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Indaial – 2020 Psicologia e comunidade Profª. Tais Martins 1a Edição Copyright © UNIASSELVI 2020 Elaboração: Profª. Tais Martins Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: M386p Martins, Tais Psicologia e comunidade. / Tais Martins. – Indaial: UNIASSELVI, 2021. 178 p.; il. ISBN 978-65-5663-437-1 ISBN Digital 978-65-5663-433-3 1. Psicologia comunitária. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci. CDD 155.94 aPresentação A obra Psicologia Social Comunitária é responsável pela abordagem de conteúdos importantes e desafiadores da Psicologia. Os alunos dedicados a esses aprendizados, certamente, tornar-se-ão profissionais de qualidade e dispostos ao olhar humanitário. Este material foi elaborado através da conjugação de saberes entre a Teoria e a Prática da Psicologia Comunitária, que traz em seu bojo um conteúdo valioso e inquietante. Essa seara vem expandindo a sua atuação e também a sua amplitude conceitual em função das produções científicas e acadêmicas. Os estudantes dispostos a amealhar esse conhecimento devem constatar o quanto ele é agradável e ao mesmo tempo muito próximo dos contextos pessoais e profissionais. A valorização da vida humana recebe um novo contorno na medida em que aumenta a conscientização da sociedade e o conhecimento, sendo um dos melhores instrumentos de uma sociedade afinada com os valores humanos. A elaboração deste material contou com uma ampla pesquisa bibliográfica, textos sobre o assunto e até mesmo debates promovidos em encontros e Congressos Nacionais e Internacionais, pois não há profissional qualificado que descuide do aprimoramento permanente. Na Unidade 1, abordaremos a Psicologia Comunitária. Em seguida, na Unidade 2, estudaremos a Influência dos Grupos. Por fim, na Unidade 3, aprenderemos sobre a Psicologia Comunitária e a Atuação Profissional. A Psicologia Social Comunitária oferece um panorama dinâmico, pois a relação da realidade social com o processo culmina com a construção das identidades sociais e do fortalecimento do grupo. A construção ideológica está corporificada através do sentimento de pertencimento, pois a comunidade não é apenas um corpo ou um objeto. A busca do corpo perfeito e a luta contra o peso e o reganho de peso constituem uma tomada social e não exclusivamente individual, pois a identidade das pessoas obesas encontra um possível modelo de desenvolvimento humano que mesmo estigmatizado se identifica e passa a compor uma comunidade. Através da contextualização com a PSC, destaca-se o contexto dialético da inclusão-exclusão que é imbuído de uma subjetividade, pois os sujeitos sentem-se ao mesmo tempo incluídos e discriminados diante dos conflitos sociais comuns à vida em grupo e em comunidade. A PSC tem como uma de suas ocupações o estudo da comunidade. Os processos psicossociais e as relações de poder são vinculados às transformações sociais. Nesse sentido, a contingência cultural, a solução de conflitos e a resolução de problemas indicam que a comunidade acaba por formar-se através de um processo identitário. A integração e a satisfação das necessidades aumentam o sentimento de comunidade, e justamente aí há um elo entre os três tópicos desta unidade, pois a influência dos grupos e a atuação comunitária do psicólogo social comunitário oferecem uma visão panorâmica da teoria, mas também um recorte prático, diante das possíveis interações que o exercício da psicologia possibilita vivenciar. A Psicologia Comunitária dedica-se a estudar, compreender e intervir no cenário de questões psicossociais que caracterizam uma comunidade. Os objetivos da Psicologia Social Comunitária transitam compreensão das necessidades do campo biopsicossocial, pois vislumbram construir um entendimento acerca do conceito da Psicologia Social Comunitária e de seu objeto de estudo. Por certo não se pode esquecer que a tratativa desta disciplina transita na construção social de realidades subjetivas e humanas. Tão logo é preciso atentar o que são elementos permeados por uma práxis ética. Quando mencionamos os objetivos desse estudo não podemos esquecer que se faz necessário compreender, analisar e interpretar problemas de origem psicológica, tais como: questões de ordem cognitiva, emocional, comportamental e ecológica. Sendo assim, é notória a necessidade de desenvolver habilidades para atuação em diversas áreas de intervenção, coisa que só a conduta facilitará o direcionamento teórico e prático do psicólogo para o desenvolvimento das suas habilidades profissionais. A comunidade apresenta um traço dinâmico. O binômio indivíduo- sociedade recebe a influência dos processos socioculturais. O homem se insere no processo histórico, mas não representa somente um papel determinado, torna-se agente da história, pois transforma a sociedade em que vive. Por sua vez, Martin-Baró (1989) chama a atenção para a ligação da realidade como processo. Nesse ponto surge a responsabilidade do psicólogo social diante da sua contribuição na construção das identidades pessoais e do fortalecimento do grupo. Para Wienselfeld (2014), a comunidade não é apenas um corpo ou um objeto, mas uma construção ideológica que se corporifica através do sentimento de pertencimento. Por fim, a psicologia social comunitária traz algumas etapas desafiadoras que merecem atenção: 1) o fato de que não há uma base consensual que reúna os trabalhos dentro de uma mesma terminologia, indicando aproximações teórico-conceituais; 2) revela a necessidade de serem feitas análises epistemológicas sobre as práticas desenvolvidas com o intuito de analisar criticamente as incoerências e pseudoconciliações no campo da dimensão teórica e metodológica; 3) é necessário discutir o grau de impacto e importância dessas práticas na vida comunitária, a fim de se fazer uma reflexão crítica sobre o tipo de compromisso implícito e as alianças estabelecidas nos trabalhos de PSC. Com esta discussão surgem os novos caminhos para uma nova consciência mais politizada através da participação popular. Tal debate, que traz como um dos seus pontos nodais a crítica ao elitismo da Psicologia, coincide com o desenvolvimento da Psicologia Comunitária no Brasil. Esta se edifica a partir do movimento de uma série de psicólogos que criticavam o viés positivista da Psicologia social até então hegemônica, buscando construir propostas de transformação social, a partir de maior aproximação do psicólogo com as dinâmicas do cotidiano da maioria da população. Compete ao profissional da Psicologia Social Comunitária atender às demandas psicológicas, visando abranger aspectos sociopolítico-econômicos. Dessa feita é fulcral para o psicólogo estudar e compreender que a Teoria da Psicologia Social Comunitária tem relevância significativa para a formação de um psicólogo, não apenas por se tratar de uma abordagem pioneira e abrangente, que busca entender a pessoa em seus contextos, mas também por ser uma teoria condizente com explicações a respeito do ser humano dentro dos grupos aos quais pertence ou dos grupos em que resta alijado. O material contou também com o apoio incondicional da Equipe UNIASSELVI. Uma equipe qualificada e sempre disposta ao apoio e aos esclarecimentos necessários. Bons estudos! Profª. Tais Martins Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novi- dades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagra- mação no texto, aproveitandoao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilida- de de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assun- to em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento. Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complemen- tares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada! LEMBRETE sumário UNIDADE 1 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA ............................................................................ 1 TÓPICO 1 — CONCEITO ..................................................................................................................... 3 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 3 2 O PENSAMENTO SOCIAL E AS INFLUÊNCIAS SOCIAIS ..................................................... 4 2.1 A EMERGÊNCIA E A FORMAÇÃO DA PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA (PSC) NO BRASIL .................................................................................................. 5 2.1.1 Etapas desafiadoras da psicologia social comunitária ..................................................... 5 3 A HISTÓRIA DA CONSTRUÇÃO DA PSICOLOGIA SOCIAL NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA .................................................................................................................. 6 3.1 CARACTERÍSTICAS DA PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA ...................................... 7 RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 12 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 13 TÓPICO 2 — HISTÓRICO ................................................................................................................. 15 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 15 2 O ESTUDO DA PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA ...................................................... 17 2.1 A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA É UMA DISCIPLINA RECENTE ................................... 17 2.1.1 A evolução da Psicologia .................................................................................................... 19 RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 20 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 21 TÓPICO 3 — IDENTIDADE .............................................................................................................. 23 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 23 2 AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS ................................................................................................. 24 2.1 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SÃO FENÔMENOS DA VIDA COTIDIANA ................... 25 2.1.1 As três dimensões das representações sociais ................................................................. 26 RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 29 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 30 TÓPICO 4 — COMUNIDADE ........................................................................................................... 33 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 33 2 A PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA TEM COMO UMA DE SUAS OCUPAÇÕES O ESTUDO DA COMUNIDADE ........................................................................ 34 2.1 O SENTIDO DE COMUNIDADE SURGE A PARTIR DA CONCEPÇÃO DE SAÚDE E DE EMAGRECIMENTO COMO FORMA DE MANUTENÇÃO DA SAÚDE....................... 34 2.1.1 Preconceitos e estereótipos ................................................................................................. 35 3 A PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA ESTUDA AS RELAÇÕES ENTRE O INDIVÍDUO E A SOCIEDADE ...................................................................................................... 36 3.1 O DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA ................................................... 37 3.1.1 O ganho de peso é um problema ....................................................................................... 38 RESUMO DO TÓPICO 4..................................................................................................................... 41 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 42 TÓPICO 5 — CRENÇAS E JULGAMENTOS SOCIAIS ............................................................... 45 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 45 2 O CONCEITO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL.................................................................. 46 2.1 INTERVENÇÃO SOCIAL ............................................................................................................ 47 2.1.1 A vida social diante da nossa formação filogenética e ontogenética ........................... 48 LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 50 RESUMO DO TÓPICO 5..................................................................................................................... 53 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 54 REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................... 56 UNIDADE 2 — A INFLUÊNCIA DOS GRUPOS ........................................................................... 59 TÓPICO 1 — RELAÇÕES SOCIAIS ................................................................................................. 61 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 61 2 REFLEXÕES NECESSÁRIAS .......................................................................................................... 61 3 INTERFACE ENTRE A PERCEPÇÃO SOCIAL E AS RELAÇÕES SOCIAIS........................ 63 4 ENTRE A SOCIOLOGIA E A PSICOLOGIA ............................................................................... 63 4.1 A IMIGRAÇÃO COMO EXEMPLO NA PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA ......... 65 4.2 O CONTROLE DAS RELAÇÕES É ALGO JÁ MENCIONADO PELA OBRA FOUCALTIANA ............................................................................................................................ 70 5 OBJETOS DO MEIO SOCIAL ........................................................................................................ 71 RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 74 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 75 TÓPICO 2 — CONFLITOS E PACIFICAÇÃO ................................................................................ 77 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 77 2 A POSSIBILIDADE DE AUTONOMIA E LIBERDADE ........................................................... 77 3 VIOLÊNCIA E SAÚDE MENTAL .................................................................................................. 80 3.1 PROTEÇÃO E EXPOSIÇÃO DIANTE DA VIOLÊNCIA ........................................................ 80 3.1.1 Violência doméstica ............................................................................................................. 81 3.1.2 Violência contra o idoso ...................................................................................................... 83 3.1.3 Violência obstétrica .............................................................................................................. 85 4 GRUPOS SOCIAIS ............................................................................................................................ 88 4.1 FUNÇÃO DO PSICÓLOGO ........................................................................................................ 88 RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 90 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 91 TÓPICO 3 — VIOLÊNCIA E VITIMOLOGIA ............................................................................... 93 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 93 RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 95 AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 96 TÓPICO 4 — PERCEPÇÃO SOCIAL ................................................................................................ 99 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 99 2 A PSICOLOGIA SOCIAL E A PERCEPÇÃO DO OUTRO ..................................................... 100 RESUMO DO TÓPICO 4................................................................................................................... 104 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 105 TÓPICO 5 — PRECONCEITOS, ESTEREÓTIPOS E DISCRIMINAÇÃO ............................. 107 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 107 2 CARACTERIZAÇÃO DO PRECONCEITO ............................................................................... 107 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 110 RESUMO DO TÓPICO 5................................................................................................................... 116 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 117 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 119 UNIDADE 3 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA E A ATUAÇÃO PROFISSIONAL ........... 121 TÓPICO 1 — ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO NA PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA ........................................................................................................ 123 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 123 2 ESPÉCIE HUMANA NO PLANETA ............................................................................................ 124 2.1 A PSICOLOGIA É UMA CIÊNCIA AMPLA .......................................................................... 125 RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 128 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 129 TÓPICO 2 — DIREITOS HUMANOS E PSICOLOGIA COMUNITÁRIA ............................ 133 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 133 2 O PROGRESSO NO BRASIL ........................................................................................................ 134 2.1 GRUPOS DE APOIO .................................................................................................................. 135 2.2 A LIBERDADE ............................................................................................................................ 136 2.3 EMANCIPAÇÃO ........................................................................................................................ 138 RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 141 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 142 TÓPICO 3 — OBESIDADE E SEUS CONTORNOS NA PSICOLOGIA COMUNITÁRIA ........................................................................................................ 145 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 145 2 A OBESIDADE É EXPOSTA NA ÁREA DA SAÚDE COMO UMA EPIDEMIA MUNDIAL ......................................................................................................................................... 146 2.1 A OBESIDADE É UM PROBLEMA DE SAÚDE, MAS TAMBÉM SOCIAL ...................... 147 3 A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS (TRS) ........................................................... 150 RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 152 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 153 TÓPICO 4 — VIOLÊNCIA E SEUS CONTORNOS NA PSICOLOGIA SOCIAL ...................... COMUNITÁRIA ........................................................................................................ 155 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 155 2 O CONCEITO DA PALAVRA VIOLÊNCIA ..............................................................................155 2.1 PSICOLOGIA SOCIAL............................................................................................................... 158 3 A CONDENAÇÃO “SOCIAL” ...................................................................................................... 161 3.1 O PROCESSO HISTÓRICO BRASILEIRO .............................................................................. 161 4 A VIOLÊNCIA É UM ELEMENTO QUE PROPICIA UM DEBATE ...................................... 163 RESUMO DO TÓPICO 4................................................................................................................... 164 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 165 TÓPICO 5 — APLICAÇÕES GERAIS DA PSICOLOGIA COMUNITÁRIA ......................... 167 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 167 2 MASSAS E AS CONDUTAS HUMANAS .................................................................................. 167 2.1 MUITOS TEMAS DESAFIAM A ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO COMUNITÁRIO .......... 168 LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 170 RESUMO DO TÓPICO 5................................................................................................................... 173 AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 174 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 176 1 UNIDADE 1 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • identificar fundamentos da Psicologia que contribuem na compreensão dos fenômenos jurídicos; • delimitar o objeto e as áreas de abrangência da Psicologia Comunitária nos contextos sociais e também das organizações pertinentes à proteção dos indivíduos e dos grupos; • distinguir no campo das relações entre a Psicologia e a Comunidade, dominando as técnicas para ampliar esses saberes para auxiliar na paci- ficação dos conflitos. Esta unidade está dividida em cinco tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – CONCEITO TÓPICO 2 – HISTÓRICO TÓPICO 3 – IDENTIDADE TÓPICO 4 – COMUNIDADE TÓPICO 5 – CRENÇAS E JULGAMENTOS SOCIAIS Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 2 3 TÓPICO 1 — UNIDADE 1 CONCEITO 1 INTRODUÇÃO A Psicologia Social Comunitária traz em seu bojo um estudo científico sobre o modo como as pessoas pensam e também a forma como elas se relacionam. É da competência dessa ciência o estudo da influência do comportamento de uma pessoa sobre as outras, uma vez que a honestidade, a crueldade e a prestatividade são interligadas através de elementos como: a) o pensamento social, b) a influência social e c) as relações sociais. É de responsabilidade da psicologia social comunitária a análise do pensamento social, tendo em vista os indivíduos e a sua realidade social através de suas capacidades intuitivas. As atitudes possuem uma ligação direta, sujeito que influencia e que pode também ser influenciado pelo comportamento do grupo no qual está inserido. Nesse sentido, é preciso observar que existem as influências sociais que certamente interferem no comportamento dos sujeitos e também no comportamento dos grupos. A psicologia social pode ser entendida como um ramo de estudo da psicologia que tem como centro de sua análise o comportamento do indivíduo e as relações sociais estabelecidas por este indivíduo. Podemos afirmar também que a psicologia social estabelece um limite entre o que vem a ser psicologia e o que é a área de atuação da sociologia. Podemos asseverar que o ponto nevrálgico de diferenciação entre ambas está centrado no objeto de estudo, pois a psicologia tem como objeto de estudo o indivíduo e as interdependências entre os sujeitos, ou seja, o comportamento da pessoa e o condicionamento humano são observados através do pensamento e do comportamento das pessoas. Kurt Lewin (1890-1947) é considerado por muitos o fundador da psicologia social. Já no que concerne à sociologia, o seu objeto de estudo está concentrado no grupo social. A riqueza dessa disciplina é justamente o que a transforma num desafio reflexivo inesgotável, como veremos nos subtópicos que seguem. UNIDADE 1 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA 4 O olhar, a escuta e a contextualização são capazes de qualificar ainda mais o exercício profissional do Psicólogo Social, pois é o ato de olhar compreensivamente, suspendendo valores e sustentando o que é trazido pelas pessoas, pelo grupo e pela comunidade, que permitirá um olhar do psicólogo, que se diferencia dos demais profissionais que atuam com as Ciências Sociais. • A psicologia comunitária tem seus precedentes pelas correntes de pensamento social do século XIX. Notoriamente, através da Revolução Industrial, que teve seu início no final do século XVIII, presenciou o surgimento de grandes transformações econômicas, sociais, políticas e tecnológicas. • Esses acontecimentos promoveram uma mudança do sistema de economia agrícola, produção mecanizada e um agrupamento nos grandes núcleos urbanos. É notório que houve uma mudança no estilo de vida e nos costumes das pessoas. É diante da mudança de panoramas históricos e do pensamento social que se estabelecerá a sua preocupação com as problemáticas sociais. • O psicólogo é um catalisador de processos. Seus temas são: os processos de formação de consciência, a construção de identidade, as representações sociais, a apatia social, a desorganização e mobilização, o individualismo, a solidariedade, os processos de ação social etc. • Reiteramos que o papel do psicólogo em contextos comunitários é um tema de primeira ordem, pois enseja a grande tarefa de conhecer as necessidades da comunidade, orientar e dinamizar as estratégias que facilitem a solução. Os objetivos da Psicologia Social Comunitária transitam a compreensão das necessidades do campo biopsicossocial, pois vislumbram construir um entendimento acerca do conceito da psicologia social comunitária e de seu objeto de estudo. IMPORTANT E 2 O PENSAMENTO SOCIAL E AS INFLUÊNCIAS SOCIAIS O pensamento social e as influências sociais culminam a compreensão das relações sociais, pois é por meio dela que seremos capazes de observar os comportamentos que são biológicos e também os comportamentos que são sociais. Por meio dos valores, observaremos a positividade e a negatividade de determinadas condutas; a estrutura e a organização social permitem e proíbem determinados comportamentos. Com a aplicação da psicologia social comunitária, será possível verificar os contextos da vida cotidiana. Estudar o comportamento do ser humano e no que ele é influenciado socialmente é uma das competências dessa ciência, pois antes mesmo de nascermos, somos influenciados pela cultura a qual pertencemos, uma vez que as condições históricas e sociais e a história do grupo no qual seremos inseridos determinam o que é bom ou ruim, positivo e negativo, reforçador ou não. Não devemos descartar o fato de que muitas vezes a psicologia social é confundida com a sociologia. É bom recorte e da competência da psicologia social TÓPICO 1 — CONCEITO 5 comunitária analisar e investigar o estudo dos indivíduos e como eles influenciam e são influenciados pelas pessoas que compõem a sociedade. Destarte, é possível mencionar que a psicologia social comunitária é fronteiriça com os estudos de sociologia, pois é da competência da sociologia a análise dos grupos eda sociedade; na psicologia social comunitária os indivíduos são observados através de uma experimentação, analisando, de modo científico, a construção do pensamento social, a análise da influência social e, por fim, a construção das relações sociais. Em outras palavras, significa explicar o comportamento humano através da personalidade ou através das crianças; combina por configurar o objeto do estudo da psicologia social comunitária, que tem seu foco sobre a construção da realidade social. 2.1 A EMERGÊNCIA E A FORMAÇÃO DA PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA (PSC) NO BRASIL A emergência e a formação da Psicologia Social Comunitária (PSC) no Brasil, nos últimos 50 anos, foram marcadas, por um lado, pela contraposição aos dispositivos conceituais, aos locais de trabalho consagrados e às práticas da psicologia social norte-americana ao longo do século XX e, por outro, pela inserção da noção de comunidade em seu conjunto de princípios (FREITAS, 2013). Por meio da linguagem se estabelecem os significados das palavras que são atribuídas pelo grupo social e pela cultura e através delas se determinam uma visão de mundo, um sistema de valores e, por consequência, ações, sentimentos e emoções decorrentes. Embora as emoções sejam universais – tristeza, medo, alegria, nojo –, o que nos faz senti-las varia conforme os significados atribuídos pelo grupo social ao qual pertencemos. A palavra se torna poderosa quando alguma “autoridade” social impõe um significado único e inquestionável, que determina uma ação automática. A contra-arma do poder da palavra se encontra na própria natureza do significado: ampliá-lo, questioná-lo, pensar sobre ele, e não agir automaticamente em resposta a uma palavra. Entre a palavra e a ação deve sempre existir o pensamento para não sermos dominados por aqueles que detêm o poder da palavra. 2.1.1 Etapas desafiadoras da psicologia social comunitária A psicologia social comunitária traz algumas etapas desafiadoras que merecem atenção: • O fato de que não há uma base consensual que reúna os trabalhos dentro de uma mesma terminologia, indicando aproximações teórico-conceituais. UNIDADE 1 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA 6 • Revela a necessidade de serem feitas análises epistemológicas sobre as práticas desenvolvidas, com o intuito de analisar criticamente as incoerências e as pseudoconciliações no campo da dimensão teórica e metodológica. • É necessário discutir o grau de impacto e importância dessas práticas na vida comunitária, a fim de se fazer uma reflexão crítica sobre o tipo de compromisso implícito e as alianças estabelecidas nos trabalhos de PSC (JACQUES, 2013). Com essa discussão surgem os novos caminhos para uma nova consciência mais politizada através da participação popular. Tal debate, que traz como um dos seus pontos nodais a crítica ao elitismo da Psicologia, coincide com o desenvolvimento da Psicologia Comunitária no Brasil. Esta se edifica a partir do movimento de uma série de psicólogos que criticavam o viés positivista da Psicologia social até então hegemônica, buscando construir propostas de transformação social a partir de maior aproximação do psicólogo com as dinâmicas do cotidiano da maioria da população (JACQUES, 2013). 3 A HISTÓRIA DA CONSTRUÇÃO DA PSICOLOGIA SOCIAL NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA A história da construção da psicologia social no Brasil e na América Latina construiu uma psicologia social como um campo de produção de conhecimento relacionando a relação homem x sociedade, através da compreensão do indivíduo e no papel de identificação dos grupos aos quais esse indivíduo pertence. Ao qualificar a psicologia como social e posteriormente como comunitária, fica claro o objetivo de colaboração dos espaços relacionais que aproximam o indivíduo a partir de seus territórios, mas que posteriormente constroem seus processos de identificação, sejam eles físicos ou simbólicos (SAWAIA, 2000). A Psicologia Social Comunitária utiliza o enquadre teórico da Psicologia Social, privilegiando o trabalho com os grupos, colaborando para a formação da consciência crítica e para a construção de uma identidade social e individual, orientada por preceitos eticamente humanos (FREITAS, 1996). É muito difícil encontrar comportamentos humanos que não envolvam componentes sociais. Esses aspectos sociais são o enfoque da psicologia social. A Psicologia Social Comunitária reúne diversos campos de atuação, pois seu intuito é trabalhar com os grupos populares na busca contínua do protagonismo e esse protagonismo só é construído a partir de um pensamento crítico. IMPORTANT E TÓPICO 1 — CONCEITO 7 A psicologia social estuda a relação entre o indivíduo e a sociedade, entendida historicamente desde como seus membros se organizam para garantir sua sobrevivência até seus costumes, valores e instituições necessárias para a continuidade da sociedade. Psicologia social como o estudo científico da ação enquanto ideológica. Ao dizer ideológica, estamos expressando a mesma ideia de influência ou relação interpessoal, do jogo do pessoal e social; porém estamos afirmando também que a ação é uma síntese de objetividade e subjetividade, de conhecimento e de valorização, não necessariamente consciente, quer dizer que a ação está significada por conteúdos valorados e referidos historicamente em uma estrutura social (MARTÍN-BARÓ, 2012, p. 17). Podemos fazer todas as variações que quisermos, desde que as relações sejam mantidas. Há situações ou papéis mais determinados e outros mais livres. Ao conviver em grupos, cada um vai construindo seu EU. No processo de interação, desenvolvemos nossa consciência, nossa identidade. A psicologia corresponde a desmascarar os vínculos que ligam os atores sociais com os interesses de classe, colocando em evidência as mediações através das quais as necessidades de uma classe concreta se tornam imperativos interiorizados pelas pessoas, desarticular o emaranhado de forças objetivadas em uma ordem social que manipula os sujeitos através de mecanismos de falsa consciência (MARTÍN- BARÓ, 2012, p. 48). Podemos asseverar que a psicologia social comunitária ganhou uma visão crítica acerca dos problemas sociais e aos poucos foi transformando a comunidade e seu principal referencial de análise. “A comunidade é o eixo geográfico ou psicossocial onde a vida cotidiana é vivida” (CAMPOS, 2013, p. 8). A investigação das relações entre uma determinada comunidade e as ligações entre os seus componentes possibilita destacar a relevância da formação dos grupos, justificando a ampliação da perspectiva social em promover mudanças através do compromisso ético e político considerado pela psicologia social comunitária. Para Jacob (1999), a comunidade é um propósito da verdadeira essência da Psicologia Comunitária, em que se constitui o objeto de estudo e implementa a teorização e a intervenção, pois é através da cultura e dos significados compartilhados que os indivíduos constituem o elemento de um grupo social concreto: o sentir-se parte e o fazer parte. Aprofundaremos esse conceito no tópico sobre comunidade. 3.1 CARACTERÍSTICAS DA PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA A Psicologia Social Comunitária apresenta traços muito particulares desde sua história até os seus papéis de atuação. É uma psicologia que tem como UNIDADE 1 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA 8 diretriz a tratativa com os grupos populares, pois por meio da compreensão da história dos sujeitos e dos grupos sociais é possível traçar estratégias para que cada grupo assuma o seu real protagonismo. Através dos estudos de filosofia elencados por Aristóteles é possível observar a necessidade humana de digestão nos contextos sociais. No entanto, nem toda interação é fácil e nem toda linguagem possibilita uma convivência harmônica. As relações de poder se estabelecem e com elas surgem as fragilidades, as relações positivas e negativas advindas da vida social. No que concerne ao delineamento histórico, é possível verificar que no Brasil,entre as décadas de 1960 e 1970, a anteriormente denominada psicologia na comunidade assumia um serviço necessário e indispensável à população, pois por meio das organizações políticas e das novas frentes de trabalho foi possível observar a retirada de um serviço clandestino que somente contribuía com as referências sociológicas e antropológicas, em que se constrói um trabalho comunitário de estofo que apresenta um compromisso teórico e prático com o fito de ampliar a resolução das demandas sociais, através do emprego de estratégias intervencionais que facilitaram a interação com as comunidades e também a compreensão dos valores e da cultura de cada espaço. Surge nesse momento o grande papel do psicólogo como identificador das demandas sociais e das estratégias de intervenção, através de um diálogo de confiabilidade e de conhecimento. Nesse diapasão, a psicologia comunitária tornou-se o campo social (GÓIS, 1993). As características da psicologia social comunitária, segundo Montero (2004), podem ser compreendidas da seguinte forma, a saber: • preocupa-se com fenômenos psicossociais relacionados aos processos de construção do caráter comunitário, levando em conta o contexto cultural e social do qual surgem; • aceita a comunidade como um ser dinâmico composto por agentes ativos, relacionados à realidade em que vivem; • enfatiza as forças e capacidades e não as carências e debilidades; • considera a relatividade cultural; • inclui a diversidade; • assume as relações que ocorrem entre as pessoas e seu meio ambiente; • assume uma orientação voltada às mudanças sociais e ao desenvolvimento comunitário a partir da dupla motivação, seja ela comunitária ou científica; • inclui uma orientação voltada às mudanças pessoais e no processo de inter- relação entre indivíduos e comunidade; • vislumbra a possibilidade de poder da comunidade sobre os processos que afetam; • delineia uma condição política que supõe a formação da cidadania através do fortalecimento da sociedade; • defende uma ação comunitária que seja fundamentada pela participação da TÓPICO 1 — CONCEITO 9 própria comunidade; • considera a Psicologia Social Comunitária uma ciência aplicada que é capaz de produzir intervenções sociais; • apresenta um caráter eminentemente preventivo; • seu caráter científico promove interferências na esfera crítica e também na construção de novas teorias. O intento das intervenções da psicologia social comunitária tem como foco promover mudanças e adaptações na estrutura das comunidades através de uma participação coletiva. Essa participação deve ser favorecida através de processos de fortalecimento interpessoais, interativos e comportamentais (ÁLVARO; GARRIDO, 2006). Os processos de autopercepção trazem uma grande contribuição para a compreensão da capacidade e da manutenção exitosa dos sistemas sociais, uma vez que o ambiente social e político exige dos indivíduos uma organização que se perfaz através das atividades comunitárias (MONTERO, 2004). No que diz respeito ao papel do Psicólogo Comunitário, o trabalho de Maria de Fátima Quintal (1994) é muito significativo, visto que aborda o fato de que existem diferenças no tipo de identidade e nos produtos das práticas profissionais. Ela elenca um quadro de quatro tipos de práticas contempladas no trabalho comunitário, a saber: • A Psicologia Comunitária define estratégias para diagnosticar, de uma perspectiva psicológica e individual, e se preocupa com as estruturas internas individuais. É a psicologia clínica tradicional em outro cenário social e espacial, ou seja, assume um novo espaço de ação. Utiliza técnicas e instrumentos tradicionais de psicoterapia, diagnóstico e testes. Busca identificar crises vivenciadas e promove classificações. Considera que os problemas da comunidade são causados principalmente por problemas mentais. Seus temas de interesse são: neurose, psicose, histeria, relações familiares e pessoais. Outros problemas são vistos de uma perspectiva situacional. A comunidade é um mero destinatário. Significa uma defesa da especificidade profissional e crença na determinação psicológica. • A Psicologia Comunitária é aquela em que a ênfase é determinada pela população. O psicólogo participa de discussões e mobilizações; ele é um ativista político. Os problemas comunais derivariam de fatores econômicos, políticos e sociais; ele não atribui causas psíquicas a eles, o pessoal é analisado como o resultado das condições sociais. O psicólogo atende populações carentes contribuindo para aprender a se expressar, organizar e atender demandas. Contribui para a organização e mobilização popular. Para isso, utiliza dinâmicas de grupo para facilitar os processos de comunicação e organização, utilizando instrumentos de outras áreas. Com ela, a psicologia pouco contribui, pois seu caráter é basicamente político; se detecta novas situações e problemas, eles requerem maior análise e treinamento; dessa forma, a população ganha em possibilidades organizacionais. A prática UNIDADE 1 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA 10 psicológica é pobre. É uma não defesa da especificidade profissional e da crença numa determinação psicológica. • A Psicologia Comunitária atribui causas psíquicas a problemas comunitários, vendo-os como traços ou tendências internas da estrutura psíquica. Suas técnicas buscam fortalecer a organização, a mobilização e a participação. O psicólogo é um intermediário entre a população e as instituições. Implica a não defesa da especificidade profissional e a crença numa determinação psicológica. Carece de identificação profissional ou social. • A Psicologia Comunitária enfrenta os problemas das comunidades e estuda os aspectos subjetivos que contribuem para uma maior incidência das determinações. Analisa a realidade concreta da vida e da vida diária. O Psicólogo é um catalisador de processos. Seus temas são: os processos de formação de consciência, a construção de identidade, as representações sociais, a apatia social, a desorganização e mobilização, o individualismo, a solidariedade, os processos de ação social etc. Os problemas individuais são vistos a partir de uma perspectiva psicossocial e como uma construção sócio-histórica. Use as técnicas psicológicas existentes, mas crie outras, participando com a população. Desmistifique as explicações frequentes. É uma posição de defesa de especificidade profissional e crença na determinação sócio-histórica. Com ela, a psicologia e a comunidade ganham; cria-se a necessidade de reflexão e sistematização, constroem-se novos instrumentos e novas relações de produção e intervenção do conhecimento. A comunidade tem novas possibilidades como ator social, construindo novas formas de vida comunitária. O objeto de estudo está inacabado, em construção permanente. Requer coerência nos pressupostos científicos e rigor nos instrumentos de apreensão do objetivo e subjetivo das determinações sociais. Significa, então, um novo tipo de intervenção e relacionamento da psicologia com a comunidade. É preciso observar um viés contextual, pois há três subdivisões importantes que merecem destaque: • Psicologia na Comunidade (sai do espaço elitista de atuação). • Psicologia da Comunidade (envolve processos coletivos e públicos e também institucionais). • Psicologia Comunitária (modelo de psicologia crítica, não adaptacionista, tomada de consciência e identidade cultural). Até agora, apresentamos algumas ideias que acreditamos serem essenciais para entender o que significa o conceito de apoio social e a razão de seu protagonismo na Psicologia Comunitária. Intervir é empoderar, e para empoderar é preciso promover o uso de recursos, disponibilizar ou desenvolver práticas que permitam o acesso a esses recursos. O papel que eles desempenham neste processo é essencial, uma vez que o empoderamento envolve o desenvolvimento de capacidades das pessoas, organizações e comunidades, e as capacidades são TÓPICO 1 — CONCEITO 11 intimamente relacionadasà identidade. Nesse sentido, não é possível desvincular identidade com valores ou cultura, porque um dá conteúdo ao outro. O problema então é como promover o desenvolvimento sem cancelar os sistemas de crenças e valores, que são, precisamente, o motor que orienta todo o processo. Tolerância, colaboração, comunicação, discussão de objetivos, consenso etc. são todos os aspectos da intervenção a que se pode promover para que o empoderamento aconteça sem anular a identidade. Seguimos para os próximos tópicos. LANE, S. T. M. A Psicologia Social e uma nova concepção de homem para a Psicologia. In: LANE, S. T. M.; CODO, W. Psicologia Social: O homem em movimento. São Paulo: Brasiliense, 1984. MARTIN-BARÓ, I. El Poder Social. In: MARTIN-BARÓ, I. Sistema, grupo y poder: psicología social desde Centroamérica (II). San Salvador: UCA Editores, 1989. MONTERO, M. Crítica, autocrítica y construcción de teoria en la psicología sociallatino-a- mericana. Revista Colombiana de Psicología, v. 19, n. 2, p. 177-191, 2010. DICAS 12 Neste tópico, você aprendeu que: • Estudar o comportamento do ser humano e no que ele é influenciado socialmente é uma das competências dessa ciência, pois antes mesmo de nascermos, somos influenciados pela cultura a qual pertencemos, uma vez que as condições históricas e sociais e a história do grupo no qual seremos inseridos determinam o que é bom ou ruim, positivo e negativo, reforçador ou não. • A história da construção da psicologia social no Brasil e na América Latina construiu uma psicologia social como um campo de produção de conhecimento relacionando a relação homem x sociedade, através da compreensão do indivíduo e no papel de identificação dos grupos aos quais esse indivíduo pertence. • A Psicologia Social Comunitária apresenta traços muito particulares desde sua história até os seus papéis de atuação. É uma psicologia que tem como diretriz a tratativa com os grupos populares, pois por meio da compreensão da história dos sujeitos e dos grupos sociais é possível traçar estratégias para que cada grupo assuma o seu real protagonismo. • Tolerância, colaboração, comunicação, discussão de objetivos, consenso etc. são todos os aspectos da intervenção a que se pode promover para que o empoderamento aconteça sem anular a identidade. RESUMO DO TÓPICO 1 13 1 A obra Psicologia Social Comunitária é responsável pela abordagem de conteúdos importantes e desafiadores da Psicologia. Os estudos de Bader Sawaia e Regina Helena Freitas Campos caracterizam a comunidade por vários elementos, EXCETO: a) ( ) Abranger todas as formas de relacionamento marcadas por um grau elevado de intimidade pessoal, profundeza emocional, engajamento moral e continuidade no tempo. b) ( ) Fundamentar-se no homem e na mulher, vistos em sua totalidade e não neste ou naquele papel que possam desempenhar na ordem social. c) ( ) Ver como elemento vital o fazer e o pensar coletivos, destituídos das individualidades que os compõem. d) ( ) A fusão do sentimento da tradição que se constitui só no pensamento e não na participação. e) ( ) Sua base cotidiana deve ser sustentada somente no espaço geográ- fico. 2 A Psicologia Social Comunitária utiliza o enquadre teórico da Psicologia Social, privilegiando o trabalho com os grupos, colaborando para a formação da consciência crítica e para a construção de uma identidade social e individual, orientada por preceitos eticamente humanos. Quais as possíveis marcas que se pode ter com a produção teórica e a prática da psicologia social comunitária? a) ( ) A busca do desenvolvimento da consciência crítica, da ética, da soli- dariedade e das práticas cooperativas ou mesmo autogestionárias. b) ( ) A busca da autogestão como única maneira de termos as comunida- des vivendo sua autonomia em nossa sociedade. c) ( ) A definição junto às ONGs de como devem agir na solução imediata dos problemas sociais que atingem apenas parte da população. d) ( ) Orientar as Comunidades Urbanas marginalizadas a se conscienti- zarem de seus direitos. e) ( ) A definição das ações políticas partidárias como únicas capazes de garantir a tomada de consciência da realidade vivida. 3 O psicólogo trabalha com grupos atendidos pelo Programa de Atenção Integral à Família (PAIF) nos Centros de Referência e Assistência Social (CRAS), população em situação de vulnerabilidade social. Os objetivos do PAIF são: a) a prevenção e enfrentamento de situações de risco social; b) dos vínculos familiares e comunitários; c) promoção de aquisições sociais e materiais das famílias, visando fortalecer o protagonismo e a autonomia das famílias e da Comunidade. Com pauta nessas análises, cabe ao psicólogo: AUTOATIVIDADE 14 a) ( ) Estruturar um planejamento que permita a escolha de técnicas e di- nâmicas que estimulem a participação e a criação das atividades gru- pais, construindo um programa social, pois é através do conhecimento e do planejamento feito conjuntamente com os líderes comunitários que será possível construir os grupos focais. b) ( ) Facilitar o atendimento da população em situação de vulnerabilida- de, possibilitando o acolhimento econômico. c) ( ) Identificar as alternativas ecológicas de intervenção. d) ( ) Organizar os trabalhos de ambulatório para dar suporte à saúde da população. 4 Quais são os objetivos da Psicologia Social Comunitária e no que compreendem? 5 O processo histórico da Psicologia Social Comunitária aponta para qual sentido? 15 TÓPICO 2 — UNIDADE 1 HISTÓRICO 1 INTRODUÇÃO A Psicologia Comunitária é uma disciplina de gênese recente, pois seu surgimento é constatado no último terço do século XX nos Estados Unidos. Uma vez instalada, ela restou disseminada em larga escala pela Europa e pela América Latina. Existem diferentes formas de conceber a Psicologia Comunitária. Destas, duas merecem destaque, a saber: a norte-americana e a latino-americana, por sua graduação e autonomia – o que facilita a sua análise – e também porque são suficientemente documentadas em estudos empíricos que analisam sua trajetória e produção investigativa, bem como suas principais orientações práticas. A Psicologia Social como ciência independente nasce entre 1930-1940. Embora tenha raízes e precedentes, a Psicologia Social Comunitária se cristalizou institucional e academicamente nos Estados Unidos, na década de 1960-1970, vinculada ao campo da saúde mental. A história e a pré-história do movimento da comunidade americana são suficientemente detalhadas em vários livros e capítulos, o que nos exime de seu relato factual. Nós mesmos tentamos sintetizar o como e o porquê do surgimento da Psicologia Social Comunitária. A Psicologia Social Comunitária tem sua construção pautada na preocupação com a cidadania e com a interação dos grupos sociais; a busca de um processo de conhecimento social comunitário que possa assegurar o protagonismo das populações. No início do século XX, o psiquiatra Sigmund Freud utilizou a Psicologia Social para estudar o caráter social e psiquicamente condicionado das neuroses e psicoses de massas. Para ele, toda a psicologia é social. Toda disciplina científica tem como tarefa a busca de soluções para problemas práticos que surgem dentro de grupos e comunidades com um impacto direto sobre os indivíduos. A intervenção nos grupos sociais é responsável pelo favorecimento da autonomia e dos processos de engajamento e de criticidade diante dos problemas comuns que são enfrentados pelos grupos, pela comunidade e pela sociedade. No surgimento da Psicologia Social Comunitária, aliam-se uma série de forças e fatores, sejam eles técnicos, profissionais ou sociopolíticos, que serviram de amadurecimento da aplicação da Psicologia. Notoriamente, após a Segunda 16 UNIDADE 1 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA Guerra Mundial, há uma abertura para as mudanças sociais que ocorreram nos anos 1960. Ganha força o ativismo e o intervencionismo dos cientistas sociais. Essa situação não é pacífica,uma vez que não há uma unanimidade entre os autores, pois uns defendem que a Psicologia Social surgiu em 1859 com a edição da revista “Grande Enciclopédia Soviética”, de Steintahl e Lazarus. Enquanto outra vertente fala do surgimento de um processo de psicologização da sociologia que surge no final do século XIX. Cronologicamente, podemos situar o processo de psicologização da Sociologia burguesa na última década do século passado. Nas palavras do sociólogo e publicista francês G. Le Bon (1841-1931): “ao século dos heróis sucedia o século das massas”. Por fim, nos compete destacar que a crise da Psicologia Social incentivou vários pesquisadores a formularem alternativas para uma nova Psicologia Social mais comprometida com a realidade. Por um lado, a insuficiência do modelo médico-clínico da doença e do hospital, seu eixo principal, compreende e resolve não só muitos problemas de saúde mental, mas também as novas patologias psicossociais (drogas, marginalização, violência, desintegração da família etc.) resultantes das profundas deslocações e desintegração social que acompanham as mudanças tecnológicas e sociais em curso. Soma-se a isso, o desencanto da psicoterapia para atender às expectativas inicialmente geradas e a impossibilidade de atingir por meio desse método todos aqueles que precisam de ajuda psicológica (principalmente os mais marginalizados: a psicoterapia sempre foi um valor e uma prática das classes médias altas). Notoriamente, a reflexão sobre o surgimento da psicologia social através do seu processo histórico tem uma ligação com a Segunda Guerra Mundial, pois é a partir desse momento que a psicologia social passou a ser compreendida como estudo das interações humanas; elementos, como o preconceito, a liderança e os problemas comuns às interações humanas passam a ser observados de maneira mais atenta. Por sua vez, não podemos descurar do fato de que a psicologia social comunitária tradicional não trazia ainda em seu bojo esses delineamentos. No Brasil e na América Latina, esse movimento ganha força a partir da década de 1970, pois dentro da própria psicologia social um movimento começa a apresentar questionamentos sobre a diversidade cultural e sobre o comprometimento da Psicologia com os problemas da sociedade, é isso uma construção, ainda que incipiente, do modelo tradicional de psicologia social comunitária que começava a voltar o seu olhar para uma concepção mais harmônica, dualista e psicologizante sobre o homem e a vida social. TÓPICO 2 — HISTÓRICO 17 2 O ESTUDO DA PSICOLOGIA SOCIAL COMUNITÁRIA O estudo da Psicologia Social Comunitária enseja uma breve análise sobre as características e as interações humanas no que concerne aos problemas que surgem no seio social, os valores, o ajustamento social, as atitudes e condutas humanas, que podem ser estruturados através de contextos históricos e também culturais. A Psicologia Social Comunitária é demarcada através, especialmente, da Segunda Guerra Mundial, pois antes deste momento nevrálgico a preocupação dela estava centrada no estudo dos grupos e nas questões específicas de conduta e de ajustamento ou desajustamento social. É no pós-guerra que as práticas comunitárias encontram seu momento de ascensão e o modelo de Psicologia anteriormente conhecido passa a ser revisitado. A Psicologia Social Comunitária reúne intervenções diversas em várias áreas de atuação, pois sua base teórica e prática está fundamentada na concepção de princípios morais de solidariedade e de cooperação, pois, muitas vezes, é através do corpo social que podemos compreender as resoluções da vida cotidiana. 2.1 A PSICOLOGIA COMUNITÁRIA É UMA DISCIPLINA RECENTE A Psicologia Comunitária é uma disciplina recente. Sua origem tem contato com a psiquiatria social e preventiva, e, posteriormente, relaciona-se à dinâmica e à psicoterapia de grupos. Há uma conceituação que vai surgindo através da análise das origens sociais nos objetos de estudo dos psicólogos e psicólogas. Um dos marcos inquestionáveis desse processo são os decisivos acontecimentos de maio de 1968, na França e Itália, que colocam em evidência a neutralidade dos pesquisadores. Esse momento é conhecido como Crise da Psicologia Social, que se constitui sob o questionamento do modelo empírico-analítico. Na interpretação de José Costa (2015, s.p., grifos do autor) sobre a psicologia política abordada por Maritza Montero: A contribuição de Montero para o desenvolvimento da disciplina também passa pela importância de suas obras de sistematização teórico-metodológica e divulgação do estado da arte da PC na América Latina e em outros locais do globo. Em 2007, participou de um projeto liderado por Isaac Prilleltensky para divulgar o desenvolvimento da PC ao redor do mundo, coeditando, com Stephanie Reich e Manuel Riemer, o livro International Community Psychology: History and Theories, no qual são apresentados trabalhos de psicólogas e psicólogos comunitários de mais de vinte países, em todos os cinco continentes. Em 2011 Montero publicou, junto a Irma Serrano-García, a obra Historias de la Psicología Comunitária en América Latina: participación y transformación com artigos sobre a história da PC em dezenove países latino-americanos. Não obstante, a produção individual de Montero 18 UNIDADE 1 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA mais significativa ao campo da PC corresponde à tríade formada pelos livros: Teoría y Práctica de la Psicología Comunitaria: la tensión entre comunidad y sociedade, Introducción a la Psicología Comunitaria: desarrollo, conceptos y procesos e uma obra dedicada exclusivamente ao método: Hacer para Transformar: el método en Psicología Comunitaria. É possível afirmar que esses livros têm contribuído em grande medida para o fortalecimento do campo da PC na última década, tornando- se bibliografia obrigatória em diversos cursos de graduação e pós- graduação em Psicologia Comunitária. A maioria dos capítulos pode ser lida independente dos demais, de modo a iluminar um tema específico da PC, mas tomados em conjunto, esses três livros significam uma contribuição sumamente original de Montero à construção de um paradigma latino-americano crítico e construcionista para a Psicologia Comunitária. Existem três subdivisões da Psicologia, a saber: • Psicologia Social: estudo acerca das multidões e também dos processos de comunicação entre o indivíduo e a dinâmica das relações interpessoais. Tem como cerne estudar como as pessoas se relacionam e se influenciam mutuamente. • A Psicologia Comunitária: estudo dos grupos nas comunidades e das instituições sociais. Tem como esteio o estudo das experiências sociais que o indivíduo adquire e partilha através dos grupos nos quais transita. • A Psicologia Social Comunitária: nessa conjunção podemos afirmar que há um fio condutor entre as duas classificações anteriores, pois a Psicologia Social Comunitária fundamenta-se pelos princípios éticos e humanitários com as práticas direcionadas para a participação coletiva. Segundo Yamamoto (2007), paralelamente ao desenvolvimento da Psicologia Comunitária, podem ser observadas contínuas mudanças nos cenários das políticas públicas brasileiras. Essa situação nos direciona para o bem-estar social, que é a seara de atuação do psicólogo. Nos tópicos seguintes, procuraremos trazer algumas ideias e características básicas que definem a Psicologia Comunitária como conceito teórico e como campo de intervenção. No entanto, é preciso tratar os conteúdos através de uma contextualização sócio-histórica. É necessário compreender que o conjunto de conhecimentos teóricos transferido para um contexto ou situações específicas sempre ficam aquém das necessidades específicas de uma comunidade. Uma ação em que os objetivos da ciência e da prática são combinados e a teoria seja validada pelo fazer empírico, por sua vez, torna-se um conhecimento teórico e dá um sentido dialético de conhecimento, pois essa troca de imbricações e sentidosultrapassa os limites do atendimento clínico e cede espaço para um novo viés de atuação profissional. Não devemos esquecer, em nosso entendimento, as raízes socioestruturais desses eventos: a industrialização e o desenvolvimento dos anos 1960 geram possibilidades muito maiores de diferenciação social, pois aparecem assim grupos sociais marginalizados e profundas mudanças socioculturais como: a) aumento da competitividade, b) individualismo, c) diminuição da solidariedade do papel TÓPICO 2 — HISTÓRICO 19 dos grupos sociais primários, d) estabelecimento dos valores do sucesso face à realização pessoal ou afiliação, entre outros. Essas situações colocam dramáticos problemas de adaptação a grandes grupos populacionais, sejam imigrantes, desempregados, excluídos e marginalizados. 2.1.1 A evolução da Psicologia Com a evolução da Psicologia, surgiram múltiplas ramificações, algumas enfatizando a teoria, outras norteando seus trabalhos na prática de Psicologia Social. Posteriormente, as áreas de Psicologia Comunitária da Psicologia Geral tiveram pretensões aplicadas eminentemente e suas principais intenções eram distanciar-se de laboratórios psicológicos descontextualizados da realidade humana. Ao longo dos estudos de psicologia comunitária nos Estados Unidos e das influências do contexto social e político, é notório que a América Latina conduziu momentos de protagonismos e continuou exercendo sua influência. Especificamente, diferentes ciclos políticos (alternância entre governos democráticos e republicanos) marcaram a predominância de uma ou outra teoria sobre saúde mental. Durante os períodos mais progressivos, determinantes ambientais têm mais peso na explicação do comportamento humano, enquanto em períodos de conservadorismo político e social, tem-se a importância das variáveis pessoais. Além disso, essa influência política não se limita apenas a perspectivas teóricas predominantes, mas, sobretudo, afeta os tipos de intervenções que eles são promovidos e desenvolvidos. GUARESCHI, P. Psicologia Social Crítica como prática de libertação. Porto Alegre, RS: Editora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2004. FREITAS, M. Desafios contemporâneos à Psicologia Social Comunitária: que visibilidade e que espaços têm sido construídos? Psicologia e Argumento, v. 22, n. 36, p. 33-47, 2004. SAWAIA, B. Comunidade: a apropriação científica de um conceito tão antigo quanto a humanidade. In: CAMPOS, R. Psicologia Social Comunitária: da solidariedade à autono- mia. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000. DICAS 20 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • A Psicologia Social Comunitária reúne intervenções diversas em várias áreas de atuação, pois sua base teórica e prática está fundamentada na concepção de princípios morais de solidariedade e de cooperação, pois, muitas vezes, é através do corpo social que podemos compreender as resoluções da vida cotidiana. • A Psicologia Comunitária é uma disciplina recente. Sua origem tem contato com a psiquiatria social e preventiva, e, posteriormente, relaciona-se à dinâmica e à psicoterapia de grupos. • Com a evolução da Psicologia, surgiram múltiplas ramificações, algumas enfatizando a teoria, outras norteando seus trabalhos na prática de Psicologia Social. Posteriormente, as áreas de Psicologia Comunitária da Psicologia Geral tiveram pretensões aplicadas eminentemente e suas principais intenções eram distanciar-se de laboratórios psicológicos descontextualizados da realidade humana. 21 1 A psicologia social comunitária pode ser definida como uma área da psicologia social que estuda a atividade do psiquismo decorrente do modo de vida do lugar/comunidade; estuda o sistema de relações e representações, identidade, consciência, identificação e pertinência dos indivíduos ao lugar/ comunidade e aos grupos comunitários. A história da psicologia comunitária no Brasil apresenta como primeiras práticas de intervenção da psicologia social comunitária: a) ( ) A prevenção da saúde mental e a educação popular. b) ( ) A intervenção sindical e a violência entre gêneros. c) ( ) A violência urbana e a perda de identidade pelas migrações. d) ( ) A melhoria das condições de trabalho e a análise da ação ideológica dos meios de comunicação. e) ( ) A ausência de organização popular e a superação do individualismo. 2 A Psicologia Comunitária é uma aplicação da psicologia social para a resolução dos problemas sociais nas comunidades. Qual é o objetivo da psicologia comunitária? a) ( ) Atuar com grupos nos quais as relações de poder garantam o status quo. b) ( ) Atuar no sentido de manter relações verticalizadas e conscientes. c) ( ) Atuar na comunidade apontando os caminhos que deverão ser segui- dos para que os sujeitos encontrem a emancipação. d) ( ) Atuar no sentido de preservar relações assistencialistas e paternalistas. e) ( ) Atuar com a população excluída, buscando trabalhar a consciência crítica e o empoderamento dos sujeitos. 3 A Psicologia Comunitária se caracteriza por trabalhar com sujeitos sociais em condições ambientais específicas. Sobre o objetivo da psicologia comunitária através de seu processo histórico, assinale a alternativa INCORRETA: a) ( ) O objetivo é discutir as relações entre Saúde Comunitária e Psicologia Comunitária na perspectiva dos processos de participação e de libertação que contribuem na construção de metodologias participativas. b) ( ) A comunidade é o principal ator e o foco está mais nos processos de saúde que nos processos de doença. As metodologias participativas presentes na caminhada comunitária, na visita domiciliar e no círculo de cultura propiciam uma prática condizente com esses princípios. c) ( ) O envolvimento dos profissionais de saúde e dos moradores das co- munidades favorece processos de saúde e de autonomia. AUTOATIVIDADE 22 d) ( ) A Psicologia Social Comunitária compartilha valores e práticas que possuem como princípios a libertação e a participação, que contribuem na construção de espaços que rompam com os processos de opressão. e) ( ) A Psicologia Social Comunitária priva valores e práticas que possuem como princípios a libertação e a participação, impedindo uma prática con- dizente com esses princípios. 4 A ideia de uma Saúde Comunitária aparece de maneira imprecisa e polissêmica nos discursos e práticas de saúde, tanto no Brasil como em outros países da América Latina, tornando-se necessária uma clarificação desse conceito. O que busca a análise da Psicologia Social Comunitária? 5 A Psicologia Social Comunitária apresenta duas vertentes. Quais são as que se constituem como um princípio da vertente latino-americana? 23 TÓPICO 3 — UNIDADE 1 IDENTIDADE 1 INTRODUÇÃO A identidade social pode ser entendida como a influência dos grupos no pensamento de seus membros, até que possam então desenvolver os seus próprios pensamentos. Os grupos têm influência sobre o pensamento de seus membros e desenvolvem até mesmo um estilo de pensamento distinto, tão logo as representações preencham funções de manutenção da identidade social que resta entremeada pelo equilíbrio sociocognitivo (JODELET, 2001). Identidade, poder e atividade não são aspectos grupais independentes. [...] em cada situação concreta, os grupos se encontram imbricados, diretamente ou através de seus membros, o que gera identidades grupais parcialmente comuns ou difusas, poderes compartilhados e ações com efeitos múltiplos (MARTÍN-BARÓ, 1989, p. 227). Menciona, ainda, que há quatro fatores importantes que devem ser considerados: Quatro fatores podem influir na formação espontânea de um grupo primário: a) a atração entre seus membros; b) alguma semelhança entre eles; c) a ansiedade; d) a complementaridade de suas características pessoais [...]. A própria atividade dos grupos primários vai gerando vínculos afetivos e de complementaridade funcional entre os membros, tornando-os mais interdependentes, até o ponto de modelaras necessidades e ainda a identidade pessoal de cada um (MARTÍN- BARÓ, 1989, p. 305-306). Tendo como base essas três condições, Martín-Baró (1989, p. 206) define grupo enquanto “uma estrutura de vínculos e relações entre pessoas que canalizam em cada circunstância suas necessidades individuais e/ou interesses coletivos”. Ressalta ainda que um grupo é uma estrutura social: é uma realidade total, um conjunto que não pode ser reduzido à soma de seus membros. “A totalidade do grupo supõe alguns vínculos entre os indivíduos, uma relação de interdependência que é a que estabelece o caráter de estrutura e faz das pessoas membros” (MARTÍN-BARÓ, 1989, p. 206). Assim, segundo o autor, um grupo constitui um canal de necessidades e interesses em uma situação e circunstância específica, afirmando com isso o caráter concreto, histórico de cada grupo. Apresenta, ainda, três parâmetros principais para a análise do processo grupal: 24 UNIDADE 1 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA • A identidade do grupo, ou seja, a definição do que é e o que o caracteriza como tal frente a outros grupos. • O poder de que dispõe o grupo em suas relações com os demais grupos. • A atividade grupal e mais a significação social do que produz essa atividade grupal. Três aspectos devem ser considerados na conformação da identidade de um grupo: – formalização organizativa: determinação das condições de pertencer ao grupo (normas formais ou informais, rígidas ou flexíveis, estáveis ou passageiras); requer ainda uma definição de suas partes e uma regulação das relações entre elas (divisão ou não das funções, sistematização das tarefas, distribuição de trabalho e atribuições); – as relações com outros grupos: a dialética intergrupal produzida historicamente em cada sociedade interfere no surgimento do grupo, assim como a sua conexão com as necessidades e os interesses de uma classe social; – a consciência de pertencer a um grupo: o grupo passa a ser para o indivíduo uma referência para a sua própria identidade ou vida, referência essa criada a partir do sentimento de pertença subjetiva a um grupo. Esse sentimento é que contribui para que um grupo de pessoas se sinta e atue como grupo, possibilitando a sua identificação. 2 AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS As Representações Sociais são estudadas através da articulação de elementos mentais, sociais e afetivos. Esses elementos são integrados por meio da cognição, da linguagem e da comunicação. As relações sociais afetam as representações sociais e interferem sobre elas, pois através de uma realidade material surge uma interação recíproca e permanente entre o que se compreende da realidade e como essa realidade se apresenta para cada sujeito, uma vez que os elementos afetivos e de comunicação são variáveis entre o grupo e isoladamente (JODELET, 2001). A cultura, a classe social, a linguagem e os interesses comuns aproximam as pessoas com a intenção de compreender os processos sociais aos quais estão submetidas (GARCIA, 1994). As Representações Sociais permitem compreender a relação entre as formas de violência ocorridas entre as pessoas e também o efeito da cultura, pois a satisfação com a imagem pessoal não corresponde à busca da saúde mental e emocional das pessoas. Dá-se ênfase ao processo de estigmatização, culpabilização e exclusão que as pessoas que sofrem com a violência ou outras formas de exclusão são submetidas. A Psicologia Social Comunitária busca compreender tais processos considerando os laços estabelecidos por pessoas que vivenciam condições semelhantes. Muitos fatores são essenciais para essa formulação, pois a identidade dos membros se constitui por meio dos sentimentos de exclusão que são comuns aos indivíduos que sofrem ou sofreram com a violência. Por sua vez, a integração entre as pessoas que sofreram violência confere uma característica TÓPICO 3 — IDENTIDADE 25 transformadora, pois através das necessidades comuns emerge também a busca de satisfações comuns pautadas na superação (MONTERO, 2004). As Representações Sociais são crenças compartilhadas e são elas que auxiliam na compreensão de grupo e de pertencimento ou de afastamento do grupo. Através delas os valores e as ideias são partilhados e com elas são construídas as ideologias sociais (MOSCOVICI, 2003). É preciso destacar que há mais aspectos negativos do que positivos em relação à violência, e para além de um processo de identificação das pessoas que sofrem com essa culpabilização e estigmatização não há uma identificação entre elas, pois não se pode ignorar que há condenação social. Na Psicologia Social, as Representações Sociais (RS) ganham um sentido para além da apreensão e conceituação, pois são sistemas mentais também criativos, autônomos e que constroem o real. Nesse modelo, as Representações Sociais não são somente resultado da ação mental, mas sua motivadora, sendo também vista como eminentemente social em suas origens e função. Para Moscovici (2003, p. 49): Há um poder criador de objetos e eventos da atividade representativa, há [...] relações entre o nosso reservatório [...] de imagens e a nossa capacidade de combiná-las, de engendrar novas e surpreendentes combinações. [...] a representação constitui uma preparação para a ação, pois, além de guiar o comportamento, ela remodela e reconstitui os elementos do meio ambiente em que o comportamento deve se ligar. Ela consegue incutir um sentido ao comportamento, integrá-lo numa rede de relações em que está vinculada ao seu objeto, fornecendo ao mesmo tempo as noções, as teorias e os fundos de observação que tornam essas relações estáveis e eficazes. 2.1 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SÃO FENÔMENOS DA VIDA COTIDIANA Representações Sociais são fenômenos da vida cotidiana. As pessoas constroem através da comunicação os seus símbolos e as suas identificações. A escolha dos temas segundo sua relevância e interesse é capaz de reproduzir e por vezes criar Representações Sociais (MOSCOVICI, 1976). “As Representações Sociais, além de configurarem como pensamento compartilhado socialmente sobre um fato social que tem importância para um grupo de pessoas, também são teorizadas” (POLLI; CAMARGO, 2010, p. 13). 26 UNIDADE 1 — PSICOLOGIA COMUNITÁRIA Representações Sociais são pensamentos construídos e compartilhados socialmente por meio das comunicações estabelecidas entre as pessoas. Também designadas como saber do senso comum, criam um mundo de significados que são compartilhados por pessoas que fazem parte de um grupo social (JODELET, 2001). IMPORTANT E As interações sociais e o desenvolvimento humano se constituem por meio da linguagem. Essa interação constrói as RS, uma vez que estabelece significados entre os indivíduos. Há uma busca pela personalização. Dessa forma, o sujeito social se aproxima ou se afasta da comunidade diante das suas concordâncias e dissonâncias com as relações sociais (LANE, 1984). Para Jodelet (2001), os conhecimentos compartilhados de forma comum estruturam um modelo de comunidade. Através das RS existe a constituição de um senso comum. Há uma relação que é dialética, pois as relações humanas são compreendidas por meio de informações e comportamentos que de forma conflituosa ou amena são partilhados e essa partilha aponta para o contexto das representações sociais. O domínio das informações promove processos reflexivos que constroem a apropriação da realidade social e as impressões sobre o mundo externo seguem paulatinamente internalizadas nos indivíduos, e essa apropriação constitui as RS. 2.1.1 As três dimensões das representações sociais As Representações Sociais são formadas por três dimensões, a saber: 1) informação; 2) atitude; 3) campo de representação ou imagem. Essas dimensões apontam para o fato de que existe um modelo social que possui uma unidade. Essa unidade pode se apresentar de três modos: 1) hegemônica; 2) emancipada; 3) polêmica. Significa dizer que é possível que haja situações em que a unidade entre as pessoas aponte para uma
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