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Hermenêutica Filosófica-Aula 4

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Disciplina: Hermenêutica Filosó�ca
Aula 4: Escolas hermenêuticas (�losó�ca e jurídica)
Apresentação
Dentro da re�exão sobre as escolas hermenêuticas, é necessário que se tenha a compreensão da
importante contribuição �losó�ca e jurídica para o desenvolvimento do conceito.
Nesta aula, estudaremos a hermenêutica �losó�ca e a hermenêutica jurídica. Veremos que, na �loso�a, o
conceito de hermenêutica foi introduzido por Schleiermacher, no século XIX, in�uenciado pela exegese
teológica, e que Gadamer ampliou a re�exão de hermenêutica �losó�ca sob o olhar de que ela interpreta
não somente os textos, mas a vida humana.
Notaremos ainda que a jurídica está intimamente ligada à interpretação das leis por meio da
compreensão de justiça e de Estado e que, dentro da hermenêutica jurídica, existem várias correntes de
interpretação das leis.
Objetivos
Reconhecer as características da hermenêutica �losó�ca;
Listar a hermenêutica jurídica com algumas correntes de interpretação.
Conceito
A re�exão �losó�ca sobre hermenêutica é recente, apesar de outros pensadores re�etirem sobre ela, foi
somente Friedrich Daniel Ernest Schleiermacher que sistematizou o processo hermenêutico.
Antes dele, Friedrich Ast a�rmava que a hermenêutica era a técnica de descobrir o pensamento do autor e
Friedrich Wolf defendia que a hermenêutica era fundamental para compreender o que nos causava
estranheza, isto é, interpretar somente os textos obscuros.
1
 Friedrich Daniel Ernest Schleiermacher. (Fonte: Wikipedia)
Veja as principais colaborações que Schleiermacher introduziu na história da hermenêutica:
Concepção de uma
hermenêutica geral.
Superação do pensamento
de Ast e Wolf.
Reconhecimento de ter um
círculo hermenêutico.
Importante ressaltar que a principal importância de Schleiermacher para a
hermenêutica foi a criação de uma teoria sobre a hermenêutica geral, desligando-a da
disciplina de teologia e �lologia.
https://stecine.azureedge.net/webaula/estacio/go0020/aula4.html
A autonomia da hermenêutica
A hermenêutica a partir de Schleiermacher é autônoma. Assim sendo, é concebida como um processo
universal que tem por intenção a interpretação de qualquer tipo de texto, independentemente da ciência e de
seu conteúdo.

Os pressupostos filosóficos de Schleiermacher que permitem desenvolver a
hermenêutica como uma ciência, residem na ideia de que, no diálogo entre os homens, a
estranheza é uma constante, na medida em que a carga de vida e as experiências
particulares constroem os seres humanos diversos um dos outros.
(MAZOTTI, 2010, p.21)
A re�exão de Schleiermacher vai além das propostas de seus antecessores, pois não é somente o texto que
deve ser interpretado, mas a compreensão do sujeito, em que não é possível separar o texto do autor.
Comentário
Esses dois aspectos são chamados por Schleiermacher de interpretação gramatical e interpretação
psicológica. Ele buscou fazer com que a hermenêutica geral se aproximasse dos padrões de cienti�cidade,
que era o objetivo da sonhada autonomia da hermenêutica.
Como Schleiermacher tinha a tradição religiosa em sua vida, buscou que a compreensão das sagradas
escrituras e os textos da antiguidade clássica fossem libertos do interesse dogmático da época, pois esse
interesse tinha como por objetivo revelar as verdades ocultas do texto. Ele procurou apenas a interpretação
da essência, do sentido e do pensamento do autor contido no texto.
É importante ressaltar que Schleiermacher não criou a ideia de círculo hermenêutico.
O objetivo dele era a reconstrução do pensamento do autor do texto. Compreender o texto, e arte de
reconstruir o pensamento de outra pessoa. A ênfase que aponta em seu pensamento é sobre os aspectos
gramaticais e psicológicos da interpretação.
Gadamer
Hans-Georg Gadamer é considerado um dos maiores �lósofos no campo da hermenêutica �losó�ca. O seu
pensamento in�uenciou muito as características do método hermenêutico �losó�co, mas também outras
escolas hermenêuticas.
 (Fonte: tomertu / Shutterstock)
Gadamer foi discípulo de Edmundo Husserl e Martin Heidegger, que acompanhou a sua habilitação
acadêmica sobre a �loso�a grega. A sua principal obra foi Verdade e Método, na qual faz uma crítica à ênfase
no método como a única forma de conhecimento verdadeiro. A nova perspectiva anunciada por ele se
fundamentou na ontologia da linguagem.
Gadamer sabia como o método é importante para as ciências, mas não concordava
com a pretensão de universalidade e o fundamento para a validade do conhecimento.

Por isso, desde sua origem histórica, o problema da hermenêutica ultrapassa os limites
que lhe são impostos pelo conceito metodológico da ciência moderna. Compreender e
interpretar textos não é um expediente reservado apenas à ciência, mas pertence
claramente ao todo da experiência do homem no mundo. Na sua origem, o fenômeno
hermenêutico não é, de forma alguma, um problema de método.
(GADAMER, 2015, p.29)
A hermenêutica para Gadamer vai muito mais além da interpretação do texto e de suas técnicas, a
interpretação é a compreensão da vida do ser humano perante o mundo. Podemos dizer, assim, que
hermenêutica é a interpretação das relações e do mundo.
Círculo hermenêutico
Uma importante ideia apresentada por ele é a do círculo hermenêutico, que já era aceito dentro da �lologia e
da teologia como um aspecto formal.
Para Gadamer, esse círculo não é compreendido somente como a relação entre o todo e as partes.
Vai muito mais além...

Quem quiser compreender um texto, realiza sempre um projetar. Tão logo apareça um
primeiro sentido no texto, o intérprete prelineia um sentido do todo. Naturalmente que
o sentido somente se manifesta porque quem lê o texto lê a partir de determinadas
expectativas e na perspectiva de um sentido determinado. A compreensão do que está
posto no texto consiste precisamente na elaboração desse projeto prévio, que,
obviamente, tem que ir sendo constantemente revisado com base no que se dá
conforme se avança na penetração do sentido.
(GADAMER, 2015, p.356)
Ele admite também que a hermenêutica e a compreensão das coisas, como um processo de linguagem,
sofreu in�uência da �loso�a da linguagem. O fenômeno de compreensão das coisas só é possível porque se
tem acesso à linguagem.

A linguagem aqui tem como função existir e representar o mundo. Sendo assim, não é concebida como uma mera junção de palavras, mas uma forma de
interligar a compreensão do homem com o mundo. (Fonte: pathdoc / Shutterstock)
Paul Ricoeur
Na escola da hermenêutica �losó�ca também podemos falar de Paul Ricoeur (1913 – 2005), como um dos
�lósofos que pensaram sobre a hermenêutica.

Paul Ricoeur resgata uma definição de hermenêutica próxima da definição histórica.
Para Ricoeur, a hermenêutica é a teoria de regras que governam a interpretação de um
determinado texto ou conjunto de sinais suscetíveis de serem considerados como
textos.
(MAZOTTI, 2010, p.42)
O objetivo da hermenêutica como interpretação é tentar que o intérprete consiga superar a distância em que
o texto foi escrito e o momento em que o intérprete se encontra. E a hermenêutica se transforma em �loso�a
quando o intérprete, por meio da leitura dos textos, re�ete sobre a sua própria existência, buscando encontrar
um sentido da vida através dos textos e não qual era o sentido que o autor queria expressar.
A hermenêutica, no pensamento de Paul Ricoeur, superou a dimensão de procurar qual o sentido que o autor
quis passar, se preocupando em entender a presença do intérprete no mundo, o “ser-no-mundo” através do
texto.
Comentário
Uma ideia introduzida por Paul Ricoeur na hermenêutica é a re�exão sobre a “hermenêutica da
descon�ança”. Esse aspecto do pensamento de Ricoeur é fortemente in�uenciado pelos grandes mestres da
descon�ança: Marx, Freud e Nietzsche. Essa hermenêutica é necessária para superar o impasse das teorias
modernas de Schleiermacher a Gadamer.
Hermenêutica jurídica
Neste momento, vamos entrar em contato com outra escola hermenêutica: a jurídica.Existem duas maneiras de classi�car e estudar as escolas jurídicas, a primeira trata do aspecto formal com a
interpretação da lei puramente instrumental e a segunda com aspectos ideológicos e �losó�cos que de�ne a
essência da lei.
 (Fonte: Indypendenz / Shutterstock)
É importante ressaltar que o surgimento destas escolas re�ete uma compreensão de
Estado e de justiça em sua época.
Métodos de interpretação das leis ou normas
Na hermenêutica jurídica, existem vários métodos de interpretação das leis ou normas. Agora, vamos
conhecer de maneira rápida alguns deles:
Clique nos botões para ver as informações.
O método gramatical ou literal foi criado com uma in�uência muito grande da escola bíblica, no sentido
de buscar o sentido literal do texto. Esse método teve também uma in�uência da Revolução Francesa de
1789.
No máximo, o que era permitido eram algumas considerações sintáticas, morfológicas e semânticas da
norma.
O método gramatical elimina o trabalho subjetivo do intérprete ao pregar su�ciência da lei. Não mostra a
vontade que o sujeito tem de interpretar o sistema normativo. Seu objetivo é mostrar a aplicação justa da
lei e a soberania das Assembleias Legislativas.
Método gramatical ou literal 

O código francês, assim como as Escrituras Sagradas, eram obras divinas
e, como tais, não podiam ter seu sentido alterado. Ao homem, cabia
apenas a percepção do texto tal como ele se apresentava.
(MAZOTTI, 2010, p.54)
O método exegético aceita as premissas das normas, mas apresenta e reconhece a importância da
investigação do espírito legislador. Existe uma diferença entre o método gramatical e o exegético, pois o
gramatical tem um apego muito grande à expressão literal da lei, e o exegético demonstra a vontade do
legislador. Porém, isso não impede que os dois dialoguem.
Podemos veri�car nesse conceito uma identi�cação com a �loso�a de Schleiermacher, em que o
discurso só é entendido pelo afastamento do seu autor.
O método exegético não elimina uma visão ideológica para a�rmar seu valor. Com a Revolução Francesa,
a burguesia ascendeu socialmente e ocupou o parlamento. Através desse método eles queriam defender
seus interesses.
É importante ressaltar que a criação de um novo método imparcial revelou uma forma de manter o status
quo.
Método exegético e o espírito do legislado 

O próprio método gramatical deve ser utilizado como um estudo
introdutório filológico da norma que, a fim e a cabo, permite reforçar as
descobertas das intenções legislativas. Dessa forma, o papel do
intérprete se torna um investigar psicológico do ente abstrato
compreendido como legislador.
(MAZOTTI, 2010, p.55)
O método lógico-sistemático entende que cada artigo da lei esteja alinhado com a estrutura do todo. O
artigo só é válido se estiver em harmonia com as demais disposições legais. Logo, caso não siga essa
lógica, será considerado inválido. Essa relação da parte com o todo nos remete à ideia da retórica.
Por exigir do intérprete um conhecimento do todo, é exigido dele um conhecimento profundo dos
sentidos para encontrar ou não a ruptura entre as partes.
Quando se trata do ambiente jurídico, nem sempre as ordenações sistemáticas têm razões puramente
formais. O conteúdo das leis nem sempre permitem estabelecer critérios exatos para quali�cação e
mediação, esse aspecto foi enfatizado a partir da segunda guerra.
Método lógico-sistemático 
O método histórico nasceu na Alemanha sob os ensinamentos de Friedrich Carl Von Savigny, jurista
alemão, que nasceu em 21 de fevereiro de 1779 e morreu 25 de outubro de 1861.
É considerado o criador do método histórico onde as leis e as normas são conjuntos de leis já existentes.
Só é possível alcançar o seu signi�cado através de uma pesquisa histórica.
No método histórico, é necessário que o homem retorne às suas tradições para encontrar qual é o atual
sentido da existência.
A criação de uma lei sempre está ligada a um momento cronológico anterior à sua aplicação. Por isso,
através de uma linha histórica de interpretação, tem que investigar o que sustenta esses dois momentos:
criação e aplicação.
Método histórico 

É preciso encontrar qual é o fio condutor que nos transporta do passado
ao presente e nos conduz ao futuro. Existe uma lógica, uma razão pela
qual as coisas dão de uma forma e não de outra, e este fundamento é
histórico e deve ser evidenciado. Na medida em que o passado dialoga
com o presente, faz-se necessário realizar um juízo acerca da razão
existente na criação legislativa pretérita e sua adequação ao caso
presente.
(MAZOTTI, 2010, p.69)
Para o método teleológico, o direito é formado por desejos e aspirações que estão presentes na
sociedade. O julgador passa a ter um papel muito importante, porque, através dele, é organizada uma
conciliação entre os interesses presentes da norma que está em jogo.
As necessidades e as vontades da sociedade devem ser atendidas pela legislação, que não pode �car
refém de especulações que atrapalhem a sua e�ciência. Esse aspecto é encontrado no artigo 5º, da lei
de introdução às normas do direito brasileiro: “na aplicação da lei, o juiz atenderá aos �ns sociais a que
ele se dirige e às exigências do bem comum”.
Método teleológico 

A decisão do magistrado deve se atentar à lei, mas também aos
interesses individuais dos litigantes, estejam eles ligados a fatores
econômicos, artísticos, culturais, religiosos, ou qualquer outro.
(MAZOTTI, 2010, p.73)
François Geny foi um jurista francês que pensou em uma doutrina que estabelece de forma razoável a
integração entre o método exegético e o método histórico. Geny vai procurar preencher uma lacuna que
existe dentro do direito, pois ele não consegue legislar tudo.
Com isso, Geny a�rma que o direito não pode ser pensado separado de outras ciências, mas sim junto
com a �loso�a, religião, moral e a ideia de justiça.
Para Geny:
Quando o juiz não encontra as respostas nas normas presente no direito, ele tem a liberdade e o dever de
realizar uma pesquisa em torno dos dados racionais e ideais. Por meio dessa pesquisa poderá formular
um conceito que determine e dê solução ao caso concreto.
Método cientí�co 

[...] o trabalho do jurista é aplicar a norma jurídica da forma como ela é
positivada, sem recurso à pretensa vontade do legislador, nem às
considerações histórico-evolutivas de se adaptar a norma aos ambientes
sociais em formação.
(MAZOTTI, 2010, p.76)
Com o aparecimento da sociologia, as discussões jurídicas trouxeram novos elementos para sua
estruturação, tais como: observação, experimentação e comparação de dados.
A principal contribuição do método sociológico para o direito foi despertar nos juristas uma dimensão de
pesquisa social que até então não era muito clara. Mesmo que o texto da lei seja o mesmo, quando em
contato com as diversas realidades culturais, pode ser interpretado de maneira diferente.
Após apresentar os vários métodos jurídicos de hermenêutica, podemos fazer um paralelo com o deus
grego Hermes de onde surgiu o termo Hermenêutica. Como já vimos, Hermes era responsável por
transmitir as mensagens dos deuses do Olimpo para os humanos. Assim, no direito, a mensagem a ser
traduzida e interpretada é a lei.
A hermenêutica jurídica é um verdadeiro processo das ciências de espírito, porque o processo de
compreender e de interpretar signi�ca conhecer e reconhecer o sentido válido da re�exão.
Método sociológico 
Gabarito comentado
Atividade
1. Qual desses �lósofos é considerado o “pai da hermenêutica”?
a) Paul Ricoeur
b) Friedrich Daniel Ernst Schleiermacher
c) Hans-Georg Gadamer
d) Martin Heidegger
2. Relacione o pensamento ao seu respectivo autor.
Paul Ricoeur Hans-Georg Gadamer 1 2
a) A hermenêutica é a interpretação das relações e do mundo, e não somente a interpretação de um texto.
b) A hermenêutica é o processo de interpretação que re�ete a sua própria existência no mundo por meio dos textos.
1 2
1 2
3. Dentro da hermenêutica jurídica, qual método de interpretação foi in�uenciadopela escola bíblica?
a) Método gramatical ou literal.
b) Método exegético e o espírito do legislador.
c) Método lógico-sistemático.
d) Método sociológico.
Notas
Friedrich Daniel Ernest Schleiermacher 1
Schleiermacher (1768–1834), teólogo, �lólogo e �lósofo alemão, é classi�cado como criador da
hermenêutica moderna, enquanto disciplina geral.
Referências
MAZOTTI, Marcelo. As Escolas Hermenêuticas e o Método de Interpretação da Lei. Barueri: Manole, 2010.
SCHLEIERMACHER, F. Hermenêutica: a arte e técnica da interpretação. Petrópolis: Vozes, 2000.
GADAMER, Hans-Georg. Verdade e método I: traços fundamentais de uma hermenêutica �losó�ca. 15. ed.
Petrópolis: Vozes, 2015.
Próxima aula
Friedrich Schleiermacher;
Sistema hermenêutico �losó�co de Schleiermacher;
Schleiermacher e a linguagem.
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