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CAPÍTULO 1 PENSANDO COMO UM ECONOMISTA Grande parte da microeconomia exige o estudo de como as pessoas fazem escolhas sob condições de escassez, embora muitas delas reajam negativamente a essa des- crição, dizendo que o assunto possui pouca relevância real nos países desenvolvidos, onde a escassez material, de modo geral, é uma coisa do passado. Essa reação, no entanto, assume uma visão muito estreita do termo escassez, pois sempre há importantes recursos com oferta reduzida. Quando morreu, Aristóteles Onassis possuía vários bilhões de dólares, uma vez que tinha mais dinheiro do que jamais poderia ter gasto, e o utilizava para coisas como mandar esculpir à mão apoios para os pés feitos de mármore no formato de baleias para os bancos do bar de seu iate. Mesmo assim, ele enfrentou um problema de escassez muito maior do que a grande parte de nós um dia já pensou enfrentar. Onassis era vítima de miastenia grave, uma doença neurológica autoimune debilitante e progressiva, e, por esse motivo, para ele, a escassez que importava não era a de dinheiro, mas sim de tempo, energia e habilidade física necessários para realizar atividades comuns do dia a dia. O tempo é um recurso escasso para todos, não apenas para os portadores de doen- ças terminais. Portanto, ao decidir que filmes ver, por exemplo, é o tempo, e não o preço do ingresso, que restringe a maioria de nós. Com apenas algumas noites livres por mês, ver um filme significa não poder ver outro ou, então, não poder jantar com amigos. Todavia, tempo e dinheiro não são os únicos recursos escassos importantes. Con- sidere, por exemplo, a escolha econômica que você enfrenta quando um amigo o convi da para um bufê de café da manhã: você tem de decidir como completar seu prato, e mesmo que não seja rico, dinheiro não seria o problema, já que pode comer o quanto quiser de graça. Tempo também não seria um obstáculo, já que você teria a manhã inteira livre e gostaria de passar esse tempo na companhia de seu amigo. No entanto, nesse caso, o importante recurso em escassez é a capacidade de seu estômago. Você possui, diante de si, uma mesa inteira com suas comidas preferidas e tem de de- cidir quais comer e em que quantidades. Comer mais um waffle significa necessaria- mente ter menos espaço para mais ovos mexidos, e mesmo que essa situação não envolva dinheiro, sua escolha não deixa de ser uma decisão econômica. Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 3 5/28/13 4:47 PM PARTE I INTRODUÇÃO4 “Ah, aqui é ótimo, mas eu me sinto um pouco desconfortável em um lugar onde não há orçamentos.” Toda escolha envolve importantes elementos de escassez. Às vezes, a escassez re- levante envolve dinheiro, mas... nem sempre. Lidar com a escassez é a essência da condição humana. De fato, não fosse o problema da escassez, a vida seria muito menos intensa, uma vez que, para alguém com um tempo de vida e recursos materiais infini- tos, nenhuma decisão jamais importaria. Neste capítulo, examinaremos alguns dos princípios fundamentais da teoria mi- croeconômica e veremos como um economista poderia aplicá-los a uma grande va- riedade de escolhas que envolvem a escassez, enquanto nos capítulos posteriores desenvolveremos a teoria mais formalmente. Por enquanto, nossa meta é conseguir uma sensação intuitiva daquela mentalidade distintiva conhecida como “pensar como um economista”, e a melhor maneira de fazer isso é analisar uma série de problemas com os quais estamos familiarizados por experiência própria. A ABORDAGEM DO CUSTO-BENEFÍCIO PARA DECISÕES Muitas das escolhas que os economistas estudam podem ser expressas por meio da seguinte pergunta: — Devo fazer a atividade x? Para alguém que queira ir ao cinema, “... fazer a atividade x?” pode ser, por exem- plo, “... ver Casablanca hoje à noite?”. Para quem vai a um bufê de café da manhã, pode ser “... comer mais um waffle?”. Os economistas respondem a essas perguntas comparando os custos e benefícios de fazer a atividade em questão, e a regra de deci- são que utilizamos é incrivelmente simples. Se C(x) denota os custos de se fazer x e B(x) denota os benefícios, então: Se B(x) > C(x), faça x; caso contrário, não o faça. Para aplicar essa regra, temos de definir e medir seus custos e benefícios. Os va- lores monetários são um denominador comum útil para essa finalidade, mesmo quan- do a atividade não possui nenhuma relação direta com dinheiro. Definamos B(x) como © T he N ew Y or ke r C ol le ct io n 19 76 D on al d R ei lly , e m c ar to on ba nk .c om . To do s os d ir ei to s re se rv ad os . Se o benefício de uma atividade excede seu custo, faça-a. Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 4 5/28/13 4:47 PM 5CAPÍTULO I PENSANDO COMO UM ECONOMISTA Exemplo 1.1 a quantia máxima em dinheiro que você estaria disposto a pagar para fazer x. Geral- mente, B(x) será uma magnitude hipotética, a quantia que você estaria disposto a pa- gar se fosse necessário, embora nenhum dinheiro vá trocar de mãos. C(x), por sua vez, é o valor de todos os recursos dos quais você tem de abdicar a fim de fazer x. Aqui, C(x) também não precisa envolver uma transferência monetária explícita. Na maioria das decisões, pelo menos alguns dos benefícios ou custos não estarão prontamente disponíveis em termos monetários. Para ver como procedemos nesses casos, considere a decisão simples a seguir. Devo abaixar o volume do meu aparelho de som? Você se sentou em uma cadeira confortável e está escutando música quando percebe que não gosta das duas próximas faixas do disco. Se tivesse um aparelho programável, você o te- ria programado para não tocá-las, mas esse não é o caso e, então, você tem de decidir entre levantar e abaixar o volume ou ficar onde está e esperar as duas faixas acabarem. O benefício de abaixar o volume é não escutar as músicas de que você não gosta em volume alto e o custo, por sua vez, é a inconveniência de se levantar de sua cadeira. Se você estiver extremamente confortável e a música for apenas um pouco incômoda, você prova- velmente ficará onde está, mas se não tiver se ajeitado há muito tempo ou se a música for realmente incômoda, é mais provável que você se levante. Até mesmo para decisões simples como essa é possível transportar os custos e os benefícios relevantes para um sistema monetário. Considere primeiro o custo de sair de sua cadeira: se alguém lhe oferecesse 1 centavo para sair de uma cadeira confortável e não houvesse nenhum outra motivação para fazê-lo além do dinheiro, você aceitaria a oferta? A maioria das pessoas não. Todavia, se alguém lhe oferecesse $1 mil, você estaria de pé em um instante. Em algum ponto, entre $0,01 e $1 mil está seu preço de reserva, a quantia mínima que você aceitaria para sair da cadeira. Para ver onde está o limite, imagine um leilão mental consigo mesmo no qual você vai oferecendo pequenos incrementos a partir de $0,01 até chegar ao ponto em que simples- mente vale a pena se levantar. O valor em que ocorre esse ponto obviamente depende das circunstâncias, e se você for rico, ele tenderá a ser mais alto do que se for pobre, pois deter- minada quantia em dinheiro parecerá menos importante; se estiver se sentindo cheio de energia, será mais baixo do que se estiver cansado; e assim por diante. Para continuarmos a discussão, suponha que seu preço de reserva para sair da cadeira seja $1. Você pode reali- zar um leilão mental similar para determinar a quantia máxima que estaria disposto a pagar para alguém abaixar o volume da música por você, e esse preço de reserva mede os benefí- cios de abaixar a música; suponhamos que ele seja $0,75. Nos termos de nossa regra de decisão formal, temos, então, x = “abaixar o volume do aparelho”, com B(x) = $0,75 < C(x) = $1, o que significa que você provavelmente ficará em sua cadeira. Ouvir as duas próximas faixas será desagradável, mas isso não se compara a ter de se levantar da cadeira. Uma inversão dos valores do custo e benefício implicaria a decisãode levantar e abaixar o volume do som. Se B(x) e C(x) forem iguais, você ficaria indiferente com relação às duas alternativas. • O PAPEL DA TEORIA ECONÔMICA A ideia de que qualquer pessoa pode realmente calcular os custos e os benefícios de abaixar o volume do aparelho de som pode parecer absurda. Os economistas são cri- ticados por fazer suposições não realistas sobre como as pessoas se comportam, e os leigos rapidamente questionam qual seria a finalidade da imagem de uma pessoa ten- tando decidir quanto ele pagaria para evitar levantar de sua cadeira. Há duas respostas para essa crítica. A primeira é que os economistas não supõem que as pessoas façam explicitamente esses cálculos. Em vez disso, como muitos econo- mistas defendem, podemos fazer previsões úteis supondo que as pessoas ajam como se preço de reserva da atividade x preço pelo qual uma pessoa estaria indiferente entre fazer x e não fazer x. Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 5 5/28/13 4:47 PM PARTE I INTRODUÇÃO6 tivessem feito esses cálculos. Essa visão foi enfaticamente expressa pelo vencedor do Prêmio Nobel Milton Friedman, que a ilustrou analisando as técnicas utilizadas por jogadores profissionais de bilhar.1 Ele defende que as tacadas que os jogadores esco- lhem e o modo específico como tentam realizá-las podem ser extremamente bem pre- vistas supondo que os jogadores considerarão cuidadosamente todas as leis relevantes da física newtoniana. É claro que poucos jogadores profissionais de bilhar tiveram uma educação formal em física e quase nenhum deles sabe recitar leis como “o ângulo de incidência é igual ao ângulo de reflexão”. Eles provavelmente também não conhe- cem as definições de “colisões elásticas” ou “momento angular”, mas, mesmo assim – Friedman defende – eles nunca teriam se tornado jogadores profissionais a menos que jogassem de acordo com as leis da física. Nossa teoria do comportamento do jogador de bilhar supõe, de maneira não realista, que os jogadores conheçam as leis da física, e Friedman nos estimula a julgar essa teoria não por quão preciso é seu pressuposto central, mas por quão bem ela prevê o comportamento, e nisso ela tem de fato um ótimo desempenho. Assim como os jogadores de bilhar, também temos de desenvolver habilidades para lidar com nossos ambientes, e muitos economistas, entre eles Friedman, acredi- tam que podemos obter boas percepções sobre nosso comportamento se supusermos que agimos como se fôssemos governados pelas regras racionais da tomada de decisão. Por tentativa e erro, de alguma maneira acabamos por absorver essas regras, assim como os jogadores de bilhar absorvem as leis da física. Uma segunda resposta à acusação de que os economistas fazem suposições não realistas é admitir que, com frequência, o comportamento realmente difere das previ- sões dos modelos econômicos. Assim – como diz o economista Richard Thaler – geral- mente nos comportamos mais como jogadores de bilhar novatos do que como profissionais, ignorando tacadas indiretas e sem a menor ideia de como conseguir o efeito adequado sobre a bola branca de modo a posicioná-la para a próxima tacada – e as evidências consideráveis sustentam essa segunda visão. Mesmo quando os modelos econômicos falham em termos descritivos, eles geral- mente fornecem um direcionamento útil para a tomada de decisões. Isto é, ainda que nem sempre prevejam como realmente nos comportamos, os modelos econômicos po- dem nos dar percepções úteis sobre como alcançar nossos objetivos de maneira mais eficiente, e se os jogadores novatos de bilhar ainda não tiverem internalizado as leis relevantes da física, eles podem consultá-las em busca de um guia sobre como aprimo- rar sua técnica. Os modelos econômicos geralmente desempenham um papel análogo no que diz respeito às decisões comuns de consumidores e empresas, e de fato esse papel fornece por si só um motivo convincente para aprender economia. FALÁCIAS COMUNS NA TOMADA DE DECISÕES Alguns economistas sentem-se envergonhados se um leigo ressalta que grande parte do que eles fazem se resume a uma aplicação do princípio de que devemos realizar uma ação se, e somente se, seus benefícios excederem seus custos. Isso não parece suficiente para manter uma pessoa com Ph.D. no assunto ocupada o dia inteiro! No entanto, economia é muito mais do que isso. As pessoas que estudam economia descobrem ra- pidamente que medir custos e benefícios não é somente uma ciência, mas também uma arte. Alguns custos parecem quase deliberadamente escondidos dos nossos olhos, e outros podem parecer relevantes, mas, se olharmos mais atentamente, perceberemos que não o são. A economia nos ensina como identificar os custos e benefícios que realmente importam, e um objetivo importante deste livro é ensinar-lhe a aprimorar suas tomadas 1 Milton Friedman. “The Methodology of Positive Economics”. Essays in Positive Economics. Chica- go: University of Chicago Press, 1953. © Ja y D ir ec to /G et ty Im ag es O campeão de bilhar profissional Corey Deuel pode não conhecer todas as leis formais da física newtoniana, mas a qualidade de suas jogadas sugere que ele possui uma profunda compreensão dessas leis. As pessoas nem sempre se comportam como o previsto por modelos econômicos, mas eles fornecem percepções úteis sobre como alcançar objetivos importantes. Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 6 5/28/13 4:47 PM 7CAPÍTULO I PENSANDO COMO UM ECONOMISTA de decisões. Um bom ponto de partida é examinar algumas falácias comuns na toma- da de decisões, uma vez que os princípios econômicos relevantes são simples e pauta- dos no bom-senso, mas muitas pessoas os ignoram. FALÁCIA 1: IGNORAR CUSTOS IMPLÍCITOS Uma das falácias é ignorar custos que não são explícitos, ou seja, se fazer a atividade x significa não fazer a atividade y, então o valor para que você faça y (se a tivesse feito) é um custo de oportunidade de fazer x. Muitas pessoas tomam decisões ruins porque tendem a ignorar o valor dessas= oportunidades abdicadas, e essa noção sugere que quase sempre será instrutivo transformar perguntas como “Devo fazer x?” em “Devo fazer x ou y?” Nesta última, y é simplesmente a alternativa mais valorizada em relação a fazer x. O exemplo a seguir reforça essa ideia. Devo ir esquiar hoje ou trabalhar como auxiliar de pesquisa? Há uma área de esqui próxima à sua universidade e, por experiência, você sabe que um dia esquiando montanha abaixo vale $60. Os gastos envolvidos são de $40 (o que inclui passagem de ônibus, ingresso do elevador e equipamentos), entretanto, esses não são os únicos custos de ir esquiar, uma vez que você também tem de levar em consideração o valor da alternativa mais atraente de que abdicará ao escolher o esqui. Suponha que a melhor alternativa seja seu novo emprego como auxiliar de pesquisa de um professor universitário, o qual paga $45 por dia; porém, você gosta dele a ponto de estar disposto a fazê-lo de graça. Sendo assim, a questão que você enfrenta é: “Devo ir esquiar ou trabalhar como auxiliar de pesquisa?” Nesse caso, o custo de esquiar não é somente o custo explícito da cesta de esqui ($40), mas também o custo de oportunidade dos lucros abdicados ($45). Os custos totais são, por- tanto, de $85, o que excede os benefícios de $60. Como C(x) > B(x), você deve permanecer no campus e trabalhar para seu professor. Alguém que ignorasse o custo de oportunidade dos lucros abdicados decidiria, incorretamente, por esquiar. • O fato de você gostar do emprego de pesquisador o suficiente para estar disposto a realizá-lo de graça é uma outra maneira de dizer que não há custos psíquicos associados à realização do trabalho, e isso é importante porque significa que, ao deixar de trabalhar, você não estaria escapando de algo desagradável, mas é claro que nem todos os empre- gos se enquadram nessa categoria. Suponha, em vez disso, que seu emprego seja limpar pratos no refeitório pela mesma remuneração, $45/dia, e que o emprego sejatão desa- gradável que você não estaria disposto a fazê-lo por menos de $30/dia. Supondo que seu gerente do refeitório permita que você tire um dia de folga sempre que você quiser, va- mos reconsiderar sua decisão sobre ir ou não esquiar. Devo esquiar hoje ou limpar pratos? Há duas maneiras equivalentes de analisar essa decisão, e a primeira delas é dizer que um dos benefícios de esquiar é não ter de limpar pratos. Como você nunca estaria disposto a limpar pratos por menos de $30/dia, evitar tal tarefa vale essa quantia para você, e esquiar traz o benefício indireto de não ter de limpar pratos. Quando adicionamos esse benefício indireto ao benefício direto de $60 proporcionado pelo esqui, temos B(x) = $90. Nessa visão do problema, C(x) é o mesmo de antes, ou seja, os gastos de $40 mais o custo de oportu- nidade dos lucros abdicados de $45, totalizando $85. Então, agora temos B(x) > C(x), o que significa que é melhor você esquiar. Por outro lado, poderíamos ver a desagradabilidade do emprego de limpar pratos como algo que neutraliza a remuneração recebida. Segundo essa visão, subtrairíamos $30/dia de seus lucros de $45/dia e diríamos que o custo de oportunidade de não trabalhar Exemplo 1.2 custo de oportunidade de uma atividade o valor de tudo o que tem de ser sacrificado para fazer a atividade. Exemplo 1.3 Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 7 5/28/13 4:47 PM PARTE I INTRODUÇÃO8 é de apenas $15/dia. Então, C(x) = $40 + $15 = $55 < B(x) = $60 e, novamente, a conclusão seria de que é melhor você esquiar. Não faz nenhuma diferença qual dessas duas maneiras você usa para abordar a ava- liação do fato de limpar pratos como algo desagradável, mas é crucialmente importante, no entanto, que você o faça ou de um modo ou de outro, evitando contá-lo duas vezes! • Como o Exemplo 1.3 deixa claro, custos e benefícios são recíprocos. Portanto, não incorrer em um custo é o mesmo que obter um benefício, e, seguindo o mesmo raciocínio, não obter um benefício é o mesmo que incorrer em um custo. Por mais óbvio que esse fato pareça, geralmente ele é ignorado. Um exemplo disso foi um aluno estrangeiro de pós-graduação que tirou seu diploma há alguns anos e estava prestes a voltar para seu país. As regulamentações comerciais de seu país per- mitiam que pessoas que estivessem chegando de países estrangeiros trouxessem um automóvel novo sem ter que pagar a tarifa de importação normal de 50%. O sogro do aluno pediu a ele que levasse um Chevrolet novo que custava $20 mil e enviou-lhe um cheque nesse exato valor, o que causou um dilema ao aluno. Ele estava planejando le- var um Chevrolet e vendê-lo em seu país, pois, como observamos, pelo fato de geral- mente ser cobrado um imposto de importação de 50% sobre carros novos, um Chevrolet seria vendido na revendedora daquele país por $30 mil. O aluno estimava que seria fácil vendê-lo por $28 mil sem o uso de intermediários, o que lhe daria um lucro líquido de $8 mil. Assim, o custo de oportunidade de dar o carro a seu sogro por $20 mil seria de $8 mil, e não obter esse grande benefício era um grande custo. No fim das contas, o aluno decidiu arcar com esse custo por valorizar ainda mais manter a paz na família. Como o princípio do custo-benefício deixa claro, a melhor decisão nem sempre é a que o deixa com mais dinheiro no bolso. Devo começar a trabalhar ou fazer faculdade primeiro? Os custos de se ir para a faculdade não se limitam a mensalidades, taxas, alojamento, livros, suprimentos e afins. Também incluem o custo de oportunidadedas alternativas abdicadas enquanto se estuda, uma vez que os ganhos aumentam com a experiência. Assim, quanto mais experiente você é, mais tem de abdicar para frequentar a faculdade, e esse custo de oportunidade é, portanto, mais baixo quando você acaba de sair da escola. Do lado do benefício, um grande ganho de um curso superior é melhorar o seu salário. Sendo assim, quanto antes você se formar, mais tempo terá para colher os frutos desse be- nefício. Outro benefício é a agradabilidade de ir à faculdade em vez de trabalhar. Em geral, os tipos de empregos que as pessoas conseguem tendem a ser menos desagradáveis (ou mais agradáveis) quanto mais educação formal elas têm. Sendo assim, começando a faculdade ime- diatamente depois da escola, você evita ter de trabalhar em empregos menos agradáveis. Para a maioria das pessoas, então, faz sentido ir à faculdade primeiro e começar a trabalhar depois, e certamente faz muito mais sentido frequentar a faculdade aos 20 anos de idade do que aos 50. Uma exceção comum envolve pessoas imaturas demais assim que saíram da escola para aproveitar os benefícios de cursar uma faculdade. Para elas, é melhor trabalhar um ou dois anos antes da faculdade. • O exemplo da faculdade é uma ilustração perfeita do argumento de Friedman sobre como avaliar uma teoria, uma vez que os formandos do ensino médio não deci- dem ir à faculdade com base em cálculos sofisticados envolvendo custos de oportuni- dades; pelo contrário, a maioria deles começa imediatamente após o ensino médio simplesmente porque é isso que a maioria de seus colegas faz, e acaba sendo a coisa certa a se fazer. Mas isso levanta a questão de como é que isso passou a ser a coisa certa a se fazer, visto que costumes não se originam do nada. Diversas sociedades tiveram séculos para experimentar essa decisão, e se houvesse alguma maneira significativamente melhor de Exemplo 1.4 Por que a maioria dos alunos começa a faculdade imediatamente depois de terminar a escola? Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 8 5/28/13 4:47 PM 9CAPÍTULO I PENSANDO COMO UM ECONOMISTA organizar os períodos de estudo e trabalho da vida, alguma sociedade provavelmente já a teria descoberto há muito tempo. Nosso costume atual sobreviveu porque é efi- ciente, e as pessoas talvez não façam cálculos explícitos sobre o custo de oportunidade de lucros abdicados, mas geralmente se comportam como se os fizessem.2 Embora o conceito de custo de oportunidade seja extremamente simples, ele é um dos mais importantes em microeconomia, e a arte de aplicar esse conceito corretamen- te está em ser capaz de reconhecer a alternativa mais valiosa que é sacrificada pela realização de determinada atividade. FALÁCIA 2: DEIxAR DE IGNORAR CUSTOS IRRECUPERÁVEIS Um custo de oportunidade pode não parecer relevante quando, na realidade, é. Por outro lado, às vezes uma despesa pode parecer relevante quando, na realidade, não é, e isso é o que frequentemente ocorre com os custos irrecuperáveis ou custos afunda- dos, os quais não podem mais ser recuperados no momento em que uma decisão é tomada. Ao contrário dos custos de oportunidade, esses custos devem ser ignorados, uma vez que não ignorá-los é uma segunda falácia na tomada de decisões. O princípio de ignorar custos irrecuperáveis aparece claramente no exemplo a seguir. Devo dirigir até Boston ou tomar um ônibus? Você está planejando uma viagem de 250 quilômetros até Boston. Exceto pelo custo, você é completamente indiferente entre dirigir e pegar um ônibus. A passagem do ônibus custa $100, e, como você não sabe quanto custaria ir de carro, liga para a Hertz e pede uma esti- mativa. A Hertz lhe diz que, para seu modelo de carro, dirigir por 10 mil quilômetros em um ano típico representaria os seguintes gastos: Seguro $1.000 Juros 2.000 Combustível e óleo 1.000 Manutenção 1.000 Total $5.000 Suponha que você calcule que esses custos sejam de $0,50/km e utilize esse valor para calcular que a viagem de carro lhe custará $125. Como isso é mais do que a passagem de ônibus ($100), você decide ir de ônibus. Se decidir dessa maneira, será vítima da falácia do custo irrecuperável. Os pagamentos de seguro e juros não variam com o número de quilômetros que você dirige por ano. Am- bos são custos irrecuperáveis e serão iguais, independentemente de sua decisão de dirigir até Boston ou não. Dos custos listados, combustível, óleo e manutenção são os únicos que variam comos quilômetros dirigidos: eles somam $2 mil para cada 10 mil quilômetros di- rigidos, ou $0,20/km. A $0,20/km, ir de carro até Boston custa apenas $50, e como isso é menos do que a passagem de ônibus, você deve ir dirigindo. • 2 Isso não significa que todos os costumes necessariamente promovam a eficiência. Por exemplo, as circunstâncias podem ter mudado de tal maneira que um costume que promovia eficiência no pas- sado não funciona mais. Com o tempo, tal costume talvez venha a mudar, contudo, muitos hábitos e costumes, uma vez arraigados, levam muito tempo para se adaptarem. Exemplo 1.5 Se um custo já foi incorrido e não pode ser recuperado, ele é irrelevante para todas as decisões sobre o futuro. Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 9 5/28/13 4:47 PM PARTE I INTRODUÇÃO10 No Exemplo 1.5, observe o papel desempenhado pela suposição de que, exceto pelos custos, você é indiferente entre os dois meios de transporte, ou seja, se preferisse um meio ao outro, também teríamos de considerar essa preferência. Por exemplo, se você estivesse disposto a pagar $60 para evitar o incômodo de dirigir, o custo real de dirigir seria de $110, e não de $50, e você deveria ir de ônibus. Exercícios como o apresentado a seguir estarão distribuídos por todo o livro para ajudá-lo a ter certeza de que compreendeu importantes conceitos analíticos, e você dominará a microeconomia de maneira mais eficiente se fizer esses exercícios à medida que for progredindo na leitura. EXERCÍCIO 1.1 Como seria a sua resposta à pergunta do Exemplo 1.5 se o valor de evitar o incô- modo de dirigir fosse $20 e você calculasse uma média de uma multa de trânsito de $28 para cada 200 quilômetros dirigidos? Para verificar se você respondeu certo, as respostas dos exercícios inseridos no texto do capítulo podem ser encontradas ao final de cada um deles. Naturalmente, os exercícios serão muito mais úteis se você resolvê-los antes de consultar as respostas. O experimento da pizza Uma pizzaria local oferece uma refeição em sistema de rodízio por $5, no qual você paga na entrada e o garçom lhe traz quantas fatias de pizza você desejar. Um antigo colega de turma realizou o seguinte experimento: um assistente servia de garçom para um grupo de mesas.3 O “garçom” selecionava metade das mesas aleatoriamente e dava a todos que estivessem naquelas mesas um reembolso de $5 antes de anotar os pedidos. Os clientes das outras mesas, porém, não recebiam nenhum reembolso, e ele, então, anotava cuidadosamente o nú- mero de fatias que cada cliente comia. Que diferença, se houver, você prevê nas quantidades de fatia consumidas por cada um dos grupos? Os clientes de cada grupo confrontam a questão: “Devo comer mais uma fatia de pizza?” Aqui, a atividade x consiste em comer mais uma fatia. Para ambos os grupos, C(x) é exatamente zero, e mesmo os membros do grupo que não receberam o reembolso podem comer quantas fatias quiserem sem pagar nada a mais. Como o grupo do reembolso foi escolhido aleatoriamente, não há motivo para supor que seus membros gostem mais ou me- nos de pizza do que os outros. Para todos, a regra de decisão é: continue comendo até não haver mais nenhum prazer em comer mais uma fatia. Dessa forma, B(x) deveria ser o mesmo para ambos os grupos, e as pessoas tanto de um grupo quanto de outro devem continuar comendo até B(x) cair para zero. Seguindo esse raciocínio, os dois grupos deveriam comer a mesma quantidade de pizza, em média. O preço de entrada no rodízio de $5 é um custo irrecuperável e não deve ter influência nenhuma na quantidade de pizza que uma pessoa come. Entretanto, o grupo que não recebeu o reembolso consumiu substancialmente mais pizza. • Embora nossa regra de decisão do custo-benefício não passe no teste da previ- são nesse experimento, sua mensagem para o tomador de decisões racional não é afetada. Pela lógica, os dois grupos deveriam ter se comportado da mesma maneira, sendo que a única diferença entre eles é que os clientes do grupo reembolsado têm rendimentos ao longo da vida $5 mais altos do que os dos outros. Uma diferença tão trivial não deveria ter nenhum efeito sobre o consumo de pizza, porém os membros do grupo não reembolsado pareciam querer mais para garantir que “o dinheiro gasto 3 Ver Richard Thaler. “Toward a Positive Theory of Consumer Choice”. Journal of Economic Beha- vior and Organization, n. 1, 1980. Exemplo 1.6 Comer mais só para fazer o dinheiro pago valer a pena não é uma estratégia de decisão sensata. Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 10 5/28/13 4:47 PM 11CAPÍTULO I PENSANDO COMO UM ECONOMISTA valeu a pena”. Com toda probabilidade, no entanto, esse motivo levou-os apenas a comer demais.4 O que há de errado em se sentir motivado a “fazer o dinheiro gasto valer a pena”? Absolutamente nada, contanto que a força por trás dessa motivação opere antes de você entrar em transações. Assim, faz todo o sentido ser levado, por esse mo- tivo, a escolher um restaurante em detrimento de um concorrente idêntico, mas que, por acaso, cobre mais. Todavia, uma vez que o preço do seu almoço tenha sido deter- minado, a motivação de fazer o dinheiro pago valer a pena deve ser abandonada, e a satisfação que você obtém por comer mais uma fatia de pizza deve depender, então, apenas da fome que você está sentindo e de quanto você gosta de pizza, não de quanto pagou. Contudo, as pessoas geralmente parecem não se comportar dessa maneira, e essa dificuldade pode decorrer do fato de que não somos criaturas totalmente flexíveis; sendo assim, talvez motivações que façam sentido em um contexto não sejam comple- tamente abandonadas em outro. EXERCÍCIO 1.2 Jim ganha um ingresso de uma estação de rádio para assistir a um show de uma banda de jazz ao ar livre. Mike pagou $18 por um ingresso para o mesmo show. Na noite do show, cai uma enorme tempestade. Se Jim e Mike tiverem os mesmos gos- tos, qual deles mais provavelmente irá ao show, supondo que cada um decida com base em uma comparação de custo-benefício? FALÁCIA 3: MEDIR CUSTOS E BENEFÍCIOS COMO PROPORÇÕES EM VEz DE VALORES ABSOLUTOS EM DINHEIRO Quando um menino pergunta à sua mãe “Já estamos chegando?”, como ela responde- rá se eles estiverem a 10 quilômetro de seu destino final? Sem nenhum conhecimento do contexto de seu percurso, não há como saber. Se eles estiverem chegando ao fim de um percurso de 300 quilômetro, sua resposta quase certamente será positiva, mas se eles acabaram de iniciar um percurso de 12 quilômetro, ela responderá que não. Dicas contextuais são importantes para diversas avaliações comuns, por isso pen- sar na distância como um percentual da distância total a ser percorrida é natural e informativo. Muitos também acham natural pensar em termos percentuais ao compa- rar custos e benefícios, porém, como ilustram os dois exemplos simples a seguir, essa tendência geralmente causa problemas. Você deve dirigir até o Walmart para economizar $10 em um rádio despertador que custa $20 em outras lojas? Você vai comprar um rádio despertador em uma loja próxima ao campus por $20 quando um amigo lhe diz que o mesmo rádio está em promoção no Walmart por apenas $10. Se o Walmart fica a 15 minutos de carro de onde você está, onde você compraria o rádio? Se ele quebrar e ainda estiver na garantia, você tem de enviá-lo ao fabricante para consertar, independentemente de onde o tiver comprado. 4 Uma alternativa à explicação de “fazer o dinheiro pago valer a pena” é que $5 é uma fração signifi- cativa da quantia que muitos clientes têm disponível para gastar a curto prazo. Assim, os membros do grupo reembolsado talvez tenham se contido mais para deixar espaço sobrando para a sobremesa que agora eles poderiam pagar. Para testar essa explicação alternativa, o experimentador poderia dar aos membros do grupo não reembolsado um presente em dinheiro no valor de $5 mais cedo naquele mesmo dia e, então, ver se a quantidade de pizza consumida pelos dois grupos ainda assim seria diferente.Exemplo 1.7a Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 11 5/28/13 4:47 PM PARTE I INTRODUÇÃO12 Você deve dirigir até o centro da cidade para economizar $10 em um televisor de $1 mil? Você vai comprar um televisor em uma loja próxima ao campus por $1.010, quando um amigo lhe diz que o mesmo televisor está em promoção no Walmart por apenas $1 mil. Se o Walmart fica a 15 minutos de carro de onde você está, onde você compraria o televisor? Novamente, consertos dentro da garantia acarretariam enviar o televisor ao fabricante em qualquer caso. Não existe uma única resposta certa para nenhuma dessas perguntas, que questio- nam, se o benefício de dirigir até o Walmart vale seu custo. A maioria das pessoas diria que certamente vale a pena fazer a viagem para comprar o rádio despertador, mas não para comprar o televisor. Quando solicitadas a explicar, elas dizem que dirigir até a Walmart lhes proporcionaria uma economia de 50% sobre o rádio, mas uma economia de menos de 1% sobre o televisor. Esses percentuais, no entanto, são irrelevantes. Em cada caso, o benefício de dirigir até o Walmart é exatamente a economia de $10 obtida com o preço de compra mais baixo. Qual é o custo de dirigir até o Walmart? Algumas pessoas podem estar dispostas a fazer a viagem por apenas $5, enquanto outras podem não estar dispostas a fazê-la por menos de $50, mas independentemente de qual seja esse valor, ele será o mesmo em ambos os casos. Então, suas respostas para as perguntas feitas anteriormente têm de ser iguais. Se você estivesse disposto a fazer a viagem por, digamos, $8, então deve comprar o rádio despertador e a televisão no Walmart; mas se seu preço de reserva para fazer a viagem for, digamos, $12, então você deve comprar ambos os eletrodomésticos na loja próxima ao campus. • Ao fazer o teste do custo-benefício, você deve expressar os custos em termos ab- solutos em dinheiro, uma vez que comparar percentuais não é uma maneira muito frutífera de pensar em decisões como essas. EXERCÍCIO 1.3 Você possui um cupom que lhe dá direito a um desconto na passagem aérea de apenas uma das duas viagens que você tem agendada para fazer no próximo mês. Você pode ter $100 de desconto sobre a passagem normal de $200 para Nova York, ou um desconto de $120 sobre a passagem normal de $2.400 para Nova Délhi. Em que viagem você deve usar seu cupom? FALÁCIA 4: NÃO COMPREENDER A DISTINÇÃO ENTRE UM VALOR MéDIO E UM VALOR MARGINAL Até agora, discutimos decisões relacionadas a realizar ou não determinada ação. Ge- ralmente, porém, a escolha não envolve decidir realizar ou não a ação, e sim até que ponto ela deve ser realizada. Nesse caso mais complexo, podemos aplicar o princípio do custo-benefício reformulando a pergunta, isto é, em vez de perguntar “Devo fazer a atividade x?,” devemos perguntar repetidas vezes “Devo aumentar meu nível atual de envolvimento na atividade x?” Para responder a essa pergunta, temos de comparar os benefícios e custos de uma unidade adicional da atividade. O custo de uma unidade adicional da atividade é cha- mado custo marginal da atividade, enquanto o benefício de uma unidade adicional é chamado benefício marginal da atividade. A regra do custo-benefício nos diz para continuar aumentando o nível de uma atividade enquanto seu benefício marginal exceder seu custo marginal, mas como o exemplo a seguir ilustra, as pessoas geralmente não aplicam essa regra corretamente. Exemplo 1.7b Ao comparar custos e benefícios, sempre use valores absolutos em dinheiro, e não proporções. custo marginal aumento no custo total que resulta da realização de uma unidade adicional de uma atividade. benefício marginal aumento no benefício total que resulta da realização de uma unidade adicional de uma atividade. Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 12 5/28/13 4:47 PM 13CAPÍTULO I PENSANDO COMO UM ECONOMISTA Tom deve lançar mais um barco à água? Tom administra uma pequena frota de pesca de três barcos e, atualmente, seus custos ope- racionais diários, incluindo aluguel dos barcos e salários dos pescadores, são de $300, ou uma média de $100/barco lançado à água. Sua receita ou benefício diário total da venda dos peixes é, atualmente, de $600, ou uma média de $200/barco lançado à água. Tom decide que, como seu custo por barco é menor do que sua receita por barco, ele deve lançar mais um barco à água. Essa é uma decisão sensata? Para responder a essa pergunta, temos de comparar o custo marginal de lançar um barco à água com seu benefício marginal. As informações fornecidas, nos dizem apenas o custo médio e o benefício médio de se lançar um barco à água – que são, respectiva- mente, um terço do custo total e um terço da receita total dos três barcos. Saber o benefício médio e o custo médio por barco lançado à água não nos permite decidir se lançar mais um barco à água faz sentido em termos econômicos, pois, embora o benefício médio dos três barcos lançados à água até agora talvez possa ser igual ao benefício marginal de lançar mais um barco, este também pode ser mais alto ou mais baixo. A mesma afirmação é válida no que diz respeito aos custos médio e marginal. Para ilustrar, suponha que o custo marginal de se lançar um barco à água e de sua tri- pulação seja constante a $100/barco ao dia. Sendo assim, Tom deve lançar à água um quarto barco somente se isso adicionar pelo menos $100 à sua receita diária total de peixes pes- cados. Entretanto, o mero fato de a receita média atual ser de $200/barco não nos diz qual será o benefício marginal de lançar à água o quarto barco. Suponha, por exemplo, que a relação entre o número de barcos lançados à água e a receita diária total seja como o descrito na Tabela 1.1. Com três barcos por dia, o benefício médio por barco seria, então, de $200, assim como o indicado anteriormente. Se Tom lan- çasse à água um quarto barco, a receita diária média cairia para $160/barco, o que é ainda mais do que o suposto custo marginal de $100. Observe, no entanto, que, na segunda coluna, a receita total de quatro barcos é de apenas $40/dia a mais do que a receita total de três barcos. Isso significa que a receita marginal de lançar à água o quarto barco é de apenas $40, e como isso é menos que seu custo marginal ($100), não faz nenhum sentido lançar à água o quarto barco. • Tabela 1.1 Como o custo total varia com o número de barcos lançados à água Número de barcos Benefício diário total ($) Benefício diário médio ($/barco) 0 0 0 1 300 300 2 480 240 3 600 200 4 640 160 O exemplo a seguir ilustra como aplicar o princípio do custo-benefício correta- mente nesse caso. Exemplo 1.8 custo médio o custo médio de realizar n unidades de uma atividade é o custo total da atividade dividido por n. benefício médio o benefício médio de realizar n unidades de uma atividade é o benefício total da atividade dividido por n. Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 13 5/28/13 4:47 PM PARTE I INTRODUÇÃO14 Quantos barcos Tom deve lançar à água? O custo marginal de lançar à água um barco e tripulação é, novamente, constante a $100 por dia. Se a receita diária total da pesca novamente varia com o número de barcos lançados à água, como mostra a Tabela 1.1, quantos barcos Tom deve lançar à água? Tom deve continuar lançando barcos à água enquanto o benefício marginal de fazê-lo for pelo menos igual ao custo marginal. Com um custo marginal constante a $100 por lan- çamento, Tom deve, então, continuar lançando barcos à água enquanto o benefício marginal for de pelo menos $100. Aplicando a definição de benefício marginal aos valores de benefício total na segunda coluna da Tabela 1.1, obtemos os valores do benefício marginal na terceira coluna da Tabela 1.2. Como o benefício marginal é a diferença no benefício total que ocorre quando variamos o número de barcos de um em um, colocamos cada valor de benefício marginal entre as linhas, mostrando os valores correspondentes de benefício total. Por exemplo, o benefíciomarginal de aumentar o número de barcos de um para dois é $180, a diferença entre a re- ceita total ($480) com dois barcos e a receita total ($300) com um barco. Tabela 1.2 Como o benefício marginal varia com o número de barcos lançados à água Número de barcos Benefício diário total ($) Benefício diário marginal ($/barco) 0 0 1 300 300 2 480 180 3 600 120 4 640 40 Comparando os valores de custo marginal de $100/barco com os de benefício margi- nal na terceira coluna da Tabela 1.2, vemos que os três primeiros lançamentos à água satis- fazem o teste de custo-benefício, mas o quarto não o satisfaz. Sendo assim, Tom deve lançar apenas três barcos à água. • EXERCÍCIO 1.4 Se o custo marginal de lançar à água cada barco não fosse de $100, mas de $150, quantos barcos Tom deveria ter lançado à água? O princípio do custo-benefício nos diz que os custos e benefícios marginais – me- didas que correspondem ao incremento de uma atividade em consideração – são as medidas relevantes para escolher o nível que se deve buscar dessa atividade. Contudo, muitas pessoas comparam o custo e benefício médios da atividade ao tomar tais deci- sões, mas, como o Exemplo 1.8 deve ter deixado claro, aumentar o nível de uma ativi- dade pode não ser justificável, embora seu benefício médio no nível atual seja significativamente maior do que seu custo médio. UTILIzANDO O BENEFÍCIO MARGINAL E O CUSTO MARGINAL GRAFICAMENTE Os exemplos que acabamos de discutir acarretam decisões sobre uma atividade que poderia ocorrer somente em determinados níveis – nenhum barco, um barco, dois Exemplo 1.9 Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 14 5/28/13 4:47 PM 15CAPÍTULO I PENSANDO COMO UM ECONOMISTA barcos, e assim por diante; no entanto, os níveis de muitas outras atividades podem variar continuamente. Pode-se comprar gasolina, por exemplo, em qualquer quantida- de desejada. Para atividades continuamente variáveis, geralmente é conveniente exibir a comparação do benefício marginal e do custo marginal graficamente. Quanto Susan deve falar com Hal por mês? Susan tem um plano de telefonia que cobra 4 centavos por minuto por ligações de longa dis- tância para seu namorado Hal (frações de minutos são cobradas segundo a mesma tarifa, en- tão uma ligação de 30 segundos custaria a ela 2 centavos). O valor para Susan – medido em termos de sua disposição a pagar – de um minuto adicional de conversa com Hal é exibido na curva BM da Figura 1.1. Quantos minutos ela deve gastar no telefone com Hal por mês? A inclinação decrescente da curva BM reflete o fato de que o valor de um minuto adicional diminui com a quantidade total de conversa que já aconteceu até aquele momento e, como veremos no Capítulo 3, é padrão comum que, quanto mais alguém tem de um bem, menor é o valor atribuído a unidades adicionais desse mesmo bem. A curva CM no diagrama mede o custo de cada minuto adicional, supostamente constante a $0,04. A quantidade ótima de conversa é a quantidade para a qual essas duas curvas se cruzam – a saber, 400 minutos por mês. Se Susan falasse com Hal menos tempo do que isso, o benefício marginal de adicio- nar mais um minuto excederia o custo marginal, portanto, ela deve falar mais tempo. Mas se eles falarem por mais de 400 minutos por mês, a quantia que ela economizaria falando menos excederia o benefício que ela sacrificaria, o que significa que eles devem falar menos. • EXERCÍCIO 1.5 Se a curva de benefício marginal de Susan for novamente aquela dada na Figura 1.1, quantos minutos por mês ela deve falar com Hal se a tarifa de ligação de longa distância cair para 2 centavos por minuto? A MÃO INVISÍVEL Uma das percepções mais importantes da análise econômica é que a busca individual do interesse próprio é não somente consistente com objetivos sociais mais amplos, mas, na verdade, é até mesmo necessária para eles. Totalmente ignorantes dos efeitos de suas ações, os consumidores e seus interesses próprios agem como se fossem conduzidos pelo Exemplo 1.10 200 400 Minutos por mês Tarifa de longa distância (centavos por minuto) 600 800 BM CM Valor de um minuto adicional Custo de um minuto adicional 1 2 Preço = 4 6 8 Figura 1.1 Quantidade ótima de conversa. A quantidade ótima de uma atividade continuamente variável é a quantidade para a qual seu benefício marginal é exatamente igual ao seu custo marginal. Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 15 5/28/13 4:47 PM PARTE I INTRODUÇÃO16 que Adam Smith chamou de uma mão invisível, produzindo o máximo de bem-estar social. Na talvez mais citada passagem de A riqueza das nações, Smith escreveu: Não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro ou do padeiro que esperamos nosso jantar, mas da consideração que eles têm pelo seu próprio interesse. Apelemos não à sua humanidade, mas ao seu amor-próprio, e nunca falemos com eles sobre nossas necessidades, mas sobre as vantagens que eles podem obter. Smith observou que a concorrência entre vendedores promovia tentativas de desen volver melhores produtos e maneiras mais baratas de produzi-los, e o primeiro a ter êxito nessas tentativas desfrutava de lucros mais altos do que seus rivais, mas ape- nas temporariamente, pois quando os outros copiavam os novos produtos e métodos, suas ofertas inevitavelmente pressionavam os preços para baixo. A percepção de Smith, resumidamente, é que embora os vendedores estivessem tentando promover apenas sua vantagem própria, os maiores beneficiários acabavam sendo os consumidores. Os economistas modernos às vezes perdem de vista o fato de que Smith não acreditava que as motivações egoístas fossem as únicas importantes. Em seu tratado anterior, A teoria dos sentimentos morais, por exemplo, ele escreveu de maneira co- movente sobre a compaixão que sentimos pelos outros: Por mais egoísta que o homem supostamente seja, há evidentemente alguns princí- pios em sua natureza que o faz se interessar pela sorte dos outros e tornam a felici- dade destes necessária para ele, embora não desfrute de nada dela, exceto do prazer de vê-la. São sentimentos desse tipo a pena ou a compaixão, a emoção que sentimos pela desgraça dos outros quando a presenciamos ou temos de imaginá-la de maneira vívida. O fato de sempre sofrermos com os sofrimentos dos outros é uma questão óbvia demais para exigir qualquer exemplo que o prove, pois esse sentimento, como todas as outras paixões originais da natureza humana, não está, de maneira nenhu- ma, restrita aos virtuosos e humanos, embora estes o sintam com a mais refinada sensibilidade. Nem mesmo o maior malfeitor, o mais endurecido infrator das leis da sociedade é totalmente dele desprovido. Smith tinha consciência, além disso, de que o resultado de uma busca desenfreada do interesse próprio às vezes está longe de ser socialmente benigno. Como o exemplo a seguir ilustra, o mecanismo da mão invisível falha quando custos ou benefícios impor- tantes dão resultados para as pessoas em vez de para os próprios tomadores de decisões. Devo queimar as folhas de meu jardim ou transportá-las até a floresta? Suponha que o custo de transportar as folhas seja de $20 e o custo de queimá-las seja de apenas $1 para a proprietária da casa. Se ela se importar somente com os custos que recaem diretamente sobre si mesma, ela decidirá queimar as folhas de seu jardim. O problema é que queimar as folhas acarreta um importante custo externo, que significa um custo arcado por pessoas que não estão diretamente envolvidas na decisão. Esse custo externo representa os danos causados pela fumaça da queimada e recai não sobre a proprietária que toma a decisão de queimar as folhas, mas sobre as pessoas que moram nas proximidades, na direção do vento. Suponha que os danos causados pela fumaça cheguem a $25. Deste modo, o bem da comunida- de exige, então, que as folhas sejam transportadas até a floresta, e não queimadas. No entanto, do ponto de vista do interesse pessoal da proprietária, parece melhor queimá-las.5 • 5 Obviamente,se a proprietária interage frequentemente com as pessoas que moram na direção em que o vento sopra, o interesse próprio pode ainda assim determinar que ela transporte as folhas para preservar a boa-vontade em futuras interações. Mas se essas pessoas forem estranhos anônimos, essa motivação operará com menos força. Exemplo 1.11 Adam Smith: 1723-1790. Os discípulos modernos de Smith geralmente simplificam excessivamente a mensagem dele. custo externo de uma atividade custo que recai sobre pessoas que não estão diretamente envolvidas na atividade. Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 16 5/28/13 4:47 PM 17CAPÍTULO I PENSANDO COMO UM ECONOMISTA Custos e benefícios externos geralmente motivam leis que limitam a discrição individual (custos e benefícios externos serão o foco do Capítulo 17), e a maioria das comunidades hoje, por exemplo, tem leis que proíbem a queima de folhas dentro dos limites das cidades. Essas leis podem ser entendidas como uma maneira de fazer os custos e benefícios vistos pelos indivíduos se parecerem mais com aqueles experi- mentados pela comunidade como um todo, uma vez que, com uma lei contra queimar folhas em vigor, uma pessoa que potencialmente queimaria folhas irá comparar a pena de violar a lei ao custo de transportar as folhas, e a maioria conclui que é mais barato transportá-las. OS PAIS GOSTARIAM QUE SUA FILHA OU SEU FILHO SE CASASSE COM O HOMO ECONOMICUS? Muitos economistas e outros cientistas comportamentais permanecem céticos a respei- to da importância do dever e de outras motivações não egoístas, pois acreditam que as recompensas materiais mais altas associadas ao comportamento egoísta dominam tão fortemente as outras motivações que, em uma primeira abordagem, podemos com certeza ignorar as motivações não egoístas. Tendo essa visão em mente, o estereótipo do tomador de decisões do modelo do interesse próprio geralmente recebe o rótulo de Homo economicus ou “homem eco- nômico”. O homo economicus não vivencia os tipos de sentimentos que motivam as pessoas a votar ou a devolver carteiras perdidas a seus donos com o dinheiro intac- to; pelo contrário, custos e benefícios materiais pessoais são as únicas coisas em que ele pensa. Ele não contribui voluntariamente para instituições privadas de caridade ou para emissoras de televisão, mantém promessas somente quando vale a pena e, se as leis contra poluição não são cuidadosamente executadas, ele desconecta o conversor catalítico de seu carro para economizar combustível. E assim por diante. Obviamente, muitas pessoas não se encaixam na caricatura do modelo de interes- se próprio do “eu primeiro”. Elas doam medula óssea para estranhos com leucemia, enfrentam grandes problemas e incorrem em despesas para que a justiça seja cumpri- da, mesmo quando isso não reverte o dano originalmente causado. Por sua própria conta, salvam pessoas de prédios em chamas e pulam em rios gélidos para resgatar pessoas que correm o risco de se afogar; soldados jogam seus corpos em cima de gra- nadas a ponto de explodir para salvar seus companheiros. Certamente as motivações egoístas são importantes. Quando um detetive investi- ga um assassinato, por exemplo, sua primeira pergunta é: “Quem se beneficiaria com a morte da vítima?”; quando um economista estuda uma regulamentação do governo, ele quer saber quem obtém aumento de renda com ela; e quando um senador propõe um novo projeto de despesas, o cientista político tenta descobrir quais de seus consti- tuintes serão seus principais beneficiários. Nosso objetivo, em grande parte deste livro, é compreender os tipos de compor- tamento gerados pelas motivações egoístas em situações específicas, mas, durante todo esse processo, é crucial lembrar que o modelo do interesse próprio não tem a intenção de ser uma prescrição de como conduzir seus próprios assuntos. Pelo contrário, vere- mos em capítulos posteriores que o homo economicus é lamentavelmente inadequado para as demandas da existência social como a conhecemos. Cada um de nós provavel- mente conhece pessoas que mais ou menos se encaixam na caricatura do homo econo- micus, e nossa prioridade máxima, na maior parte do tempo, é ficar longe deles. A ironia aqui é que ser uma pessoa que segue puramente seus próprios interesses acarreta um grau de isolamento social que não somente é ruim para a alma, mas tam- bém prejudicial ao bolso. Para ter sucesso na vida, mesmo em termos puramente ma- teriais, as pessoas têm de fazer alianças e estabelecer relacionamentos de confiança. Mas que pessoa sensata estaria disposta a confiar no homo economicus? Os próximos capítulos apresentarão exemplos específicos de como motivações não egoístas trazem O interesse próprio é uma das motivações humanas mais importantes, mas não é a única. Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 17 5/28/13 4:47 PM PARTE I INTRODUÇÃO18 recompensas materiais para aqueles que as buscam. Por enquanto, tenha em mente que o modelo do interesse próprio pretende apenas captar uma parte do comportamento humano, ainda que uma parte importante. NATURALISMO ECONÔMICO Estudar biologia permite que as pessoas observem e admirem muitos detalhes da vida os quais, caso contrário, não perceberiam. Para o naturalista, um passeio em uma floresta silenciosa se torna uma aventura. De maneira bem parecida, estudar microeconomia per- mite que a pessoa se torne um “naturalista econômico”, alguém que enxerga os detalhes mundanos da existência comum sob uma nova perspectiva. Cada elemento da paisagem criada pelo homem não é mais uma massa amorfa, mas o resultado de um cálculo implí- cito de custo-benefício. A seguir, temos alguns exemplos do naturalismo econômico. Por que comida de avião é tão ruim? Todos reclamam de comida de avião e, de fato, se qualquer restaurante sério ousasse servir a mesma comida, ele rapidamente iria à falência. Nossas reclamações parecem supor como certo que as refeições servidas pelas empresas aéreas deveriam ser tão boas quanto as que comemos em restaurantes. Mas por que elas deveriam sê-lo? A perspectiva do custo-benefício diz que as empresas aéreas devem aumentar a qualidade de suas refeições se, e somente se, o benefício for maior que o custo de fazê-lo. O benefício de refeições melhores é provavelmente bem medido pelo que os passageiros estariam dispostos a pagar por ele na forma de passagens aéreas mais altas, uma vez que, se pudessem comer uma refeição com qualidade de restaurante por, digamos, um aumento de meros $10 na passagem, a maioria das pessoas provavelmente pagaria a diferença com prazer. O problema, no entanto, é que seria muito mais caro do que isso preparar refeições significativamente melhores a 39 mil pés em uma cozinha minúscula e com um tempo bastante restrito. Seria possível, é claro. Uma empresa aérea poderia remover 20 assentos do avião, instalar uma cozinha moderna e bem equipada, contratar uma equipe extra, gastar mais nos ingredientes, e assim por diante. Todavia, esses custos extras seriam algo por volta de $100 por passageiro, algo bem distante dos $10 citados inicialmente. Diante disso, mesmo com todas as nossas reclamações sobre a má qualidade da comida servida em aviões, poucas pessoas estariam dispostas a arcar com esse ônus extra. Sendo assim, o triste resultado é que o destino da comida de avião é continuar sendo intragável. NATURALISMO ECONÔMICO 1.1 ESCALOPINHO DE VITELA EMPANADO OU ROLINHO DE LEGUMES? LINHAS AÉREAS – O RESTAURANTE © T he N ew Y or ke r C ol le ct io n 20 01 M ic k St ev en s, em c ar to on ba nk .c om . To do s os d ir ei to s re se rv ad os . Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 18 5/28/13 4:47 PM 19CAPÍTULO I PENSANDO COMO UM ECONOMISTA Muitos de nós respondemos calorosamente à máxima: “Dê o melhor de si em tudo o que fizer”. Afinal, ela encoraja certo orgulho de boa execução que, infelizmente, na maioria das vezes, falta. O Naturalismo econômico 1.1 deixa claro, no entanto, que sea máxima for interpretada de maneira literal, ela não fará nenhum sentido, pois fazer algo bem feito exige tempo, esforço e despesas, mas esses recursos são escassos e dedicá-los a uma atividade os indisponibiliza para outras. Aumentar a qualidade de uma das coisas que fazemos significa necessariamente reduzir a qualidade de outras – mais uma aplicação do conceito de custo de oportunidade – e toda decisão inteligente tem que estar ciente de que uma coisa compromete outra. Tudo o que vemos na vida é o resultado de algum compromisso. Para Rafael Nadal, jogar em campeonatos de tênis elimina a possibilidade de ele se tornar um con- certista de piano, contudo, isso obviamente não significa que ele não deva passar tem- po nenhum tocando piano, mas sim que ele provavelmente se manterá em um padrão mais baixo do que o que ele alcança na quadra de tênis. Por que câmbios manuais têm cinco marchas de aceleração e os automáticos, apenas quatro? Quanto mais marchas de aceleração o câmbio de um carro possuir, maior será sua economia de combustível. As marchas adicionais agem como o “overdrive” dos carros da década de 1940, economizando combustível ao permitir que trafeguem pelas rodovias com velocidades de motor mais baixas. A maioria dos carros produzidos atualmente oferece cinco marchas de câmbio em seus câmbios manuais, mas apenas três ou quatro em seus câmbios automáticos. Como a economia de combustível é obviamente algo positivo, por que limitar o número de marchas nos câmbios automáticos? O motivo é que economia de combustível não é nosso único objetivo, pois também que- remos manter o preço do carro dentro de certos limites. Câmbios automáticos são mais com- plexos que os manuais e o custo de adicionar uma marcha extra é, então, muito mais alto. Por outro lado, os benefícios de adicionar uma marcha extra são os mesmos em ambos os casos, e se as montadoras seguirem a regra de “adicionar uma marcha extra se seu benefício superar seu custo", então os câmbios automáticos terão menos marchas do que os manuais. O raciocínio no Naturalismo econômico 1.2 também ajuda a esclarecer por que os câmbios manuais hoje têm cinco marchas quando, há cinquenta anos, a maioria tinha apenas três (e muitos câmbios automáticos, apenas duas). O benefício de adicio- nar uma marcha extra, novamente, é que isso aumenta a economia de combustível. Assim, o valor desse benefício em termos financeiros depende diretamente do preço do combustível. O preço da gasolina em relação a outros bens é muito mais alto hoje do que há cinquenta anos, o que ajuda a explicar por que os câmbios têm mais marchas hoje do que costumavam ter. QUESTÕES POSITIVAS E NORMATIVAS No Noroeste do Pacífico, empresas madeireiras atualmente estão cortando as últimas reservas de sequoias para vender madeira a empreiteiras para a construção de casas. Muitas dessas árvores têm mais de 2 mil anos, um tesouro nacional que nunca pode- remos repor. Para as madeireiras, no entanto, elas valem mais como madeira do que como monumentos do passado. Se as reservas virgens restantes de sequoias têm de ser protegidas, isso é uma questão normativa – uma questão que envolve nossos valores e que está relacionada ao que tem de ser feito ou o que deveria ser feito, porém a análise econômica não pode responder a essas questões sozinha. Uma sociedade que reveren- cia a natureza e o que é antigo pode muito bem decidir o destino das sequoias de ma- neira diferente de uma sociedade que tenha outros valores, ainda que membros de ambas as sociedades estejam totalmente de acordo com todos os fatos e as teorias O tempo e esforço necessários para se tornar campeão de tênis elimina a possibilidade de simultaneamente se tornar um grande concertista de piano. NATURALISMO ECONÔMICO 1.2 questão normativa questão sobre quais políticas ou arranjos institucionais levam aos melhores resultados. Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 19 5/28/13 4:47 PM PARTE I INTRODUÇÃO20 econômicas relevantes. A análise econômica está em terreno mais firme quando se trata de responder às questões positivas – questões sobre quais serão as consequências de políticas ou arranjos institucionais específicos. Se banirmos a derrubada de sequoias em áreas virgens, o que acontecerá com o preço da madeira? Que materiais de cons- trução substitutos podem ser desenvolvidos e a que custos? Como os empregos nas indústrias de madeira e habitação serão afetados? Todas essas são questões positivas, e as respostas para elas são claramente relevantes para nosso raciocínio sobre a ques- tão normativa por trás delas. MICROECONOMIA E MACROECONOMIA Neste capítulo, focamos as questões enfrentadas pelo tomador de decisões individual. À medida que progredirmos, também consideraremos modelos econômicos de grupos de indivíduos – por exemplo, o grupo de todos os compradores ou todos os vendedo- res em um mercado. O estudo de escolhas individuais e do comportamento grupal em mercados individuais entram, ambos, sob a rubrica da microeconomia. A macroecono- mia, ao contrário, é o estudo de agregações de mercados mais amplas. Por exemplo, ela tenta explicar a taxa de desemprego nacional, o nível geral de preços e o valor total da produção nacional. Os economistas conseguem prever e explicar muito melhor o que acontece em mercados individuais do que na economia como um todo, e quando economistas proe- minentes discordam na imprensa ou na televisão, a questão está mais provavelmente relacionada à macroeconomia do que à microeconomia, mas, embora os economistas tenham problemas com questões macroeconômicas, a análise macroeconômica é ine- gavelmente importante, afinal, recessões e inflação perturbam milhões de vidas. Os economistas acreditam cada vez mais que a chave do progresso em macroe- conomia esteja em uma análise mais cuidadosa dos mercados individuais que for- mam os agregados mais amplos. Consequentemente, a distinção entre micro e macro tornou-se menos clara nos últimos anos, uma vez que a formação universitária de todos os economistas, tanto micro quanto macro, tem se focalizado cada vez mais na análise microeconômica. R E S U M O • A microeconomia envolve o estudo da escolha sob con- dições de escassez, e esta está sempre presente, mesmo quando os recursos materiais são abundantes. Há sempre importantes limitações de tempo, energia e outras coisas de que precisamos para perseguir nossos objetivos. • Grande parte da tarefa do economista é tentar respon- der às perguntas na forma “Devo fazer a atividade x?” A abordagem adotada para respondê-las é extremamente simples: fazer x se, e somente se, seus custos forem meno- res do que seus benefícios, lembrando que não incorrer em um custo é o mesmo que obter um benefício. • O modelo de custo-benefício às vezes não consegue pre- ver como as pessoas se comportam ao fazer escolhas do dia a dia. A arte da análise de custo-benefício está em ser capaz de especificar e medir os custos e benefícios relevantes, uma habilidade que muitos tomadores de decisão não possuem. Alguns custos, como os irrecupe- ráveis, muitas vezes parecem relevantes, mas, por fim, não o são; e outros, como os custos implícitos, às vezes são ignorados, embora sejam importantes. Os benefícios muitas vezes também são difíceis de medir, e a experiên- cia nos ensina que estar ciente das falácias mais comuns ajuda a maioria das pessoas a se tornar um melhor to- mador de decisões. • Quando a questão não envolve realizar ou não uma ati- vidade, mas, em vez disso, em que nível ela deve ser reali- zada, a análise marginal chama nossa atenção para a im- portância dos benefícios marginais e dos custos marginais. Devemos aumentar o nível de uma atividade sempre que seu benefício marginal exceder seu custo marginal. • Os princípios da escolha racional não se limitam, de ma- neira nenhuma, aos mercados formais de bens e serviços. De fato, existe um tipo de cálculo implícito ou explícito de custo-benefício por trás de quase toda ação humana,ob- jeto e comportamento, portanto, conhecer esses princípios subjacentes nos faz ver o mundo sob um ângulo totalmen- te novo, nem sempre lisonjeiro, mas sempre uma fonte de percepções estimulantes. questão positiva questão sobre as consequências de políticas ou arranjos institucionais específicos. Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 20 5/28/13 4:47 PM 21CAPÍTULO I PENSANDO COMO UM ECONOMISTA Q U E S T Õ E S D E R E V I S Ã O 1. Qual é seu custo de oportunidade de ler um romance esta noite? 2. Seu colega de quarto está pensando em largar a facul- dade esse semestre. Se as mensalidades pagas adian- tadas por todo o semestre não são reembolsáveis, ele deve considerá-las ao tomar sua decisão? 3. Dê três exemplos de atividades acompanhadas por custos ou benefícios externos. 4. Por que o custo de oportunidade de frequentar a fa- culdade é mais alto para uma pessoa de 50 anos do que para alguém de 20 anos? 5. Por que os custos irrecuperáveis devem ser irrelevan- tes para decisões atuais? 6. Como o modelo do custo-benefício pode ser útil para estudar o comportamento de pessoas que não pensam explicitamente em termos de custos e benefícios? P R O B L E M A S 1. Jamal tem um emprego de verão flexível. Ele pode trabalhar todos os dias, mas tem per- missão para tirar um dia de folga sempre que quiser. Seu amigo Don sugere que eles visi- tem um parque de diversões na terça-feira. O ingresso do parque custa $15/pessoa, e a gasolina e o estacionamento custarão $5 para cada um. No entanto, Jamal ama parques de diversão e um dia no parque vale $45 para ele, no entanto, Jamal também gosta tanto de seu emprego que, na verdade, estaria disposto a pagar $10 por dia para realizá-lo. a. Se Jamal ganha $10 quando trabalha, ele deve ir ao parque de diversões? b. E se Jamal ganha $15...? c. E se Jamal ganha $20...? 2. Tom é fazendeiro e planta cogumelos. Ele investe todo o seu dinheiro extra em novos co- gumelos, que, caso contrário, cresceriam em um terreno inutilizável atrás de seu celeiro. Os cogumelos dobram de tamanho durante seu primeiro ano; depois disso, eles são colhidos e vendidos a um preço constante por libra. O amigo de Tom, Dick, pede a ele um empréstimo de $200, que ele promete pagar depois de 1 ano. Quanto em juros Dick tem que pagar a Tom para que este não fique em uma situação pior do que se ele não tivesse feito o empréstimo? 3. O plano de refeições na Universidade A permite que os alunos comam o quanto quiserem por um valor fixo de $500/semestre. Um aluno típico de lá come 250 quilogramas de comida/semestre. A Universidade B cobra de seus alunos $500 por um bloquinho de tíque- tes-refeição que dá ao aluno o direito de comer 250 quilogramas de comida por semestre. Se o aluno come mais de de 250 quilogramas, ele paga extra; se o aluno come menos, re- cebe um reembolso. Se os alunos forem racionais, em que universidade o consumo médio de comida será maior? 4. Você está planejando uma viagem de 1 mil metros para a Flórida. Exceto pelo custo, você é indiferente quanto a dirigir ou pegar um ônibus. A passagem de ônibus custa $260 e os custos de operar seu carro durante um típico ano com 10 mil quilômetros dirigidas são os seguintes: Seguro $1.000 Juros 2.000 Combustível e óleo 1.200 Pneus 200 Licença e registro 50 Manutenção 1.100 Total $5.550 Você deve ir de carro ou de ônibus? 5. Al e Jane alugaram um salão de festas para celebrar seu aniversário de casamento. Cin- quenta pessoas já aceitaram seu convite. A empresa de serviço de bufê cobrará $5/pessoa pela comida e $2/pessoa pelas bebidas. A banda custará $300 pela noite toda, e o salão de festas custa $200. Agora, Al e Jane estão considerando convidar mais 10 pessoas. Em quanto esses convidados extras aumentarão o custo de sua festa? Microeconomia_FRANK_Parte 1 e 2.indd 21 5/28/13 4:47 PM
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