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Teresa Haguette - Metodologias qualitativas na sociologia

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www.vozes.com.br 
12a Edição 
.Cham. 30 I H 167m 12. ed. 
Autor: Haguette, Teresa Maria Frota, I 
Título: Metodologias qualitativas na so 
11111111111111111111111111111111111111111111111111 
140189 12 Ac. 115508 
BCH 
!;y.s~~: lSi~llmr!'lli~l~r ~RESA MAKIA FROTA HAGUETTE 
vendos@vozes.com .br 9 788532 6 O 8 5 43 
o livro trata de algumas 
metodolpgias de pesquisa 
de cunho qualitativo, 
confonne se tem 
observado na sociologia 
nos últimos anos. 
Entende a autora que as 
fonnas de abordagem do 
real não estão 
desvinculadas das 
concepções abstratas que 
tentam explicá-lo, razão 
por que parte do trabalho 
discute os fundamentos 
teóricos do 
interacionismo simbólico, 
da etnometodologia e da 
dramaturgia social. 
Apresenta os 
fundamentos teóricos de 
algumas metodologias 
qualitativas na sociologia, 
a crítica e a alternativa 
aos métodos tradicionais. 
As técnicas de coleta de 
dados mais usuais nas 
ciências sociais são 
apresentadas 
didaticamente: A 
Metodologias qualitativas na sociologia 
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) 
Câmara Brasileira do Livro, Sp, Brasil) 
Haguette, Teresa Maria Frota 
Metodologias qualitativas na sociologia / 
Teresa Maria Frota Haguette. - 12. ed. - Petrópolis, RJ : 
Vozes, 2010. 
ISBN 978-85-326-0854-3 
Bibliografia. 
1. Interacionismo simbólico 2. Observação 
participante 3. Pesquisa-ação 4. Pesquisa qualitativa 5. 
Sociologia - Metodologia I. Título. 
07-0643 CDD-301.01 
Índices para catálogo sistemático: 
1. Sociologia: Metodologias qualitativas 301.01 
Teresa Maria Frota Haguette 
METODOLOG1AS 
QUAL1TAT1VAS 
NA SOC10LOG1A 
• EDITORA 
Y VOZES 
Petrópolis 
-
Sumário 
Prefácio à terceira edição, 11 
Introdução, 13 
PRIMEIRA PARTE: Fundamentos teóricos de algumas metodologias 
qualitativas na sociologia, 23 
1. A interação simbólica, 25 
1. Introdução, 25 
2. George Herbert Mead, 25 
2.1. A sociedade, 27 
2.2. O self, 29 
2.3. A mente, 31 
2.4. Considerações críticas, 32 
2.5. A natureza da interação simbólica, 34 
2.6. Princípios metodológicos do interacionismo simbólico, 39 
2.7. Variações na orientação interacionista, 43 
2. A etnometodologia, 47 
1. Origem e objeto, 47 
3. A dramaturgia social de Goffman, 51 
4. Conclusões teóricas, 54 
SEGUNDA PARTE: Metodologias qualitativas, 57 
5. O objeto das metodologias qualitativas, 59 
6. A observação participante, 62 
1. Origens, 62 
2. Definição e objeto, 64 
7. A história de vida, 74 
1. Origem e desenvolvimento da história de vida e suas funções, 74 
2. A utilização da história de vida no Brasil, 78 
8. A entrevista, 81 
9. A história oral, 87 
1. Características e limitações, 87 
--
2. A técnica, 90 
10. Conclusões, 95 
TERCEIRA PARTE: A crítica e a alternativa aos métodos de pesquisas 
tradicionais, 101 
11. Pesquisa-ação e pesquisa participante, 103 
1. A pesquisa-ação, 105 
1.1. A enquete operária, 112 
1.2. A intervenção sociológica, 123 
1.3. A pesquisa-ação institucional, 134 
2. A pesquisa participante, 141 
2.1. Definição e características, 141 
2.2. Fundamentos teóricos, epistemológicos e metodológicos da 
pesquisa participante, 149 
QUARTA PARTE: Holismo e individualismo metodológico no marxismo 
recente, 169 
12. O individualismo metodológico na confluência da estrutura e da 
ação individual, 171 
1. Introdução, 171 
2. O pós-marxismo, 174 
3. O novo marxismo estrutural, 175 
4. O marxismo analítico, 177 
5. Algumas origens, 182 
6. O individualismo metodológico, 186 
7. O problema do reducionismo na sociologia, 192 
8. A teoria da escolha racional, 198 
9. Últimas questões, 204 
13. Conclusões, 207 
14. Considerações finais, 209 
Bibliografia, 216 
Prefácio à terceira edição 
Metodologias qualitativas na sociologia, publicado ao final de 1987, 
representou a minha tese para professor titular em Sociologia, na UFC. 
Foi escrito em poucos meses, dada a premência exigida pelo Edital do 
concurso, realizado em 1986. Muitas de minhas preocupações ficaram 
ausentes da discussão por absoluta falta de tempo. Uma delas, referida 
nas considerações finais do livro, destaca a importância de uma análi-
se das teorias marxistas vis-à-vis a uma questão crucial que, há décadas, 
perpassa muitas das polêmicas teóricas na sociologia, ou seja, as relações 
entre estrutura e ação individual. 
Na oportunidade da publicação desta terceira edição, pareceu-
me conveniente a inserção de um capítulo que trouxesse esclarecimentos 
sobre o estágio atual dos debates em torno desse tema. 
Incluo, pois, um texto inédito que se intitula O individualismo me-
todológico na confluência da estrutura e da ação individual, que representa uma 
prestação de contas comigo mesma, cujo compromisso eu, silenciosa, 
mas pertinazmente, contraíra em 1986. 
O pressuposto neoclássico de que os indivíduos agem em função 
de escolhas racionais decididas em situações diferenciadas, assumido pelo 
marxismo analítico, restabelece o trânsito entre o individual, o coletivo 
e o estrutural, abrindo amplas possibilidades para a explicação de fenô-
menos sociais antes obnubilados pelas várias ortodoxias que cerceavam a 
imaginação sociológica, tão cara a Marx quanto a Wright Mills. 
Não obstante, o esforço delineado até aqui não deve ser entendi-
do como indicativo de satisfação arrematada de minhas dúvidas e preocu-
pações sobre o conhecimento das formas e dos mecanismos de manuten-
ção da sociedade e da ligação entre as micro e as macroestruturas. 
Se, por um lado, as teorias são construídas a partir da observação 
do real, por outro, o real só é conhecido através do emprego de métodos 
científicos rigorosos. O individualismo metodológico, expresso na proposta 
11 
do marxismo analítico - que reconhece no método da escolha racional 
capacidades para desvendar os meandros que configuram muitas de suas 
preocupações políticas -, merece um crédito de confiança da comunidade 
científica, ou seja, deve ser conhecido e utilizado para verificação de sua 
eficácia. Deve ser submetido a um teste de validade, conforme preten-
dem fazer os próprios adeptos do Marxismo Analítico com algumas das 
proposições marxianas. Só que, neste caso, testa-se o método. 
1ntrodução 
A ciência moderna com seus quatro séculos de desenvolvimento, 
responsável pelo progresso material atingido pelas sociedades avançadas 
de hoje, não se mostrou capaz de exterminar as desigualdades sociais e os 
sofrimentos humanos delas decorrentes. Na maioria das vezes tem ela 
Fortaleza, 26 de junho de 1992 funcionado como instrumento do poder, como aliada da opressão e coa-
12 
Teresa Maria Frota Haguette tora das liberdades humanas. Isto porque, sendo social, ela representa um 
processo social como tantos outros, sujeito às vicissitudes das formas de 
organização societária e aos percalços da influência dos produtores sobre 
o uso de seus produtos; apesar de seus ideais de neutralidade e objetivi-
dade, ideais que refletem a racionalidade do ser humano, a ciência está 
presa à contradição de ser uma produção do homem, de sua grandeza e 
de suas misérias. 
Mas também é certo que a boa-fé e a boa vontade habitaram em 
muitos daqueles que lutaram pela geração de um conhecimento mais exa-
to, mais fidedigno, mais livre de erros. Bacon representa um marco his-
tórico na fundamentação e instrumentalização da forma de fazer ciência. 
Dele é a convicção de que o conhecimento humano só é possível através 
da mediação dos sentidos, sendo a consciência, ou a mente, uma tabula 
rasa na qual são impressos os dados do real. A esta visão convencionou-
se chamar empirismo porquanto pretende condicionar o conhecimento à 
aproximação direta com o real mediante regras rígidas que limitariam as 
tentativas metafísicas de explicação da realidade. Por isto, o método in-
dutivo que levaria o pesquisador à montagem gradual da coleção de casos 
passados pelo efeito da triagem que os identificaria como semelhantes 
e dessemelhantes permitir-lhe-ia generalizarsobre o real ao perceber a 
ocorrência constante dos fenômenos. Adepto desta corrente (ou convic-
ção), foi também Locke que introduziu novas argumentações ao método 
empirista, enriquecendo-o. 
Entretanto, com Descartes, o método empirista foi contestado na 
tentativa de restaurar o papel da razão e da reflexão de certa forma relegadas 
13 
a segundo plano na visão baconiana: a razão precede a convivência dos 
sentidos com o dado empírico uma vez que o homem foi agraciado por 
Deus com um aparato que lh.e confere o poder de ter ideias a priori, ou 
seja, prescindindo de contatos diretos com o real através dos sentidos. 
Isto significa que certas ideias são inatas. A crença neste pressuposto 
levou Descartes a desenvolver com maestria as técnicas da reflexão e em , 
consequência, a descuidar daquela aproximação do pesquisador com o 
real, pré-requisito do conhecimento defendido por Bacon e Locke. Assim 
sendo, a maneira apropriada de fazer generalizações sobre a realidade seria 
pelo método dedutivo: através da razão descobre-se princípios gerais sobre 
a realidade que serão confirmados mediante, também, o conhecimento de 
fatos particulares. A crença na razão e no poder de conhecer propiciou, na 
história das ideias, a rubricação da visão cartesiana de racionalismo. 
Percebe-se, pois, que a questão principal do confronto entre em-
pirismo e racionalismo residia na disputa sobre quem melhor garante o 
domínio do real: a razão ou os sentidos, o que, consequentemente, con-
duz a uma ponderação maior ou menor alocada pelos pensadores à neces-
sidade de uma aproximação maior ou menor com o real em consequência. 
também, de crenças divergentes sobre a própria constituição do homem 
enquanto ser pensante. O problema era, pois, de ordem ontológica. 
Como sempre acontece, as ideias ou convicções polares são sem-
pre contestadas, dando surgimento a propostas ecléticas que sabiamente 
retiram daquelas o que têm de melhor, ou de convincente. Foi o que fez 
Kant que, cético sobre a possibilidade de conhecimento do real, limita-se 
~ observação de seu comportamento e de suas relações, ou seja, do ob-
Jeto fenomenal. Concebendo o homem como um ser que dispõe de um 
~para.to mental sui generís que o qualifica como ser consciente, mostra que 
I~pnme as leis ao real. Estava bnçada a grande controvérsia epistemoló-
gIca moderna. 
Até o século XVIII as discussões epistemológicas parecem se si-
tuar em campo neutro, onde as preocupações com a objetividade do co-
nhecimento ocupam o maior espaço. 
É contudo no século XIX que, ao se inaugurar a individualização 
d 'A • 
as ClenCIas sociais, se instaura o "problema político" dentro das meto-
dologias em v' . .. d . oga. o pOSItIVIsmo e Comte, caudatáno do empirismo. 
14 
-
e a dialética marxista, desdobramento da dialética hegeliana; esta, bem 
próxima do racionalismo cartesiano enquanto defensora da primazia da 
razão sobre os sentidos, embora introduzindo relevantes modificações 
nas concepções sobre o processo do pensamento: a ideia de totalidade, de 
movimento (história) e da contradição. Entretanto, a diferença marcante 
entre os dois residia no fato de que Hegel enfatizava a teoria - ou contem-
plação do mundo - enquanto que Marx estava preocupado com a práxis. 
Nesse momento, a dialética não estava "politizada"; ela se politiza com 
Marx que, insatisfeito com as aplicações etéreas da dialética hegeliana, 
dá-lhe uma inflexão brutal, colocando-a de cabeça para baixo, ou seja, 
retira-a do mundo das ideias e aplica-a ao processo de desenvolvimento 
social: o materialismo histórico e o materialismo dialético. 
Esta violenta inflexão empreendida por Marx propiciou um en-
contro da dialética hegeliana com o real e, consequentemente, com o pos-
tulado empirista de que o conhecimento não pode prescindir dos sentidos, 
distanciando-a do princípio cartesiano das ideias inatas. O materialismo 
histórico, pedra angular do marxismo, propugna que não é a consciência 
do homem que determina sua existência, mas, ao contrário, é sua exis-
tência social que determina sua consciência. Desta forma o materialismo 
histórico, ao enfatizar a determinação das condições materiais de existên-
cia sobre a consciência do homem, traz implícita a ideia de que o contato 
com o real - trabalho produtivo ou intelectual - é fator sine qua non do 
conhecimento, seja este conhecimento consubstanciado sob a forma de 
uma "falsa consciência" ou de uma produção científica que pretende re-
constituir e explicar este real. Para a dialética marxista e para o materialis-
mo histórico, pois, o concreto real é a base do conhecimento!. 
Enquanto o materialismo histórico representa o veio teórico que 
explica o andamento do real, ou da sociedade, a dialética representa o 
método de abordagem deste real esforçando-se por compreender o fato 
da historicidade humana, por analisar a prática efetiva do homem empíri-
co e por fazer a crítica das ideologias. Em suma, a dialética diz respeito à 
1: Foge aos nossos propósitos discutir outros aspectos da oposição entre a dialética mar-
XIsta e o empirismo e, posteriormente, o positivismo, vez que nosso interesse se prende 
ao aspecto específico da afinidade entre os dois em termos da imprescindibilidade de 
convivência com o real para fins da produção de conhecimento. 
15 
compreensão dos processos que comandam a análise científica2 da socie- as determinações inevitáveis da pobreza e da dominação. Ao positivismo 
dade a partir da luta de classes e d~ prática coletiva pela emancipação do restoU o apego à quantidade, sempre mais facilmente obtida, e à vigi-
homem, contra a exploração, em prol da igualdade social. O positivismo, lância epistemológica que, apesar de tudo, tem prestado inquestionáveis 
ao se distanciar das questões metafísicas, debruçou-se sobre o método de beneficios às ciências humanas. O apelo marxista tem levado quase sem-
conhecer, concebendo o fato como autônomo e verdadeiro levando a um pre ao compromisso político (ou é o compromisso político que leva ao 
parcelamento do real nas investigações de problemas passíveis de serem marxismo?) enquanto o apelo positivista se restringe aos aspectos aparen-
percebidos e constatados. Ao fazê-lo, descurou do sujeito cognoscente, temente neutros da objetividade no ato de conhecer. É esta omissão de 
privilegiando o fato que se tornou soberano; descurou também da teoria compromisso com ajustiça e a equidade que faz do positivismo um servo 
prévia que sempre informa o objeto do conhecimento. Coube ao grupo da injustiça e da opressão. Se não há, pelo menos assim acreditamos, uma 
de Viena, aos neopositivistas, a recuperação lógica do sujeito, problema- ciência social descompromissada, não pode haver teoria omissa que não 
tizando seu papel e as consequências deste no ato de conhecer. Ambos, implique em aceitação de um status quo. 
marxismo e positivismo, guardam em comum, entretanto, a herança do Ao situar a causa das desigualdades sociais no movimento expan-
iluminismo que exige o uso da ciência, ou seja, que a ciência tenha apli- sionista do sistema capitalista mundial, Marx abdica do indivíduo e dos 
cações práticas e que se coloque em benefício do homem. O século XXpequenos grupos como objeto de análise3, embora acredite na sua força 
presenciou um brutal desenvolvimento das chamadas metodologias de como membros de uma classe social. Se o sistema capitalista já traz em si 
pesquisa, envolvendo discussões relevantes sobre formas de controle do a semente de sua destruição, resta ao homem, ou à consciência, esperar 
erro na captação da realidade, partindo quase sempre do pressuposto de que isto aconteça, dizem alguns, pois ao indivíduo não cabe um papel 
que ela é cognoscível. Aqui também, marxismo e positivismo estão acor- na história. Se, por outro lado, aceitarmos que as macroestruturas sejam 
des: o real é objetivo. Objetivo e contraditório, diz o primeiro; objetivo formadas pelas microestruturas, evitando o determinismoparalisante da-
e não problemático, afirma o segundo. O forte componente humanista quelas em relação a estas e dando margem ao indivíduo para agir como 
da teoria marxista - além, obviamente, de seu poder explicativo - atraiu protagonista da história, não há dúvida que, como cientistas sociais, valo-
os cientistas sociais comprometidos com a justiça e a equidade, quando rizaremos a dinâmica da sociedade consubstanciada nos grupos de bair-
o método positivista se adaptava como uma luva à análise das sociedades ros, nas comunidades, nos sindicatos, nas instituições, enfim, nos loei de 
opulentas mascarando conflitos e enfatizando o consenso como cimento convivência e interação social, onde as "definições de situação" estão em 
entre as micro e as macroestruturas sociais. Tal não era possível crer em constante mutação obedecendo ao próprio ritmo da dinâmica societal, 
outras realidades. Urgia a busca das causas da desigualdade e da opressão levando seja à acomodação, seja ao protesto, face as experiências iníquas 
na maior parte dos países do globo. Eram causas estruturais, permanentes a que estes grupos estão sujeitos. É preciso destacar que as "margens de 
no movimento periférico, que iludem, mantendo as bases e agitando gen- manobra", ou o poder de decisão da maioria, se chocam com o poder 
tilmente a superfície. Ao expor em toda a sua crueza os mecanismos de constituído _ poder econômico, poder do saber, e outros poderes - que 
funcionamento do sistema capitalista, Marx desnudou as imagens "mo- molda as consciências e os imaginários, anulando a ação contestadora em 
dernizantes" de seu percurso de exploração e miséria, apontando para busca de l'd d d 'd ll'b rtá' . uma rea 1 a e e 1 ea 1 e no. 
2. Cf. François Chatelêt (Questions Objections, à la recherche des Vraies Semblances. Paris, Édi----__ _ 
tions Denoel, 1979, cap. II, Le Plaisir de la Definition, p. 67-144) para uma discussão dos 3. Vale salientar que desdobramentos posteriores, e mais recentes, da visão marxiana per-
conceitos de alienação, comunismo/socialismo, dialética, ideologia, marxismo, materialis- mitem uma abordagem de microprocessos societais, conforme atestam os trabalhos de 
mo, ocidente, progressismo, reformismo, república, revolução, soberania e tecnocracia. Castoriadis, L. Goldmann e H. Lefebvre. 
16 17 
Entendemos que as questões epistemológicas e me~odoló~cas consequências do exacerbado poder de poucos sobre muitos, não é, a 
nas ciências sociais estão, por definição, subordinadas às teonas exphca, nosso ver, o domínio dos métodos e técnicas de pesquisa social, mas o 
tivas que o pesquisador elege como responsáveis pelo funcionamento d, escrutínio de sua própria visão de mundo, pré-requisito fundamental 
sociedade. Por trás delas situa-se, e,m última instância, sua visão de mun, daquilo que dela decorre, a atividade de analista do real, de intérprete das 
do (T#ltanschauung)4, ou sua ideologia, que fornece~á o ~ub~t~ato da sU'experiências alheias e de protagonista ativo das transformações que lhe 
crença na forma como a sociedade se mantém, na mevItablhdade dest, parecerão necessárias, mas que nem sempre serão as melhores. O "arbítrio" 
manutenção ou na possibilidade e necessidade de uma transformaçã0
5
. do pesquisador representa sua mais pesada carga de responsabilidade se 
Neste sentido, pois, entendemos que as teorias devem ser ava'admitirmos a complexidade e incomensurabilidade do real e o fato de 
liadas em termos de seu poder explicativo sobre alguns aspec~o~ da rea'que ele apenas faz uma "leitura" deste real; se admitirmos que a captação 
lidade. Dizemos "alguns aspectos" porque não nos parece eX1stIr na sO'do real como um "retlexo" é uma utopia; se aceitarmos que a reprodução 
ciologia uma teoria suficientemente abrangente para comportar todos o~e a interpretação da realidade são problemáticas e que a multiplicidade de 
fenômenos sociais e muito menos fornecer todas as respostas passíveis d(formas de convivência social juntamente com o intenso movimento das 
serem levantadas; mesmo que esta teoria existisse, nada asseguraria qU(sociedades dificulta e, talvez, impossibilita a generalização dos achados de 
suas explicações fossem as "verdadeiras", isto porque não há forma d(uma investigação e, consequentemente, a descoberta de regularidades. 
comprovar a veracidade absoluta de um enunciado. O que, com efeito As chamadas metodologias qualitativas na sociologia são exem-
acontece, é que aderimos a certas explicações em termos de sua plausi'plos de reação contra o paradigma estrutural, quase sempre associado a 
bilidade. Aqui também, o tipo de questão que vai interessar ao soci6modelos quantitativos de análise, com algumas exceções, tais como o mo-
logo depende de tudo aquilo de que já falamos acima. No nosso casodelo marxista que, embora estrutural, se apoia com veemência nos dados 
explicitamos o que mais nos interessa e atrai a fim de fornecer com clahistóricos, específicos e únicos em sua qualidade reconstitutiva do passa-
reza ao leitor uma ideia dos parâmetros que regem nossa preocupaçã(do. Há que considerar que esta reação não representa um repúdio cabal às 
no presente trabalho. Interessa-nos descobrir: a) como uma sociedade slmacroanálises e, sim, o reconhecimento de que a sociedade é constituída 
mantém e se transforma, quais os mecanismos que ligam as micro e ade microprocessos que, em seu conjunto, configuram as estruturas maci-
macroestruturas; b) qual o papel da ação humana na história; c) quais °ças, aparentemente invariantes, atuando e conformando inexoravelmente 
fatores principais que dinamizam a história; d) como fazer para conhecea ação social individual. É esta a crença que acalentamos, responsável pela 
a sociedade e obter indícios de respostas para (a), (b) e (c). opção que agora nos apresenta as metodologias qualitativas, não como 
As técnicas, na verdade, são secundárias no sentido de qUalternativas aos modelos quantitativos, oposição frequente na literatura 
poderão ser sempre justificadas dentro do método científico. A grandespecializada que reflete uma visão maniqueísta que é de certa forma nor-
questão que se coloca hoje para o cientista social, especialmente nCmativa, ao asseverar as vantagens sumárias de um modelo e os defeitos 
países periféricos onde sua atuação o aproxima com mais violência dÓcongênitos do outro, mas como uma necessidade e uma urgência dentro 
da sociologia para aqueles que estão convencidos de que a sociedade é 
4. Empregado aqui no sentido que lhe aloca Sombart (1964: 18) "[ ... ] o significado dupluma estrutura que se movimenta mediante a força da ação social indivi-
do conceito de Weltanschauung, isto é, que por um lado implica nossas ideias fundJjual e grupal. O desprezo por este aspecto do social implica, a nosso ver, 
. b 'd outro nossos valores fundamentais na vida" [traduzido ( _. . fi I .. d mentais so re a VI a e, por , .m uma concepçao determmlsta que u mma, na ongem, a esperança e 
espanhol pelo A.]. 'lu d' ld d - d' b . 'd 
. - -, , e a eSlgua a e e a opressao possam um la ser su stltm as por es-5. Embora esta visão de mundo contenha elementos de determmaçao, ela nao e absolut. . . . 
truturas dignas e Justas. Não há dúvida que as estruturas eX1stem e devem podendo ser reformulada ou modificada através da autocrítica. 
18 
19 
Entendemos que as questões epistemológicas e metodológiaS 
nas ciências sociais estão, por definição, subordinadas às teorias explica-
tivas que o pesquisador elege como responsáveis pelo funcionamento da 
sociedade. Por trás delas situa-se, em últi;'a instância, sua visão de mun-
do (l#ltanschauung)4, ou sua ideologia, que fornecerá o substrato da sua 
crença na forma como a sociedade se mantém, na inevitabilidade desta 
manutenção ou na possibilidade e necessidade de urna transfonnaçã05. 
Neste sentido, pois, entendemos que as teorias devem ser ava-
liadas em termos de seu poder explicativo sobre alguns aspectos da rea-
lidade. Dizemos "alguns aspectos" porque não nos parece existirna so-
ciologia uma teoria suficientemente abrangente para comportar todos os 
fenômenos sociais e muito menos fornecer todas as respostas passíveis de 
serem levantadas; mesmo que esta teoria existisse, nada asseguraria que 
suas explicações fossem as "verdadeiras", isto porque não há forma de 
comprovar a veracidade absoluta de um enunciado. O que, com efeito, 
acontece, é que aderimos a certas explicações em termos de sua plausi-
bilidade. Aqui também, o tipo de questão que vai interessar ao soció-
logo depende de tudo aquilo de que já falamos acima. No nosso caso, 
explicitamos o que mais nos interessa e atrai a fim de fornecer com cla-
reza ao leitor uma ideia dos parâmetros que regem nossa preocupação 
no presente trabalho. Interessa-nos descobrir: a) como uma sociedade se 
mantém e se transforma, quais os mecanismos que ligam as micro e as 
macroestruturas; b) qual o papel da ação humana na história; c) quais os 
fatores principais que dinamizam a história; d) como fazer para conhecer 
a sociedade e obter indícios de respostas para (a), (b) e (c). 
As técnicas, na verdade, são secundárias no sentido de que 
poderão ser sempre justificadas dentro do méto~o científi.co. A grande 
questão que se coloca hoje para o cientista socIal, especIalmente nos 
países periféricos onde sua atuação o aproxima com mais violência das 
4. Empregado aqui no sentido que lhe aloca Sombart (1964: ?8) ~[ ... ] o sign~fic:mo duplo 
d . d"IT' I h uung I'Sto é que por um lado Implica nossas Ideias funda-o conceito e we tansc a , , 
. b 'd r outro nossos valores fundamentais na vida" [traduzido do mentais so re a VI a e, po , 
espanhol pelo A.]. 
5 E b . - d undo contenha elementos de determinação, ela não é absoluta . m ora esta vlsao em, 
podendo ser reformulada ou modificada através da autocrítica. 
18 
. consequências do exacerbado poder de poucos sobre muitos, não é, a 
nosso ver, o domínio dos métodos e técnicas de pesquisa social, mas o 
escrutínio de sua própria visão de mundo, pré-requisito fundamental 
daquilo que dela decorre, a atividade de analista do real, de intérprete das 
experiências alheias e de protagonista ativo das transformações que lhe 
parecerão necessárias, mas que nem sempre serão as melhores. O "arbítrio" 
do pesquisador representa sua mais pesada carga de responsabilidade se 
admitirmos a complexidade e incomensurabilidade do real e o fato de 
que ele apenas faz uma "leitura" deste real; se admitirmos que a captação 
do real como um "reflexo" é uma utopia; se aceitarmos que a reprodução 
e a interpretação da realidade são problemáticas e que a multiplicidade de 
formas de convivência social juntamente com o intenso movimento das 
sociedades dificulta e, talvez, impossibilita a generalização dos achados de 
uma investigação e, consequentemente, a descoberta de regularidades. 
As chamadas metodologias qualitativas na sociologia são exem-
plos de reação contra o paradigma estrutural, quase sempre associado a 
modelos quantitativos de análise, com algumas exceções, tais como o mo-
delo marxista que, embora estrutural, se apoia com veemência nos dados 
históricos, específicos e únicos em sua qualidade reconstitutiva do passa-
do. Há que considerar que esta reação não representa um repúdio cabal às 
macroanálises e, sim, o reconhecimento de que a sociedade é constituída 
de microprocessos que, em seu conjunto, configuram as estruturas maci-
ças, aparentemente invariantes, atuando e conformando inexoravelmente 
a ação social individual. É esta a crença que acalentamos, responsável pela 
opção que agora nos apresenta as metodologias qualitativas, não como 
alternativas aos modelos quantitativos, oposição frequente na literatura 
especializada que reflete uma visão maniqueísta que é de certa forma nor-
mativa, ao asseverar as vantagens sumárias de um modelo e os defeitos 
congênitos do outro, mas como uma necessidade e uma urgência dentro 
da sociologia para aqueles que estão convencidos de que a sociedade é 
uma estrutura que se movimenta mediante a força da ação social indivi-
dual e grupal. O desprezo por este aspecto do social implica, a nosso ver, 
em uma concepção determinista que fulmina, na origem, a esperança de 
que a desigualdade e a opressão possam um dia ser substituídas por es-
truturas dignas e justas. Não há dúvida que as estruturas existem e devem 
19 
ser conhecidas, mas é a ação humana, a interação social, que constitui 
o motor da história. Àqueles que poderão argumentar que a única ação 
efetiva é a ação de classe, respondemos que a classe social é, com efeito, 
uma entidade fundamental na análise da sociedade capitalista, mas que 
sua ação se inicia nos pequenos grupos, nos sindicatos, nos bairros, nos 
partidos; ou seja, as decisões são tomadas por indivíduos e grupos que 
interagem e decidem sobre uma ação comum. Não vemos incompatibi-
lidade entre as duas coisas. 
Acreditamos, pois, que tanto as estruturas quanto os micropro-
ces sos de ação social devem ser conhecidos, analisados e interpretados, 
cabendo a cada um a metodologia apropriada, a metodologia que melhor 
se adequa ao problema que se deseja investigar. Por outro lado, conforme 
já referimos, existe um substrato teórico, uma visão de como a sociedade 
funciona, por trás das metodologias, aparentemente "neutras". As meto-
dologias qualitativas derivam da convicção de que a ação social é funda-
mental na configuração da sociedade. É nosso propósito neste trabalho 
apresentar o embasamento teórico dos dois tipos de metodologias quali-
tativas que reputamos mais relevantes para a sociologia, ambos apoiados 
na crença da importância dos aspectos subjetivos da ação social: o intera-
cionismo simbólico e a pesquisa - ação-pesquisa-participante. Enquanto 
a primeira vertente exibe contornos teóricos sólidos e uma metodologia 
já curtida pela experiência científica de mais de meio século, a segunda 
é jovem e ainda imatura em seus princípios teóricos e metodológicos, 
pretendendo-se uma alternativa aos métodos da ciência social tradicional, 
incapaz de resolver os problemas e as injustiças sociais dos países perifé-
ricos. Com razão, argumenta sobre a necessidade de uma tomada de po-
sição política da parte do investigador, de sua "intervenção" no ambiente 
de pesquisa, quebrando com os limites artificiais entre sujeito e objeto 
do conhecimento em nome da objetividade e da nt:\.1tralidade científicas. 
Cônscia do poder inexorável de poucos sobre muitos na realidade socie-
tal, a segunda vertente adota a instância moral de opção pelos oprimidos, 
dando um passo além do interacionismo simbólico, ainda "despolitiza-
do", embora, a nosso ver, com todas as possibilidades de se tornar um 
aliado da ciência compromissada. 
20 
o trabalho está dividido em quatro partes; na primeira expomos 
os fundamentos teóricos do interacionismo simbólico, elegendo George 
Herbert Mead como elemento exemplar da concepção interacionista. A 
etnometodologia de Harold Garfinkel e a dramaturgia social de Erving 
Goffman são elaborações particulares da mesma corrente, ilustrando 
aplicações concretas dos princípios interacionistas. A segunda parte trata 
de alguns métodos ou técnicas qualitativas de captação de dados que se 
prestam à análise da ação social, tais como: a observação participante, a 
história da vida, a história oral e a entrevista. A terceira parte apresenta 
a proposta alternativa aos métodos da pesquisa tradicional consubstancia-
da na pesquisa-ação e pesquisa-participante. Como exemplos de pesqui-
sa-ação tomamos a enquete operária, conforme foi exposta por Michel 
Thiollent, a intervenção sociológica de Alain Touraine e a pesquisa-ação 
institucional de René Barbier. O capítulo sobre a pesquisa-participante 
foi composto como uma síntese de vários trabalhos. Dada a falta de uni-
formidade e de homogeneidade entre os diferentes autores, ensaiamos 
uma apresentação ideal típica sem muita segurança de estar atingindo o 
objetivode colocar com clareza seus fundamentos teóricos básicos e suas 
coordenadas metodológicas mais comuns. 
A quarta parte retoma um tema apenas lembrado nas Conclusões 
das edições anteriores. Ao mesmo tempo em que atualiza os debates em 
torno de algumas correntes marxistas contemporâneas, especialmente o 
marxismo analítico, explicita certas desavenças e controvérsias sobre a va-
lidade de utilização do individualismo metodológico face aos postulados 
marxianos. 
Ao final de cada parte introduzimos comentários críticos que re-
fletem as dificuldades de ordem epistemológica e metodológica que nos 
parecem mais evidentes. Este não pretende ser um trabalho exaustivo 
sobre os temas tratados, mas uma contribuição à reflexão sobre a forma 
ou formas possíveis de produção do conhecimento dentro do espírito 
sugerido por Carlos Rodrigues Brandão, de que faz falta na literatura 
especializada uma crítica científica e uma crítica política das diferentes 
propostas de pesquisa participante, ao que acrescentaríamos: uma dis-
cussão que exiba as angústias e impotências de um cientista social que se 
pretende compromissado com a justiça e a equidade, mas que se sente 
21 
preso aos imperativos do rigor científico. Como fazer a união das duas 
preocupações é uma questão sobre a qual apenas tateamos respostas, em-
bora estejamos mais propensos a crer que o problema epistemológico nas 
ciências humanas não tem solução, re·stando a instância moral da opção 
pelos oprimidos. 
Somente os homens que creem 
apaixonadamente nos valores 
e põem em jogo uma vontade 
apaixonada podem chegar a ser 
grandes cientistas (Sombart). 
22 
PRIMEIRA PARTE 
Fundamentos teóricos de algumas 
metodologias qualitativos no sociologia 
L 
A interação simbólica 
1. Introdução 
A escola da interação simbólica se reporta em origem a clássicos 
da sociologia do fim do século XIX tais como Charles Horton Cooley 
(1864-1929), WI. Thomas (1863-1947) e George Herbert Mead (1863-
1931)6, embora o termo interacionismo simbólico tenha sido cunhado 
por Herbert Blumer em 19371. Os pontos comuns aos três envolvem as 
concepções da sociedade como um processo, do indivíduo e da sociedade 
como estreitamente inter-relacionados e do aspecto subjetivo do com-
portamento humano como uma parte necessária no processo de forma-
ção e manutenção dinâmica do self social e do grupo social (PSATHAS, 
1973: 5). Alguns de seus conceitos já se incorporaram à terminologia 
sociológica como a "introspecção simpatética" de Cooley, a "definição 
de situação"g de Thomas ou "o outro generalizado" de Mead. A obra de 
Mead, entretanto, foi aquela que mais contribuiu para a conceptualização 
da perspectiva interacionista. Por esta razão nos deteremos sobre ele para 
um melhor exame dos fundamentos desta escola. 
2. George Herbert Meod 
Mead não publicou uma obra completa e sistemática sobre sua 
teoria. Todos os seus quatro livros são póstumos e organizados por edito-
6. COOLEY, Charles H. Human Nature and the Social Order. Nova York: Schoken, 1964 
[originalmente publicado em 1902]. COOLEY, Charles H. "The Roots of Social Kno-
wledge". ln: The American Journal of Sociology, vol. 32 Oul. 1926), p. 59-79. COOLEY, 
Charles H. ''A Study ofthe Early Use ofSelf-Words by a Child". Psychological Review, vol. 
15 (nov. 1908), p. 339-357. THOMAS, William r. On Social Organization and Social Perso-
nality: Selected Papers. Chicago: University of Chicago Press, 1966 [com uma introdução 
de Morris]anowitz]. MEAD, George Herbert: nota sobre o autor, adiante. 
7. CE BLUMER, H. 1969: 1, nota de rodapé. 
8. Muito utilizada na literatura especializada é a frase de Thomas: "Se os homens definem 
situações como reais, elas são reais nas suas consequências". 
25 
res a partir de palestras, aulas, notas e manuscritos fragmentários. Seu 
sistema de psicologia social, entretanto, é apresentado de forma completa 
em Mind, Self and Society9, um dos mais importantes e influentes livros 
na área da interação simbólica, onde ~ autor explora não somente a 
complexa relação entre a sociedade e o indivíduo, como expõe a gênese 
do self, o desenvolvimento de símbolos significantes e o processo de 
comportamento da mente. Apesar de sua obra como um todo exibir 
uma orientação filosófica, ele preocupou-se em ilustrar suas proposições 
a partir de fatos da vida cotidiana. Mead, o arquiteto por excelência do 
interacionismo simbólico, ensinou na Universidade de Chicago no perío-
do de 1893 a 1931, quando faleceu. Ele próprio se referia à sua teoria 
em termos de "behaviorismo social"lo, entendendo por isto a descrição 
do comportamento do nível humano cujo dado principal é o ato social 
concebido não só como o comportamento "externo" observável, como 
também a atividade "encoberta" do ato. Neste sentido, sua teoria se opõe 
ao behaviorismo radical de John B. Watson, que reduz o comportamento 
humano aos mesmos mecanismos encontrados ao nível infra-humano e 
onde a dimensão social é vista como uma mera influência externa sobre 
o indivíduo. Enquanto Watson insiste no estudo estritamente científico 
do comportamento aparente, Mead permite uma instintiva investigação 
compreensiva de aspectos do comportamento, ausente na perspectiva 
de Watson. A lógica natural do pensamento de Mead parece indicar a 
precedência da sociedade sobre o self e, por último, a mente, invertendo, 
assim, a ordem do título de sua principal obra: Mind, Self and society 
(MELTZER, 1972: 5; TROYER, 1972: 321). 
9. As quatro obras publicadas são: Philosophy qf the Present (1932) que contém as palestras 
de Mead na Paul Carus Foundation, sobre filosofia da história dentro de uma perspectiva 
pragmática; Mind, Seif and Society. Chicago, U niversity of Chicago Press, 1934, que, apesar 
de ser a principal publicação de Mead, representa uma coleção de aulas ministradas no 
curso de psicologia social na Universidade de Chicago; Movements ofThought in the 19 th 
[entury. Chicago: University of Chicago Press, 1936, foram aulas proferidas sobre a his-
tória das ideias e, finalmente, Philosophy of the Act. Chicago: University of Chicago Press, 
1938, que representa afirmações sistemáticas, sobre a filosofia do pragmatismo (MELT-
ZER, 1972: 4). 
10. Behaviorismo social, distinto do behaviorismo radical de John B. Watson, fundador 
do behaviorismo em psicologia. 
26 
2.1. A sociedade 
De acordo com Mead, toda atividade grupal se baseia no compor-
tam~nto cooperativo. Embora algumas sociedades infra-humanas ajam 
conjuntamente, fazem-no levadas pelas características biológicas de seus 
membr~s. O comportamento cooperativo dos insetos, por exemplo, é 
determmado fisiologicamente sem que seus padrões de associação se al-
terem mesmo ao longo de inúmeras gerações, enquanto que a cooperação 
huma_na, com sua diversidade de padrões, atesta que os fatores fisiológi-
cos nao podem explicá-la. A associação humana surge somente quando: 
a) cada, ~tor in~ivi~ual percebe a intenção dos atos dos outros e, então, b) 
constrol sua propna resposta baseado naquela intenção. Isto significa que, 
par~ haver cooperação entre seres humanos, é necessário que alguns me-
camsmos estejam presentes de forma que cada ator individual: a) possa 
entender as linhas de ação dos outros e b) possa direcionar seu próprio 
comportamento a fim de acomodar-se àquelas linhas de ação. O compor-
tamento humano não é uma questão de resposta direta às atividades dos 
outros, mas envolve uma resposta às intenções dos outros, ou seja, ao fu-
turo e intencional comportamento dos outros, não somente às suas ações 
presentes (MELTZER, 1972: 6). Estas intenções são transmitidas através 
de ges.tos que se tornam simbólicos, isto é, passíveis de serem interpretados. 
A SOCIedade humana se funda, pois, na base do consenso, de sentidos 
compartilhados sob a forma de compreensões e expectativas comuns. 
Quando os gestos assumem um sentido comum, ou seja, quando eles 
adquirem um elemento linguístico,podem ser designados de "símbolos 
significantes". O componente significativo de um ato ll , que representa 
uma atividade mental, acontece através do role-taking: o indivíduo deve 
colocar-se na posição de outra pessoa, deve identificar-se com ela12. Para 
Mead a relação dos seres humanos entre si surge do desenvolvimento de 
sua habilidade de responder a seus próprios gestos. Esta habilidade permi-
te que diferentes seres humanos respondam da mesma forma ao mesmo 
11. Que Mead chama "meaning". 
12. Este proces -, so ocorre nao somente em termos da assunção do papel de uma pessoa 
espeCifica como d I d . o pape e um grupo, o que Mead chamageneralized other. Além do con-
ceito ~~ Taking the role qf the other Mead se refere à conversat;on qfi?estures ou "conversação de 
gestos , no mesmo sentido. 
27 
gesto, possibilitando a compartilhar de experiências, a incorporação entre 
si do comportamento. O comportamento é, pois, social e não meramente 
uma resposta aos outros. O ser humano responde a si mesmo da mesma 
forma que outras pessoas lhe respondem e, ao fazê-lo, imaginativamente 
compartilha a conduta dos outros (MELTZER, 1972: 8). De acordo com 
a interpretação de Blumer (1969: 82), são estas as características da análise 
de Mead, baseada na interação simbólical3 . Elas pressupõem: 
que a sociedade humana é feita de indivíduos que têm selves 
(isto é, que fazem indicações para si mesmos); que a ação 
individual é uma construção e não um dado, erigida pelo 
indivíduo através da percepção (noting) e interpretação das 
características das situações nas quais ele atua; que a ação 
grupal ou coletiva consiste do alinhamento de ações indivi-
duais trazidas pelas interpretações que os indivíduos alocam 
às ações dos outros ou consideram em termos da ação de 
cada um (T. do A.). 
A sociedade humana deve ser vista como consistindo de 
pessoas em ação e a vida da sociedade deve ser vista como 
consistindo de suas ações. As unidades atuantes podem ser 
indivíduos separados, coletividades cujos membros agem 
conjuntamente com vistas a uma ação (quest) comum, ou 
organizações atuantes em benefício de uma constituência 
(constituency). Respectivos exemplos são compras individu-
ais em um mercado, um grupo que joga ou uma banda mis-
sionária, e uma cooperação de negócios ou uma associação 
profissional nacional. Não existe nenhuma atividade empi-
ricamente observável em uma sociedade humana que não 
surja de alguma unidade de ação (T. do A.). 
13. Ao fazer a explanação do pensamento de Mead, Blumer critica a sociologia convencio-
nal por acreditar que o comportamento das pessoas como membros de uma sociedade é 
uma expressão do jogo de forças societais sobre elas, como sistema social, estrutura social, 
cultura, costume, instituição, normas, valores, etc. Blumer alega que esta abordagem ignora 
que as ações sociais dos indivíduos numa sociedade são construídas por eles através de um 
processo de interpretação. 
28 
A ação comum, contudo, ocorre em relação a um lugar e a uma 
situação. Toda e qualquer unidade de ação - um indivíduo, uma família, 
uma escola, uma igreja, uma firma, um sindicato, um legislativo, assim 
por diante a ação em si - é feita à luz de uma situação específica. Logo, a 
ação é construída através da interpretação da situação, consistindo a vida 
grupal de unidades de ação desenvolvendo ações para enfrentar situações 
nas quais elas estão inseridas (BLUMER, 1969: 85)14. 
2.2. O self 
Ao afirmar que o ser humano possui um self, Mead quer enfatizar 
que, da mesma forma que o indivíduo age socialmente com relação a 
outras pessoas, ele interage socialmente consigo mesmo. Ele pode tornar-se 
o objeto de suas próprias ações. O self, assim como outros objetos, é for-
mado através das "definições" feitas por outros que servirão de referen-
ciai para que ele possa ver-se a si mesmol5 . Assim sendo, o ser humano 
pode tornar-se objeto de suas próprias ações dentro da sociedade que, de 
acordo com Mead, precede a existência do self. A sociedade representa, 
pois, o contexto dentro do qual o self surge e se desenvolve. Este desen-
volvimento tem início em um estágio de imitação por parte da criança, 
sem qualquer componente significativo. Em seguida ela passa a "assumir 
o papel de outros" em relação a si própria; exemplos destes papéis são a 
14. Paralelamente ao trabalho de Mead, Willian I. Thomas elaborava o conceito de "defi-
nição de situação": "preliminar a qualquer ato de comportamento autodeterminado existe 
sempre um estágio de exame e deliberação que nós podemos chamar de 'definição de 
situação'. Na verdade, não apenas os atos concretos são dependentes da definição de si-
tuação, mas gradualmente uma completa política de vida e a personalidade do próprio 
indivíduo seguem de uma série de tais definições". The Unadjusted Gir!. Boston: Little, 
Browand Company, 1931, p. 41. 
15. Este aspecto foi desenvolvido concomitantemente por Charles H. Cooley através do 
conceito "looking glass self": muna larga e interessante classe de casos a referência social 
~oma a forma de alguma imaginação definida de como o self de alguém - isto é, qualquer 
Ideia que ele se aproprie - aparece muna mente particular, e o tipo de autossentimento 
(self:feeling) que alguém sente é determinado pela atitude dirigida a isto, atribuída por esta 
outra mente. O self social deste tipo poderia ser chamado de vidro refletido ou "looking-
glass self" CE COOLEY C.H .. Looking-Glass SelE ln: MARIS J.G. & MELTZER B.N. 
(org.), 1972. De acordo com Manford H. Kuhn (1972), Cooley representa um dos inte-
lectuais que antecederam a "teoria do papel". 
29 
"mãe", a "professora", o "bandido", o "mocinho" etc. Quando a criança 
é capaz de fazer o jogo de diferentes papéis ela já constrói ~ ~ue Mead 
chama de generalized other ou papel coletivo, o que ele adqumU no ~ur­
so de sua associação com os outros e cujas expectativas ela internahzou 
(MELTZER, 1972: 10). Meltzer, ao interpretar o pensamento ~e ~ead, 
enfatiza que o self representa um processo social no interior do mdlVlduo 
envolvendo duas fases analíticas distintas: 
O "Eu" é a tendência impulsiva do indivíduo. Ele é o aspecto ini-
cial, espontâneo e desorganizado da experiência humana. Logo, 
ele representa as tendências não direcionais do indivíduo. 
O "Mim" representa o "outro" incorporado ao indivíduo. Logo, ele 
compreende o conjunto organizado de atitudes e definições, com-
preensões e expectativas - ou simplesmente sentidos - comuns ao 
grupo. Em qualquer situação o "Mim" compreende o outro gene-
ralizado e, raramente, um outro particular (não grifo do A). 
Todo ato começa na forma de um "Eu" e geralmente termina na 
forma de um "Mim". Porque o "Eu" representa a iniciação do 
ato antes dele cair sob o controle das definições e expectativas dos 
outros (Mim). O "Eu", pois, o dá propulsão, enquanto o "Mim" 
dá direção ao ato. O comportamento humano, então, pode ser 
visto como uma série perpétua de iniciações de atos pelo "Eu" 
e de ações retroativas sobre o ato (isto é, direcionarnento do ato) 
pelo "Mim". O ato é a resultante desta interação
l6 
(T. doA). 
A formação do self, assim como o ato humano, tem uma fun-
damentação social. Entretanto, nem o self nem o ato social são estáticos. 
Eles evoluem ou se modificam de acordo com as mudanças nos padrões 
e nos conteúdos das interações que o indivíduo experiencia, não só com 
os outros, como consigo mesmo. Por que o indivíduo poss~i um 
seif, é capaz de ter uma vida mental: ele pode fazer indicaç~s para SI pró-
pno _ o que constitui a própria mente. Por que ele pOSSUi uma mente, 
16. Meltzer (1972: 11, nota 3) discute a aparente semelhança existente entre os conceitos 
do "Eu" e do "Mim", de Mead, e aqueles do "ID", "EGO" e "Superego" de Freud. Ele 
afirma que, enquanto o Superego age de forma frustrante e repressiva sobre o "ID", o 
"MIM" proporciona a direção necessária e, muitas vezes, gratificante aos Impulsos desor-
denadosdo "EU". Outras comparações menores são elaboradas. 
30 
tem a possibilidade de dirigir e controlar seu comportamento, ao invés de 
tornar-se um agente passivo dos impulsos e estímulos. 
Neste sentido, Mead (1936: 389-390 citado por TROYER, 1972) 
afirma que o organismo social 
2.3. A mente17 
[ ... ] não é um protoplasma sensitivo que está simplesmente 
recebendo estes estímulos de fora e, então, respondendo a 
eles. Ele está primariamente procurando certos estímulos ... 
Qualquer coisa que estejamos fazendo determina o tipo de 
estímulo que desencadeará certas respostas que estão mera-
mente prontas para expressar-se, e é a atitude em termos de 
ação que nos determina que estímulo será (T. do A.). 
Mead considera indispensável o aparato fisiológico do organismo 
para o desenvolvimento da mente (sistema nervoso central e córtex). É 
através dele que a gênese das mentes e dos selves se torna biologicamente 
possível em indivíduos humanos através dos processos sociais de experiên-
cia e comportamentos, dentro de uma matriz de relações sociais e intera-
ções. O cérebro é necessário para a emergência da mente, mas ele sozinho 
não faz a mente. É a sociedade-interação social que, usando os cérebros, 
forma a mente. O comportamento humano inteligente é "essencialmente 
e fundamentalmente social" (TROYER, 1972: 324 - T. do A.). 
Como um self pode surgir somente em uma sociedade onde 
haja comunicação, da mesma forma a mente só pode emer-
gir em um self ou personalidade dentro da qual esta conver-
sação de atitudes ou participação social toma lugar. É esta 
conversação, esta interação simbólica, interposta como uma 
parte integral do ato, que constitui a mente (MEAD, 1936: 
384-385, citado por TROYER, 1972: 324 - T. do A.). 
A mente é concebida por Mead como um processo que se mani-
festa sempre que o indivíduo interage consigo próprio usando símbolos 
significantes. Esta significância ou sentido é também social em origem, 
17. Por considerarmos os aspectos propriamente fisiológicos da mente fora dos propósitos 
da presente discussão, não nos referiremos a eles. Remetemos, entretanto, o leitor a Mead 
(1936). 
31 
conforme já referimos anteriormente. Da mesma forma a mente é social 
tanto em sua origem como em sua função, pois ela surge do processo 
social de comunicação. Dentro deste processo, o organismo seleciona 
aqueles estímulos que são relevantes para suas necessidades, rejeitando 
outros que considera irrelevantes. Todo comportamento implica em uma 
percepção seletiva de situações. A percepção não pode, assim, ser conce-
bida como uma mera impressão de alguma coisa do exterior no sistema 
do indivíduo. 
Por outro lado, o ser animal vive em um mundo de "objetos" 
que constituem seu ambiente circundante. Entretanto, o ser humano, 
diferentemente do animal irracional, é capaz de "formar" seus próprios 
"objetos", ou seja, através de sua atividade ele estabelece seu ambiente e 
os objetos sociais que dele fazem parte. O "objeto" é destacado pela men-
te através da percepção, possibilitando ao indivíduo planejar suas ações. 
A atividade mental necessariamente envolve sentidos que são atribuídos 
aos objetos, definindo-os. "O sentido de um objeto ou evento é simples-
mente uma imagem do padrão de ação que define o objeto ou o evento" 
(MELTZER, 1972: 18). 
Finalmente, depois da apresentação sumária e, certamente, sim-
plificada do pensamento de George Herbert Mead, pretendemos ter 
mostrado a vinculação e a unidade orgânica existentes entre os principais 
conceitos do autor, tais como a interação simbólica, a assunção de papéis, 
o sentido, o self e a mente que caracterizam o ato humano. 
2.4. Considerações críticas 
A obra de Mead, embora original e coerente, apresenta algumas 
deficiências e incompletudes, fruto da forma como o autor elaborou seu 
pensamento e da não intencionalidade de publicação de seus escritos na 
época. Conforme já referido anteriormente, eles representavam, na sua 
maioria, apontamentos fragmentários e esquemas das aulas ou palestras 
que ministrava e que foram selecionadas e editadas postumamente sem 
muita preocupação quanto à organização, justificando-se, assim, as repe-
tições e as ideias mal-acabadas ou vagas. Meltzer (1972: 18-21) empre-
ende uma avaliação crítica detalhada, dentro da perspectiva da psicologia 
social, do pensamento de Mead, especialmente no que diz respeito à falta 
32 
.. 
de clareza e à ambiguidade de certos conceitos relacionados com a natureza 
dos "impulsos"; falta de consistência no uso dos conceitos de "sentido" 
e "mente"; ambiguidade nos conceitos de "Eu" e "Mim", assim como de 
self, simplificação no uso do conceito de "outro generalizado"18. " ,ouso lm-
preciso dos conceitos de "obieto" e "imagem" e finalment b"" "J , , e, a am 19u1-
dade no uso dos conceitos de "atitude", "gesto" e "símbolo" ao tratar do 
comportamento infra-humano. Outra parte da crítica de Meltzer se dirige 
às omissões da teoria de Mead: falta de poder explicativo por negligenciar 
" A" d d o porque a con uta e restringir-se ao "como"; sua missão quanto ao 
papel dos elementos efetivos no surgimento do self e da interação sociaP9: 
omissão, também, quanto à natureza (ou até eXl"steAncl"a) d" " o mconSCiente 
ou subconsciente e dos mecanismos de ajustamento. Finalmente, Meltzer 
chama a atenção para a ausência de uma proposta metodológica na obra 
de Mead - o que será retomado por Blumer e discutido mais adiante - e 
da falta de evidência sistemática para seus posicionamentos. 
Quanto às contribuições, Meltzer (1969: 21-22) relaciona a in-
flu~ncia de Mead na sociologia sobre Cooley, Thomas, Park, Burgess, E. 
Fans e Blumer, além de outros na área da psicologia sociapo; sua ênfase 
nos aspectos encobertos, subjetivos do comportamento; sua crença de 
~ue o comportamento humano é comportamento em termos do que as 
slt~ações simbolizam e de que a mente e o self são sociais ao invés de bio-
logt.camente dados; a importância que ele aloca à linguagem como me-
camsmo ~e emergência da mente e do self; sua definição de self como um 
agente atlvo; sua concepção de "ato" enfatizando a tendência dos indiví-
duos de construir seu comportamento no curso da atividade e descobrir 
~s ~bjetos e seu ambiente circundante; sua discussão da maneira como os 
md~víduos constroem seu mundo comum; e, finalmente, a forma como 
e.le dumina o caráter da interação social, concebendo-a como o compar-
tdhar de comp t " 'd A I , or amentos, ao mves e ve- os como resposta passiva a um 
estímulo externo. 
18. Limitação re d" d h" 
co 
"d me la a, 0Je, pelos trabalhos sobre "grupo de referência" que criaram o 
ncelto e "out ""fi " do" (MET'T' ros Slgnl !Cantes , aclarando a concepção de Mead de "outro generaliza-
LIZER, 1969: 20)" 
19. Problema superado por Cooley" 
20 L" d " 
~14;'h; ~n~'~1 T. No::omb, W con~~~JM 
"T-lCH /U13(; 
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Muitas das críticas, acima referidas brevemente, têm como re-
ferencial a psicologia social, perdendo, pois, seu impacto dentro de uma 
avaliação propriamente sociológica. Desta forma, não podemos perder de 
vista que os insights de Mead foram de uma importância fu~damen~l. :~ra 
o desmembramento do interacionismo simbólico em teonas SubsIdIanas 
tais como, entre outras21 , o dramaturgismo de Goffman e a etnometodologia 
de Harold Garfinkel que discutiremos mais adiante. 
2.5. A natureza da interação simbólica 
Apesar da relevância dos estudos clássicos acima referidos, além 
de outros, eles não exibem uma sistemática capaz de representar com 
clareza os pressupostos básicos da abordagem interacionista. Coube.a 
Herbert Blumer fazê-lo através de seus escritos iniciados em 1937, CUJa 
maioria está reproduzida em sua mais importante publicação, Symbolic 
Interactionism, Perspective and Method (New Jersey: Prentice-Hall, Inc. / 
Englewood Cliffs, 1969). . 
Blumer apresenta e discute os mais importantes aspectos da m-
teração simbólica tentando ser fiel ao pensamento deMead, abordando 
sobretudo a natureza da interação simbólica, a natureza da sociedade e da 
vida em grupo, a natureza dos objetos, da ação humana e a ação conjun~a. 
Vejamos seus pontos básicos. De acordo com este autor, são três premIS-
sas básicas do interacionismo simbólico: 
1. O ser humano age com relação às coisas na base dos sentidos que elas 
têm para ele. Estas coisas incluem todos os objetos nsicos, outros seres 
humanos, categorias de seres humanos (amigos ou inimigos), institui-
ções, ideias valorizadas (honestidade), atividades dos outros e outras situ-
ações que o indivíduo encontra na sua vida cotidiana. 
2. O sentido destas coisas é derivado, ou surge, da interação social que 
alguém estabelece com seus companheiros. 
3. Estes sentidos são manipulados e modificados através de um processo inter-
pretativo usado pela pessoa ao tratar as coisas que ela encontra (grifo do A). 
Ao contrário das posturas encontradas em muitas abordagens das 
ciências psicológicas, o interacionismo simbólico aloca uma importância 
21. Outras vertentes do interacionismo simbólico podem ser identificadas nos trabalhO'> 
sobre "teoria do papel", "grupos de referência" e "teoria do self"· 
34 
fundamental ao sentido que as coisas têm para o comportamento humano. 
Ignorar isto sigrtifica "falsificar o comportamento em estudo" (BLUMER, 
1969: 3). Por outro lado, o interacionismo simbólico também se diferen-
cia de outras abordagens quando concebe o sentido como emergindo do 
processo de interação entre as pessoas, ao invés de percebê-lo seja como 
algo intrínseco ao ser, seja como uma expressão dos elementos consti-
tuintes da psique, da mente, ou de organização psicológica. 
A utilização de sentidos, entretanto, envolve um processo inter-
pretativo que acontece em duas etapas. Primeiramente o ato r indica a 
si mesmo as coisas em direção das quais ele está agindo; ele aponta a si 
mesmo as coisas que têm sentido. Isto representa um processo social in-
ternalizado no qual o ato r interage consigo mesmo de uma maneira bem 
diversa daquela na qual interagem os elementos psicológicos - represen-
tando a instância da pessoa engajada em um processo de comunicação 
consigo mesma. Em seguida, em virtude deste processo, a interpreta-
ção passa a significar a forma de manipulação de sentidos, ou seja, o ator 
seleciona, checa, suspende, reagrupa e transforma os sentidos à luz da 
situação na qual ele está colocado e da direção de sua ação. A interpreta-
ção é, pois, um processo formativo, e não uma aplicação sistemática de 
sentidos já estabelecidos. 
Ao fundar-se nestas premissas, a interação simbólica é levada ne-
cessariamente a desenvolver um esquema analítico da sociedade humana 
e da conduta humana que envolve certas ideias básicas22 relacionadas com 
a natureza das seguintes matérias: grupos humanos ou sociedades, inte-
ração social, objetos, o ser humano como ato r, a ação humana e as inter-
conexões entre as linhas de ação. Em uma visão de conjunto estas ideias 
representam a forma como o interacionismo simbólico vê a sociedade 
humana e a conduta. 
A sociedade humana ou a vida humana em grupo é vista como 
consistindo de pessoas que interagem, ou seja, pessoas em ação que de-
senvolvem atividades diferenciadas que as colocam em diferentes situa-
ções. O princípio fundamental é que os grupos humanos, assim como a 
sociedade, "existem em ação" e devem ser vistos em termos de ação. É 
22 Ou . . root Images, como prefere Blumer (1969: 6). 
35 
através deste processo de constante atividade que estruturas e orgamza-
ções são estabelecidas. Logo, a vida do grupo necessariamente pressup.õe 
a interação entre os membros do grupo ou, em outros termos, a SOCle-
dade consiste de indivíduos interagindo uns com os outros, e cujas ativi-
dades ocorrem predominantemente em resposta de um a outro, ou em 
relação de um a outro. Torna-se, pois, evidente que a interação não pode 
ser tratada _ embora admitida - meramente como um meio através do 
qual as determinações do comportamento passam a produzir o próprio 
comportament023 . 
Tomando um outro aspecto do pensamento de Mead, Blumer 
discute a necessidade das partes interagentes "assumirem o papel do ou-
tro", a fim de que as indicações dirigidas à(s) outra(s) parte(s) sejam feitas 
a partir do ponto de vista desta outra parte, de modo que sua intenção seja 
percebida. A mútua assunção de papéis é uma condição sine qua non da 
comunicação e da interação efetiva de símbolos. Quando uma pessoa faz 
indicações a outra, ela o faz indicando objetos significativos para ela, que 
fazem parte de seu "mundo". Um objeto é visto, então, como qualquer 
coisa que pode ser indicada ou referida. 
O sentido dos objetos para uma pessoa surge fundamentalmente 
da maneira como eles lhe são definidos por outras pessoas que com ela 
interagem, consistindo o meio circundante de qualquer pessoa, unicamen-
te dos objetos que esta pessoa reconhece. Assim, para que se compreenda 
a ação das pessoas, é necessário que se identifique seu mundo de objetos. 
Os objetos _ em termos de seus sentidos - são criações sociais, ou seja, são 
formados a partir do processo de definição e interpretação através da 
interação humana. A vida de um grupo humano dentro da perspecti-
va interacionista representa um vasto processo de formação, sustentação 
e transformação de objetos, na medida em que seus sentidos se modifi-
cam, modificando o mundo das pessoas. 
Para ser capaz de interagir, o ser humano deve possuir um self. Ele 
representa um organismo que não somente responde aos outros como 
23. Blumer (1969: 7) critica certas perspectivas psicológicas e sociológicas que ignoram 
que a interação não pode ser concebida como interação de elementos psicológicos ou 
societais, tais como: a interação entre atitudes, a interação de papéis sociais ou de compo-
nentes do sistema social. Ele enfatiza que a interação social representa uma interação entre 
atores e não entre fatores que sobre eles atuam. 
36 
a si mesmo, ou seja, o ser humano pode ser um objeto de suas próprias 
ações. Como outros objetos, o self surge do processo de interação social 
no qual outras pessoas estão definindo alguém para si mesmo. A fim de 
tornar-se um objeto para si mesma a pessoa deve ver-se a si mesma "de fo-
ra", ou seja, colocando-se no lugar ou no papel dos outros e vendo a si 
própria ou agindo para si mesma daquela posição. Consequentemente, 
nós vemos a nós mesmos através da forma como os outros nos veem 
ou nos definem. 
O ser humano difere do animal porque ele é capaz de fazer "in-
dicações" para si mesmo. Isto significa que, ao confrontar o mundo de 
objetos que o rodeia, ele deve "interpretá-lo" a fim de agir, construindo 
um "guia de ação" à luz desta interpretação e não somente "responder" aos 
fatores que sobre ele atuam. A ação da parte do ser humano "consiste em 
tomar em consideração as várias coisas que ele nota, construindo uma li-
nha de conduta na base de como ele as interpreta" (BLUMER, 1969: 15). 
A perspectiva interacionista, pois, está em completo desacordo 
com certas visões dominantes, tanto na psicologia como nas ciências so-
ciais que ignoram o processo de autointeração, através do qual o indi-
víduo manipula o seu mundo e constrói sua ação. Ao contrário, estas 
visões concebem a ação como originando-se de ou combinando-se com 
(motivos, atitudes, complexos inconscientes, configuração de estímulos, 
demandas de status ou de situação, etc.). Sumariando o processo de for-
mação da ação, Blumer (1969: 16) enfatiza: 
Nós devemos reconhecer que as atividades dos seres hu-
manos consistem no enfrentamento de uma sequência 
de situações nas quais eles devem agir, e que suas ações são 
construídas à base do que eles notam, de como eles avaliam 
e interpretam o que eles notam, e do tipo de linhas de ação 
projetadas que eles mapeiam. 
As normas de ação humana se aplicam tanto para a ação indivi-
dual como para a ação coletivae, neste ponto, Blumer discute um último 
~pecto do processo de interação simbólica, que se refere à "ação con-
Junta" (j .. . omt actton) ou coletlva. Da mesma forma que a ação individual, 
a ação conjunta pode se constituir em objeto de estudo, não perdendo o 
caráter de ser construída através de um processo interpretativo, quando 
37 
a coletividade enfrenta situações nas quais é chamada a agir. A ação con-
junta, apesar de ser composta da atividade de diferentes linhas de ação 
dos indivíduos componentes, tem um caráter sui generis, isto é, um caráter 
que torna a articulação ou a vinculação das ações individuais diferente do 
somatório destas ações24 • É assim que se pode falar de casamento, de tran-
sações comerciais, de família, de universidade ou de nação. Apesar de seu 
caráter distintivo, a ação conjunta tem sempre que operar através de um 
processo de "formação", ou seja, embora certas ações conjuntas aparen-
temente exibam formas estabelecidas e repetitivas de ação, cada uma de 
suas instâncias deve ser formada novamente. Estas formas decorrentes 
de ação permitem ao indivíduo partilhar sentidos comuns e preestabele-
cidos sobre as expectativas de ação dos participantes e, consequentemen-
te, cada participante é capaz de guiar seu próprio comportamento à luz 
destes sentidos. 
Aqui, Blumer novamente critica as visões dominantes na litera-
tura de ciências sociais que entendem estas formas repetitivas da ação 
conjunta como a essência ou a forma natural da vida humana em grupo. 
Elas acreditam que a sociedade humana existe sob a forma de uma ordem 
estabelecida de vida através da aderência a um conjunto de regras, nor-
mas, valores e sanções que especificam como os indivíduos devem agir 
em situações específicas. Exemplos disto são os conceitos de "cultura" e 
de "ordem social". O fato é que, por detrás da fachada da ação conjunta 
percebida objetivamente, o conjunto de sentidos que sustém esta ação 
conjunta tem sua vida própria. Não é verdade que são as regras que criam e 
sustentam a vida em grupo, mas, ao contrário, é o processo social de vida grupal que 
cria e mantém as regras. 
As instituições, por exemplo, representam uma rede que não fun-
ciona automaticamente por causa de certa dinâmica interna ou sistema de 
requerimentos; funciona porque as pessoas, em momentos diferentes, fa-
zem alguma coisa, como um resultado da forma como definem a situação 
na qual são chamadas a agir. Por outro lado, a ação conjunta necessaria-
mente surge e se configura a partir das ações prévias de seus participantes 
24. Percebe-se aqui a semelhança entre a perspectiva interacionista com relação à "ação 
conjunta" e os conceitos de "multidão" de Mannhein e de "consciência coletiva" de 
Durkheim, no sentido de considerar seu caráter sui generis. 
38 
que sempre se utilizam de seu "mundo de objetos", de seu "conjunto de 
sen~idos" e d.e seus "esquemas de interpretação" que já possuem. A ação 
conjunta, pOlS, representa não somente um "vínculo horizontal" com as 
atividades dos participantes, como um "vínculo vertical" com suas ações 
conjuntas prévias. 
2.6. Princípios metodológicos do interacionismo simbólico 
Apesar de basear-se sobretudo em Mead na formulação e explici-
tação dos princípios da interação simbólica, Blumer chama a atenção para 
o fato de que um posicionamento metodológico definido está ausente 
nos escritos daqueles que representam a tradição intelectual do interacio-
nismo simbólico, tais como Mead, Dewey, Thomas, Park,James, Cooley, 
Znaniecki, Baldwin, Redfield e With. Assumindo inteira responsabilida-
de ele se propõe a identificar os princípios norteadores da metodologia no 
caso da ciência empírica e a tratar especificamente com a postura metodo-
lógica do interacionismo simbólico. 
Sua perspectiva, ao invés de filosófica, pretende-se empírica, ou 
seja, designada a prover um conhecimento verificável sobre a vida humana 
em grupo e sobre a conduta humana. Consequentemente, algumas exi-
gências devem ser preenchidas. O primeiro pressuposto básico, que, na 
verdade, representa uma redundância, é que uma ciência empírica pres-
supõe a existência de um mundo empírico disponível para observação, 
estudo e análise. Este mundo empírico deve representar sempre o ponto 
central de preocupação do pesquisador, o ponto de partida e o ponto de 
chegada da ciência empírica. A "realidade", para a ciência empírica, existe 
somente no mundo empírico e somente lá pode ser procurada e veri-
ficada. Entretanto, é necessário que não se confunda esta posição com 
outras de corte positivista. Ao contrário delas, esta postura se aproxima e 
aceita um dos postulados idealistas de que "o mundo da realidade" existe 
somente na experiência humana e que ele aparece somente sob a forma 
de como os seres humanos "veem" este mundo. A ciência empírica tem 
por fim captar imagens do mundo empírico sob estudo e testá-las através 
do escrutínio acurado do próprio mundo empírico. Assim sendo, a meto-
dologia se refere aos princípios que estão subjacentes e que direcionam o 
processo global de estudo do caráter persistente de determinado mundo 
empírico. Esta concepção de metodologia implica em tr~s i~portant~s 
pontos: 1) a metodologia compreende a inteira busca cIentIfica e nao 
apenas alguns aspectos selecionados desta busca; 2) cada par~e da busca 
científica, assim como o ato científico completo em si, deve ajustar-se ao 
caráter persistente do mundo empírico sob estudo; logo, os métodos de 
estudo estão subservientes a este mundo e devem ser testados por ele; 3) 
o mundo empírico sob estudo, e não os modelos da investigação cientí-
fica, provê a última e decisiva resposta a este teste (BL~MER., 196~: 24). 
Percebe-se que esta concepção de metodologIa se dIstancIa da-
quelas comumente usadas pelas escolas quantitat~vis.tas para quem a me-
todologia se resume na discussão de métodos e tecmcas. . . 
Blumer (1969: 24-26) identifica os 6 pontos maIS Importantes 
da investigação científica que são indispensáveis à ciência empírica e que 
merecem ser conhecidas na sua inteireza: 
a) A possessão e o uso de uma visão prévia ou esquema do mundo e~­
pírico sob estudo. Representa um pré-requisito inevitável,já que é est~ vtsa.o 
que orientará a formulaião de problemas, a escolha dos tipos de dados, e a tdentl-
ficaião das premissas que caracterizam o mundo em estudo. _ 
b) A elaboração de questões do mundo empírico e a conversao das 
questões em problemas. Este é o passo que caracteriza propriamente o ato da 
investigaião , pois são os tipos de questões e os tipos de problemas colocados que 
nortearão o desenrolar da pesquisa. 
c) A determinação dos dados a serem coletados e os meios que serão 
utilizados para fazê-los. É óbvio que é o problema que diftne o tipo de dados 
a serem coletados, e que os meios usados dependem da natureza dos dados. 
d) A determinação das relações entre os dados. Pode-se chegar a isto seja 
através de um processo de niflexão acurada sobre as conexões existentes entre os 
vários tipos de dados, seja através de procedimentos estatísticos mecânicos como a 
análise de fator ou um esquema de correlaião. 
e) A interpretação dos resultados. É nesta fase final que o pesquisador ex-
trapola o âmbito dos resultados empíricos propriamente ditos e se debruia sobre 
o riferencial teórico ou sobre concepções que transcendem o âmbito de um estudo. 
atentando para o fato de que se o riferencial teórico for falso ou não comprovado. 
suas interpretações também o serão. 
f) O uso de conceitos. Os conceitos são fundamentais para o ato de investigação 
e devem ser diftnidos a partir da colocação dos problemas. São eles que guiarão 
40 
&1 
a busca de dados, a tentativa de relacioná-los, assim como a interpretaião dos 
resultados. 
Com referência ao segundo aspecto de sua concepção de meto-
dologia - de que cada parte da busca científica, assim como do ato cien-
tífico como um todo, deve moldar-se ao caráter persistentedo mundo 
empírico sob estudo e de que, consequentemente, os métodos de estu-
do devem submeter-se a este mundo devendo também ser testados por 
ele -, Blumer critica a metodologia convencional por utilizar meios de 
estabelecer a validade empírica de certos estudos através de esquemas 
inadequados para captar o caráter específico do objeto de estudo. Estes 
meios seriam: a) a aceitação do protocolo científico; b) o desenvolvimen-
to de estudos baseados em réplicas; c) a crença no teste de hipóteses; d) 
o emprego de procedimentos operacionais. A utilização deste processo, 
diz ele, não oferece qualquer segurança de que as premissas, os dados, as 
relações, os conceitos e as interpretações sejam empiricamente válidos. 
Estes procedimentos mostram, a priori, que as premissas estabelecidas so-
bre a natureza do mundo empírico realmente o refletem, sem que um 
exame acurado destas premissas seja empreendido. A tarefa do estudo 
científico, ao contrário, deveria se limitar a "levantar o véu" que cobre a 
área ou a vida do grupo que alguém se propõe a estudar. Isto só pode ser 
efetuado mediante uma aproximação com a área e de uma "escavação" 
profunda através de um estudo cuidadoso. Esquemas metodológicos, que 
encorajam ou permitem aquele tipo de procedimento, traem o princípio 
cardeal de respeito à natureza do mundo empírico. 
Blumer (1969: 40) tenta fundamentar sua opinião perguntando: 
Como pode alguém aproximar-se da área e escavá-la? Isto 
não é uma questão simples de aproximar-se de determinada 
área e olhar para ela. É um trabalho exaustivo que requer 
uma ordem elevada de (probing) tentativa cuidadosa e ho-
nesta, imaginação criativa e disciplinada, recursos e flexi-
bilidade no estudo, uma ponderação dos resultados e uma 
constante disposição para testar e reorganizar as visões e 
imagens da área. 
Este processo não é específico das ciências sociais, mas também 
das ciências naturais, como atestam os trabalhos de Darwin. Suas partes 
fundamentais são a "exploração" e a "inspeção" que distinguem clara-
mente as formas de investigação naturalista do mundo, daquelas caracte-
rísticas das metodologias em voga. A explora~ão, diz Blumer, é, por defini-
ção, um procedimento flexível, no qual o estudioso passa de uma à outra 
forma de investigação, adota novos pontos de observação, à proporção 
que seu estudo progride, toma novos direcionamentos previamente não 
pensados e muda seu reconhecimento do tipo de dados mais relevantes 
quando ele adquire mais informação e melhor compreensão. Já a inspe~ão 
representa um exame mais intensivo e focal do conteúdo empírico de 
todos os elementos analíticos usados para fins de análise, assim como o 
mesmo tipo de exame da natureza empírica das relações entre estes ele-
mentos. A exploração e a inspeção representam, pois, os elementos car-
deais da investiga~ão naturalista do mundo, ou seja, a investigação dirigida 
para o mundo empírico tal qual ele se apresenta, ao invés de simulações 
ou abstrações ou, ainda, substituições através de imagens preconcebidas. 
O interacionismo simbólico, cujos fundamentos metodológicos 
foram discutidos acima, vale a pena insistir, é uma abordagem "terra a 
terra" do estudo científico da vida humana em grupo e da conduta hu-
mana. Mas como é possível entendê-los? Vários são os procedimentos 
que têm sido utilizados para fazê-lo e que consideram de uma forma ou 
de outra os dois processos de exploração e inspeção, como a observação 
direta, o trabalho de campo, a observação participante, o estudo de caso, a 
entrevista, o uso da história de vida, o uso de cartas e diários assim como 
de documentos públicos, painés de discussão e conversas. Blumer, em-
bora reconheça a realidade destes procedimentos, está mais preocupado 
em ressaltar as implicações metodológicas da visão interacionista sobre 
o grupo humano e a ação social que ele sumariza em quatro concepções 
&2 
centrais: 
1) as pessoas, individual ou coletivamente, estão preparadas 
para agir à base dos sentidos dos objetos que compreendem 
seu mundo; 2) a associação das pessoas se dá, necessaria-
mente, sob a forma de processo no qual elas estão fazendo 
indicações uma à outra e interpretando as indicações uma 
da outra; 3) os atos sociais, não importa se individuais ou 
coletivos, são construídos através de um processo no qual 
42 
os atores notam, interpretam e avaliam as situações que eles 
confrontam; e 4) a intervinculação complexa dos atas que 
compreendem organizações, instituições, divisão de traba-
lho e redes de interdependência são questões moventes e 
não estáticas (1969: 50). 
Finalmente, podemos dizer, com Blumer, que o interacionismo 
simbólico luta pelo respeito à natureza do mundo empírico e pela organi-
zação de procedimentos metodológicos que reflitam este respeito. 
2.7. Variações na orientaçõo interacíonista2S 
Embora tenhamos apresentado de forma mais extensiva a pers-
pectiva de Blumer, devemos esclarecer que os deslocamentos tomados 
pelos seguidores dos clássicos - Cooley, Mead, Thomas - levaram o sur-
gimento de duas orientações diferentes: a Escola de Chicago e a Escola 
de Iowa. A primeira tem em H. Blumer seu mais renomado expoente, 
enquanto que a segunda segue a orientação de Manford Kuhn, falecido 
em 1963. Ambos, entretanto, aceitam os principais postulados do intera-
cionismo simbólico discordando, especialmente, com relação aos pontos 
que passamos a discutir brevemente. 
A divergência fundamental entre as duas escolas é, provavelmen-
te, no campo metodológico. Enquanto Blumer insiste na necessidade de uma 
metodologia distinta no estudo do homem, conforme vimos anterior-
~ent,e, Kuhn enfatiza a comunalidade do método em todas as disciplinas 
CIentificas. Trata-se, aqui, da interminável e não acabada oposição entre os 
pontos de vista humanístico e científico. Blumer procura tornar a socie-
dade moderna inteligível, enquanto Kuhn busca as previsões universais 
da conduta humana através da tentativa de operacionalização das ideias 
centrais do interacionismo simbólico. Um exemplo disto é sua técnica 
~ captação das auto atitudes (selfattitudes), o teste TST26, ou o "Teste das 
vmte afirmações". Kuhn acredita na possibilidade de transformar os 
conceitos intera I· • t . , . _ c oms as em vanavels empregadas para testar proposi-
çoes empíricas J' BI J:. b· - . . a umer laz o ~eçao a este tipO de operacionalização por 
25 Este t'· , b . OpICO e aseado em Meltzer e Petras (1972: 43-57). 
26. Twenty Statement Test - d --, o mais usa o teste para IdentIficar e mensurar as autoatitudes_ 
43 
acreditar que a realidade social não pode ser percebida através de "con-
ceitos definitivos", mas sim através de "conceitos sensibilizantes" que são 
mais capazes de expressar o caráter processual da realidade. 
Nos dizeres de Meltzer e Petras (1972: 49): 
Enquanto a imagem de Blumer sobre o homem levou-o a 
uma metodologia particular, as predileções metodológicas 
de Kuhn levaram-no a uma imagem particular do homem. 
Estas diferentes perspectivas nos encaminham para a segunda 
diferença entre as duas escolas. Trata-se da questão sobre a natureza do 
comportamento humano em termos de liberdade ou determinação, ou, 
em outras palavras, sobre a questão: é o comportamento humano de-
terminado ou indeterminado? Obviamente, a compreensão de Blumer 
a respeito do caráter processual da interação leva-o a conceber este com-
portamento como imprevisível e indeterminado. Em contraste, a Escola 
de Iowa rejeita não só o indeterminismo da conduta humana como a 
explicação da inovação social baseada nos elementos emergentes e criati-
vos da ação humana. Consequentemente, o comportamento é visto como 
determinado pelas definições do autor, inclusive suas autodefinições que, 
por sua vez, podem ser previstas na base das expectativas internalizadas. 
A terceira divergência diz respeito ao aspecto mais amplo da con-
cepção do self e a da sociedade, como processo ou

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