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CENTRO DE PSICOLOGIA APLICADA UNIVERSIDADE PAULISTA – UNIP Campus Jundiaí RELATÓRIO PARCIAL DE ESTÁGIO DA DISCIPLINA PSICOLOGIA DO COTIDIANO Nº 01/2022 1. IDENTIFICAÇÃO 1.1 RELATOR: Isabella Nazare Silva – RA N586923 1.2 INTERESSADO: Centro de Psicologia Aplicada (CPA), representado pela Professora orientadora deste estágio curricular obrigatório: Profa. Ma. Ana Maria Jesuina Barbieri Vassoler CRP 06/50223 referente a disciplina de Psicologia do Cotidiano. 1.3 ASSUNTO/FINALIDADE: Registro documental de processos de observação, registro e descrição da vida cotidiana. - Datas: 15/03/2022, 19/03/2022, 27/03/2022, 08/04/2022 e 13/04/2022 - Dia da semana e horário: 1ª: Terça – 8:00 às 10:00 (2 hrs) 2ª: Sábado – 13:00 às 15:00 (2h00 hrs) 3ª: Domingo – 17:00 às 20:00 (3hrs) 4ª: Sexta – 12:00 às 14:30 (1h30) 5ª: Quarta – 7:30 às 8:00 / 16:30 às 17:30. (1:30 hr) 2. DESCRIÇÃO DA DEMANDA A partir do artigo publicado pela Pepsic em janeiro de 2006, intitulado Sociabilidade Virtual: Separando o joio do trigo, onde se discute a mediação exclusiva dos relacionamentos interpessoais pelo meio “on-line” na sociedade do século 21, debatendo a reação negativa e hipócrita da sociedade e seu olhar convergente em relação aos meios de telecomunicação desde a sua criação até os dias atuais. Análise realizada em conjunto com o artigo A modernidade liquida: O sujeito e a interface com o fantasma, publicado na revista Mal-estar e Subjetividade em 2008 que retrata a linha tênue entre a construção da fantasia virtual marcada pela tentativa de preencher os desejos e pulsões do sujeito contemporâneo e a realidade metropolitana insegura junyo o mal-estar que atravessa a subjetividade humana nos meios digitais, os livros do sociólogo polonês Z. Bauman: A modernidade liquida (2001) e Sobre a fragilidade dos laços humanos (2004) e por fim, o artigo Vigiar e punir: a internet e as redes de poder participativo na era da globalização publicado na Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação em 2012, que aborda a organização e o julgamento da sociedade na era virtual inspirado na teoria de Focault. 3. PROCEDIMENTO A análise a seguir foi pautada na realização de no total 10 horas de observação in loco pelo tema escolhido em sala de aula: A relação do sujeito com o uso de celulares. A observação foi focada em jovens e adultos que estavam utilizando seus aparelhos digitais (tablet, celulares, notebooks etc.) em diversos espaços públicos e privados nas cidades de Jundiaí e Campo Limpo Paulista no estado de São Paulo e como esses sujeitos em questão se relacionavam com seu aparelho e as pessoas a sua volta. A maior parte dos sujeitos observados eram do sexo feminino, em média entre seus 17 e 45 anos, de diversas classes sociais, porém houve uma predominância de sujeitos de classe média, em contextos diversificados de trabalho, estudo e lazer. Os locais frequentados para a observação foram: - Um Shopping bem estruturado e famoso na cidade de Jundiaí, frequentado por pessoas com um considerável poder aquisitivo, onde se ocorreu a observação no período de 3 horas. - Leitura de matéria publicada em 25/03/2022 na internet sobre a exposição virtual da mulher que foi flagrada em atos sexuais com um mendigo e o julgamento da internet e a leitura dos 100 comentários relacionados à matéria, a observação teve a duração de 1 hora e meia. - Um aparelho de cunho municipal que promove cursos para jovens e adolescentes em Campo Limpo Paulista, a observação se deu em um período de 2 horas. - Uma clínica veterinária particular altamente frequentada por donos de animais no centro de Jundiaí onde ocorreu a observação pelo período total de 2 horas. - Dois meios diferentes de transporte público intermunicipais (trem e ônibus). Observados no mesmo dia pelo período de 1 hora (ônibus) e 30 minutos (trem CPTM). Todos os locais onde a observação ocorreu se inseriam em espaços onde as liberações relacionadas a pandemia variavam de cidade a cidade (como obrigatoriedade do uso de EPIs e a capacidade de lotação) entretanto pode-se afirmar que a concentração de pessoas nesses lugares era consideravelmente alta. 4. DESCRIÇÃO E ANÁLISE Na praça de alimentação de um famoso shopping center na cidade de Jundiaí, uma familia almoça tranquilamente na tarde um sabádo do mês de Março, o silencio predomina na mesa enquanto uma mulher na faixa dos 40 anos ajeita-se para a refeição, aparentemente levemente irritada e sua filha de aproximadamente 18 anos mexe em seu celular. Logo tal silencio é quebrado com uma dúvida, a mãe pede ajuda para a filha com uma ferramenta do aplicativo Instagram, chamada de “Stories”, aparentemente logo fica impressionada com a facilidade na qual a mesma pode compartilhar fragmentos de sua vida por 24 horas com amigos, parentes e desconhecidos que acompanham seu perfil. O contraste geracional se diminui quando mãe e filha estão com o telefone na mão ambas conectadas compartilhando fotos e videos do seu lanche e do membro mais novo da familia, um menino na fase da primeira infancia que já acostumado faz gracejos para as cameras enquanto brinca com a comida. Conforme o artigo Sociabilidade Virtual (2006), o final do século 20 e o início do século 21 foram marcados pelo rápido avanço tecnológico, os fenômenos como a globalização e a modernização acelerada da indústria digital fizeram com que celulares virassem um objeto acessível para grande parte da população brasileira. Desde o surgimento e a popularização da internet, em sua principal forma como um meio de proporcionar uma sociabilização acelerada e em massa foi alvo de rejeições e críticas no mundo todo por conta de sua “grande carga ideológica”. Entretanto, os tempos mudaram e o subjeto de como se moldam e se desenvolvem as interações humanas nesse novo cenário mundial que chamam atenção das mídias e dos filósofos até os dias de hoje. Para o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, a fragilidade dos laços humanos marca esse início do milênio na história. Diante da crise do estatuto do real, esse sujeito virtual com seus desejos e vontades tem em sua construção um processo complexo até a sua materialização no mundo exterior, tal processo que a partir da segunda metade do século 21 tem sua iniciação em idades cada vez mais jovens. Na cidade de Jundiaí, pode-se observar um jovem casal na faixa etária dos 20 e poucos anos, aguardando na sala de estar de um consultório veterinário junto de sua filha de aproximadamente dois anos de idade, aparentemente para distrai-la a jovem mãe colocou no seu celular vídeos com conteúdo infantil destinados para crianças mais novas disponíveis em diversos aplicativos como o Youtube e o Instagram, logo a mãe foi chamada para a consulta com o cachorrinho da família e ficaram apenas o pai e a filha na sala de espera, o pai deixou o telefone de lado prestando atenção na televisão que passava um jogo de futebol e a filha pegou o telefone, ao abri-lo, começou a falar repetidamente: “vidinha” “vidinha” e abriu o telefone em um aplicativo chamado de Instagram, nele ela começou a passar os vídeos um por um até achar algum conteúdo que a agradasse de forma autônoma na função chamada de Reels embutida no aplicativo em suas versões mais recentes. Em Sobre a fragilidade dos laços humanos (2004), Z. Bauman afirma que as relações virtuais estabelecem um padrão que orienta todos os relacionamentos (p. 13), tal afirmação apesar de radical e um tanto quanto curiosa é altamente perceptível quanto influência nos mecanismos de socialização atual como os bandos e tribos. Um grupo de jovens entre seus 16 e 18 anos esperam na frente de um prédio municipal para uma aula de violão gratuita, seus burburinhos giram em torno de conversas em um aplicativo chamado de Whatsapp, flertes no Tinder e compras em lojas de produçõesem massas que contêm todas as trends de modas atuais das séries de TV e do Instagram. Todas as meninas estavam vestidas de formas semelhantes e referenciavam dialetos encontrados e originados em fóruns da internet como “based”, “incel”, “cringe” - chamados de chanspeak, a semelhança e o efeito da identificação aparentavam ser elementos extremamente importantes para os indivíduos que compunham aquele grupo, ilustrando como modas e tendencias muitas vezes saem do meio virtual e estabelecem uma padronização dentro das relações entre os jovens atualmente, na vestimenta, em seu linguajar e ideologia. Á posteriori desses contatos iniciais cada vez mais precoces como uma tentativa de suprir o tédio e a falta e sua continuidade transformada em necessidade por uma manifestação de desejo imediato e a fuga de uma realidade tediosa. De acordo com Sigmund Freud (1995) o indivíduo foge da realidade quando o preço a se pagar para estar nela é alto demais e neste cenário pandêmico os transportes públicos viraram um dos maiores locais onde se predomina o uso do telefone celular para fins de distração, os serviços em massa de streaming pagos e gratuitos monopolizam o tempo das pessoas quando estão retornando para casa do seu trabalho ou escola, durante o período de quase todo o dia seja no momento da manhã dentro de um trem na CPTM ou em um ônibus no final da tarde a maioria das pessoas no transporte público independente de sua faixa etária, classe social, gênero e destino final estão de fones de ouvido e cabisbaixas olhando para o seu celular seja ouvindo música no Spotify, ou assistindo uma série na Netflix. Entretanto a grande parte delas tem uma diversão em comum no mundo virtual: as redes sociais. O artigo: A modernidade liquida: o sujeito e o fantasma virtual (2008), exemplifica como o Facebook e o Instagram ocupam grande parte do histórico digital dos brasileiros atualmente, nele se podem criar universos que não existem, manter um contato com outras pessoas e com a informação de forma rápida e movimentada, apenas seguindo o que se deseja ver e bloqueando informações aversivas que podem ser personalizadas por cada usuário, fazendo com que o individuo passe mais tempo no contato digital que está ao seu controle do que realizando um contato real que depende do eu e o outro. Nas redes sociais são uma consequência do novo modelo de sociedade inserido após a globalização e o advento da era digital, seus milhares de acessos compõem uma aldeia global de conexões instantâneas onde se reconfigurou as relações sociais, as dinâmicas de poder e a ação dos sujeitos na sociedade moderna e seu senso de julgamento. No Brasil em março de 2022, viralizou nas redes um vídeo de uma mulher casada mantendo relações sexuais com um morador de rua, o flagrante divulgado pelo próprio marido aparentemente surpreso e chocado por encontrar sua esposa em uma situação dessa natureza de traição. Segundo o artigo Vigiar e punir: a internet e as redes de poder participativo na era da globalização (2012) hoje os dispositivos de vigilância e controle encontraram nas novas tecnologias, e principalmente na internet, um novo espaço para interação social e manifestação de poder. A repercussão ocorrida neste caso e a exposição que ocorreu com os três principais personagens dessa situação cercadas de opiniões pessoais e até discursos de ódio, se manifesta dentro de um novo olhar das relações de poder no cyberespaço, a sociedade em rede possibilita que o individuo passe pelas fases do poder e se encontre em papeis versáteis de julgador e julgado, o historiador francês Michel Focault, ilustra essa passagem de poder entre os indivíduos não como agentes de uma mudança, mas sim como objetos, vigilantes em potencial nessa relação hierárquica: “Em outras palavras, o poder não se aplica aos indivíduos, passa por eles.” (FOUCAULT, 1979, p.83). 5. CONCLUSÃO Em suma, podemos concluir a partir das análises das 10 horas de observações e dos princípios teóricos da psicologia e sociologia apresentados em sala de aula e pesquisas adicionais realizadas pelo relator que a observação é uma ferramenta base totalmente indispensável para a formação e realização do trabalho de um psicólogo, adjunto da sua construção e produção de seu conhecimento. Apesar de ser um processo complexo, a parte mais difícil se dá no relato dos fatos de forma como ocorreram, ou seja, de maneira totalmente objetiva e impessoal, excluindo considerações e julgamentos pessoais durante todo o momento que está ocorrendo tal observação. Por fim, podemos observar através das observações neste presente trabalho relatadas e analisadas que a colaboração de Michel Focault, Z. Bauman e Sigmund Freud mostram-se extremamente válidas para análise da observação de como se constroem e se desenvolvem as relações dos indivíduos de formas Inter e intrapessoais com as tecnologias existentes na era virtual. 6. REFERÊNCIAS Barreto, Paulo Jeferson Pereira, Rios Riverson. Vigiar e punir: a internet e as redes de poder participativo na era da globalização. Intercom [online]. 2012, [Acessado 15 abril 2022]. Disponível em: http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2012/resumos/R7-1173-1.pdf FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. São Paulo: Graal, 2009 Nicolaci-da-Costa, Ana Maria. Sociabilidade virtual: separando o joio do trigo. Psicologia & Sociedade [online]. 2005, v. 17, n. 2 [Acessado 15 abril 2022], pp. 50-57. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0102-71822005000200008 Sigmund, Freud. A perda da realidade na neurose e na psicose (Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas, 2a ed.). Rio de Janeiro: Imago. 1995 Verdiani Tfouni, Fabio Elias y da Silva, Nilce y (2008), "A modernidade líquida: o sujeito e a interface com o fantasma." Revista Mal-estar E Subjetividade, Vol. VIII, núm.1, pp.171-194 [Consultado: 15 de abril de 2022]. ISSN: 1518-6148. Disponível em: https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=27180109 Zygmunt, Bauman. Amor líquido: Sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004. Zygmunt, Bauman. Modernidade Liquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001. http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2012/resumos/R7-1173-1.pdf https://doi.org/10.1590/S0102-71822005000200008 https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=27180109 Jundiaí, 15 de abril de 2022. Isabella N Silva – RA: N586923 Estagiário/Relator Supervisora de estágio: Profa. Ma. Ana Maria J. B. Vassoler CRP:06/50223
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