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1 2 3 EDUCAÇÃO E SOCIEDADE Teoria e Prática 4 DIREÇÃO EDITORIAL: Willames Frank DIAGRAMAÇÃO: Willames Frank DESIGNER DE CAPA: Willames Frank O padrão ortográfico, o sistema de citações e referências bibliográficas são prerrogativas do autor. Da mesma forma, o conteúdo da obra é de inteira e exclusiva responsabilidade de seu autor. Todos os livros publicados pela Editora Phillos estão sob os direitos da Creative Commons 4.0 https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/deed.pt_BR 2020 Editora PHILLOS ACADEMY Av. Santa Maria, Parque Oeste, 601. Goiânia-GO www.phillosacademy.com phillosacademy@gmail.com Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) S159p BARROS. André Luís de Almeida; BRANDÃO. Hugo, Educação e Sociedade: teoria e prática. [recurso digital] / André Luís de Almeida Barros, Hugo Brandão (Orgs). – Goiânia-GO: Editora Phillos Academy, 2021. ISBN: 978-65-88994-57-3 Disponível em: http://www.phillosacademy.com 1. Educação. 2. Filosofia. 3. Ensino Médio. 4. Ensino 5. Aprendizagem. I. Título. CDD: 370 Índices para catálogo sistemático: Educação 370 https://www.cblservicos.org.br/servicos/meus-livros/visualizar/?id=4b42c3e8-1520-ec11-b6e6-00224837afbb 5 André Luís de Almeida Barros Hugo Brandão (Orgs.) EDUCAÇÃO E SOCIEDADE Teoria e Prática 6 Direção Editorial Willames Frank da Silva Nascimento Comitê Científico Editorial Dr. Alberto Vivar Flores Universidade Federal de Alagoas | UFAL (Brasil) Drª. María Josefina Israel Semino Universidade Federal do Rio Grande | FURG (Brasil) Dr. Arivaldo Sezyshta Universidade Federal da Paraíba | UFPB (Brasil) Dr. Dante Ramaglia Universidad Nacional de Cuyo | UNCUYO (Argentina) Dr. Francisco Pereira Sousa Universidade Federal de Alagoas | UFAL (Brasil) Dr. Sirio Lopez Velasco Universidade Federal do Rio Grande | FURG(Brasil) Dr. Thierno Diop Université Cheikh Anta Diop de Dakar | (Senegal) Dr. Pablo Díaz Estevez Universidad De La República Uruguay | UDELAR (Uruguai) 7 SUMÁRIO APRESENTAÇÃO ................................................................................. 8 Capítulo 1 ................................................................................................ 11 AS RELAÇÕES SOCIOFILOSÓFICAS NO ENSINO MÉDIO João André Amorim Ferreira Capítulo 2 ................................................................................................ 29 ANÁLISE DO DISCURSO E A PESQUISA DOCUMENTAL: Caminhos para pesquisa filosófica em educação Thiago Pessoa Prudente Capítulo 3 ................................................................................................ 58 A ORALIDADE NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO: ESTUDO DE CASO DAS ESCOLAS PÚBLICAS DA CIDADE DE VITÓRIA DE SANTO ANTÃO (PE) Maricleide Maria de Farias Silva Juliana Maria Lima Coelho Tarciana Cecília de Souza Ferreira Capítulo 4 ................................................................................................ 85 ENSINO DE FILOSOFIA, APRENDIZAGEM COLABORATIVA E INTERAÇÃO NO ÂMBITO DA EAD Thiago Pessoa Prudente Cleide Jane de Sá Araújo Costa Walter Matias Lima Capítulo 5 .............................................................................................. 105 O PROBLEMA DA TÉCNICA NA ÉTICA AMBIENTAL: INCIDÊNCIA PEDAGÓGICA DA RESPONSABILIDADE E DA PRECAUÇÃO Renata Rodrigues da Costa José Lucas de Omena Gusmão Capítulo 6 .............................................................................................. 135 A META 11 DO PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO E O ATUAL CONTEXTO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NOS ESTADOS DE ALAGOAS, PERNAMBUCO E SANTA CATARINA André Luis de Almeida Barros Antonio Iatanilton Damasceno de França Sandro Soares Diniz 8 APRESENTAÇÃO Tratando-se de educação, não é difícil reconhecer que constitui fenômeno social complexo e universal, inserido na trajetória humana, da Pré-História aos dias atuais. Essencialmente relacionada à capacidade de trabalhar, traço inerente e exclusivo da espécie humana, a aptidão para conhecer determinou, e determina, as formas de produção, reprodução e sofisticação dos processos de trabalho, condicionando e transformando as relações sociais como um todo, funcionando como catalizador e motor da subsistência e da cultura. E, esse dito conhecimento, não se deve entender noutro sentido, senão enquanto produção, acúmulo, sofisticação e transmissão de conhecimentos acerca da natureza e da própria espécie cuja finalidade última é a continuidade do gênero humano. Afinal, o homem é o ser que trabalha e que conhece, sendo difícil determinar até que ponto tais aptidões são causa e consequência recíprocas. Quem poderia, pois – sem incorrer em imprecisão ou redundância – afirmar que o homem trabalha, porque conhece ou que conhece, porque trabalha? Quanto às relações sociais voltadas ao trato do conhecimento, estas devem viabilizar o aperfeiçoamento cultural direcionado à valorização da espécie. Nesse sentido, a educação deve visar à eliminação das causas dos conflitos que assolam a humanidade no curso da história. Tal condição implica rechaçar processos educacionais que promovam uma continuidade de cunho reprodutivista. 9 Assim, na atualidade, a superação dos conflitos urge como meta fundamental para a educação... Nesse contexto, a presente obra traz breves contribuições especialmente voltadas à reflexão de questões relativas à educação básica no Brasil atual. À escola, contemporaneamente consagrada como lugar onde se materializa o direito fundamental à educação, cabe a tarefa basilar de desenvolver nos alunos a capacidade de compreensão da realidade. Com efeito, a educação básica lida com sujeitos em formação, aos quais deve proporcionar a melhor concepção acerca da natureza e da sociedade como dimensões gerais, essenciais e irrecusáveis da realidade humana. Assim, fomentar a melhor compreensão de mundo, incluindo a melhor percepção de si mesmo, no sentido da construção da autonomia, deve ser o maior compromisso dos profissionais da educação em face dos alunos. Para alcançar esse fim, a Pedagogia, como ciência da educação, tem papel fundamental, destinando-se a investigar objetos e meios necessários à formação de sujeitos autônomos. É preciso destacar, portanto, que, acima e além do desenvolvimento tecnológico, não se deve descuidar do homem, do sujeito do conhecimento, do operador e destinatário dos recursos tecnológicos. Esse homem que é sujeito historicamente situado, mais ainda, sócio e economicamente condicionado, o ser que é consciente de si e do tempo e que deve ser educado para ser consciente de seu tempo, de suas determinações mediante a apropriação das melhores realizações do gênero humano. 10 Esse ser que desde o desencadear do processo civilizatório, atravessou Eras na mediação transformadora que segue sua eterna marcha ao porvir. Esse a quem não se pode olvidar, que não deve olvidar-se de si como sujeito do conhecimento, da história e da sua própria história, construída incessantemente no plano concreto das práticas sociais orientadas pelo saber. É preciso, então, questionar as práticas e saberes dominantes e, especialmente, conceber quais os saberes necessários a realização das melhores práticas e relações possíveis. Os organizadores. 11 Capítulo 1 AS RELAÇÕES SOCIOFILOSÓFICAS NO ENSINO MÉDIO João André Amorim Ferreira RESUMO Tanto a Filosofia quanto a Sociologia são tratadas como disciplinas obrigatórias no Ensino Médio, devendo ser tratadas como condições integrantes desucesso para projetos transversais com outras disciplinas, fundamentais para o pleno desenvolvimento do educando. Este artigo tem como finalidade analisar os aspectos que envolvem as relações filosóficas e sociológicas no Ensino Médio. Foi realizada uma pesquisa bibliográfica a partir do levantamento dos principais autores: Almeida (2007); Del Prette e Del Prette (1996); Santos (2002); Schwartzman (2005); Stoltz (2011); Trindade e Menezes (2009) e Vasconcelos (2011), de modo a compreender os fundamentos filosóficos e sociológicos da educação e analisar como a Filosofia e Sociologia podem ser implementadas projetos inovadores no Ensino Médio. A pesquisa indica que a permanência destas disciplinas no Ensino Médio permite o fortalecimento de valores culturais, éticos e morais, onde os sujeitos estarão mais aptos a adquirirem noções mais conscientes de suas práticas enquanto cidadãos. 12 INTRODUÇÃO No Ensino Médio, a Filosofia e a Sociologia atualmente são disciplinas obrigatórias fundamentais para os projetos transversais, uma vez que são complementares a outras disciplinas, contribuindo significativamente com o pleno desenvolvimento do educando. No entanto, a obrigatoriedade nem sempre pode ser observada, pois, as mesmas haviam sido banidas do currículo educacional brasileiro desde 1971, sendo novamente inseridas no ano de 2008 a partir da Lei nº 11.684. Embora a legislação reconhecesse a importância das disciplinas para a construção da identidade dos alunos enquanto cidadãos brasileiros, a lei careceu de propostas mais eficientes e realistas, deixando à escolha das instituições de ensino às três séries que os conteúdos deveriam ser aplicados. Com isso, a problemática deste estudo parte da necessidade de compreender verdadeiramente o papel das disciplinas de Filosofia e Sociologia para o desenvolvimento integral do sujeito, considerando a construção de sua identidade enquanto cidadão e reflexão sobre os de valores e princípios de ética e da moral, solidariedade e democracia, criticidade social e político- ideológico. A hipótese que este trabalho busca comprovar é que a permanência da Filosofia e da Sociologia no ambiente educacional é fundamental para que os alunos possam desenvolver uma postura mais crítica, sendo fundamental ainda para a compreensão do 13 comportamento do ser humano enquanto sujeito nas relações sociais e a multipluralidade que envolve seu ambiente de socialização a partir de sua própria cosmovisão. Diante dessa esfera sociofilosófica, este estudo busca analisar os aspectos que envolvem o ensino de filosofia e sociologia no Ensino Médio. Para tanto, foi realizada uma pesquisa bibliográfica através de livros, artigos científicos de bases de dados reconhecidas e periódicos que abordam o assunto, proporcionando o conhecimento aprofundado necessário para a conclusão deste estudo. FILOSOFIA PARA QUÊ? Conforme relata Stoltz (2011) até os anos 90, o Brasil mantinha políticas públicas educacionais insuficientes para proporcionar o desenvolvimento socioeconômico do país consistente, sendo necessária a elaboração de propostas mais efetivas direcionadas ao atendimento das necessidades da classe mais baixa. Entretanto, os benefícios não foram colhidos pela população mais carente, pois, houve apenas a melhoria da acessibilidade nas escolas públicas, não impactando na qualidade das propostas pedagógicas, principalmente no ensino público. A educação na sociedade contemporânea enfrentou mudanças significativas com o desenvolvimento e modernização das políticas públicas voltadas para a educação iniciada no final do século XIX, vindo a se fortalecer no século XX, com o crescimento político, social 14 e econômico. A partir daí o país passou a manter propostas pedagógicas, a fim de reconstruir a sociedade brasileira, considerando a perspectiva de que uma educação com qualidade seria capaz de formar cidadãos mais conscientes (TRINDADE; MENEZES, 2009). Sem dúvida que o ensino se tornou uma prática social, onde grandes e contínuas transformações, culturais, políticas, sociais e tecnológicas, exigem que alguns comportamentos pedagógicos precisem ser imediatamente sofisticados para formar integralmente o aluno, buscando assim a construção do conhecimento contextualizado e reflexivo. Óbvio que isto permite o desenvolvimento de inúmeras vias de oportunidades e de aprendizagem, tanto para os alunos quanto para todos os profissionais da educação (SCHWARTZMAN, 2005). A aprendizagem precisa de definições mais complexas, principalmente quando relacionada às relações existentes entre as grandes estruturas das instituições educacionais e as necessidades da atual sociedade. Percebe- se que quando são formados cidadãos mais conscientes de suas funções, os projetos com atividades educacionais são considerados mais eficientes, sendo a Educação importante instrumento para o desenvolvimento social e cultural (VALLE et al, 2009). A aprendizagem significativa na modernidade está voltada para o desenvolvimento da vontade de aprender dos alunos, porém, isto não depende apenas de suas vontades próprias, mas também de inúmeras ações didáticas e projetos com atividades que permitam condições agradáveis e favoráveis para conseguir o conhecimento no ambiente educacional que permitirá uma 15 vivência através de seu processo de aprendizagem e de ensino. A probabilidade perante as habilidades do docente e de estratagemas pedagógicos tem sido bastante observada no debate desta questão. Cabe afirmar que cada aluno é capaz de realizar uma filtragem dos conteúdos e das informações importantes e significativas para si próprio. A partir deste objetivo, o aluno conseguirá a aprendizagem, passando a se manter devidamente assimilado com a construção de ideias científica, sendo possível organizar as inúmeras áreas do conhecimento que deseja aprimorar e compreender no universo de pesquisa que está ao seu redor. Neste sentido, especificamente no que se menciona ao conhecimento filosófico, Viero, Trevisan, Conte (2004, p. 93) relatam que: [...] a filosofia da educação surgiu do forte vínculo entre a filosofia e a pedagogia estabelecida no decorrer dos anos, pois a filosofia, preocupada com as formas do conhecimento perfeito, orientou o homem segundo a razão, inferindo um pensamento pedagógico que busca a perfeição. Assim, percebe- se a disciplina sendo marcada pela história do pensamento filosófico, com fundamentos e objetivos voltados aos entendimentos da tradição. De modo geral, Vasconcelos (2011, p. 10) afirma que a Filosofia da Educação “lida, na verdade, com questões aparentemente muito simples, mas que se revelam complexas, uma vez que a levamos a sério”. Estas questões investigam os aspectos históricos e atuais que impactam na construção dos elementos educacionais. 16 Para Nogueira (2009) os fundamentos filosóficos da educação são os pilares que sustentam as políticas pedagógicas, já que possuem a finalidade de proporcionar a reflexão e crítica dos conteúdos que precisam ser melhorados, sendo possível transformar a realidade dos aprendizes. Quando estes fundamentos se encontram inseridos, na prática docente, auxiliam na avaliação de estratégias e projetos que visam o aprendizado efetivo, demonstrando os benefícios das práticas educativas para o sujeito. Diante deste contexto, Santos (2007) afirma que a educação na contemporaneidade permanece embasada em uma perspectiva construtivista, onde o docente, enquanto educador busca a produção de conhecimento por meio das aquisições de experiências, permitindo o crescimento humano. Isto não significa que é preciso garantir unicamente a dimensão pedagógica. Entretanto, é essencial haver a produção de saberes participada, onde o professorserá capaz de assumir o processo educativo de forma interativa e dinâmica. O docente poderá então trocar experiências com seus alunos e partilhar conhecimentos suficientes para desenvolver ambientes de desenvolvimento mútuo. O construtivismo exige que o professor esteja preparado e capacitado para fornecer atividades e problemáticas que instiguem o aluno a se desenvolver e crescer. É indispensável que os professores mantenham os conhecimentos científicos dentro de sua área de atuação, mantendo ainda os saberes voltados para a prática da docência e para a construção do conhecimento, essenciais 17 para que este profissional possa conhecer sua própria atuação no ambiente educativo (SANTOS, 2007). Além disso, o construtivismo auxiliará na superação dos desafios encontrados no ambiente escolar que podem prejudicar o desenvolvimento dos alunos, pois, os professores desenvolverão uma postura mais crítica- reflexiva, pontuando o que deve ser mudado e quais estratégias poderão ser praticadas para melhorar a realidade da escola. De acordo com Nogueira (2009) as bases Sociológicas e Filosóficas da Educação partem do raciocínio de que as instituições escolares precisam disponibilizar profissionais, conteúdos e instrumentos didáticos que fazem parte da sociedade moderna, facilitando o engajamento dos alunos em sala de aula. Com isso, a Sociologia e a Filosofia propõem que o aprendizado seja praticado através de medidas dinâmicas, porém rigorosas, permitindo o envolvimento do aluno nas diversas teorias humanas, havendo o alcance de sensos comuns para a construção de debates e questionamentos que proporcionem o crescimento. Quando voltada para a educação, a filosofia determina que as reflexões sejam realizadas a partir das teorias, princípios e práticas pedagógicas (ALVES, 2002). Na visão de Nogueira (2009) a Filosofia é uma disciplina indispensável para os professores, pois, auxiliam na avaliação do desempenho dos alunos, propiciando o conhecimento necessário para realizar julgamentos coerentes e justos. Para o autor esses fundamentos apresentam importante papel na formação do homem 18 contemporâneo, fornecendo o saber a respeito do processo de socialização dos sujeitos. O ensino de filosofia possui a função de propor um aprendizado do pensamento através de métodos rigorosos, aumentando o potencial do pensamento em questionar as teorias alcançando um nível acima do senso comum, formando um indivíduo completamente apto a lidar com o realismo que o cerca. Quando voltada para a educação, a filosofia determina que as reflexões sejam realizadas a partir das teorias, princípios e práticas pedagógicas. Os fundamentos sociológicos influenciam diretamente a prática docente, já que o papel do professor no processo de inserção envolve a organização dos conhecimentos e experiências divulgados entre os alunos que contribuirão para que os mesmos possam desenvolver suas capacidades. Com isso, o docente se torna o responsável por liderar as ações educativas do grupo, sendo um agente moralizador que busca a harmonia da relação em grupo. Através destes fundamentos é possível identificar novas oportunidades de problematização sociológica das ações e realidades educativas, ampliando os questionamentos exercidos em sala de aula acerca da construção do conhecimento. Com isso, os professores poderão se tornar muito mais reflexivos em relação às estratégias didáticas adotadas, identificando os desafios que precisam ser superados para colocar em prática os conteúdos programáticos. 19 PERMANÊNCIA DA FILOSOFIA E SOCIOLOGIA NO CURRICULO DO ENSINO MEDIO Por sua vez, Santos (2002, p. 05) relata que a permanência da Sociologia no ambiente em sala de aula é capaz de contribuir para que o aluno desenvolva “capacidades de observação, análise e síntese que possibilitam o entendimento dos fundamentos das relações sociais, em especial, aquelas geradas pelas mudanças na produção, no conhecimento e no mundo do trabalho”. No entanto, para que a permanência de ambas as disciplinas no Ensino Médio seja eficaz e produtiva, torna- se fundamental a reforma educacional, deixando as propostas pedagógicas mais dinâmicas, flexíveis e práticas, para assim, atuar na formação de cidadãos mais conscientes e responsáveis de seus deveres e direitos na sociedade em que vivem. O exercício da cidadania atualmente não pode ser compreendido apenas através do reconhecimento da diversidade e das necessidades de cada indivíduo, mas, sobretudo viver em uma comunidade onde o respeito ao pluralismo das civilizações é fundamental, principalmente pela necessidade em combater qualquer tipo de preconceito. Este objetivo é muito complexo, pois, engloba ensinar e educar crianças, jovens e adultos através de valores coerentes ao bem-estar da sociedade, assegurando uma postura explícita ao incentivo da prática de ações democráticas, justas e igualitárias. Com isso, a cidadania parte do princípio da equidade, onde todos os membros da 20 população possuem o direito de participar ativamente de seus caminhos, garantindo o desenvolvimento da democracia social. Partindo do pressuposto de que a cidadania é uma das finalidades da educação, podemos afirmar que não existe cidade educadora sem professores, sem escolas públicas de qualidade e sem uma sociedade que participe e que seja cidadã, onde o cidadão é ao mesmo tempo, educador e educando. A cidade dispõe de inúmeras possibilidades de educação: a vivência na cidade se constitui num espaço cultural de aprendizagem permanente por si só, “espontaneamente”. Mas a cidade, pode e deve ser “intencionalmente” educadora (ALMEIDA, 2007, p. 12). Almeida (2007) ainda relata que os princípios de cidadania na educação brasileira só serão alcançados quando houver o respeito pela diversidade cultural e a redução dos conflitos de ideias. A partir do pressuposto de que o Brasil possui uma diversidade cultural, o ensino de filosofia e sociologia deve ser pensado a partir das realidades oriundas dessa diversidade, uma vez que a reflexão filosófica é situada em períodos históricos e fundamentada na realidade atual. Também para a reflexão sociológica, faz-se necessário a apreensão da realidade cultural a partir de ideologias, considerando o caráter científico dos estudos sociológicos. Isto é fundamental, pois, o processo de desenvolvimento humano está associado com a aprendizagem de elementos e experiências que ofereçam a reprodução e a vivência nos ambientes aos quais o homem se encontra inserido na sociedade. 21 Para Del Prette e Del Prette (1996, p. 208) a educação para a cidadania deve ser proporcionada pela educação formal assegurando a “análise dos valores e práticas sociais da instituição escolar e do grau em que efetivamente promovem ou suprimem a cidadania enquanto compromisso com mudanças sociais”. Educar para a cidadania, consiste em refletir sobre os conceitos morais de liberdade, uma vez que esses conceitos implicam em compreender que os valores existem e devem ser respeitados por uma questão ética, atingindo assim, mudanças sociais efetivas. Dessa maneira, “a escola deve constituir um ambiente formador completo. Deverá abranger condições para que o educando possa construir os dois sistemas de valores mais importantes para a adaptação da pessoa ao meio: a lógica e a moral” (FACCINI, 2004, p. 09). Sendo a lógica a forma e a moral a regra para a formação do sujeito ôntico e ontológico. Com isso, o aluno pode interagir com o conhecimento científico, estabelecendo uma relação com suas próprias experiências, definindo uma nova compreensão, o que fortalece a visão de que os fundamentos sociológicos da educação melhoram significativamente o processo de aprendizagem. Baseado nesses princípios oseducadores devem adotar uma abordagem de trabalho que permite a melhoria do processo de aprendizagem, a fim de reduzir os problemas enfrentados em sala de aula, substituindo-os por métodos positivos capazes de aumentar o desempenho dos alunos. Para Freire (1996): 22 É importante afirmar que não basta reconhecer que a cidade é educativa, independente de nosso querer ou de nosso desejo. A cidade se faz educativa pela necessidade de educar, de aprender, de ensinar, de conhecer, de criar, de sonhar, de imaginar de que todos nós, mulheres e homens, impregnamos seus campos, seus vales, impregnamos suas casas, seus edifícios, deixando em tudo o selo de certo tempo, o estilo, o gosto de certa época. A cidade somos nós (FREIRE, 1996, p. 97). É através destas experiências, que o indivíduo passa a definir seus próprios valores e construir sua própria escala de princípios. Os valores apropriam os indivíduos através das experiências mais significativas durante sua vida, sendo que conforme relata Araújo (2007) o desenvolvimento moral depende diretamente da qualidade das relações interpessoais entre os cidadãos e as situações de valor, que poderão ser trabalhadas devidamente no âmbito educacional pelas disciplinas de Filosofia e Sociologia. É imprescindível o conhecimento dos conteúdos sociais e filosóficos de maneira aberta, passando a considerar o comportamento cognitivo que conduzem o aluno a aumentar seu potencial de aprendizagem, adquirindo novos valores e princípios necessários para as boas práticas das políticas pedagógicas. O entendimento das diversas teorias que diferenciam os fenômenos, os modelos, os diversos conceitos e a realidade permite que o ser humano possa obter o conhecimento científico necessário para colocar em prática o atributo da cidadania, uma vez que fornece o 23 aprendizado do caráter histórico da comunidade ao qual está inserido (VASCONCELOS, 2011). É importante frisar que os aspectos sociológicos e filosóficos são essenciais, pois, estas disciplinas não são compostas de conceitos e conteúdos científicos acabados, pois apresentam áreas reflexivas em constante renovação com o mundo atual, permitindo que o aprendiz relacione a teoria com as mudanças sociais, sendo importantes instrumentos na identificação de respostas consistentes para os problemas que enfrentam em seu dia a dia (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 1996). Vasconcelos (2011) defende que a incorporação dos fundamentos filosóficos na educação seja realizada de maneira mais abrangente, adequada e consciente, pois, ocorre de maneira didática, já que é obtida de maneira crítica e reflexiva, articulando os conteúdos, as propostas metodológicas e a realidade vivenciada. Com isso, por meio da compreensão da evolução da humanidade é possível identificar a mola propulsora que tem permeia as principais conquistas e a superação dos obstáculos na sociedade, sendo possível estabelecer questionamentos e, ao mesmo tempo, encontrar respostas. Isto ocorre, pois, a aprendizagem está intimamente ligada à transmissão cultural, pois os indivíduos adquirem conhecimentos, assim como os comportamentos éticos, práticos e sociais, que são aprendidos pelo princípio do desejo e do prazer. Com o levantamento das evidências sociológicas e filosóficas, há o enriquecimento epistemológico, pois, estas áreas possuem vasto campo de experimentações, propiciando ao homem fontes 24 inesgotáveis de pesquisas para investigações, reflexões e aprendizagens. Alves (2002) destaca a necessidade da integração e articulação entre diferentes áreas de conhecimento, a fim de manter a sintonia de tratamentos metodológicos e garantir com que o aprendizado ocorra a partir do desenvolvimento de competências gerais. Isto não envolve o mero tratamento de assuntos comuns entre as disciplinas que visem descaracteriza-las, mas sim, a promoção de ações conjuntas que possuem o intuito de complementar o conhecimento disciplinar. É possível que uma disciplina possa abordar desde que seja mantido o contexto e a interdisciplinaridade, de um assunto que lhe seja próprio, sem que outras disciplinas estejam abordando o mesmo assunto. O esforço parte de cada profissional possibilitar tal conquista. O autor ainda afirma que o trabalho interdisciplinar entra em ação no intuito de melhorar o potencial do homem na busca por respostas às necessidades de sua ação, construindo novos potenciais e habilidades de desenvolvimento e contextualização dos conteúdos aprendidos no âmbito social e cultural. Compreende-se que este processo permite que o homem possa desenvolver diferenciais para expressar seus conhecimentos, demonstrar comportamentos e praticar habilidades de maneira contínua e progressiva. No entanto, é preciso destacar que qualquer ser humano não pode ser avaliado somente por meio de suas capacidades, mas também através de suas experiências que o ambiente em que vive oferece. 25 CONSIDERAÇÕES FINAIS A educação para a modernidade se encontra voltada para o oferecimento de propostas pedagógicas, visam suprir as necessidades dos alunos diante das transformações sociais e tecnológicas observadas na sociedade, sendo possível oferecer um currículo contextualizado e reflexivo. As disciplinas de Filosofia e Sociologia trabalham com o mesmo objeto de estudo, ou seja, o ser humano em sociedade, buscando despertar o senso de observação, análise e de síntese dos aprendizes, possibilitando que o mesmo adquira maior potencial de entendimento acerca das relações sociais, culturais, emocionais, psicológicas, existenciais no processo de humanização dos indivíduos. Além disso, por apresentarem conceitos e conteúdos que permanecem em constante evolução, garantem ao aluno maior compreensão das mudanças sociais que os cercam. A permanência destas disciplinas no Ensino Médio permite o fortalecimento de valores culturais, éticos e morais, onde os sujeitos estarão mais aptos a adquirirem noções mais conscientes de suas práticas enquanto cidadãos. Com isso, os alunos ainda estarão em contato com um vasto campo de experimentações, já que ambas as áreas apresentam fontes inesgotáveis de pesquisa, fundamentais para o aprendizado significativo. No entanto, ressalta-se que para que haja a permanência de ambas as disciplinas no Ensino Médio de modo eficiente e produtivo, é indispensável que as propostas pedagógicas se tornem mais dinâmicas e flexíveis, sendo possível contextualizar o conteúdo com a 26 prática, deixando as aulas mais prazerosas e interessantes. Além disso, estas disciplinas podem fazer parte do caráter multidisciplinar, sendo complementares a outras disciplinas. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Cristiane. A arte e a construção da cidadania (2007) Disponível em: < http://www.fc.unesp.br/upload/pedagogia/TCC%20Cri stiane%20-%20Final.pdf> Acesso em: 07/10/2013 ALVES, Dalton José. A filosofia no ensino médio: ambiguidades e contradições na LDB. São Paulo: Autores Associados, 2002. ARAÚJO, U. F. Educação comunitária e a construção de valores de democracia e cidadania. In: 33rd Annual Conference of the Association for Moral Education New York, 15-18/11/2007. Disponível em: <http://www.uspleste.usp.br/uliarau/textos/PAPERA ME2007-def.pdf> Acesso em: 07/10/2013 DEL PRETTE, Almir; DEL PRETTE, Zilda. Psicologia, Identidade Social e Cidadania: o espaço da educação e dos movimentos sociais. Educação e filosofia, 10(20) 203-223, jul./dez, 1996. FACCINI, Regina. O desenvolvimento do hábito de ler na construção da cidadania (2004) Disponível em: <http://www.franca.unesp.br/O%20DESENVOLVIM ENTO%20DO%20HABITO.pdf> Acesso em: 07/10/2013 27 FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários a prática pedagógica. São Paulo: Paz e Terra, 1996. ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃOBÁSICA – IDEB. Nota Técnica (2007) Disponível em: <http://download.inep.gov.br/educacao_basica/portal_i deb/o_que_e_o_ideb/Nota_Tecnica_n1_concepcaoIDE B.pdf> Acesso em: 15/09/2013 NOGUEIRA, Renato Jr. Aprendendo a ensinar: uma introdução aos fundamentos filosóficos da educação. Curitiba: IBPEX, 2009. SANTOS, Fernanda Machado. Significações de construtivismo na perspectiva de professores construtivistas e sua relação com práticas avaliativas. (2007) Disponível em: < http://www.bdtd.ucb.br/tede/tde_arquivos/4/TDE- 2007-12-13T141040Z- 552/Publico/Texto%20Completo.pdf> Acesso em: 25/05/2013 SCHWARTZMAN, S. M. C. A redescoberta da cultura. São Paulo, Edusp, 1997. SCHWARTZMAN, S. M. C. Os desafios da educação no Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005. SOUZA, Luciene Maria de. Estado e políticas públicas educacionais: reflexões sobreas práticas neoliberais (2006) Disponível em: 28 <http://www.simposioestadopoliticas.ufu.br/imagens/a nais/pdf/AC06.pdf> Acesso em: 15/09/2013 STOLTZ, Tania. As perspectivas construtivistas e histórico-cultural na educação escolar. Curitiba: IBPEX, 2011. TRINDADE, Syomara Assuite; MENEZES, Irani Rodrigues. A educação na modernidade e a modernização da escola no Brasil: século XIX e início do século XX (2009) Disponível em: <http://www.histedbr.fae.unicamp.br/revista/edicoes/3 6/art10_36.pdf> Acesso em: 25/09/2013 VALLE, Bertha de Borja Reis do. et al. Políticas Públicas em Educação. Curitiba: IESDE Brasil S. A, 2009. VASCONCELOS, Jose Antônio. Fundamentos Filosóficos da educação. Curitiba: IBPEX, 2011. VIERO, Catia Piccolo; TREVISAN, Amarildo Luiz; CONTE, Elaine. Filosofia da educação a partir do diálogo contemporâneo entre analíticos e continentais (2004) Disponível em: <http://www.abstracta.pro.br/revista/publicados/v1n1a 7%20-%20vvaa%20- %20Filosofia%20da%20educa%C3%A7%C3%A3o.pdf> Acesso em: 25/09/2013. 29 Capítulo 2 ANÁLISE DO DISCURSO E A PESQUISA DOCUMENTAL: Caminhos para pesquisa filosófica em educação. Thiago Pessoa Prudente RESUMO Este artigo visa analisar a existência de uma possível relação epistemológica entre a Análise do Discurso e a Pesquisa Documental para o desenvolvimento da pesquisa filosófica em Educação. Nessa proposta estudamos a concepção, percepção, qualificação e aplicação desses objetos através de uma pesquisa documental feita em notas de aula, artigos e livros publicados nas últimas duas décadas dedicados aos temas: análise do discurso, pesquisa documental, filosofia da Educação e pesquisa filosófica educacional. Analisou-se o processo de origem e definição dos temas ao longo da história e da estruturação de cada uma das ciências envolvidas, como eles atuam e se correlacionam. Apontamos como e onde se estabelecem relações entre elas ao longo das últimas décadas e o que se pode produzir de concreto com isso. Averiguou-se, também, a importância e o papel individual e conjunto de cada tema para o desenvolvimento do universo epistemológico 30 educacional. E por fim tentamos evidenciar que é possível estabelecer essa relação de nível epistemológico entre Análise do Discurso e a Pesquisa Documental tendo em vista as coerências e aproximações metodológicas existentes e necessárias para o desenvolvimento de pesquisas filosóficas em Educação. INTRODUÇÃO A pesquisa educacional por si só é um universo de estudo extremamente amplo, complexo e diferenciado dentro do mundo da Educação por se desprender em diversos caminhos e possibilidades de levantamento e análise de dados, inferências e produção de novos conhecimentos ou pela reinterpretação de outros já bem conhecidos e aclamados. É diante dessa constatação e das inferências nela contidas que buscamos neste trabalho fazer uma breve análise da relação entre os métodos de pesquisa documental e Análise do Discurso (AD) para o desenvolvimento de um modelo de pesquisa filosófica que atenda algumas das necessidades do universo da Educação, enquanto campo de conhecimento e enquanto ciência. Antes de formalmente iniciarmos nossa pequena análise queremos deixar claro que essa temática é ampla e bastante explorada no âmbito dos estudos das ciências sociais e da linguagem vista a existência de uma prática mais antiga, ampla e trabalhada nestas áreas dos métodos de pesquisas centradas na prática da leitura, interpretação, compreensão de textos e da associação entre a pesquisa documental e a Análise do Discurso apresentam. É esta 31 proximidade e corroboração existentes entre elas, no sentido de garantir e propor elementos para as discussões e elaboração de problemas, além é claro da análise sobre o social que as mesmas carregam, que nos levam a querer entender como se comporta essa relação no âmbito da Educação e em especial como isso contribui para pesquisa filosófica no universo educacional. Além disso este trabalho se propõe, tão meramente, revisar o conjunto teórico que fundamenta a Análise do Discurso, como este se desenvolve em conjunto com a Pesquisa Documental e como eles se relacionam para o desenvolvimento da pesquisa filosófica no âmbito da Educação, dessa forma, deixa-se claro que não é objetivo deste artigo realizar ou demonstrar o funcionamento da Análise do Discurso em nenhuma das estruturas em que ela atua para embasar ou fundamentar as informações e afirmações que foram encontradas durante a pesquisa ou produzidas ao longo da mesma. Assim, nosso trabalho se encontra estruturado em cinco sessões que tratam dessa temática na seguinte ordem: na primeira sessão, apresentamos os conceitos básicos que trabalhamos em nossa pesquisa que são os de pesquisa documental, análise do discurso, pesquisa filosófica para educação; na segunda, apresentamos a relação prévia entre pesquisa documental e análise do discurso comum nos universos das ciências sociais e da linguagem; a terceira, traz a ação da pesquisa filosófica no universo da Educação; na quarta sessão apresentamos nossa visão acerca da relação e dos possíveis frutos entre os conceitos por nós abordados; e na última apresentamos nossas considerações finais. 32 PESQUISA DOCUMENTAL, ANÁLISE DO DISCURSO E PESQUISA FILOSÓFICA PARA EDUCAÇÃO – O que são? Todo campo de conhecimento para adquirir o status de ciência necessita, antes de tudo, possuir meios pelos quais possa produzir conhecimento, e, para definir e qualificar seus objetos de estudo. Pensando dessa forma seus agentes procuram, então, determinar quais serão os instrumentos e os caminhos necessários e possíveis para tal empreitada. E dentre esses instrumentos e caminhos um que se destaca é o da pesquisa científica. Cada ciência possui seus métodos e metodologias para produzir conhecimento e poder determinar e estudar seus objetos. Com a Educação enquanto campo de conhecimento e ciência não é diferente. Ela está classificada como integrante das chamadas ciências humanas, ou ainda ciências sociais, uma vez que seus diversos objetos de estudos tratam de processos e relações que envolvem os seres humanos no mais diferentes níveis e condições de realidade, e, que se caracterizam como partes importantes do desenvolvimento individual e social dos sujeitos. O que chama atenção é que nas chamadas ciências humanas por mais específicas que cada uma delas sejam não se encontram métodos e metodologias exclusivas ou principais como se encontra em outras áreas de conhecimento, como as ciências exatas ou da terra por exemplo, devido complexidade e distinção do objeto de estudo das mesmas, que é o homem em sua totalidade e especificidades, que conduz a produção de diversos 33 caminhos de pensamento e pesquisa, além do fato de que grande parte dessas ciências serem consideradas jovens ciências que surgiram ou se organizaram com rigores científicosnecessários apenas nos últimos três ou quatro séculos. Dessa maneira compreende-se o porque da Educação procurar adquirir seus saberes e produzir seus conhecimentos através de diferentes e diversificados caminhos de pesquisa que ora se apresentam como meramente quantitativos, e, ora estabelecem-se como qualitativos. Desses os métodos e metodologias de ordem qualitativos se destacam, mostrando-se como os mais viáveis e interessantes no sentido de obter e trabalhar os mais diversos e distintos dados oferecendo uma grande de gama de questões, inferências e possibilidades de resultados. Na Educação diversos desses métodos e metodologias se apresentam como novidades, outros por sua vez, devido à recorrência de suas práticas se mostram com mais antigos e usuais, sendo eles muitas vezes relegados a um plano secundário ou, considerado, de menor valor. No entanto, o mais interessante no processo de construção científica para o universo da Educação é a possibilidade de se combinar esses diferentes métodos e metodologias em busca de um novo e próprio caminho metodológico, pois, como ressalta Alves (1992, p. 55-56) a Educação ainda tem a necessidade de constituir um corpo teórico próprio e consistente, indo recorrentemente buscar os ferramentas e fundamentos em outros campos de conhecimento. 34 Com base nessa constatação é que procuramos, neste primeiro momento, definir quais são os conceitos que buscamos entender e relacionar em nosso trabalho, são eles: o de Pesquisa Documental, o de Análise do Discurso e o de Pesquisa Filosófica, de forma geral e mais especificamente para o desenvolvimento da Educação enquanto ciência. Seguindo o itinerário proposto, comecemos então buscando definir o que é a Pesquisa Documental. A Pesquisa Documental é um método de pesquisa científica considerado por muitos especialistas como básico e muito comum dentro e fora do universo acadêmico uma vez que busca analisar e refletir sobre todos os tipos de documentos e registros que se possa ter sobre algo em um determinado local e período de tempo na história de um povo ou de um evento natural ou não. Por ser um método de pesquisa tão básico e comum acontece de ser, geralmente, confundida ou associada com outro método de pesquisa também muito comum e naturalmente adotado pelo universo acadêmico que é a Pesquisa Bibliográfica. Apesar de serem parecidas, existe uma diferença grande entre a pesquisa documental e a bibliográfica que reside no conteúdo analisado por elas. A pesquisa documental procura trabalhar conjuntamente tanto os materiais e fontes previamente analisados e aceitos pela Academia, como os textos e conteúdos escritos por pesquisadores, autores e artistas notoriamente reconhecidos por sua produção acadêmica, literária ou artística, e, publicados ou expostos por fontes idôneas e reconhecidas por suas especificidades e rigorosidade 35 textual e acadêmicas, com outros documentos e registros com pouca ou nenhuma análise prévia por parte de pesquisadores, tais como: artigos de jornais diários, revistas, e sítios da internet; entrevistas realizadas das mais diversas formas e expostas nos diversos meios e mídias de comunicação; softwares; programas audiovisuais produzidos paras os mais diversos tipos, fontes e formas de divulgação; documentos históricos de fontes oficiais ou não; dados e índices oferecidos por fontes oficiais ou não etc. Já a pesquisa bibliográfica trabalha exclusivamente focada em materiais publicados e analisados previamente pela academia, tais como artigos científicos, obras de autores constituídos de grande experiência e renome em uma determinada área científica ou artística, como afirma Gil (1991) apud Silva e Menezes (2005, p. 21). Essa diferenciação é de vital importância para o entendimento dos processos de pesquisas em educação, visto que, a compreensão do que pode ser analisado e estudado dependerá de se entender como plausível ou não de análise para uma determinada área, ou seja, se precisa ou não do prévio crivo da academia para ser aceita como objeto ou fonte de pesquisa e de conhecimento. Por isso compreendemos que para a Educação a pesquisa documental se apresenta como um universo muito mais abrangente, dinâmico e que possibilita o desenvolvimento de novos conhecimentos e das estruturas educacionais vigentes “porque possibilita ampliar o entendimento de objetos cuja compreensão necessita de contextualização histórica e sociocultural.”, como afirma Sá-Silva, Almeida e Guidani (2009, p. 2), dado isso a maior 36 gama de conteúdos possíveis de serem acessados e analisados. Visto a definição sobre Pesquisa Documental, atentemo-nos agora para a ideia de Análise do Discurso, ou simplesmente AD. A Análise do Discurso é um campo de estudo, assim como uma metodologia de pesquisa científica, que tem suas origens na Linguística. Ela surge, durante a década de 60 do século XX, como um caminho científico diferente ao Estruturalismo linguístico francês, proposto por Saussure, vigente nos estudos sobre a língua francesa à época. Essa diferença ou contraposição se deve principalmente a mudança que a AD propõe no objeto de estudo da linguística, que na visão tradicional estruturalista a linguística deveria se ater basicamente ao estudo da língua pura e formal, livre das interferências sociais e subjetivas que pudessem existir. Já na Análise do Discurso, o foco proposto passa a ser o discurso, que segundo Florêncio et al (2009, p.21) se trata de “uma relação indissociável entre língua, história e ideologia”. Ainda guiado por esses autores pudemos entender que o discurso se constitui de conjunto de ações onde, ainda segundo esses autores, a “materialidade da língua [ou seja, as falas subjetivas incutidas na língua e que estão presentes e manifestadas nos indivíduos e seus grupos sociais, sendo até então desprezadas pelos modelos tradicionais de construção linguística] funde-se a materialidade da história e opera nas relações sociais” (2009, p.21) existentes em um grupo ou meio social e sustentadas pelas ideologias presentes nessa mesma estruturação social. 37 Essa proposta de caminho científico, apresentada pelo pensador francês Michel Pêcheux, logo ultrapassaria os limites dos campos linguísticos em face da sua necessidade de correlacionar os elementos históricos, sociais e ideológicos para ganhar corpus científico e condições de se estabelecer enquanto campo e metodologia científica. É essa necessidade e sua intrínseca condição transdisciplinar que aproxima a AD de outros campos científicos das ciências humanas, como a Sociologia, a Psicologia, a História e a Filosofia, como afirmam em seus escritos Florencio et al (2009), Pêcheux (1998), Cavalcante (2007) e Rossi [2013?]. E é graças a esses relacionamentos entre a Análise do Discurso e outros campos das ciências humanas e da reestruturação da própria AD durante os anos de 1980, que se torna possível também aproximá-la de outras ciências como a Educação. A aproximação com a Educação se fortaleceu, especialmente, com a difusão da AD para fora da França, e, sua chegada nas Américas, onde no Brasil passou a ser utilizada mais fortemente para analisar não somente a língua, mas, especialmente, o meio social, sendo posta como um caminho para se entender, através dos vários discursos que se difundiam, o que ocorria nos campos da política, da economia, da comunicação, e para o nosso caso em especial, da Educação, enquanto campo de conhecimento e ciência, e, tendo em vista o cotidiano das relações e práticas acadêmicas que se estabelecem no âmbito das instituições de ensino de quaisquer níveis e com a formação dos educadores frente as mudanças sociopolíticas, históricas e econômicas que vinham ocorrendo na América Latina desde o final da década de38 1970 até o início do século XXI, ganhando assim o status de metodologia de pesquisa para o universo da Educação, como apontado por Marli André (2001), quando esta em seu trabalho discute a questão da pesquisa em educação e a necessidade de se estabelecê-la com certo rigor para garantir a qualidade dos resultados, métodos e metodologias de trabalho próprias para a Educação. E por fim entremos na concepção de Pesquisa Filosófica. Em linhas gerais pode-se entender a Pesquisa Filosófica, hoje, como um processo de busca ou de construção de conceitos a partir de um determinado itinerário teórico. A ideia da pesquisa filosófica é a de buscar nos referenciais prévios de saberes, científicos ou não, as bases para do conhecimento de um determinado tema, área ou problema. Esse modelo de pesquisa se fundamenta na aplicação do método de análise filosófico sobre as diversas metodologias e linhas de pensamentos existentes, sejam elas referenciais consolidados ou não de uma área de conhecimento ou ciência, a partir desse trabalho procura- se correlacionar as ações de ordem prática com as de ordem teórica em busca da formulação de ideias ou conceitos que expliquem e tornem mais compreensível a realidade que se insere determinada ciência, buscando dessa forma revelar os pontos frágeis e não preenchidos do itinerário científico que se procura construir. Basicamente consiste em lançar questionamentos ou dúvidas, de ordem epistemológicas, éticas, estéticas, políticas, antropológicas etc sobre o objeto que se busca conhecer ou que se discute, ao fim de contribuir com processo de formação de um campo de conhecimento 39 enquanto ciência específica e na ação de seus agentes, quer como afirma Henning (2006) em seu trabalho. No campo da Educação consiste basicamente em questionar sobre os processos de produção dos conhecimentos próprios ou sobre a possibilidade de uso ou adequação de referenciais provenientes de outras ciências sobre as problemáticas comuns a educação. E na reflexão sobre os caminhos teóricos e seus problemas também. Em geral, remete-se a discutir os marcos teóricos e suas aplicações nos campos epistemológicos, éticos, estéticos, políticos, antropológicos etc tendo por fim a construção de conceitos, problemas e de fundamentações teóricas para a Educação e seus campos de conhecimento. A RELAÇÃO ENTRE A ANÁLISE DO DISCURSO E A PESQUISA DOCUMENTAL – História e raízes. A Análise do Discurso enquanto metodologia de pesquisa pode ser considerada um caminho recente frente aos mais diversos itinerários científicos conhecidos, no entanto, as raízes de seu desenvolvimento se voltam para caminhos mais antigos no processo de construção e produção do conhecimento humano. É possível garantir essa afirmação ao se analisar o processo de concepção da AD realizado por Pêcheux, ainda nos anos de 1960, a partir de seu campo científico inicial, a linguística. A Análise do Discurso surge na Linguística como uma via diferente aos modelos da época, em especial ao estruturalismo, por deter-se em estudar o discurso dos sujeitos e não somente a língua formal ou a fala 40 oficializada. Esse rompimento como a estrutura científica vigente da época só foi possível graças a duas condições impostas ao processo de concepção da AD que foram: 1. A aproximação da linguística com outras ciências humanas, para no seu cerne poder construir o conceito de discurso; 2. E, o entendimento, por parte de seus criadores, do trajeto científico que era necessário ser tomado para que o discurso não esteja somente ligado ao que está institucionalizado e aceito pela Academia, mas, também ao que se encontra em outras falas apresentadas pelos diversos meios e mídias de comunicação cotidianas aos sujeitos. Essas determinações se mostraram vitais ao processo de construção da Análise do Discurso. Primeiramente por ampliarem o raio de ação da linguística, retirando-a de uma práxis puramente teórica e conduzindo-a para um processo de intervenção mais prático junto ao cotidiano social e individual dos sujeitos praticantes de uma mesma língua e pertencentes a um mesmo agrupamento social, e, como afirmado por Andréa Rossi “o discurso é uma prática, uma ação do sujeito sobre o mundo.” ([2013?], p. 20). Essa condição prática se dá a partir da aproximação entre as práxis da Linguística com as da Sociologia, da História, da Psicologia e da Filosofia para o estabelecimento dos elementos irão compor o discurso, ou seja, foi somente com a associação entre os diversos conceitos dessas diferentes ciências humanas que permitiu o estabelecimento do discurso, que pode ser compreendido como uma reconstrução da fala contida na língua a partir de estruturas e relações individuais entre um 41 sujeito com o meio social em que está inserido, com o momento histórico em que vive e com as ideologias sociopolíticas e econômicas que o cercam. Assim, o discurso pode ser entendido como a produção linguística individual dos sujeitos que partem da língua formal e da fala oficializada para uma derivação da fala em uma ordem menos formal, mais cotidiana e não oficializada da língua. Além disso, no discurso busca-se compreender e dar relevância tanto aos conceitos e/ou ideias que estão explícitas quanto as que encontram-se implícitas nas falas do sujeito, conceitos e ideias estas contidas e/ou manifestadas nas estruturas de consciente e subconsciente dos indivíduos através de suas visões e relações de mundo. Diante de tudo isso se pode determinar que o papel da Análise do Discurso, enquanto metodologia de pesquisa científica para o campo da Linguística, é o de analisar e comparar os discursos oficiais e não oficiais dos diversos sujeitos, buscando compreender os contextos individuais, históricos, sociais e ideológicos explícitos e implícitos nesses discursos, a fim de encontrar o sentido daquilo que se fala para quem transmite e para quem recebe a mensagem. Em outras ciências ela contribui com a possibilidade compreender as estruturas e os contextos sociais, históricos, simbólicos e ideológicos que existem nas (inter)relações entre os diversos indivíduos e os meios ambientes em que estão inseridos, ajudando também na formulação de questionamentos e problemáticas que colaborem com a produção de ideias e de conceitos sobre os objetos estudados. E de modo geral podemos afirmar que “ela pretende é reconstruir as falas que criam uma 42 vontade de verdade científica em certo momento histórico” (ROSSI, [2013?], p. 19) De ordem outra conexão que podemos estabelecer a partir das inferências anteriores é que a Análise do Discurso foi produzida a partir dos ideais teóricos e filosóficos marxistas de Althusser, Bakhtin e, mais tardiamente, Lukács de filosofia da linguagem, de discurso político, de ontologia e de produção epsitemológica, como afirmam Cavalcante (2007, p. 32-36) e Florêncio et al (2009, p. 24-27). Compreendemos com isso que analisar um discurso se constrói mediante a crítica da constatação de uma ligação dos sujeitos envolvidos com um determinado momento histórico, sociopolítico e econômico que estabelecem os padrões sociais de cultura, produção econônima, normas sociais e ideologias que regem as relações sociais e de poderes entre os indivíduos, indivíduos-grupos e entre grupos sociais nos diversos ambientes sociais, ou seja, o conceito marxiano de materialismo histórico-dialético. Essa constatação da influência do modelo marxista de pensamento é, também, um dos fatores importantes que permitiram o desenvolvimento teórico da AD, pois, ao se constatar que as construções linguísticas dos sujeitos também se submetem e se dão através das diversas e diferentes práxis e relações sociais, e, que essas estão regulamentadas pelas relações de produção material- econômicoque geram os modos de vida de uma determinada época e local, constituindo por isso algumas das bases para o entendimento do modo de pensar e agir dos indivíduos, e, consequentemente no próprio discurso que cada sujeito é capaz de produzir. 43 Esse entendimento marxista de mundo, via de regra, apresenta o embate entre duas correntes ideológicas opostas, ora dentro de um mesmo contexto sócio- produtivo, a exemplo o capitalismo no que compete a relação entre o pensamento burguês e o pensamento proletário, ora diante de contextos sócio-produtivos distintos, como entre o capitalismo e o socialismo. Seguindo ainda essa linha de raciocínio, o embate ideológico não se restringe só as questões econômicas mas tende a si refletir também em outras esferas sociais, como: nas artes, na literatura, na educação etc, criando assim diversas formas de falas e de contextos sociais que resultam nos mais variados discursos. No entanto, outro ponto que chama atenção é a influência, que geralmente ocorre, das ditas ideologias dominantes sobre as dominadas. De acordo com o marxismo essa é uma situação historicamente comprovada, visto a necessidade da ideologia dominante manter-se sempre no poder. As construções sociais procuram manter a ordem ideologicamente estabelecida reproduzindo nos variados discursos essa condições, ora de forma explicita ora implicitamente. Contudo, observa-se que nos discursos as falas implícitas tendem a apresentarem-se com algum grau de discordância das explícitas, isso se explica devida o embate ideológico frente a organização social, vê-se muito desse contraste ao analisar, por exemplo, os discursos oficiais onde se propõem a redução da pobreza através do aumento de educação pública, gratuita e de qualidade, mas no próprio discurso não se apresentam formas concretas para atingir essa meta, e, isso ocorre porque o pensamento 44 promovido pela ideologia dominante, que está implícita no discurso, entende que atingir essa meta geraria não somente uma mão de obra mais qualificada mas, também, um indivíduo pensante e esclarecido que poderia simplesmente discordar da estrutura social vigente e exigir mudanças no sistema social impondo a queda da ideologia dominante em prol de outra melhor para os anseios sociais da classe menos favorecida, dessa forma, o próprio discurso que explicitamente fala em mudança se apresentando como um resultado de um construto ideológico contrário ao modelo dominante, em seu interior se contradiz em prol da manutenção da ideologia dominante que o propôs como forma de controlar o meio social. É justamente por se dedicar a analisar esses diversos tipos de discurso utilizando elementos que, aos olhos do tradicionalismo acadêmico não passam de lugares comuns e sem um fundo científico viável que os sustentem, que a Análise do Discurso rompe com vários paradigmas, primeiramente os ligados ao estruturalismo na linguística e depois aos modelos tradicionais de pesquisa de outras ciências, ao começar a utilizar diferentes tipos de documentos como fontes de pesquisa e de análise. Ela sai do refúgio bibliográfico acadêmico oficial e se aventura em outras linguagens e literaturas tidas como não formais ou não oficiais. Essa quebra paradigmática com relação as fontes de pesquisa e análise também se deve ao processo de aproximação de seu itinerário de trabalho com o de outras metodologias e ciências distintas a de sua origem que já utilizavam de um processo de pesquisa documental mais amplo como base para seus trabalhos. 45 A partir dessa constatação pudemos inferir que a AD também tem suas bases no processo de pesquisa documental. Ela utiliza-se não somente dos discursos oficializados para constituir seu objeto de pesquisa, mas, que combina os discursos oficias e extraoficiais dos diferentes sujeitos associando-os as condições históricas, sociais e ideológicas contidas nos diferentes e distinto documentos postos em diversos meios e mídias de comunicação, desde propagandas em outdoors espalhados pela cidade às obras científicas e academicamente reconhecidas e aceitas. É dessa riqueza de mobilidade e fontes que a perpassa a Pesquisa Documental que a faz ser um método de pesquisa importante para complementar os processos de pesquisa da Análise do Discurso, mas, além disso a pesquisa documental serve também de base para outras metodologias de pesquisa como: a pesquisa filosófica, a pesquisa etnográfica e a análise de conteúdo. Nesses contextos a pesquisa documental se mostra como via principal de acesso as fontes para os diversos temas, problemáticas e a base conceitual de uma pesquisa devido sua possibilidade de múltiplas abordagens para estudo e compreensão de uma realidade que ela permite. Por essa facilidade de acesso às informações e saberes que servem de base para constituição de uma pesquisa é possível creditar a Pesquisa documental a condição de um dos primeiros métodos de pesquisa científica que se pode averiguar, como afirmam Sá-Silva, Almeida e Guidani (2009, p. 13-14). Ela consiste em buscar seja no meio acadêmico ou não objetos que transmitam ou possam transmitir informações que após a intervenção 46 científica transformam-se em conhecimentos e saberes técnicos capazes de serem amplamente reproduzidos, e, de explicar e/ou ajudar a compreender um determinado evento, momento sócio-histórico ou objeto. A Pesquisa Documental, assim como a AD, utiliza desde artigos ou obras científicas, literárias e artísticas previamente reconhecidas e aprovadas pela Academia à postagens em redes sociais, propagandas, artigos e colunas em jornais diários e/ou revistas semanais, registros audiovisuais, entrevistas etc. Com o advento de outros métodos e metodologias de pesquisas científicas a Pesquisa Documental passou a ser relagada por muitos como um método complementar de pesquisa. Contudo, é possível afirmar que esse entendimento é enganoso e um tanto falacioso, uma vez que averiguamos seu uso como método base e principal de acesso a dados e informações para muitas pesquisas científicas, em especial as que se desenvolvem no universo das ciências sociais e humanas conformem explicitam Sá- Silva, Almeida e Guindani (2009, p. 3). O que é coerente considerá-la é como uma simbiose perfeita para muitos caminhos de pesquisa, entre eles a AD, devido sua amplitude de ação e de materiais para estudos que ela pode oferecer. FILOSOFIA E EDUCAÇÃO: A Análise do Discurso e a produção de conceitos Ao longo de toda a história encontramos em diversos pensadores registros sobre o que é a Filosofia e qual é o papel/função que ela tem para o desenvolvimento 47 do ser humano, quer seja através do pensamento, das artes e ciências, do meio social etc. Nesse contexto um dos papéis se destaca a capacidade que ela tem para definir e qualificar os seres e objetos de acordo com sua natureza não somente física, mas também social e prática. Ao longo de toda sua história e de acordo com cada um de seus pensadores essa capacidade recebeu diversos nomes, tais como: ideias, conceitos, espírito e outros. É possível, assim, afirmar que para cada filósofo que se debruça(ou) sobre a questão da capacidade que a filosofia tem para definir e qualificar existe uma nomenclatura distinta para determinar o que é essa tal definição e qualificação dos seres. Dessas diversas nomenclaturas distintas duas chamam mais atenção devido suas capacidades em compreender a natureza dos seres e objetos para daí tentar defini-los e qualificá-los, são os termos ideias e conceito. O termo ideia aparece pela primeira vez ainda na antiguidade clássica com o filósofo grego Platão de Atenas em sua obra “A República”, sendo melhor apresentado e demonstrado através da “Alegoria da Caverna” presente no Livro VII dessa obra. Paraele as ideias eram a definição e qualificação da verdade dos seres e objetos constituídos no mundo inteligível que podem ou não possuir representações materiais no mundo sensível, ou seja, para Platão as ideias são os seres ou objetos reais e verdadeiros que só existem no mundo inteligível, mundo este que só pode ser acessado apenas através do Demiurgo e da alma por meio práticas como a meditação, a contemplação ou dos sonhos, e, que se manifestam na realidade como uma cópia ou imagem imperfeita do seu eu ideal. Essa 48 terminologia ainda que antiga é altamente usual nos meios acadêmicos e científicos atuais, pois, em geral, refere-se ao ser ou objeto ainda em desenvolvimento ou que só existe num plano teórico, tendo este ser ou objeto comprovação ou não científica. Já o uso do termo conceito no universo científico é mais atual, datando dos anos de 1990, sendo desenvolvido e divulgado pelos pensadores franceses Gilles Deleuze e Felix Guattari. Para eles o processo de definição e qualificação de um ser ou objeto vem de um processo de criativo semelhante ao de um artista, ou seja, para esses filósofos o “conceito” de algo se estabelece a partir da relação particular que existe entre o sujeito que estuda algo, o objeto ou ser que é estudado e a realidade que ambos se encontram, e, da forma como essa relação venha ser compreendida e trabalhada frente a concepção de mundo que ela apresenta e a realidade em que se insere. Por esse trabalho criativo Deleuze e Guattari ousam afirmar que “a Filosofia é a arte de formar, de inventar, de fabricar conceitos.” (1997, p. 9). No entanto, a criação dos conceitos não é algo que possa nascer do puro abstrato, para eles o tanto o sujeito quanto o objetos devem estar inserido dentro de um contexto social de mundo, onde o indivíduo não só seja capaz de pensa-lo, mas, que o sujeito possa também senti-lo, materializá-lo de modo a encontrá-lo no rumo da história e das sociedades. Ou seja, a definição ou qualificação dos seres/objetos mesmo dependente da 'criatividade' e da visão de mundo do pesquisador deve estar ligada a uma realidade física e tangível, mas independente dele. (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p. 28-30). 49 O interessante da constituição filosófica do termo conceito foi a aceitação e a expansão que o mesmo teve no universo acadêmico e científico, dado sua concepção ter origem num contexto de pensamento materialista que defende que processo de criação, definição e qualificação dos seres e objetos, seja ele de qual área for, deve estar ligado a um uso prático e sensível em virtude das necessidades produtivas dos homens, em detrimento do uso do termo ideia que vem cunhado diante de um contexto de pensamento puramente inteligível onde tudo deve ser criado somente em prol e para a constituição de uma razão dedutiva e lógica não necessitando para isso de um corpus físico, real ou prático. Outro detalhe que chama atenção é o fato de que essa mudança ocorreu principalmente nos campos das ciências sociais e humanas, e, em especial nas tidas como mais recentes, como a Sociologia e a Educação por exemplo. Para a Educação o termo conceito alinhou-se muito bem, uma vez que seus objetos de estudo se constituem dentro de uma realidade tangível e tendem a ser materializados em sujeitos, objetos físicos ou em (inter)ações de ordem práticas quer sejam físicas ou sociais passíveis de comprovação dentro da realidade. Assim é possível inferir que a Filosofia para a Educação se mostra como uma companheira natural para seu processo de produção conhecimento, visto que fornece ferramentas e aponta caminhos pertinentes para esse processo. Dessa comunhão entre a Filosofia e a Educação denota-se a elaboração de uma disciplina dedicada a pensar e construir os conceitos próprios e necessários para a manutenção e desenvolvimento da Educação, além de ser capaz de 50 estabelecer os caminhos para produção de problemáticas e questões essenciais que tenderão a mover a produção científica e de conhecimento em geral e nos seus diversos campos de pensar, esse campo é conhecido como Filosofia da Educação. Com esse objetivo a Filosofia da Educação, utilizando-se dos processos de pesquisa filosófica em conjunto com diversos outros métodos e metodologias de pesquisa científica, procura estabelecer caminhos para se pensar a Educação, enquanto ciência, através de seus próprios conceitos, sujeitos, objetos, (inter)ações e realidade, como permite apontar o trabalho de Henning (2006, p. 7-12) sobre o papel do filósofo e da Filosofia na pesquisa em educação. Esse processo muitas vezes perpassa pela necessidade de se associar a Educação a outras ciências para poder compreender explicar os elementos que se que conhecer. Na procura por atender essas condições é se estabelecem as relações entre a Pesquisa documental, a Análise do Discurso e a Pesquisa filosófica na Educação, visto também as origens e que existem fundamentos comuns em todas. Como exposto anteriormente, a Análise do Discurso tem suas bases científicas na associação de processos de pesquisa e análises provenientes dos diversos campos das ciências humanas, como a Linguística, a Sociologia, a História, a Psicologia e a Filosofia (FLORENCIO ET AL, 2009; PÊCHEUX, 1998; CAVALCANTE, 2007; ROSSI, [2013?]). Essa relação quando aplicada no universo da Educação possibilita que o trabalho de pesquisa estruturado pela AD habilite o pesquisador a enxergar novas linhas de pensamento, a ter 51 uma nova visão de mundo e compreensão da realidade que o podem levar a estabelecer novas definições e qualificações aos seres outrora já pertencentes e objetos de estudo em outra ciência como próprios ou aptos ao meio de pesquisa da Educação. Um exemplo que se poder averiguar da aplicação da AD na pesquisa filosófica em Educação, é o conceito de Estudante frente outras metodologias de pesquisa mais tradicionais no universo da pesquisa educacional. Na maioria das metodologias tradicionais da Educação o estudante é compreendido apenas como objeto de estudo a quem se aplica determinadas ações ou como um sujeito que se relaciona com o objeto estudado, com isso, pode-se dizer que o estudante é encarado como um sujeito passional que quando atua tem suas ações e falas analisadas de modo isolado ou dissociado de seu contexto histórico, social e ideológico, em favorecimento da visão que o pesquisador tem desse estudante ou da relação dele com o objeto principal de seu estudo. Esse afastamento é sempre conduzido de modo a firmar alguma ideia já preestabelecida, condizente ou não, com o discurso empregado pelo pesquisador. Por sua vez quando se trabalha com Análise do Discurso, e com outras metodologias como a Pesquisa Etnográfica por exemplo, esse sujeito tido como passional torna-se um sujeito ativo, visto que seu discurso, que está associado a características específicas de seu grupo social, do momento histórico pessoal ou global, de particularidades de seu comportamento e de uma visão de mundo composta por diversos embates ideológicos que o cercam, traz novas inferências sobre a realidade, e, 52 contribui com a produção de novas questões ao tema ou problemática que está interligado, serão justamente essas novidades promovidas pela AD com a inserção de um sujeito ativo na pesquisa que ajudarão o pesquisador da Educação a conceber seus conceitos sobre “o que é?” algo no universo da Educação, e, o “como é?” ou “como age?” esse algo nesse mundo e frente o itinerário científico da pesquisa em Educação. Dessa maneira é possível a compreensão da Análise do Discurso como produtora de conceitos para a Educação, uma vez que ela se faz presente no processo de pesquisa filosófica que a Educação desenvolve, trazendo novos caminhos e compreensões acerca do mundo, sendoessas independentes da visão inicial ou principal do pesquisador, mas, que o auxiliam a encontrar respostas ou questões que o conduzirão na criação de seu próprio conceito de Educação ou de como ela é? Como ela age ou deverá agir dentro de uma determinada realidade social e/ou de mundo. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao longo de toda a pesquisa ficou claro que é possível a utilização da Análise do Discurso, associada ao método de Pesquisa documental, como um caminho para a pesquisa filosófica em Educação. Isso por causa de diversos fatores que possibilitaram a associação da Análise do Discurso como uma metodologia de pesquisa propícia aos estudos no universo da Educação, a começar pelo processo de origem da AD no universo científico da Linguística como uma 53 metodologia que centra seus estudos nos discursos dos sujeitos, discurso esse é formulado a partir das falas individualizadas dos sujeitos associadas a um conjunto de fatores históricos, sociais e ideológicos que possibilitam ao pesquisador traçar um perfil do meio social capaz de explicar e tornar compreensível diferentes percepções da realidade de mundo que possam se apresentar. Outro fator de associação é expansão da AD para outros campos científicos das ciências humanas como a Sociologia e a Psicologia foi a possibilidade de uma “construção teórica da intertextualidade” (PÊCHEUX, 1998, p. 48), onde o discurso passa a ser um elemento- chave para o desenvolvimento de diversas teorias e objetos de pesquisas para esses universos, atribuindo sentidos e interpretações as falas que se apresentam nas fontes e materiais que possibilitam a construção de seus trabalhos, o mesmo valendo para o universo da Educação. Além da possibilidade de trabalhar em conjunto com a Pesquisa Documental, assim como outros métodos de pesquisa tradicionais nas ciências humanas, vem ajudando mutuamente ao desenvolvimento dos arcabouços teóricos e na busca de novos objetos, problemas e caminhos para pesquisa científica para si e para as diversas ciências a quem se associa. Essa capacidade de desenvolvimento dos arcabouços teóricos, tantos os existentes como os novos, e de buscar ou identificar novos objetos, problemas e caminhos para pesquisa científica se dá graças a ampliação das fontes de pesquisa que a Análise do Discurso conjuntamente com a Pesquisa Documental permitem e possibilitam, fontes essa que estão além dos materiais 54 aceitos e entendidos pela Academia como naturais e válidos à pesquisa científica. Com uso da AD é possível extrair conceitos tanto em obras e textos academicamente aceitos quanto em documentos textuais ou não que são produzidos no âmbito por crianças em idade escolar por exemplo. Além disso tudo, some-se a condição de contraponto ao modelos tradicionais de pesquisa científica em todos os campos de conhecimento que ela se associa, a exemplo sua ruptura com o modelo estruturalista de pesquisa e estudo da língua no universo da Linguística. Essas condições carregam a Análise do Discurso de novos valores e visões de mundo capazes de (re)determinar e (re)qualificar os seres ou objetos de estudo e pesquisa de acordo com as necessidades de cada campo de conhecimento, ou seja, de conceituar os seres ou objetos estudados e/ou pesquisados de acordo com necessidades de cada itinerário de pesquisa ou de cada ciência, ajudando assim a melhorar e ampliar a compreensão de mundo e o entendimento da realidade para os pesquisadores e estudiosos de cada ciência. Vale ressaltar que esses valores e essa visão de mundo diferenciada extraída pela Análise do Discurso está incutida nos mais variados meios e mídias de comunicação utilizáveis pelos indivíduos e o acesso científico a esses discursos se faz através do método trabalho da Pesquisa documental, que vem auxiliar o pesquisador a identificar o que lhe é necessário e importante para sua pesquisa. Dessa forma como diria Pêcheux “o desafio crucial é o de construir interpretações, sem jamais neutralizá-Ias, nem no 'qualquer coisa' de um discurso sobre o discurso, nem em 55 um espaço lógico estabilizado com pretensão universal.” (1998, p. 55) Assim, a possibilidade de (re)formar os conceitos dos seres e objetos de uma ou para uma ciência a partir da visão de mundo oferecida pelos próprios sujeitos inseridos no processo de pesquisa, e não apenas pela visão do pesquisador, é o que se apresenta como o diferencial trazido pela Análise do Discurso em conjunto com Pesquisa Documental capaz de inseri-las no rol das metodologias de pesquisa associáveis aos padrões filosóficos de pesquisa científica, em especial, ao universo da pesquisa em Educação. REFERÊNCIAS ALVES, Alda Judith. A “Revisão da Bibliografia” em Teses e Dissertações: meus tipos ines quecíveis. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 81, p. 53-60, maio 1992. 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