes tarde do que só depois do Globo Repórter.
O seguro morreu de chato.
A voz do povo é a voz da Claudia Leitte.
Cabeça vazia, ofi cina do pastor.
Todos os caminhos levam ao coma.
Um olho no gato, outro no namorado dele.
Jogar Chávez para colher Maduro.
Uma andorinha não faz ideia.
Aos amigos, a justiça brasileira. Aos inimigos, a malha fi na.
Gregorio Duvivier. Folha de S.Paulo, 28 jul. 2014.
Na crônica de Duvivier, a estratégia para gerar o efeito de hu-
mor decorre do(a):
a) linguagem rebuscada empregada pelo narrador no trata-
mento do assunto.
b) inserção de diálogo com o leitor acerca do acontecimento 
narrado.
c) referência a frases prontas para elaborar outra com sentido 
diferente.
d) referência a histórias bíblicas de forma descontextualizada.
e) contraste entre o tema abordado e a linguagem usada.
PARA PRATICARCOMPLEMENTARES
As questões de 6 a 8 tomam por base uma passagem da crônica 
“O pai, hoje e amanhã”, de Carlos Drummond de Andrade.
A civilização industrial, entidade abstrata, nem por isso me-
nos poderosa, encomendou à ciência aplicada a execução 
de um projeto extremamente concreto: a fabricação do ser 
humano sem pais.
A ciência aplicada faz o possível para aviar a encomenda 
a médio prazo. Já venceu a primeira etapa, com a insemi-
nação artifi cial, que, de um lado, acelera a produtividade 
dos rebanhos (resultado econômico) e, de outro, anestesia 
o sentimento fi lial (resultado moral).
O ser humano concebido por esse processo tanto pode con-
siderar-se fi lho de dois pais como de nenhum. Em fase mais 
evoluída, o chamado bebê de proveta dispensará a incuba-
ção em ventre materno, desenvolvendo-se sob condições 
artifi ciais plenamente satisfatórias. Nenhum vínculo de me-
O verbo que preenche adequadamente a lacuna é viver. Para o cronista, viver, e 
não vivenciar, deve ser empregado no sentido de “passar por uma experiência”, 
pois vivenciar implicaria também uma atitude refl exiva.
O vocábulo “pedante” pode ser substituído por “pretensioso”, no sentido de 
“aquele que se pretende culto, alardeando conhecimento que não possui”.
5. O autor faz referência a frases prontas/ditados populares com a intenção de criar humor e, ao mesmo tempo, 
faz uma crítica àquilo que se aceita como sabedoria popular que, em muitos casos, é questionável. Alternativa c. 
22 O Discurso Narrativo II
mória, gratidão, amor, interesse, costume— direi mesmo: 
de ressentimento ou ódio — o ligará a qualquer pessoa res-
ponsável por seu aparecimento. O sêmen, anônimo, obtido 
por masturbação profi ssional e recolhido ao banco especia-
lizado, por sua vez cederá lugar ao gerador sintético, extraí-
do de recursos da natureza vegetal e mineral. Estará aboli-
da, assim, qualquer participação consciente do homem e da 
mulher no preparo e formação de uma unidade humana. 
Esta será produzida sob critérios políticos e econômicos 
tecnicamente estabelecidos, que excluem a inútil e mesmo 
perturbadora intromissão do casal. Pai? Mito do passado.
Aparentemente, tal projeto parece coincidir com a tendên-
cia, acentuada nos últimos anos, de se contestar a fi gura tra-
dicional do pai. Eliminando-se a presença incômoda, ter-
-se-ia realizado o ideal de inúmeros jovens que se revoltam 
contra ela — o pai de família e o pai social, o governo, a lei 
— e aspiram à vida isenta de compromissos com valores do 
passado.
Julgo ilusória esta interpretação. O projeto tecnológico de 
eliminação do pai vai longe demais no caminho da quebra 
de padrões. A meu ver, a insubmissão dos fi lhos aos pais 
é fenômeno que envolve novo conceito de relações, e não 
ruptura de relações.
De notícias e não notícias faz-se a crônica, 1975.
 6 (Vunesp) Com ironia e fi ngida concordância, o cronista afi rma 
que o resultado fi nal do projeto encomendado à ciência apli-
cada será:
a) a prova de que a ciência é mais poderosa que qualquer 
divindade.
b) o monopólio genético, com um só país produzindo a popu-
lação.
c) a eliminação das diferenças culturais no planeta.
d) a exclusão dos pais na geração de bebês.
e) a criação de androides, que substituirão os seres humanos.
 7 (Vunesp) De acordo com a crônica, o autor acredita que a inse-
minação artifi cial apresentará uma consequência no sistema de 
valores familiares:
a) anestesia do sentimento fi lial.
b) negação do poder de Deus.
c) valorização da fi gura paterna.
d) divinização da ciência.
e) quebra das leis da natureza.
 8 (Vunesp) “Pai? Mito do passado.” 
Esta pergunta e sua resposta, de acordo com o conteúdo da 
crônica, sintetizam um dos argumentos que, aparentemente, 
fundamentaram o projeto:
a) a autoridade dos fi lhos sobre os pais foi a base da civilização.
b) a fi gura paterna é necessária à sociedade.
c) a mãe educa melhor o fi lho para a vida real.
d) a estrutura familiar não foi descrita em mitos e lendas.
e) a função do pai é hoje ultrapassada e dispensável.
TAREFA PROPOSTA
Texto para as questões de 1 a 3.
O culpado é ele mesmo
Relutei em tocar nesse assunto, não só porque já se escreveu 
muito sobre ele, como porque, ao abordá-lo, passo a inte-
grar a “glória” póstuma com que sempre contam crimino-
sos como o autor da recente matança de escolares no Rio de 
Janeiro. Desprezados, ofendidos, marginalizados, humilha-
dos, ignorados, esses assassinos sabem, porque se espelham 
em precedentes, que, depois de sua morte, serão fi nalmente 
vistos e comentados e sua foto será estampada por jornais, 
revistas e cadeias de televisão. […]
A impressão que às vezes se tem é que ninguém é mais res-
ponsável por nada. Acredita-se numa espécie de determi-
nismo para o comportamento humano, que seria sempre 
efeito de “causas” como a pobreza, a ignorância ou a injus-
tiça. Não tivesse o inocente sido vitimado por elas, não se 
tornaria criminoso, como se os pobres, os ignorantes e os 
injustiçados fossem majoritária e necessariamente crimino-
sos. A ruindade, a mesquinharia, a inclinação pela violência, 
a inveja, a cobiça, o egocentrismo, o cultivo dos maus senti-
mentos, nada disso é levado em conta. […]
Quando o criminoso apresenta problemas de saúde mental, 
não pode ser responsabilizado pelos seus atos. Então quem 
pode? […] 
[…] Acho que não dá para se pôr no lugar das mães e dos pais 
atingidos, somente eles sabem do que passaram, do que estão 
passando e do que nunca passará. […]
[…] A fi losofi a do nosso sistema penal é a recuperação do 
criminoso, mas tem gente que é ruim irrecuperavelmente 
e quem quiser pode chamar isso de doença. Que diferença 
faz, notadamente para as vítimas?
[…]
RIBEIRO, João Ubaldo. In: O Estado de S. Paulo, 17 abr. 2011.
 1 Sobre a crônica, assinale o que for correto:
a) O cronista aproveita-se de um fato que causou espanto e 
indignação a toda a sociedade brasileira e leva o leitor a 
As respostas encontram-se no portal, em Resoluções e Gabaritos.
23
P
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O Discurso Narrativo II
refl etir sobre a ação da justiça em nosso país.
b) O cronista narra um fato que ocorreu na cidade do Rio de 
Janeiro que tem como culpada a própria sociedade.
c) Para o cronista, a ruindade, a mesquinharia, a inclinação 
pela violência, a inveja, a cobiça, o egocentrismo, o cultivo 
dos maus sentimentos, nada disso pode ser levado em conta 
no julgamento do fato.
d) O cronista coloca-se no lugar dos familiares das vítimas e 
demonstra saber o que eles realmente sentiram naquele 
momento.
e) Para o cronista o nosso sistema penal é efi ciente na recupe-
ração de criminosos.
 2 Podemos classifi car a crônica como:
a) narrativo-descritiva.
b) metalinguística.
c) refl exiva.
d) poética.
e) humorística.
 3 No início da crônica, João Ubaldo Ribeiro afi rma ter relutado 
em tocar no assunto que desenvolve em seu texto. Ele revela 
por que não queria escrever sobre o ocorrido?
Texto para as questões de 4 a 6.
A pátria de ponteiros
Numa demonstração de abertura e inequívoca coragem, Fritz 
pediu uma feijoada. Eu comentei que, aparentemente, ele não 
estava tendo difi culdades de adaptação. O alemão disse que não. 
Por conta do seu trabalho — instala e conserta máquinas de to-
mografi a computadorizada —, viajava o mundo todo. A única 
coisa que lhe incomodava, no Brasil, era nunca saber quando as 
pessoas chegariam aos encontros. O problema era menos o atra-
so, confessou, do que nossa difi culdade em admiti-lo: “O pessoa 
manda mensagem, diz ‘tô chegando!’, eu levanta do minha ca-
deirrra e olha prrro porrrta da restaurrrante, mas pessoa chega 
só quarrrenta minutos depois”. Então me fez a pergunta que só 
poderia vir de um compatriota de Imanuel Kant: “‘Quando a 
brrrasileirrro diz tô chegando!’, em quanto tempo brrrrasileirrro 
chega?”.
Pensei em mentir, em dizer que uns atrasam, mas outros 
aparecem rapidinho. Achei, porém, que em nome de nossa 
dignidade — ali, naquela mesa, eu era a “pátria de ponteiros” 
— o melhor seria falar a verdade: “Fritz, é assim: quando o 
brasileiro diz ‘tô chegando!’ é porque, na real, ele tá saindo”. 
Tentei atenuar o assombro do alemão: veja, não é exatamente 
mentira, afi nal, ao pôr o pé pra fora de casa dá-se início ao 
processo de chegada, assim como ao sair do útero se começa 
a caminhar para a cova. É só uma questão de perspectiva.
“Mas e quando o pessoa diz ‘tô saindo!’?” Expliquei que as 
declarações do brasileiro, no que tange ao atraso, estão sem-
pre uma etapa à frente da realidade — são uma manifestação 
do seu desejo. Se a pessoa diz que está chegando, é porque tá 
saindo, e se diz que tá saindo, é porque ainda precisa tomar 
banho, tirar a roupa da máquina e botar comida pro cachorro.
Fritz fi cou pensativo. Uma morena entrou no bar e percebi 
certa reverberação nos hormônios teutões. Era a chance de 
mudar de assunto, mas eu havia sido mordido pela mosca 
da sinceridade e resolvi ir até o fi m: revelei que, além do 
“tô chegando!” e do “tô saindo!”, ele teria de aprender a lidar 
com “chego em 15!” e “cinco minutinhos!”.
“Chego em 15!” é sinônimo de “tô chegando!”: quer dizer 
que o patrício está saindo. Quinze minutos é o tempo má-
gico que o brasileiro acredita gastar em qualquer percurso 
— a despeito da experiência, da Sulamérica trânsito e do 
Waze. Da Mooca pra USP? “Chego em 15!” De Santo Amaro 
pra Cantareira? “Quinze!” Mais uma vez, não é propriamente 
mentira. Se pegássemos todos os faróis abertos e todos os 
carros saíssem da nossa frente, em tese, vai que…?
Já o “cinco minutinhos!” é um pouco mais vago. Pode

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